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AS GÊMEAS
1.
- Nem faço ideia. Eu nem sabia que existia esse lugar. Meu marido,
apesar de gostar de muita sofisticação, eventualmente ia a lugares que lhe
lembram suas origens. Ele estava sozinho? Disseram que houve demora
em ser socorrido.
- Parece que ele veio com clientes, não sei bem. Quando saiu,
estava com uma pessoa, mas somente ele foi agredido. Ele estava muito
bem vestido...
Falou apontando para uma moça. Não quis dizer nem senhora –
porque assim não a classificava -, nem vadia, nem jovem. Calculou as
palavras.
Então ela olhou em direção a tal fulana, que retribuiu o olhar com a
cabeça erguida, com os olhos desafiadores, querendo mostrar que podia
muito e deliciando-se ao ver a mulher poderosa ali disputando com ela.
Até achando que era mais do que realmente era.
Então entendeu. Ela pôde ver que era trintona, tinha os cabelos
compridos mal tingidos de loiro e suas roupas eram coladas, provocantes
e bem baratas. Ele sempre teve seus deslizes e sua preferência sempre foi
por mulheres loiras e vulgares. Se alguém lhe assediava, não havia dúvida,
ele retribuía as investidas com entusiasmo. Porém sempre negava os
casos com veemência. Imitava o pai, que tinha sido adúltero,
irresponsável, e, apesar de ser homem bonitão, por ter autoestima baixa,
tinha casos com mulheres horrorosas, até fedidas.
Quando casaram, logo ele quis ter filhos para prendê-la. E nasceu
uma menina. Maria Silvia queria fazer mestrado e doutorado. Para isso,
havia reservado dinheiro para as necessidades do dia a dia.
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Desde novo trabalhava, pois logo percebeu que não havia outra
saída para ele, porém não gostava do trampo. Teve vários serviços, os
quais nenhum bom, segundo seus conceitos deturpados. Depois de algum
tempo, conseguiu emprego numa loja. De início se situou para perceber os
detalhes, principalmente os sórdidos.
O patrão tinha uma amante, que era caixa. A patroa lhe tinha ciúme
doentio, e, não se sabe o motivo, ele não queria que ela soubesse de jeito
nenhum do tal relacionamento. Numa tarde, houve uma confusão e a
esposa quase pega os dois em adultério. Fez escândalo, disse que há
tempo desconfiava e que não ia mais permitir tamanha sem-vergonhice.
No auge do caos, surgiu Cipriano dizendo:
- Dona Magda, a senhora está equivocada. A moça é minha
namorada. Nós não queríamos que ninguém daqui soubesse, com medo
de nos mandarem embora.
Houve alívio geral. Até a própria esposa gostou do desfecho. Com
isso, ele passou a ter certas regalias, que sabia muito bem usá-las na hora
certa. Abusava de horários e fazia corpo mole. Chegava ao ponto de ser
muito respeitoso na frente do dono, porém, perto de Dona Magda,
beijava a colega e até bulia nela. As duas tinham faniquitos. Quando a
esposa contou ao marido e este veio ter com os dois, estes negaram com
veemência. O patrão queria acreditar que era o único da moça, e assim a
história continuou. Os dois empregados transarem na surdina foi o
esperado.
A jovem chegou a acreditar que ele estava apaixonado por ela.
Triste engodo. O que mais o atraía nela era o fato daquilo não passar
adiante. Ele tinha horas de sexo e estava tudo acabado. Sem
consequências, do jeito que ele queria. Isso ele sempre fez durante toda
sua vida. Para ele, o sexo era prazer momentâneo. Como ele nunca
conseguiu ter ligações afetivas, era só isso. Suas emoções só existiam em
palavras. Quando namorava, era só pelo tesão e pelo poder sobre a outra
pessoa. Também, ao perder um amigo, não ficava triste, porém frustrado
por ter uma fonte de favores a menos, se fosse precisar em alguma
ocasião.
Ele fez de tudo para se levantar na vida. Muitas coisas nada éticas,
nem morais. Resolveu estudar. Na hora de escolher a faculdade, não teve
nenhuma dúvida: Economia. Queria ficar rico. Para entrar no vestibular e
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- Pra você é fácil, mas para mim, que fui filho de Efigênio Baco e
Nonata...
Só que havia um detalhe: ele falava mal dos seus para ela, quando
lhe interessava. De resto, escondia os defeitos deles e imitava suas
limitações. Do pai, imitava os adultérios e as luxúrias, porém não seus
calotes, que o faziam pessoa muito mal falada na cidade a ponto de terem
de trocar de lugar constantemente. Queria ter posição de destaque na
sociedade. De sua mãe, a veneração ao dinheiro. Planejou e arrumou uma
otária que se enquadrava bem a seu propósito de ficar rico. Para isso,
engendrava tudo que podia.
