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Por que existe vida?

Osho,
Eu nunca fui capaz de encontrar resposta para uma pergunta.
É uma pergunta estúpida, mas mesmo assim eu queria muito saber a resposta.
Você poderia nos dizer qual é o propósito da criação? Por que a vida existe?
Por que todas as coisas existem? Eu não acredito em acidentes.

Prem Patrick,
A pergunta é certamente estúpida... Você está absolutamente certo a respeito disso. E a
pergunta não é respondível. Qualquer pessoa que respondê-la irá somente criar alguns
questionamentos a mais em você. Você não foi capaz de encontrar qualquer resposta porque não
existe resposta. A vida é um mistério, por isso essa pergunta não pode ser respondida. Você não
pode perguntar o porquê. Se o porquê for respondido, a vida deixa de ser um mistério.
Esse é todo o esforço da ciência: destruir o mistério da vida. E a maneira é encontrar respostas
para todos os porquês. E a ciência acredita, naturalmente com arrogância e ignorância, que um dia
ela será capaz de responder a todos os porquês. Isso não é possível. Mesmo se nós respondermos
a todos os porquês, o último dos porquês permanecerá: por que a vida existe, afinal? Qual o
significado da existência? Qual é o propósito de tudo isso? Essa pergunta é a última e ela não pode
ser respondida.
Se alguém lhe der uma resposta, ela simplesmente irá criar um novo questionamento. E
respostas já têm sido dadas... Algumas pessoas acreditam que Deus criou o mundo porque queria
ajudar a humanidade. Agora, que tipo de resposta é essa? Ele criou a humanidade para ajudar a
humanidade. Qual era a necessidade de criar? Alguns outros dizem que Deus criou o mundo porque
ele estava se sentindo muito solitário. Se Deus estava se sentindo mal muito só, então não existe
qualquer possibilidade de alguém se tornar um Buda.
E se Deus de repente começou a se sentir solitário, então o que ele estava fazendo antes de
criar o mundo? Por toda a eternidade ele tem estado só... então de repente , num dia, numa manhã,
ele ficou enlouquecido, ou o que? De repente ele começou a se sentir solitário depois do almoço. E
qual era a necessidade de criar todo o mundo? Apenas uma mulher já teria sido o suficiente!
E agora, como ele está se sentindo hoje? Muito cheio de gente? Gente em demasia pelas
ruas? Deve estar planejando destruir o mundo em breve. Sobre que tipo de Deus você está falando?
O seu Deus é uma pessoa que pode se sentir solitário?
Todas essas são respostas tolas para perguntas tolas.
Então existem pessoas que dirão: isso é um jogo de Deus, a sua brincadeira. Ele não poderia
ter ficado sentado em silêncio? Que espécie de jogo é esse? Adolf Hitler e Mussolini e Joseph Stalin
e Mao-Tse-Tung, Gengis Khan, Tamurlaine, Nadir Shah... Brincadeira de Deus? Seis milhões de
judeus assassinados por Adolf Hitler, e Deus está brincando com um jogo? Por que ele não vai jogar
golfe? ou xadrês? Por que torturar pessoas? Tanta miséria no mundo e esses tolos seguem dizendo
que isso é brincadeira de Deus? Crianças que nascem paralíticas, cegas, surdas, mudas...
Brincadeira de Deus? Que espécie de Deus é esse? Ou ele não é Deus, ou pelo menos ele não é
divino. Ele deve ser muito mau.
Essas perguntas não ajudam. Elas criam mais perguntas. Patrick, o máximo que eu posso dizer
é que a vida não tem propósito algum, ela não pode ter qualquer propósito.
Todos os propósitos estão no meio da vida. Sim, um carro tem um propósito: ele pode levá-lo
de um lugar ao outro. O alimento tem um propósito: ele pode nutri-lo, ele pode mantê-lo vivo. Uma
casa tem um propósito: ela pode lhe dar abrigo quando está chovendo e quando está quente. As
roupas têm propósito... Todos os propósitos estão dentro da vida, mas a vida em si mesma não
pode ter qualquer propósito porque ela não é um meio para algum fim. Um carro é um meio, a casa
é um meio.
A vida não tem qualquer objetivo, a vida não está indo para lugar algum. A vida está
simplesmente aqui! Ela nunca foi criada. Esqueça essa idéia de criação. Isso cria muitas perguntas
estúpidas na mente. Ela nunca foi criada, ela sempre esteve aqui e ela sempre estará aqui. Com
formas diferentes, de maneiras diferentes, a dança continuará. Ela é eterna. Ais dhammo sanantano
- assim é a lei última.
Não há qualquer propósito e essa é a beleza da vida. Se houvesse alguns propósitos, então a
vida não seria tão bonita, então haveria uma motivação, então ela seria como um negócio, então ela
seria muito séria. Olhe para as rosas, para as flores de lótus, para os lírios. Qual o propósito? O
