Apesar da impessoalidade que um museu evoca, foi de pura emoção o momento de
assinatura do termo de doação do acervo do fotógrafo goiano Samuel Costa, assinado por sua mãe, Ambrosina Franco de Lima Costa, e por Linda Monteiro, presidente da Agência Goiana de Cultura (Agepel), ontem de manhã, na sede do Museu da Imagem e do Som (MIS). O acervo, como milhares de fotografias, slides, negativos e revistas, foi destinado ao MIS, unidade da Agepel, que a partir de agora vai iniciar os projetos de higienização, catalogação e manutenção para que o todo o material possa ser consultado pela comunidade. Nascido em Jataí, em 1954, Samuel Costa morou em Goiânia, onde iniciou seus estudos de Engenharia Elétrica na Universidade Federal de Goiás, curso que abandonou para se dedicar totalmente à fotografia. No final dos anos 70, mudou-se para Paris, de onde viajaria por toda a Europa em busca de inspiração para novos cliques. No começo dos anos 80, ele voltou para o Brasil, registrando com sensibilidade uma época que marcou o fim da ditadura no País e a intensificação dos conflitos urbanos em Goiânia, fruto do crescimento acelerado da cidade. Também viajou pelo País, captando momentos impressionantes do formigueiro humano de Serra Pelada, no Pará, e os movimentos harmônicos de capoeristas em Salvador. Personalidades das artes plásticas no Estado, como Ana Maria Pacheco, Antônio Poteiro e Fernando Costa Filho, também foram fotografados pelo artista. Aos poucos, Samuel Costa foi montando um portfólio que serviria de referência histórica contemporânea e também como mapa da sua criatividade, movida pela inspiração de mestres da fotografia, como o francês Cartier-Bresson. Porém, o que prevaleceu foi a sua própria marca: o olhar mergulhado no outro. Em vida, teve vários de seus trabalhos publicados em revistas e catálogos no Brasil e no exterior. O fotógrafo morreu em 1987, aos 33 anos, em decorrência da aids. Familiares A solenidade de doação na sede do MIS, que funciona no Centro Cultura Marieta Telles, contou com a presença de familiares do fotógrafo, amigos e personalidades da cultura goiana. Muito emocionada, Ambrosina Costa, mãe de Samuel Costa, lembrou que o filho fotografava desde criança, iniciando-se no ofício ainda aos oito anos de idade. “Quando ele quis largar a o curso de Engenharia Elétrica, a família ficou muito apreensiva. Queríamos que ele terminasse pelo menos a faculdade primeiro. Mas não adiantou. Ele queria ir para a França estudar fotografia, seguir uma carreira que ele realmente amasse”, recordou. Ela contou que, logo após a morte do filho, ficou bastante preocupada em como preservar bem tudo o ele que havia deixado. “Mesmo sendo leiga no assunto, achei que seria melhor colocar as coisas num armário de metal, abrir a janela, ventilar um pouco o local. De resto foi fácil, porque meu filho era bem organizado”, disse. Foi somente há alguns anos que ela pensou em doar o legado de Samuel. “Alguns amigos começaram a falar para eu doar para algum museu. Foi difícil me desapegar, mas agora tudo o que o meu filho produziu será bem guardado e mantido, podendo ajudar na pesquisa de muito gente. Um dos fatos que mais colaborou para esta minha decisão foi a publicação de um crônica sobre o Samuel escrita por Luís Araujo Pereira em 2005, no POPULAR. Fiquei muito feliz na época e estou mais feliz hoje”, declarou. Linda Monteiro, presidente da Agepel, agradeceu a doação e destacou o espírito de “confiança da família no trabalho do MIS”. “É muito bonito que esta família tenha o nível de entendimento de que o material que ela está doando é um bem público, que deve estar ao acesso de todos, para pesquisadores, estudantes e comunidade em geral.” Stela Horta, diretora do MIS, destaca a qualidade da conservação das peças. Ao todo são 32 mil negativos, 5 mil slides, 2 mil aplicações fotográficas, livros de fotografia e revistas com trabalhos de Samuel Costa publicados. “Os temas são diversos e contemporâneos, abrangendo os anos 70 e 80, porém de grande importância histórica. Entre os temas, há desde artistas como Antônio Poteiro à arquitetura da cidade de Goiás, passando pelo garimpo de Serra Pelada em seu auge, além de manifestações culturais como o carnaval da Bahia.” Escritor e cronista do POPULAR, Luís Araújo Pereira, que também é integrante da Comissão de Acervo do MIS, foi amigo pessoal de Samuel Costa. “Ele seria hoje um grande fotógrafo, um dos mais importantes de sua geração, pois tinha muita criatividade e sensibilidade. O Samuel era um tipo inquieto, que fotografava e pesquisava o tempo todo. A máquina fotográfica era mais que um acessório inseparável, parecia fazer parte do corpo dele também. Cheio de projetos, ele queria lançar um livro com as diversas personalidades do meio artístico que havia fotografado e queria ainda fotografar, como Jorge Amado, Maria Bethânia, Ana Maria Pacheco, Lígia Fagundes, entre outros”, contou. Segundo Stela Horta, uma pequena parte do material doado pela família de Samuel Costa já está disponível para consulta na biblioteca do MIS, caso de alguns livros e revistas. Já o acervo fotográfico propriamente dito deve demorar um pouco mais para ser aberto ao público. “Embora quase tudo esteja num grau razoável de conservação, o acervo deverá ser todo higienizado, depois passar por um processo de conservação, e em seguida de reprodução e digitalização, um serviço minucioso que será entregue aos poucos à comunidade, à medida que for concluído”, declarou.