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A Pessoa no DIP

Sujeito de DIP. TPI.


Imunidades diplomáticas.
A pessoa no Direito Internacional Público
Como já visto, o indivíduo também é sujeito de DIP, ao lado
dos Estados, das organizações internacionais, das ONGs e das
empresas. Mas tal situação é mais própria da atualidade.

ANTES
- Entendia-se que a sociedade internacional era só interestatal.
- Apenas os Estados eram sujeitos de DIP, pois somente a eles
cabia a produção de normas internacionais.
- A pessoa natural era mero objeto das normas internacionais.
ATUALMENTE
- Tal noção muda a partir de tribunais ad hoc, como o de
Nuremberg (criado pelo Acordo de Londres, 1945), e os da
Iugoslávia e de Ruanda (criados pela ONU, em 1993 e 1994).
"Crimes contra o Direito Internacional são cometidos por indivíduos, não
por entidades abstratas, e os preceitos de Direito Internacional fazem-se
efetivos apenas com a condenação destes indivíduos” (T. Nuremberg)
 Indivíduo como polo passivo do DIP.

- De outro lado, há a criação da ONU e OEA, com seus órgãos


internos de reclamações individuais.
 Indivíduo como polo ativo do DIP.
Mas ainda há (poucos) autores que negam aos indivíduos o status de
sujeitos do DIP, como Rezek, já que eles "não se envolvem na produção do
acervo normativo internacional, nem guardam qualquer relação direta e
imediata com esse corpo de normas". (REZEK apud MAZZUOLI, 2015, p.471)
- Confusão entre capacidade e personalidade jurídicas.

A capacidade de exercício (mesmo a internacional) é verificada


quando o indivíduo está apto a concretizar atos jurídicos.
- No DIP, a dos Estados é máxima e dos indivíduos é mínima.
Inclusive, porque estes não podem celebrar tratados.
A personalidade (mesmo a internacional) é presente naqueles que
podem ser sujeitos de direitos e deveres.
- Mesmo os incapazes no exercício dos DH (ex: crianças e deficientes
psíquicos, por exemplo) têm direito à satisfação jurídica.
O TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL E OS INDIVÍDUOS
- Criado pelo Estatuto de Roma, de 1998, que entrou em vigor em
2002, após o depósito de ratificação do 60º Estado junto à ONU
(no Brasil, Decreto 4.388/2002).
- Porém, NÃO está vinculado à qualquer organização internacional.
- Composto por 18 juízes, é instalado em Haia (Holanda), em 2003.
- Atualmente, 123 Estados aceitaram a competência do TPI.
- China, EUA, Israel e Rússia, dentre outros, não são membros.

Art. 25. Estatuto de Roma do TPI: "1. De acordo com o presente Estatuto, o
Tribunal será competente para julgar as pessoas físicas. 2. Quem cometer um
crime da competência do Tribunal será considerado individualmente
responsável e poderá ser punido de acordo com o presente Estatuto".
- Os indivíduos (desde que maiores de 18 anos à data do crime)
passam a ser punidos como tais, ou seja, como pessoas mesmo, e
não em nome do Estado ao qual pertencem.
Art. 103. 1. a) As penas privativas de liberdade serão cumpridas num Estado
indicado pelo Tribunal a partir de uma lista de Estados que lhe tenham
manifestado a sua disponibilidade para receber pessoas condenadas.
- Mas, segundo o Estatuto, a competência do TPI é “complementar
às jurisdições penais nacionais” (art. 1º).
Melhor seria definir a competência do TPI como SUBSIDIÁRIA, pois ele
“só intervirá (ultima ratio) quando o direito interno (na esfera criminal)
não o fizer, segundo os critérios definidos pelo próprio Estatuto (art. 17),
ou seja, se os Estados se mostrarem incapazes ou não demonstrarem
efetiva vontade de punir os seus criminosos” (MAZZUOLI, p.1050).

- E quais os crimes de responsabilidade do TPI?


Consumação, tentativa, solicitação ou instigação de algum dos crimes do Art.
5º, assim conceituados nos dispositivos subsequentes:
a) Genocídio: práticas criminosas (homicídio, ofensa à integridade física ou
mental, sujeição a condições desumanas, impedimento de novos
nascimentos ou transferência ilegal de crianças) contra grupos de pessoas,
em função de características nacionais, étnicas, raciais ou religiosas.
b) Crimes contra a humanidade: ataques sistemáticos ou generalizados
contra comunidades, resultando em homicídio, extermínio, escravidão,
transferência forçada de território, tortura, agressão sexual, desaparecimento
de pessoas, apartheid ou outra forma de atos desumanos semelhantes.
c) Crimes de guerra: conforme definidos na Convenção de Genebra de 1949,
nas leis e nos costumes aplicáveis aos conflitos armados internacionais (ex:
tortura, tomada de reféns, privação a julgamento justo e imparcial etc.).
d) Crimes de agressão: citados no Art. 5º do Estatuto de Roma, mas não
definidos na redação original.
Veja alguns casos concretos julgados pelo TPI
Antinomias aparentes entre TPI e CFBR/1988
1. Entrega de Brasileiros ao TPI.
Pergunta: Como os brasileiros são entregues ao TPI, pelo próprio
Brasil, sendo que a CF impede a extradição dos mesmos?
- Vide o seguinte dispositivo constitucional.
Art. 5º, LI - nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado,
em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de
comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e
drogas afins, na forma da lei;
- Lembrando que é direito individual e, portanto, cláusula pétrea
(art. 60, §4º, IV).
Afinal, a CF não se conflita com o Art. 89, §1º do Estatuto de Roma?
1. O Tribunal poderá dirigir um pedido de detenção e entrega de uma pessoa,
instruído com os documentos comprovativos referidos no artigo 91, a qualquer
Estado em cujo território essa pessoa se possa encontrar, e solicitar a
cooperação desse Estado na detenção e entrega da pessoa em causa. [...]

