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Intervenção na Abordagem em solução de problemas

Profa Dra Margarita villar Luis


EERP - USP
Sumário

◦ Origem: fundamentos teóricos, derivações da teoria.

◦ Definições

◦ Características e focos da abordagem

◦ Modalidades: individual e grupal



◦ Etapas ou componentes na abordagem em solução de problemas: foco no
treinamento

◦ Exercício: caso de adolescente


Origem:

O treinamento em habilidades sociais é o fundamento geral para o que se denominou Terapia


de solução de problemas. Derivam dela as intervenções, Método de solução de problemas,
Treinamento em solução de problemas.

A proposta de uma intervenção clínica para ajudar os indivíduos na solução de seus problemas, tem
raízes em movimentos da psicologia dos anos 50 e 60, quando se defendeu a adoção de um
enfoque de competências sociais em psicopatologia. A ideia central que fundamentou tal proposta
era o modelo de doença percebido como um comportamento anormal, ou seja o comportamento
não adaptado do sujeito pode ser resultado de uma deficiência nas habilidades de solução de
problemas ( Nezu,1987). As duas abordagens clínicas buscam aumentar a competência da atuação
da pessoa frente a situações críticas da vida.

“Definição”: Uma tentativa direta e sistemática de ensinar às pessoas, estratégias e habilidades


interpessoais com o propósito de melhorar suas competências interpessoais e individuais para
enfrentar situações sociais específicas que ocorrem no decorrer da vida.
D’Zurilla & Goldfried (1971), seguindo esse fundamento teórico delinearam um modelo prescrito
para treinar as pessoas em habilidades de solução de problemas como uma estratégia para
facilitar suas competências sociais gerais, uma vez que esse enfoque integrava muitos
resultados positivos de investigações provenientes de diversas áreas de estudo que descreviam
o treinamento dentro de uma perspectiva psicológica comportamental.

O treinamento ou método de solução de problemas consiste num processo cognitivo explícito


que torna possível uma variedade de estratégias de respostas, potencialmente efetivas para o
enfrentamento de situações problema , que possibilitam ao sujeito escolher aquelas possíveis e
adequadas para reduzir as emoções negativas (D’ Zurilla& Golfried, 1971).

No processo os indivíduos são levados a compreenderem a natureza dos problemas da vida e


dirigir seus objetivos em direção à modificação do contexto problemático da situação ou de suas
próprias ações em relação à mesma ( Nezu& Nezu,1999)
A proposta foi adotada seguidamente, com modificações no nome ( por exemplo, terapia
focada na solução de problemas) e incorporaram conhecimentos utilizadas em outras áreas da
psicologia, abandonaram definições restritas de personalidade e psicopatologia
( comportamento não adaptado e doença como disfunção), essas modificações ou ampliações
de perspectivas avançaram a partir da década de 80 com Shazer, 1985 nos Estados Unidos e
na Espanha (Nezu & Nezu, 1999), e inclusive deu-se ênfase à aplicação grupal.

É uma forma de terapia breve, cuja chave central é a utilização dos recursos trazidos
pelo próprio cliente para responder às suas necessidades e atingir seus objetivos de
forma a alcançar uma vida satisfatória para si tão rápido quanto possível ( Rasera &
Martins, 2013)
Características e focos da abordagem:

A relação terapêutica é um esforço negociado, consensual e cooperativo em


que profissional e cliente, focados na solução, produzem juntos vários
intercâmbios (Trocas) de linguagem centrados em relatar exceções ( vezes em
que o problema acontecia menos ou não acontecia), estabelecem metas e
soluções.

Há a negociação e produção, enquanto o profissional e o cliente apresentam


suas colocações e interpretam juntos as situações e os sentimentos e
relacionamentos que se apresentavam ambíguos. Dessa forma, ambos
atribuem juntos os significados aos aspectos da vida do cliente e justificam as
ações que surgem com o objetivo de desenvolver uma solução, que pode não
ser a única ou a melhor, mas é a que se ajusta (adapta) ao problema trazido
pelo cliente naquele momento (Shazer,1991)
Mas qual é a compreensão que se tem de PROBLEMAS ?