Adorava ter poder e acreditava que nenhum palpite dos outros valia tanto
quanto suas ideias, porém, com sua inteligência, maquiava tudo isso.
Ela lhe abriu as portas para seus negócios e ele foi longe, muito
longe. Usou tudo que pôde. Fez os melhores cursos em sua área. Nunca a
custa de estudo, sempre pensando no diploma. Também subornou,
trapaceou, blefou, mentiu e usou o que pode para ganhar dinheiro. Sua
fortuna era seu principal objetivo na vida. Entretanto se dizia honesto e
gostava demais de apontar os corruptos que a mídia estava enfocando,
ridicularizando-os como se fosse o mais honesto dos mortais. Glorificava-
se de sua honradez com a cara lavada. A esposa nem lhe percebia os
enrustes, e se percebeu alguma vez, arrumou desculpa para si mesma.
Ele mentia tanto, que às vezes nem se dava conta de que estava
mentindo. Porém tinha, interiormente, orgulho de sua capacidade de
enganar. Para ele, o mundo era feito de caças e predadores, por isso
gostava de se aproximar daqueles de boa-fé. Na verdade, achava a
companhia deles detestável.
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Ela nunca deu atenção à filha, pois não conseguia amar ninguém.
Amor dado com a intenção de fazer alguém feliz, sem nada de volta, não
era Kiki. Podia até gostar, sempre pensando em algum benefício próprio,
nem que fosse longínquo. Vinha de relação conjugal falida, com pais
adúlteros, ausência total da figura paterna e avó materna egoísta. Para
agravar ainda mais, sua mãe morreu antes de sua adolescência, tendo ela
ficado com a avó matriarca e parentes que a maltratavam muito. Lá
dentro de sua cachola, mesmo sem se dar conta, ela nunca sentiu dos
outros sentimentos positivos.
desejo, nem luxúria, muito menos por amor. Era sempre por interesse
próprio. Quando conseguia seus objetivos, descartava totalmente o caso.
Ao rever a tal pessoa, agia com descaramento e frieza impressionantes.
Não foram muitos casos não, foram até poucos. Talvez por ela não ter
capacidade de sedução satisfatória. Entretanto agradava o marido o
bastante para mantê-lo, pois não conseguiria outro igual. Disso ela tinha
uma noção bem precisa. O interessante é que se fazia ser detentora da
moral e dos bons costumes. Como frequentava muito a igreja, as pessoas
não lhe tinham suspeitas. E ela acusava aos outros com veemência...!
O motivo dele não era amor, pois Cipriano não tinha a capacidade
de amar ninguém. Acontece que ele viu o pai, várias vezes, largando a
família por qualquer vira-lata, com consequências tristes, até mesmo
trágicas, para todos. Apesar de Cipriano querer a mulherada, não queria
aquilo para si. As relações sexuais, para ele, eram quase masturbação a
dois. Qualquer buraco – vagina, ânus ou outra coisa -, servia. Por isso,
gostava tanto de luxúria bem exagerada. Nisso ele conseguia emoção, um
desafio que lhe dava um maluco prazer. A sedução dele com a esposa
ficou sendo sua vontade de sempre querer ficar com ela. Entretanto isso
custou a ela sofrimentos, angústias, até agressões. Nela e nas filhas, as
quais amava tanto. Como ele tinha a autoestima baixa, imaginava a
esposa acima dele, precisando diminuí-la. Por isso a ridicularizava o
quanto podia e falava mal dela pelas costas.
Em dado momento, viu a tal moça falando com o delegado, que lhe
fazia sinais de negação. Meio irritado, saiu da sala. Alguns minutos depois,
o policial se dirigiu a ela:
- Sim. E daí?
Uma das filhas havia chegado e ela foi ao encontro dela, deixando a
moça ali plantada. O policial a retirou dali discretamente. Também veio
lhe dar apoio o amigo antigo, Dr. Cristóvão, o qual Cipriano classificava
como otário incorrigível. Como ele era médico e ele poderia precisar dele,
aguentava a sua presença nesses anos. Também por achá-lo inofensivo.
De fato, ele era muito ingênuo.
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Mesmo sem se dizer uma palavra, havia pressão sobre a polícia para
desfecho do ocorrido.
apanhando, igual cachorros. Querem botar toda a culpa nele, que é “de
menor”.
- E agora a sua filha também vai pra cadeia. E lá, Lazinha manda e
vai acabar com ela, com certeza.
- Não enche...
- Ela não é minha filha e você sabe disso. Além do mais, quem
mandou ela se meter com a chefona.
- Depois não ficou? “Que” que adiantou? Não me enche! Não vou
fazer nada e pronto!
Lembrou-se do dia que sua filha lhe trouxe uma bebê recém-nascida
branquinha, branquinha... A criança chorava muito, parecia até que
gritava. Era forte, muito forte.
- Você não “tava” trabalhando num hospital, que aquele velho tinha
lhe arrumado? “Tava” tão bem no serviço...
