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Abordagem Seis Sigma para o Processo de Definição de Preços e

Segmentação

Introdução: Seis Sigma não deve ser aplicado apenas em processos de redução de custos de
fabricação e operações logísticas – na verdade, ele pode se tornar o elemento essencial para criar a
estratégia de preços em uma empresa. Os conceitos de Seis Sigma permitem o desenvolvimento de
uma abordagem pró-ativa para a determinação estratégica de preços, possibilitando melhoria na
lucratividade. Através deste processo, evita-se negociações demoradas e sem valor agregado e,
conseqüentemente, a erosão de preços. O resultado final? Um lucro líquido maior.

Em um artigo intitulado “Six Sigma Pricing” (“Formação de Preços Seis Sigma”), recentemente
publicado na Harvard Business Review, ManMohan S. Sodhi e Navdeep S. Sodhi ilustram com
sucesso como um fabricante global de equipamentos industriais aplicou o rigor do Seis Sigma ao
processo de apreçamento. Além disso, eles também explicam corretamente os conceitos Seis Sigma e
suas aplicações. Por outro lado, seu artigo não trata do processo mais importante relacionado ao
gerenciamento de preços: a criação de uma estratégia de preços. Na verdade, eles solucionam um
processo de definição de preços em uma transação, ou seja, eles melhoram o processo que a
companhia utiliza para lidar com suas exceções. O ideal é que uma estratégia de apreçamento eficaz e
bem-sucedida evite completamente qualquer negociação com exceções de preço. Por essa razão, uma
abordagem ainda melhor para o uso das ferramentas Seis Sigma teria sido desenvolver as estratégias
de apreçamento da organização e definição da política de preços.
Além disso, como os autores selecionaram apenas um produto para ter os resultados rastreados, eles
criaram uma oportunidade para a força de vendas atender aos requisitos do novo processo de
aprovação. Estando em conformidade com as regras do produto examinado e oferecendo descontos
maiores em outros produtos, que não tiveram de seguir o novo processo, eles puderam negociar
facilmente com clientes para pagar o preço integral em um produto enquanto recebiam um desconto
maior em outros itens não contemplados no projeto.
Na realidade, os autores afirmam no artigo que eles conseguiram captar o valor integral do aumento de
preço do produto que eles selecionaram para rastrear, mas não conseguiram fazer o mesmo com o
restante das linhas de produtos. Isso confirma que quando começamos a executar políticas de
apreçamento em apenas um produto de uma companhia com uma variedade de produtos, o setor de
vendas facilmente encontra alternativas para negociar melhores preços com os clientes, caso tenham
permissão para tal, especialmente se não forem avaliados ou recompensados por lucratividade.
Portanto, neste artigo, descreverei como os conceitos Six Sigma podem ser aplicados em um sentido
mais amplo, incluindo “todos os clientes” (mais de 5.000) e “todos os produtos” (mais de 1.000 SKUs)
de uma organização em uma divisão de uma companhia industrial global de cuidados com a saúde,
que chamarei de ACME Inc. Esse foi um Projeto Faixa Preta em Seis Sigma desenvolvido em 2002 e
completamente implementado em 2003. Após 4 anos ainda está gerando melhorias de preços e
impacto na lucratividade. Com a possibilidade de gerenciar melhores preços, evita-se as negociações
demoradas e sem valor agregado e, conseqüentemente, a erosão de preços.

