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Apoio Cultural

C A N TO S
E TOADAS

DO REISADO
PATRIMÔNIO MUSICAL DO CEARÁ

‘‘Olá meu boi bonito, que veio do Ceará


tu dança bem bonito, garrote, aqui pro povo olhar’’
(verso tradicional do reisado)
CANTOS E TOADAS DO REISADO: PATRIMÔNIO MUSICAL CEARENSE

Durante quase um ano (2017), uma equipe liderada pela pesquisadora em cultura Raylane
Neres, de Sobral, visitou várias cidades cearenses mapeando as mais diversificadas toadas dos
mestres e grupos de reisado do Estado. A pesquisa colheu os relatos, cantos, peças e toadas
que vão das melodias dramáticas e singelamente orquestradas dos Mestre Piauí
(Quixeramobim), Chico Emília (Quixadá), Mestre Aldenir e Mestra Mazé (Crato) aos
improvisos certeiros do Mestre João Paulo e Grupo Pé-quente (Meruoca), passando por uma
infinidade de traços, simbolismos e especificidades nos vários cantos e recantos do Ceará,
como Potengi (Mestre Antônio, da comunidade de Sassaré), Juazeiro do Norte (Mestre
Cicinho), Sobral (Mestre Antônio Paz, da comunidade de Aracatiaçu), Guaraciaba do Norte
(Grupo Alto do Bom Jesus), Meruoca (Gerardinho Chicó), Senador Pompeu (Mestre Zédimar,
do distrito de São Joaquim de Cima), Forquilha (Boi Lagartixa) e Fortaleza (Reisado do
ESCUTA).
O presente catálogo contém um pouco da história dos grupos e mestres visitados e os seus
principais cantos, peças e toadas. No final, estão alguns destes versos transcritos em partitura,
uma forma de tornar a sonoridade indelével e de acesso universal.
A contemporaneidade tem sufocado paulatinamente as manifestações tradicionais,
levando-as, em muitos lugares, ao ostracismo e a alcunha do controverso 'folclore'. Muitas
vezes mal compreendidos, os fazeres chegam até a ser romantizados como o 'toscos' ou a arte
'dos que não tem instrução'. Todavia, projetos estruturantes e o fomento das politicas publicas
estaduais tem lutado para contrapor estes perfis estereotipados. O que se vê são brincadeiras
que nada tem de 'tolas', mas são politizadas num nível deveras avançado de compreensão de
mundo, de subversão, demonstrando, ainda, uma indiscutível qualidade musical e poética,
num enredo que satiriza o sistema vigente e exibe a alma e os anseios das pessoas envolvidas.
Foi um trabalho árduo, mas feito com muita alegria e prazer. Não dá pra permanecer as
mesmas pessoa depois de uma jornada tão audaciosa e revigorante, que nos permitiu
conhecer um pouco do universo rico e sincrético dos reisados cearenses.
O que compartilhamos com os leitores e leitoras é um pouco desta trajetória, desejando
que nas próximas oportunidades, apreciem os mestres e mestras, reisados e bumba-meu-boi
da sua cidade ou região. Eles irão encantá-los(as), como nos encantou. Irão presenteá-los(as)
com uma visão notoriamente esclarecida do mundo e farão isso da maneira mais lúdica,
improvável e engraçada que se pode conceber. Os reisados são parte do que somos,
cearenses de corpo e alma.
ESTRELA DA SERRA
BOI ESTRELA DA SERRA - MESTRE JOÃO PAULO - MERUOCA
O grupo Boi Estrela da Serra, segundo dados colhidos na Secretaria de Cultura de Meruoca,
remonta a meados do século XIX (1857). De acordo com o brincante Paulo Eliotério do
Nascimento, nascido no ano de 1948, no sítio Boa Vista, os seus bisavós relatavam as
histórias dos primeiros participantes.
Na década de 1990, integrou-se ao grupo um experiente brincante, com mais de 60 anos
de atuação no universo dos caretas: O Sr. João Paulo Vieira, nascido em 1925 e participante
da manifestação desde os sete anos de idade.
Em 2017, o Mestre João Paulo foi condecorado com o título de Tesouro Vivo da Cultura
de Meruoca (Câmara Municipal de Meruoca, resolução Nº 008/2016) e no início de 2018, o
Mestre figurou na lista de contemplados pelo Edital dos Tesouros Vivos da Cultura, da
Secretaria Estadual da Cultura.
O grupo Estrela da Serra é formado por 15 brincantes das localidades de Sítio Recife e
Sítio Freixeiras, Meruoca, entre homens e mulheres.

Dentre as toadas cantadas pelo grupo, Pra 'mim' chegar nos seus pés
destacamos: E poder me ajoelhar

A TOADA DOS INDIOS Me ajoelho em seus pés


Lhe pedindo, por favor
Estou preso, estou seguro Quem geme, não sente nada
Não posso nem me mover Quem chora é que sente a dor
Culpado 'foi' os caretas
Que mandaram me prender Capitão, tenha pena de mim
Tenha dó do meu penar
Uma praça ao lado esquerdo Peço licença ao senhor
Polícia do outro lado Para em seu salão entrar
E um capitão bem na frente
Que de gente estou cercado E a brincadeira segue. A apresentação do
grupo, se for completa, pode durar mais
Estou cercado de policia de duas horas e eles sempre se reúnem
Recebi ordem de prisão no período natalino e durante o mês de
A policia me prendeu janeiro, voltando a montar o grupo na
Por que não tem coração semana santa, por ocasião das
manifestações relativas aos caretas.
Capitão, peço licença
Licença queira me dar

