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“RELIGIÕES AFRO-MARANHENSES NAS ONDAS DO RÁDIO: UM POUCO

DA HISTÓRIA DA COMUNICAÇÃO AFRO-RELIGIOSA EM SÃO LUÍS”

“RELIGIÕES AFRO-MARANHENSES NAS ONDAS DO RÁDIO: UM POUCO DA HISTÓRIA


DA COMUNICAÇÃO AFRO-RELIGIOSA EM SÃO LUÍS”

Gerson Carlos Pereira Lindoso¹, glindoso@uol.com.br Sérgio Figueiredo


Ferretti²(Orientador)
1- Jornalista e Mestrando em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Maranhão, UFMA, 2- Prof°
Dr.do Depto. de Sociologia e Antropologia, UFMA.

A história da comunicação afro-religiosa maranhense ou o universo de idéias circulantes


que vão além da informação, atrelando-se a um processo interacional e de sociabilidade
(emissor-receptor) referente a própria comunicação popular, teve como base estrutural a
iniciativa de pais-de-santo da cidade na divulgação de suas religiões, a partir de
programas radiofônicos especializados nessa temática. Dentre esses líderes afro-
religiosos destacamos Jorge da Fé em Deus (chefe do Terreiro de Iemanjá-Tambor de
Mina, falecido em 2003) e José Cupertino de Araújo (chefe da Tenda Deusa Iara-
Umbanda, falecido em 1984) que apresentavam programas de rádios sobre culturas
afro-religiosas no início dos anos 70 em São Luís. Com o presente estudo buscamos
subsídios para a construção da história da comunicação afro-religiosa maranhense,
resgatando dados e informações concernentes a esses grupos, que também produzem e
fazem comunicação.

Palavras-Chave: Comunicação Popular, Religiões afro-brasileiras, Líderes afro-religiosos


maranhenses, Tambor de Mina, Umbanda.

Gerson Carlos Pereira Lindoso¹, glindoso@uol.com.br Sérgio Figueiredo


Ferretti²(Orientador)
1- Jornalista e Mestrando em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Maranhão,
UFMA, 2- Prof° Dr.do Depto. de Sociologia e Antropologia, UFMA.

INTRODUÇÃO

O trabalho de pesquisa em forma de ensaio tem como objetivo intrínseco


elencar e identificar programas radiofônicos de cunho afro-religioso, veiculados
desde a década de 70 em emissoras radiofônicas de São Luís do Maranhão. A
partir desse trabalho queremos alçar vôos maiores e construir a história da
comunicação afro-religiosa do Maranhão como parte do nosso projeto de
pesquisa atualizado, “Religiões afro-maranhenses e Comunicação Popular” do
mestrado em Ciências Sociais do qual fazemos parte atualmente.
O interesse pela temática é fruto de nossos estudos dentro da perspectiva
antropológica e da comunicação popular, a partir de pesquisas (PIBIC-CNPq,
Iniciação Científica) já desenvolvidas na graduação dentro da Universidade
Federal do Maranhão (Curso de Comunicação Social-Jornalismo) e que
estiveram inteiramente ligadas ao Departamento de Sociologia e Antropologia.
Foi a partir do Grupo de Pesquisa Mina, Religião e Cultura Popular,
coordenados pelos professores doutores e pesquisadores de religiões afro-
brasileiras Sérgio e Mundicarmo Ferretti, é que começamos a direcionar e
estreitar mais nossas relações com o campo e com o objeto de pesquisa
(comunidades-terreiro da cidade).
Na verdade nossas pesquisas nada mais são do que um estudo interdisciplinar
entre as Ciências da Comunicação ( Comunicação Popular e Alternativa) e as
Ciências Sociais (Antropologia e Sociologia da Religião) no qual nosso trabalho
de conclusão de curso (monografia) foi definido como uma análise etnográfica-
midiática sobre um terreiro de Tambor de Mina, religião de matriz africana
específica do Maranhão em que são cultuadas divindades africanas como
Voduns e Orixás (deuses africanos), além de entidades de outras
nacionalidades como os encantados (nobres europeus, reis, rainhas, príncipes,
princesas, etc.) e também os caboclos. Procuramos observar como o público
afro-religioso maranhense está relacionado como o sistema de comunicação
tradicional de São Luís, a priori, mais especificamente no século XX,
observando criticamente textos audiovisuais ( de televisão e rádio) e impressos
(jornais, revistas, folhetos, periódicos) com temáticas direcionadas às religiões
afro-brasileiras.
Além de programas radiofônicos descritos no ensaio achamos interessante
também adicionar ao texto algumas informações sobre a televisão,
basicamente o programa ‘Viva a Oxalá’, comandado pelo pai-de-santo e ex-
vereador Sebastião do Coroado (ADICIONAR INFORMAÇÕES SOBRE O
PROGRAMA). É importante ressaltar que dentro do contexto comunicacional
relacionado a cultura popular e folclore adotamos entre nossas linhas de
pesquisa a de Luís Beltrão, com a Folkcomunicação, “ciência que estuda o
conjunto de procedimentos de intercâmbio de informações, idéias, opiniões e
atitudes dos públicos marginalizados urbanos e rurais, através de agentes e
meios direta e indiretamente ligados ao folclore” (BELTRÃO, 1980, p.24).
Buscamos através dessas experiências alargar mais o estudo da comunicação
do Maranhão, provocando no público acadêmico e social em geral a idéia de
que os veículos massivos devem ser democratizados e que TODOS DEVEM
TER ACESSO e melhor serem respeitados como cidadãos,
independentemente de suas origens, crenças e religiões.