- O Vetusto quer transar comigo e pagar muito mal (falou esta frase
com vários palavrões), mas como ele tem suas manhas, suas influências,
eu obriguei o velho a me pôr pra trabalhar no hospital, como terceirizada
na faxina. Trampo eu não queria. Eu só ia enrolar. Ele tinha de me dar
cobertura e ele ia me dando. E “me comendo”, “me comendo”...
- Que nojo!
- Até parece que você não foi puta da zona. Se eu aguentei o velho
babão, foi porque minha intenção era outra. O Cândido me informou
duma parada genial: vender bebezinho pra gente de fora do país.
- Nem vou ter. Não posso ter e nem quero ter. E não prejudica
ninguém. A criança vai ter muito mais do que teria aqui...
- Então ele me convidou para dar uma volta de carro. Ele me pegava
na esquina e eu não devia deixar ninguém perceber. Como eu gosto de
tudo que é errado, topei. O carro era de luxo e eu já imaginei um caso com
ele. Mas o sem-vergonha não me deu beijo ou carinho. Desabotoou a
braguilha e empurrou minha cara para fazer sexo oral (falou este final de
frase com palavras de baixo calão). Falava palavrões e me chamava de
puta relaxada. Fiquei com muita raiva, xinguei o safado e ele nem ligou.
“Me” deixou na mesma esquina e eu voltei para o hospital. Quando
cheguei, a esposa dele, muito loira, estava para ter bebê. Eu ainda ouvi ele
lhe dizer que ela era a única mulher da sua vida e que ele a amava muito.
“Me” deu uma raiva...!
Entretanto ela não soubera que a tal esposa estava chorando pela
ausência do companheiro. O pai dela estava presente no apartamento, o
mais simples que ela conseguira pagar para fazer jus à sua condição social.
Estava ausente a mãe dela, sempre resmungando e de mau humor com
tudo, principalmente com o genro, fazendo cara emburrada. O futuro pai
então falou frases que, apesar de mentirosas, sempre serviram para
convencer a boboca de sua mulher. Ele temia a chegada da sogra.
Lelé continua:
- A mãe da pobre não tinha nada a ver com isso. Foi até vítima. Ela
ia sofrer.
- Ninguém nem soube que nasceu outra menina. Nem ela, que era
sem experiência e estava atordoada. Eu soube que ela ficou perguntando
pelo outro bebê, mas como o médico e a enfermeira tinham sua culpa,
disseram pra otária que ela se enganou e coisa e tal. Ninguém ligou para o
que ela falou e deve ficar assim mesmo.
- Louca!
- Esse embrulho vai ficar aqui muito pouco tempo, talvez nem uma
hora. O Cândido vem logo pegar.
que não deu certo e ela ficou com o embrulho. Além de ter tido mágoas
do pai.
Certo dia, um daqueles seus amigos do mal lhe deu a idéia de ir para
sinal de trânsito com a bebê no colo.
- Criança loira fatura mais. Você ainda diz que o pai é loiro e aqui da
cidade, que os babacas dão mais dinheiro, imaginando ser parentes deles.
- Melhor ainda.
E ela foi. Lelé percebeu então que era um mar de dinheiro esse
negócio. Comprava drogas, comia, bebia, e a bebê quase não lhe dava
despesa. A pele dela ficava queimada, e muito. Imaginem recém-nascida
no sol a pique. Quando chorava muito, dava-lhe uns tabefes e a infeliz
criatura parava.
Malvina passou muita fome, pois não havia comida para lhe dar,
nem aquilo de primeira necessidade para a saúde nem para a dignidade
do ser humano. Infelizmente a criança, ao sentir a falta disso, passou a
achar que não tinha direito às coisas normais da vida.
Quando Lelé não precisava dela, a empurrava para a avó, que foi se
afeiçoando cada vez mais àquela criaturinha de Deus. Eram seus melhores
momentos, apesar da miséria das duas. Foi criada entre drogas, crimes,
agressões, sem amparo, sem comida e sem o mínimo da dignidade
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humana. Quando cresceu e já não servia mais nem para semáforo, nem
para despistar tráfego de droga, Lelé a obrigava a vender rosas nas
madrugadas.
Maria Sílvia, carente do amor de sua mãe, criou sua filha o melhor
que pôde, com amor e carinho até exagerados. No futuro, filhos assim
têm como consequência acharem que todas as pessoas lhe devem
paparicos. Ela era tão mimada que dava birras enormes quando não se
satisfaziam seus mínimos desejos. Suas comidas eram preparadas com o
máximo requinte da higiene e valores nutricionais. No primeiro ano de
idade, quando começou a tomar suco natural, as diferentes frutas iam se
acrescentando por colherinhas.
