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Crônicas

Profª Laura Costa


O que é crônica?
A crônica é um gênero textual curto escrito em prosa, geralmente

produzido para meios de comunicação, por exemplo, jornais, revistas, etc.

Além de ser um texto curto, possui uma "vida curta", ou seja, as crônicas

tratam de acontecimentos corriqueiros do cotidiano.

Do latim, a palavra “crônica” (chronica) refere-se a um registro de eventos

marcados pelo tempo (cronológico); e do grego (khronos) significa

“tempo”.

Portanto, elas estão extremamente conectadas ao contexto em que são

produzidas, por isso, com o passar do tempo ela perde sua “validade”, ou
Características

● narrativa curta;
● uso de uma linguagem simples e coloquial;
● presença de poucos personagens, se houver;
● espaço reduzido;
● temas relacionados a acontecimentos cotidianos.
Crônica Narrativa
A crônica narrativa é um tipo de crônica que relata as ações de
personagens num tempo atual e um espaço determinado.
Em relação à linguagem, as crônicas narrativas possuem uma linguagem
simples e direta e, muitas vezes, utilizam do humor para entreter os
leitores. Além disso, podem apresentar o discurso direto, onde há a
reprodução das falas dos personagens.
As crônicas narrativas envolvem os mais diversos tipos de narrador (foco
narrativo) e, portanto, podem ser narradas em primeira ou terceira
pessoa.
Além da crônica narrativa, ela pode ser dissertativa-argumentativa ou
descritiva. Entretanto, podemos encontrar uma crônica que seja narrativa
e descritiva ao mesmo tempo.
Vale lembrar que a crônica é um texto curto em prosa onde a principal
característica é relatar acontecimentos cotidianos de forma cronológica,
daí seu nome. Esse tipo de texto é muito veiculado nos meios de
comunicação, por exemplo, jornais e revistas.
Aprenda a chamar a polícia (Luís Fernando Veríssimo)

Eu tenho o sono muito leve, e numa noite dessas notei que havia alguém
andando sorrateiramente no quintal de casa.
Levantei em silêncio e fiquei acompanhando os leves ruídos que vinham
lá de fora, até ver uma silhueta passando pela janela do banheiro.
Como minha casa era muito segura, com grades nas janelas e trancas
internas nas portas, não fiquei muito preocupado, mas era claro que eu
não ia deixar um ladrão ali, espiando tranquilamente.
Liguei baixinho para a polícia, informei a situação e o meu endereço.
Perguntaram-me se o ladrão estava armado ou se já estava no interior da
casa.
Esclareci que não e disseram-me que não havia nenhuma viatura por
perto para ajudar, mas que iriam mandar alguém assim que fosse
possível.
Um minuto depois, liguei de novo e disse com a voz calma:
— Oi, eu liguei há pouco porque tinha alguém no meu quintal. Não precisa
mais ter pressa. Eu já matei o ladrão com um tiro de escopeta calibre 12,
que tenho guardada em casa para estas situações. O tiro fez um estrago
danado no cara!
Passados menos de três minutos, estavam na minha rua cinco carros da
polícia, um helicóptero, uma unidade do resgate, uma equipe de TV e a
turma dos direitos humanos, que não perderiam isso por nada neste mundo.
Eles prenderam o ladrão em flagrante, que ficava olhando tudo com cara de
assombrado. Talvez ele estivesse pensando que aquela era a casa do
Comandante da Polícia.
No meio do tumulto, um tenente se aproximou de mim e disse:
— Pensei que tivesse dito que tinha matado o ladrão.
Eu respondi:
— Pensei que tivesse dito que não havia ninguém disponível.
Crônica argumentativa

A crônica argumentativa é um tipo de texto em que a argumentação é a sua


principal marca.
Ela é muito utilizada pelos meios de comunicação, sobretudo os jornais e as
revistas.
A crônica argumentativa funde aspectos da crônica e dos textos argumentativos
e se aproxima do Artigo de Opinião. Ela pode ser do gênero narrativo,
dissertativo ou descritivo.
Os cronistas, autores que escrevem as crônicas, expressam nesse tipo de texto
um tema e sua posição, ponto de vista ou juízo de valor sobre tal assunto.
Note que a crônica narrativa argumentativa narra uma breve história, com
personagens, tempo e espaço. Ela pode conter discursos diretos (com marca da
fala dos personagens, por exemplo, o uso de travessão), indiretos (palavras dos
personagens proferidas pelo narrador, ao invés de utilizar as marcas pessoas) e
os indiretos livre (fusão dos dois tipos de discursos: direto e indireto).
Moacyr Scliar: Astúcia, inteligência, sabedoria
No interessante Onde Encontrar a Sabedoria? (Ed. Ponto de Leitura), o respeitado crítico norte-
americano Harold Bloom observa que, ao longo do tempo, as pessoas sempre recorreram aos livros e
aos autores famosos com o objetivo de se tornarem mais sábias. Leitura, esse era o raciocínio, pode ser
uma coisa difícil, mas o esforço valeria a pena se, como resultado, a pessoa se tornasse mais sábia. Cabe,
contudo, a pergunta: será que este é um sonho comum à humanidade? Será que todos nós queremos a
sabedoria? Será que no Brasil, em particular, é este um ideal?

