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Planeamento do Aproveitamento

dos Recursos Hidricos

Jaime Timba
A metodologia tradicional de planeamento

O planeamento de recursos hídricos constitui uma das actividades mais


importantes para assegurar uma gestão sustentável da água. Neste
sentido, considera-se de interesse fazer uma abordagem mais profunda ao
conceito de planeamento, explicitando a natureza do conceito, bem como
as diferentes abordagens e práticas de planeamento, nomeadamente para o
caso de Moçambique

Jaime Timba
O conceito de Planeamento
Sendo uma actividade corrente na vida do Homem, o acto de planear
pode igualmente ser entendido como “a mais sofisticada e delicada
actividade da Sociedade Humana organizada”

Estabelecendo uma relação entre os conceitos de “plano” e

“planeamento”, pode começar-se por descrever um plano como sendo


“essencialmente uma definição de orientações estratégicas, cuja
concretização tem necessariamente de se adaptar a realidades cada
vez mais imprevisíveis, mas que permite aproximarmo-nos do
cumprimento de determinados objectivos pré-estabelecidos

Uma visão estratégica do conceito de plano deve incluir uma


enumeração de acções que desde logo se prevejam como necessárias.
Jaime Timba
O conceito de Planeamento
Por seu lado, o “planeamento” pode ser entendido como uma
actividade continuada que nos aproxima desses objectivos pré-
definidos. Resumidamente, enquanto o plano se deve estabelecer
como um guia para a acção, o planeamento deve constituir a
actividade de rever e adaptar esse guia a novas realidades e ajustar os
objectivos definidos em função dos resultados entretanto obtidos.

No contexto mais específico, Cunha et al. 1980, considera ainda


que as acções de planeamento “visam estabelecer procedimentos
organizados com o objectivo de escolher a melhor alternativa para
optimizar a utilização dos recursos hídricos”.
Jaime Timba
O conceito de Planeamento
Mais concretamente, pretendese atingir com o planeamento
dos recursos hídricos, a necessária compatibilização das
políticas, programas e projectos de recursos hídricos que
assegurem a disponibilidade de água em quantidade, qualidade e
fiabilidade requeridas pelos diferentes sectores de actividades, em
horizontes temporais relativamente alargados e num quadro de
incerteza

Jaime Timba
O conceito de Planeamento
Actores e agentes de decisão
No caso do planeamento de recursos hídricos, em que são envolvidos
vários actores, que participam tanto na execução das várias actividades como na
formulação de estratégias e objectivos, a própria actividade de planeamento
torna-se mais complexa. De facto, a natureza transversal do recurso implica
que muitos agentes, a diversos níveis, participem no processo de
formulação das políticas da água e na sua execução prática. Por este motivo, a
actividade de planeamento não pode reflectir apenas uma posição exclusiva do
Estado, tendo de integrar e complementar vários pontos de vista que sejam
relevantes para estabelecer consensos em volta dos objectivos a atingir e dos
meios a utilizar. Salienta-se aqui uma característica conflitual latente entre os
interesses e objectivos dos actores intervenientes, nomeadamente:
Jaime Timba
O conceito de Planeamento
Actores e agentes de decisão
os diferentes utilizadores da água (como por exemplo: as autarquias ou
utilizadores privados, sejam eles colectivos ou individuais), ou defensores
de determinados usos e finalidades da água (como organizações ambientais),
bem como na partilha de riscos, decorrentes da imprevisibilidade de eventos
extremos associados à água.

Desta forma, a tomada em consideração dos diferentes actores que participam


nos processos de decisão tem de ser parte integrante de uma actividade de
planeamento eficaz e socialmente aceite.

Jaime Timba
O conceito de Planeamento

Jaime Timba
Planeamento
Processos de Planeamento
O processo de planeamento inicia-se num contexto de conhecimento muito
superficial dos sistemas, dos problemas e das opções.

O principal objectivo do planeamento de recursos hídricos pode ser enunciado


como: “garantir o fornecimento de água de qualidade adequada e
quantidade suficiente, de modo a possibilitar o desenvolvimento das várias
actividades dela dependentes, nos tempos e espaços que justifiquem o
investimento a realizar”

Após definido um quadro de objectivos, o processo do planeamento deverá


passar por uma avaliação de diferentes alternativas e pelo estabelecimento
de prioridades e calendarização de potenciais projectos, considerando as
oportunidades e limitações físicas e de gestão do sistema.
Planeamento
Processos de Planeamento
O processo do planeamento pode ser dividido em três etapas básicas:

• Identificação do problema, com a formulação clara de objectivos


(classificação das diferentes massas de água em função dos actuais ou
potenciais usos, fixação de objectivos de qualidade e de protecção para as
principais massas de água e ecossistemas aquáticos e ribeirinhos, elaboração
de projecções das necessidades de água a satisfazer no futuro, avaliação de
necessidades em matéria de caudais ecológicos, etc.), condições limite e
definição do sistema natural;

• Análise do sistema definido e avaliação de alternativas baseadas em


critérios prédefinidos;

• Selecção e implementação da estratégia “óptima”.