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Este falecera com cinquenta e poucos anos e Kiki ficou muito bem
na vida. Daí veio o motivo pelo qual Maria Sílvia xingava muito nas futuras
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seus direitos. Ficou ali. Quase ao meio dia, apareceu a assistente social
que começou a lhe fazer perguntas. Malvina não sabia o que responder,
pois não queria comprometer aquela que considerava sua mãe. Não se
sabe se por bons sentimentos ou por pavor. Ela tinha tanto medo dela,
que mesmo depois de ter crescido e ficado maior que a pretensa mãe,
fazia quase tudo para não apanhar. Tanto Lelé como Margarete eram
miúdas.
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Amada era tão fora do mundo que uma vez, num resort de luxo, no
meio da piscina, ela exclamou alto, no meio de pessoas embasbacadas:
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Eles tiveram outra filha: Duruca. O pai havia lhe posto o nome e o
apelido. Como todos, principalmente o pai, só lhe chamavam assim,
ninguém mais se preocupou com o verdadeiro nome.
- Eu não. Pra que ter trabalho? Logo, logo eu morro, nem teria esses
malefícios da degradação do meio ambiente.
- Você não pensa, pelo menos, em seus filhos, seus netos, enfim, em
seus descendentes?
- Eu não! Eles que se virem.
Quando vemos esses grandes executivos internacionais mentindo
contra o meio ambiente, contra a saúde, etc., percebemos que eles
pensam igual ao Cipriano. O pior é que essas pessoas são frias, calculistas,
e não têm nenhum escrúpulo, conseguindo chegar a altos postos de
decisão, inclusive dirigindo uma nação. A história nos dá uma lista
enorme.
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- Vamos brincar?
Maria Sílvia veio e chamou todos para dentro. Teve medo da reação
do marido, carente, e não teve pulso de tomar atitude concreta e firme.
Errou mais uma vez.
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Quando saíram, ela viu que tinha sobrado uns trocadinhos e sugeriu
à avó que, em rasgo de luxo para elas, fossem de ônibus, pois o barraco,
que ficava em Vila das Cruzes, era a uns quarenta minutos andando
rápido. Foi aí que encontraram, por acaso, Lelé, já meia embriagada ou
drogada. No ponto de ônibus havia outras pessoas, quando chegou o
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coletivo. As três então foram entrar nele. Foi quando uma moça, toda
bem arrumada, reclamou da presença delas. Os outros dali concordaram
com a tal e aqueles que já estavam no ônibus também. Não foi só pela
bêbada, foi também pela extrema pobreza delas, que os deixou inseguros.
Lelé insistiu e entrou fazendo barulho. Depois deu mais confusão, pois ela
não tinha dinheiro para pagar a passagem. Malvina puxou a avó com
vergonha. Ela já sabia que, no ônibus, só podia entrar quando estivesse
muito vazio, e pudesse ficar em canto isolada. Para entrar em loja, era a
mesma tragédia. Não gostavam nem que ela passasse na frente. Em
shopping center, nem poderia cogitar. O motivo da cabeça de muitos era a
possibilidade de ela ser um perigo, uma ladra ou coisa parecida. esmo que
não fosse.
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O pai dava surras enormes nas filhas, xingando-as dos piores nomes.
Amada, que tinha o temperamento dele, jogava nele tudo que via pela
frente. Se ele ia para sua direção, tentando revidar-lhe, aí ela corria para
os objetos mais caros. Nisso impunha-lhe medo.
Isso a fez não querer ser igual à mãe em nada. Até a aparência, ela
rejeitava. Maria Sílvia tentou desesperadamente trazê-la para o caminho
do bem. Pagou-lhe professores particulares e cursinhos mil. Colocou-a em
psicólogos, atividades religiosas, escoteiros... Quando interessava, ela até
fazia de conta que os esforços da mãe estavam ajudando, depois, quando
não mais precisava, dava volta de 180° graus, sem o menor remorso, nem
o menor constrangimento. Tornou-se uma pessoa que fazia e falava o que
interessava àquele que lhe dava prazer ou alguma vantagem material.
pai, não falavam tanto, pois tinham medo dele. Quanto à mãe, elas
chegavam a abusos e exageros absurdos. Duruca era mais, entretanto
Amada também não tinha por sua genitora o respeito normal.
Seu pai tinha dinheiro, mas era sua mãe, pela sua posição, que
tinha prestígio e poder. Isso gerava muita inveja nas pessoas. Duruca
então, para agradar a quem lhe interessava, tratava a mãe, na frente
delas, com grosserias, xingamentos e outras atitudes contrárias à sensatez
e à racionalidade. Não respeitava nem mãe, nem pai.
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No sonho, eu não aguentava mais tanta morte e nem queria que ele
voltasse, mesmo morrendo de saudades dele, daquele outro que era meu
filho – será que existiu -, ou simplesmente do meu filho ...!”
- Oh, tia Assunção, não fica sofrendo não. Vai fazer suas
caminhadas, entrar no mar e nadar até aquele ponto que a senhora gosta.
