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MAYOMBE

PEPETELA
CONTEXTO HISTÓRICO

 Em 1482, chegam ao Congo os primeiros portugueses,


comandados por Diogo Cão (espaço dividido por questões
étnicas e políticas).
 Entre 1581 e 1671 Portugal dominou todo o território
angolano, com todos os seus diversos reinos independentes
(exploração de minérios e comercialização de escravos).
 Após a Segunda Guerra Mundial, entre 1945 e 1952,
propagou-se por todas as colônias africanas um sentimento de
independência.
CONTEXTO HISTÓRICO

 1953 - surgimento do primeiro partido político nacionalista


clandestino, o Partido da Luta Unida dos Africanos de Angola
(PLUA), que, em dezembro de 1956, tornar-se-ia o Movimento
Popular de Libertação de Angola, o MPLA, o primeiro partido
de massas.
 4 de fevereiro de 1961 - um grupo de cerca de 200 angolanos,
ligados ao MPLA ataca a Casa de Reclusão Militar, em
Luanda, a Cadeia da 7.ª Esquadra da polícia, a sede dos
Correios e a Emissora Nacional de Angola.
CONTEXTO HISTÓRICO

 15 de março de 1961 - distritos do Zaire, Uíje e Quanza-


Norte - a UPA (União das Populações de Angola),
fundada em 1954, organiza um massacre de populações
brancas e de trabalhadores negros oriundos de outras
regiões. Embora essa primeira ação tenha sido contida
pelos militares portugueses, a guerrilha se espalha para
outras regiões de Angola tendo como líderes a UPA (mais
tarde chamada de Frente Nacional de Libertação de
Angola – FNLA) e o MPLA, os quais, por uma série de
divergências não se uniam, dificultando o processo de
independência.
 1974 – Fim da Guerrilha pela libertação.
MAYOMBE

 https://youtu.be/SgSsuOBU7ZQ
ESTRUTURA E SÍNTESE

 Capítulo I – A Missão: Aborda a operação dos guerrilheiros


envolvendo os trabalhadores de Cabinda na exploração de
madeira e os portugueses.

 Capítulo II – A base: Apresentação da floresta do Mayombe


e da rotina da Base da Segunda Região. Apresenta
reflexões sobre a revolução, o amor e os relacionamentos
pessoais.
 
 Capítulo III – Ondina: Reflexão sobre relacionamentos
afetivos e o papel social da mulher.
 
ESTRUTURA E SÍNTESE

 Capítulo IV – A surucucu: Ação dos guerrilheiros de


Dolisie contra os portugueses que supostamente haviam
invadido a base. Esclarecimento de um mal-entendido
envolvendo Teoria, Vewê e uma surucucu. Reflexão sobre
o papel social da mulher.

 Capítulo V – A amoreira: Combate dos guerrilheiros


contra os portugueses acampados no Pau Caído e morte
de Sem Medo.
 
 Epílogo: Discurso do Comissário sobre sua transformação
e a importância de Sem Medo nesse processo.
DEDICATÓRIA

Aos guerrilheiros do Mayombe,


que ousaram desafiar os deuses
abrindo caminho na floresta obscura,
Vou contar a história de Ogun,
o Prometeu africano. (p.9)

 Eleva os guerrilheiros à condição de heróis épicos, capazes de desafiar forças


sobre-humanas.
 Remete ao multiculturalismo angolano.
 Valoriza a cultura africana por anos reprimida pelos colonialistas portugueses.
 Assim como, na mitologia ocidental, Prometeu corajosamente libertou os
homens, em Mayombe, a liberdade humana foi concedida por um deus africano,
Ogun (a que se equiparam os guerrilheiros).
MAPA DE ANGOLA
PERSONAGENS

 Comandante Sem Medo – Entrar na guerrilha em 1964. Estudou em Seminário, mas, por
perceber incoerências na Igreja, tornou-se ateu. Combateu com o Comandante Hoji-ya-Henda
(José Mendes de Carvalho), que morreu em combate aos 27 anos em 14 de abril de 1968. É
veterano de guerra, tem 35 anos e é muito sábio e observador.

