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UNIVERSIDADE DE AVEIRO

DEPARTAMENTO DAS CIENCIAS DE EDUCACAO


CADEIRA DE SOCIOLOGIA DE EDUCAÇÃO

TRABALHO CURRICULAR

TEMA: O conflito no seio das organizações


O Conflito na organização e instituição escolar/educativa

PROFESSOR DOUOTOR –António Martins

Aluno: Augusto Borges Amado

Fevereiro, 2007
INDICE

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RESUMO

3-4
I INTRODUÇÃO

II REFERENCIAL TEÓRICO 4-13

1. Em torno do conceito de Conflito e posturas adoptadas a respeito 4-6

2. Diferentes enfoques teóricos nos diferentes paradigmas de


6-11
organização e administração escolar e educativa

2.1. Visão tecnocrática-positivista ou empírico-analítica


7-8

2.2. Visão hermenêutica-interpretativa


8-10

2.3. Visão sócio-crítica


10-11

III O CONFLITO NA EDUCAÇÃO E NAS ORGANIZAÇÕES ESCOLARES:


TENTATIVA DE UMA ANÁLISE CRÍTICA À LUZ DE CONCEITOS E 14-20
TEORIAS APRESENTADAS

IV NATUREZA CONFLITUOSA DAS ORGANIZAÇÕES ESCOLARES E 20-24


EDUCATIVA

V CONSIDERAÇÕES FINAIS 25-26

VI BIBLIOGRAFIA UTILIZADA/CONSULTADA 26-27

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RESUMO
As interacções humanas nas organizações assim como as interacções organizacionais tendem a
produzir uma infinidade de quadros situacionais, cujas interpretações, explicações e/ou soluções nem
sempre se mostram consensuais. Concorrem para a formatação deste quadro, como sabemos, desejos,
interesses, necessidade e preocupações de indivíduos e/ou grupos que se desencontram e/ou se
incompatibilizam por uma variedade de motivos, relativamente à uma realidade concreta e objectiva;
tais motivos, podem dever-se ao desacordo relativamente aos objectivos, às ideias ou pensamentos, ou
até sentimentos e emoções.
Conclui-se, assim, que no processo de construção de soluções para os problemas sócio-
humanos (ou sócio-individuais) produzem-se, inevitavelmente, e face às diferenças manifestas na
busca da explicação e solução para os mais variados quadros de necessidade e de expectativa humana e
social, uma variedade de conflitos todos os dias; o que significa dizer, também, que não poderá haver
soluções totalitárias e eternas e que construções finalizadas só podem ser conseguidas num amplo
quadro de abertura e respeito às diferenças, baseadas numa troca construtiva.
Nesta ordem de ideias, entendemos que o conflito surge como um fenómeno/factor normal no
contexto organizacional, interorganizacional e societário no sentido de que o seu reconhecimento e
valorização poderá ajudar a expor os verdadeiros problemas e direccionar a busca de solução para um
amplo debate de ideias; ou seja, permitindo, por um lado, o exercício de uma abordagem metodológica
assente numa construção colectiva e, por outro, uma prática e aprendizagens pedagógicas que
incentivem e institucionalizem a capacidade e práticas de cooperação e colaboração na construção de
decisões.
Ora, perante um quadro ou qualquer situação - problema, inclusive, os que se relacionam com a
temática educação, parte-se do princípio de que para se considerar “as justas aspirações da sociedade
nas suas diferença, diversidade e racionalidade encontradas nos diferentes grupos e segmentos sociais
e profissionais”, impõe-se, à partida, o exercício de uma prática democrática e participativa efectiva
dos mesmos, na definição de prioridades e construção de decisão sobre as suas vidas e sobre as
organizações e a sociedade a que pertencem. E, tal, como já vimos, que é impensável a configuração
de um tal quadro, sem a existência e/ou o reconhecimento de conflitos.
Daí aflorarmos no presente trabalho a temática conflito.

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I. INTRODUÇÃO
A abertura que ocorre em 1990 conduz à instauração da segunda república assente no princípio
do pluralismo, viabilizando, desta forma, as eleições democráticas e consequentemente, mudanças
profundas na organização da vida política e social do país. Buscando atender aos pressupostos que
nortearam esta mudança, foram sendo elaborados e aprovados normativos no sentido de materializá-
los. Entre estas Leis, destacam-se a Lei de Base 103/III/90 (Lei de Bases dos Sistema educativo) e,
posteriormente, o Decreto – Lei nº 20/2002 de 19 de Agosto (Regime de Organização e Gestão dos
Estabelecimentos de Ensino Secundário).
No entanto, decorrido estes anos todos, as análises interpretativas dos Relatórios do Conselho
do Ministério, produzidos pelo Ministério da Educação e Ensino Superior, sobre o ensino básico
integrado e demais níveis de ensino, bem como os do Ciclos de Debates e o Relatório do Conselho do
Ministério1 e o Documento Orientador que subvencionara a instituição do Curso de Gestores e
Coordenadores (ambos de 1998), revelam a necessidade do desenvolvimento de práticas mais
adequada aos problemas concretos da escola e da educação, por parte dos profissionais e da
administração educativa e escolar.
Das análises acima referenciadas, e considerando as necessidades apontadas, podemos afirmar
então que: (i) existe a prática/tendência do desenho e implementação de políticas e projectos de cima
para baixo, cujos conteúdos, estratégias, processos e resultados finais não são aceites na sua
globalidade e/ou na sua parcialidade, tanto do ponto de vista de conteúdo como no de forma; (ii)
inadequação das políticas e dos projectos à realidade e ao contexto sócio-temporal, (iii) demanda de
uma maior autonomia para as escolas e órgãos concelhios da educação, (iii) melhores condições de
trabalho e exigência de uma maior preparação dos agentes educativos e uma melhor integração da
educação, em termos de territórios.
Tal ambiente, indicia, de certa forma, um défice de exercício democrático, de participação e
cooperação na tomada de decisão relativas às problemáticas sócio-educativas e administrativo –
institucional, e de formação, tanto a nível central, concelhio e local.
Tal quadro, quando analisado do ponto de vista da tomada de decisão sobre a educação em
Cabo verde, denuncia igualmente, a existência de situações de conflito na construção de opções e/ou
soluções respeitante à matéria educativa e à sua gestão e administração; ou seja, pode-se depreender
que estamos perante quadros/situações de desencontro de perspectivas, de valores, de contradição em
que os principais actores e instancias interessados na matéria, não (ou nem sempre) se revêem nos
objectivos, ideias, abordagens e/ou decisões adoptadas por diferentes actores envolvidos.
Assim, em jeito de estudo exploratório visando subsidiar as próximas reflexões e a escrita da
dissertação de Mestrado, propomo-nos abordar, ainda que de forma sumária, a temática conflito. Nesta
abordagem sintética, procuramos, entre outros, descortinar como as diferentes correntes teóricas, sejam

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elas, sociológicas e/ou administrativo – organizacionais, vêm fazendo o seu enquadramento bem,
como, analisar tais visões/conceptualizações nos ambientes educativo e escolar, designadamente, na
direcção, gestão e administração educativas.

II. REFERENCIAL TEÓRICO

1.Em torno do conceito de conflito e das posturas adoptadas frente ao conflito.

Como haviamos dito na nossa introdução, as relações estabelecidas no seio das organizações
e/ou as ineteracções entre organizações dão-se num cenário de diferenças conceptuais, metodológicas
e pedagógicas que conduzem a formas ou maneiras próprias de perceber, pensar e racionalizar, sentir e
experimentar e agir; estas diferenças acabam por interferir, positiva e/ou negativamente, na vida e na
dinâmica dos indivíduos, dos grupos, das organizações, e numa escala maior, da sociedade; neste
sentido, é normal que, em decorrência dessas interferências, encontremos quadros de tensão, de debate,
de insatisfação; ou seja, um quadro aberto de/para instauração de conflitos.
O conflito vem ganhando diversas conceitualizações e significados, conforme os ramos de
saberes que o foram estudando.
Ora, das leituras que fizemos pudemos depreender que podemos encontrar conceitos distintos,
consoante os pontos de vista adoptados.
Para J.G. March y H. A. Simon, citado por Ciscar e Uria (1988: 247) tomando como ponto de
partida a tomada de decisão, no seio da organização, o conflito é …una ruptura de los mecanismos
standard da toma de decisiones, por la cual un individuo ou un grupo experimentan dificultades al
elegir una acción alternativa.
No entanto, F. Petit, citado també, por Ciscar e Uria (1988: 248) valendo-se de um enfoque
psicosociológico entende que o “conflicto social (es el) conjunto de interacciones concretas y
complejas, entre individuos y/o grupos, sin olvidar, de todos modos, que estas interacciones son las
manifestaciones localizadas de fenómenos de poder que se inscriben en la dinámica global de una
sociedad determinada.
De igual forma, podemos encontrar conflitos de papéis no contexto social e organizacional,
podendo estar ligados a luta pelo poder destes papéis, ou ainda quando as expectativa sobre tais papéis
difere do que o próprio indivíduo entende que deve ser o seu comportamento. A este respeito, Maynz,
citado por Ciscar Ciscar e Uria ( 1988: 248) diz-nos que conflitos de papeles surgen por ejemplo
cuando un miembro debe cumplir órdens de varias pessoas o de varios grupos de personas cuyas
expectativas respecto a su comportamiento son diferentes. También las expectativas de un solo