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BOI CORAÇÃO
BOI CORAÇÃO - MESTRE ANTÔNIO PAZ - ARACATIAÇU
A agente cultural sobralense Ana Sousa nos passa a informação de que a origem do Boi
Coração, de Aracatiaçu, remonta ao ano de 1910. Aracatiaçu é distrito de Sobral, situado a
leste da “Princesinha do Norte”.
Por volta do ano de 2006, com a criação do Ponto de Cultura Vento Forte, numa parceria
com o Ministério da Cultura, intensificou-se o fomento a tradição dos reisados na
comunidade. Desde o ano de 2005, também, o grupo vem participando do encontro anual
de bois e reisados de Sobral, além de apresentações em diversos eventos pelo estado,
como o XIV Festival Nordestino de Teatro, em Guaramiranga, em 2007; Apresentação em
eventos de Lisiuex, Santa Quitéria; Realização do projeto Boi Coração: mais de 100 anos de
Tradição, que contou com apoio cultural da Secretaria da Cultura do Estado do Ceará,
dentre outros.
Quem conversou conosco foi o Mestre Antônio Paz que, muito simpático e atencioso,
nos contou um pouco de sua história e nos alegrou com as diversas toadas do grupo. Na
época da entrevista (2017) com setenta e quatro anos, ele relata que começou a brincar
ainda na adolescência, por volta do ano de 1958, quando monta um grupo de reisados
numa localidade próxima de Aracatiaçu, ao lado dos irmãos Chaguinha, Amilton, Edilson e
outras pessoas próximas.
O grupo foi se desfazendo nas décadas posteriores e quando Seu Antônio Paz transfere-
se com a família para a sede de Aracatiaçu, encontra os brincantes do Boi Coração, não
demorando a se integrar ao grupo.
Dentre as toadas cantadas pelo grupo, destacamos:
A TOADA DA CHEGADA DO BOI
Pentecoste, Caxitoré Por apelido me chamam
Livramento, Aracati Êle bumba, olá meu boi
Quando eu falar contigo, acorde Canário, Beija-Fulô
E dá um salto, vem aqui
Lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá Infelizmente, Mestre Antônio Paz faleceu
Êle bumba, olá meu boi alguns meses depois da entrevista. Fica
Meu garrote, boi Lulu nossa torcida para que o grupo possa dar
Êle bumba, olá meu boi segmento à memória do mestre e a
Eu sou filho do meu pai brincadeira. Aracatiaçu tem intensificado
Êle bumba, olá meu boi sua luta pela preservação e fomento de
Eu sou neto do meu avô atividades culturais nos últimos anos,
Êle bumba, olá meu boi tendo o reisado e o maracatu como as
Pois não querem que eu vá expressões mais consolidadas. Mestre
Êle bumba, olá meu boi Antônio Paz viverá para sempre na
Pois aonde é que eu vou? memória daqueles que amam o fazer de
Êle bumba, olá meu boi bois e reisados.

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ALTO DO BOM JESUS
REISADO DO ALTO DO BOM JESUS - GUARACIABA DO NORTE
Chegamos a Guaraciaba numa data bem festiva, pois o grupo REISADO DO ALTO DO BOM
JESUS, que já estava há vários anos sem se apresentar, iria voltar à cena e a comunidade
estava em peso, para ver o retorno do grupo tradicional.
Entre os diversos diferenciais do grupo, destacamos o acompanhamento musical com o
violino e o fato do brincante que fica embaixo do boi, dançar ajoelhado.
O reisado do Alto do Bom Jesus foi fundado no início da década de 1970 e a
apresentação se inicia com um canto entoado por seu Joaquim Cruz, os dos mais antigos
brincantes.
Entre as toadas cantadas pelo grupo, destacamos:
TOADA INÍCIAL E ainda ficou cinco, para tocar siricora
Os três reis do oriente, que 'chegou' aqui Boa noite meu capitão, pegue aqui na
agora minha mão,
Avança, avança, caro companheiro, como vai sua senhora?
vai fazer bom pra ganhar nosso dinheiro
É os três reis do oriente, todos três com Faz bonito o capitão
devoção 'Teje' pegado na vela
Que partiu para Belém Que a porta que não tem tranca
Ver jesus na redenção Se tranca com uma tramela
Avança, avança, caro companheiro, Tramela e trameliana
vai fazer bom pra ganhar nosso dinheiro Trameliana e tramela
Era Gaspar e Baltazar, o terceiro era Ganzela e ganzeliana
Belchior Ganzeliana e ganzela
Todos três andavam bem, cada qual era Só não casei com a Rita
o melhor Por que ela é muito amarela
Ela vira o lobisomem
O careta entra declamando os seguintes E nem me passa na titela
versos
Um dos fatores que nos alegrou em
Demorei ali um pouquinho, enquanto eu Guaraciaba, além da calorosíssima
vestia a estopa recepção na comunidade, foi a maciça
Que a fazenda é muito cara e não pude presença da população na brincadeira.
comprar roupa Nosso agradecimento a Helder Melo e
Perdi a cavalaria da donzela “Tiadora” Michelly Martins que nos receberam na
Cada cavalo na sela, cada sela uma sede do Engenho Novo e nos
senhora acompanharam até a localidade de Alto do
Cinco na sala de dentro e cinco na sala de Bom Jesus.
fora
Cinco tocava rebeca e cinco tocava viola

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REIS DE CONGO
REIS DE CONGO - MESTRE ALDENIR – CRATO
Na comunidade de Bela Vista, Vila de Padre Cícero, na aprazível cidade do Crato,
encontramos o Mestre José Aldenir Aguair, reconhecido em 2004 como Tesouro Vivo da
Cultura do Estado do Ceará. Mestre Aldenir começou a brincar reisados aos 15 anos, mas
sua integração dedicada ao grupo Reis de Congo deu-se 1955, quando, nas palavras do
próprio mestre “comecei a brincar trajado”. De lá para cá, não deixou de brincar por nem
um ano.
Nascido na localidade de Baixio Verde (próximo ao Sítio Bela Vista) em 20 de agosto de
1933, Mestre Aldenir foi homenageado pela XII Mostra Estadual Ceará Natal de Luz, em
2017.
A coordenadora do grupo, Ana Paula de Brito Silva, mãe Maria Eduarda (12 anos) e Ana
Laura (07 anos), que participam do reisado, é a responsável por todas as articulações do
grupo, que traz na bagagem um grande itinerário de apresentações dentro e fora do
Ceará.
Muitas das toadas e mesmo personagens (como “a doida”, o cão e a alma) são criações
do próprio Mestre Aldenir, com base em acontecimentos que chamaram sua atenção.
Destacam-se no grupo três garotas, todas com doze anos (2017), que compõe músicas
para o reisado, algumas das quais já estão sendo utilizadas nas apresentações oficiais.
Suelenn Luane Pereira, Kimberly Fidelis Oliveira e Maria Eduarda Brito são frequentadoras
assíduas do reisado e encantam pela simpatia e amor que demonstram pela manifestação
a despeito da pouca idade. Dentre as peças cantadas pelo grupo, destacamos:

Aldenir / Nós viemos bem aqui pra


PEÇA DO BAIXIO VERDE cantar essa vitória (BIS) / Cheguei agora
Nunca pensei de ser mestre de reisado com todo meu pessoal / Minha gente
Nasci no baixio verde, sentindo o cheiro venha ver essa dança cultural (BIS)
de mato (BIS)
No engenho de Rui, comendo mel e Esse é o reisado, aprendi pequeninin
rapadura Esse é o Mestre Aldenir, dança até o sol
Lutando pela cultura do município do raiar (BIS)
Crato (BIS)
Mestre Aldenir é uma grande referência
Tenho lembranças quanto eu era não só no Crato, mas em todo o Estado do
Cambiteiro / Trabalhava o dia inteiro, Ceará e muitos dos mestres de reisado da
mais meu colega Raimundo (BIS) / De Região do Cariri passaram pelas suas
tardezinha eu ia tomar café / Na casa de mãos. Sua casa está sempre de portas
Daniel onde ficava as 'mulhé' abertas para receber todos aqueles que
desejam dialogar, aprender, contribuir ou
PEÇA DE AUTORIA DO TRIO DE MENINAS mesmo apreciar seu espírito sempre
MESTRE ALDENIR alegre e sua aura que transborda cultura,
paz e melodia.
Esse é o reisado do nosso Mestre

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BOI PAZ NO MUNDO
BOI PAZ NO MUNDO - HERDEIROS DO MESTRE PANTECA- SOBRAL
Dificilmente exista um sobralense que nunca tenha ouvido falar do Boi Ideal, outrora
liderado pelo Mestre Panteca, falecido em 2006. O aludido, por muitas décadas, fortaleceu
a tradição do reisado na “Princesa do Norte”, como é carinhosamente chamada a cidade de
Sobral.
Alguns integrantes do grupo conversaram conosco, entre eles o coordenador João
Batista Mendes, neto do Mestre Panteca e herdeiro da tradição. Com quarenta e dois anos à
época da entrevista (2017), João Batista iniciou sua participação nos bois e reisados ainda
aos sete anos de idade no Boi Ideal, onde permaneceu até os 33 anos, quando fundou o
próprio grupo, o Boi Paz no Mundo, que está em atividade até os dias de hoje. Participaram
da conversa também os brincantes Francisco Gildo Costa, que também brincara no Boi
Ideal desde muito moço, aos dez anos; Francisco Carlos Gilson (brincante infantil), Marcílio
e Alves.
João Batista nos conta que o Boi Ideal foi concebido por seu tataravô, que trouxe
influências de viagens que fizera ao Maranhão para montar o grupo.

Dentre as toadas cantadas pelo grupo, De ter um laço pra me laçar


destacamos: Cadê aquele laço, laço de laçar meu boi?
TOADA DO LAÇO Cadê aquele laço que eu não sei pra onde
Cadê aquele laço, laço de laçar meu boi? foi
Cadê aquele laço que eu não sei pra onde A TOADA DA BURRINHA
foi E vem chegando meu cavalo
Foi boiadeiro, o menino, 'Cavalin' do paz no mundo
Vem, vem lá Cavalo traz alegria
O boiadeiro sou eu 'Cavalin' do paz no mundo
Vem, vem lá Pra dançar agarradinho
Meu laço caiu no ribeirão 'Cavalin' do paz no mundo
Vem, vem lá Cavalo tem tradição
Meu laço caiu das minhas mãos 'Cavalin' do paz no mundo
Vem, vem lá Pra dançar com emoção
Ai que saudade que eu tenho do laço 'Cavalin' do paz no mundo
Vem, vem lá Cavalo tu é da paz

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REISADO MANOEL MESSIAS
REISADO MANOEL MESSIAS - MESTRE CICINHO - JUAZEIRO DO NORTE
Em Juazeiro do Norte, nosso diálogo foi com o grupo de reisados Manoel Messias,
capitaneado pelo jovem Cícero Frank Severino da Silva, o Mestre Cicinho, de apenas 39
anos. A visita foi ainda mais proveitosa, pela presença de Cícera Flatenara Azarias da Silva,
filha de Cicinho e coordenadora do reisado mirim Santo Expedito e de Luis Cláudio da
Silva, do grupo de reisados São Luiz.
O reisado Manoel Messias é bastante conhecido na região e sua origem se deu por volta
do ano de 1972, quando os Mestres Damião Vieira Lima, o Damião Cabeludo, Zé Pretinho
e Mestre Zequinha, como era conhecido Manoel Lúcio da Silva, pai de Cicinho, se reuniram
e resolveram iniciar a atividade.
Mestre Zequinha parou suas atividades no ano de 1995, por problemas de saúde, vindo
a falecer em 2009. A pedido de Mestre Zequinha, o grupo retornou em 2003, já sob o
comando de Mestre Cicinho. Desde então, o reisado tem mantido a tradição, com
participação, inclusive, nas Paraolimpíadas do Rio em 2016, quando realizou diversas
apresentações pela capital fluminense.
Dentre as peças cantadas pelo grupo, destacamos:
PEÇA DO JARAGUÁ Oh minha gente eu aqui nunca rimei
'Tava' debaixo de um arvoredo Mas já sonhei que hoje eu vou rimar
Ao meio dia eu 'tava' descansando Vou te contar um causo que aconteceu
Ouvi um canto tão saudoso Comigo lá nos “Popô”, presta atenção eu
Só me parece um passarinho cantando te contar
Oh que pássaro bonito é aquele Sai de casa pra ir a uma brincadeira
Tá preso no ninho sem poder voar Naquela ribeira todos já sabem quem
É o nosso pássaro Jaraguá sou
Que anda perdido nas ondas do mar Tava em pé, tava no meio do terreiro
Oh! que bicho feio A policia do juazeiro, minha peixeira
Virgem Mãe de Deus levou
É o Jaraguá, oh maninha No outro dia as meninas foram buscar
Pra pegar o Mateus Que são gente popular e fazem a conta
Chegou, chegou, já chegou meu Jaraguá do amigo
Mas o bichinho é bonitinho e ele sabe Fiquei alegre, eu fiquei muito contente
vadiar Obrigado pras meninas, fiquei muito
agradecido
Mestre Luis Cláudio nos conta de um causo
que ocorreu com o Mestre Chico Barbosa, o Juazeiro do Norte regozija-se com a
q u a l e s t a va a c o m p a n h a n d o n u m a atuação frequente dos Reisados Manoel
localidade chamada Popô, perto do Messias e São Luiz nos vários eventos que a
famoso horto em Juazeiro do Norte, cidade promove em atenção aos
descrito nesta peça: manifestos da cultura popular.

