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Marília de Dirceu

Tomás Antônio Gonzaga


Tomás Antônio Gonzaga

 Nasce em 1744 – Porto


 Vem para o brasil em 1752
 Volta para Portugal para estudar Direito em 1761
 Volta para o Brasil para ser Ouvidor-geral de Minas Gerais em 1782
 É preso em 1789
 Fica 3 anos em interrogatório na prisão em Ilha das Cobras (RJ)
 É desterrado para Moçambique
 Casa-se com Juliana Mascarenhas e tem 2 filhos
 Morre em 1810
Marília de Dirceu
Marília de Dirceu

 - Poema lírico e narrativo


 - Contempla as principais características do Arcadismo brasileiro
 - Dividida em 3 partes, sendo 80 Liras e 13 Sonetos
 - 1ª. Parte – 33 Liras – publicado em 1792 (amor pastoril racional árcade)
 - 2ª. Parte – 38 Liras – publicado em 1799 (sofrimento na masmorra)
 - 3ª. Parte – 9 Liras e 13 sonetos – publicado em 1812 (despedida)

 - Dirceu – Tomás Antônio Gonzaga


 - Marília – Maria Doroteia Joaquina de Seixas Brandão
 - Glauceste – Cláudio Manuel da Costa
Arcadismo
 - Neoclassicismo

 - Iluminismo

 - Pastoralismo, bucolismo, contato com a natureza que é Razão, Liberdade e


Verdade

 - No Brasil, Inconfidência Mineira

 - Fugere urben, locus amoenus, carpe diem

 - Escrita racional e simples, se contrapondo ao Barroco – inutilia truncat


 Lira I

 Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,


 Que viva de guardar alheio gado;
 De tosco trato, d’ expressões grosseiro,
 Dos frios gelos, e dos sóis queimado.
 Tenho próprio casal, e nele assisto;
 Dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
 Das brancas ovelhinhas tiro o leite,
 E mais as finas lãs, de que me visto.
 Graças, Marília bela,
 Graças à minha Estrela!
 Eu vi o meu semblante numa fonte,
 Dos anos inda não está cortado:
 Os pastores, que habitam este monte,
 Com tal destreza toco a sanfoninha,
 Que inveja até me tem o próprio Alceste:
 Ao som dela concerto a voz celeste;
 Nem canto letra, que não seja minha,
 Graças, Marília bela,
 Graças à minha Estrela!
 Mas tendo tantos dotes da ventura,
 Só apreço lhes dou, gentil Pastora,
 Depois que teu afeto me segura,
 Que queres do que tenho ser senhora.
 É bom, minha Marília, é bom ser dono
 De um rebanho, que cubra monte, e prado;
 Porém, gentil Pastora, o teu agrado
 Vale mais q’um rebanho, e mais q’um trono.
 Graças, Marília bela,
 Graças à minha Estrela!
 Os teus olhos espalham luz divina,
 A quem a luz do Sol em vão se atreve:
 Papoula, ou rosa delicada, e fina,
 Te cobre as faces, que são cor de neve.
 Os teus cabelos são uns fios d’ouro;
 Teu lindo corpo bálsamos vapora.
 Ah! Não, não fez o Céu, gentil Pastora,
 Para glória de Amor igual tesouro.
 Graças, Marília bela,
 Graças à minha Estrela!
 Irás a divertir-te na floresta,
 Sustentada, Marília, no meu braço;
 Ali descansarei a quente sesta,
 Dormindo um leve sono em teu regaço:
 Enquanto a luta jogam os Pastores,
 E emparelhados correm nas campinas,
 Toucarei teus cabelos de boninas,
 Nos troncos gravarei os teus louvores.
 Graças, Marília bela,
 Graças à minha Estrela!
 Depois de nos ferir a mão da morte,
 Ou seja neste monte, ou noutra serra,
 Nossos corpos terão, terão a sorte
 De consumir os dois a mesma terra.
 Na campa, rodeada de ciprestes,
 Lerão estas palavras os Pastores:
 “Quem quiser ser feliz nos seus amores,
 Siga os exemplos, que nos deram estes.”
 Graças, Marília bela,
 Graças à minha Estrela!
 Lira II