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superior pueden ocultar en sí materia de conflictos, por ejemplo cuando se exige que el cometido sea
cumplido con la mayor rapidez y el mayor cuidado….
No en tanto, Thouzard, citado por Ciscar e Uria (1988:248), ao estudar a problemática da
conciliação nos conflitos laborais, centrando-se desiganadamente, nos porocessos de negociação e
mediação propõe-nos que o conflito é… una situación en la cual unos actores (individuos, grupos,
organizaciones, naciones) o bien persiguen objetivos o defienden valores opuestos; o bien persiguen
simultánea y competitivamente lo mismo objetivo”
Uma análise mais atenta das definições anteriores permite-nos verificar que existe a tendência
para se concentrarem na ideia de desacordo, imcompatibilidade, competição e, as vezes, até de
perseguição, quando buscam definir o conflito.
Esta conceptualização acaba por produzir uma concepção dominante do conflito como sendo
algo nefasto e negativo, impondo muitas vezes soluções de força e de carácter autoritário e
controlador, colocando no mesmo barco conceitos de problema, conflitos, competição.
Desta forma, esta visão permite que se atribua igual significado ao conflito (situação que
implica divergências, cuja origem pode estar na acumulação de insatisfação em relação à problemas e
ou situações não resolvidas e/ou não aceites, ou ainda da detecção de incongruências de vária ordem
encontradas através da análise crítico-reflexiva da realidade, ou até com relação ao método e
procedimentos para a resolução e/ou explicação de uma situação, mas em que o objectivo não é
necessariamente o de derrotar a outra parte, mas, sim, o de construir relações e espaços dialogizantes
com vista à soluções que beneficie a ambas as partes) e competição (situação que implica uma
oposição de objectivos entre as partes, mas que, à partida, uma das partes busca derrotar a outra parte).
Aliás, investigações iniciadas desde os anos 60 do século vinte, já tendiam a contrariar esta
visão nefasta do conflito, pensando inclusivamente que a tensão geradora de conflitos no seio da
organização poderia revelar-se produtiva.
Assim, Joe kelly, (1970:p.226) citado por Ciscar e Uria (1988:249) a este respeito diz-nos que “
o conflito que é dirigido, mais que suprimido, ignorado ou evitado, contribui significativamente para a
efectividade da compainha.”.
De igual forma, Aram T. Colier (1968:p.226), citado por Ciscar e Uria (1988:249) argumentava
que “o conflito é essencial para o trabalho construtivo”
Outros autores ainda consideram os conflitos nichos de mudança que podem favorecer o
crescimento individual e organizacional e a transformação das práticas sociais e políticas, ao
possibilitarem, através de um engajamento consciente de praxis crítico-reflexivo, debate de ideias,
reflexão partilhada, acção e soluções criativas e construtivas.
Nesta óptica, talvez o conflito não se afigure tanto como um desencontro de objectivos, mas
sim, como “ uma divergência de perspectivas”, pois uma situação de conflito não exclui a

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possibilidade de os sujeitos em confronto perseguirem os mesmos objectivos, podendo ter então
abordagens e perspectivas diferenciadas, que podem estar fundadas em valores contrários. O que em
certo sentido mostra-se salutar na medida em que ela ao possibilitar justapor e/ou contrapor diferentes
formas de ler e explicar uma mesma realidade, contribui, de forma didáctica e pedagógica, para um
quadro de trocas, de aprendizagens, de construção, de crescimento e maturação individual e societal,
na busca de soluções assentes no princípio do pluralismo de ideias.
Ora, pelo que fica exposto, concluímos que o conflito se revela sempre consciente na medida
em que evidenciará sempre, uma leitura e um recorte feito por actores engajados na acção e no
contexto próprio de uma realidade dada, portanto uma realidade que depende tanto da posição do
sujeito na estrutura da organização, da administração e da sociedade, bem como da apropriação que for
fazendo desta mesma realidade conjuntural e situacional e dos significados que for capaz de construir;
ou seja, as análises dos indivíduos não se dão fora do seu contexto de acção e da sua realidade
vivencial e experiencial, nem tão pouco desenquadradas do seu lugar e da sua posição/situação no
interior desta realidade e das realidades que nela intervêm.
Rematando esta parte do trabalho, fica a ideia principal de que o conflito é importante e que a
criação de espaços para que se manifeste e se produza de forma clara e objectiva e criativa, poderá
facilitar o governo e administração das organizações e da administração, no sentido de que a sua
valorização imporá novas práticas na construção de decisões visando a busca de soluções para os
problemas que forem aparecendo.

Mas, como conceptualizamos o conflito, no presente trabalho?


No nosso entender a definição que nos serve e que se encontra dentro da nossa linha de
interesse é a que considera o conflito enquadrado no contexto em que é produzido. Sendo assim, o
conflito neste trabalho conceptualizado como sendo nicho produtor de novos paradigmas, expressão de
opiniões distintas, condição necessária para a construção dos acordos e a base da cooperação, algo
benéfico para a organização quando trabalhado como natural e que pode contribuir para o exercício da
democracia e participação; portanto espaço de confronto ideias, e construção de reflexão, decisões e
soluções.

2. Diferentes enfoques teóricos nos principais paradigmas da organização e


administração escolar e educativa.

O conflito não tem tido o devido lugar nas questões que se ligam à problemática da
administração da educação e das escolas. E quando é aflorado, percebe-se a instauração de um clima
de crispação e, as vezes, até de menosprezo, relativamente aos sujeitos que questionam e as suas
argumentações. Razões várias explicam tais atitudes e/ou práticas; no entanto, podemos destacar entre

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outros, o facto de ainda se achar que a administração da educação é algo previsível, ou que é algo de
foro técnico, portanto, de especialistas, ou ainda de que as questões e argumentações apresentadas não
tem fundamento, pois quem vem questionando, entendeu mal a proposta ou a decisão tomada. No
entanto, raramente, as instâncias superiores de decisão reconhecem que estão em presença de
desencontros de valores, de divergência de interesses, portanto de choque de ideologias. Todas estas
posturas, foram ganhando corpo em concepções teóricas que foram sendo construídas ao longo dos
tempos.

Quais são então as abordagens teóricas que vão dando corpo às análises e ao estudo da
problemática do conflito? Qual dessas abordagens tem merecido maior preponderância na análise do
conflito? E quais os pressupostos que estão por trás dessas abordagens?

Partindo das análises de Alves (1995) e de Jares (1996) que por sua vez, fundamentam-se em
England (1989) temos três visões que fazem a abordagem do conflito: a tecnocrática-positivista, a
hermenêutica e interpretativa e a sócio-crítica

2.1.) Visão Tecnocrática-Positivista ou empírico-analítica

Esta visão tem seu suporte nas correntes positivistas; fundamentam-se na ideia de que a
realidade social e organizacional sendo objectiva, estruturam-se independenetemente das convicções e
das atitudes dos sujeitos. Sendo assim, os fenómenos e as situações explicam-se por procedimentos
hipotéticos dedutivos e assentes em suposições sujeitos à comprovação empírica e através de obtenção
de dados quantificáveis que os explicam e os justificam.
Como coloca Alves (1995: 8) o critério de verdade encontra-se nas correlações estatíticamente
significativas entre as pressuposições e os factos empiricamente observados, num processo linear de
causalidade. Desta forma, a ciência deverá ser o instrumento e referência suficientes para predizer,
explicar e manipular os elementos, os acontecimentos e as situações social e organizacional. Portanto,
as subjectividades, as interacções não são necessárias para a explicação e o funcionamento das
organizações.

Qual o quadro que esta visão constrói para o conflito?


