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Brasília, 03 a 07 de junho de 1996 - Nº 34

Data (páginas internas): 12 de junho de 1996

Este Informativo, elaborado pela Assessoria da Presidência do STF a


partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário,
contém resumos não oficiais de decisões proferidas na semana pelo Tribunal. A
fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma
das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a
publicação das mesmas no Diário da Justiça.

ÍNDICE DE ASSUNTOS
Ação Rescisória e ADIn
Cabimento de Habeas Corpus
Competência para Julgamento de Prefeito
Contraditório e Ampla Defesa
Contribuição Social
Imunidade Penal de Vereador
Quota de Contribuição
Reajuste de Servidor
Reincidência e Menoridade
Suspensão de Segurança
Taxa e Imposto: Base de Cálculo
Taxa e Poder de Polícia
Vereadores: Remuneração

PLENÁRIO

Competência para Julgamento de Prefeito


Iniciado o julgamento de habeas corpus afetado ao Plenário pela Segunda Turma, em
que se discute sobre a aplicabilidade do art. 29, X, da CF - que prevê o julgamento do
prefeito perante o Tribunal de Justiça - a processo por crime de homicídio que teria sido
praticado pelo paciente antes do advento da Constituição de 1988, ao tempo em que o
mesmo exercia o mandato de prefeito municipal. Após os votos dos Ministros Maurício
Corrêa, relator, Ilmar Galvão e Néri da Silveira, deferindo a ordem para anular a decisão
proferida pelo Tribunal do Júri, ao fundamento de que o mencionado preceito
constitucional deveria ser aplicado à hipótese, e dos votos dos Ministros Marco Aurélio,
Carlos Velloso, Sydney Sanches e Moreira Alves, indeferindo a ordem sob o argumento de
que o paciente já não exercia o mandato quando a CF/88 entrou em vigor, o julgamento foi
suspenso por pedido de vista do Min. Sepúlveda Pertence. HC 73.680-SP, rel. Min.
Maurício Corrêa, 03.06.96.

Suspensão de Segurança
Em julgamento de agravo regimental interposto contra decisão do Presidente que
deferira pedido de suspensão de segurança formulado pela União (Lei 4348/64, art. 4º), o
Tribunal - acolhendo embora a preliminar de ilegitimidade ad processum do Procurador-
Geral da Fazenda Nacional, ao fundamento de que somente o Advogado-Geral da União
poderia representá-la perante o STF (LC 73/93, art. 4º, III) -, afastou a pretendida extinção
do feito, por entender que o Procurador-Geral da República, possuindo, ele próprio,
legitimidade para requerer a suspensão (RISTF, art. 297 e Lei 8038/90, art. 25), assumira
em seu parecer a iniciativa da ação. No mérito, a decisão agravada - que suspendera os
efeitos da liminar em mandado de segurança que o TRF da 3ª Região deferira para
assegurar ao impetrante (instituição financeira) o direito de deduzir da base de cálculo do
imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro a “provisão para créditos em
liqüidação” - foi confirmada por maioria de votos (vencido o Min. Marco Aurélio). SS
1.015-SP (AgRg), rel. Min. Sepúlveda Pertence, 03.06.96.

Contribuição Social
Iniciado o julgamento de dois recursos extraordinários em que se discute sobre se o
dispositivo legal que elevou de 8% para 10% a alíquota da contribuição social instituída
pela Lei 7689/88 - dispositivo, esse, que resultara da conversão em lei da MP 86, de
25.09.89 - poderia ser aplicado no próprio exercício de 1989, alcançando o lucro apurado
em 31 de dezembro daquele ano. Após os votos dos Ministros Ilmar Galvão, relator do
primeiro RE, julgando válida a incidência da alíquota majorada, e Carlos Velloso, relator do
segundo, julgando-a inconstitucional, pediu vista o Min. Maurício Corrêa. RE 197.790-
MG, rel. Min. Ilmar Galvão, e RE 181.664-RS, rel. Min. Carlos Velloso, 03.06.96.

Imunidade Penal de Vereador


Tratando-se de discurso proferido da tribuna da Câmara Municipal, a inviolabilidade do
vereador “por suas opiniões, palavras e votos” (CF, art. 29, VIII) é absoluta, admitindo,
como sanção, somente as que forem aplicáveis no âmbito da própria casa legislativa. Com
esse fundamento, o Tribunal conheceu e deu provimento a recurso extraordinário interposto
contra acórdão que condenara o recorrente (vereador) por crime de calúnia. Vencido o Min.
Marco Aurélio, ao fundamento de que a acusação feita da tribuna pelo recorrente a terceiro
não estava relacionada com o exercício do mandato de vereador, cuidando-se, antes, de
questão pessoal. RE 140.867-MS, rel. orig. Min. Marco Aurélio; rel. p/ ac. Min. Maurício
Corrêa, 03.06.96.

Reajuste de Servidor
Indeferida liminar em ação direta ajuizada pelo Governador do Distrito Federal contra
lei distrital que prevê a concessão de reajuste aos servidores públicos locais “observados,
no mínimo, os percentuais concedidos aos servidores públicos federais” (Lei 1007/96).
Como não houve, até o momento, lei concedendo reajuste aos servidores federais, o
Tribunal considerou inocorrente o periculum in mora, pressuposto do deferimento da
medida cautelar. ADIn 1438-DF, rel. Min. Ilmar Galvão, 03.06.96.