 Pintam, Marília, os Poetas


 A um menino vendado,
 Com uma aljava de setas,
 Arco empunhado na mão;
 Ligeiras asas nos ombros,
 O tenro corpo despido,
 E de Amor, ou de Cupido
 São os nomes, que lhe dão.
 Tu, Marília, agora vendo
 De Amor o lindo retrato,
 Contigo estarás dizendo,
 Que é este o retrato teu.
 Sim, Marília, a cópia é tua,
 Que Cupido é Deus suposto:
 Se há Cupido, é só teu rosto,
 Que ele foi quem me venceu.
 Lira III

 De amar, minha Marília, a formosura


 Não se podem livrar humanos peitos.
 Adoram os heróis; e os mesmos brutos
 Aos grilhões de Cupido estão sujeitos.
 Quem, Marília, despreza uma beleza,
 A luz da razão precisa;
 E se tem discurso, pisa
 A lei, que lhe ditou a Natureza.
 Lira IV

 Marília, teus olhos


 São réus, e culpados,
 Que sofra, e que beije
 Os ferros pesados
 De injusto Senhor.
 Marília, escuta
 Um triste Pastor.
 Lira V

 São estes os sítios?


 São estes; mas eu
 O mesmo não sou.
 Marília, tu chamas?
 Espera, que eu vou.
 Lira XI

 Não toques, minha Musa, não, não toques


 Na sonorosa Lira,
 Que às almas, como a minha, namoradas
 Doces canções inspira:
 Assopra no clarim, que apenas soa,
 Enche de assombro a terra!
 Naquele, a cujo som cantou Homero,
 Cantou Virgílio a Guerra.
 Busquemos, ó Musa,
 Empresa maior;
 Deixemos as ternas
 Fadigas do Amor.
 Lira XIV

 Minha bela Marília, tudo passa;


 A sorte deste mundo é mal segura;
 Se vem depois dos males a ventura,
 Vem depois dos prazeres a desgraça.
 Estão os mesmos Deuses
 Sujeitos ao poder impio Fado:
 Apolo já fugiu do Céu brilhante,
 Já foi Pastor de gado.
 A devorante mão da negra Morte
 Acaba de roubar o bem, que temos;
 Até na triste campa não podemos
 Zombar do braço da inconstante sorte.
 Qual fica no sepulcro,
 Que seus avós ergueram, descansado;
 Qual no campo, e lhe arranca os brancos ossos
 Ferro do torto arado.

 Ornemos nossas testas com as flores.