O conflito surge como algo disfuncional, patológico, portanto, manifestação de desvios da
tarefa derivada de uma reacção emocional. Para tal, os conflitos devem ser corrigidas a todo o custo
e/ou evitados, pois, eles estão ligadas à lutas de poder.
Assim encontra-se uma preocupação forte com a necessidade de um controlo acirrado sobre os
conflitos, pois são considerados como situações que perturbam a consecução da eficácia; ou seja, a
perspectiva tecnocrática-positivista busca na sua racionalidade – eficácia, manter o equilíbrio, a

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harmonia, a integração da organização em função dos objectivos estabelecidos. Tal significa dizer,
então, para a perspectiva tecnocrática-positivista a eficácia traduz-se em situações/quadros da
inexistência de conflitos. Impõe-se, assim, que a organização funcione baseada numa cuidada
planificação e programação de actividades e de utilização de processos de controlo com vista a
prevenir ou limitar, ao máximo, as situações de conflito. A busca cega da eficácia que se configura
como algo objectivo, neutral, técnico e absoluto deve orientar todas as acções do estabelecimento
escolar, convertendo-se no único critério definidor para a tomada de decisões.
Do ponto de vista da administração, este enfoque aponta para o facto de a existência de
conflitos indiciar a existência de “grupos – do -contra”; por isso, devem ser eliminados, sendo o papel
do gestor, administrador eliminá-los ou silenciá-los ou domá-los, bem, como os seus principais fonte e
“grupos-foco ou “grupos-fonte”. Assim, se explica a forte preocupação em estruturar as relações no
quadro da organização e/ou da administração, esmero na selecção das pessoas que ocupam os cargos,
recompensas e punições minuciosamente desenhados com vista a assegurar, por um lado, a anuência
do indivíduo aos pressupostos filosóficos e laborais pré-estabelecidos e, portanto, aceitar a autoridade
formal e a realidade/situação existente e instaurada; por outro, garantir o reforço das normas
organizacionais, por forma a que haja uma aceitação de decisões da hierarquia.

Análise Crítica que podemos fazer a esta concepção tecnocrática-positivista?


Em primeiro lugar, a eficácia não pode ser construída unicamente à custa de critérios
objectivos, concretos e mensuráveis; em segundo lugar, uma tal visão, faz com que as preocupações
com os problemas da organização se assentem exclusivamente em processos administrativos
direccionados para a obtenção do produto.
Por outro lado, ao impor a colaboração induzida à custa de metas e normativos traçados
administrativamente, a partir de dentro e/ou de fora, não se coaduna com a cooperação consciente, pois
esta exige um elevado nível de profissionalismo que seja crítico-reflexivo, responsável e cooperativo.

2.2.) Visão Hermenêutica-Interpretativa


Esta visão adopta uma posição crítica em relação aos pressupostos da abordagem anterior,
designadamente, afirmando que as fontes de conhecimento não resultam de hipóteses; ou seja, que
conhecer é antes de mais compreender os modelos simbólicos, os processos de comunicação e de
interacção social. (Alves, 1995: p.8).
Assim esta visão propõe desvelar os significados das acções dos actores, os sentidos, ritos,
símbolos, linguagens (Alves, 1995:p.8). Observa-se aqui o reconhecimento do facto de que a teoria
não se constrói independente do contexto e dos sujeitos, propondo que o significado seja procurado nas

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interacções e interpretações humanas, pois a realidade é o resultado dessas interacções e
interpretações enformadas por valores, intenções, motivações, estratégias pessoais. (Alves, 1995:p.8)

Qual o quadro que esta visão constrói para o conflito?


Esta abordagem não nega o conflito mas considera-o como inevitável e positivo para estimular
a criatividade do grupo. No entanto, o conflito aparece como um problema de percepção, sendo
analisado de forma isolada; portanto de forma independente, ignorando as condições sociais que
enformam os próprios sujeitos e as suas percepções.
Nesta lógica, para a abordagem hermenêutico – interpretativa, as causas do conflito resultam de
problemas de percepção individual, deficiente comunicação interpessoal, confusão no entendimento da
situação e/ou dos actos.
Portanto, a solução para os conflitos assenta-se na melhoria dos processos de comunicação
entre os indivíduos como forma de aperfeiçoar o funcionamento e a comunicação do grupo bem como
as relações humanas a partir do entendimento das subjectividades pessoais; neste sentido, o mais certo
é ajudar as pessoas a perceberem seus equívocos, reconhecendo seus erros cuja origem reside,
fundamentalmente, nas suas ideias e/ou crenças.
Ora, o que esta visão propõe, de facto, é uma ideologia assente na compreensão e no
significado

Análise Crítica que podemos fazer a esta concepção hermenêutico-interpretativa?


Esta visão apresenta algumas limitações, nomeadamente, o de reduzir o conflito a uma
perspectiva psicologista, e os indivíduos em termos de necessidades individuais, destacando
estrategicamente o ponto de vista individual, isolando-o das circunstancias sociais e materiais que o
circunda e que permitem significar a sua experiência e sua prática pessoal e social; anula-se assim, e
propositadamente, por um lado o sentido de grupo e o sentimento de pertença e, por outro, o sentido
sociológico das suas análises e/ou interpretações.
Valendo-se das ideias de Carr y Kemmis (1986:112-113), este enfoque do conflito escamoteia
os verdadeiros motivos dos conflitos; ou seja, o conflito é criado por nós, pois é fruto do nosso
entendimento, da nossa percepção sobre a realidade, consequência da confusão que nós fazemos
quando tentamos compreender alguma coisa; nesta lógica, a realidade nunca apresenta conflito; aliás,
tal linha de pensamento explica-se na metodologia encontrada para resolver o conflito que é levar o
sujeito a modificar o seu pensamento acerca da realidade dada e/ou do que faz e não procurar mudar
e/ou transformar a própria realidade ou que este faz.
Portanto para a visão hermenêutico-interpretativa, a realidade dada, vivida, experimentada está
isenta de contradições, pois os conflitos que se verificam, são coisas da “cabeça da pessoa” e ou dos
grupos, geralmente consequência da incapacidade destes para entenderem as coisas, ou o que eles

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próprios e os outros fazem. Embora não se negue de todo, que o factor comunicação e compreensão
possam afigurar-se, também, como razões de eventuais conflitos, elas não conseguem explicar toda a
sua complexidade; até porque as situações reais vividas, sendo um construto social e partilhado, elas
não se afiguram de per-si como propriedade e/ou construção unicamente pessoal nem podem ser
condicionadas por interpretações particulares da cada pessoa, ou cada membro da organização.
Esta postura de conceber os conflitos como resultados de confusões de conceitos, e que a sua
resolução está na demonstração da racionalidade de seus actos, de uma forma descontextualizada
“tanto do contexto organizativo e social em que vive o grupo como da micropolítica interna do
mesmo” (Jares:1996), indicia o propósito deste enfoque em submeter o indivíduo a situação
prevalecente, procurando sempre conciliar as pessoas com a realidade existente (Carr y Kemmis,
1986:112) indivíduos.

2.3.) Visão Sócio-crítico


Esta visão vale-se “tanto do conhecimento da ciência empírico-analítica como da ciência
social interpretativa mediante um processo de auto-reflexão e de crítica sistemática das condições,
dos contextos, dos processos e dos resultados da sua produção.” (Alves, 1995:9)
A visão sócio-critica postula um exercício crítico-reflexivo permanente através de uma análise
sistemática dos “seus próprios processos”, colocando-os sempre em causa; tal linha de condução tem o
propósito de desconstruir as propostas ideológicas que enformam uma dada realidade e/ou situação, “
demonstrando como ela deforma a realidade social, moral e política e oculta das causas do conflito, a
repressão e a insatisfação e submete as pessoas a um conjunto de normas e de relações de poder.
(Alves, 1995:9)

Qual o quadro que esta visão constrói para o conflito?