Ação Rescisória e ADIn


Não cabe ação rescisória de acórdão proferido em ação direta de inconstitucionalidade.
Com base nesse entendimento, o Tribunal negou provimento a agravo regimental interposto
contra despacho do relator que negara seguimento a ação rescisória. Precedente citado: AR
878-SP (RTJ 94/49). AR 1.365-BA (AgRg), rel. Min. Moreira Alves, 03.06.96.

PRIMEIRA TURMA
Cabimento de Habeas Corpus
Se a pretensão a determinado tratamento penal já foi examinada e indeferida pelo STF
em julgamento de habeas corpus, a circunstância de o STJ haver decidido de modo mais
favorável em relação a outro co-réu não confere ao paciente daquele HC o direito à
extensão previsto no art. 580 do CPP [“No caso de concurso de agentes (Código Penal,
art. 25), a decisão do recurso interposto por um dos réus, se fundado em motivos que não
sejam de caráter exclusivamente pessoal, aproveitará aos outros.”]. Não pode o STF ficar
vinculado a decisão proferida por tribunal de menor hierarquia. Habeas corpus não
conhecido. HC 73.886-SP, rel. Min. Sydney Sanches, 04.06.96.

Quota de Contribuição
A quota de contribuição sobre a exportação de café, criada pelo DL 2295/86 e devida
ao extinto IBC - Instituto Brasileiro do Café, não foi revogada pela parte permanente da
CF/88 - que manteve o tributo na competência da União (art. 149) -, nem pelo art. 25, I, do
ADTC, que, ao prever a revogação, a partir de 180 dias da promulgação da Carta, de
“todos os dispositivos legais que atribuam ou deleguem a órgão do Poder Executivo
competência assinalada pela Constituição ao Congresso Nacional, especialmente no que
tange a: I - ação normativa”, atingiu somente a delegação contida no art. 40 do
mencionado decreto-lei, que dava poderes ao Presidente do IBC para fixar o valor da
aludida contribuição. RE 191.229-SP, rel. Min. Ilmar Galvão, 04.06.96.

Contraditório e Ampla Defesa


Iniciado o julgamento de RE interposto pelo Estado de Santa Catarina contra acórdão
que determinara a reintegração à Polícia Militar de praças com menos de 10 anos de serviço
aos quais foi imposta, independentemente de procedimento administrativo, pena de
licenciamento sumário a bem da disciplina. Após o voto do Min. Ilmar Galvão, relator - não
conhecendo do RE por entender que a decisão recorrida aplicara corretamente a regra do
art. 5º, LV, da CF (“aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados
em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa...”) -, pediu vista o Min.
Octavio Gallotti. RE 140.195-SC, rel. Min. Ilmar Galvão, 04.06.96.

Taxa e Imposto: Base de Cálculo


Iniciado o julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão que teve por
ilegítimas as taxas de licença de localização e funcionamento e de prevenção de incêndio
do município de Sorocaba-SP, ao fundamento de que sua base de cálculo - a área ocupada
pelo estabelecimento fiscalizado - seria a mesma do IPTU, coincidência vedada pelo art.
145, § 2º, da CF (“As taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos.”). Após
o voto do Min. Ilmar Galvão, relator, afastando a pretendida incompatibilidade da norma
municipal com o citado art. 145, § 2º, pediu vista o Min. Octavio Gallotti. RE 185.050-SP,
rel. Min. Ilmar Galvão, 04.06.96.

Taxa e Poder de Polícia


A cobrança de taxa em razão do exercício do poder de polícia (CF, art. 145, II)
depende, entre outros fatores, da prestação efetiva desse serviço pela pessoa tributante.
Com base nesse fundamento - e verificando, na espécie, a partir dos fatos assentados pelo
acórdão recorrido, que o exercício efetivo do poder de polícia justificava plenamente, no
período compreendido pela demanda, a exigência da taxa de fiscalização, localização e
funcionamento do município de São Paulo -, a Turma não conheceu de recurso
extraordinário em que se sustentava a ilegitimidade da referida taxa. Precedentes citados:
RE 80441-ES (RTJ 88/882) e RE 116518-SP (RTJ 149/535). RE 195.788-SP, rel. Min.
Octavio Gallotti, 04.06.96.

SEGUNDA TURMA

Reincidência e Menoridade
A atenuante da menoridade não prevalece sobre a agravante da reincidência. Na
presença concomitante das duas circunstâncias, cabe ao juiz efetuar a compensação de uma
pela outra, quando da dosagem da pena. Habeas corpus indeferido contra o voto do Min.
Marco Aurélio, que dava prevalência à menoridade. Precedente citado: HC 71.469-SP (DJU
de 18.08.95). HC 73.772-SP, rel. Min. Néri da Silveira, 04.06.96.

