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CONSTITUIÇÃO PSIQUICA DO SUJEITO

 Muito antes da criança nascer, segundo a Psicanálise, ela já está


referida no discurso dos seus pais. Ela já está demarcada, ou melhor,
demarcada pela fala, pelo desejo de um Outro materno que o nomeia,
que lhe dá um lugar. Um corpo é falado sem nem ao menos existir. A
criança já é objeto do desejo destes, ou seja, já está incluída numa
cadeia significante. E ao nascer ela encontra-se desprovida de todos os
atributos necessários para manter sua própria sobrevivência. Ela não
sabe quais são os objetos adequados para a satisfação de suas
necessidades e é aí que a mãe entra.
CONSTITUIÇÃO PSIQUICA DO SUJEITO

OUTRO
 Não se refere a uma pessoa física e sim a uma instância que dá conta
da dimensão simbólica. O Outro pode ser compreendido como
linguagem, equivale à cultura, ao conjunto de marcas que preexistem e
constituem a história de um sujeito. Já o “outro” diz respeito à relação
com o semelhante, designa o sujeito, o eu em sua singularidade.
 Num primeiro momento, é o Outro que dá permanência ao recém-
nascido diante de sua dispersão fisiológica e corporal. A função materna
será responsável por imprimir as reações da criança uma significação
afetiva. A criança vai constituir-se a partir desse Outro.
CONSTITUIÇÃO PSIQUICA DO SUJEITO