lótus de manhã cedo, o sol nascendo, o cuco começando a cantar...Qual o propósito? Isso não é
intrinsecamente lindo? Todas as coisas precisam de propósitos fora de si mesmas?
A vida é intrinsecamente linda. Ela não tem qualquer propósito extrínseco. Ela não é
propositada. Ela é exatamente como uma canção de um pássaro na escuridão da noite, ou o som
da água, ou o som do vento passando através dos pinheiros...
O homem é voltado para objetivos. E porque a sua mente é voltada para objetivos, ela cria
perguntas como esta: "Qual o objetivo da vida? Deve haver algum objetivo." Mas se alguém disser,
"esse é o objetivo da vida", então você irá perguntar: "Qual o objetivo desse objetivo? Por que nós
devemos alcançá-lo? A que propósito ele irá servir?" E se alguma outra pessoa disser "Esse é o
objetivo desse objetivo", as mesmas perguntas irão surgir novamente e você vai voltar ao mesmo
ponto, ad infinitum.
Você me pergunta: "Você poderia nos dizer qual é o propósito da criação?"
O mundo nunca foi criado. A palavra "criação" não é correta. O mundo sempre esteve aqui, ele é
eterno. Não existe criador. Deus não é o criador do mundo. Deus é a própria energia criativa da
existência. É mais criatividade do que um criador. Ele não é o poeta, mas sim a poesia; não o
dançarino, mas a dança; não a flor, mas a fragrância.
Você me pergunta: "Por que a vida existe?"
Essas perguntas parecem muito filosóficas, e podem torturá-lo muito, mas elas são absurdas. É
como perguntar "Qual o sabor da cor verde?" Isso é irrelevante. A cor verde não tem qualquer sabor.
Cor e sabor não estão relacionados absolutamente. "Por que a vida existe?" Veja que as palavras
"vida" e "existência" significam a mesma coisa. Isso é tautologia. Você está perguntando: "Por que a
vida é vida?" Assim fica mais claro para você. Mas quando você pergunta "Por que a vida existe?",
as palavras enganam você.
Você está perguntando "Por que a vida é vida?". Você está perguntando "Por que uma rosa é
uma rosa?" Você ficaria satisfeito se uma rosa fosse uma margarida? Então você poderia perguntar
"Por que uma margarida é uma margarida?" De que maneira você fica mais satisfeito?
Se a vida não existir, você ficará mais satisfeito? Simplesmente imagine você mesmo sem o
corpo, sem a mente, um fantasma perguntando "Por que a vida não existe? O que aconteceu com a
vida? Por que ela desapareceu?". Essas perguntas sempre irão persistir e perseguir você.
A vida é um mistério. Não existe qualquer porquê, qualquer propósito, qualquer razão. Ela está
simplesmente aqui. Aproveite-a ou abandone-a, mas ela está simplesmente aqui. E estando ela
aqui, por que não aproveitá-la? Por que desperdiçar seu tempo filosofando? Por que não dançar,
cantar, amar e meditar? Por que não se aprofundar mais e mais nessa coisa chamada "vida"?
Talvez no centro mais profundo você irá saber a resposta. Mas a resposta vem de uma tal maneira
que ela não pode ser expressada. É como um homem mudo que experimenta açúcar. É doce, ele
sabe que é doce, mas ele não consegue falar.
Os Budas sabem, mas eles não conseguem dizer. E os idiotas não sabem e seguem falando,
seguem dando respostas a você. Os idiotas são muito espertos nesse sentido de encontrar, de
fabricar, de manufaturar respostas. Faça qualquer pergunta e eles terão uma resposta para você.
Quando Gautama Buda costumava viajar por este país de um lugar a outro, alguns poucos
discípulos iam à frente e anunciavam na cidade: "Buda está chegando, mas por favor não façam
aquelas onze perguntas". E uma daquelas onze perguntas era "Por que a vida existe?". Uma outra
era "Quem criou o mundo?" Naquelas onze perguntas, toda a filosofia estava contida. Na verdade,
se você abandonar aquelas onze perguntas, nada sobra para ser perguntado.
Buda costumava dizer que essas eram perguntas inúteis. Elas não eram respondíveis, não
porque ninguém soubesse a resposta. Elas eram irrespondíveis pela própria natureza das coisas.
Um grande filósofo, Maulingaputta, veio até Buda e começou a fazer algumas perguntas...
Perguntas após perguntas. Buda ouviu silenciosamente por meia hora. Maulingaputta começou a se
sentir um pouco embaraçado porque Buda não estava respondendo, ele estava simplesmente
sentado ali, sorrindo, como se nada tivesse acontecido, e ele havia formulado perguntas tão
importantes, tão significativas.
Finalmente Buda disse: "Você realmente quer saber a resposta?"
Maulingaputta disse: "Se eu não quisesse, por que eu teria vindo até você? Eu viajei pelo