Vereadores: Remuneração
Iniciado o julgamento de recurso extraordinário em que se discute sobre a validade, em
face do art. 37, XIII, da CF (“é vedada a vinculação ou equiparação de vencimentos,...”)
de resolução da Câmara Municipal de São José do Rio Preto-SP que fixava a remuneração
de seus vereadores, para a legislatura de 1989/1992, em valor equivalente a 25% da
remuneração dos deputados estaduais. Após os votos dos Ministros Marco Aurélio, relator,
e Néri da Silveira - entendendo ser possível a questionada vinculação desde que observado
o teto salarial do prefeito do Município (art. 37, XI da CF) -, o julgamento foi adiado em
virtude de pedido de vista do Min. Maurício Corrêa. RE 181.715-SP, rel. Min. Marco
Aurélio, 04.06.96.

Sessões Ordinárias Extraordinárias Julgamentos

Pleno 05.06.96 03.06.96 20


1ª Turma 04.06.96 -------- 107
2ª Turma 04.06.96 -------- 24

OS INTERESSADOS EM OBTER CÓPIAS EM DISQUETE DOS INFORMATIVOS 01


A 21, EM ARQUIVOS PADRÃO “WORD FOR WINDOWS”, DEVERÃO PROCEDER
DA SEGUINTE MANEIRA: REMETER PARA O ENDEREÇO ABAIXO UM
DISQUETE DE 3 ½” , DEVIDAMENTE FORMATADO, E ENVELOPE DE RETORNO
PREENCHIDO E SELADO.
Supremo Tribunal Federal
Assessoria da Presidência
“INFORMATIVO STF”
Praça dos Três Poderes
CEP - 70.175-900 - Brasília - DF

C L I P P I N G DO D J
07 de junho de 1996

Rcl nº 529-1
Rel.: Min. Carlos Velloso
EMENTA: PROCESSUAL PENAL. PENAL. RECLAMAÇÃO: S.T.J., HC 2.295-SP e
RHC 3.277-SP.
I. - O S.T.J., julgando o RHC 3.277-SP, decidiu que o réu não tinha o direito de
apelar em liberdade. Posteriormente, julgando o HC 2.295-SP, decidiu em sentido
contrário. Esta última decisão usurpou competência do Supremo Tribunal Federal, dado
que a primeira decisão somente poderia ser modificada em recurso extraordinário
ou em "habeas corpus" originário, ambos da competência da Corte Suprema.
II. - Reclamação julgada procedente, cassado o acórdão proferido no HC 2.295-
SP, avocando-se o julgamento deste pelo STF.

Inq 731 (EDcl)


Rel.: Min. Néri da Silveira
EMENTA: Ação Penal. Denúncia recebida. Prova ilícita. Embargos de declaração
pleiteando seu desentranhamento. Constituição, art. 5º, inciso LVI. 2. Reconhecida a
ilicitude da prova constante dos autos, conseqüência imediata é o direito da parte, à qual
possa essa prova prejudicar, a vê-la desentranhada. 3. Hipótese em que a prova questionada
foi tida como ilícita, no julgamento da Ação Penal nº 307, fato já considerado no acórdão
de recebimento da denúncia. 4. Pedido de desentranhamento formulado na resposta
oferecida pelo embargante e reiterado em outro instante processual. 5. Embargos de
declaração recebidos, para determinar o desentranhamento dos autos das peças
concernentes à prova julgada ilícita, nos termos discriminados no voto condutor do
julgamento.

MS nº 22264-6
Rel.: Min. Octavio Gallotti
EMENTA: - Desapropriação para fins de reforma agrária.
Vício de notificação (art. 2º, § 2º, da Lei nº 8.629-93) e indevida
desconsideração de registros imobiliários em nome dos impetrantes (art. 859 do Código
Civil e art. 252 da Lei nº 6.015-73).
Segurança concedida.

HC nº 73454-5
Rel.: Min. Maurício Corrêa
EMENTA: "HABEAS-CORPUS". CRIME DE CORRUPÇÃO ATIVA. ALEGAÇÃO
DE NULIDADE DA PRISÃO PREVENTIVA, PORQUE: 1º) FUNDADA NA
OCULTAÇÃO DO PACIENTE PARA NÃO SER CITADO (CPP, ART. 312), EIS QUE
PARA A OCULTAÇÃO EXISTEM AS SANÇÕES PROCESSUAIS DA CITAÇÃO
EDITALÍCIA (CPP, ART. 362) E DE DECLARAÇÃO DE REVELIA (CPP, ART. 366);
2º) A OCULTAÇÃO FOI LEGÍTIMA, EIS QUE EXISTIA OUTRA ORDEM DE
PRISÃO CONTRA O PACIENTE, ANULADA EM "HABEAS-CORPUS".
1. Ninguém é obrigado a cumprir ordem ilegal, ou a ela se submeter, ainda que
emanada de autoridade judicial. Mais: é dever de cidadania opor-se à ordem ilegal;
caso contrário, nega-se o
Estado de Direito. Precedentes.
2. Ainda que o paciente tenha se ocultado para não se submeter a ordem de
prisão ilegal, este fato não foi o único fundamento suficiente do segundo decreto de
prisão, baixado por outra autoridade judiciária em outro processo; a nova ordem de
prisão atende às previsões dos arts. 312, 313, I, e 315 do CPP.
3. "Habeas-corpus" originário, substitutivo de recurso ordinário em "habeas-
corpus", conhecido, mas indeferido.