Leia seus livros, converse com suas amigas. Não dê importância aquele
ingrato.
Maria Sílvia sabia das dificuldades que ela teve com o marido
bêbado e abusador, e com o mau filho, que seguiu o péssimo exemplo
paterno.
Continuando, disse:
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Aos catorze anos, Amada resolveu deixar de ser virgem. Todas suas
amigas já não o eram. Sem pensar em sentimento, escolheu um rapazinho
rico, o qual sua turminha considerava bonito. Convidou alguns
adolescentes a irem passar fim de semana na casa da tia Assunção,
combinou uma armação para os dois ficarem sozinhos e aconteceu o
desvirginamento. Ela adorou, achou muito bom. Teve a precaução de se
proteger de doenças e provável gravidez. Para isso, teve a assessoria da
assistente social de sua escola, que dava palestras para as alunas sobre
esse assunto.
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E Ueslei decidiu:
Todos riram.
- Não tenho nada a ver com “cê” não. Não sou viciada, nem lhe
devo dinheiro. “Cê” deve estar confundido. Eu quero é paz.
defendeu como pôde, entretanto ele era mais forte. Arrancou sua bata,
bateu muito nela, prendeu suas mãos, colocou um pedaço de pano em
sua boca – ela tentava mordê-lo - e conseguiu penetrar o pênis em seu
corpo, chegando ao êxtase do sexo. Depois, limpou-se com a toalha que
ela havia se banhado e ainda teve o desplante de lhe dizer rindo:
- Pode se exibir, se mostrar. Quem tirou seu cabaço foi o rei Ueslei.
Malvina continuou sua vida, achando que aquele episódio havia sido
um capítulo triste em sua vida. Nem percebeu que sua menstruação não
estava mais vindo. Foi Lelé quem percebeu que sua barriga começou a
crescer:
- Não quero nada dele. Aqui dentro tem meu filho. Ele foi pai de
maneira horrorosa. Não quero nem que ele saiba, mas, vó, eu já estou
começando a gostar dessa coisinha aqui dentro.
Lelé retrucou:
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- Minha filha, foi tudo do jeito que você quis, não faltou nada.
- Faltou sim...
Tinha outra coisa. Amada se vestia com roupas caras e de grife, fazia
absoluto empenho nisso. Estava sempre em salões de beleza sofisticados
e gostava demais de joias. Vez por outra namorava algum rapaz,
entretanto não lhes tinha afeição. Prestando-lhe atenção bem de perto,
percebia-se que ela fazia tudo para aparecer bem, para ser bem falada,
porém não tinha aquele gosto todo por rapazes. Não era lésbica, nem
machona, mas não tinha sensualidade, apesar de ser considerada uma
boneca linda no seu meio. Talvez fosse só uma boneca.
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- Tanto tempo que não me lembro mais... e meu pai, quem é? Você
era puta, nem pode saber de qual “homi” eu era filha... Vá à merda!
E não lembrava mesmo. Foi tão pouco tempo que estiveram juntos.
E para ela, havia sido o macho safado, com roupas bonitas, perfume e o
carrão chique.
- Só sei que amo muito meu filhinho. Vou criar essa coisinha
sozinha, trabalhar muito, mas nada vai faltar para ele.
- Minha querida, trabalhar no lixão é horrível... por que você não vai
ser puta. Eu fui – deixei de ser quando ninguém me queria mais -, Lelé
também se vira na calçada... é meia horinha... às vezes tem uns bestas,
outros estúpidos e outros tarados... mas é só meia horinha... a gente pega
o dinheiro e fica livre o dia inteiro sem precisar trabalhar. Ser puta não é
ruim, tanto é que quem vai pra profissão não larga mais. Ter de enfrentar
batente, “tô fora”...
De fato nem ela, nem Lelé, queriam trabalhar. Preferiam viver mal,
dinheiro minguado, com vida irregular, sem nenhuma segurança, nem
dignidade, do que ter serviço o dia inteiro.
Parece incrível, porém até sorriu. E era verdade. Suas mãos criaram
calos para se proteger dos acidentes dos quais ela constantemente era
vítima.
A nossa jovem não era lésbica, nem machona, mas não tinha
sensualidade. E não era devido ao seu aleijão, pois apesar disso, ficou até
com aparência boa. Não ligava para sexo. Quando algum rapaz lhe falava
alguma coisa, assediando-a, ela o xingava e blasfemava. A avó achava que
foi o episódio com o Nhou, depois o traficante. Sabe-se lá...
Também foi certo que, apesar de Ueslei achar que o filho não era
seu, devido ao comportamento da mãe, sempre ficou com uma coisa lhe
remoendo os miolos. Por isso ele dava proteção muito discreta – pra lá de
discreta – ao moleque. Isso não impediu que o menino, antes da
adolescência, já estivesse na malandragem, metido em pequenos furtos,
alguma droga, etc. A pressão do meio em cima dele era grande e forte.