1.0 Programa Axé Cultura e Ilê Ashé Akorô D’ogum: a interatividade das religiões
afro-maranhenses no rádio

Nesse aspecto descrevemos um programa radiofônico produzido e promovido por


um terreiro de Tambor de Mina de São Luís, o Axé Cultura.
O programa Axé, Cultura foi veiculado pela Rádio Comunitária Conquista e a sua
freqüência era a FM 95,5 MHz, localizando-se na rua do Arroz S/n, praça do Mururu,
bairro do Coroado (bairro popular de São Luís). A rádio Comunitária Conquista foi
fundada em 27 de fevereiro de 2000 e na época da pesquisa (segundo semestre de 2003)
era César Roberto e Joselito Santos, onde essa rádio faz parte da Associação de Difusão
Comunitária e Popular-ADCP na cidade.
Há uma programação variada de ritmos na rádio comunitária Conquista, adequando-
se aos gostos dos seus ouvintes. A comunidade do Coroado, João Paulo e adjacências
mais próximas da rádio comunitária Conquista podem relatar problemas cotidianos de
seus bairros e reivindicar melhorias, além de outras questões e também pessoas de
outros bairros de São Luís podem participar e opinar sobre a rádio.
Escolhemos dentre a vasta programação da rádio Conquista trabalhar ou focalizar o
programa afro-religioso “Axé, Cultura”, comandado pelo pai-de-santo Itabajara, chefe
do Ilê Ashé Akorô D’ogum no bairro do Maiobão, que é de nossa área de pesquisa
(mídia e religiosidade afro). O programa tinha uma hora de duração sendo veiculado
das 8 às 9h das manhãs de sábado.
Peruzzo (1998, p.161) dá o exemplo de uma rádio comunitária em Lima, capital
peruana, explicitando sua importância no desenvolvimento das idéias do povo:
“A implantação das rádios populares esteve ligada a uma realidade
de carência generalizada de bens necessários à vida, situação que
contribuiu para o desabrochar de diversos movimentos. O
pioneirismo coube à rádio do povo de vila Nossa senhora de
Aparecida, naquele bairro, que foi ao ar em 26 de abril de
1984”(Peruzzo, 1998, p.161).

