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Vale Transporte Crédito

Trabalho em uma empresa á dois anos, e agora estou saindo; recebo o vale
transporte pelo cartão ônibus e como as vezes eu ai de carona para o serviço, os vales foram
acumulando, e agora o cartão tem cerca de R$ de credito (recebo cerca de R& 120,00 de
vale por mês), gostaria de saber seu eu tenho direito aos vales que acumularam no cartão,
uma vez que a empresa recolhe o mesmo.

Não tem, não. Tem-se que o vale-transporte constitui benefício destituído de


natureza salarial, não se incorporando à remuneração do beneficiário para quaisquer efeitos.
E arriscaria dizer o seguinte: a não utilização dos vales-transporte pelo empregado, que os
oculta, digo, guarda porque utiliza-se de meio de transporte próprio ou de terceiro (carona,
p. ex.) sem comunicar o seu empregador, pode constitui falta disciplinar. Se não necessitou
deles, deveria ter renunciado o direito de recebê-los. Nesse sentido:

VALE TRANSPORTE - Direito renunciável. O fornecimento de vale-transporte não constitui


direito irrenunciável, podendo o empregado dele dispor se não necessitar de transporte
coletivo ao seu deslocamento residência-trabalho e vice-versa, devendo para tanto
manifestar expressamente sua renúncia. (TRT - 12.ª Região - 2.ª Turma, Ac. n.º 10734/99,
Rel. Juiz Jorge Luiz Volpato, DJSC 18.10.99, p. 108)

Em tempo: menciono "vales-transporte", mas estou ciente se tratar de cartão eletrônico;


aqui, no Rio de Janeiro, é o RioCard, emitido pela Fetranspor, sistema de pagamento das
tarifas no transporte público urbano e semi-urbano de passageiros instituído pelo Decreto n.º
27.454, de 27 de novembro de 2000. Portanto, quando ler "vales-transporte", leve em
consideração que me refiro ao cartão eletrônico e/ou aos créditos nele contidos.

A Justiça do Trabalho costuma dizer que aquele empregado que faz uso irregular do vale-
transporte pratica ato de indisciplina, o que pode constituir falta grave à luz das normas
trabalhistas, e, pois, acarretar a rescisão do contrato individual de trabalho por justa causa
do empregado faltoso. Reputo ser uma medida muito enérgica... Lembro-me de muitos
empregados que comercializavam os vales que recebiam!

Passo a explicar.

O direito ao recebimento de vales-transporte, garantido pela Lei n.º 7.418, de 16 de


dezembro de 1985, regulamentado pelo Decreto n.º 95.247, de 17 de novembro de 1997, e
pela Lei n.º 7.619, de 30 de setembro de 1987, é uma ficção jurídica fundada na presunção
da necessidade do trabalhador receber o benefício para deslocar-se para seu local de
trabalho. Para ilustrar isso, não se pode atribuir ao trabalhador o ônus de comprovar a
necessidade de receber o que é de seu direito. A jurisprudência é rica quanto a isso, senão
vejamos:

VALE TRANSPORTE - As normas trabalhistas devem ser interpretadas no sentido de conceder


aos trabalhadores os benefícios e direitos nelas previstos e não de forma a obstar seu
exercício. Embora o art. 7.º, inciso I e II do Decreto 95.247/87, que regulamentou as leis
que instituíram o vale-transporte, estabeleça como condição de exercício daquele direito que
o empregado informe por escrito a seu empregador seu endereço residencial e a linha de
transporte utilizada em seu trajeto de ida e volta do trabalho, isto não quer dizer que ao
empregador (a parte que tem melhores condições de produzir prova documental, em
qualquer relação de emprego) baste alegar em juízo que seus empregados não se
interessaram pelo recebimento daquela vantagem, sem nada precisar provar. É que não se
pode atribuir à parte hipossuficiente o onus probandi do cumprimento de requisito
meramente formal para a fruição de direito cogente, de incidência genérica e imperativa a
toda relação empregatícia, sendo razoável presumir que seu exercício é de interesse de todo
e qualquer trabalhador. Nesta linha de raciocínio, cabe sempre por inteiro à empregadora,
em princípio, o ônus de provar concretamente em juízo o fato extraordinário de que o
empregado não pleiteou aquele direito. (TRT 3.ª Região - 8.ª Turma - 00027-2003-030-03-
00-9 RO, Rel. Juiz Heriberto de Castro, DJMG 09/08/2003, p. 16).