O Problema
A ACME é a líder de mercado nesta indústria de material médico. Devido ao número de concorrentes
no mercado e novos substitutos com tecnologias mais avançadas, a linha de produtos desta divisão está
em seu estágio de maturidade no famoso gráfico de ciclo de vida dos produtos. Seus produtos são
amplamente utilizados em hospitais em todo o país. Os preços variam de acordo com as diferentes
características dos componentes dos produtos, bem como de acordo com seu uso por difernetes
segmentos de profissionais da saúde. O portfolio de produtos é muito abrangente, com mais de 1.000
SKUs, e preços de tabela variando de US$50 por caixa para um produto não-diferenciado a US$1.500
por caixa para um produto muito exclusivo e diferenciado.
Com 65% da participação de mercado, a ACME era a líder incontestável em qualidade, serviços e
preços até 2001. Os concorrentes eram, em geral, seus seguidores tanto da qualidade quanto da política
de preços. Normalmente, a concorrência utilizava uma estratégia de guerra de preços, ou seja,
qualquer que fosse a cotação da ACME, eles reduziam seus preços em 20%, 30% e até 50% apenas
para ganhar a negociação. Com esse tipo de pressão nos preços e com uma mentalidade de
participação no mercado, a alta gerência permitiu que os preços fossem livremente negociados pelos
representantes de vendas com um desconto de até 65% no preço de tabela. Os gerentes de vendas
tinham uma liberdade de ação maior, que chegava a 80% de desconto. A força de vendas manipulava
os preços de uma forma independente, sempre priorizando o domínio na participação de mercado.
Pedidos com descontos maiores eram submetidos à aprovação de Marketing que, às vezes, era
surpreendido com descontos de até 91%. A média de descontos para a ACME no fim de 2001 foi de
67% dos preços de tabela.
No fim de 2001, grupos de compras hospitalares (GCH) começaram a analisar os preços pagos para o
mesmo código de produto para diferentes clientes afiliados aos respectivos grupos. Durante esse
período, mais e mais clientes começaram a trocar informações sobre os preços pagos a ACME.
Em março de 2002, a alta gerência foi chamada para duas reuniões com as GCHs mais importantes
para explicar uma variabilidade de preços de mais de 500% para o mesmo produto, com a mesma
embalagem e o mesmo código para clientes similares. Aquele produto era o código de maior venda da
ACME, com preços de mercado variando de US$12.79 (84% de desconto) por caixa a US$80 por
caixa (preço de tabela).
À medida que as GCHs analisavam os preços que seus associados estavam pagando à ACME, elas
perceberam que os clientes maiores e mais fiéis estavam pagando preços mais elevados que os clientes
menores e menos fiéis (Veja o Gráfico 1, para ilustração). Duas grandes GCHs solicitaram que todo o
volume de sua compra fosse vendido pelo menor preço dado a um de seus associados.

Gráfico 1 – Qual é o Preço Certo?


Quando a equipe do Projeto Seis Sigma da ACME mapeou um dos códigos da empresa, foi
confirmado que os preços foram estabelecidos sem nenhum critério e que clientes maiores e mais fiéis
poderiam estar pagando mais que os clientes menores e não-fiéis.
Amostra de 30 pedidos de diferentes clientes. O eixo Y mostra o volume em unidades e o eixo X, a
quantia paga por cliente diferente.

