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foda-seoestado.com/o-inevitavel-fracasso-do-partidarismo/
Com muito tempo no movimento libertário, nota-se em todo ano par o mesmo debate de
sempre: partidarismo vs anti-política. Chega em um ponto que fica bastante cansativo
repetir os mesmos argumentos e esclarecer posições no que diz respeito à rejeição das
vias políticas. Mas em virtude desse ano o debate estar mais acalorado devido à
publicação da versão tupiniquim de uma antítese do manifesto de Konkin, uma espécie de
manifesto gradualista, vou abrir aqui uma pequena exceção. Trata-se de um debate
importante, pois visa a influenciar como um libertário deve usar seu tempo extra no eterno
combate ao estatismo. Eu pensei em dar uma resposta a esse manifesto, mas quando o li,
vi que ele em momento algum tocou nos principais argumentos dos libertários puristas.
Visto que não se responder um texto que não tem direção a seus argumentos, o melhor a
se fazer é esclarecê-los. Bem, vamos lá.
Pessoas votaram “errado” (admitindo aqui uma suposta existência de voto “correto”)
porque as ideias dominantes estão erradas. Políticos tendem à demagogia e à falsas
promessas de “almoço grátis” porque é o que toca a população. Indo ainda mais longe, vê-
se facilmente que o populismo dá certo porque antes da esquerda dominar o mainstream
político, ela fez o trabalho de “formiguinha” e instituiu no mundo inteiro uma cultura de
dependência e de subjugação das pessoas à classe política, negando as virtudes
intrínsecas da auto-determinação pessoal e da livre-iniciativa e instituindo para isso uma
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ideia do mal necessário, que devemos obrigatoriamente nos sacrificar em prol de uma
ficção sociopata, o chamado “bem-estar social”.
Olhando para um intervalo maior de tempo, vemos que esse é um fenômeno que vem
ocorrendo ao longo de séculos e os números o demonstram cabalmente. Mais ainda, toda
a história política dos séculos XVI e XVII até hoje é a história do fracasso das ideias da
liberdade em prol do coletivismo. Hans-Hermann Hoppe usou as transições das
monarquias absolutistas européias para a democracia republicana a fim de ilustrar esse
ponto. Na seção “Provas e ilustrações: a exploração e a visão de curto Prazo (orientada
Para o Presente) sob o regime monárquico e Sob o republicanismo democrático” de seu
famoso livro Democracia – o Deus que Falhou, ele apresenta inúmeros indicadores
econômicos e estatísticos para isso. Acredito que esse seja um ponto passivo no debate.
Olhando para o Brasil, vê-se o mesmo fenômeno, mesmo cortando sua história em
pedaços. Ainda em curtos períodos de tempo, é possível identificar como a prevalência
das ideias coletivistas determinaram o rumo da política em direção ao cenário
bem estatizante que temos hoje. Tomemos por exemplo o caso do PT: sua maior vitória
não foi nas urnas em 2002, mas décadas antes, quando completou seu processo de
dominação no meio acadêmico e cultural do Brasil. A vitória de Lula nas urnas, cedo ou
tarde, era algo inexorável, dada essa realidade.
Não creio que haja dúvidas quanto à importância do debate de ideias. Mises não cometeu
exagerou algum quando escreveu que a história dos homens em sociedade é determinada
por suas ideias. De fato, as ideias são as rédeas da ação humana. E apenas as ideias
corretas podem iluminar a escuridão. O debate começa quando se argumenta que é
possível fazer política em prol da liberdade paralelamente a esse combate de ideias. Ou
mais ainda, que a política é um mecanismo importante para que as ideias da liberdade
ganhe as repercussões necessárias. A isto eu pretendo expor dois pontos centrais que
para mim consistem no núcleo da anti-política.
Primeiramente, haja visto que a predominância das ideias corretas é o que em última
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análise determina tudo o mais na esfera das relações do homem em sociedade, deve-se
sempre colocar a coerência em primeiro plano. Então, a questão que se apresenta é: seria
coerente defender a via política e ao mesmo tempo defender as ideias da liberdade? A
resposta a isto é um claro e sonoro “não”. Para um libertário, não é difícil ver o porquê,
bastando para isso entender a natureza do funcionamento do estado, uma instituição
social fundada na ausência de consenso entre os homens, logo coercitiva por
natureza. Em todo e qualquer lugar, o estado sempre se resume a ganhar à custa de
outros. Não houve qualquer avanço nessa realidade. Podemos mudar as definições e
alegar que, porque votamos, estamos nos governando a nós mesmos. Mas isso não altera
a essência do problema moral do estado: tudo que ele tem, ele adquire através do roubo.
