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MARÍLIA DE DIRCEU – TOMÁS ANTÔNIO GONZAGA

O AUTOR

CARACTERÍSTICAS
CONTEXTO ESTÉTICO E HISTÓRICO DO ARCADISMO A ESTRUTURA DA OBRA
3 partes
I– (33 liras) marcadas pelo convencionalismo árcade

II– (38 liras) escritas possivelmente na prisão


Com caráter melancólico e de amor ausente
IDEAIS PRINCIPAIS DA ESTÉTICA ÁRCADE
1) “Fugere Urbem” III– (9 liras e 13 sonetos) retorno ao convencionalismo
2) “Inutilia Truncat” árcade
3) “Aurea Mediocritas”
4) “Locus Amoenus”
5) “Carpe Diem”

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A OBRA

PARTE I Ah! enquanto os Destinos impiedosos


LIRA I Não voltam contra nós a face irada,
Eu, Marília, não sou algum vaqueiro, Façamos, sim, façamos, doce amada,
Que viva de guardar alheio gado; Os nossos breves dias mais ditosos.
De tosco trato, de expressões grosseiro, Um coração que, frouxo,
Dos frios gelos e dos sóis queimado. A grata posse de seu bem difere,
Tenho próprio casal e nele assisto; A si, Marília, a si próprio rouba,
Dá-me vinho, legume, fruta, azeite; Das brancas E a si próprio fere.
ovelhinhas tiro o leite E mais as finas lãs, de que me
visto. Ornemos nossas testas com as flores,
Graças, Marília bela, E façamos de feno um brando leito;
Graças à minha estrela! Prendamo-nos, Marília, em laço estreito,
Gozemos do prazer de sãos Amores.
Eu vi o meu semblante numa fonte: Sobre as nossas cabeças,
Dos anos inda não está cortado; Sem que o possam deter, o tempo corre;
Os pastores que habitam este monte E para nós o tempo que se passa
Respeitam o poder de meu cajado. Também, Marília, morre.
Com tal destreza toco a sanfoninha1,
Que inveja até me tem o próprio Alceste2: Com os anos, Marília, o gosto falta,
Ao som dela concerto a voz celeste; E se entorpece o corpo já cansado:
Nem canto letra que não seja minha, Triste o velho cordeiro está deitado,
Graças, Marília bela, E o leve filho, sempre alegre, salta.
Graças à minha estrela! A mesma formosura
É dote que só goza a mocidade:
Rugam-se as faces, o cabelo alveja,
Mal chega a longa idade.

LIRA XIV Que havemos de esperar, Marília bela?


Minha bela Marília, tudo passa; Que vão passando os florescentes dias?
A sorte deste mundo é mal segura; As glórias que vêm tarde, já vêm frias,
Se vem depois dos males a ventura, E pode, enfim, mudar-se a nossa estrela.
Vem depois dos prazeres a desgraça. Ah! Não, minha Marília,
Estão os mesmos deuses Aproveite-se o tempo, antes que faça
Sujeitos ao poder do ímpio Fado: O estrago de roubar ao corpo as forças
Apolo já fugiu do céu brilhante, E ao semblante a graça!
Já foi pastor de gado.

A devorante mão da negra Morte


Acaba de roubar o bem que temos;
Até na triste campa não podemos
Zombar do braço da inconstante sorte:
Qual fica no sepulcro,
Que seus avós ergueram, descansado;
Qual60 no campo, e lhe arranca os frios ossos
Ferro do torto arado.

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PARTE II PARTE III
LIRA I LIRA I
Já não cinjo de louro a minha testa Convidou-me a ver seu Templo
Nem sonoras canções o deus me inspira. O cego Cupido um dia:
Ah! que nem me resta Encheu-se de gosto o peito,
Uma já quebrada, Fiz deste Deus um conceito,
Mal sonora lira! Como dele não fazia.

Mas neste mesmo estado em que me vejo, Aqui vejo, descorados,


Pede, Marília, Amor que vá cantar-te: Os terníssimos amantes
Cumpro o seu desejo; Entre as cadeias gemerem;
E ao que resta supra Vejo nas piras arderem
A paixão e a arte. As entranhas palpitantes."

A fumaça, Marília, da candeia, A quem amas, quanto avistas",


Que a molhada parede ou suja ou pinta, Diz Cupido, "não aterra;
Bem que tosca e feia, Quem quer cingir o loureiro
Agora me pode Também vai sofrer primeiro
Ministrar a tinta. Todo o trabalho da guerra.
Contudo, que te dilates
Aos mais preparos o discurso apronta:
Ele me diz que faça no pé de uma
Má laranja ponta,
E dele me sirva SONETOS
Em lugar de pluma. 2
Num fértil campo de soberbo Douro,
Dormindo sobre a relva, descansava,
LIRA II Quando vi que a Fortuna me mostrava,
Esprema a vil calúnia, muito embora, Com alegre semblante, o seu tesouro.
Entre as mãos denegridas e insolentes,
Os venenos das plantas De uma parte, um montão de prata e ouro
E das bravas serpentes; Com pedras de valor o chão curvava;
Aqui um cetro, ali um trono estava,
Chovam raios e raios, no meu rosto Pendiam coroas mil de grama e louro.
Não hás de ver, Marília, o medo escrito,
O medo perturbado, "Acabou", diz-me então, "a desventura:
Que infunde o vil delito. De quantos bens te exponho qual te agrada,
Pois benigna os concedo, vai, procura."
Podem muito, conheço, podem muito,
As fúrias infernais, que Pluto move127; Escolhi, acordei, e não vi nada:
Mas pode mais que todas Comigo assentei logo que a ventura
Um dedo só de Jove. Nunca chega a passar de ser sonhada.

Este deus converteu em flor mimosa,


A quem seu nome deram, a Narciso;
Fez de muitos os astros
Qu'inda no céu diviso128.

3
QUESTÃO
(VUNESP) Leia com atenção:
"O ser herói, Marília, não consiste
Em queimar os impérios: move a guerra,
Espalha o sangue humano,
E despovoa a terra
Também o mau tirano.
Consiste o ser herói em viver justo:
E tanto pode ser herói o pobre,
Como o maior augusto".

O trecho acima exemplifica uma das características do homem ilustrado do século XVIII e pertence a um dos poetas
que conseguiu aliar a ideologia do Iluminismo com a sensibilidade poética própria do Arcadismo. O autor do trecho e a
característica aí patente são, respectivamente:

a) Cláudio Manuel da Costa e o repúdio do poder militar representado por César Augusto e por Alexandre, o Grande,
presentes em outras estrofes do poema.
b) Silva Alvarenga e o elogio do homem comum que, por sua bondade inata e sua vida justa, contrasta com os grandes
conquistadores militares.
c) Alvarenga Peixoto e o louvor do homem que consegue assimilar o social ao natural.
d) Tomás Antônio Gonzaga e a exaltação do homem comum que se forma e se constrói segundo um ideal de bondade
inata e de urbanidade.
e) Tomás Antônio Gonzaga e a construção ideal de um homem heroico cuja medida seria a bondade inata, base de uma
vida harmonizadora das disposições individuais e das vicissitudes sociais.

Anotações:

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