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O Projeto
Definição
Os preços customizados e ocultos (não transparentes ao mercado em geral) foram úteis à ACME até
aquele momento, mas agora uma mudança seria necessária. A ACME precisava de uma alteração
imediata nas políticas, execução e cultura da definição de preços. Uma equipe de projeto foi formada,
incluindo o gerente de marketing regional da unidade de negócios, o controller regional, dois gerentes
de vendas experientes, um gerente de finanças, um funcionário de supply chain e outro do serviço de
atendimento ao cliente. O projeto foi liderado pelo gerente de marketing regional, que o desenvolveu
como um projeto Faixa Preta em Seis sigma com o suporte de um Master Black Belt corporativo.
Como em qualquer projeto Seis Sigma, a equipe iniciou seu trabalho com a definição de metas e
fronteiras baseadas no atual conhecimento do negócio, necessidades dos clientes e definição do
processo que requer melhoria. Nosso problema foi definido como a inexplicável variabilidade de
preços para um determinado código para qualquer segmento de clientes ACME. Ou seja, objetivamos
redefinir as políticas de desconto de preços, segmentar nossa base de clientes e definir as faixas de
preço para cada código de um determinado segmento de clientes, e ainda permitir uma faixa muito
pequena para negociação. Resumindo, um novo menu de preços seria estabelecido.
A equipe decidiu trabalhar como objetivos em um lucro bruto total ao invés de em receitas máximas
para mostrar que estávamos dispostos a perder alguma participação de mercado e vendas se
pudéssemos melhorar a lucratividade durante a jornada. Além disso, o objetivo mais importante no
lado não-financeiro foi mudar a cultura da organização de uma mentalidade de uma força de vendas
voltada para a participação de mercado para uma cultura de gerenciamento de lucratividade através de
melhores preços.
Antes de coletar os dados, a equipe desenhou um gráfico de Fornecedores, Informação, Processo,
Resultados e Clientes (Ou SIPOC, em Inglês – Suppliers, Inputs, Process, Outputs, Customers – veja
Gráfico 2, para mais detalhes).
O próximo passo foi conduzir uma análise de stakeholders (envolvidos) para todos os clientes listados
no SIPOC. Conforme iniciamos as entrevistas, até os gerentes de vendas de alto perfil estavam com
medo de perder poder nas decisões de preço com a implementação do projeto.
A partir das entrevistas do tipo “Voz do Cliente”, transformamos todos os comentários, idéias e
preocupações naquilo que chamamos de “Árvore de Fatores Críticos para a Qualidade” (CTQ, em
Inglês – Critical To Quality Tree). Essa é uma outra ferramenta Seis Sigma que permite que a equipe
parta de resultados desejados para métricas e requisitos claramente definidos (veja Gráfico 3, para um
exemplo de um CTQ desse projeto). Por fim, a equipe elaborou o processo completo que seria
analisado.

Medir
Com todas as etapas listadas na fase anterior, o grupo usou uma outra ferramenta Seis Sigma chamada
Matriz de Priorização para identificar as etapas mais importantes que deveriam ser realizadas para
atingir os objetivos do projeto.
A Matriz de Priorização identificou três questões-chave: definição de políticas de preços (menus de
preços), segmentação de produtos e segmentação de clientes.
Além disso, a equipe criou um gráfico de causa-e-efeito do processo atual, incluindo todas as etapas
envolvidas, desde a determinação de tabelas de preços até preços faturados aos clientes, mais uma vez
identificando os três problemas prioritários a ser direcionados.
Gráfico 2 – Projeto SIPOC

S I P O C
Marketing Posicionamento do Produto Segmentação de Clientes Marketing
Políticas de Preços Harmonização de Preços
Vendas Estratégia de Contas Programa de
Concorrentes Treinamento Força de Vendas
Necessidades dos Clientes Ferramenta de Preços
Propostas/Contratos Gerenciamento
Finanças Objetivos das Vendas Processo de Definição Gerente da Franquia
Dados Vendas/Financeiros Preços Diretoria L.A.
Gerente da Direção Estratégica
Franquia Gerente da Franquia
Diretoria L. A. Suporte ao champion Controle/Medidas Marketing
Direção estratégica Gerência de Vendas
PERLA Recursos
Requisitos do sistema

Comunicar a Negociação de
Determinar Estabelecer faixas política de preços Monitora-
vendas/preços de
segmentação de preços e fornecer mento
ferramentas faturamento com
de clientes/ baseadas na e controle
para sua o cliente
produtos segmentação
implementação
Gráfico 3 – Árvore CTQ
Neces- 2º Nível – 3 º Nível –
Métricas Requisitos
sidade Direcionadores CTQs

Alvo % preços
Preços de Alvo e Política de Preços mínimo por código
Mínimos Estabelecida
PDT

Aumento de ASP
em 10% ASP 10% maior que
ASP
no último ano
(operacionalmente)