Quase sem forças, quando percebeu que estava só, teve de levantar
cambaleando e ir embora, pois tinha medo de alguma máquina não a
perceber embaixo daquilo tudo, além do ataque dos bichos.
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pegar uma bolada, ele a estimulou a ir. Parece incrível que todos, até
mesmo sua mãe, a encorajavam a ir. Malvina não gostou daquilo,
entretanto, como os demais podiam dizer que era inveja da amiga bonita,
não se manifestou.
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Começou a frequentar a casa dos pais dele a moça Cadina. Ela era
irmã de artista da televisão que fazia sucesso na época, principalmente
por ficar nua. Começou então um festival de elogios a tal fulana. Diziam-
na a linda das lindas. Quando ela ia a casa deles, todos se desmilinguiam a
bajulá-la. Era tanta bajulação, que fugia à normalidade. Até Duruca achava
muito, mas, nem de longe, colocava-se contra.
Ela sentou na cama arqueada sem falar nada. Foi quando tocou a
campainha e chegou alguém da família dele.
- Ela descobriu meu caso com Cadina. Vocês não vão mais ter que
entretê-la para ela não me pegar no flagrante, mas também não vão
poder se deliciar enganando a nobrezinha...
Duruca se pegou num parque ali perto, sentada num banco. Nem
tinha ideia de quanto tempo ficou lá. Pegou o telefone e ligou para a mãe.
Apesar de ainda ter serviço, ela entendeu que poderiam ser feitos
no outro dia, largou tudo e foi para casa tensa.
Carlos, o pai do rapaz, foi o único que telefonou para Duruca, para
saber como ela estava. Reimar tinha tanta certeza de que ela estava
fatalmente em suas mãos, que levou susto enorme quando percebeu o
afastamento dela. O pai dele ainda tentou se encontrar com ela, dizendo
ser tudo um mal entendido. Entretanto percebeu que infelizmente estava
tudo acabado. Definitivamente. Nem foi necessário os Toledo Bordeaux
de Lima tomarem nenhuma providência. Em tempo mínimo, eles saíram
do imóvel com o pouco de seus pertences.
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Pele toda maltratada, sempre com cheiro de bebida... Ele lhe trouxe
sanduíche, outro dia cocada e ela se encantou.
Dessa vez ela até gritou de dor, entretanto teve de suportar. Não
tinha outro jeito. Saiu cambaleando, com a avó ao lado, tentando ampará-
la. Foram para o barraco, em Vila das Cruzes. Algumas horas depois, ela
ardia em febre e foi levada ao hospital público. Depois de horas, foi
atendida. De início, os funcionários xingaram a pobre dizendo-lhe que iam
comunicar à polícia... Trataram-na de mal para pior. Porém eles lhe deram
medicamentos e fizeram a internação. Disseram para a avó que ela não
iria suportar. Além do mais, havia as doenças venéreas. Ela se debatia e se
estrebuchava em um colchão no corredor. A avó chorava e ela nem a
escutava.
- Quem faz aborto como você fez, quase nunca escapa... Dê graças a
Deus. Vou levar você para a médica.
- Ressuscitou?
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- Aborta!
Maria Sílvia gritou e berrou. Ninguém a escutou, nem ligou para ela,
que foi para seu quarto chorar. Depois do trabalho, foi à igreja. Ficou lá
muito tempo, nem sabe quanto. Ela não teve força para enfrentar seu
marido e sua filha e impedir o desastre.
- Que médico educado! Que clínica chique! Não doeu nada. Nem
senti me livrar do estorvo.
Amada, que parecia não ligar para o assunto, voltou à sua vida de
consumismo e futilidade. Porém, pelo resto da vida, ela teve pesadelos
sobre o aborto. Quando deu a luz a seus filhos, ficou imaginando que o
nascituro vinha lhe cobrar pelo passado.
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Maria Sílvia era duma ingenuidade muito grande. Como ela era
muito fiel e honesta, imaginava que as pessoas eram iguais a ela. Homens,
ela bobamente os imaginava iguais a seu pai, que sempre foi fiel, honesto
e muito bom. Quando desconfiava do marido, este lhe vinha com
argumentos tolos e ainda a acusava, não importando os motivos. Em
seguida, xingava e ridicularizava a traída. Se acontecesse de ela se
descontrolar e eles começarem a brigar, ele tinha aquele prazer neurótico
por ser viciado em angústia. Ela nem percebia que nele havia um risinho
cínico e malvado. Nessa hora, ele se sentia igual ao pai dele , que sempre
foi um traidor constante. Ele imitava o pai não com as gastanças – ele
tinha sofrido muito pelos seus desmandos financeiros e sociais -,
entretanto no resto, era e queria ser cópia da figura paterna.
Tinha nisso seu passado com a carência materna. Kiki nunca lhe deu
atenção, pois Maria Sílvia foi investimento para seus objetivos e ela
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- Sei lá...