A comunicação popular é uma alavanca para a expressão das idéias, pensamentos e


reivindicações dos grupos minoritários(negros, mulheres, ciganos, etc.), que na maioria
das vezes estão excluídos do sistema de comunicação tradicional enquanto detentores
dessas concessões. Peruzzo (Id.,p.29), a comunicação popular é uma comunicação
vinculada à prática de movimentos coletivos.
Continuando as explicações sobre a comunicação popular, Peruzzo (1995, p.29) diz o
seguinte:

“Retrata momentos de processo contra-comunicação na sociedade


civil em suas formas democratizadas de produzir comunicação, nos
tipos de veículos, nos seus conteúdos, etc...diferentes ou alternativos
da então comunicação circunscrita ao âmbito da estrutura dominante
de comunicação, ou seja dos grandes meios de comunicação de
massa”(Peruzzo, 1995,p.29).

A comunicação produzida pelas rádios comunitárias vai produzir um grito de


denúncia e reivindicações por melhores condições de vida. Os afro-religiosos quando
tem oportunidade utilizam esses espaços, na maioria das vezes, como uma alternativa de
fazer um contra-discurso. É um meio de desconstrução do discurso das classes
ideologicamente dominantes ou hegemônicas, que detém as concessões dos meios de
comunicação no Brasil.
Os meios massivos tradicionais não vão suprir todas as carências da sociedade civil
em termos de informações específicas e mais determinadas, logo são necessários canais
de comunicação provenientes de meios sociais organizados. Ramos (2002, p.9) faz
algumas colocações sobre a mídia como reprodutora de discriminação dos grupos
minoritários, especialmente os negros:

“Além de ser um caso exemplar dos mecanismos de reprodução das


relações raciais, a mídia desempenha um papel central único na
produção e manutenção do racismo. Através dos meios de
comunicação, especialmente dos meios de massa, como a televisão e o
rádio, as desigualdades raciais são naturalizadas (Ramos, 2002, p.9).

O programa “Axé, Cultura” é de cunho afro-religioso e sua linguagem é


eminentemente popular, abordando assuntos e questões relacionadas ao universo afro-
religioso maranhense. As pessoas envolvidas na produção e apresentação do programa
eram: Pai Itabajara e Carla, além de um operador que ajudava com os aparatos técnicos
da difusão da rádio.
Ao longo da programação eram feitas entrevistas (convidados), discussões e
explicações sobre as religiões afro-brasileiras, a partir de textos; leitura de informativos,
propagandas de festas populares, seleção de músicas de cunho afro-religioso (cd’s de
Tambor de Mina e cultura popular maranhense). A interatividade com o público era feita
pelo telefone sendo ao vivo, onde o ouvinte podia fazer suas perguntas ou observações
no ar.
O programa Axé Cultura é ligado ao Ilê Ashé Akorô D’Ogum, terreiro de Mina
comandado pelo pai-de-santo e apresentador Itabajara, localizado na Avenida Hilton
Rocha n°7, Maiobão, município de Paço do Lumiar (cidade muito próxima de São Luís/
20 min.). Atualmente, o programa Axé Cultura voltou a ser veiculado, entretanto, não
está mais na rádio comunitária Conquista FM tendo seu espaço agora na Rádio Timbira
do Maranhão, onde sofreu algumas alterações positivas (como o aumento da duração
passando para 2 horas, dentre outras).

2.0 Os Meios de Comunicação no Universo Afro-Religioso Maranhense: Cultura


Mística e Viva a Oxalá”

O sistema tradicional de comunicação demanda altos custos econômicos mesmo aqueles


meios de expressão menos dispendiosos (Teatro e Show Business) requerem um certo capital
para a sua implantação. Ao longo dos anos o estudo da comunicação, voltou-se para o
contexto do seu sistema tradicional(Meios, canais e Mensagens), ou seja, o processo
comunicacional da transmissão de mensagens: Emissor-Receptor.