No máximo, 3% do
Processo de Controle sobre % dos Pedidos
total de pedidos
Reduzir Gerenciamento de preços ad hoc
Variabilidade Propostas
de Preços
Manter dados Base de Dados das Manter 5 anos de
históricos para Propostas dados
melhorar decisões
Coeficiente de Dos 30% a 15%
Variabilidade de
Flexibilidade Limitada Variância atuais
preços dentro de
aos Representantes um desvio padrão

Respeitar Lista de preços com Preços reais de acordo


Posicionamento / nova segmentação com especificações
Segmentação de
Preços

Analisar
A primeira ferramenta usada nesta etapa foi um Gráfico de Pareto para identificar de onde vinha a
maioria das vendas: 40% das vendas eram destinadas a distribuidores; 30% para clientes privados;
15% para clientes públicos; 12% para contas-chave (clientes por contrato), e 3% para outros tipos de
clientes. Todos os clientes seriam agrupados pelo modelo tradicional (distribuidores, hospitais
privados, etc) e em seguida seriam segmentados, através de outros fatores diferentes. Por exemplo,
vendas, histórico de pagamento, mix de produtos, entre outros.
A equipe concordou sobre os fatores que deveriam influenciar as decisões de apreçamento para a força
de vendas: tipo de cliente (privado, público, conta-chave, sem fins lucrativos, etc.), prazos de
pagamento (30, 60 ou 90 dias para faturamento, histórico de pagamentos, etc), território do
representante de vendas (localidade do cliente) e volume total de compras (tamanho da compra).
Então, selecionamos alguns códigos e fizemos análises de regressão, nas quais o preço real faturado
deveria ser explicado por esses fatores (variáveis).
A grande surpresa: o fator mais importante foi a representatividade de vendas. Ou seja,
independentemente do tipo de cliente, volume comprado ou termos de pagamento, caso estivesse
localizado em uma determinada região (ou seja, pertencer a um determinado representante), os preços
estavam próximos entre si. Isto é, a variável mais importante era quem era o vendedor da área. A
segunda variável (fator) mais importante foi o tamanho do pedido. Em geral, quanto maior o pedido,
menor o preço. Essa segunda descoberta foi um alívio porque acreditamos que fazia sentido
recompensar os clientes pelo tamanho de seu pedido. No entanto, poucos preços puderam ser
explicados pelas equações da análise de regressão.
A terceira ferramenta analítica usada foi o teste-t das amostras. Usamos essas análises para ver se a
data do pedido influenciava nas decisões de preço. Isso foi necessário porque havia uma percepção
comum de que quando chegávamos perto do fim do trimestre, os preços erodiam para que negociações
fossem feitas, e a venda, concluída. No entanto, o que a equipe observou foi que os preços
permaneceram estatisticamente inalterados (as médias estavam realmente mais baixas, mas não por
um valor estatisticamente significativo).
Outra análise foi realizada através da técnica Anova. Nessa etapa, a equipe queria entender melhor se
tipo de cliente influenciava os preços. Aqui, outra surpresa. Os distribuidores recebiam um desconto
estatisticamente inferior do que outros tipos de clientes. Após mais investigações, concluímos que isso
estava acontecendo porque os distribuidores neste mercado geralmente têm acordos de exclusividade.
Portanto, todas as vezes que a ACME elevava seus preços, os aumentos tinham efeito imediato nos
distribuidores. Mas, para outros clientes diretos, um processo de negociação retardava ou evitava os
aumentos da tabela de preços.
Outras ferramentas estatísticas foram usadas durante essa fase para demonstrar oportunidades que a
ACME poderia ter com suas políticas de preço. Muitas investigações e análises também ajudaram a
confirmar com dados substanciados algumas das percepções negativas que os gerentes do grupo
tinham em relação à definição de preços
Finalmente, usamos uma ferramenta chamada Análise de Capabilidade para entender com quanto de
desconto cada código da organização estava sendo vendido. Isso permitiu que a equipe identificasse os
códigos mais sensíveis aos preços, bem como visualizasse qual seria a faixa ideal à qual o produto
deveria ser ajustado para captar maior volume e, com isso, reduzir a variabilidade.