HC nº 73491-0
Rel.: Min. Marco Aurélio
COMPETÊNCIA - HABEAS-CORPUS - ATO DE TRIBUNAL DE ALÇADA
CRIMINAL. Na dicção da ilustrada maioria, em relação à qual guardo reservas, compete
ao Supremo Tribunal Federal julgar todo e qualquer habeas-corpus dirigido contra ato de
Tribunal ainda que não possua a qualificação de superior. Convicção pessoal colocada
em segundo plano, em face de atuação em Órgão fracionário.
PENA - PROGRESSÃO DO REGIME DE CUMPRIMENTO. O pleito deve
estar lastreado não só no fator objetivo - cumprimento de pelo menos um sexto da pena
no regime anterior - como também no subjetivo, ligado ao mérito do presidiário.
Mostra-se insusceptível de acolhimento quando o exame criminológico revela
desequilíbrio emocional, havendo demonstrado o preso não possuir constrangimento
pelos atos delituosos cometidos e não se sentir obrigado a conformar-se com os
padrões vigentes da vida gregária. Se de um lado a fuga não pode ser considerada como
fator negativo, tendo em vista consubstanciar direito natural, de outro não menos correto é
que a prática delituosa a partir dela torna incontroversa a falta da indispensável
ressocialização.

HC nº 73638-6
Rel.: Min. Maurício Corrêa
EMENTA: "HABEAS-CORPUS". CRIME DE DANO QUALIFICADO, EM
CONCURSO FORMAL. CRIME DE AUTORIA COLETIVA. ALEGAÇÃO DE INÉPCIA
DA DENÚNCIA, POR NÃO DESCREVER "TODAS AS CIRCUNSTÂNCIAS" DO
FATO CRIMINOSO.
1. Nos crimes multidudinários, ou de autoria coletiva, a denúncia pode narrar
genéricamente a participação de cada agente, cuja conduta específica é apurada no curso
do processo.
2. A exigência de indicação na denúncia de "todas as circunstâncias do fato
criminoso" (CPP, art. 41) vem sendo mitigada pelos pretórios quando se trata de crime
de autoria coletiva, desde que se permita o exercício do direito de defesa. Precedente.
3. Ademais, "as omissões da denúncia poderão ser supridas a todo o tempo, antes da
sentença final" (CPP, art. 569).
4. "Habeas-corpus" conhecido, mas indeferido.

MS nº 22090-3 (AgRg)
Rel.: Min. Carlos Velloso
EMENTA: CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DE
TRIBUNAL DE 2º GRAU. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO S.T.F.
I. - Não cabe ao S.T.F. julgar, originariamente, mandado de segurança
impetrado contra ato de Tribunal de 2º grau ou de Tribunal Superior. C.F., art. 102, I, "d".
II. - Agravo regimental não provido.

RE nº 140341-1
Rel.: Min. Carlos Velloso
EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRABALHO. SINDICATO. AÇÃO DE
CUMPRIMENTO. COMPETÊNCIA. CONVENÇÕES COLETIVAS. C.F., art. 114. Lei
8.984, de 07.02.95.
I. - A competência para o processo e julgamento das ações de cumprimento de
sentenças normativas havidas em dissídios coletivos ou em convenções ou acordos
coletivos de trabalho, é da Justiça do Trabalho, tendo em vista a inovação, em termos
de competência, inscrita no art. 114 da Constituição, presente, também, a Lei 8.984,
de 07.02.95, art. 1º.
II. - R.E. não conhecido.

RE nº 154945-9
Rel.: Min. Marco Aurélio
APOSENTADORIA PROPORCIONAL - TEMPO DE EXERCÍCIO EM FUNÇÃO
COMISSIONADA - DILAÇÃO. Uma vez completado o período previsto na Carta
Política da República - alínea "c" do inciso III do artigo 40 - para o servidor
aposentar-se com proventos proporcionais, descabe cogitar da permanência em
função comissionada. A norma insculpida no § 2º do artigo 40 referido está restrita a
cargos ou empregos temporários, inconfundíveis com cargo efetivo e deslocamento, do
servidor, para a função comissionada. A aposentadoria, em si, rege-se pelo texto
constitucional. Insubsistência do artigo 172 da Lei do Município de São Paulo de nº 8.989,
de 29 de outubro de 1979, no que condiciona a aposentadoria de detentor de cargo de
provimento efetivo à permanência por quinze anos na função comissionada que venha
ocupando.
RE nº 158215-4
Rel.: Min. Marco Aurélio
DEFESA - DEVIDO PROCESSO LEGAL - INCISO LV DO ROL DAS GARANTIAS
CONSTITUCIONAIS - EXAME - LEGISLAÇÃO COMUM. A intangibilidade do
preceito constitucional assegurador do devido processo legal direciona ao exame da
legislação comum. Daí a insubsistência da óptica segundo a qual a violência à Carta
Política da República, suficiente a ensejar o conhecimento de extraordinário, há de ser
direta e frontal. Caso a caso, compete ao Supremo Tribunal Federal exercer crivo
sobre a matéria, distinguindo os recursos protelatórios daqueles em que versada, com
procedência, a transgressão a texto constitucional, muito embora torne-se necessário,
até mesmo, partir-se do que previsto na legislação comum. Entendimento diverso
implica relegar à inocuidade dois princípios básicos em um Estado Democrático de
Direito - o da legalidade e do devido processo legal, com a garantia da ampla defesa,
sempre a pressuporem a consideração de normas estritamente legais.
COOPERATIVA - EXCLUSÃO DE ASSOCIADO - CARÁTER
PUNITIVO - DEVIDO PROCESSO LEGAL. Na hipótese de exclusão de associado
decorrente de conduta contrária aos estatutos, impõe-se a observância ao devido processo
legal, viabilizado o exercício amplo da defesa. Simples desafio do associado à assembléia
geral, no que toca à exclusão, não é de molde a atrair adoção de processo sumário.
Observância obrigatória do próprio estatuto da cooperativa.