Tenho minhas dúvidas. Sabedoria é uma condição que resulta de uma profunda compreensão do mundo
e da condição humana. Nós não nascemos sábios, não nascemos com esta compreensão; temos de
adquiri-la através da vida, e isso se faz mediante conhecimento (daí a necessidade da leitura) mas
também graças ao "insight", o "conhece-te a ti mesmo", de Sócrates, mediante o qual aprendemos a não
nos deixarmos iludir por nossa arrogância, a reconhecer nossas limitações e defeitos, a pensar e a agir de
forma serena e desapaixonada. Agir, sim; sabedoria não é só pensar bem, não é só ter conhecimento e
entender as coisas. Sabedoria é agir bem, resolvendo os problemas de forma eficaz, mas de forma ética,
decente.
Um componente importante da sabedoria é a inteligência, a palavra que vem do
latim e quer dizer entendimento. A pessoa inteligente entende, mediante o
raciocínio e a experiência, as coisas, mesmo complexas. É uma habilidade que,
diferente da sabedoria, pode ser avaliada, e até quantificada; daí os testes de
inteligência, incluindo o famoso QI, quociente de inteligência, aliás objeto de
controvérsia nos últimos anos.

Ser inteligente não é ser sábio: na sabedoria o furo está mais acima. A pessoa
inteligente nem sempre age bem; a história da humanidade está cheia de
vigaristas que aplicavam e aplicam golpes inteligentíssimos (os hackers, por
exemplo). No fim essas pessoas se dão mal, exatamente porque lhes falta esse
conhecimento maior que é a sabedoria.
Isso é ainda mais verdadeiro no caso da astúcia, que não é sabedoria nem inteligência. É uma coisa
menos sofisticada, mais primitiva, daí porque, nas fábulas, é simbolizada por um animal, a raposa. A
raposa não é sábia nem inteligente; a raposa é astuta. Astúcia é a habilidade de enganar; astúcia é manha,
esperteza. Zélia Duncan diz isso na letra de uma música: Astúcia, astúcia/O que te faltou foi astúcia/Pra
roubar meu coração faltou muito pouco/Era só ter procurado no outro bolso. Astucioso é o cara que
procura no outro bolso; é o cara que sabe como roubar. Isso explica por que a astúcia é ainda tão
valorizada no Brasil: porque representa uma maneira fácil de conquistar as coisas, de subir na vida. Se
vocês perguntarem a alguém como se ganha eleições, se com sabedoria, com inteligência ou com astúcia,
a pessoa certamente optará por esta última alternativa, atrás da qual estão séculos de safadeza e de
corrupção. Mas é que as duras condições da vida em nosso país, a pobreza, a desigualdade, deixaram
esta lição: para sobreviver é preciso ser astuto, esperto. É muito glamouroso ser inteligente, é digna de
admiração a pessoa sábia; mas, quando se trata de salvar a pele, o melhor mesmo é a astúcia.

Compreensível. Mas não satisfatório. Nós só chegamos à verdadeira maturidade quando a astúcia
reconhece a importância da inteligência e quando esta é um recurso para atingir a sabedoria. Um Brasil
sábio deveria ser o nosso objetivo maior.
Crônica Reflexiva
Não há preocupação com a estrutura do texto, como ocorre com as
crônicas argumentativas.
A partir de um fato comum ou do cotidiano, o cronista tece
considerações filosóficas, como a condição humana e a
transitoriedade da vida, projetando seus pensamentos na realidade
à sua volta.
Normalmente escrita na 1a pessoa do singular, admite tanto a
linguagem formal como a coloquial. Entretanto, não abandona os
recursos de aproximação com o leitor, o que faz com que este se
interesse pelo texto e, com o cronista, reflita sobre o assunto em
questão.
Vitória Nossa (Clarice Lispector)

O que temos feito de nós e a isso considerado vitória nossa de cada dia?
Não temos amado, acima de todas as coisas. Não temos aceito o que não
se entende porque não queremos ser tolos. Temos amontoado coisas e
seguranças por não nos termos, nem aos outros. Não temos nenhuma
alegria que tenha sido catalogada. Temos construído catedrais e ficado
do lado de fora, pois as catedrais que nós mesmos construímos tememos
que sejam armadilhas. Não nos temos entregue a nós mesmos, pois isso
seria o começo de uma vida larga e talvez sem consolo. Temos evitado
cair de joelhos diante do primeiro que por amor diga: teu medo.
Temos organizado associações de pavor sorridente, onde se serve a
bebida com soda. Temos procurado salvar-nos, mas sem usar a
palavra salvação para não nos envergonharmos de sermos inocentes.
Não temos usado a palavra amor para não termos de reconhecer sua
contextura de amor e de ódio. Temos mantido em segredo a nossa
morte. Temos feito arte por não sabermos como é a outra coisa.
Temos disfarçado com amor a nossa indiferença, disfarçando nossa
indiferença com angústia, disfarçando com o pequeno medo o
grande medo maior. Não temos adorado, por termos a sensata
mesquinhez de lembrarmos a tempo dos falsos deuses. Não temos
sidos ingênuos para não rirmos de nós mesmos e para que no fim do
dia possamos dizer “pelo menos não fui tolo”, e assim não
chorarmos antes de apagar a luz. Temos tido a certeza de que eu
também e vocês todos também, e por isso todos nem sabem se
amam. Temo sorrido em público do que não sorrimos quando ficamos
sozinhos. Temos chamado de franqueza a nossa candura. Temo-nos
temido um ao outro, acima de tudo. E a tudo isso temos considerado
a vitória nossa de cada dia…

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