Inovando
Depois que as análises foram finalizadas e com todos os CTQs em mente, a equipe se sentiu pronta
para desenvolver, avaliar e implementar soluções direcionadas para as causas verificadas que estavam
afetando o processo. A meta nessa fase foi demonstrar com dados que as soluções propostas
resolveriam o problema e levariam à melhoria do processo. De fato, baseado em tudo que aprendemos
durante o projeto, a equipe decidiu que a solução deveria incluir:
1. Nova segmentação de clientes
2. Nova segmentação de produtos
3. Criação de um menu de preços relacionado à segmentação de clientes e produtos
4. Treinar a força de vendas na definição de preços baseada no valor
5. Demonstrar para a organização os retornos financeiros esperados
6. Explicação do racional de mercado por trás do novo menu de preços
7. Recompensar a força de vendas sobre a lucratividade e não sobre participação no
mercado/volume
8. Suporte à força de vendas com ferramentas que facilitem a implementação
9. Manter o controle de preços e monitorar a implementação

A solução se iniciou com uma visão de que deveríamos ter clientes segmentados em como eles
percebem o valor de nossos produtos e serviços. Para isso, desenvolvemos uma segmentação de nosso
banco de dados de clientes, levando em consideração os seguintes fatores: total de vendas atuais
(tamanho do cliente), mix de produtos (componente estratégico: produtos mais complexos, maior
necessidade de qualidade, maior percepção de valor em nossos produtos), e tipo de clientes (visando
comportamento e conveniência de compras).
A segmentação de clientes começou com tipos de clientes, seguida pelo desenvolvimento de uma
matriz para cada tipo de cliente. Abaixo, ilustramos a matriz para a segmentação de clientes privados.