Ag nº 158735-1 (AgRg)
Rel.: Min. Sydney Sanches
EMENTA: - DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL.
ARTIGOS 5º, INCISOS II E LV (PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E AMPLA
DEFESA), 192, § 3º (TAXA DE JUROS REAIS), DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E
47 DO ADCT.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. RECURSO ESPECIAL.
1. Não comprovando a recorrente que o tema do inc. II do art. 5º da C.F. fora
prequestionado na apelação, de modo a se poder verificar se o acórdão da apelação fora
igualmente omisso, a respeito, e a justificar os embargos declaratórios apresentados no
Tribunal de origem, não se pode, no R.E., considerar satisfeito o requisito do
prequestionamento a propósito de tal tema (Súmulas 282 e 356).
2. Ademais, se ofensa tivesse havido ao inciso II do art. 5º da C.F., seria por via indireta,
ou seja, por má interpretação de normas infraconstitucionais, alegação inadmissível,
em R.E., segundo pacífica jurisprudência do S.T.F.
3. Do mesmo modo, eventual violação ao inciso LV do art. 5º da C.F. (princípio da
ampla defesa) resultaria, no caso, de má interpretação de normas processuais sobre
produção de provas, a justificar Recurso Especial para o Superior Tribunal de Justiça,
que, no caso, não houve, e não Recurso Extraordinário para esta Corte.
4. Igualmente não lograria êxito o R.E., no que concerne à taxa de juros prevista no
§ 3º do art. 192 da C.F., pois o Plenário do S.T.F., na ADI nº 4, considerou tal
norma não auto-aplicável.
5. Por fim, no que respeita ao art. 47 do ADCT, o R.E. estaria a comportar melhor
exame, não fosse uma particularidade, que o inviabiliza, no caso. É que haveria coisa
julgada, decorrente de outra ação, entre as mesmas partes, sobre tal questão, a obstar a
reapreciação do tema pelo S.T.F., no R.E.
6. Evidenciada, assim, a inviabilidade deste, correta a decisão que lhe negou
seguimento.
7. Agravo improvido.

Acórdãos publicados: 176

T R A N S C R I Ç Õ E S

Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão


mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões
que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade
jurídica.
Estupro e Violência Presumida
HC 73.662-MG *

DECISÃO: Por maioria de votos, a Turma rejeitou proposta do Presidente, no sentido de afetar ao Plenário o
julgamento do habeas corpus, tendo em conta a importância da matéria, vencidos os Ministros Carlos Velloso e
Presidente. Por maioria, a Turma concedeu o habeas corpus para absolver o paciente, vencidos os Ministros
Carlos Velloso e Presidente. A Turma determinou, ainda, a expedição de alvará de soltura, em favos do paciente, se
por al não houver de permanecer preso. 2ª Turma, 21.05.96.

Ministro Marco Aurélio (relator)


RELATÓRIO - Com a inicial de folhas 2 a 13, procuram os Impetrantes demonstrar que, na espécie, não restou
configurado o tipo em relação ao qual foi condenado o Paciente, ou seja, aquele consubstanciado no artigo 213,
combinado com o artigo 224 do Código Penal. A partir do exame da prova coligida, sustenta-se que não houve o
estupro em si, já que a vítima se passara por pessoa com idade superior à real, quer sob o aspecto físico, quer sob o
aspecto mental, tendo confessado em Juízo que mantivera relação sexual com o Paciente por vontade própria. Por
sua vez, este último, após o episódio, ocorrido em 1991 quando contava com vinte e quatro anos, contraíra
matrimônio, levando vida regular e sendo pai de filho menor. Ressalta-se que o Paciente pressupôs estar mantendo
conjunção carnal com pessoa de idade superior aos dezesseis anos, verificando-se, assim, verdadeiro erro de tipo.
É transcrita jurisprudência sobre a matéria.
Aos autos veio a peça de folha 140, noticiando o julgamento, pela Primeira Câmara Criminal, de apelação
interposta pela defesa, mediante o qual foi expungido o aumento da pena.
Remetidos os autos à Procuradoria Geral da República, pronunciou-se esta no sentido do indeferimento do
pedido, salientando ser o habeas-corpus impróprio ao reexame de provas.
É o relatório.