Nem um centavo do seu orçamento trilionário é adquirido em trocas voluntárias. [1]
É importante também salientar que a correta propagação das ideias libertárias vai melhorar
as chances de políticos com maior inibição para o roubo como uma consequência indireta,
embora não intencional, de modo que, curiosamente, os partidaristas já saem no lucro
com o trabalho de propagação da ética libertária e suas implicações de não-agressão,
ainda que na ignorância de um imediatista, eles deturpem a mensagem com um falso
pragmatismo, típico de quem não entendeu ou finge não entender que os desdobramentos
do mundo político são só a ponta de um complexo iceberg encrustado na realidade
sociológica dos homens.
O segundo ponto é uma resposta à mais natural questão que se coloca após o primeiro: é
só isso que propõem os anti-políticos, quer dizer, basta debater, escrever textos, ministrar
palestras e gravar vídeos educativos e tudo estará resolvido caso um número
suficientemente grande de pessoas estiverem convencidas da tese libertária? Obviamente
não. É até pueril, senão ridículo pensar que não há mais nada a fazer. Ao contrário, muito
pode e deve ser feito. Citando Mises novamente, “um movimento ‘anti-qualquer-coisa’
demonstra uma atitude puramente negativa. Não tem a menor chance de sucesso. Suas
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críticas acerbas virtualmente promovem o programa que atacam. As pessoas devem lutar
por algo que desejam realizar e não simplesmente evitar um mal, por pior que seja.” Algo
deve ser proposto e posto em prática para dar lugar à política como uma forma de
organização social legítima. Mas para que seja algo que de fato se opõe à política, como
desejamos, então ela deve emergir de baixo para cima na ordem espontânea da
sociedade, ser voluntária e descentralizada. Não se pode esperar portanto que surja do dia
para a noite e que seja proposto por um libertário só, afinal, não há porque haver unicidade
nas soluções.
Nesse ponto, já deve estar claro que a denominação “gradualista” que se dá aos adeptos
do partidarismo está nominalmente errada, haja visto que eles têm uma altíssima
preferência temporal, focando apenas no curto prazo. A política jamais traz mudanças
graduais em uma só direção senão a do próprio estatismo. Para mudanças mais profundas
e significativas, o projeto que eles têm para hoje é completamente estéril na melhor das
hipóteses e no geral, é uma imensa perda de recursos e de qualidade na mensagem
libertária. Os puristas ou abolicionistas, por outro lado, focam no longo prazo, aumentando
o capital humano pró-liberdade ao mesmo tempo em que estimula e apoia as soluções
descentralizadas anti-establishment. Não há nem pode haver uma solução mágica e no
momento em que vivemos, a luta contra o aparato de dominação e poder do estado é
talvez a mais difícil de todas. Buscar por soluções sem efetividade em longo prazo e
degeneradas por princípio é subestimar o valor e a importância dessa causa.
Notas
[1] Para mais detalhes sobre a natureza do estado e sua relação com a política, veja meu
artigo “Por que devemos rejeitar a política“, onde a questão moral é enfatizada. Também
sobre a moralidade do voto, recomendo o artigo “Seria votar um ato de violência?” de Carl
Watner. Neste presente artigo estaremos interessados em questões pragmáticas,
referentes à suposição da utilidade do voto para uma profunda mudança social rumo a um
ideal libertário.
[2] Esse silogismo foi primeiramente formulado no debate em escrito que tive com Paulo
Kogos, cuja íntegra pode ser lida aqui.
[3] Vale notar que a tática geral que consiste na prática sistemática de boicote ao estado e
à economia regulada já foi sistematizada em teoria no fim do século XX por Samuel
Konkin, que a denominou de Agorismo. Ela abrange desde complexas redes de trocas no
mercado negro como o Silk Road até simples atos de preferir uma carrocinha de hot-dog
à uma grande corporação de fast-food ou de optar pela compra de uísques
contrabandeados em detrimento daqueles em prateleiras de mercado. As novas
tecnologias descentralizadas ou descentralizadoras como o já citado Openbazaar, podem
ser grandes aliadas, facilitando o anonimato, quebrando barreiras físicas e conectando
libertários com interesses em comum.
5/5