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BOI BRASILEIRINHO
BOI BRASILEIRINHO - SÍTIO SOCORRO - MASSAPÊ
O grupo Brasileirinho, da localidade de Sítio Socorro (Massapê) nos recebeu por meio de
cinco integrantes: Hermano Pompílio de Castro, mais conhecido como Seu Duquinha, que
é sanfoneiro e cavaquista e um dos mais antigos do grupo, com quase cinquenta anos
'puxando o fole' na brincadeira do boi; João Batista de Castro, coordenador e brincante do
boi, interpretando o personagem 'véia'; Antônio Carlos da Silva, que brinca como o
'caboclo'; Antônio José Alves, o 'Mateus'; que já soma mais de três décadas no grupo; e a
Sra. Raimunda do Nazaré, septuagenária que toca zabumba no grupo e é irmã do seu
Duquinha e mãe de João Batista e Antônio Carlos.
Segundo o relato dos brincantes, o grupo foi fundado ainda na década de 1960, com o
nome Boi Estrela. Conhecido pela ortodoxia na execução da brincadeira, o Brasileirinho já
participou das sete edições do Festival de Reisados de Meruoca e dos tradicionais desfiles
dos caretas em Meruoca, além de apresentações também na sede de Massapê e em outras
comunidades próximas. O grupo é composto por agricultores, pedreiros e outros
profissionais de origem humilde, que encontram, na brincadeira, uma forma de diversão e
de manter viva sua cultura e memória.
Dentre as toadas cantadas pelo grupo, Bahia
destacamos:
E uma mulher bem bonita pra 'mim'
TOADAS DE ENTRADA beijar todo dia
Segunda eu plantei a cana e terça Eita, meu boi bonito, e eu vim te buscar
amanheceu nascendo Mandado do papau, garrote, eu vou te
Quarta amanheci cortando e quinta levar
amanheci moendo Eita meu boi bonito, e tu presta atenção
Sexta fiz a cachaça, sábado amanheci Eu tô mais esse povo, danado, mais o
bebendo capitão
Domingo foi a ressaca e segunda Eita meu boi bonito, que agora eu vou
amanheci comendo falar
Cachaça jeribita, feita do pau do torém Em terra que o s outros andam, garrote,
Bebe o rico, bebe o pobre, bebe quem tem que se respeitar
tem o seu vintém Eita meu boi bonito, e tu presta atenção
Até você que é liso, meu capitão, beba Tu se quebra decente, garrote, aqui para
também o povão
Eita meu boi bonito, pisa de lá pra cá
A TOADA DA CHEGADA DO BOI Num vamos fazer feio, garrote, tu tem
que me acompanhar
Têm três coisas nesse mundo
Eita meu boi bonito, tu é bem 'pintadin’
Se Deus me desse eu queria
Tu pisa a pisada certa, pro povo que 'tão'
Uma fazenda de gado, uma cada na
aqui

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MESTRE PIAUÍ - QUIXERAMOBIM
Antônio Batista da Silva é um simpaticíssimo quixeramobiense conhecido por Mestre Piauí.
Homenageado na Edição Ceará Natal de Luz de 2017, ao lado do saudoso Mestre Boca
MESTRE PIAUÍ

Rica, Piauí coleciona honrarias em sua galeria repleta de placas, títulos e adereços da
brincadeira do boi.
Reconhecido como Tesouro Vivo da Cultura pelo Governo do Estado do Ceará, o
Mestre propaga seus saberes por meio de encontros as quartas-feiras com 25 estudantes
da rede pública de ensino em Quixeramobim.
São quase setenta anos na labuta dos reisados. O Mestre nos conta que os tempos já
foram mais difíceis e que, pra manter a brincadeira, teve que fazer sacrifícios, mas hoje
existem uma serie de aparatos que tornam as coisas mais fáceis e acessíveis. Piauí já
participou de varias edições do encontro mestres do mundo, que acontece anualmente em
Limoeiro do Norte e em 2017, representou sua cidade na XII Bienal Internacional do Livro,
em Fortaleza, quando participou de mesa redonda sobre cultura e realizou uma
apresentação do seu grupo de reisados, o Boi Estrela, no auditório dos Mestres da Cultura –
Centro de Eventos do Ceará.
Dentre as toadas cantadas pelo grupo, destacamos:
A TOADA DOS SANTOS REIS Menino, vai ver quem é, menino vai ver quem é
A Deus e salve casa santa onde Deus fez a morada São os 'cantador' de reis, são os 'cantador' de reis
A Deus e salve casa santa onde Deus fez a morada Quem mandou foi São José, quem mandou foi
Onde mora o cálice bento e a hóstia consagrada São José
Nosso Senhor subiu aos céus domingo da
ressurreição 'Tirar' reis não é pecado, 'tirar' reis não é pecado
Nosso Senhor subiu aos céus domingo da São José também tirou, São José também tirou
ressurreição São José também chorou neste dia de alegria
Ele foi morto, crucificado, sexta-feira da paixão Mas depois de muitos anos, São José também
Ele foi morto, crucificado, sexta-feira da paixão chorou
Oh de casa, oh de fora, oh de casa, oh de fora
Menina, vai ver quem é, menina vai ver quem é Alguns dos filhos do Mestre Piauí
São os 'cantador' de reis, são os 'cantador' de reis participam do reisado e sua esposa, sempre
Quem mandou foi São José, quem mandou foi afável e atenciosa, o acompanha nas
São José jornadas. Foi uma experiência magnifica
São José também chorou, neste dia de alegria conversar e conhecer um pouco da vida do
Mas depois de muitos anos, São José também Mestre Piauí e de sua família.
chorou
De ver sofrer seu filho amado, pregado numa cruz
com tanta dor