VOTO - [...]
No mérito, tem-se que, nos crimes de estupro, o depoimento da vítima exsurge com inegável importância. No
caso dos autos, ouvida em Juízo, esclareceu que vinha saindo de motocicleta com o Paciente, sempre indo a lugar
deserto para troca de beijos e carícias. Apontou que o mesmo já fizera com um dos amigos do Paciente, entre
outros rapazes. A seguir, noticiou que o Paciente pedira gentilmente para que mantivesse consigo conjunção
carnal, e que se recusara, de início, mas cedera em face às carícias. Retornando à residência, pedira ao Paciente
que a deixasse longe de casa, visando a fugir à fiscalização do genitor, que, por falta de sorte, viu-a descer da
motocicleta.
Ao que tudo indica, a ação penal em que condenado o Paciente surgiu única e exclusivamente da reação do
pai da vítima. Esta, respondendo a perguntas endereçadas pelo Estado-acusador, foi categórica em afirmar que:
"(...)já ficou com outro rapaz de nome Valdir; que se relacionou sexualmente com o réu por três vezes e que
na última foi que seu pai pegou; que a depoente manteve relações sexuais com o réu na primeira vez que o
conheceu; que tal relação sexual não foi forçada em hipótese alguma; que assim agiu porque pintou vontade;
que o relacionamento da depoente com o pai não é muito bom e que o pai a pressionou para comparecer
perante a autoridade; que transou com Valdir num sítio abandonado perto da fábrica." (folhas 48 e 49)
[...]
Soma-se ao depoimento da própria vítima a da testemunha Henrique Ambrósio de Souza, consoante o qual:
"(...)tinha conhecimento de que Márcio saía junto à menor M.A.N. que, igualmente ficou sabendo pelo
próprio acusado que ambos mantiveram relações sexuais; que a vítima aparentava ter uns 15 ou 16 anos; é do
conhecimento do declarante que ela saía com outros; que chegou a ver a menor sair à noite com outras
pessoas de moto; que a menor anda muito pela noite ficando até a madrugada na rua e o depoente a considera
uma prostitutazinha." (folha 51)
Diante de tais colocações, forçoso é concluir que não se verificou o tipo do artigo 213 do Código Penal, no
que preceitua como estupro o ato de "constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave
ameaça". A pouca idade da vítima não é de molde a afastar o que confessou em Juízo, ou seja, haver mantido
relações com o Paciente por livre e espontânea vontade. O quadro revela-se realmente estarrecedor, porquanto se
constata que menor, contando apenas com doze anos, levava vida promíscua, tudo conduzindo à procedência do
que articulado pela defesa sobre a aparência de idade superior aos citados doze anos. A presunção de violência
prevista no artigo 224 do Código Penal cede à realidade. Até porque não há como deixar de reconhecer a
modificação de costumes havida, de maneira assustadoramente vertiginosa, nas últimas décadas, mormente na
atual quadra. Os meios de comunicação de um modo geral e, particularmente, a televisão, são responsáveis pela
divulgação maciça de informações, não as selecionando sequer de acordo com medianos e saudáveis critérios que
pudessem atender às menores exigências de uma sociedade marcada pelas dessemelhanças. Assim é que, sendo
irrestrito o acesso à mídia, não se mostra incomum reparar-se a precocidade com que as crianças de hoje lidam,
sem embaraços quaisquer, com assuntos concernentes à sexualidade, tudo de uma forma espontânea, quase natural.
Tanto não se diria nos idos dos anos 40, época em que exsurgia, glorioso e como símbolo da modernidade e
liberalismo, o nosso vetusto e ainda vigente Código Penal. Àquela altura, uma pessoa que contasse doze anos de
idade era de fato considerada criança e, como tal, indefesa e despreparada para os sustos da vida. [...]
Portanto, é de se ver que já não socorre à sociedade os rigores de um Código ultrapassado, anacrônico e, em
algumas passagens, até descabido, porque não acompanhou a verdadeira revolução comportamental assistida pelos
hoje mais idosos. Com certeza, o conceito de liberdade é tão discrepante daquele de outrora que só seria
comparado aos que norteavam antigamente a noção de libertinagem, anarquia, cinismo e desfaçatez.
Alfim, cabe uma pergunta que, de tão óbvia, transparece à primeira vista como que desnecessária, conquanto
ainda não devidamente respondida: a sociedade envelhece; as leis, não?
Ora, enrijecida a legislação - que, ao invés de obnubilar a evolução dos costumes, deveria acompanhá-la,
dessa forma protegendo-a - cabe ao intérprete da lei o papel de arrefecer tanta austeridade, flexibilizando, sob o
ângulo literal, o texto normativo, tornando-o, destarte, adequado e oportuno, sem o que o argumento da segurança
transmuda-se em sofisma e servirá, ao reverso, ao despotismo inexorável dos arquiconservadores de plantão,
nunca a uma sociedade que se quer global, ágil e avançada - tecnológica, social e espiritualmente.
De qualquer forma, o núcleo do tipo é o constrangimento e à medida em que a vítima deixou patenteado
haver mantido relações sexuais espontaneamente, não se tem, mesmo a mercê da potencialização da idade, como
concluir, na espécie, pela caracterização. A presunção não é absoluta, cedendo as peculiaridades do caso como são
as já apontadas, ou seja, o fato de a vítima aparentar mais idade, levar vida dissoluta, saindo altas horas da noite e
mantendo relações sexuais com outros rapazes como reconhecido no depoimento e era de conhecimento público.
Na doutrina encontra-se a corroboração a esta tese. Consoante ensina Magalhães Noronha, a presunção
inscrita na letra "a" do artigo 224 do Código Penal é relativa, podendo ser excluída pela suposição equivocada do
agente de que a vítima tem idade superior a quatorze anos:
"Se o agente está convicto, se crê sinceramente que a vítima é maior de quatorze anos não ocorre a
presunção. Não existe crime, porque age de boa-fé." (Direito Penal, 4ª ed., vol. 3/221)
Também Heleno Cláudio Fragoso, em "Lições de Direito Penal", afirma que a presunção em comento não é
absoluta, "pois o erro plenamente justificado sobre a idade da vítima exclui a aplicação de tal presunção".
Por tais razões, concedo a ordem para absolver o Paciente.
É o meu voto.