 Teoria – Alto e magro, abandona a esposa para entrar na guerrilha a fim de provar seu valor e
conquistar seu espaço na sociedade angolana como mestiço. Por seus conhecimentos, é o
professor do grupo, dividindo-se entre as aulas e as patrulhas.
 
 Comissário Político – Alto e magro, abandona o Caxito, o pai camponês velho e arruinado pelo
roubo das terras de café para entrar na guerrilha. É o responsável pela educação política do
grupo de guerrilheiros. É dez anos mais novo que Sem Medo. Seu nome é João e, no decorrer
da narrativa, passa por experiências que o levarão a uma grande transformação.
 
 Chefe de Operações – Abandonou os Dembos para entrar na guerrilha. É o responsável pelas
ações militares da Seção e também passará por transformações na sua forma de pensar com o
decorrer da narrativa.
 
PERSONAGENS

 Muatiânvua – Filho de pai bailundo e mãe kimbundo. Marinheiro, abandonou a vida


no mar para ser guerrilheiro.  
 Milagre – Nascido em Quibaxe, região kimbundo, filho de camponês assassinado
brutalmente durante o massacre de 1961 e sem estudo, vai para a guerrilha a
chamado do tio. Não consegue esquecer as atrocidades cometidas contra seu povo
quando era criança e, por isso, tem em si fortemente enraizada a questão do
tribalismo.
  Mundo Novo – Nascido em Luanda, kimbundo, é um dos poucos do grupo de
guerrilheiros que não está afetado pelo tribalismo. É muito dogmático, segundo o
ponto de vista de Sem Medo. Substituirá André em Dolisie.
  Ekuikui – Ex-caçador que se junta ao MPLA.
  Ingratidão do Tuga – Combatente desde 1961, primeiro na região Norte, depois em
Cabinda, é julgado e condenado por ter roubado cem escudos de um trabalhador
em uma das ações do grupo.
  Pangu-A-Kitina – Enfermeiro dos guerrilheiros.

 
PERSONAGENS

Lutamos – Natural de Cabinda, é o guia e intérprete dos


guerrilheiros: ele conhece os caminhos do Mayombe e fala o
fiote. Morre em combate para salvar o Comissário.
André – Responsável que fica em Dolisie e simboliza o
burocrata ambicioso que, preocupado com o poder e seus
privilégios, atrapalha a revolução. É substituído após ter sido
flagrado em falta, mas não parece preocupar-se por conhecer
pessoas no Movimento que o ajudarão.
Ondina – Professora na escola do Movimento, em Dolisie. Tem
22 anos e é noiva do Comissário. Sexualmente muito mais
experiente do que ele, simboliza a mulher livre, incapaz de se
submeter a um homem.
Kiluanje - Chefe de grupo.
 
PERSONAGENS

 Kandimba – Velho que cuidava das refeições no bureau, em


Dolisie.

 Mata-Tudo e Katanga – Soldados que estavam de guarda


quando Ingratidão do Tuga fugiu. Foram presos em seu lugar
por suspeita de auxiliarem na fuga.

 Chefe do Depósito – Natural de Quibaxe, era um camponês


que, para acabar com a exploração, resolveu entrar para a
guerrilha. Adoentado, foi afastado dos combates e tornou-se
responsável pelo depósito do material de guerra e pela
cadeia em Dolisie. Ao contrário de Milagre, seu conterrâneo,
não é tribalista.
TEMAS

 Racismo

Criança ainda, [eu, Teoria] queria ser branco, para que os


brancos me não chamassem negro. Homem, queria ser negro,
para que os negros me não odiassem. Onde estou eu, então?
(p.18)
TEMAS

 Tribalismo X Formação política

- Eu sou kikongo? Tu és kimbundo? Achas mesmo que sim?