 E façamos de feno um brando leito,
 Prendamo-nos, Marília, em laço estreito,
 Gozemos do prazer de sãos Amores.
 Sobre as nossas cabeças,
 Sem que o possam deter, o tempo corre;
 E para nós o tempo, que se passa,
 Também, Marília, morre.
 Lira XVI  A minha Marília quanto
 Eu, Glauceste, não duvido  À natureza não deve!
 Ser a tua Eulina amada  Tem divino rosto,
 Pastora formosa,  E tem mãos de neve.
 Pastora engraçada,  Se mostro na face o gosto,
 Vejo a sua cor-de-rosa,  Ri-se Marília contente;
 Vejo o seu olhar divino,  Se canto, canta comigo,
 Vejo os seus purpúreos beiços,  E apenas triste me sente,
 Vejo o peito cristalino;  Limpa os olhos com as tranças
 Nem há coisa, que assemelhe  De fino cabelo louro.
 Ao crespo cabelo louro.  A minha Marília vale,
 Ah! que a tua Eulina vale,  Vale um imenso tesouro.
 Vale um imenso tesouro!
 Assim também serei, minha Marília,
 Lira XVIII
 Daqui a poucos anos;
 Que o impio tempo para todos corre.
 Não vês aquele velho respeitável
 Os dentes cairão, e os meus cabelos,
 Que à muleta encostado
 Ah! sentirei os danos,
 Apenas mal se move, e mal se arrasta?
 Que evita só quem morre.
 Oh! quanto estrago não lhe fez o tempo!
 O tempo arrebatado,
 Mas sempre passarei uma velhice
 Que o mesmo bronze gasta.
 Muito menos penosa.
 Não trarei a muleta carregada:
 Descansarei o já vergado corpo
 Na tua mão piedosa,
 Na tua mão nevada.
 Lira XIX
 Enquanto pasta alegre o manso gado,
 Minha bela Marília, nos sentemos
 À sombra deste cedro levantado.
 Um pouco meditemos  Que gosto não terá a esposa amante,
 Na regular beleza,  Quando der ao filhinho o peito brando,
 Que em tudo quanto vive, nos descobre  E refletir então no seu semblante!
 A sábia natureza.  Quando, Marília, quando
 Disser consigo: “É esta
 Atende, como aquela vaca preta  “De teu querido pai a mesma barba,
 O novilhinho seu dos mais separa,  “A mesma boca, e testa.”
 E o lambe, enquanto chupa a lisa teta.
 Atende mais, ó cara,
 Como a ruiva cadela
 Suporta que lhe morda o filho o corpo,
 E salte em cima dela.
 Apenas lhe morde,
  Marília gritando,
Lira XX
 C’o dedo fugiu.
 Era uma frondosa
 Amor, que no bosque
 Roseira se abria  Estava brincando,
 Um lindo botão.  Aos ais acudiu.
 Marília formosa
 Mal viu a rotura,
 O pé lhe torcia
 E o sangue espargido,
 Com a branca mão.  Que a Deusa mostrou;
 Risonho beijando
  O dedo ofendido,
Nas folhas viçosas
 Assim lhe falou:
 A abelha enraivada
 O corpo escondeu.  “Se tu por não tão pouco
 Tocou-lhe Marília,  “O pranto desatas,
  “Ah! dá-me atenção;
Na mão descuidada
 “E como daquele,
 A fera mordeu.
 “Que feres, e matas,
 “Não tens compaixão?”
 Lira XXVII  Eu vivo, minha Bela, sim, eu vivo
 Eu é que sou herói, Marília bela,  Nos braços do descanso, e mais do gosto:
 Segundo da virtude a honrosa estrada:  Quando estou acordado
 Ganhei, ganhei um trono,  Contemplo no teu rosto
 Ah! não manchei a espada,  De graças adornado:
 Não roubei ao dono.  Se durmo, logo sonho, e ali te vejo.
 Ergui-o no teu peito, e nos teus braços:  Ah! nem desperto, nem dormindo sobe
 E valem muito mais que o mundo inteiro  A mais o meu desejo.
 Uns tão ditosos laços.
 Lira XXXIII  Nem suspendas o teu canto,
 Pega na lira sonora,  Inda que, Pastor, se veja
 Pega, meu caro Glauceste;  Que a minha boca suspira,
 E ferindo as cordas de ouro,  Que se banha em pranto o rosto;
 Mostra aos rústicos Pastores  Que os outros choram de inveja,
 A formosura celeste  E chora Dirceu de gosto.
 De Marília, meus amores.  Ah! pinta, pinta
 Ah! pinta, pinta  A minha Bela!
 A minha Bela!  E em nada a cópia
 E em nada a cópia  Se afaste dela.
 Se afaste dela.
 PARTE II  A fumaça, Marília, da candeia,
 Lira I  Que a molhada parede ou suja, ou pinta,
 Já não cinjo de louro a minha testa;  Bem que tosca, e feia,
 Nem sonoras canções o Deus me inspira:  Agora me pode
 Ah! que nem me resta  Ministrar a tinta.
 Uma já quebrada,
 Mal sonora Lira!  Aos mais preparos o discurso apronta:
 Ele me diz, que faça do pé de uma
 Mas neste mesmo estado, em que me vejo,  Má laranja ponta,
 Pede, Marília, Amor que vá cantar-te:  E dele me sirva
 Cumpro o seu desejo;  Em lugar de pluma
 E ao que resta supra
 A paixão, e a arte.
 Nesta cruel masmorra tenebrosa  Se alguém me perguntar onde eu te vejo,
 Ainda vendo estou teus olhos belos,  Responderei: No peito, que uns Amores
 A testa formosa,  De casto desejo
 Os dentes nevados,  Aqui te pintaram,
 Os negros cabelos.  E são bons Pintores.
 Lira II

 Esprema a vil calúnia muito embora


 Eu tenho um coração maior que o mundo!
 Enter as mãos denegridas, e insolentes,
 Tu, formosa Marília, bem o sabes:
 Os venenos das plantas,
 Um coração..., e basta,
 E das bravas serpentes.
 Onde tu mesma cabes.