Ministro Néri da Silveira (voto-vista)

[...] É de anotar, assim, que, no exame das provas, a sentença não assentou que a menor aparentasse mais de
doze anos de idade, como se pretende na inicial do habeas corpus. Ao recusar, por fundamentos jurídicos, a
alegação da defesa, afirmou, inclusive, que isso seria, no ponto, irrelevante.
De tal modo, esse fato não há, desde logo, de ser, aqui, em habeas corpus, invocado, para afastara as decisões
das instâncias ordinárias. Não caberia, ademais, em habeas corpus, pretender reapreciar as provas do feito
criminal, em ordem a poder sustentar a tese de a menor possuir aparência de pessoa com mais de quatorze anos. à
evidência, a fotografia de fls. 19, trazida com a inicial, nada prova, desde logo, por absoluta falta de identificação
das seis meninas que nela são vistas e da data a que corresponde. Nem seria invocável mera afirmação de uma
testemunha de defesa, companheiro do paciente. [...]
A posição adotada pela sentença e o acórdão guardam conformidade com a jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal.
No julgamento do Recurso Extraordinário Criminal nº 116.649-PR, a Primeira Turma, por votação unânime,
relator o ilustre Ministro Octávio Gallotti, decidiu em aresto assim ementado (RTJ 127/343):
“Estupro cometido contra vítima que não é maior de catorze anos (artigos 213 e 224, “a”, do Código
Penal). Presunção de violência, que não cede em face da consideração da experiência sexual da ofendida.
Recurso provido, para condenar-se o réu.”
Cuidava-se, então, de hipótese em que as decisões de primeiro e segundo graus, referindo, também lições de
Magalhães Noronha e Heleno Cláudio Fragoso, sustentavam tratar-se de presunção relativa a da alínea “a” do art.
224, do Código Penal. [...]
Pois bem, a Primeira Turma conheceu do recurso extraordinário, por divergência do aresto recorrido com
julgados do STF e de outros Tribunais, e lhe deu provimento para condenar o recorrido. Começou por invocar
aresto desta Segunda Turma, no Habeas Corpus nº 51.500 (RTJ 68/375), assim ementado:
“1. Estupro cometido mediante violência presumida (Código Penal art. 224, ‘a’). O consentimento da
ofendida e sua experiência sexual anterior não desconstituem a tipicidade de tal fato criminoso.
2. Dolo intenso, ou brando e qualquer matéria envolvida em prova não podem ser objeto de apreciação em
processo de habeas corpus (Rel. Min. Antonio Neder, RTJ 68/375).”
No precedente referido desta Turma, adotara-se este fundamento (RTJ 68/376):
“4. Por outro lado, como também apontado pela veneranda decisão condenatória, irrelevante se apresenta, na
espécie, o consentimento da menor ou a conclusão dos peritos sobre a atividade sexual anterior da ofendida,
pois tanto ‘não ilide a tipicidade do crime em tela, máxime considerando que o apelado por mais de uma vez
possuiu a menor e o fato de, eventualmente, antes de alcançar a idade de doze anos, ter sido ela vítima de
outro ou outros estupros em nada o beneficia.” [...]
Idêntica orientação seguiu a Primeira Turma, no RECr nº 108.267-PR, relator o Ministro Sydney Sanches
(RTJ 130/803-817), a 21.3.1989.
Proclamou, com inteira adequação à teleologia da norma em exame, o colendo Tribunal de Justiça do Estado
de São Paulo, relator o Des. Thomaz Carvalhal (“in” Revista dos Tribunais, vol. 348, págs. 81 a 83): “A leviandade
de uma menor de quatorze anos não autoriza ninguém a aproveitar, satisfazendo seus instintos sexuais. Sua
imaturidade para consentir em ato de tal relevo para sua vida, torna criminosa a ação, pela qual seu autor responde
penalmente”. [...]
Nesse sentido, anotou, no precedente mencionado, o ilustre Ministro Sydney Sanches (RTJ 130/816):
“A teleologia da norma penal é a defesa da menor. E essa tutela não pode ser ignorada mesmo quando
alegadas experiências anteriores da menor. O contrário seria incentivar a prostituição infantil, pela
impunidade que criaria.
Como diz o recorrente, citando o Professor João Mestieri, “no estupro ficto tem-se um dever geral de
abstenção de relações sexuais imposta aos destinatários da norma em relação a menores de certa idade.” [...]
Não logra, desse modo, também, maior relevo, a tão invocada expressão da vítima de que “assim agiu
porque ‘pintou’ vontade” ou estoutra “que não tem medo de pegar AIDS e nem de engravidar”, reproduzidas na
sentença (fls. 91). Não é menos certo que, no primeiro depoimento, informou que, por medo, subiu na carona da
moto do paciente, quando este determinou.
Está, de outra parte, em uma rápida incursão pelos documentos, no “laudo psicológico”, às fls. 83: “ Seu