Planeamento
Processos de Planeamento
O processo do planeamento pode ser dividido em três etapas básicas:

• Identificação do problema, com a formulação clara de objectivos


(classificação das diferentes massas de água em função dos actuais ou
potenciais usos, fixação de objectivos de qualidade e de protecção para as
principais massas de água e ecossistemas aquáticos e ribeirinhos, elaboração
de projecções das necessidades de água a satisfazer no futuro, avaliação de
necessidades em matéria de caudais ecológicos, etc.), condições limite e
definição do sistema natural;

• Análise do sistema definido e avaliação de alternativas baseadas em


critérios prédefinidos;

• Selecção e implementação da estratégia “óptima”.


Planeamento
Planeamento
Tipologia dos planos

A imagem corrente de “plano de recursos hídricos” é a de um relatório


técnico que, mediante aprovação, se transforma em Lei, de vigência
limitada no tempo.

Considera-se importante explicar que existem, no entanto, diferentes


tipos de planos e, consequentemente, de tipologias de planeamento.
Neste contexto, Tovar, 1997, aponta diversos conceitos de
planeamento que correspondem a diferentes conteúdos, abordagens e
processos de desenvolvimento.
Planeamento
Classificação quanto ao objecto:

a. Planeamento mono-objectivo – incide sobre um único fim, como por


exemplo: abastecimento de água, irrigação, controlo de cheias, ou outro;

b. Planeamento de fins múltiplos – visa satisfazer em simultâneo diversos


fins préestabelecidos (geralmente do âmbito da engenharia), englobando

frequentemente diversos planos mono-objectivo;


Planeamento
Classificação quanto ao objecto:
c. Plano geral (“masterplan”) – é a formulação de um programa de
desenvolvimento faseado para exploração de oportunidades de projectos de
recursos hídricos em determinada área durante um período de tempo específico.
Tem como principais componentes a análise dos recursos hídricos, análise
da procura, projecto do sistema e fundamentação sócio-económica e
financeira;

d. Planeamento integrado – abrange múltiplas funções, fins múltiplos e


objectivos múltiplos (económicos, financeiros, políticos, sociais e
ambientais) e considera conjuntamente medidas estruturais (construções e
equipamentos) e não estruturais (institucionais);
Planeamento
Classificação quanto ao objecto:
c. Plano geral (“masterplan”) – é a formulação de um programa de
desenvolvimento faseado para exploração de oportunidades de projectos de
recursos hídricos em determinada área durante um período de tempo específico.
Tem como principais componentes a análise dos recursos hídricos, análise
da procura, projecto do sistema e fundamentação sócio-económica e
financeira;

d. Planeamento integrado – abrange múltiplas funções, fins múltiplos e


objectivos múltiplos (económicos, financeiros, políticos, sociais e
ambientais) e considera conjuntamente medidas estruturais (construções e
equipamentos) e não estruturais (institucionais);
Planeamento
Classificação quanto à extensão geográfica:

a. Planeamento nacional – um plano nacional de recursos hídricos é feito


para determinar as prioridades nacionais de afectação dos recursos hídricos com
vista ao cumprimento dos objectivos nacionais. Nesta perspectiva, considera-se
que o Plano Nacional da Água é um plano integrado;

b. Planeamento regional – é um exercício similar a nível regional;

c. Planeamento de bacia hidrográfica – utiliza as fronteiras da bacia


como limites espaciais do planeamento, devendo ser um plano integrado
Planeamento

Classificação quanto à abordagem e processo de desenvolvimento:

a. Planeamento linear – as quatro principais componentes do “plano geral”


seguem se e são completadas uma de cada vez, sequencialmente;

b. Planeamento cíclico – esta mesma sequência de actividades é repetida


várias vezes com crescente detalhe e precisão.
Planeamento
Classificação quanto ao desenvolvimento e vigência temporal:

a. Planeamento de curto prazo – considera um horizonte de quatro a cinco


anos, ou inferior. Tem a vantagem de reduzir a incerteza na projecção
dos cenários, a probabilidade de mudanças conjunturais “imprevistas” e de
mudanças estruturais durante a vigência do plano. A desvantagem é a perda
de perspectiva, a limitação do âmbito dos objectivos a prosseguir e a
reduzida incidência na condução do desenvolvimento futuro;

b. Planeamento de longo prazo – para horizontes de dez a vinte cinco anos.


