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QUANDO A MUDANÇA ESCONDE O REFORMISMO

No campo das propostas ecológicas é fácil dogmatizarmos determinismos.


Absolutizamos facilmente alternativas como soluções politicamente corretas que demonstram
seu caráter extremamente conservador. O grande problema são os princípios que coordenam a
dinâmica das mudanças. Na maioria das vezes trata-se de alterações lineares, ou seja,
transformações pontuais sem capacidade de produzir qualquer perturbação da lógica societal
atual que tantos prejuízos realiza no meio ambiente pela sua própria lógica operativa. Usando
uma analogia, trata-se de manter a chapeuzinho vermelho sob ameaça do lobo mau. A vida da
chapeuzinho vermelho depende da forma como lidamos com o lobo. Os atuais projetos de
defesa ecológica tentam convencer o lobo a não atacar a chapeuzinho, procuram conscientiza-
lo sobre como é bonito viver em paz, que é gratificante a companhia da chapeuzinho, mas
nunca procuram atacar a essência do lobo.

Não se protege o meio ambiente mantendo a atual logica de sociedade que vivemos. O
capitalismo é o lobo mau da história e ele não vai preservar a chapeuzinho. Os recursos
naturais são tratados pelo sistema capitalista como forma de acumular. Portanto, não vamos
ter proteção ecológica que ameace os lucros capitalistas em geral. É claro que algumas
empresas poderão ter ameaçados seus espaços mercantis, mas no âmbito global o capitalismo
precisa necessariamente da exploração da natureza para sua sobrevivência. Podemos até ter
novas tecnologias, mas nunca uma mudança mais radical que atinja a forma como o sistema
funciona: exploração do trabalho e da natureza.

É o que estamos vendo no caso das famosas “sacolas plásticas”. Há um grande


movimento de ecologistas, governos e da sociedade em geral pela sua eliminação.
Desenvolvem-se grandes teses sobre os males da sua utilização para o solo, defendendo-se sua
proscrição como saída corajosa na defesa do planeta. Trata-se a questão como se fosse a
panaceia para todos os males ecológicos. Todavia, trata-se apenas de mais uma mudança que
não atinge a voracidade do capital diante dos recursos naturais, pois rapidamente ele se
metamorfoseia para ampliar seus lucros com uma nova roupagem. Neste sentido, o
capitalismo tem uma capacidade de regeneração espetacular, de dar inveja espantosa aos
outros sistemas sociais do passado.

É o que está acontecendo com as empresas de papelão. Já estão fazendo campanha e


propaganda sobre alternativas cômodas e confortáveis para o sepultamento das sacolinhas.
Trata-se da embalagem de papelão ecologicamente correta e praticidade indiscutível, por um
precinho bem camarada. Pois é, estamos substituindo a sacola e seus males terríveis para o
meio ambiente por uma saída que tem em vista a possibilidade de realizar novos e ampliados
lucros. A estratégia das empresas de papelão não é algo isolado. As tecnologias politicamente
corretas para o meio ambiente fazem grande sucesso, prometem o bem estar ecológico
conjugado com mínimas mudanças de postura e comportamento pessoal. Nada de mudanças
mais profundas. Muda-se alguma coisa (fim das sacolinhas) para que tudo continue do mesmo
jeito (continuidade dos lucros através da exploração do trabalhador e do meio ambiente).

Isto demonstra que necessitamos de uma abordagem mais radical no que se refere ao
problema ecológico. Medidas como estas do fim das sacolinhas são minimamente paliativas,
no fundo, funcionam como legitimação do capital, pois este estaria pretensamente preocupado
com os rumos ecológicos do planeta. É claro que ele está, desde que não prejudique a seiva da
vida: o sagrado direito de lucro. Desta forma, não se resolvem os problemas da natureza
através do incremento de tecnologia, pois esta funciona sob a égide da lucratividade. As
alterações tecnológicas podem até minimizar os impactos ambientais sobre o planeta, mas não
garantem uma vida mais saudável.
Neste sentido, devemos tomar todo cuidado com o discurso da sustentabilidade, pois é
uma teoria eficiente para o capital. Trata-se de um conceito utilizado sem críticas, uma
expressão desistoricizada de seus determinismos, pois surgida no contexto de reprodução da
natureza para a continuidade da exploração do capital. A sustentabilidade é do capital e não do
meio ambiente. Não é atoa que tal expressão é hegemônica em eventos de viés conservador:
SWU, fóruns patrocinados por prefeituras e corporações, como também em bicicletadas pelo
mundo afora ou mesmo em autorizações de órgãos ambientais. Estes eventos não apresentam
qualquer questionamento ao sistema capitalista. Não se trata de ser contra o capitalismo (a
despeito de sermos contrários), mas de identificar que a operacionalização do sistema tem
como decorrência o tratamento da natureza como recurso explorável para reprodução
ampliada do capital. Eis nosso grande problema. Não dá para ser ecologista sem ser ao mesmo
tempo anti-capitalista.

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