Problemas são situações específicas da vida (presentes ou por acontecer, como a vinda de um filho, sequelas
de uma doença) que exigem respostas para a continuidade do funcionamento adaptado do indivíduo, mas que
frente a elas este é incapaz de oferecer uma resposta eficaz de enfrentamento, devido a obstáculos pessoais
( ser uma novidade, ambiguidade nas escolhas, incerteza, exigências contraditórias) ou ambientais ( falta de
recursos materiais, de suporte social).

Problemas, representam uma discrepância entre a realidade de uma situação e os objetivos desejados. Pode ser
um único acontecimento, uma série de acontecimentos relacionados ou uma situação crônica.

Problema é um tipo de relação pessoa-ambiente que altera o equilíbrio;há percepção de discrepância entre as
demandas e a disponibilidade de uma resposta adaptativa. O desequilíbrio instalado muda com o tempo, em
função das alterações do ambiente ( por exemplo, suporte social), da pessoa (fortalecimento psíquico,
compreensão), ou de ambos.
(Nezu & Nezu,1999).
Autores da década de noventa buscaram novas descrições para o que as pessoas podem denominar como
problemas, entendendo-os como:

“uma das muitas formas que as pessoas podem usar para dar significado ao que acontece
nas suas vidas” (Shazer,1988)”.

Re-descrever as realidades vivenciadas pelo sujeito é uma forma de apresentar ao cliente uma realidade mais
satisfatória, por exemplo ao invés de descrever o cliente como “vítima de abuso sexual”, mudar para
“sobrevivente de abuso sexual”, ou referir-se a comportamentos que são descritos como doença, tais como, os
“transtornos alimentares” e “uso e abuso de drogas”, descrevê-los como hábitos que temporariamente
incapacitam a pessoa.

A mudança na descrição tem objetivo de realçar as possibilidades positivas, os aspectos saudáveis da vida do
cliente ou mostrar de forma evidente a força ou o benefício que o problema também propicia. Quando se tem
uma percepção diferente da situação isso pode ser um recurso na criação de soluções (Shazer,1988).
A partir dos anos 90 as experiências em terapias e trabalhos com enfoque
grupal na solução de problemas, se desenvolveram com bastante sucesso e
incluíram diversas populações : grupos familiares e grupos de familiares
cuidadores, grupos de clientes com problemas de saúde mental ( depressão,
ansiedade), grupos de estudantes ( prevenção do uso de substâncias
psicoativas), grupos de universitários (ajustamento á vida universitária).

Na modalidade grupal é preferível que haja certa homogeneidade entre os


participantes em termos por exemplo, de alguma experiência em comum
(vivenciar uma situação problema similar) de maneira que possam se identificar
uns com os outros, mas que também mantenham algumas diferenças de forma
a que uns possam aprender com as vivências dos outros.
A abordagem em solução de problemas, com foco no treinamento, pode envolver um número de
etapas ou componentes:

1. A primeira etapa se propõe a estimular a motivação do cliente no processo de solução e vai incluir
depoimentos com as crenças, apreciações e expectativas relacionadas à situação problema e a
expressão individual das próprias habilidades para solucionar o problema.
O profissional deve expressar ao cliente a convicção de que as formas que ele têm adotado
(comportamentos atuais) para lidar com as situações são a maneiras que ele encontrou para
sobreviver.

Promover no cliente a autoconsciência em relação à situação problemática, no propósito de definir


e formular o seu problema ( perguntas como: descreva ou exponha, fale o que o está
incomodando , inquietando ?; alguma vez você já enfrentou essa situação? Já enfrentou alguma
situação parecida?)
2. A segunda etapa: Promover a geração de alternativas ( perguntas: se já enfrentou uma
situação parecida, como lidou com ela, de que forma você enfrentou a situação? Como
você se sentiu com essa forma de resolver? Você sentiu que foi uma solução boa ? Acha
que poderia ter lidado com a situação de forma diferente ? como? No caso atual, você
utilizaria essa forma de solução ou acha que nada seria aproveitável ? Como imagina que
poderia lidar com esta situação ? Qual seria na sua opinião a solução ideal?;

O foco é na conversa da solução, voltada para o presente e o futuro (perguntas: o


que gostaria que se mantivesse ou que continuasse a acontecer), não buscar
entender nem analisar o problema (os porquês? E como?), procurando “arranhar a
superfície”, trabalhar com o estabelecimento de metas para cada um dos
participantes, bem como para o grupo como um todo, quando for o caso. Ao fim de
cada encontro o profissional pode estimular o(s) cliente(s) a pensar, durante a
semana sobre aquilo que pode ajudar a mover-se em direção às metas desejadas.
3. Terceira etapa: Tomada de decisão; ( se houvesse um milagre, o que haveria de diferente nessa
situação? O que você gostaria que estivesse diferente? Como você imagina que pode abordar a
situação ? Você percebe alguma ou algumas dificuldades nesse enfrentamento? Você percebe que
tem fragilidades (insegurança) para decidir? Até onde acha que pode agir em direção à solução?
Você percebe algum reforço nas pessoas do seu meio para poder ajudá-la a dirigir-se a uma meta
que se proponha?