A Comunicação Popular, a partir dos anos 80 passa a vigorar e a ser tema de pesquisas,
onde irá redefinir os marcos da problemática da comunicação. Agora falar de comunicação
popular significa falar de cultura e relação. “s meios ou veículos de comunicação populares,
ou seja, a nova comunicação, representam um novo grito, antes sufocado, de denúncia e
reivindicação por transformações, exteriorizados, sobretudo em pequenos jornais, boletins,
alto-falantes, teatro, folhetos, volantes, vídeos, audiovisuais, cartazes, pôsters, cartilhas, etc”
(PERUZZO, 1998, p.115).
O protagonista da comunicação popular é o próprio povo, no qual sua participação será
fundamental. Por povo, entende-se o conjunto das classes subalternas, que estão em um
constante processo de lutas de classes, delineando-se uma visão Marxista nesse ponto de
vista.
Meios massivos tradicionais e meios de comunicação populares vão estar ladeados numa
relação de complemento e não exclusão. Na verdade, os grandes veículos são de grande
importância no que diz respeito ao campo do divertimento e da informação e nem todas as
necessidades, em nível de aspirações comunitárias e de movimentos sociais, são supridas
pela mídia tradicional, sendo passível de lacunas.

A mídia popular e seu conteúdo vem preencher essas lacunas deixadas pelo sistema de
comunicação tradicional e visa atender grupos específicos ou populares. Na verdade, os
programas vêm muitas vezes oportunizar os grupos afro-descendentes na desconstrução dos
estereótipos e estigmas que o próprio negro carrega, desde a sua chegada ao nosso país e
demais continentes no qual ele aportou.

Percebe-se nessas iniciativas das comunidades afro-descendentes locais (cidade de São


Luís), o interesse em construir algo “NOVO, explicitando a partir dessas ações um desejo
de autonomia e por um “quer fazer” democrático. São criações de outros valores,
contrapondo-se a um mídia tradicional(elitista, preconceituosa, hegemônica e também
racista).
Ramos afirma que através dos meios de comunicação, especialmente dos meios de massa,
como a televisão e o rádio, as desigualdades raciais são naturalizadas, banalizadas e muitas
vezes racionalizadas (RAMOS, 2002, p.09). O contexto midiático vai ser classificado
como um mecanismo de reprodução das relações raciais de nossa sociedade.

Coloca-se em voga, aqui, conceitos ou categorias como: mídia e exclusão social, mídia e
invisibilização, mídia e silenciamento. Essas denominações têm um certo teor de
complexidade e necessitam ser analisadas com cuidado. Aspectos relevantes podem ser
representados ou explicitados pelos estereótipos do elemento negro na mídia.

No cinema são variados os arquétipos do elemento negro com várias denominações:


pretos-velhos, a mãe preta, o mártir, negro de alma branca, nobre selvagem, negro
revoltado, negão, malandro, o favelado, crioulo doido, mulata boazuda, musa e afro-
baiano.

Como a temática nessa investigação gira em torno do negro no seu aspecto religioso,
enquanto detentor dos seus próprios veículos de massa, a problemática ainda é mais
delicada. As religiões de matriz africana no Brasil usualmente aparecem nos veículos de
massa como exóticas, diferentes ou como pólo antagônico ao modelo judaico-cristão,
cristalizado nas religiões tradicionais (catolicismo e evangélicas)

Apesar de vários e inúmeros estudos sobre as religiões de matriz africana, persiste assim
mesmo o preconceito e a discriminação refletida nos meios de comunicação social:

Mesmo em trabalhos considerados sérios como o Teatro popular


brasileiro de Solano Trindade, tal Como é visto em “Agulha no
palheiro”, 1953, de Alex Viany. O primeiro filme da Vera Cruz,
Caiçara-1950 de Adolfo Celi, chega a falsificar o próprio ritual,
sem nenhuma preocupação antropológica (RODRIGUES, 2001,p.
101).

Os espaços ou mídias analisados nesse trabalho são oportunidades da comunidade afro-


religiosa maranhense de “reconstruir” e socializar as informações que dizem respeito a
religião e culturas africanas.
2.1 PROGRAMA CULTURA MÍSTICA

O programa Cultura Mística é veiculado na rádio Cultura FM com a freqüência 106,3


MHz. Anteriormente, a sintonia era na 91,5 MHz e passou pela 89,9MHz mas por
problemas de interferências em televisores da vizinhança houve a troca de freqüência, que
possibilitou uma melhoria de qualidade e maior potência na transmissão, entretanto a
transmissão não chega na cidade de São Luís como um todo.