Tenta estabelecer perspectivas de longo termo para o desenvolvimento futuro de
uma nação, região ou bacia hidrográfica. Corrige as desvantagens do
planeamento de curto prazo, enquanto aumenta a incerteza e o imprevisto;
Planeamento
Classificação quanto ao desenvolvimento e vigência temporal:

Planeamento estratégico – tenta ser uma combinação dos dois anteriores,

concentrando-se no curto prazo, mas de maneira a manter aberta uma gama de

futuras opções tão vasta quanto possível. Neste sentido, o planeamento de curto

prazo tem tendência a assumir um papel predominante enquanto o planeamento

de longo prazo tende a ser reduzido a uma política, para a prossecução da qual o

planeamento de curto prazo tem de deixar aberta uma larga gama de


opções passíveis de condução aos objectivos últimos. Nesta óptica, um
plano que pressupõe a ocorrência de acontecimentos incertos mas que
exclui opções de desenvolvimento futuro não é estratégico, nem flexível, nem
robusto.
Planeamento
Necessidade de planos a longo prazo

É reconhecido que os horizontes de planeamento a longo prazo dos recursos


hídricos são correntemente mais amplos do que os do planeamento
económico-social . Neste sentido, a elaboração de planos a longo prazo,
abrangendo períodos de trinta a cinquenta anos, pretende perspectivar a
evolução da procura da água e definir a política de gestão de recursos hídricos
que permita ajustar as disponibilidades e a referida procura. Esse
ajustamento pode ser conseguido actuando sobre qualquer das componentes:
Planeamento
Necessidade de planos a longo prazo

Componentes:

• Aumentando as disponibilidades, por exemplo através do aumento da


regularização dos escoamentos superficiais, exploração de novos
aquíferos, transferência de água entre bacias, reutilização de águas usadas;

• Diminuindo a procura, por exemplo através de programas de conservação,


introdução de tecnologias secas menos poluidoras, aumento da eficiência
de sistemas de irrigação, localização de futuros grandes consumidores em
zonas com maior abundância de água.
Planeamento
Necessidade de planos a longo prazo

É essencial a existência de planos a longo prazo para o aproveitamento de


recursos hídricos, seja a nível regional, nacional ou de bacia hidrográfica.
Um forte argumento para comprovar esta necessidade, é o facto de as
estruturas hidráulicas necessárias para satisfazer a procura de água em termos de
quantidade e qualidade, envolverem grandes volumes de capital, levarem muito
tempo a estudar, a construir e a entrar em operação e terem uma longa vida útil,
reforçado ainda pela sua característica de irreversibilidade. A própria
Conferência da Água das Nações Unidas recomenda a formulação de planos
gerais à escala nacional e de bacias hidrográficas, de maneira a todos os

países poderem ter uma perspectiva de longo prazo para o planeamento de


acções a curto e médio prazo.

A elaboração d
Planeamento
Necessidade de planos a longo prazo

A elaboração de planos a longo prazo necessita de inventários dos


recursos hídricos considerados, tendo como base preferencialmente a bacia
hidrográfica. Neste contexto, torna-se necessário obter um conjunto de
elementos que permita fazer uma caracterização estocástica com base na
variabilidade natural do ciclo hidrológico e nas disponibilidades de água em
regime natural.
Planeamento
Necessidade de planos a longo prazo

Quintela, 1979, refere como elementos necessários para este inventário,


essencialmente observações :

Meteorológicas – precipitações, temperaturas, evaporação;

Hidrométricas – alturas e caudais de cursos de águas superficiais;

Cotas piezométricas em aquíferos;

Erosão, sedimentação e transporte sólido;

Qualidade da água;

outros elementos – características dos aquíferos (espessura, transmissividade,


zonas de recarga), cobertura vegetal
Planeamento
Necessidade de planos a longo prazo

Vaz, 1984, o inventário de uma bacia permite:

1. estabelecer aproximadamente um limite superior da disponibilidade de água


utilizável, na hipótese de não ocorrerem grandes mudanças tecnológicas,
considerando a máxima regulação possível;

2. conjugando informação hidrológica com informação sobre solos, clima,


demografia, economia e outra, estabelecer um “plano de regulação total”
ou “esquema geral”:
Planeamento
Necessidade de planos a longo prazo

O referido “esquema geral” partilha vários pontos com o plano a longo


prazo do aproveitamento de recursos hídricos. No entanto, o período
necessário para o completo aproveitamento do potencial de recursos
hídricos de uma bacia pode ultrapassar o período considerado no plano a
longo prazo, por exemplo, para bacias com áreas superiores a dez a vinte mil

quilómetros quadrados. Num caso destes, seriam considerados quatro “níveis


temporais”: esquema geral, planos a longo, médio e a curto prazo. A todos estes
níveis, Vaz, 1984, considera que: “o plano constitui o processo de ajustar as
disponibilidades de água, definidas no inventário, às necessidades de água,
resultantes dos planos de desenvolvimento económico e social.”. Este
ajustamento deverá ser feito a nível temporal e espacial de bacia hidrográfica,
regional e nacional.
Planeamento
Necessidade de planos a longo prazo

Cunha et al. 1980, sistematizaram um conjunto de acções para a elaboração


de um Plano Nacional de Recursos Hídricos da seguinte maneira:

1. definição dos objectivos a atingir e da política de gestão dos recursos


hídricos;

2. inventário das disponibilidades de água;

3. inventário das necessidades de água;

4. balanço de disponibilidades e necessidades;

5. identificação e selecção de projectos a executar;

6. formulação de programas a longo e médio prazo e definição de


programas de acção imediata e de medidas de carácter institucional para a
promover a gestão da água.
Muito obrigado

Jaime Timba

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