 Chovam raios e raios, no meu rosto


 Não hás de ver, Marília, o medo escrito:
 O medo perturbador,
 Que infunde o vil delito.
 Lira III
 Sucede, Marília bela,
 À medonha noite o dia;
 A estação chuvosa e fria  Qual eu sou, verá o mundo;
 À quente seca estação.  Mais me dará do que eu tinha,
 Muda-se a sorte dos tempos;  Tornarei a ver-te minha;
 Só a minha sorte não?  Que feliz consolação!
 Não há de tudo mudar-se;
 Os troncos nas Primaveras  Só a minha sorte não.
 Brotam em flores viçosos,
 Nos Invernos escabrosos
 Largam as folhas no chão.
 Muda-se a sorte dos troncos;
 Só a minha sorte não?
 Lira IV  Lira XI
 Já, já me vai, Marília, branquejando  Eu não gasto, Marília, a vida toda
 Louro cabelo, que circula a testa;  Em lançar o penedo da montanha;
 Este mesmo, que alveja, vai caindo  Ou em mover a roda;
 E pouco já me resta.  Mas tenho ainda mais cruel tormento:
 Por coisas que me afligem, roda, e gira
 As faces vão perdendo as vivas cores,  Cansado pensamento.
 E vão-se sobre os ossos enrugando,
 Vai fugindo a viveza dos meus olhos;  Estou no Inferno, estou, Marília bela;
 Tudo se vai mudando.  E numa coisa só é mais humana
 A minha dura estrela:
 Se quero levantar-me, as costas vergam;  Uns não podem mover do Inferno os passos;
 As forças dos meus membros já se gastam,  Eu pretendo voar, e voar cedo
 Vou a dar ela casa uns curtos passos,  À glória dos teus braços.
 Pesam-me os pés, e arrastam.
 Lira XV  Lira XIX
 Eu, Marília, não fui nenhum Vaqueiro,
 Fui honrado Pastor da tua aldeia;  Nesta triste masmorra,
 Vestia finas lãs, e tinha sempre  De um semivivo corpo sepultura,
 A minha choça do preciso cheia.  Inda, Marília, adoro
 Tiraram-me o casal, e o manso gado,  A tua formosura.
 Nem tenho, a que me encoste, um só cajado.  Amor na minha idéia te retrata;
 Busca extremoso, que eu assim resista
 Para ter que te dar, é que eu queria  À dor imensa, que me cerca, e mata.
 De mor rebanho ainda ser o dono;
 Prezava o teu semblante, os teus cabelos
 Ainda muito mais que um grande Trono.
 Agora que te oferte já não vejo
 Além de um puro amor, de um são desejo.
 Lira XXI
 Que diversas que são, Marília, as horas,  Beijando os dedos dessa mão formosa,
 Que passo na masmorra imunda, e feia,  Banhados com as lágrimas do gosto,
 Dessas horas felizes, já passadas  Jurava não cantar mais outras graças,
 Na tua pátria aldeia!  Que as graças do teu rosto.

 Então eu me ajuntava com Glauceste;  Ainda não quebrei o juramento,


 E à sombra de alto Cedro na campina  Eu agora, Marília, não as canto;
 Eu versos te compunha, e ele os compunha  Mas inda vale mais que os doces versos
 À sua cara Eulina.  A voz do triste pranto.
 Lira XXXIV
 Vou-me, ó Bela, deitar na dura cama,  Pintam que entrando vou na grande Igreja;
 De que nem sequer sou o pobre dono:  Pintam que as mãos nos damos, e aqui vejo
 Estende sobre mim Morfeu as asas,  Subir-te à branca face a cor mimosa,
 E vem ligeiro o sono.  A viva cor do pejo.

 Os sonhos, que rodeiam a tarimba,  Se o meu crime não fosse só de amores,


 Mil coisas vão pintar na minha idéia;  A ver-me delinqüente, réu de morte,
 Não pintam cadafalsos, não, não pintam  Não sonhara, Marília, só contigo,
 Nenhuma imagem feia.  Sonhara de outra sorte.

 Pintam que estou bordando um teu vestido;


 Que um menino com asas, cego, e louro,
 Me enfia nas agulhas o delgado,
 O brando fio de ouro.
 Toma de Minas a estrada,
 Lira XXXVII
 Na Igreja nova, que fica
 Meu sonoro Passarinho,
 Ao direito lado, e segue
 Se sabes do meu tormento,
 Sempre firme a Vila Rica.
 E buscas dar-me, cantando,
 Um doce contentamento,
 Entra nesta grande terra,
 Passa uma formosa ponte,
 Ah! não cantes, mais não cantes,
 Passa a segunda, a terceira
 Se me queres ser propício;
 Tem um palácio defronte.
 Eu te dou em que me faças
 Muito maior benefício.
 Ele tem ao pé da porta
 Uma rasgada janela,
 Ergue o corpo, os ares rompe,
 É da sala, aonde assiste
 Procura o Porto da Estrela,
 A minha Marília bela.
 Sobe à serra, e se cansares,
 Descansa num tronco dela,
 Para bem a conheceres,  A boca risonha, e breve,
 Eu te dou os sinais todos  Suas faces cor-de-rosa,
 Do seu gesto, do seu talhe,  Numa palavra, a que vires
 Das suas feições, e modos.  Entre todas mais formosa.