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Maria Sílvia a considerava tão mal avantajada que tinha pena dela.
Não lhe passaria nunca pela cabeça ser sua concorrente conjugal, pois ela
possuía rosto bonito e corpo bem apanhado, além de ser meiga e
feminina.
- Xinga essa sebosa metida a nobre (e soltava três palavrões) ... além
do mais, quando você entrar em casa, se ela reclamar, dá-lhe bofetões
(também usava palavras de baixo calão) ...
Riam muito. Bêbado, ele, que já tinha raiva pela figura feminina –
não era homossexual, parecia até machão – e encorajado pela amante,
chegava à sua casa e agredia a esposa. No dia seguinte, percebia que
necessitava reverter a situação. A reação estourada vinha como ia, e logo
ele voltava a agir como se nada tivesse acontecido. Com o maior
descaramento, fingindo olhinhos de bondade, dizia-lhe a frase de sempre:
ela era a mulher de sua vida e que a amava muito. Além de culpá-la de ter
sido a causadora da briga. Infelizmente ele não tinha a menor intenção de
mudar nada do que estava acontecendo.
Anos mais tarde foi que Maria Sílvia percebeu que as brigas,
xingamentos, agressões haviam aumentado na proporção dele diminuir
sua capacidade de ereção. Casou-se ingênua, por isso Cipriano a induziu a
fazer atos de libertinagem e ela concordou, no intuito de agradá-lo. A
possível traição da amante não significaria para ele fracasso, já a da
esposa, sentindo-se mal servida sexualmente, seria muito humilhante.
Ele nunca sentiu responsabilidade por algum fato ruim que tenha
feito. Para ele, a culpa é apenas mecanismo para controlar as outras
pessoas.
Um dia, Cipriano foi até uma pessoa que dizia prever o futuro. Essa
lhe disse que ele tinha amante, entre as muitas que passaram por sua
vida, e que sua esposa iria descobrir e abandoná-lo. Ele se descontrolou
tanto que a tal senhora levou susto. Aconselhou-o então a abandonar a
amante, se quisesse continuar com seu casamento. Ele não podia perder
Maria Sílvia de jeito nenhum, principalmente pelo dinheiro do casal e pela
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sua posição social. Também não queria ficar como o pai, que no fim da
vida implorava companhia para uma mulher vulgar e fedida.
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- “Sô” acha?
também. Cai na mão de gente ruim “da pesada” e tem que trabalhar igual
a escravo. Outros, essa gente má percebe que ele, ou ela, não tem família
ou coisa assim e bota também pro cativeiro. Eu sei disso porque o irmão
dela (apontava para a esposa) “tá” ajudando nisso lá na nossa igreja.
Desculpe falar, Malvina, mas você é quase assim. Por isso, se cuida,
menina. Eu e minha mulher sempre fazemos oração por você.
- “Brigada”.
31
Por sorte sua, veio morar em casa herdada dos pais, podendo até
alugar um salão embaixo. Tudo não estaria mal, se ela não julgasse que
deveria ter muito mais, principalmente quando via a situação da amiga.
Cipriano implicou com ela, por ser separada e, portanto, em sua cabeça
preconceituosa, péssima para convívio com sua esposa. Ele imaginou que
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- Eu, eu não...
E voou...
queria ficar sem a esposa. Nesse caso, não era nem a cafajestada. Sua
intenção mesmo era separá-la da amiga. O ato sexual seria um brinde
somente.
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Apesar do avô não o ser, Joãozinho era muito bonito. Depois nasceu
uma menina, Mariana, agora em homenagem à família do pai. Ela nasceu
muito parecida com o pai e era linda. Como Amada era ciumenta e
possessiva, não deixava nenhuma das avós ficarem próximas de seus
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filhos. Sua mãe entendia. Tentava harmonizar o que podia e ficava com as
crianças tanto quanto lhe era possível, pois eram muitos seus afazeres,
pelo fato dela ser uma executiva ocupada. Entretanto a sogra não se
conformava e as duas, nora e sogra, vez por outra se desentendiam feio.
Sorte ter sempre a mãe e o marido para contemporizar. E tudo dava uma
abrandada: a sogra não queria ficar longe do filho e dos netos e Amada se
interessava muito pelo dinheiro dela.
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Ela cultivava um ciúme doentio pelo marido. Talvez por ver o pai
com traições durante sua vida inteira. Quando lhe diziam brincando, ou
não, que Josué era bonito, rico e médico famoso, ela ficava furiosa.
Dependendo da pessoa, procurava controlar-se ou fazia grosseria mesmo.
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Além disso, ela era livre, totalmente livre. Durante toda sua vida
levantou-se e foi dormir na hora que quis, comeu quando lhe dava fome e
trabalhava quando precisava. Sem compromisso com nada nem ninguém.