Para a visão sócio-crítica o conflito é algo natural; portanto, inerente a todo tipo de organização
e da própria vida; afigura-se como um elemento fundamental para o processo de mudança e de
transformação ao nível dos entendimentos, das práticas, dos valores dos sujeitos, das estruturas sociais
e institucionais que demarcam ou balizam a actuação destes.
Neste enfoque, as perspectivas apontam para uma utilização didáctico-pedagógico do conflito,
no sentido de se poder questionar tanto a entidade, realidade e/ou situação como a correlação de forças
que nelas existem. Esta característica específica deste enfoque vem possibilitar que os actores da
organização procurarão entender a trama complexa dos sentidos, esclarecer os lugares estruturais da
sua génese, desmistificar a naturalidade dos dispositivos da ordem burocrático-normativa, desvelar as
estratégias do poder oculto. … através de uma acção crítica, reflexiva, conscientes do peso e das
determinações estruturais, realizar uma praxis que promova a participação, o desenvolvimento
pessoal, cívico e comunitário. (Alves: 1995, p.9)

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Portanto, de acordo com Gonzalez (1989:123) citado por Jares (1996) estamos perante um
direccionar para a construção de uma consciência crítica e colectiva dos membros da organização,
através da revelação das contradições implícitas na vida da organizativa e desvelar as formas de falsa
consciência que distorcem o significado das condições organizativas e sociais.
Finalizando com England (1989:106) e citado também por Jares (1996) este enfoque teórico do
conflito permite que os sujeitos sociais demonstrem como a ideologia deforma a realidade social,
moral e política e oculta as causas do conflito, a repressão e a insatisfação, e submete às pessoas a
um conjunto determinado de normas e relações de poder….deste ponto de vista, para a teoria crítica,
administração educativa rege-se por uns valores explícitos e confessos.
Ora, uma análise mais acurada destes três enfoques teóricos acerca do conflito, faz-nos eleger
os três vectores fundamentais que perpassam todos eles: interesses, conflito e poder.
A guisa de conclusão, e de acordo com Burrell & Morgan (1979, Hall) citado por Hall (1984)
encontramos basicamente três visões sobre interesses, conflito e poder, a saber: (1) visão unitária e
autoritária, em que o conflito é conceptualizado como negativo e perigoso, sendo assim raro; neste
caso, a existir deverá ser um fenómeno transitório, pois serão eliminados imediatamente. As fontes de
tais conflitos seriam então os indivíduos problemáticos e as contendas interpessoais; (2) Uma visão
intermediária, que se propõe pluralista (tolerante?) e que reconhece o conflito como uma característica
imanente às organizações, enfatizando seus aspectos potencialmente positivos e funcionais. No
entanto, esforça-se por indivdualizar e psicologizar as construções e as posições dos sujeitos, isolando
as suas inferências do contexto em que é produzido. Sendo assim, o conflito continua sendo um
problema do indivíduo e consequência do seu entendimento. A realidade, as situações não são
portadoras de conflito. Portanto, as decisões, as normas, as condições sócio-laborais, as políticas estão
sempre correctas e, por último, (3) uma visão mais avançada e radical (Política), que tem no conflito,
por um lado, um vector de ruptura capaz de agenciar transformações significativas ao nível da
sociedade, das organizações e da administração, propondo desmascarar as propostas ideológicas que
subjazem na formatação da realidade social, das políticas, por forma a desocultar, de forma consciente,
as verdadeiras causas de conflito; e, por outro, uma possibilidade de inovar as práticas e os processos
de busca de solução, através de confronto aberto de ideias e assentes na respeito à diferença e
pluralismo de ideias.

3. Tipos de Conflito
Uma primeira leitura exploratória, permitiu-nos concluir que, regra geral, os conflitos
encontram-se escalonados em dois grandes grupos: individual e organizacional, sendo que os
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organizacionais podem ser subdivididos em conflitos intergrupais no seu seio das organizações e os
conflitos entre organizações.
Portanto, encontramos conflitos sócio-afectivos, de ordem mais subjectiva, que resultam de
eventuais incompatibilidades do indivíduo na sua interacção com outros actores e os organizacionais-
funcionais ou substantivos que resultam, tanto de factores imanentes à natureza das próprias
organizações como de posicionamentos, de construção de significados e da apropriação das realidades
por parte dos sujeitos organizacionais, no quadro do funcionamento da organização e da sociedade.
Assim, da leitura do trabalho de Ciscar e Uria (1988: 250-253), arriscamo-nos a elaborar o
quadro em baixo que procura espelhar os conflitos, tendo em conta a classificação em cima
apresentada, bem como as formas de manifestação e os motivos.

CONFLITOS
Manifestação /causas
(CLASSIFICAÇÃO)
Diferenças entre sujeito.
Estão relacionados com as características de temperamento, postura e comportamento dos
sujeitos; o quadro da hierarquização de valores do sujeito poderá ser o pano de fundo para o
delineamento de tais conflitos; nestes casos concretos, os factores que condicionam tal
hierarquização de valores podem ser a educação, cultura, origem/classe social, grupo étnico e
religioso, experiências vivenciais e sociais positivas e/ou negativas, do sujeito.
Tais diferenças podem se manifestar, sob forma de (1) Introversão – extroversão; (2)
Independência de critério – necessidade de assessoramento; (3) Agressividade – apatia; (4)
Ânsia do poder – dependência; (5) Tolerância – intolerância às críticas
Diferenças de captação da realidade
Relacionam-se com as diferentes formas do sujeito tem de perceber a realidade (situações,
acontecimentos, etc.), podendo ter efeito positivo ou negativo. Destacam-se, entre outros os que
INDIVIDUAIS estão ligados à situações de (1) Perca de autoridade, (2) Incompatibilidades, (3) Tratamento
injusto e desigual e (4) diferenças de metas, finalidades, etc.
Conflito de papéis
As diferentes Resulta, regra geral, da não demarcação com clareza dos papéis de cada um ou então da própria
formas dos dificuldade em conseguir tal demarcação.
Conflitos relacionados com a tomada de decisões:
indivíduos Surgem quando perante um quadro que se reclama do sujeito o seu posicionamento a respeito de
perceberem os uma decisão e/ou solução; podem manifestar-se em situações de:
(1) Inaceitabilidade (quando é preciso decidir entre uma alternativa melhor, mas que não é
acontecimentos à suficientemente boa ou aceitável, porque não satisfaz minimamente;
(2) Não comparabilidade (quando tem consciência do que acontecerá se eleger tal alternativa,
sua volta mas não tem um padrão para comparar os resultados que derivariam de uma tal opção);
(3) Incerteza (quando se desconhece a relação entre uma escolha alternativa e as consequências
que se derivariam desta mesma escolha);
Conflitos causados por objectivos que se pretendem alcançar
Conflitos individuais derivados dos diferentes objectivos perseguidos por membros de uma
organização. Menos estudado, porque, à partida, a abordagem dominante considera que estando
os objectivos pré-fixados, serão poucas as possibilidades de vir a existir interpretações inividuais
e/ou grupais a respeito.
Conflitos produzidos por deficiências organizacionais
São da vária ordem; embora individuais, mostram-se exteriores aos indivíduos, na medida que
são intrínsecas à natureza e/ou à condição das próprias organizações. Destacam-se, por exemplo
a luta pelo acesso, posse e/ou distribuição dos recursos, acesso e partilha de informação,
condicionamento de benefícios ao cumprimento de requisitos e/ou procedimentos não aceites,
de todo, pelos sujeitos, etc.)
ORGANIZACIONAIS Conflitos intergrupais no interior da organização
Derivam geralmente de situações que espelham: (1) ausência geral de conflito; (2) sentimento da

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Conflitos que se necessidade de tomada decisão a respeito de eventuais diferenças com relação ao objectivo; (3)
relacionam com diferença de percepção da realidade entre os sujeitos da organização; (4) Diferenças de
situações perspectiva relativamente à apropriação dos objectivos e das políticas organizacionais; (5) numa
intrinsecamente situação em que se verifica todos os quadros apontados.
organizacionais e Conflitos entre organizações
das relações que Têm origem em situações em que as organizações em confronto geralmente apresentam
delas são construídas perspectivas diferentes relativamente, à valores, políticas, metodologias que subsidiam e
e correlação de conformam suas propostas, projectos, decisões, soluções.
forças enformadas

Analisando o quadro em cima e na esteia de alguns analistas, distingue-se, efectivamente,


conflitos emocionais, de índole sócio-afectivos, e os substantivos ou orientados para objectivos, para
os de carácter funcional.
Em termos de implicação, tem sido consenso de que os conflitos emocionais ou afectivos, são
de difícil resolução, já que sendo as causas, intrínsecas ao indivíduo, elas dependem muito mais das
concepções do sujeito; sendo assim, revelam-se ameaçador para o clima da organização, para além do
facto de mostrarem-se prejudicial para o próprio sujeito, na medida em que poderá ver-se
estigmatizado e reflectir na sua auto-estima. Sendo assim, este tipo de conflito, para além de dispersar
a energia criativa dos sujeitos, ao condicionar o relacionamento interpessoal entre os membros da
organização e comprometer a qualidade das interacções existentes, acaba também por dificultar a
construção de uma prática colectiva.
Já os conflitos organizacionais-funcionais ou substantivos, podem revelar-se significativos
para os sujeitos, grupos e organização, na medida que, os confrontos e tensões experimentados por
estes na sua interacção e/ou na interacção com a organização e a sua administração, resultam do facto
de projectarem perspectivas diferenciadas relativamente às políticas, estratégias, metodologias e
processos decididos visando a direcção, gestão e administração dos diferentes domínios da instituição.
Porém, ainda que a tendência seja para valorizarmos, muito mais, os conflitos de
funcionamento, também por revelar-se mais importante no quadro a evolução e o desenvolvimento das
organizações e das pessoas, devemos ter em mente, que os conflitos emocionais, estarão sempre
presente em maior ou menor grau, na vida das pessoas, dos grupos e da instituição.
Sendo assim, e muito embora, para o nosso trabalho futuro de dissertação, interesse-nos,
sobretudo, os conflitos organizacionais-funcionais, é nosso entender que os conflitos
supramencionados estarão sempre interrelacionados na configuração das situações produzidas no seio
das organizações a serem estudados e analisados.