Oh de casa, oh de fora, oh de casa, oh de fora

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MESTRE CHICO EMÍLIA
MESTRE CHICO EMÍLIA - CIPÓ DOS ANJOS - QUIXADÁ
Francisco Ferreira Neres, o famoso mestre Chico Emília, coordena o Boi Coração desde
1993, herança deixada pelo fundador do grupo, Sr. Francisco Domingos Firmino, o “Seu
Assis”, falecido em 2017. Chico Emília vive na localidade de Boa Água, a cerca de 20 km da
sede do município de Quixadá e nos recebe com calor e simpatia no seu aprazível alpendre.
“A origem do boi coração vem do Seu Assis, pois foi ele que defendeu esse nome, boi
coração. O nosso reisado de caretas representa o trabalhador, o agricultor, o vaqueiro,
essas coisas. Por exemplo, a burrinha. Todo mundo sabe que a burra antigamente foi o
maior meio de transporte, só quem possuía eram as pessoas ricas. Hoje trocaram pela hilux,
pela bros (motocicleta), essas coisas. E assim é com a ema, com o bode, a alma. O nosso
reisado é voltado pras coisas do sertão”, nos conta o Mestre Chico Emília.
Dentre as toadas cantadas pelo grupo, destacamos:

. Olha a chuva chovendo, a goteira


TOADA INICIAL pingando
Lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, Meu 'padrin' abra essa porta que eu tô
Lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, me molhando
Mas abre essa porta de nossa senhora,
Ô de casa, ô de forra, Mãe geronima é que nós mora longe,
quem tá aqui já pode ir sem demora
É o cravo, é a rosa, é a flor do bugari
Esta casa está bem feita, por dentro, Nosso agradecimento especial ao
por fora não colaborador do grupo, Ednêis Brito, por
Pro dentro é cravo de rosa, por fora ter nos apresentado e nos levado até o
manjericão grupo.
Santo Reis do Oriente só andam fora de
hora O Mestre Chico Emilia e o grupo é uma
Eles foram pra Belém visitar Nossa grande referência não só em Quixadá
Senhora mas em todo o Sertão Central, pela sua
O senhor dono da casa, eu não quero versatilidade musical, pela preservação
seu dinheiro dos modos de fazer reisado com os traços
Eu só quero é a licença pra brincar no tradicionais da brincadeira e pela sua
seu terreiro generosidade em ensinar a nova geração.
Senhora dona da casa, abra a porta,
acenda a luz
São os reis do Oriente, são do espírito
de Jesus

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BOI PÉ QUENTE
BOI PÉ QUENTE - SÃO VICENTE - MERUOCA
O grupo Pé Quente é formado por moradores das comunidades de Gameleira e São
Vicente, Meruoca. Os brincantes Adriano Taveira, Sr. Zé Sena e Edvan Rodrigues nos
recebem com bastante ímpeto, para conversarmos sobre a manifestação.
Sr. Zé Sena nos conta que a origem do grupo remonta ao ano de 1971, fundado por ele
próprio e um primo, conhecido como Lalá. O nome Pé Quente vem da expressão em si. Na
região, quem tem o “pé quente” é aquela pessoa que dança rápido, agitado e esta é uma
das características do grupo, a dança sempre frenética.
Destacamos o trabalho promissor de transmissão de saberes, pois os brincantes do
grupo Pé Quente, incentivam as crianças da comunidade a participar da brincadeira. Este
trabalho resultou na criação de um grupo infantil, cujas crianças estão, paulatinamente,
passando a integrar, também, o grupo adulto, numa intensa integração de gerações em
que os fazeres entram em salutar simbiose.
Dentre as toadas cantadas pelo grupo, destacamos:

TOADA DE ENTRADA 'Antôin' na proa.


“Oh senhor dono da casa, a 'Mãe Geroma' Chega 'dotô', chega 'dotô', chega 'dotô'
é quem tá a (Bis) pra receitar
E é o cravo e a rosa e a fulô do bugari. A receita desse boi”
Abre a porta se queres abrir, a noite é tão
bela pra nós divertir (Bis) “Cada personagem dá sua receita e continua
a toada”, nos relata Adriano, que enfatiza,
Depois da grande farra dos caretas, com as juntamente a Seu Zé Sena, que “O nosso
infinitas sátiras ao capitão (ou capitã, como é diferencial é que cada um de nós faz nosso
comum no grupo), vem a toada do “levanta improviso. Não é só um que canta o reisado,
boi”: cada um faz sua parte”, completa.
“Tu te alevanta boi, vamos vadiar (Bis)
Hoje nesse terreiro, garrote, vou o sol TOADA DO MACAQUINHO
raiar” (Bis) “E ele disse que gira, gira, gira, o
Seguido de: macaquinho, macaquinho da aurora, e ele
“Oh, te dou lelê, mas oh te dou lalá, o povo disse que gira, gira, o macaco chegou
ta querendo, garrote, é ver tu dançar agora”
E esse agito todo 'vêi' da Gameleira.(Bis)
Dança, dança, dança boi, levanta poeira” O grupo pé-quente costuma brincar durante
(Bis) o mês de janeiro, mas tem participado das
Na ressurreição, entoa-se: programações natalinas nos últimos anos. É
“Desce de rio abaixo, ô Lelê, desce uma comum também a montagem do grupo para
canoa. a festa dos caretas na semana santa.
Com São Francisco dentro, ô Lelê, e Santo