comportamento é instável, com falta de perseverança nas atividades, reagindo de forma imatura às estimulações
ambientais. Percebe-se também seu narcisismo e exibicionismo, com fantasias no campo sexual. (...). Encontra-se
emocionalmente perturbada, esforçando-se para manter a integridade do ego.”
Na compreensão do art. 224, “a”, do Código Penal, cumpre ter, assim, presente que se supõe a violência pela
falta de consentimento válido, ou seja, pela incapacidade de consentir do sujeito passivo. Nessa linha, decidiu o
Tribunal de Justiça de São Paulo: “Irrelevante haja acedido (menor de 13 anos de idade) ao primeiro convite de
seu estuprador, se por presunção legal não tinha discernimento e liberdade de volição. O seu querer era viciado
pela incapacidade de consentir”. Já, por isso, advertia Viveiros de Castro, prove o réu que a ofendida consentiu;
prove ainda o réu que a menor tinha uma inteligência perspicaz e viva, sabia perfeitamente o que fazia (...),
conhecia teoricamente todos os segredos da voluptuosidade (...). O crime não muda de natureza, é estupro (...).”
(RJTJSP 28/400 e RT 460/327). O Superior Tribunal de Justiça, à sua vez, no Recurso Especial nº 15414, relator o
Ministro Pedro Acioli, decidiu em aresto assim ementado:
“A falta de consentimento válido é a essencial circunstância que confere ao artigo 224 a presunção ‘juris et de
jure’, buscada para ter-se como real a violência presumida. Não há conceder que menores de quatorze anos, a
quem não se permite validade de atos jurídicos tenha consciência plena para validar com o seu consentimento
o ato em comento. É justamente a impossibilidade de o menor compreender em toda sua extensão o ato
praticado, que afasta o consentimento válido, para excluir a incidência da norma penal. Falta ao menor a
maturidade, quer mental, ,quer física, para ter alcance e avaliar com precisão o ato violador dos costumes.
Não pode falar-se, portanto, em consentimento pleno e livre; a conseqüência é a violência presumida.” (DJU
de 31.8.1992, p. 13653)
De todo o exposto, tenho, pois, que a exegese conducente a afastar a incidência do art. 224, letra “a”, do
Código Penal, quando a menor de quatorze anos manifestar consentimento em ato sexual, levaria a tornar impunes
ações socialmente reprováveis, inaceitáveis e mesmo abjetas de elementos inescrupulosos que buscariam
satisfação sexual com pobres crianças, já desprotegidas, em razão da miséria material e do abandono moral e
intelectual, que cercam a prostituição infantil. Bastaria, a seguir, para a impunidade, que a infeliz vítima, em razão
de dinheiro ou de favores outros do sujeito ativo, ou mesmo por medo de represália, afirmasse que consentira na
prática da conjunção carnal ou que provocara, para isso, o agente do ilícito. Tal interpretação, “data venia”, - além
de negar o texto da lei, sua finalidade que é a proteção ao menor de quatorze anos, - não contribuiria, de outra
parte, para a solução do gravíssimo problema da infância e da adolescência de nosso tempo, a qual não se restringe
a mero amparo material a legiões de meninos e meninas que perambulam pelas ruas de nossas cidades, mas
simultaneamente, exige, dos Poderes Públicos e das instituições privadas, a assistência moral e espiritual, em
ordem a que possam participar dos valores da cidadania e se integrar nos caminhos da dignidade humana. O Poder
Judiciário é co-responsável nessa obra da nacionalidade, cumprindo-lhe, destarte, não dar às leis interpretação que,
aparentemente, atenderia a uma época de liberação sexual, mas que, em verdade, conduzirá à impunidade em
crimes dessa natureza e isso implicará, assim, concorrer, na aplicação da lei, para a crescente dissolução dos
costumes. A lei quer dar proteção ao que não é maior de quatorze anos; não é cabível, destarte, conferir-lhe
interpretação que terá como destino, evidentemente, favorecer os que buscam dar satisfação a seus instintos
sexuais, fora do matrimônio ou de relação familiar estável nos termos da Constituição, procurando menores, quase
sempre desamparados, ou fruto da liberação dos costumes, os quais, por sua imaturidade, seriam, ainda uma vez,
vítimas da própria sociedade.
Com a devida vênia, mantenho a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, porque é a que melhor atende
aos objetivos da lei, à exigida proteção social aos menores de quatorze anos e aos interesses maiores da sociedade.
Indefiro o habeas corpus.

* Acórdão ainda não publicado.

Assessor responsável pelo Informativo


Miguel Francisco Urbano Nagib

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