III. O Conflito na educação e nas organizações escolares: tentativa de uma


análise explicativa à luz dos conceitos e teorias supramencionadas.

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Considera-se que existe uma relação de implicação entre o que ocorre na organização escolar
nos grupos nele instalados. Assim, a organização escolar enquanto resultante de um processo sócio-
histórico não pode ser compreendido e/ou transformado de forma isolada. Daí que, os processos que
ocorrem no quadro do funcionamento da escola podem ser concebidas e implementadas à revelia do
que acontece tanto no interior da escola (ou seja, à margem dos conflitos produzidos durante o seu
funcionamento), como no seu exterior (portanto, desligados dos conflitos ideológicos que dominam a
sociedade e a comunidade em que se encontra inserida).

Qual a implicação que uma tal visão ou abordagem poderá ter nas na compreensão dos
fenómenos educativos e escolares?
O processo educativo não é nem nunca será uma instância neutra, desprovida de significados e
sentidos ideológicos. Porquê?
Os processos escolares e educativos, sendo fenómenos sociais, carregam no seu seio os
conflitos ideológicos que dinamizam a sociedade, bem como, as estratégias dos indivíduos e dos
grupos que se relacionam e interactuam no estabelecimento escolar. Não existe conduta sócio-humana
vazia de significado. Toda a conduta humana seja ela individual e/ou de grupos tem um cariz
estratégico, na medida em que os processos de escolha, de significados e de sentidos, de classificações,
de posicionamentos e de decisões são construídos sempre como actos de valor, decorrentes da leitura,
interpretação e compreensão dos conflitos ligados aos diferentes aspectos da sociedade e da instituição.
Desta forma, a compreensão dos problemas escolares enquanto resultantes de processos sócio-
históricos, só pode ser conseguida, mediante uma profunda análise de implicação relacional. Esta
análise deve basear-se no exercício crítico-reflexivo que seja capaz de esclarecer os vínculos com os
conflitos ideológicos da sociedade que ajudam a tecer e a sedimentar as relações de poder, a instalar e
a mediar as propostas de acções que visam a organização e a governação dos centros escolares e as
práticas institucionais.
Porém, os processos que conduzem que subsidiam a organização e funcionamento dos
estabelecimentos escolares, na perspectiva de mudança não são pacíficos.

Porquê?
Qualquer organização, inclusive a escola, experimenta conflitos de natureza e intensidade
diversas, expressas em múltiplas situações conflituantes que podem ir desde o conflito entre
professores, passando pelo conflito professor-aluno, professor-direcção, entre alunos, pais-professores
e desembocando no conflito entre o estabelecimento e a administração central e/ou regional. Portanto,
a escola como qualquer outra organização social encontra-se imersa, também, na realidade dos

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conflitos sociais, caracterizada pela existência de lutas e disputas de interesses de diferentes grupos e
classes sociais, culturais, profissionais, etc.
Assim, regra geral, o conflito surge como elemento motor do processo de mudança no
estabelecimento escolar. O conflito é entendido assim, como um facto real no âmbito dos processos
escolares e do funcionamento dos estabelecimentos escolares, devendo ser considerado, valorizado e
potenciado.

Então, porque negar o facto da escola ser um lugar de conflito e que estes poderão ser germes
de mudança e de transformação na organização e funcionamento do estabelecimento escolar?

O caminho adequado é construir uma alternativa que dê um novo significado ao conflito no


seio da escola, ou seja, transformá-lo em fonte /nicho de reflexão crítica de forma a produzir-se
espaços e momentos de debate de ideias e de projectos de inovação que agenciem e articulem novas
práticas sociais, culturais e educativas e modos de relacionamento profissionais transformadores.
Nos estabelecimentos escolares, vivenciam-se situações de desencontros de necessidades, de
expectativas, de interesses, de interpretação, de compreensão e de explicação relacionadas com os
problemas da comunidade escolar e educativa. O que significa que no estabelecimento escolar, existem
«situações em que as pessoas, ou grupos profissionais procuram ou percebem metas opostas, afirmam
valores antagónicos ou têm interesses divergentes» (Jares, 1991, p. 108) citado por Jares (1996)
No entanto, como dizem-nos Apple (1986) e Torres (1991a), citado por Jarez, (1996:p. 237) No
plano educativo, a concepção negativa dominante da natureza e usos do conflito afecta a todos os
seus domínos. No ensino e materiais escolares, o conflito ou é apresentado de forma negativo ou é
escamoteado; o currículo transmite uma realidade sem conflito, tanto no plano social como no
científico.
Na perspectiva tecnocrática-positivista o conflito surge como algo disfuncional, patológico,
portanto, como desvio da tarefa derivada de uma reacção emocional. Ora, a luz de novos estudos
realizados sobre o funcionamento das organizações, a postura tecnocrática-positivista apresenta-se
como uma concepção conservadora, e que postula que as situações de conflito devem ser corrigidas a
todo o custo e/ou evitadas, pois, elas estão ligadas à lutas de poder. Por esta razão surge a necessidade
de um controlo acirrado sobre os conflitos, pois são considerados como situações que perturbam a
consecução da eficácia. Assim, Hannan (1980:90) citado por Jerez (1996: 238), assevera-nos que , “o
conflito, o desacordo, é interpretado como um desvio de tarefa, derivada da reacção emocional, mas
que uma oposição àqueles que definem tarefa, decidem sobre alguma coisa
Nesta perspectiva, a racionalidade que subsidia esta concepção de funcionamento da escola é a
busca da eficácia na sua gestão e desenvolvimento, sendo aquela traduzida em situações/quadros da

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inexistência de conflitos. Isto quer dizer que a eficácia consiste em manter o equilíbrio, a harmonia, a
integração da escola em função dos objectivos organizacionais da sociedade.
Por conseguinte, impõe-se que a escola funcione baseada numa cuidada planificação e
programação de actividades e de utilização de processos de controlo com vista a prevenir ou limitar, ao
máximo, as situações de conflito. A busca cega da eficácia que se configura como algo objectivo,
neutral, técnico e absoluto acaba por orientar todas as acções do estabelecimento escolar, convertendo-
se no único critério definidor para a tomada de decisões.
A este respeito Torres (1991a:53) citado por Jares (1996: 236) diz-nos que tal acontece porque
A escola e os fenómenos educacionais são pensadas afastadas dessa realidade de conflito e luta que
supõe a existência dos diferentes interesses que defendem as diversas classes e grupos sociais.
Por outro lado, a eficácia não pode ser construída unicamente à custa de critérios objectivos,
concretos e mensuráveis, cujas preocupações se assentam exclusivamente em processos
administrativos direccionados para a obtenção do produto. Aliás como diz THURLER (1994) a
colaboração induzida à custa de metas e normativos traçados administrativamente, a partir de dentro
e/ou de fora, não se coaduna com a cooperação consciente, pois esta exige um elevado nível de
profissionalismo que seja crítico-reflexivo, responsável e cooperativo.
Sendo assim, o pensamento linear que tem orientado a busca de soluções para atingir a eficácia
da escola, não se adequa a realidade complexa da organização escolar. A escola eficaz dos anos 80
assente num padrão de rendimento académico, em que a eficácia era entendida como produto/resultado
advindo, fundamentalmente, da especificação de factores organizativos e administrativos já não dá
resposta às necessidades e preocupações actuais.
Na verdade, o projecto da escola eficaz construiu-se na base de uma certa racionalidade
científica-administrativa que acabou, de acordo com Pérez Gómez (1992), citado por Jares (1996:243)
por desconsiderar as capacidades de construção pessoal de significados, a dimensão criativa,
divergente e crítica do pensamento, assim como a capacidade de autoreflexão, autodirecção e
autoavaliação dos actores intervenientes no estabelecimento escolar. Aliás, no dizer de Paulo Freire, é
preciso pessoas com capacidade para pensar soluções para o povo já que geralmente, as elites acusam
o povo de fraqueza ou incapacidade e por isso suas soluções não dão resultado.

Mas a quem serve esta concepção de eficácia no estabelecimento escolar?