VALE -TRANSPORTE - O fornecimento de vale-transporte pelo empregador é compulsório,


pois a norma a regulamentar a vantagem é de ordem pública, de aplicação imperativa, não
se admitindo a renúncia ou transação, mormente, quando resultando cristalino e evidente
prejuízo para o empregado. Assim, em se tratando de obrigação do empregador o
fornecimento dos vales-transporte, o que inocorreu na espécie, faz jus o autor a parcela. No
entanto, nos primeiros nove meses da contratualidade o reclamante confessa não ter
requerido a vantagem. Recurso parcialmente provido. (TRT 4.ª Região – RO 00406.304/01-7
- 5.ª Turma, Rel.ª Juíza Conv. Flávia Lorena Pacheco, j. 13.11.2003)

Quando o empregador os adquire, o faz na exata medida da sua necessidade de prover o


benefício a seus funcionários, atendendo aos seus interesses e também ao disposto no art.
19 do regulamento da Lei n.º 7.418/85 (Decreto n.º 95.247/87) - no caso do RioCard, provê
os valores correspondentes às tarifas despendidas ao longo do mês, e que serão validados
no cartão. E o empregado recebe exatamente a quantidade de que precisa para seu
deslocamento lar-trabalho/trabalho-lar (vide art. 2.º). Ao recebê-los (ou o cartão eletrônico
com o saldo correspondente ao número de viagens que fará), o empregado firma recibo e
compromisso de sua utilização exclusiva para o transporte a que alude o art. 2.º do referido
decreto. Daí geralmente (salvo casos esparsos) incidir em falta grave, pela prática de ato de
indisciplina, nos termos do art. 7.º, § 3.º do Decreto n.º 95.247/87, c/c art. 482, h, da CLT,
o empregado que comercializa os vales que recebe para uso exclusivo no transporte de ida e
volta do percurso casa-trabalho.

O empregador antecipa os vales-transporte ao empregado, indispensáveis à prestação dos


serviços, cumprindo-se a finalidade da Lei n.º 7.418/85 e seu regulamento, para os dias de
serviço, até o primeiro dia útil do mês em que os mesmos serão utilizados em número
suficiente para os dias úteis do mês, incluindo-se também os dias de serviço prestados em
dia de folga. E o desconto dos percentuais permitidos (6%), incidirá apenas sobre os salários
dos dias em que efetivamente há o fornecimento dos mesmos. Seja qual for a forma (vale ou
dinheiro, quando a lei permitir; art. 5.º, do Decreto n.º 95.247/87).

Em conseqüência, percebe-se que as normas de Direito do Trabalho são na maioria


imperativas, cogentes, limitando o Estado deliberadamente a autonomia da vontade em face
da necessidade de proteger o economicamente fraco, o trabalhador, aquele ser que no
tempo em que não havia tíquete-refeição ou vale-transporte despendia boa parte do seu
tempo fazendo trajeto a pé até o trabalho e vice-versa, chegando cansado no local de
trabalho, e exausto e faminto em casa. Ou também aquele ser que costumava utilizar o
dinheiro destinado à alimentação em transporte... Trabalhador era (e ainda é, infelizmente)
sinônimo de gente que vive espremida entre o dinheiro da passagem e o dinheiro da
alimentação, mesmo com o advento desses benefícios (ticket-refeição e vale-transporte).
Logo, a disponibilidade de direitos sofre limitações, quer no tocante à renúncia, quer no
tocante à transação, pois não seria coerente que o ordenamento jurídico assegurasse ao
empregado garantias mínimas e depois deixasse esses direitos subordinados à sua vontade
ou à vontade do empregador.

Em remate, reitero que o empregado não teria direito ao saldo restante, não utilizado nos
períodos relativos aos meses em que prestou serviços a seu empregador, considerando que,
ao contrário do papel, o saldo existente no cartão não possui validade, sendo que ficará
automaticamente bloqueado em caso de permanecer mais de 120 dias sem uso (Manual do
comprador do vale-transporte eletrônico, p. 38 ).

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