- Não. São institutos diferentes segundo Art. 102 do Estatuto de Roma:


a) Por "entrega", entende-se a entrega de uma pessoa por um Estado ao
Tribunal nos termos do presente Estatuto.
b) Por "extradição", entende-se entrega de pessoa por um Estado a outro Estado
conforme previsto em um tratado, em uma convenção ou no direito interno.

Veja que Extradição envolve 2 Estados soberanos, sendo ato de cooperação


entre ambos na repressão de crimes; diferentemente da Entrega, em que a
relação de cooperação se processa entre um Estado e o próprio TPI.
2. As penas de morte e de prisão perpétua.
Na Constituição, há os seguintes dispositivos:
CF, art. 5º, XLVII - não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada;
b) de caráter perpétuo;

Sobre esta última, determina o Estatuto de Roma:


Art. 77, 1. [...] o Tribunal pode impor à pessoa condenada por um dos
crimes previstos no artigo 5º do presente Estatuto uma das seguintes penas:
a) Pena de prisão por um número determinado de anos, até ao limite
máximo de 30 anos; ou
b) Pena de prisão perpétua, se o elevado grau de ilicitude do fato e as
condições pessoais do condenado o justificarem.

* O TPI, portanto, não admite penas de morte.


Sobre a PENA DE MORTE:
Em mais de uma vez, especialmente pré-85, o STF autorizou ex-
tradição para Estados que tem pena de morte, com a condição de
que houvesse a comutação desta pela de prisão perpétua (posição
que terá que ser revista).

Sobre a PRISÃO PERPÉTUA:


- Até 1985, o STF exigia comutação da prisão perpétua (do país
requerente) pela pena privativa de liberdade não superior a 30 anos
(pena máxima do Código Penal brasileiro) .
- Porém, no processo de Extradição nº 426, julgado em 04/09/1985
(caso Russel Weisse), o STF mudou seu entendimento anterior.
* a CF/69 tratava do assunto da mesma forma que a CF/88 e, portanto,
o entendimento se manteve válido mesmo com a nova CF.
Pelo entendimento do ministro Rezek, no referido caso:
“o rol de garantias da CF/88 dispõe padrão processual no que se
refere a este país, no âmbito da jurisdição desta República. A lei
extradicional brasileira, em absoluto, não faz outra restrição salvo
aquela que tange à pena de morte.”

Mazzuoli (2015, p.1070) completa:


a medida encontra sua justificativa na Lei nº 6.815/80 (Estatuto do
Estrangeiro), pois ela não restringe, em nenhuma hipótese, a
extradição em função da pena prisão perpétua. Portanto, no Brasil,
ainda que internamente não se admita a pena de prisão perpétua,
isso não constitui restrição para efeitos de extradição.
Porém, pergunta-se: o Estatuto do Estrangeiro continua vigente?
NÃO!! Revogado pela Lei 13.445/17 (Lei da Imigração), que dispõe:
Art. 96. Não será efetivada a entrega do extraditando sem que o
Estado requerente assuma o compromisso de: [...]
III - comutar a pena corporal, perpétua ou de morte em pena
privativa de liberdade, respeitado o limite máximo de
cumprimento de 30 (trinta) anos.

Ou seja, no que se refere à extradição, a posição brasileira volta para antes de


1985. Tanto para a pena de morte, como para a perpétua e a corporal!
- E, ainda que não seja própria da entrega (ao TPI), o novo entendimento pode
influenciar eventual reserva no Estatuto de Roma no sentido de somente
possibilitar entregas caso comutada a prisão perpétua para 30 anos.
IMUNIDADES DIPLOMÁTICAS
Desde sempre procurou-se conceder a emissários e representantes de
governos certo nível de proteção, especialmente durante conflitos.
Há, em especial, 2 Convenções sobre o tema: a) de Viena sobre Relações
Diplomáticas (1961); b) de Viena sobre Relações Consulares (1963).
- Promulgadas, no Brasil, pelos Decreto 56.435/65; e Decreto 61.078/67.
- No Brasil, o corpo diplomático compreende: ministros, conselheiros,
secretários e embaixadores, todos brasileiros natos (art. 12, §3º, V CF),
conforme estrutura do Ministério das Relações Exteriores.
- Compete ao Senado aprovar a escolha de chefes de missão diplomática de
caráter permanente (embaixadas e consulados*), segundo Art. 52, X.
- Embaixada trata da relação entre Estados; Consulados entre Estado e povo.
- Concretizável quando presente o princípio da reciprocidade.
A Convenção de Viena de 61 divide as imunidades em duas: as
relativas à missão diplomática; e as relativas aos agentes diplomáticos.

a) Prerrogativas e imunidades da missão.