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CARETAS DE COURO
CARETAS DE COURO - MESTRE ANTÔNIO LUIZ - POTENGI
Um reisado bastante diferente. Visitado por personalidades como o pesquisador Oswald
Barroso e pelo governador do Ceará Camilo Santana, encontramos o reisado de caretas de
couro na comunidade de Sassaré, município de Potengi, sob a coordenação do Mestre Antônio
Luiz de Souza, reconhecido pela Secretaria da Cultura do Estado do Ceará como Tesouro Vivo
da Cultura
O reisado do Mestre Antônio Luiz começou ainda na década de 1930, com seu bisavô,
Benedito Sousa Lima, na comunidade de Lagoa do Sassaré, próximo a atual residência do
mestre.
São doze caretas, vestidos com camisas azuis e calças vermelhas e as emblemáticas
máscaras, feitas com pau de mulungu e camaru, com barbas, chapéu em forma de cone e
adereços típicos que caracterizam o grupo. Segundo Antônio Luiz, o reisado nasce quando as
pessoas em estado de enfermidade fazem promessas com os santos reis do oriente e se forem
atendidas, confeccionam as mascaras e adereços e todos os anos brincam em homenagem aos
santos que atenderam suas preces.
Casado com Raimunda Pereira dos Santos, conhecida como Rosa, o Mestre está prestes a
completar 61 anos e nos conta que nem sempre teve o reconhecimento de hoje. “Já fui
chamado de vagabundo, diziam que isso era coisa de quem não tinha o que fazer, já fui
perseguido até pela polícia, mesmo estando com a licença do reisado nas mãos. Mas hoje em
dia tá melhor”. É interessante o fato de que a entrada do grupo não é cantada, ficando o som a
cargo do violão, triângulo, pandeiro e das batidas de espada.
Dentre as peças cantadas pelo grupo, destacamos:
PEÇA DO BOI extirpa, extirpa, meu cavalo é
Meu boi bonito, ê bumba/Touro do gado, ê extirpador/Meu cavalo é bom de baixo,
bumba/Boi estrelinha, ê bumba/Fasta pra meu cavalo é bom baixeiro
t r á s , ê b u m b a / To u r o d o g a d o , ê
bumba/Faz meia lua, ê bumba/Faz lua Mestre Antônio deixa claro que as peças não
inteira, ê bumba/Ia passando numa rua, ê são 'cantadas', são 'chamadas'. “Não tenho
bumba/Uma dona me chamou, ê voz pra cantar, não”, ressalta, apesar de
bumba/Me venda esse boi, ê bumba/Eu discordarmos com veemência, já que
não vendo e nem dou, ê bumba/Te ouvimos suas peças. Um projeto do SESC
prepara, boi, ê bumba/Fasta pra trás, ê Juazeiro e da Fundação Casa Grande, de Nova
bumba/Chega pra frente, ê Olinda está transformando a casa do casal
bumba/Espalha os caretas, ê bumba/Meu num museu vivo, onde as pessoas poderão
boi lavado, ê bumba/Boi marabá, ê bumba ver fotos do reisado, objetos pessoais e o
A PEÇA DO CAVALO próprio modo de vida destas pessoas que
Meu cavalo anda, anda, meu cavalo é destacam-se pela humildade e satisfação
andador/Meu cavalo corre, corre, meu com a qual falam de sua vida e da
cavalo é corredor/Meu cavalo dança, manifestação.
dança, meu cavalo é dançador/Meu cavalo

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GERARDINHO CHICÓ
MESTRE GERARDINHO CHICÓ - MERUOCA
Gerardo Soares da Costa, o popular Gerardinho Chicó é um artista plural. Começou a
brincar no reisado de seu pai, o saudoso Francisco Soares, ainda na adolescência,
brincando como dama, galante e índio. “Eu cheguei a ser chefe de índio e acompanhei o
papai e meus irmãos tudo brincando, nessa época de sessenta (década de 1960) pra cá. O
papai era conhecido como o homem do reisado”, nos diz Gerardinho que canta na banda
Meruocanos do forró, além de atuar como compositor, artesão e poeta, sendo uma grande
referência artística em Meruoca.
o grupo de reisados do qual participava se dissipou há alguns anos e atualmente só
restam as lembranças dos bons tempos. “Quando chega janeiro o pessoal passa por mim e
diz: Gerardim, rapaz, quando eu te vejo só me lembro do reisado. Aí eu digo: rapaz, ta me
achado parecido com o boi? (risos)”. O brincante afirma que, por ele, voltaria a brincar, mas
as pessoas que compunham seu grupo acabaram se dispersando e as dificuldades seriam
imensas pra reunir todo mundo. Dentre as toadas que eram cantadas pelo grupo,
destacamos:

Mas chegou o mês de novembro/Deu Boa noite, seu Capitão, em suas faces
da primeira chuvada/Pra unir a eu aqui estou/Boa noite, seu Capitão e
vaqueirama/De junto à casa caiada todos que estão presentes/Nós viemos
Pra olhar o campo vasto e a rama já aqui mandados, dos santos reis (do)
esta fechada/Vaqueiro bandado és oriente/Capitão, peço licença/Licença
Deitado em cima da cama/Na porteira queira me dar/Hoje aqui no seu
do curral, perra toda bezerrama/O terreiro pros índios se apresentar/Hoje
gado urra no mato como quem aqui nesse terreiro pros índios se
primeiro chama/Tem quatro coisas no apresentar/Já estou no campo da luta
mundo que faz eu dobrar “camim”/Um com os meus quatro irmãos/Agora
rolo de cascavel e uma touceira de vem o exército que eu não me entrego
“espin”/Uma raposa parida e uma a prisão
“véia de biquin”/Vou terminar meu
repente, termino dizendo assim/Quem Gerardinho é um amante da cultura
tá cantando pra você, ele chama popular. Seja com seu forró pé-de-serra,
Gerardim/Ao meu lado tem o seja com suas lembranças dos tempos
Ta m p i n h a e t o d o m u n d o d i z áureos do boi ou mesmo com sua
assim/Raylane e Ernandes tá aqui em produção de itens artesanais, é difícil
nossa presença/E eu cantando pra pensar em cultura na Meruoca e não
vocês que tem muita paciência/Aqui lembrar do seu nome. Quem sabe ainda
em nossa Meruoca, nós somos de possamos ter o privilégio de ver o retorno
competência do grupo de reisados, tão almejado por
aqueles que tiveram a oportunidade de
A TOADA DOS INDIOS presenciar.

15
REISADO FOLIA DE REIS
REISADO FOLIA DE REIS - MESTRE ZÉDIMAR - SENADOR POMPEU
Encontramos o grupo Folia de Reis na comunidade São Joaquim de Cima, há 40 Km da sede
de Senador Pompeu. Com as atuais políticas de fomento do Governo do Estado do Ceará e
com o apoio de produtores culturais como Adriano Sousa, de Senador Pompeu, o reisado
tem despontado com mais ênfase na região, sendo um dos grupos de maior destaque do
município.
Coordenado por José Pedro do Nascimento, mais conhecido como Zédimar, o reisado é
composto por 17 pessoas, dos quais 12 são caretas e com um fator bem curioso: todos
dançam com longas e coloridas saias. Zédimar aprendeu os macetes do reisado com seu
pai, o Sr. João André do Nascimento, que ainda compõe o grupo mas, no dia de nossa visita,
estava em viagem para Fortaleza. O Sr. João André já herdou a tradição de seus avós, o que
nos faz concluir que o reisado remonta a, pelo menos, o início do século XX.
Dentre as toadas cantadas pelo grupo, destacamos:

TOADA DA EMA
O passo da ema, ‘penerô’ E seguem os improvisos com vários nomes
Tá no meu sertão, ‘penerô’ e lugares.
Ela pôs um ovo, ‘penerô’
Pro meu capitão, ‘penerô’ TOADA DO BOI
Oh ema, oh ema, oh ema, oh ema, oh Sapo cururu, marido da gia
‘sariema’ Todo sapo canta, maninha, todo cururu
gia
O passo da ema, tá nos inhamuns Sapo cururu, na beira do rio
Ela pôs um ovo, ‘penerô’ Ela fez as calças, maninha, não botou a
É do seu Raimundo braguilha
Oh ema, oh ema, oh ema, oh ema, oh
‘sariema’ Chega meu boi, ê bumba
Venha pra cá, , ê bumba
O passo da ema, tá em Fortaleza, Pra nós brincar, ê bumba
‘penerô’ Nesse terreiro, ê bumba
Ela pôs um ovo, ‘penerô’ Pro Capitão, ê bumba
É para a Tereza Quem tá falando, ê bumba
Oh ema, oh ema, oh ema, oh ema, oh É o caboclo, ê bumba
‘sariema’
Casado com Aurilene Rodrigues da Silva,
O passo da ema, tá no Quixadá, ‘penerô’ que sempre acompanha o reisado nas suas
Ela pôs um ovo, ‘penerô’ itinerâncias, Zédimar é pai de Aurileide da
E eu vou lhe dar Silva Nascimento (10 anos) e José Sidmar da
Oh ema, oh ema, oh ema, oh ema, oh Silva Nascimento (15 anos), que participam
‘sariema’ do grupo.

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REISADO DEDÉ DE LUNA
REISADO DEDÉ DE LUNA - MESTRA MAZÉ - CRATO
Quem conversou com a nossa equipe foi a Sra. Maria José de Luna, a Mestra Mazé, filha do
fundador do reisado, Sr. Francisco José de Luna que, em 1955, montou o grupo, na cidade
do Crato.
Maria José, quando da morte do pai, assume a função de Mestra, tarefa que vem
exercendo com maestria até os dias atuais. Mestra Mazé comanda uma agremiação de
cerca de 30 participantes.
Inicialmente, o grupo foi batizado de decolores. Porém, com o falecimento do Mestre
Dedé de Luna em 2002, as filhas renomearam o reisado em homenagem ao pai. O grupo de
reisados Dedé de Luna, destaca-se pelas vestimentas bem ornamentadas, coloridas e por
ser formado em sua maioria, por mulheres.
Com eloquentes apresentações na Região do Cariri e em eventos por todo o Estado,
como o Festejo Ceará Natal de Luz, as 'meninas do Dedé de Luna' sempre empolgam por
onde passam, com os sons sempre agitados que dificilmente não nos faz mexer o corpo.

Dentre as peças cantadas pelo grupo, destacamos

A PEÇA DE APRESENTAÇÃO entremeios


Apresentamos nosso grupo de reisados Sereia, boi e burrinha e também o
Com amor e entusiasmo que chegou Jaraguá
para dançar
É o reisado do Mestre Dedé de Luna Que fazem parte do folclore nordestino
É uma grande fortuna que ele plantou Todos são bem importantes na cultura
pra ficar popular
Pra encerrar os Mateus e a Catirina
Vamos lutar com amor no coração Também os tocadores para o reisado
Pra manter a tradição e não deixar animar
acabar
O contramestre, nosso rei e O reisado Dedé de Luna é uma das grandes
embaixadores referências de reisados do Estado do
São bem fortes lutadores para o grupo Ceará, pela suas peças, figurino e por ser
dominar um dos poucos grupos formados, em sua
Dois contra-guias, duas fases, figurino maioria, por mulheres, que mostram na
Todos dançam com carinho para o execução da brincadeira sua força e amor
grupo completar pelo fazer cultural.
Não esquecemos a nossa bela rainha
Uma figura importante para no reisado
dançar
Pra completar tem os nossos

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BOI LAGARTIXA
BOI LAGARTIXA - MESTRE NASCIMENTO - FORQUILHA
Na comunidade de Rasteira, município de Forquilha, encontramos o seu Raimundo
Rodrigues Ferreira, líder do Boi Lagartixa, tradicional grupo de reisados da região. Porém,
se perguntarmos por um Raimundo Rodrigues, dificilmente nos indicarão sua casa, melhor
perguntar pelo Mestre Nascimento. “Isso é por que eu nasci no ‘dia e nascimento’ “, nos
conta o sorridente mestre, referindo-se ao fato de ter nascido exatamente no dia de natal
(nascimento de Jesus Cristo).
Com 52 anos, brinca no reisado desde os 15, quando convenceu o pai, Sr. José Rodrigues
Ferreira, a leva-lo para ver o reisado na comunidade de Lagoa do Mato (distrito de Sobral).
Nascimento voltou encantado e não tardou a montar o próprio boi, originalmente batizado
de jacaré.
Notamos a importância dada ao personagem magarefe, que dança com os caretas, mas
que tem a atribuição de matar o boi. Este termo figura no dicionário brasileiro como
“indivíduo que abate e esfola as reses nos matadouros; açougueiro, carniceiro” e, no grupo
de reisados, é atribuído aos brincantes mais desenvoltos, cuja tarefa é matar o boi e puxar
toda sorte de improvisos.
O Boi lagartixa é composto por 06 (as vezes 08) brincantes da própria comunidade e,
além dos caretas, contam com a burrinha, o boi e o caçador. Mestre Nascimento deixa claro
que as toadas que utiliza, aprendeu com os antigos e não fez modificações.
Dentre as toadas cantadas pelo grupo, destacamos:

TOADA DA BURRINHA do tanto que eu quero a ela


Zabelinha foi no céu visitar nossa
senhora / Zabelinha deu o toque, Eu queria ser uma bride pra pousar na
Zabelhinha caiu fora nuca dela / Pra ela me querer bem do
tanto que eu quero a ela
Ê, relelê, relelê, relelê, como é de ser / No
tocado do triângulo, no gemido do Ê, relelê, relelê, relelê, como é de ser /
pandeiro No tocado do triângulo, no gemido do
pandeiro
Eu criei a minha burra no quintal do seu
‘Mané’ / O vento leva o capim e a burra Mestre Nascimento é pai de Bruna, Mônica
por que não quer e Geovane e, além de agricultor, presta
serviços a uma empresa da região. Um de
Ê, belelêco, belelêco, belelêco de macaco seus temores é que a brincadeira não
Toda burra velha, preta, tem catinga no continue quando ele não mais puder estar
sovaco na lida do reisado. “O pessoal novo se
interessa pouco pelos reisados, eu queria
Eu queria ser uma sela pra dar no que a meninada pegasse o jeito e não
espinhaço dela / Pra ela me querer bem deixasse a tradição morrer”, finaliza.