- Nós, não. Nós pertencemos à minoria que já esqueceu de que
lado nasce o Sol na sua aldeia. Ou que a confunde com outras
aldeias que conheceu. Mas a maioria, Comandante, a
maioria?
- É o teu trabalho: mostrar tantas aldeias aos camaradas que
eles se perderão se, um dia, voltarem à sua. A essa arte de
desorientação se chama formação política! (p.21)
TEMAS

 Função da literatura

- (...) É bom falar, é bom conversar com um amigo, a


quem se abre o coração. Sempre que estiveres
atrapalhado, vem ter comigo. A gente papeia. Guardar
para si não dá, só quando se é escritor. Aí um tipo põe
tudo num papel, na boca dos outros. (p.44)
TEMAS

 Conflitos pessoais

Ondina viera há um ano de Angola. Estudara uma boa parte


do Liceu, mais que ele [o Comissário]. Mesmo depois de
noivarem, isso sempre foi uma barreira. O Comissário
considerava que Ondina lhe fizera um favor, aceitando-o, pois
podia aspirar a pessoas mais cultivadas. Ele formou-a
politicamente, mas nem isso o convenceu de que estavam em
pé de igualdade. Se não acabasse com esses complexos, o
amor deles falharia, dissera um dia Sem Medo. (p.81)
TEMAS

 Luta de classes

O Comandante não passa, no fundo, dum diletante pequeno-


burguês, com rasgos anarquistas. Formado na escola
marxista, guardou da sua classe de origem uma boa dose de
anticomunismo, o qual se revela pela recusa da igualdade
proletária. (p.101)
TEMAS

 Revolução (coletivo) X Ambição (indivíduo)

- O Das Operações está a trabalhar na sombra – disse o


Comissário. – Toda a tarde esteve em conferência com os
kimbundos, até mesmo com o Teoria... Chamou-o a sós!
- Ah, bom? O tribalismo nele é mais forte que o racismo? Não
o pensava.
- Não é o tribalismo. É a ambição! (p.118)
TEMAS

 Dogmatismo político

- Alguém pode estar seguro nesta situação? Diz, Comandante,


alguém pode estar seguro?
- Sim, pode. O Mundo Novo! Ele tem uma Bíblia... Toda a
verdade está escrita, gravada em pedra, nem dois mil anos de
história poderão adulterá-la. Felizes os que creem no
absoluto, é deles a tranquilidade do espírito! Não queres ser
feliz, seguríssimo de ti mesmo? Arranja um catecismo...
(pp.129-130)
TEMAS

 Amor

No amor é a mesma coisa. Se uma pessoa se mostra toda ao


outro, o interesse da descoberta desaparece. O que conta no amor
é a descoberta do outro, dos seus pecadilhos, das suas taras, dos
seus vícios, das suas grandezas, os seus pontos sensíveis, tudo o
que constitui o outro. O amante que se quer fazer amar deve
dosear essa descoberta. Nem só querer tudo saber num momento,
nem tudo querer revelar. (...) E a alma humana é tão rica, tão
complexa, que essa descoberta pode levar uma vida. (pp. 148-149)
TEMAS

 Papel social da mulher

- Isso vem do papel social da mulher – disse o Comissário. –


Numa sociedade em que o homem controla os meios de produção,
onde é o marido que trabalha e traz o dinheiro para casa, é
natural que a mulher se submeta à supremacia masculina. A sua
defesa social é a submissão familiar.
- No geral é isso. Mas há mulheres que se não submetem, que
encontram no amor o contrapeso a essa inferioridade social. E
mesmo sem trabalhar, estando dependentes economicamente, são
capazes de jogar taco a taco com o homem. (p.150)
TEMAS

 Homem em transformação (alegoria da metamorfose)

- O problema está aí. É que tu és mesmo mulher para ele, e o


João sabe-o. Não para o João que conheceste, mas para o João
que fizeste germinar, o que está a nascer.
(...)
- (...) O mal é que ele tem de estar longe, não terá ocasião de
se mostrar com a nova pele que se construirá, que o ajudaste a
construir-se. E uma metamorfose é dolorosa e lenta. (p.175)
TEMAS

 Heróis míticos X seres humanos

- Ele ofendeu-te.
- Ora! Nunca foi ofensa quebrar um mito. Ele é que se criou
um mito sobre mim, agora apercebe-se que estava enganado.
Talvez eu o tenha ajudado a criar esse mito, quem sabe? Não era
a minha intenção, mas posso ter contribuído. Ele apercebeu-se por
si próprio e agora, pelo caminho, a cada passada, vai
desmoronando a estátua que construíra. (...) A partir de agora, ele
não precisará de mitos para viver, vai tornar-se um homem livre.
(...) (p.181)
TEMAS

 Preparação de um mundo novo (comunista)

- No fundo, é a minha posição – disse Mundo Novo. – Eu sei


que o comunismo não será conquistado já, comigo em vida, que o
mais que conseguiremos é chegar ao socialismo. São precisos
muitos anos para vencer as relações de produção capitalistas e a
mentalidade que elas deixam. (...) (p.228)
ESPAÇO

 Floresta do Mayombe

É um espaço hostil, assustador, desafiador, mas, ao mesmo


tempo, protetor, acolhedor e provedor.  