 O Eu, ou o Ego: é instancia que Freud (1923), na sua segunda teoria do


aparelho psíquico, distinguiu do id e do superego. Segundo Laplanche e
Pontalis (2004), do ponto de vista tópico, o Eu está numa relação de
dependência tanto para com as reivindicações do id, como para com os
imperativos do superego e exigências da realidade. Já do ponto de vista
dinâmico, o Eu representa, no conflito neurótico, o pólo decisivo da
personalidade. E por fim, do ponto de vista econômico, surge como um
fator de ligação dos processos psíquicos. A teoria psicanalítica tenta
explicar o Eu vendo nele um aparelho adaptativo, diferenciado a partir
do id em contato com a realidade exterior e definindo-o como produto
de identificações que levam à formação no seio da pessoa de um objeto
de amor investido pelo id.
 A imagem corporal do bebê amadurece aos poucos na medida em que
ele experimenta o toque, a exploração do espaço, a manipulação e
contato com objetos. Lacan (1958) enfatiza a grande importância do
"Estádio do Espelho", quando a criança vê sua imagem projetada no
espelho, olha por trás do mesmo. Até então, a imagem de seu corpo
encontra-se incompleta, fragmentada. A imagem do todo acontece
quando ela se vê no espelho. Ela passa então da imagem do corpo
fragmentado à compreensão da unidade de seu corpo como um todo
organizado
 Mas afinal, o que é o “Estádio do Espelho”? É uma expressão criada por
Jacques Lacan, em 1936, para designar um momento psíquico da
evolução humana. Corresponde à fase da formação da identidade, que
se dá entre os seis e os dezoito meses de idade, quando a criança
encontra e reconhece a sua imagem especular. Considera-se esta fase
como um primeiro esboço do que será o Eu do indivíduo. O espelho é
criador de múltiplas imagens, quase sempre ambíguas e reveladoras de
aspectos mais interessantes dos que os reproduzidos por uma imagem
dita fiel. A primeira intervenção de Lacan (1958) na Psicanálise foi situar
o Eu como instância do desconhecimento, de ilusão, de alienação, ou
melhor, como sede do narcisismo.
Em 1949, no texto intitulado "O estádio do espelho como formador da
função do eu tal como nos é revelada na experiência psicanalítica", Lacan
fala deste estádio como uma identificação. Considera-se esta fase como
um primeiro esboço do que será o Eu do indivíduo.
Portanto, a imagem refletida no espelho nada mais é do que a
identificação à mãe, ao que o olhar da mãe reflete a esse filho. O bebê
identifica-se ao que a mãe antecipa a ele, ao que a mãe lhe fala e ele toma
como seu. “Na verdade, acredita ser o que o espelho ou, digamo-lo logo, o
olhar da mãe reflete. Identifica-se com um fantasma; usando o termo
lacaniano, com um imaginário”. (BLEICHMAR e BLEICHMAR, 1992:144).
 O “Estádio do Espelho”, estruturante, é dividido em três tempos, são
eles, no primeiro tempo o sujeito está no Outro primordial, ou melhor,
ele é no outro. Há uma confusão entre o Eu e o Outro. Nesse momento,
a criança faz movimentos para tentar pegar a imagem que vê. Já no
segundo tempo, a criança começa a se ver como outro, começa a se
descobrir como unidade separada, mas ainda não diferenciada do outro.
Sustentado nos braços da mãe a criança passa a se reconhecer no
espelho. A criança passa a perceber que o que vê no espelho é uma
imagem, não um ser real
 E por fim, no terceiro tempo, a criança já se reconhece como diferente
do Outro e consegue construir a categoria “estranho”. A criança passa a
se reconhecer na imagem que vê no espelho. Aí, pode-se perceber o
júbilo da criança diante de sua imagem, acontece uma auto-admiração.
A criança fica na frente do espelho percebendo seus movimentos, seus
gestos, assim, estabelecendo uma relação com a imagem
 Nos seminários IV e V, Lacan (1957-1958) desenvolve o conceito -
significante Nome-do-Pai Este conceito se tornou fundamental e amplia
e eleva a função de pai no Édipo freudiano à condição de metáfora
paterna. A presença deste significante enquanto operador, segundo
Lacan (1958), diria respeito à possibilidade de simbolização do falo,
retirando o sujeito do contexto imaginário e o inserindo na lógica fálica.
O significante Nome-do-pai é, podemos dizer assim, o que vem suceder
o desejo da mãe, ou melhor, ordenar o discurso na medida em que
circunscreve o campo do desejo e gozo.
 A criança, no período em que se conhece e se distingue da mãe,
descobre também um terceiro que desvia o olhar da mesma, que é a
figura paterna, o outro como diferente e que introduz a lei simbólica. A
criança nesta fase faz uso da linguagem, nomeia-se e nomeia os outros
e, sobretudo, adquire uma representação simbólica que lhe permite
suportar a ausência da mãe.
 A mãe, ou o cuidador é a pessoa por meio da qual a criança inicia seu
contato físico e emocional com o mundo. Trata-se de um sujeito que a
criança mantém uma relação importante, alicerce para todas as outras
relações que a mesma desenvolverá durante a sua vida.
 Mostra-se necessária a entrada de um terceiro nessa relação dual mãe-
bebê. Momento em que o pai passa a fazer função, que, segundo Freud
(1914) se constitui como de interdição. Assim, no momento em que a
mãe reconhece não saber tudo sobre o filho, a função paterna se
enuncia. A criança sai do lugar de desejo da mãe, de colagem objetal.
No início da vida psíquica o bebê está alienado ao desejo do Outro
materno, mas a saída dessa alienação também se dará pelo desejo do
Outro.
 Segundo Freud (1914), a função paterna é o elemento psíquico da
separação. Quando essa função opera ela faz com que ocorra uma
separação e essa separação é fundamental para a constituição de um
lugar subjetivo.
 A quem primeiro a mãe apresenta seu bebê? Ao pai. Este ato da mãe de
apresentar seu bebê a um outro, faz com que ocorra a operação da
função paterna. Desta maneira, a mãe não se mantém em uma
dualidade unificadora com o bebê, mas reconhece um outro que tem a
ver com esse bebê. Desta forma, ela introduz a presença de um