A Rádio Cultura FM localiza-se na rua 61, quadra 123 s/n Maiobão, município de Paço
do Lumiar e faz parte da fundação cultural e comunitária luminense. São variados os
ritmos e o repertório musical transmitido pela rádio Cultura FM, respeitando todos os
gostos e preferências dos ouvintes. Há uma total liberdade na programação ou um
verdadeiro ecletismo nas veiculações diárias, desde o profano ao religioso.

Há espaço para todos, onde a presença do religioso é bem destacado, a partir da


existência de programas católicos, evangélicos e afro-brasileiros, a exemplo do Cultura
Mística. A estrutura da rádio cultura FM é bem comum e simples com uma notável
organização e sua divisão é feita a partir de dois estúdios: estúdio 1(veiculação da
programação musical diária) e estúdio 2 (gravação de propagandas e vinhetas e outros
comerciais); recepção, diretoria e um banheiro.

O equipamento técnico ou tecnológico do estúdio1 é: 1 MD, 2 CDs players, 1 mesa de


som de 16 canais, 1 híbrida(conexão com o telefone), 1 PC usado, 1 gerador de stéreo e 1
transmissor. É no estúdio 1 que é veiculado o programa Cultura Mística ao vivo às sextas-
feiras das 19:00 às 20:00 H com apenas 1 hora de duração.

Somente 3 pessoas compõem o quadro da veiculação e desenvolvimento do programa,


dentre elas o babalorixá José Itaparandi e mais dois operadores de rádio, que costumam
intercalar-se durante as semanas. É o babalorixá José Itaparandi do Terreiro de Mina
Pedra de Encantaria , que localiza-se no mesmo bairro que a rádio Cultura Fm, Maiobão,
que é o responsável pelo programa, selecionando o repertório musical(a partir de temáticas
afro-brasileiras em geral).
A interação com o público é muito boa, pois é feita no decorrer do programa ao vivo
por telefone. As pessoas podem ligar e fazer seus comentários, perguntas, críticas e
sugestões sobre os vários assuntos abordados pelo babalorixá Itaparandi, que fala sobre
astrologia, religiosidade popular e eventos no campo afro-religioso maranhense. O que
marca bastante também é a linguagem que é “popular” e adequada aos ouvintes do
programa.

2.2 PROGRAMA VIVA A OXALÁ

É na Tenda Espírita São Sebastião “Vale da Natureza”, que está localizada a sede do
programa ‘Viva a Oxalá’ sob o comando do babalorixá e verador Sebastião de Jesus Costa,
vulgo “Sebastião do Coroado”. A localização da tenda é na rua São Sebastião, n° 26,
Coroado.

A transmissão do programa é feita pelo canal 12, TV Bandeirantes e faz parte da


programação local de São Luís, sendo apresentado somente aos domingos das 6:30 às 7:30
ou das 7:30 às 8:30 da manhã(podendo variar o horário). O programa ‘Viva a Oxalá’ tem
uma equipe de 6 pessoas (4 moças, 1 rapaz e o babalorixá), onde as meninas desempenham
a função de apresentadoras, juntamente com o babalorixá Sebastião do Coroado.

Entre as apresentadoras pode haver uma intercalação na gravação do programa, embora o


rapaz, que administra a gravação do programa é fixo (filho de ‘Seu Sebastião’). O aparato
técnico ou tecnológico utilizado na produção do programa é comum, sem grandes
empreendimentos de grande porte, adequando-se as possibilidades econômicas daquela
comunidade-terreiro.

Consta no material de produção, notificado por nós: 1 caixa de som 600 amplificada; 1
suporte de madeira para sustentar o refletor de iluminação, 1 câmera, 1 televisão com vídeo
embutido e cabos para fazer a conexão entre a tv-vídeo e a câmera. A base do programa
gira ou tem sua égide sobre três pontos básicos e principais, a medicina vegetal, astrologia
e o espiritismo.