Alto B Key
Diferenciação

Curva de Preços:
Bx Maior para Menor
C A

Volume Baixo Alto

Essa matriz mostra que um cliente privado, com um volume muito grande e que compra produtos
altamente diferenciados, é considerado um cliente Chave (Key) para a ACME Inc. Isso, no entanto,
não garantiria preços mais baixos – se o cliente chave precisasse de produtos diferenciados (alguns dos
quais apenas a ACME poderia fornecer), um melhor serviço de atendimento ao cliente, ou entrega
mais rápida de itens de baixa movimentação, eles tenderiam a ser mais fiéis e menos sensíveis a preços
do que outros. Além disso, melhores serviços seriam garantidos para clientes chave, geralmente com
pedidos online, envio no mesmo dia e suporte da força de vendas, entre outros benefícios. Portanto, os
segundos melhores preços foram oferecidos a eles. De fato, os melhores preços seriam garantidos
apenas para contas grandes com necessidades não-diferenciadas. Para essas contas, que denominamos
clientes A, a ACME ofereceria os preços mais baixos, justificados por um baixo custo devido ao
atendimento com tempos de ciclo de entregas mais longos, menos suporte da força de vendas e sem
um inventário dedicado, etc.
Resumindo, decidimos que nossos preços deveriam ser diferentes para cada segmento de clientes.
Além disso, eles deveriam respeitar uma hierarquia na qual os clientes A teriam os preços mais baixos,
depois os clientes chave (key), seguidos pelos clientes B. Também criamos um segmento de clientes
C, atendidos por nosso departamento de telemarketing ou esporádicas visitas. Os clientes C também
teriam os preços mais altos. Portanto, a maior parte do volume neste segmento teria maior chance de
ser perdido.
O lado da equação da segmentação de clientes estava resolvido; no entanto, a equipe ainda estava
sentindo falta da segmentação de produtos. Essa parte era ainda mais complexa dado o número de
itens (mais de 1.000 Stock Units - SKUs) e os diferentes usos de cada produto. A solução foi
desenvolver uma análise conjunta com atributos relevantes dos produtos e conduzir uma pesquisa com
os principais líderes de opinião nas especialides mais importantes, isto é, os usuários finais (observem
que não fizemos a pesquisa com os compradores econômicos). Isso foi feito para compreender
completamente o valor de cada característica do produto apenas para o usuário final. A partir da
análise, desenvolvemos índices para cada atributo dos produtos e criamos um banco de dados onde
inserimos as características do produto para obter a sugestão do preço médio para aquele produto.
Com o novo preço médio a ser cobrado para venda, desenvolvemos um novo preço de tabela sugerido,
refletindo os conceitos baseados em valor a partir de usuários finais. Esta nova tabela levou a
aumentos de preços em mais de 300% para um código específico, que era de grande valor para os
nossos clientes e estava abaixo do preço. No entanto, isso também permitiu algumas reduções de
preço, incluindo uma redução de até 20% em um código que não tinha nenhuma diferenciação e havia
perdido muito mercado pelas ofertas dos concorrentes. O impacto líquido da nova tabela de preços,
comparada com anterior, foi de um aumento de 8,5%.
Com a tabela de preços refletindo a nova segmentação de produtos e aplicando a segmentação de
clientes desenvolvida, a equipe começou a estabelecer os descontos para cada produto de cada
segmento. Mais uma vez aqui, usamos a ferramenta camada de Controle da Análise de Capabilidade
para ajudar a determinar o nível certo de desconto para cada segmento. Em média, obtivemos
descontos de 67% a 55%. Portanto, estávamos esperando um ganho de preços em duas áreas: preços
de tabela maiores e desconto médio menor.
Com as segmentações de produtos e clientes prontas, a equipe combinou ambas para criar o menu de
preços. À medida que desenvolvíamos o menu de preços final, um componente de flexibilidade era
acrescentado onde o representante de vendas poderia reduzir ou aumentar o desconto tabelado em 3%.
Na realidade, os preços tabelados nos segmentos tinham um diferencial de exatamente 3%. Isso foi
feito para garantir que o pior preço oferecido a um cliente B não fosse superior ao melhor preço
oferecido ao cliente C. Essas barreiras foram muito úteis posteriormente para explicar e justificar as
novas políticas de preços para os clientes. Além disso, acreditamos que permitir que a força de vendas
negociasse uma pequena faixa de descontos poderia acalmá-la um pouco, já que os representantes
viviam em uma cultura na qual a negociação de preços era bastante estimulada.
Para facilitar essa mudança para os representantes de vendas, desenvolvemos um programa de
treinamento sobre preços baseados no valor percebido pelos clientes e habilidades de negociação. Para
ajudá-los a analisar a situação em uma base cliente-por-cliente, o representante poderia aplicar
algumas características de seu cliente em uma planilha, que mostraria as taxas de desconto para aquele
determinado segmento de clientes. Quando inseria o código do produto levaria a um preço tabelado,
com o desconto correto para aquele segmento. Além disso, se esse for um cliente antigo, descontos e
preços atuais (isto é, antes da implementação do projeto) apareceriam em uma coluna e na outra
coluna a informação já com a mudança de preços para aquele código específico naquele segmento de
clientes.
Uma das etapas finais da solução, antes de implementar este projeto, foi desenvolver uma análise da
situação. Primeiro, fizemos uma simulação mostrando quanto volume estaria em risco se
implementássemos a nova segmentação nos níveis de preços atuais. Calculamos o cenário de pior
caso: uma perda máxima de volume de aproximadamente 17% se não pudéssemos convencer nenhum
cliente, que estava pagando muito pouco, a pagar mais. Observe que 17% do volume total
representava 100% do volume que tinham preços abaixo das faixas criadas com a nova segmentação
de clientes e produtos.
Além disso, perguntamos aos gerentes de vendas quanto em volume eles perderiam por segmento de
cliente se eles tivessem de aumentar os preços para a nova segmentação proposta. Segundo seu
julgamento gerencial, a perda seria de aproximadamente 9% do volume. A equipe de projeto
considerou essa estimativa muito pessimista, especialmente porque os gerentes de vendas estavam
assumindo que perderíamos uma porção significativa do volume abaixo da faixa para clientes A e
clientes chave. No entanto, conseguimos demonstrar que se perdêssemos 9% em volume, dado o
aumento nas margens com os novos preços e segmentações de clientes, mesmo assim empataríamos.
Ou seja, nenhum efeito na lucratividade. Evidentemente, esse não era o resultado desejado, mas
usamos essa informação para demonstrar que existia apenas um pequeno risco no impacto do projeto.
Mesmo se perdêssemos todos os 9% do volume estimado pelos gerentes de vendas, isso não traria
mudança nos atuais níveis de lucratividade.
No entanto, para colher benefícios significativos e atingir a meta do projeto, teríamos de minimizar a
perda de volume para, no máximo, 6%. Com mais análise de dados, detalhando cliente por cliente,
para medir o impacto e a probabilidade de perder a conta, determinamos que o cenário mais provável
reduziria nosso volume em apenas 4,5%. Com este cenário, os lucros trazidos com os novos preços
seriam suficientes para compensar a queda em unidades, aumentando as receitas e o lucro bruto em
mais do que estávamos esperando originalmente quando desenvolvemos o escopo do projeto.
A implementação da nova abordagem de apreçamento começou com uma estratégia de comunicação
para clientes sobre a nova tabela de preços e a nova segmentação de clientes que a companhia estava
criando. Em agosto de 2002, a nova tabela de preços foi enviada ao mercado com uma carta da alta
gerência, explicando as maiores mudanças na política de preços que ocorreriam em janeiro de 2003.
Em outubro de 2002, a planilha com as políticas da nova segmentação foi enviada aos representantes
de vendas com uma comparação cliente por cliente do impacto dos novos preços. Em alguns casos, o
aumento médio ultrapassou 40% da quantidade total paga pelo hospital, caso o volume e o mix de
produtos permanecessem inalterados.
O programa de treinamento sobre preços baseados em valor e uma explicação completa de como a
nova planilha (denominada Pricing Determination Tool – PDT (Ferramenta de Determinação de
Preços) funcionava foram oferecidos a toda a equipe de vendas. Nesse ponto, os representantes
apresentaram muita resistência, especialmente quando foram informados de que a faixa de
negociações de preços reduziria os descontos de uma faixa entre 0%-80% para algo em torno de 52%-
58%. A maior preocupação foi em relação à perda da receita que esse novo esquema de preços traria,
já que alguns clientes que estavam pagando o preço integral veriam, repentinamente, seus preços
serem reduzidos; ou seja, eles estavam aceitando altos preços antes, então por que deveríamos reduzi-
los? Outro problema seria com os clientes pequenos, que estavam pagando preços muito baixos. Nesse
caso, assumiríamos o risco de perder volume quando eles vissem seus preços aumentando.
A explicação baseou-se em dados consolidados e, durante as duas segmentações (clientes e produtos),
mantivemos o foco no preço médio de venda, elevando-o o suficiente para compensar as perdas em
potencial. Aproveitamos a oportunidade para modificar a política de definição de preços da empresa e
elevamos os preços médios de tabela, bem como reduzimos os descontos.
Uma parte muito importante do projeto foi estabelecer a estratégia de implementação desses novos
preços com clientes. Tivemos de estar preparados para vender a nova abordagem aos clientes. A
estratégia que decidimos usar foi baseada na transparência de preços e preços justos (veja mais
detalhes no artigo relacionado no rodapé da página).
Por fim, a compensação da equipe de vendas foi alterada para refletir como cada uma conseguiria
implementar a nova estrutura de preços. Até 20% de sua remuneração, agora, viriam de objetivos de
lucros e da redução do número de exceções de preços.