 O seu semblante é redondo,  Chega então ao seu ouvido,


 Sobrancelhas arqueadas,  Dize, que sou quem te mando,
 Negros e finos cabelos,  Que vivo neta masmorra,
 Carnes de neve formadas.  Mas sem alívio penando.
 Parte III  Verás em cima da espaçosa mesa
 Lira III  Altos volumes de enredados feitos;
 Tu não verás, Marília, cem cativos  Ver-me-ás folhear os grande livros,
 Tirarem o cascalho, e a rica, terra,  E decidir os pleitos.
 Ou dos cercos dos rios caudalosos,
 Ou da minada serra.  Enquanto revolver os meus consultos.
 Tu me farás gostosa companhia,
 Não verás separar ao hábil negro
 Lendo os fatos da sábia mestra história,
 Do pesado esmeril a grossa areia,
 E os cantos da poesia.
 E já brilharem os granetes de ouro
 No fundo da bateia.
 Lerás em alta voz a imagem bela,
 Eu vendo que lhe dás o justo apreço,
 Não verás derrubar os virgens matos;
  Gostoso tornarei a ler de novo
Queimar as capoeiras ainda novas;
 Servir de adubo à terra a fértil cinza;  O cansado processo.
 Lançar os grãos nas covas.
 Parto, enfim, e vou sem ver-te,
 Que neste fatal instante
 Há-de ser o teu semblante
 Mui funesto aos olhos meus.
 1 - Leia os excertos abaixo, extraídos de "Marília de Dirceu" (Lira XIV), de Tomás Antônio
Gonzaga.

 "Minha bela Marília, tudo passa;


 A sorte deste mundo é mal segura;
 Se vem depois dos males a ventura,
 Vem depois dos prazeres a desgraça."

 "Ornemos nossas testas com as flores


 E façamos de feno um brando leito;
 Prendamo-nos, Marília, em laço estreito,
 Gozemos do prazer de sãos Amores.
 Sobre as nossas cabeças,
 Sem que o possam deter, o tempo corre;
 E para nós o tempo, que se passa,
 Também, Marília, morre."

 "Ah, não, minha Marília,


 Aproveite-se o tempo, antes que faça
 O estrago de roubar ao corpo as forças,
 Considere as seguintes afirmações sobre esses excertos.

 I - Os versos chamam a atenção para a passagem do tempo e expressam um convite aos prazeres de um
amor sadio.
 II - Os versos 05 a 12 descrevem uma cena amorosa ambientada na paisagem mineira da cidade então
chamada de Vila Rica.
 III - Marília é um nome literário adotado para referir a noiva do poeta inconfidente, cujo nome
verdadeiro era Maria Dorotéia de Seixas Brandão.

 Quais estão corretas?


 A) I
 B) II
 C) III
 D) I e III
 E) I, II e III
 2 - (UFRS) Leia as afirmações abaixo sobre o Arcadismo brasileiro.
 1- Os poetas arcades colocavam-se como pastores para realizarem, dessa forma, o ideal de uma
vida simples em contato com a natureza.
 II - O Arcadismo brasileiro, embora tenha reproduzido muito dos modelos europeus, apresentou
caracteristicas próprias, como a incorporação do elemento indígena e a sátira política.
 III - O tema do "Carpe diem", em que o poeta expressa o desejo de aproveitar intensamente o
momento presente, fugaz e passageiro, foi ignorado pelos árcades brasileiros, excessivamente
racionalistas.

 Quais estão corretas?