Locais da missão (embaixada e consulados) são invioláveis, não
podendo as autoridades do Estado acreditado neles penetrar sem o
consentimento do Chefe da Missão do acreditante (Art. 22, §1º).
Também são invioláveis documentos da missão e até correspondências.
Obs.: tal inviolabilidade é atributo do Estado acreditante e não uma
consequência da inviolabilidade do Chefe da Missão.
Ex.: Julian Assange na embaixada do Equador, em Londres.
- Responde pelos agentes dos locais da missão: o Estado acreditante;
- Responde pela proteção de tais locais contra intrusão, dano,
perturbações ou ofensas: o Estado acreditado.
b) Privilégios e imunidades dos agentes diplomáticos.
São concedidos sem verificar até que ponto os atos por eles praticados
encontram-se ou não dentro do âmbito do exercício de suas funções.
São 3 os tipos de garantias dos agentes:

b.1) Inviolabilidade pessoal e domiciliar.


- Não podem ser presos, detidos ou perseguidos, estando a salvo de
qualquer ato de polícia contra a sua pessoa.
- Inviolabilidade alcança chefes de Estado, chefes de governo, ministros
de relações exteriores, família e quem os acompanha (art.37).
- O lugar onde vive o agente diplomático (até mesmo um quarto de
hotel) também é inviolável, tal qual os locais de missão.
- Permite-se a ele, inclusive, asilar perseguidos políticos no lugar.
b.2) Imunidade jurisdicional (penal e civil).
- Imunidade penal é absoluta, para qualquer delito. ...mesmo?
- Em verdade, refere-se aos crimes tipificados pelo direito interno do
Estado acreditado, pois o agente responde pelos tipificados no
Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, de 1998.

- Mas o Estado acreditado pode declarar o agente persona non grata.


 E pode fazê-lo a qualquer momento, sem ser obrigado a justificar
a sua decisão, devendo apenas retirá-lo do território (art. 9, §1º).
- Ademais, a imunidade não isenta o agente de processo no Estado
acreditante, de origem (art. 31, §4º).
- Por último, o próprio Estado acreditante, de origem do diplomata,
pode renunciar à imunidade deste, segundo o art. 32 da Convenção
de Viena de 1961 (a seguir).
Artigo 32 da Convenção de Viena de 1961:
1. O Estado acreditante pode renunciar à imunidade de jurisdição
dos seus agentes diplomáticos e das pessoas que gozam de
imunidade nos termos do artigo 37.
2. A renúncia será sempre expressa.
3. Se um agente diplomático ou uma pessoa que goza de imunidade
de jurisdição nos termos do artigo 37 inicia uma ação judicial, não
lhe será permitido invocar a imunidade de jurisdição no tocante a
uma reconvenção ligada à ação principal.
4. A renúncia à imunidade de jurisdição no tocante às ações civis ou
administrativas não implica renúncia à imunidade quanto as medidas
de execução da sentença, para as quais nova renúncia é necessária.
b.3) Isenção fiscal.
O agente diplomático gozará de isenção de todos os impostos e
taxas, pessoais ou reais, nacionais, regionais ou municipais, com as
várias exceções do art. 34 da Convenção.

PERGUNTA: As imunidades ainda valem ao diplomata, caso ele tenha


dupla cidadania, tanto do Estado acredito como do acreditante?
Art. 37,§1º. A não ser que o Estado acreditado conceda outros
privilégios e imunidades, o agente diplomático que seja nacional do
referido Estado ou nele tenha residência permanente gozará da
imunidade de jurisdição e de inviolabilidade apenas quanto aos atos
oficiais praticados no desempenho de suas funções.
* Os cônsules, com funções menos importantes que os diplomatas, também têm
imunidade apenas quanto aos atos oficias.
E qual o juízo competente, no Brasil, para julgar o agente
diplomático brasileiro responsável pelo cometimento de crime no
Estado acreditado?
A Constituição brasileira de 1988 é expressa apenas em relação aos
"chefes de missão diplomática de caráter permanente“
[embaixadores], ao dizer que os mesmos serão processados e
julgados originariamente pelo STF (CF art. 102, I, c).

A Constituição nada disse, porém, sobre os demais membros da


missão diplomática (v.g., um terceiro secretário etc.). Qual seria,
nesse caso, o juízo brasileiro competente para processá-los e julgá-
los? Havendo interesse da União, cabe à Justiça Federal processar e
julgar o diplomata (CF, art. 109, inc. IV)

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