18
REISADO DO ESCUTA
REISADO DO ESCUTA - FORTALEZA
O reisado do ESCUTA, sigla para Espaço Cultural Frei Tito de Alencar é bastante peculiar na
sua execução. Isso, claro, em relação aos reisados que pesquisamos em outras regiões
cearenses. De 02 a 06 de janeiro, a partir da meia noite, um grupo de 15 a 20 pessoas,
coordenados pelo simpaticíssimo casal de mestres Leonardo Sampaio e Lúcia Vasconcelos
sai de casa em casa no bairro entoando cânticos em louvor aos Reis Magos e ao Menino
Jesus, enquanto arrecadam donativos, que são utilizados para manutenção do espaço
cultural.
“Hoje a gente não dá conta de passar em todas as casas, o bairro cresceu. Tem casa que
se a gente não passar, as pessoas depois vêm saber o motivo e trazem as doações mesmo
assim, mas sempre fazem questão de dizer: vocês não passaram lá em casa!”, nos conta a
Sra. Lúcia, que ajudou a fundar o grupo em 1990.
O filho do casal, Leandson Sampaio, Mestre em Filosofia pela Universidade Federal do
Ceará, que participa do reisado nos relata a total abertura do grupo para influências
musicais contemporâneas. “A gente tenta fazer as coisas de uma forma que fique mais
atrativa para todos os públicos. A juventude se engaja no reisado e traz sua influência,
deixando os ritmos mais acelerados. Assim, a gente tem colocado Tim Maia, Milton
Nascimento, Ivan Lins e Rita Lee. Todo ano a gente procura acrescentar uma música que
esteja dentro do contexto do reisado, pra dar uma vida nova ao grupo, mas sempre com
zabumba, pandeirola, triângulo, pandeiro e agogô, os instrumentos típicos”
É válido ressaltar a predominância das mulheres no grupo, não obstante a presença de
homens, crianças e adolescentes. O Escuta mantém uma página na internet
(blogdoescuta.blogspot.com) e lá podemos acessar todos os seus projetos e história, já
que além do reisado, trabalha com o bumba-meu-boi, atividades de formação, arte-
educação, dentre outros projetos que contribuem para o desenvolvimento social da
comunidade.
Dentre os cânticos entoados pelo grupo nas madrugadas do inicio de janeiro, destacamos:

MEU REISADO (Domínio Público) Eu agradeço a santa esmola


Meu reisado quando sai à rua Que nos deu com alegria
Noite de lua mais parece um beija-flor Em nome de Jesus
Eu tenho valor, eu tenho memória De José e de Maria
Meu peito chora, meu coração sente a
dor Sediado no Bairro Henrique George, em
Fortaleza, o espaço cultural é local de
Meu senhor dono da casa múltiplas atividades de formação e fruição
Abra a porta e acenda a luz da arte e cultura, sendo de grande
Venha dar a santa esmola importância social para a comunidade. O
Em nome de Jesus Reisado do escuta já foi destaque em
diversas matérias de TV e Jornal impresso,
Vejo a luz se acender configurando-se como uma das mais
Vejo o chinelo arrastar singelas expressões da festa de reis da
E alguém que vai sair capital cearense.
Alguma coisa ele vai dar

19
PARTITURAS

Reiteramos que a origem precisa de muitas das canções, peças e/ou toadas (letra e/ou
música) pesquisadas não foi distinguida, de forma que algumas estão no domínio público,
mas outras são criações dos próprios mestres e/ou grupos pesquisados (segundo os
próprios) ou ainda de seus (suas) predecessores(as). Desta forma, deixamos claro que este
catálogo não está atribuindo a autoria a qualquer grupo, mestre ou mestra pesquisado(a),
mas apenas afirmando que determinada canção, peça ou toada (letra e/ou música) é
executada por aquele(a) mestre, mestra ou grupo.

20
Toada da Chegada do Boi
Cantada por Mestre Antônio Paz
Boi Coração de Aracatiaçu

Andante
Chamada, sem harmonia

Continua na próxima página

21
22
Toada de Entrada
Cantada por Mestre Chico Emília
Boi Coração de Quixadá

Moderato

Continua na próxima página

23
24
Toada dos Santos Reis
Cantada por Mestre Piauí
Boi Coração de Quixeramobim

Andante

Continua na próxima página

25
26
Toada do Boi
Cantada pelo grupo Pé Quente de Meruoca - São Vicente

Toada da Ressurreição do Boi


Cantada pelo grupo Pé Quente de Meruoca - São Vicente

Toada do Macaquinho
Cantada pelo grupo Pé Quente de Meruoca - São Vicente

27
Toada dos Indios
Cantada pelo grupo Boi Estrela da Serra de Meruoca

Continua na próxima página

28
29
Toada Inicial
Cantada pelo grupo Alto do Bom Jesus de Guaraciaba do Norte

Continua na próxima página

30
31
Toada do Laço
Cantada pelo grupo Boi Paz no Mundo de Sobral

Continua na próxima página

32
Peça do Boi
Cantada pelo Reisado de Caretas de Couro de Potengi

Continua na próxima página

33
34
Peça do Baixio Verde
Cantada pelo Mestre Aldenir do Crato

35
Apoio Cultural C A N TO S

E TOADAS
DO REISADO
PATRIMÔNIO MUSICAL DO CEARÁ

Camilo Sobreira de Santana


Governador do Estado do Ceará

Fabiano dos Santos Píúba


Secretário da Cultura do Estado do Ceará

Maria Suzete Nunes


Secretária Adjunta

EQUIPE TÉCNICA

Raylane Neres
Pesquisa e coordenação geral

Augusto Cesar dos Santos


Produção Executiva

Ernandes Bernardo
Cidades Pesquisadas Rozalvo Barbosa
Welton Nascimento
Ronaldo Roger
Fotografia
Meruoca Massapê
Sobral
Forquilha
Fortaleza
Renato Teles
Motorista
Guaraciaba
do Norte

Quixadá
Rozalvo Barbosa Tomaz
Quixeramobim
Diagramação, arte e tratamento das fotografias

Senador Pompeu Marcos Carvalho


Transcrição para partituras

Ernandes Bernardo
Juazeiro
Potengi do Norte Arte da logo do projeto
Crato
Augusto Cesar dos Santos
Criação e revisão de textos

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