 A) I B) III C) I e II D) II e III E) I, II e III
 Texto para as questões 3 a 5
 Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
 Que viva de guardar alheio gado;
 De tosco trato, d’ expressões grosseiro,
 Dos frios gelos, e dos sóis queimado.
 Tenho próprio casal, e nele assisto;
 Dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
 Das brancas ovelhinhas tiro o leite,
 E mais as finas lãs, de que me visto.
 [...]
 Tu não verás, Marília, cem cativos
 Tirarem o cascalho e a rica terra,
 ou dos cercos dos rios caudalosos,
 Ou da minada serra graças à minha estrela
 [...]
 Não verás separar ao hábil negro
 Do pesado esmeril a grossa areia,
 E já brilharem os granetes de oiro
 No fundo da bateia
 [...]
 Não verás enrolar negros pacotes
 das secas folhas do cheiroso fumo;
 Nem espremer entre as dentadas rodas
 Da doce cana o sumo

 Verás em cima da espaçosa mesa


 Altos volumes de enredados feitos;
 Ver-me-ás folhear os grandes livros
 E decidir os pleitos
 3 – Nesses excertos, Dirceu apresenta a Marília alguns dos argumentos com que
pretende convencê-la a desposá-lo, bem como lhe sugere uma imagem de sua
vida conjugal futura.
 Considerando-se o teor dos argumentos e das imagens aí presentes, pode-se concluir
que:
 A) A relação amorosa proposta pelo poeta passa pelo crivo da racionalidade e do
cálculo.
 B) As preocupações pecuniárias do eu lírico revelam que ele visa antes ao dote que à
dama.
 C) O poeta trata de seduzir a dama interesseira, expondo-lhe o rol de seus bens.
 D) O poeta acena à amada com um futuro conjugal aventuroso e movimentado.
 E) As imagens idílicas que o eu lírico emprega remetem, de modo cifrado a
interesses eróticos inconfessáveis.
 4 – O excerto contém versos que atestam, de modo enfático, que, no Brasil, o
Arcadismo, também chamado de Neoclassicismo,

 A) Desenvolveu-se em meio rural, ao contrário do caráter citadino que tinha no


Velho Mundo
 B) Procurou situar na realidade local os temas e formas de sua matriz europeia
 C) Tornou-se nacionalista, abandonando o internacionalismo que é inerente a sua
filiação classicista
 D) Repudiou, em nome do maravilhoso cristão, as referências à mitologia pagã e
greco-latina
 E) Imiscuiu-se na política, o que lhe prejudicou a integridade estética
 5 – A configuração que o tema do amor recebe, nos versos do excerto:
 A) Será retomada pelo movimento indianista do século XIX, especialmente em
Iracema e O Guarani, de José de Alencar
 B) Antecipa a concepção natural e fisiológica do amor que será preconizado pelo
Naturalismo
 C) Contrasta com o amor concebido como um absoluto, muito próprio do
Romantismo
 D) Equivale, já, à banalização do amor que se consumará no Modernismo,
particularmente em Manuel Bandeira e Mário de Andrade
 E) Prefigura as relações conjugais desencantadas e materialistas que serão objeto de
análise no Realismo, especialmente nos romances machadianos da maturidade
 Texto para as questões 6 a 9
 Não vês aquele velho respeitável,
 que à muleta encostado,
 apenas mal se move e mal se arrasta?
 Oh! quanto estrago não lhe fez o tempo,
 o tempo arrebatado,
 que o mesmo bronze gasta!

 Enrugaram-se as faces e perderam


 seus olhos a viveza:
 voltou-se o seu cabelo em branca neve;
 já lhe treme a cabeça, a mão, o queixo,
 nem tem uma beleza
 das belezas que teve.

 Assim também serei, minha Marília,


 daqui a poucos anos,
 que o ímpio tempo para todos corre.
 Os dentes cairão e os meus cabelos.
 Ah! sentirei os danos,
 Mas sempre passarei uma velhice
 muito menos penosa.
 Não trarei a muleta carregada,
 descansarei o já vergado corpo
 na tua mão piedosa,
 na tua mão nevada.

 As frias tardes, em que negra nuvem


 os chuveiros não lance,
 irei contigo ao prado florescente:
 aqui me buscarás um sítio ameno,
 onde os membros descanse,
 e ao brando sol me aquente.

 Apenas me sentar, então, movendo


 os olhos por aquela
 vistosa parte, que ficar fronteira,
 apontando direi: — Ali falamos,
 ali, ó minha bela,
 Verterão os meus olhos duas fontes,
 nascidas de alegria;
 farão teus olhos ternos outro tanto;
 então darei, Marília, frios beijos
 na mão formosa e pia,
 que me limpar o pranto.