A implementação de politicas e de programas e/ou projectos de mudanças e de inovação,
impostos por projectos de reformas que não levem em consideração as realidades escolar e educativa,
tem demonstrado que a não assunção plena da existência de perspectivas diferenciadas e variadas de
soluções e de políticas visando a escola, a educação e a sua direcção, gestão e administração, reforça a
ideia de que o propósito é procurar manter o controlo e satu quo estabelecidos. Esta prática ou

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estratégia tem tido como objectivo principal inviabilizar transformações que coloquem em causa os
mecanismos de alienação e de dominação característicos na gestão e administração educativa. O
conflito é entendido, nesta óptica, unicamente como a percepção errónea do indivíduo em relação a um
fenómeno ou situação e não como reacção crítico-reflexiva deste. Tal posicionamento, como é óbvio,
reforça a ideia de que é imprescindível o controlo efectivo. Daí emerge a necessidade de, em primeiro
lugar, esclarecer e convencer as pessoas em que medida encontram-se equivocadas e, em segundo
lugar, controlar a gestação e o aparecimento do conflito, minimizá-la ou erradicá-la, quando não é
possível evitá-la.
Uma análise mais aprofundada desta questão mostra que as concepções de organização,
administração e funcionamento da escola que têm sido propostas, se baseiam essencialmente nas ideias
das escolas clássicas e psico-social. A ideologia subjacente a estas escolas advoga que os profissionais
e os utentes enquanto “implementadores” de tarefas, de actividades e/ou “utilizadores” de técnicas, não
precisam reflectir sobre o que fazem, restando-lhes apenas praticar as orientações e os procedimentos
determinados para o efeito. Percebe-se assim, uma vez mais, a construção de uma racionalidade
dicotómica que permite dizer que o conflito é um problema teórico na medida que a sua inexistência
depende da capacidade de prevê-los e/ou minimizá-los, através de um exercício técnico-científico que
pré-determina as medidas, as acções e os procedimentos que os práticos devem executar e/ou
implementar.
Qual a consequência desta visão no funcionamento e da administração da educação e da
organização escolar
A perspectiva clássica-burocrática de administração de organizações reforça a separação entre
planificação e execução, trabalho manual e intelectual. Esta visão tem como base o princípio da
especialização em que há os que decidem e pensam e os que executam e obedecem. Sendo assim, o
conflito emerge como um fenómeno teórico, cuja sua resolução só pode ser de natureza técnica. Logo,
os conflitos não podem ser expressão de posicionamentos e de interpretações subjectivas, portanto,
valorativas. Assim, os projectos de mudanças visando a organização e funcionamento das organizações
escolares e as propostas de inovação uma vez concebidos por pessoas qualificadas e especializadas
para o efeito e sujeitos a procedimentos técnicos balizados do ponto de vista científico, não podem ser
colocados em causa.
O carácter científico evocado para justificar a neutralidade político-ideológica das propostas de
inovação, inviabiliza a possibilidade de reconhecer a escola como entidade real específica, ignorando a
sua complexidade e os conflitos inerentes ao seu funcionamento. Ball (1989:32), citado por Jares
(1996:p.239) ainda assim, recorda-nos que é verdade que nem todas as decisões são ideológicas, mas
praticamente todas as questões relacionadas com a organização da educação e do ensino, a estrutura
do curriculo, as relações entre professores e alunos, as relações entre as diferentes estruturas da

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educação, as normas que orientam as tomadas de decisões na instituição têm fortes básicas
ideológicas
A opção por uma abordagem crítica do conflito assente em pressupostos culturais e políticos
mostra que, ao contrário da perspectiva técnico-burocrática, a mudança na organização e
funcionamento do estabelecimento escolar só será possível, se a escola e os processos que nela
ocorrem forem devidamente levados em conta. Ora, isto só se tornará realidade se o conflito for
enfrentado de forma didáctica e numa perspectiva democrática. Isto significa dizer que todos os
actores implicados deverão ter a oportunidade de, através de mecanismos de confronto, questionarem e
discutirem a vida organizacional e da adminsitrativa, o seu funcionamento e as suas contradições.
Como diz Thurler(1994), não basta enfrentar o conflito para melhorar o clima ou a atmosfera da
escola, mas, sobretudo de procurar, através destes mecanismos, transformar o estabelecimento num
espaço-ambiente onde se aprende; ou seja, converter o estabelecimento escolar num ambiente sócio-
político-cultural no qual são agenciados espaços e processos de tomadas de decisões acerca do
funcionamento da escola, gestão e adminsitração da educação assentes na promoção de (…) valores de
comunicação, de deliberação social, interdependência, solidariedade, colegialidade.”.

O que significa transformar a escola num espaço-ambiente em que se aprende?


As tipologias sócio-políticas e sócio-críticas da escola e da adminsitração da educação
estruturam-se a partir de mecanismos que se centram nos sujeitos, enquanto produtores de análises e
construções próprias em confronto com realidade escolar e educativa. É o sujeito, na sua interacção
com os demais e com a realidade enformada a partir desta interacção que, em função da apropriação da
realidade e da correlação de força nela instalada, valoriza esta ou aquela postura, se posiciona e/ou se
identifica com a instituição e com os processos que nela ocorrem (designadamente, reage às situações,
às ideias novas e aos projectos de mudança, à predisposição para a aprender, partilhar e cooperar e,
sobretudo, como interpreta as conquistas e os ganhos conseguidos e a repercussão destes na sua vida
sócio-profissional.), que viabiliza/adopta, rejeita e/ou alternativamente propõe este ou aquele modo de
relacionamento profissional e/ou institucional..
Thurler (1994), a este respeito, diz-nos que a prática dominante actual nas organizações
escolares, forjada a partir de uma perspectiva burocrática favorece a implantação de rotina, posturas
reactivas e uma certa balcanização; e que isto tem conduzido à estagnação e à constituição de
conglomerados culturais, inviabilizando, deste modo, o tratamento e a resolução de forma colectiva e
amadurecida, dos seus problemas; o que gera situações em que a resolução de problemas dos
estabelecimentos escolares, sejam equacionados ao nível individual, sectária, ou ditada de fora. No
entanto, a perspectiva hermenêutica-interpretativa também não propõe grandes mudanças nesta
matéria, pois, é ainda Ball (1989:33), citado por Jares (1996: p.241) que nos diz que ela faz encarar a

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motivação huamana como exclusivamente individual, omitindo-se o reconhecimento dos interesses no
sentido sociológico. Portanto, os membros da organização, nesta lógica, são considerados quase que
exclusivamente, em termos de “necessidades “ individuais, e não tanto como pertencentes a grupos e
preocupações e ideologias partilhadas. Desta forma, as controversas fundadas em valor e a formação
de alianças e coalisões ficam fora do quadro., desvalorizando-se assim a dimensão política, ideológica
e colectiva dos conflitos
Como é lógico, esta perspectiva exclui a possibilidade do confronto de ideias e dificulta o
amadurecimento de estratégias e soluções a partir de um quadro mais amplo e profundo que
transformem a escola num ambiente cultural, possibilitando a revisão das práticas, valores e condutas
por parte de cada profissional e seus utentes. Para além disso, inviabiliza uma analise critica do
contributo de cada um objectivando um adequado funcionamento da instituição a que pertencem,
assim como, as formas de o melhorar continuamente.
Para alguns autores, esta situação é característica de organizações escolares que não aprendem;
ou seja, escolas em que não existe uma cultura ou uma prática que levem os seus actores a reflectir de
forma crítico-reflexiva, tanto discutindo entre eles, sistematizando e potenciando as suas experiências,
como amadurecendo, colectivamente, e experimentando as ideias e propostas de mudança e de
transformação.
As mudanças visando a organização e funcionamento das organizações escolares devem
basear-se em acções articuladas e construídas a partir da compreensão e partilha por parte das
comunidades escolar e educativa, dos propósitos, finalidades, conteúdos e processos de mudança.
Assim, é preciso revisitar as práticas profissionais e instituicionais e colocá-las em confronto, partilhar
os medos e as conquistas, estabelecer confiança, respeito e pontes de solidariedade que confluem para
a apropriação consciente e partilhada da identidade da instituição e das inovações.
Como já se viu cada escola tem sua especificidade, isto é, sua identidade. Esta identidade só
terá significado se ela for clara, largamente debatida, difundida e compartilhada por todos os actores
que concorrem para o funcionamento do estabelecimento.
Portanto, a totalidade da escola e da educação dependerá da potenciação das diferentes
perspectivas de explicação e solução que as realidades escolares e educativas permitem engendrar.
Como tal é assim que deve ser analisada e explicada. Não se pode entender o sucesso da escola como
um fenómeno isolado, pois o seu funcionamento é influenciado, de forma dinâmica, por pessoas,
grupos e outras instituições. Por isso, é necessário assegurar a integração dos diversos sectores da
escola nos processos de decisão, baseada numa cultura de participação quotidiana que ajuda os
diversos actores a se inteirar e a participar da vida da sua instituição. Impõe-se igualmente que se crie
espaços de aprendizagem baseados na troca e confronto de ideias, processos e práticas. Este
procedimento deverá ser uma aposta estratégica na medida em que a transformação da escola e dos

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processos que nela ocorrem dependerão, fundamentalmente, do entendimento e da compreensão que o
colectivo for capaz de construir das propostas a serem implementadas e das melhorias conseguidas.
Para tal, urge construir uma nova escola, isto é, que seja aberta, dinâmica, dialéctica e de clima
aberto. Esta nova escola deverá procurar “acompanhar e interagir com a sociedade, a comunidade e o
Estado, tanto institucionalmente, quanto individualmente”. Assim, ela deve ser alimentada por
interacções constantes entre as pessoas e privilegiar a busca contínua e sistemática de renovação e
inovação. Acresce-se ainda, a necessidade de valorizar e potenciar as capacidades de construção
pessoal, a dimensão criativa, divergente e crítica do pensamento e de perspectivas de análise e de
soluções, assim como de promover e incentivar a capacidade de auto-reflexão, auto-direcção e
autoavaliação das acções e das políticas escolares e educativas”.