A mata criou cordas nos pés dos homens, criou cobras à


frente dos homens, a mata gerou montanhas instransponíveis,
feras, aguaceiros, rios caudalosos, lama escuridão, Medo. A mata
abriu valas camufladas de folhas sob os pés dos homens, barulhos
imensos no silêncio da noite, derrubou árvores sobre os homens.
(p.68)
ESPAÇO

 Floresta do Mayombe
O Mayombe tinha aceitado os golpes dos machados, que nele
abriram uma clareira. (...) Os paus serviram para as paredes. O
capim do teto foi transportado de longe, de perto do Lombe. Um
montículo foi lateralmente escavado e tornou-se forno para o pão.
(...) (p.67)

 Dolisie
É uma pequena cidade situada na República do Congo onde se
localiza o escritório do Movimento. Enquanto o Mayombe é o
espaço da reflexão sobre a ação e formação dos soldados, Dolisie é
o espaço da reflexão sobre o trabalho burocrático, sobre os
comportamentos dos dirigentes do partido.
TEMPO

 Os fatos narrados ocorrem no mesmo ano em que o


texto foi escrito por Pepetela, em 1971 .

Vê o Ingratidão! Combatente no Norte de 1961 até


1965. Combatente em Cabinda desde essa data. Há dez
anos que combate o inimigo. (p.61)
FOCO NARRATIVO

Narrador titular
3.a pessoa, onisciente (revela os pensamentos e sentimentos das
personagens, sobretudo de Sem Medo, algumas vezes, por meio do
discurso indireto livre:

Qual era a verdade? Fizera alguma coisa para a convencer? Sim e


não. Convencer de quê? De qual verdade? (p.176)

Polifonia
Evidencia-se quando, no meio da narrativa, o narrador passa a ser
uma das personagens, a qual expõe sua perspectiva pessoal sobre
um fato narrado anteriormente pela perspectiva do narrador
titular. Essa troca se evidencia pela frase “Eu, o narrador, sou...”.
Tradição africana das narrativas orais
ESTILO

 Predominam períodos curtos com linguagem denotativa, em que se


misturam a língua portuguesa com termos de origem africana.

Os grupos cochichavam. O mujimbo passava da boca dos que


chegavam de Dolisie para os ouvidos dos que estavam na Base.
(mujimbo = boato)
 
 Tentativa de se reproduzir a maneira como alguns guerrilheiros
falavam o português, com alguma dificuldade:
 
- (...) Eu só quero que a luta avança, por isso penso é preciso fazer
a unidade do Comando e obrigar a Direção a pôr outro responsável em
Dolisie. Só assim a luta pode avançar. Esse povo não é traidor, mas
precisa de ver a guerra está a sair mal ao tuga.
ESTILO

 Figuras de linguagem, tais como:

- Alegoria
 
- (...) Somos cegos, pois não temos os olhos e as antenas, que são o
povo. Se somos cegos, então apalpemos o caminho antes de avançar, senão
caímos num buraco. (Por meio de uma série de metáforas, o Comissário
revela que a guerrilha, sem o apoio popular, exige muito mais cuidado)
 
- Personificação
 
Assim foi parida pelo Mayombe a base guerrilheira.
 
 
ESTILO

 - Comparação

A amoreira gigante à sua frente. O tronco destaca-se d


sincretismo da mata, mas se eu percorrer com os olhos o
tronco para cima, a folhagem dele mistura-se à folhagem
geral e é de novo o sincretismo. Só o tronco se destaca, se
individualiza. Tal é o Mayombe, os gigantes só o são em
parte, ao nível do tronco, o resto confunde-se na massa.
Tal o homem.

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