O Resultado Final
Este projeto foi colocado em prática em outubro de 2002. Depois de três anos, a ACME viu as receitas
dessa divisão crescerem mais de 40% (quase que exclusivamente em através de preço). Muito deste
impacto ocorreu devido à iniciativa de apreçamento ser completamente disseminada e aprimorada com
o decorrer do tempo. Nos primeiros seis meses de 2003, observou-se uma queda considerável –
aproximadamente 10% – em unidades. Muitos clientes, que tiveram seus preços aumentados, não
aceitaram isso no início. Tentaram produtos alternativos ou negociaram tempo para implementar os
novos preços. Contudo, após seis meses, o mercado se ajustou à nova estratégia. Concorrentes
seguiram essa política e alguns clientes começaram a voltar após experiências infelizes com outros
produtos. De fato, a queda do volume total ficou em apenas 3,5%, se compararmos unidades vendidas
acumuladas entre janeiro e setembro de 2005 com unidades vendidas entre janeiro até setembro de
2002. Dado o estágio do ciclo de vida dessa linha de produtos, que está maduro e indo para o declínio,
os resultados são expressivos.
Além disso, as decisões estratégicas de preços agora são tomadas na matriz. A força de vendas tem
pouca liberdade de ação para negociar; portanto, sua capacidade em prejudicar o posicionamento do
produto foi completamente neutralizada, pois o sistema nem mesmo permite receber pedidos com
descontos abaixo das tabelas. Os representantes de vendas podem dizer aos clientes que ninguém pode
ser cobrado com preços abaixo do tabelado e eles podem dar o máximo de desconto permitido
(desconto tabelado mais 3%). Além disso, o departamento de vendas mudou drasticamente.
Habilidades de vendas técnicas específicas são obrigatórias para o sucesso da nova abordagem de
preços. Ao invés dos negociadores que costumamos ter, procuramos por pessoas mais estratégicas,
técnicas, e orientadas para o serviço, as quais consigam explicar e justificar os preços premium para os
clientes. Uma outra mudança ocorreu com os gerentes de vendas e gerentes de marketing que não
perdem mais longas horas valiosas pechinchando preços com a força de vendas. Na verdade, eles
usam melhor seu tempo com outras atividades de valor agregado. De fato, a cultura da organização
mudou. Agora, toda a divisão entende a importância estratégica de administrar preços
estrategicamente.