IV. Natureza conflituosa da organização e administração escolar e educativa.

Está mais que provado que o ser humano é um animal social, pois só a vivência conjunta lhe
permite superar e contornar os grandes desafios que directa e/ou indirectamente assegura e/ou
compromete a sua sobrevivência, sejam elas de índole natural ou social. Tal vivência conjunta, impõe,
como é óbvio, uma organização no sentido de ordenar e mediar o esforço conjunto das pessoas no
interior de uma dada sociedade. Assim, as sociedades actuais são/estão definitivamente assentes em
organizações. E sendo os indivíduos os seus elementos fundamentais, estes vêem-se confrontados no
dia a dia com uma infinidade de situações/processos criados e impostos pelas instituições-organizações
de que fazem parte, sejam elas primárias e/ou secundárias.
Fica claro, assim, que ao se organizarem para viver em sociedade, as pessoas precisam de
estabelecer regras, criando normas e definindo papéis a serem desempenhados por cada um, tanto no
quadro da(s) organização(ões) a que pertencem como no da sociedade em que estão inseridas. As
pessoas pertencem assim, à organizações e instituições diversas, podendo desempenhar papéis
diversificados que vão se configurando, em função de regras e normas estabelecidas, modelos e
padrões de comportamentos (?) que deverão nortear as suas acções. No entanto, não nos parece que a
questão fundamental seja a existência de normas; mas sim, de onde partem as normas, quem as
concebe, quais os valores que as enformam e os propósitos que perseguem. Tal coloca ao indivíduo o
dilema de se deixar formatar e vencer pelo factor organizacional ou então se posicionar, contestando e
participando, buscando intervir e influenciar, no funcionamento da organização de que faz parte.

E as organizações escolares e/ou educativa (OEE) como são enquadradas neste cenário
teórico de abordagem de conflito?

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Os pressupostos de racionalidade que visionam a escola como instituição amorfa, livre de
conflitos, isoladas das contradições sociais e solidárias com status quo social existente, como já vimos
perde sentido, face aos novos enfoques sobre o conflito. Assim, a perspectiva burocrático –
estruturalista e interpretativas ao centrarem-se nas estruturas e/ou nas pessoas, neste caso, numa
perspectiva meramente individual, revela-se uma abordagem conservadora que contraria à inovação.
No entanto, baseado no enfoque critico - politico exposto por Habermas (1982), Giroux, (1990)
e Apple (1986), que considera a organização como construção social, que é mediatizada pela realidade
social-cultural e política mais ampla; ou seja, que a compreensão dos fenómenos da organização
escolar só é possível quando enquadrada em seus contextos sócio-históricos, valorizando as dimensões
micro e macro.
Assim, entendemos, juntamente com Gonzalez (1990:41), citado por Jares (1996) que “As
escolas são uma realidade construída como organização não independente da estrutura social
dominante. Esta estrutura legitima determinadas relações, estruturas e condições organizativas” e
que “(…) a realidade organizativa, uma vez constituída, aparece envolta por um componente
ideológico que a protege do exame crítico”. Sendo assim, “(…) a mudança organizativa só pode
produzir-se, através da eliminação das formas de dominação; apenas quando os membros da
organização compreendem e são conscientes da estrutura profunda, é possível libertar e explorar
outros modos de pensar na escola.”.
Só assim se explica a natureza conflituosa da educação e da escola. Aliás, Beltrán (1991:225)
citado por Jares (1996: p.244) esclarece-nos, mais, a respeito, dizendo-nos que la naturaleza
conflictiva de las escuelas “se explica por el emplazamiento de los centros, derivado de su condición
institucional, en el seno de la macropolítica escolar, delimitada por las relaciones existentes entre el
Estado, la Administración y la sociedad civil; a la vez que su dimensión micropolítica, determinada
por las relaciones, por igual peculiares, entre profesores, currículo y estructuras organizativas “
Mas, nesta mesma perspectiva, Crozier & Fiedberg, (1977), citados por Vieira (p.66) assevera
que “Cada actor, cada indivíduo que trabalha numa organização, intervém na organização através do
seu próprio comportamento que resulta duma escolha ponderada a partir das vantagens e
desvantagens daí resultantes, e visa a obtenção de objectivos pré-determinados. Neste sentido, Crozier
e Friedberg (1977) designam o actor social como “estratégico; o que significa reconhecer que os
indivíduos têm diferentes interesses, às vezes antagónicos, e, por isso, muitas vezes geradores de
conflitos no equacionar decisões e soluções. Daí que, nesta óptica, os objectivos da organização,
geralmente dos grupos que mandam na organização, se mostrem instáveis e sujeitos ao questionamento
permanente, quando confrontados com perspectivas divergentes.
Este quadro é-nos confirmado por, Afonso (1993:43) que caracteriza a escola como sendo (…)
organizações políticas onde grupos distintos com interesses próprios entram em interacção com o

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objectivo de satisfazer esses interesses particulares, num contexto caracterizado pela diversidade dos
objectivos, pela existência de conflitos abertos ou latentes ou pela luta por maior legitimidade e
poder.
Assim, de acordo com Alves (1993:61), A organização escolar é marcada pela diluição de
objectivos, participação escassa e fluida, tecnologias rotineiras, difusão e policentrismo do poder,
incerteza e turbulência do contexto, multiplicidade de valores, heterogeneidade de formação e
interesses dos actores (Alves, 1993:61). P.69; ou seja, estamos em presença de uma organização
escolar que, de acordo com Lima (2003: p.33 ) em que muitos dos seus elementos são desligados, se
encontram relativamente independentes, em termos de intenções e de acções, processo e tecnologias
adoptados e resultados obtidos, administradores e professores, professores e professores, professores
e alunos, etc.
Nesta lógica então, a escola é conceitualizada enquanto sistema político, como nos diz Costa (
p.82-83), pois , embora os conflitos decorrentes de decisões radiquem nos interesses e surjam das
estratégias planeadas pelos diversos grupos (ou indivíduos), a sua origem não se situa exclusivamente
no interior da organização, mas, estando numa situação de vulnerabilidade relativamente ao seu
ambiente (…), os condicionalismos externos deverão ser também considerados como fonte do conflito
intra-organizacional.
Assim, o conflito, para além de fazer parte da vida organizacional é considerado como
importante no quadro funcionamento da organização, assumindo-se as escolas, segundo Ball, citado
por Costa (1996:83) como verdadeiros campos de luta, divididas por conflitos em curso ou
potenciais… de onde saem vencedores aqueles que melhor desencadearam as suas estratégias de poder,
quer formal (autoridade), quer informal (influencia). As tomadas de decisões vão resultar por
conseguinte de uma negociação (regateio) entre os diferentes subgrupos (lobbies, clientelas) à volta
dos chamados bens de troca, por exemplo a atribuição de um bom horário, disponibilização de
recursos, indicação para um cargo, Nesta lógica, a escola é, de facto, uma arena politica.
Do exposto, concluímos que a escola, a educação são por naturezas conflituosas.

Mas, quais as razões ou causas que explicam a natureza conflituosa da educação em geral, e
da escola, em particular?