menos mil milhas para vê-lo"..."Por que eu teria vindo de tão longe? Foi um longo sofrimento.
Parece que eu estive viajando por toda a minha vida! E você está perguntando se eu realmente
quero saber a resposta?"
Buda disse: "Eu estou perguntando de novo: você realmente quer a resposta? Diga sim ou não,
porque irá depender muito disso".
Maulingaputta disse "Sim!"
Então Buda disse: "Por dois anos sente-se silenciosamente ao meu lado, não pergunte, não
questione, não converse, simplesmente sente-se silenciosamente por dois anos ao meu lado. E
após dois anos você poderá perguntar o que você quiser e eu prometo que irei respondê-lo."
Um discípulo, um grande discípulo de Buda, Manjusri, que estava sentado na sombra de uma
outra árvore, começou a rir muito alto e começou a rolar pelo chão. Maulingaputta disse: "O que
aconteceu com esse homem? Você está falando comigo, você não dirigiu uma simples palavra a
ele, ninguém disse nada para ele... Estará ele contando piadas para si mesmo?"
Buda disse: "Vá lá e pergunte a ele".
Ele perguntou a Manjusri. Manjusri disse"Senhor, se você quiser realmente fazer a pergunta,
faça-a agora. Essa é a maneira dele enganar as pessoas. Ele me enganou. Eu costumava ser um
filósofo tolo, exatamente como você. A resposta dele foi a mesma quando eu cheguei. Você viajou
mil milhas e eu havia viajado duas mil milhas."
Manjusri era certamente o maior filósofo, o mais conhecido do país. Ele tinha milhares de
discípulos. Quando ele chegou, com ele vieram mil discípulos. Um grande filósofo chegando com
seus seguidores.
E Buda disse, "Sente-se silenciosamente por dois anos." E eu me sentei silenciosamente por
dois anos, mas então eu não podia fazer uma pergunta sequer. Aqueles dias de silêncio... Devagar,
devagar, todas as perguntas foram se desfazendo. E uma coisa eu vou dizer a você: ele manteve
sua promessa, ele é um homem de palavra. Após os exatos dois anos, eu tinha me esquecido
completamente, eu tinha perdido a noção do tempo, por que quem vai se preocupar em lembrar? Na
medida em que o silêncio ficou mais profundo, eu perdi toda a noção de tempo."
"Quando os dois anos se passaram, eu nem estava me dando conta disso. Eu estava curtindo
o silêncio e a presença dele. Eu estava bebendo a presença dele. E isso foi tão incrível. Na verdade,
no fundo do meu coração eu não queria nunca que aqueles dois anos fossem concluídos, porque
uma vez que eles se concluíssem, ele iria dizer: "Agora ceda o lugar para alguma outra pessoa
sentar ao meu lado, e você afaste-se um pouco. Agora você já é capaz de estar só, você não
precisa tanto de mim. Exatamente como uma mãe afasta a criança quando ela pode comer e digerir
por si mesma e não precisa mais se alimentar do peito materno. Assim, Manjusri disse, eu estava
esperando que ele se esquecesse de toda essa história a respeito dos dois anos, mas ele se
lembrou. Exatamente após os dois anos, ele me disse: "Manjusri, agora você pode formular as suas
perguntas". Eu olhei para dentro de mim e não havia nenhuma pergunta, nem ninguém para
formular perguntas, era um silêncio total. Eu ri, ele riu, ele deu um tapinha nas minhas costas e
disse, "Agora, afaste-se um pouco."
"Assim, Maulingaputta, é por isso que eu comecei a rir, porque agora ele está de novo
aplicando o mesmo golpe. E esse pobre Maulingaputta vai se sentar por dois anos silenciosamente
e vai se perder para sempre, nunca mais será capaz de formular uma pergunta sequer. Por isso,
Maulingaputta, eu insisto: se você quer realmente perguntar, pergunte agora!"
Mas, Buda disse: "Minhas condições têm que ser atendidas."
Então, Patrick, a minha resposta para você é a mesma: atenda às minhas condições, medite,
sente-se silenciosamente, simplesmente esteja aqui e todas as perguntas irão desaparecer. Eu não
estou interessado em respondê-lo. Eu estou interessado em dissolver as suas perguntas. E quando
todas as perguntas desaparecerem, aquele que pergunta também desaparecerá, ele não pode
existir sem as perguntas. Quando nenhuma pergunta mais existir, nem aquele que pergunta...
quantas bênçãos, quanto êxtase! Neste exato momento, você nem pode imaginar, você nem pode
sonhar, você nem pode compreender. Então, todo o mistério da vida se abrirá, mistérios e mais
mistérios... e isso não tem fim.

OSHO - The Book of the Books - Discourse n. 10 - 2nd question


(Tradução: Sw. Bodhi Champak)

Copyright © 2006 OSHO INTERNATIONAL FOUNDATION, Suiça.


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