Esta etapa envolve a apreciação das habilidades requeridas pelo problema na sua solução, as
fortalezas e dificuldades no estabelecimento de metas e na adoção de novos comportamentos de
enfrentamento, que substituam os originais que segundo as exposições do cliente não tem ajudado
a aliviar o sofrimento ou outros desconfortos gerados pela situação problema.

O profissional em encontros anteriores: pode convidar o(os) cliente(s) a pensar a respeito do que
pode ajudá-lo(s) a se mover em direção à meta, incentivando-o(s) a ver que cada “pequeno
passo” em direção à solução é um experimento e não uma estratégia que garantirá o
sucesso. deve ser encorajado(s) a se mover gradualmente ( aos poucos) para as soluções e a
entender que pequenas mudanças podem resultar em alívio e qualidade de vida, que através das
pequenas mudanças, metas maiores podem ser alcançadas.
4. Quarta etapa: Avaliar o resultado da decisão.
No último encontro, propõe-se haver o feedback do cliente(s) para que o profissional avalie seu
próprio desempenho e no caso de ser um grupo, programar alguma celebração das mudanças
positivas, para valorizá-las e reforçar novas autodefinições.

O papel do profissional é o de facilitador, introduzindo as perguntas e buscando manter o


rumo da conversa em direção à resposta, no caso de grupo, ajudá-lo a manter a discussão em
torno das perguntas e quando intervir, a linguagem deve ser de pressuposição (“suponha
que...”). Deve centrar-se na solução do problema, na busca das exceções, de redescrever a
situação ( fazendo junto com os clientes novas descrições da situação problemática), ajudar a
pensar em estratégias de solução, valorizar os passos do cliente dados em direção á solução.

É importante o estímulo à continuidade das reuniões entre os participantes sem a presença


do profissional, em direção a tornar-se um grupo de auto ajuda. O profissional pode
elaborar um protocolo de avaliação para entregar ao grupo para avaliar a intervenção

Essas etapas incluem as reais habilidades requeridas para definir e resolver com efetividade os
problemas.
Caso

C.M. é uma adolescente de 15 anos de idade que anda meio cabisbaixa por sofrer discriminação na
escola, devido às colegas descobrirem que era virgem e várias “brincadeiras”, gozações, chacotas e
humilhações por ainda ser virgem foram feitas a adolescente.CM sofre com isso, diz não saber o que
fazer, pois refere que é muito comum os grupos de adolescentes se dividirem entre os que já tiveram
a primeira relação dos que ainda não tiveram, sendo que, os que já fizeram sexo se vangloriam muito
disso, e que a quantidade de relações é a prioridade, quanto mais relações sexuais o adolescente
tiver, mais ele é valorizado pelos colegas. Por vergonha, C.M. se afastou das colegas e até deixou de
assistir as aulas, por isso suas notas caíram, sente-se isolada e não sabe como lidar com o problema.
Não contou para a mãe para não criar confusão na escola o que a deixaria ainda mais exposta.
 
 
Pensando no método de solução de problemas, como vocês lidariam com essa cliente?

 
a. Imaginem a situação e coloquem-se no lugar da pessoa.

b. Como solicitariam a visão dela do problema ? Como colocariam a sua percepção do que no
seu ponto de vista, é o problema?

c. Considerando a percepção dela ela e a percepção de vocês a respeito do problema, como


fariam a negociação para chegar a definir o problema

d. Elaborem perguntas que poderiam levar a redefinir a situação e a gerar alternativas para lidar
com o problema.
e. Elaborem perguntas que ajudem a pessoa a tomar decisões em direção à solução do
problema.
Referências Bibliográficas

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Nezu, A. M.,& Nezu, C. M. Treinamento em solução de problemas. In Caballo. V .E. Manual de técnicas de
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