Jares (1996:p. 244) enumera cinco razões principais e os escalona em dois níveis, sendo (1) o
nível macroestrural: a) Por la relación que se establece entre los centros educativos y las metas
educativas de la sociedad a través de las políticas educativas y los currículos establecidos; b) Porque
la escuela reproduce muchos de los conflictos que se producen en la esfera social y política. (…), e (2)
o nível microestrutural: c) Por el hecho de ser una organización y, como afirma Morgan “el conflicto
estará siempre presente en las organizaciones” (1990:141), y la escuela (…) no es una excepción; d)

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Por la especificada de su naturaleza organizativa, ambigua, con diversidad de metas, celularismo,
etc., e e) por la especificad micropolíticas que se establecen en su seno.
Por outro lado, Bolman e Deal (Bolman e Deal, 1984, p.109), citado por Jares (1996:p.245)
enumeram cinco características que justificam a natureza conflituosa da escola e da educação,
alegando que (1) “A maioria das decisões importantes nas organizações implica distribuição de
escassos recursos; (2) “As organizações são coalisões compostas de indivíduos e de grupos de
interesses, como por exemplo, níveis hierárquicos, departamentos, grupos profissionais, grupos
étnicos; (3) “Os objectivos e as decisões organizacionais emergem de variados processos de
negociação, pactos e lutas.” (4) Devido a escassez de recursos e ao endurecimento progressivo das
diferenças, o poder e o conflito são características centrais da vida organizacional.” (citado por
Jeresp.245)
Sarmento (1993: p.23), referenciado-se em Bush (1986 e 1989) nos diz que este enquadra esta
abordagem de conflito no modelo político de organização escolar e que se identifica pela centralidade
das problemáticas de conflito e de controlo e luta pelo poder, e por práticas de negociação,
compromisso, aliança ou luta. É o mesmo Sarmento (1993: p.24) que sintetizando as contribuições de
Ellstron (1983) a respeito, nos diz que este se caracteriza como sendo um modelo de predomínio do
poder, luta e conflito (conflito nos objectivos e transparência nos processos).
Ora, à luz das colocações de Jares (1996:p.245), Bolman e Deal (1984, p.109) e também, Bush
(1986) citados por Alves (1995:p.34) e Jares (1996), respectivamente, podemos concluir que os
conflitos fazem parte das organizações escolares; e que estes ganham expressão concreta no conceito
de poder manifesto nos diferentes formatos de decisão construídos no interior da organização e/ou
impostas externamente, bem como das “lutas” e estratégias daí enformadas e instauradas.
Portanto, torna-se evidente que essa conflituosidade deve ser explicitadas a partir de
interacções e mecanismos de potenciação e derivação constantes da dialéctica entre o macrosistema
político-eduactivo e as demais unidades que a constitui, no caso concreto, as escolas, os centros de
formação, etc. Portanto, estamos em presença de uma função macro-micro cuja linha de força
dominante tem sido expressa na “legitimidade” da instancia macrosistémica político-educativa
dominar e controlar as microunidades educativas e escolares.
No entanto, no quadro da ressigificação das unidades educativas e escolares, vem sendo
construído a teoria micropolítica da organização escolar que é definido por Hoyle (1982 e 1986),
citado por Jares (pág 244- 245), como estratégias pelas quais o indivíduo ou os grupos em contextos
organizativos procuram usar seus recursos de autoridade e influencia para atingir/defender seus
interesses (pág 244- 245), (…) tanto do ponto de vista do domínio e controlo por parte do grupo ou
da direcção, da governação do centro ou da educação, como fazendo parte de uma politica de
oposição ou resitência.

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Ora Costa (1996: p.80), rferenciando-se em Hoyle (1986a:148) explicita e justifica tal,
escrevendo que as organizações escolares estão especialmente propensas para a actividade
micropolítica devido a duas razões fundamentais: a prmeira, no que concerne ao funcionamento
debilmente articulado (lowsely coupled) de diversas áreas da sua actividade; a segunda, devido ao
carácter competitivo e conflitual da tomada de decisões, em especial a colisão entre a legitimidade
formal dos respeonsáveis escolares (directores, gestores) e as formas democráticas e profissionais
percepcionadas como as mais apropriadas para o funcionamento dos estabelecimentos de ensino.
Perante um tal quadro, alguns estudiosos, entre outros, Jares (1992a) agrupam os conflitos no
quadro da organização e administração escolar e educativa, em quatro categorias, a saber:

(1) Ideológico-científicas: que resultam de diferentes opções pedagógicas, ideológicas


definidoras da formatação da escola e da educação e organizativas e do tipo de cultura ou
culturas escolares que convivem no centro;

(2) Relacionadas com o poder: que se ligam ao controlo da organização, à promoção


profissional, ao acesso dos recursos e à tomada de decisões;

(3) Relacionadas com a estrutura: ligadas à situações de ambiguidade de metas e funções ,


debilidade organizativa, Contextos e variáveis organizativas

(4) Relacionadas com questões pessoais e de relação interpessoal: estima própria/afirmação,


Segurança, Insatisfação laboral, Comunicação deficiente e/ou desigual

Em jeito de conclusão, podemos então dizer que a educação e a escola, face a esta interacção
dialéctica macro-micro educativos em torno do poder e do controlo e assentes em projectos
ideológicos, científicos e pessoais diversos e/ou contraditórios, apresentam-se como nichos naturais
para a criação e existência de conflitos, nos seus mais diversos domínios. Entre estes conflitos
podemos destacar os que se prendem com as práticas e culturas de racionalização do funcionamento e
das práticas organizacionais, o enfoque burocrático – administrativo, as relacionadas com a construção
curricular, as formas de direcção, gestão e administração da escola e da educação, os enfoques, o
acesso e gestão dos recursos financeiros, materiais e meios humanos filosófico-ideológicos atinentes à
conceptualização do professor, do aluno, as abordagens relativas à participação na tomada de decisões
e na construção de soluções, das estratégias operacionais na execução de tarefas e de objectivos, as
políticas de financiamento, as políticas sócio-educativas, a autonomia etc.

V. Considerações finais

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A lógica burocrática-autoritária e hermenêutico-interpretativa que afiançam de que um bom
indicador de equilíbrio na educação e nas escolas, será a inexistência de conflitos, justificando assim
medidas de recursos tendentes a, por um lado, colocá-las em camisa de forças, por forma a evitar
desvios intencionais, através de regulamentações castradoras e inibidoras de vontade e criatividade
individuais e colectiva, e, por outro, coartando a possibilidade da construção de uma “consciência
organizacional-institucional, indivdualizando os conflitos, em nada contribuem para uma prática
idónea e responsável na construção de decisão e soluções para os variados problemas da escola e da
educação.
Aliás, como colocam alguns autores, a ordem normativa em si, não elimina os conflitos no
interior das organizações, ao menos que tal ordem seja consequência de uma construção consciente
dos indivíduos e dos grupos visados; ao contrário, reprime-os! É este quadro de hegemonia imposto às
organizações, com esta arregimentação cerrada, que acaba, segundo Gramsci, por ser ser objecto de
resistência e geradora de conflitos.
Do exposto ao longo deste pequeno trabalho, podemos depreender, então, que a abordagem dos
problemas das organizações escolares e educativas a partir do conflito é uma opção político-
metodológica que pode revelar-se inovadora e criativa na busca de soluções para as situações
problemáticas que vão caracterizando a educação, de uma forma geral, e as escolas, em particular.
Assim, ela permite, entre outros, construir uma análise crítica e dinâmica da realidade, através de
exploração e compreensão da cumplicidade e dialogicidade que se instauram entre as propostas
político-educativas e escolares e os valores e as estratégias que as orientam e as conformam, bem
como os processos, as práticas e os modos de relacionamento profissionais sedimentados na arena
escolar. O não entendimento desta cumplicidade, que é dialéctica, pode conduzir à selecções/opções
politicas e educativas destoadas das necessidades e das exigências educativas, em geral, e dos centros
escolares, em particular.
Por isso, urge recuperar o protagonismo dos sujeitos nos seus contextos, já que, “a teoria e
prática são inseparáveis no plano da subjectividade do sujeito (...), pois sempre há um diálogo do
conhecimento pessoal com a acção.”. Aliás, como diz Habermas (citado em Pérez-Gómez, 1992:103),
a reflexão implica a imersão consciente do homem no mundo da sua existência, um mundo carregado
de valores, intercâmbios simbólicos, correspondências afectivas, interesses sociais e cenários
políticos.

Para terminar, pretendemos dizer que o presente trabalho se propôs constituir uma breve
reflexão sobre o conflito nas organizações escolares. Procuramos, analisar, à luz dos diferentes
enfoques sobre o conflito, como é este enquadrado no contexto escolar e educativo, as suas formas de
manifestação mais comuns, e as suas consequências na direcção, gestão e administração da educação

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em geral e da escola em particular. Não temos a certeza de o termos conseguido. Todavia, afigurou-se
um exercício pedagógico e de aprendizagem interessantes, não só pelas ideias levantadas, mas até pelo
próprio exercício da escrita.

VI. BIBLIOGRAFIA UTILIZADA E CONSULTADA

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Augusto Borges Amado

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