 Assim irá, Marília, docemente


 meu corpo suportando
 do tempo desumano a dura guerra.
 Contente morrerei, por ser Marília
 quem, sentida, chorando
 meus baços olhos cerra.
 6 - A leitura atenta deste poema do livro Marília de Dirceu
revela que o eu lírico

 a) sente total desânimo perante a existência e os sen ti - mentos.


 b) aceita com resignação a velhice e a morte amenizadas pelo amor.
 c) está em crise existencial e não acredita na durabilidade do amor.
 d) protesta ao Criador pela precariedade da existência humana.
 e) não aceita de nenhum modo o envelhecimento e prefere morrer
ainda jovem.
 7 - Assinale a alternativa que indica a ordem em que os versos de
dez e de seis sílabas se sucedem nas oito estrofes do poema.

 a) 6, 10, 6, 6, 10, 10.


 b) 10, 6, 10, 10, 6, 6.
 c) 10, 10, 6, 10, 6, 6.
 d) 10, 6, 10, 6, 10, 6.
 e) 6, 10, 6, 10, 6, 6.
 8 - No conteúdo da quinta estrofe do poema encontramos uma
das características mais marcantes do Arcadismo:

 a) paisagem bucólica.
 b) pessimismo irônico.
 c) conflito dos elementos naturais.
 d) filosofia moral.
 e) desencanto com o amor.
 9 - Observe os seguintes vocábulos extraídos da sétima estrofe do poema:

 I. ternos.
 II. frios.
 III. pia.
 IV. pranto.

 As palavras que aparecem na estrofe como adjetivos estão contidas apenas em:
 a) I e II. b) I e III. c) I, II e III. d) I, II e IV. e) II, III e IV.
 10 - (UEMG)
 A Lira XIV, reproduzida a seguir, foi extraída da obra Marília de Dirceu, publicada
em 1792; já a canção Tempos Modernos pertence ao álbum homônimo, lançado em
1982.
 Lira XIV – parte I

 (...) Ornemos nossas testas com as flores.


 E façamos de feno um brando leito,
 Prendamo-nos, Marília, em laço estreito,
 Gozemos do prazer de sãos Amores.
 Sobre as nossas cabeças,
 Sem que o possam deter, o tempo corre;
 E para nós o tempo, que se passa,
 Também, Marília, morre.
 Tempos Modernos
 (Lulu Santos)
 (...) Hoje o tempo voa amor
 Escorre pelas mãos
 Mesmo sem se sentir
 Não há tempo
 Que volte amor
 Vamos viver tudo
 Que há pra viver
 Vamos nos permitir...

 Por meio de uma leitura comparativa entre os dois textos, é CORRETO afirmar
que
 A) Apesar de o tempo ser sempre o mesmo em todas as épocas, na modernidade
ele parece passar mais rápido; daí a urgência do amor, presente na canção
contemporânea de Lulu Santos, mas ausente na lira de Gonzaga, do século XVIII.
 B) Embora os textos tratem do mesmo tema, eles se diferem quanto à abordagem
adotada. Na lira de Gonzaga, prevalece a idealização amorosa e a relação com a
natureza; na canção de Lulu Santos, por sua vez, prevalece a relação entre amor e
tempo.
 C) Ambos os textos apontam para a necessidade de se viver o tempo presente,
decorrente da brevidade da existência; na lira de Gonzaga, o amor é tratado de
forma idealizada, ao passo que, na canção de Lulu Santos, ele é essencialmente
carnal.
 D) Embora escritos em épocas distintas, os textos tratam do mesmo tema e
utilizam a mesma estratégia: o eu-poético tenta persuadir a amada a gozar os
amores no momento presente, com base no argumento da fugacidade do tempo e
da impossibilidade de se recuperá-lo.
 11 - (UFRR) Leia o poema de Tomás Antônio Gonzaga,
transcrito a seguir, e marque a alternativa que aponta três
características do Arcadismo brasileiro que nele podem ser
observadas.

 Lira I

 A) Vulgarização da figura da mulher; medievalismo; egocentrismo.


 B) Denúncia social; exaltação da vida no campo; temas urbanos.
 C) Exaltação da vida no campo; linguagem simples; pastoralismo.
 D) Temas urbanos; linguagem simples; medievalismo.
 E) Egocentrismo; pastoralismo; denúncia social.

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