A religião professada pela tenda de Sebastião do Coroado é a Umbanda. Segundo Costa S.


(1985, p.5) “a Umbanda não é um credo religioso anti-social e nem tão pouco faz parte dos
espíritos endemoniados”. Surgindo no primeiro quadriênio do século XX, a Umbanda vai
ter a figura de Zélio de Morais com o caboclo da sete encruzilhadas como seu fundador na
cidade do Rio de Janeiro.

É histórica a trajetória do babalorixá “Sebastião do Coroado” na Umbanda (1962) e junto


aos meios de comunicação, desde a década de 70. Primeiramente, ele começou no rádio,
que evoluiu para o programa de televisão. A data mais precisa de acordo com informações
de Seu Sebastião é o ano de 1984, marcando o primeiro programa de TV (paradas em 94,
98...2002).

O custo do espaço na TV Bandeirantes é atualmente de 3000 reais mensais por apenas 1


hora de duração de programa. A interação com o público é através de cartas que as pessoas
podem interagir com o programa, onde o público relata seus problemas, dúvidas e anseios
sobre qualquer assunto, desde problemas amorosos aos de saúde.

3.0 NA RONDA DOS ORIXÁS- INCURSÕES DE JORGE BABALAÔ NA RÁDIO


TIMBIRA

Nesse capítulo, pretendemos explicitar a participação do babalorixá Jorge Itaci de


Oliveira em um programa de rádio em São Luís do Maranhão. O título do programa
era “A Timbira na ronda dos Orixás”, veiculado pela rádio Timbira na década de 70,
mais precisamente no ano de 1972.
Segundo Jorge Itaci a Timbira era uma rádio importante naquela época:

A Timbira era a rádio oficial do estado nesse tempo e o programa


atendia todas as pessoas que precisavam de uma ajuda, seja
doença espiritual ou material. Tinha que mandar cartas e no
decorrer do programa, a gente lia e se pudesse resolver o caso
dava as orientações necessárias. Muitas pessoas escreviam e
contavam seus problemas e o programa já recebia de 50 a 60
cartas em pouco tempo de existência(Entrevista com Jorge Itaci
em 08/11/02)
Percebemos que a interatividade com o público no programa de rádio era através de
cartas, sendo respondidas no ar, levando possíveis soluções para os ouvintes do
programa afro-religioso. É importante salientar o pioneirismo desse programa no
universo da comunicação afro no Maranhão, devido aquela época o preconceito ser
muito forte e um programa como esse ainda superar barreiras e obter resultados
positivos.
Os ritmos musicais veiculados no programa, basicamente eram músicas afro-religiosas,
colhidas na visita a terreiros de Mina de São Luís, segundo Jorge Itaci:

“A gente ia aos terreiros e gravava os cânticos ao vivo e, depois,


colocava pra tocar no programa. Nossas músicas não eram gravadas
não, pois era algo direto dos terreiros”(Entrevista com Jorge Itaci
08/11/02)

Devido a grande aceitação do público, que já mandava um grande número de cartas, o


programa começou a incomodar principalmente a medicina tradicional, pois havia o
receio dos hospitais ficariam vazios, pois as pessoas estavam deixando os remédios e
hospitais de lado, seguindo as orientações do babalorixá, Jorge, como receitas em
termos de medicina vegetal.
A polícia federal obrigou o programa “A Timbira na Ronda dos Orixás” ser fechado,
devido a audiência, receptividade e o impacto no público ouvinte, que aderia as receitas
e consultas de Jorge babalaô. Ao ser impedido de ser transmitido o programa ficou com
200 cartas de ouvintes sem abrir, onde muitas cartas provinha de pessoas fora do estado
como Mato Grosso e Goiás.
Naquele tempo Jorge Itaci estava no meio político e concorreu as eleições para o cargo
de vereador na cidade de São Luís do Maranhão. O seu adversário político era o
vereador eleito e pai-de-santo José Cupertino (PMDB), que concorreu as eleições com
Jorge (ARENA), ficando como vereador suplente.
COGO (1995) explicita tópicos sobre a importância das rádios comunitárias e
populares ao expressar a religiosidade, que ao mesmo tempo cita Barbero:

Especialmente no campo da comunicação, conforme propõe Jesus


Martín Barbero, é preciso tomar a religiosidade como um dos
contextos culturais, a partir do qual se deve tentar compreender e
que se passa nos meios. Ou seja, como uma mediação, aquele
lugar desde o qual é possível perceber e compreender a interação
entre o espaço da produção e da recepção”(COGO, 1995, p.57)

Atualmente, os programas religiosos são muito veiculados na mídia, entretanto,


programas midiáticos enfatizando as religiões afro-brasileiras ainda são poucos,
ajustando-se as possibilidades econômicas de cada comunidade de santo. Atualmente,
em São Luís há três programas massivos alusivos as religiões afro-brasileiras:

*Viva a Oxalá (canal 12 do Vereador e Pai de santo Sebastião do Coroado), Sebastião é


líder espiritual da Tenda São Sebastião Vale da Natureza e o programa é veiculado aos
domingos pela manhã das 6:30 às 7:30.

*Cultura Mística(Rádio Cultura FM, rádio comunitária do Maiobão), programa


comandado pelo babalorixá José Itaparandi do Terreiro de Mina Pedra de Encantaria
sendo veiculado às sextas-feiras das 19:00 às 20:00h.

*Programa Axé Cultura(Rádio Comunitária Conquista-Coroado), comandado pelo


babalorixá Itabajara com terreiro de Mina no bairro do Maiobão. O Programa Axé
Cultura é veiculado aos sábados das 8:00 às 9:00h.

A rádio Timbira fica localizada na Avenida Jerônimo de Albuquerque, 73 cohafuma


(CEASA) e, atualmente, não goza de tanto prestígio como na época do programa afro-
religioso comandado por Jorge Itaci, devido a falta de incentivos financeiros e outros
problemas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na reflexão sobre veículos de comunicação popular do universo afro-religioso maranhense,


percebemos a inserção paulatina das populações afro-religiosas maranhenses, desde os
anos 70, ou seja, há mais de 30 anos o público afro-religioso maranhense de uma forma
paulatina e heterogênea relaciona-se com os veículos massivos, a partir de programas
próprios ou específicos. Reconhecemos ao abordar tal temática a invisibilidade,
preconceito e a discriminação que os programas enfrentam ao serem específicos, tratando
de religiões afro-brasileiras, especificamente do Tambor de Mina e da Umbanda.
Mas é importante que dentro de suas comunidades-terreiro os programas fizeram bastante
sucesso, inclusive transpondo esses limites e alcançando boa audiência na cidade, a
exemplo do programa de rádio de Jorge Babalaô, Timbira na Ronda dos Orixás. Além dos
programas supra-citados, é importante identificar um programa radiofônico liderado pelo
finado pai-de-santo José Cupertino de Araújo, Introdutor da Umbanda no Maranhão, na
antiga rádio Gurupy e que também tinha muita audiência.
No sistema de comunicação social, enquanto detentoras do seu próprio espaço essas
populações afro-religiosas tem oportunidades de se expressarem pelos seus próprios pontos
de vista e com suas visões de mundo originais, rechaçando a velha transmissão
sensacionalista de suas culturas pela mídia tradicional, contrapondo opiniões (mídia
popular X Mídia tradicional).
A busca de um espaço na mídia pelas comunidades afro-descendentes de São Luís é feita
de acordo com suas possibilidades, condições econômicas e certa influência nas camadas
populares (líderes de opinião e agentes de comunicação) em contraste com o grande
aparato tecnológico dos meios massivos tradicionais. Não propomos com nossos estudos
iniciais sobre o campo afro-religioso e suas incursões na comunicação maranhense algo
finalizado ou acabado, entretanto estamos provocando e chamando a atenção para a
existência dessas iniciativas das populações afro-religiosas maranhenses em relação ao
universo da comunicação, onde elas também buscam seu espaço e uma possível
democratização dos veículos massivos ou mesmo da comunicação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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