Conclusões
Um projeto como este traz oportunidades que a ACME, e qualquer outra organização com interesse
em aprender, pode aplicar com investimento muito baixo e grande potencial para retornos. Como em
qualquer mudança de processo dessa magnitude, muitas lições podem ser aprendidas. A primeira é que
os projetos Seis Sigma podem e devem ser aplicados a processos além da fabricação e supply chain.
Segundo, durante a fase crítica de implementação aprendemos que os clientes não reclamam muito dos
aumentos de preço se eles souberem que estão pagando o mesmo preço que seus concorrentes do
mesmo segmento1. Terceiro, há muitas decisões que uma companhia pode tomar para melhorar a
média de seus preços de vendas e, conseqüentemente, lucros sem ser percebida como monopolista ou
agressiva demais. Quarto, ao comunicar suas intenções para o mercado é importantíssimo dar tempo
suficiente para ajustes e aceitação. Na verdade, os concorrentes da ACME conseguiram entender a
nova estratégia em alguns meses e também surgiram com arranjos similares, seguindo a liderança de
preços estabelecida pela ACME. Finalmente, a ACME também mudou seu sistema de compensação
para recompensar representantes de vendas não apenas por volume, mas também por lucro. Conforme
implementamos o projeto e alguns dos representantes começaram a obter sucesso com a nova
segmentação, usamos esses exemplos para aprimorar a qualidade da nova estratégia e o grande
resultado que ela traria à companhia.

1
Transparência e imparcialidade. Veja Xia, Monroe and Cox (2004), “The Price Is Unfair! A Conceptual Framework of
Price Fairness Perceptions,” Journal of Marketing, 68 (October), 1-15.

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