terceiro, o que significa que a mãe insere esse bebê no social e isso
ocorre de tal forma que esse ato da mãe, de por em operação a função
paterna, é decisivo na estruturação desse sujeito humano, ou melhor,
faz com que o nascimento desse sujeito humano não esteja deslocado
da própria constituição do social. O que significa a introdução de um
terceiro? Significa que se há um terceiro em jogo, já se está no social.
(FLEIG, 1993).
 Ao falar de metáfora paterna e significante Nome-do-Pai, Lacan (1958) se
refere ao lugar que é dado pela mãe à autoridade paterna. Vale ressaltar
que a função paterna visa encarnar a lei no desejo materno. A função
materna é essencial para a organização psíquica do infante e sua
constituição como sujeito. Pode-se dizer que é a partir da organização
psicológica desenvolvida do relacionamento com a mãe, ou com quem a
cuida, que a criança conquista a capacidade de se relacionar com o resto
do mundo.
 É necessária uma articulação entre a função materna e a função paterna
na relação que se estabelece com o bebê. A vertente paterna introduz
um limite ao gozo materno, e com isso o bebê deixa de ser um pedaço
da mãe, garantindo o espaço para que possa desenvolver o seu
psiquismo.
 Já a função paterna, por sua vez, representa a oportunidade que o bebê
tem de conhecer novas relações, novos elementos do mundo. Se ao pai,
ou a quem representa essa função, cabe garantir uma presença
amorosa que dê sustentação para que a mãe cuide de seu filho, é ele
também que, simbolicamente, vai tirando-o do colo materno e lhe
apresentando possibilidades de crescimento, podendo aliviar assim, as
ansiedades decorrentes disso. A função paterna tem como tarefa servir
de ponte para a apresentação e a aceitação da realidade à criança. O
pai, portanto, é a lei, o limite, a realidade.
 A função paterna instaurada torna-se representante e significante da lei.
A mãe apresenta o pai e apresenta-se como não sabendo mais tudo
sobre seu filho. Filho que, segundo Jerusalinsky (1999), enquanto sujeito,
apresenta-se como obra, efeito de uma linguagem, de uma antecipação
no discurso dos pais.
 A entrada do pai, como portador da lei, é essencial para o desenrolar do
Complexo de Édipo. E o que é o Complexo de Édipo? Segundo Freud
(1910), esse complexo é vivido entre os três e os cinco anos, durante a
fase fálica e seu declínio marca a entrada o período de latência. É um
conjunto organizado de desejos amorosos e hostis que a criança sente
em relação aos pais. Em outras palavras, é o amor pelo progenitor do
sexo oposto e o ódio pelo progenitor do mesmo sexo.
 Segundo Laplanche e Pontalis (2004), a fase fálica é uma fase de
organização infantil da libido que vem depois das fases oral e anal. Se
caracteriza por uma unificação das pulsões parciais sob o primado dos
órgãos genitais
 O Período de Latência, segundo Freud (1905), marca uma pausa na
evolução da sexualidade, ou seja, as energias serão voltadas à outros
fins, como brincar, estudar e etc. Esse período vai do declínio da
sexualidade infantil, que ocorre aos cinco ou seis anos de idade,
depende a criança, até o início da puberdade.
 O Complexo de Édipo, cuja organização se instala desde os três anos
com a convicção do seu sexo e se resolve (o mais cedo possível por
volta dos seis anos) com a resolução e o desligamento do prazer
incestuoso, é a encruzilhada das energias da infância, a partir da qual se
organizam as avenidas da comunicação criadora e da sua fecundidade
assumível em sociedade. (DOLTO, 1981:19).
 Lacan (1958) fala em três tempo do Complexo do Édipo, são eles: no
primeiro tempo a criança vive uma fase de indistinção com a mãe,
buscando satisfazer o desejo desta, identificando-se com o seu objeto de
desejo, que é o falo. A criança, então, é o falo da mãe, ou melhor, é o objeto
de amor da mãe e leva prazer à ela.
 O segundo tempo acontece quando a criança passa a se questionar sobre
ser ou não ser o falo da mãe. Esse tempo é marcado pela intervenção
paterna, desalojando a criança da posição ideal do falo materno. A criança
tem que renunciar a ser o objeto de desejo da mãe, que é uma condição
indispensável para a sua estruturação enquanto sujeito desejante.
 E então, por fim, vem a terceira etapa, que é o declínio complexo de Édipo.
O pai apresenta-se como potência, como aquele que pode dar o que a mãe
deseja. Esse período é marcado pela identificação
 Resumindo, então, Jerusalinsky (2002), afirma que para um bebê se
constituir como sujeito, é preciso que o agente materno sustente quatro
eixos, são eles: primeiro a suposição de um sujeito, que se refere à
ilusão antecipatória onde a mãe se permite escutar e olhar para além da
realidade do que está ali; em seguida vem o estabelecimento da
demanda que fala do reconhecimento da mãe às primeiras reações do
bebê, como mensagens a ela dirigidas. Diante disso, a mãe se coloca no
lugar de interpretar essas reações, dando a elas um sentido e, dessa
forma, serão respondidas.
 Depois, então, a alternância entre presença e ausência que diz respeito
à possibilidade da mãe de não responder a todos os pedidos do bebê. Se
espera que nessa relação não haja apenas presença e ausência e sim
uma alternância. E, por fim, a alteridade que tem a ver com a função
paterna. Mas para essa função acontecer é preciso que a função
materna esteja referida a um terceiro, sustentando a sua entrada. Com
isso, o bebê renuncia ao lugar de objeto de desejo da mãe, tornando-se
um sujeito desejante.
 A constituição psíquica de um sujeito se delineia através dos períodos
do desenvolvimento acima destacados. A imagem corporal se constrói
através do contato com o mundo. É o Outro que configura a imagem do
corpo de um sujeito. A criança, portanto, vai construindo, aos poucos,
sua imagem e seu esquema corporal. Nessa construção progressiva o Eu
vai se constituir.

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