Nunca teve nada, a não ser uns trocados no bolso. Já houve ocasiões em
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que foi furtada ou mesmo roubada, mas era tão pouco, que não deu nem
pra sentir. Em sua vida, não havia disciplina para nada.
Em seu barraco, no cortiço de Vila das Cruzes, tinha tão pouco, que,
se lhe tirassem, não ficava muito difícil repor.
Como ela nunca tinha tido família, família mesmo, esta não fazia
parte nem de sua vida, muito menos de seus objetivos. A figura masculina
não entrara na sua história. Ao contrário, passou longe, muitas vezes
associada à agressões ou abusos. Seus homens eram esporádicos. Nunca
ela se apaixonara por alguém perdidamente. Às vezes lhe dava
formigamento no corpo e na alma. Esse era o sintoma de estar
interessada em alguém. Então havia uns encontros, umas gentilezas a
mais. Nunca iam muito adiante, entretanto lhe bastavam para acalentar
sua vidinha. Verdade que não tinha ninguém seu, porém não tinha
também ninguém para preocupá-la. Havia se acostumado com aquilo.
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para a assessora dela. Pediu para ser levado à sua presença para mostrar-
lhe seu material. Ela não iria perder muito tempo. Quando a assessora
chegou a ela, meio sem-graça, a poderosa diretora parou e quis vê-lo.
Ela sempre teve a impressão de ter tido outra filha depois do parto
de Amada, apesar de todos acharem isso absurdo. Quando viu as provas,
principalmente a do computador, ficou balançada. Ao perceber, o
repórter logo lhe disse que poderiam fazer exame de DNA discretamente.
Pegou o telefone do jovem jornalista com o dizer lacônico de “vou
pensar!”.
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- E Pipão? Ele é “de menor”. Não está aqui não, mas está jurado de
morte. Além do mais, o “homi” que ele furou era importante. Estão
fazendo pressão e muita.
Ela estava atônita, nem pensar, pensava. Foi quando lhe apareceu
uma senhora de olhos bons e as duas se encaminharam a outra sala. Sem
saber o porquê, ela já foi mais calma. Mesmo assim, atônita.
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No tal hotel, tomou lanche com frutas, como maçã e uvas, que ela
não estava acostumada. Além de refrigerante e sanduíche de marca
famosa. Como não dormia há dias, ela teve um sono de muitas horas,
entre sonhos e pesadelos.
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Naquela manhã, Maria Sílvia estava ansiosa para ver a outra filha.
Foi avisada da aparência dela. Enquanto Amada usou os bons cremes e
protetores solares, Malvina, recém-nascida, ficou exposta ao sol o dia
inteiro como mendiga, sem proteção nenhuma. Durante a vida, nunca
usou hidratantes ou produtos semelhantes. A alimentação de uma era da
melhor qualidade, da outra, da pior. Além da prevenção da assistência
médica da primeira e a total abstenção da outra, mesmo quando
necessária.
ficava um pouco estranha. Era também mais baixa. Além de ser barriguda,
pois, desde pequena, sempre carregou muito peso.
Quando Malvina chegou lá, nem imaginou que ali era a casa de seus
pais. Era um sobrado grande e com classe, porém não chegava a ser
mansão. Entretanto, para seus padrões, ela nunca havia visto uma casa
assim tão bonita, tão chique e tão cinematográfica, inclusive porque
nunca tinha ido a cinema. Nunca imaginou que uma família morasse em
lugar tão maravilhoso como esse. Ela foi colocada na garagem, entretanto
sentou no chão, pois não teve coragem de usar a cadeira que lá estava.
Ficou num cantinho.
Malvina a achou uma deusa, uma figura inatingível. A mãe também teve
um susto, apesar de ter sido alertada sobre o péssimo estado da moça.
Entretanto, como era boa e altruísta, dirigiu-se à moça com carinho:
- Duruca, modos! Ela é sua irmã e sofreu muito por não ter tido
aquilo que vocês duas tiveram demais e pouco deram importância.
- Encerra, Duruca!
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- Mamãe, você não pensa em quanto ela sofreu? Você pode gostar
ou não, mas ela tem o sangue dos Toledo nas veias.
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Esse último relacionamento era com uma pessoa que tinha até
curso superior, porém trabalhar, trabalhar, não trabalhava não. Vivia em
academia de artes marciais, à qual ele e os seus familiares davam
importância exagerada. Ela pagava tudo para o companheiro, para os pais
dele e até para a cunhada. Eles, que antes andavam de ônibus fuleiro,
passaram a andar só de avião e chegavam a fazer viagens internacionais,
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além dos carros, joias e roupas de grife. O interessante é o fato de que ela
não dava nada, ou quase nada, para seus familiares. A disparidade era
absurda. E não era só material. Era emocional, social, enfim, em tudo.
- Pombas! Na primeira vez que você deita com o cara, ele goza na
tua boca e ainda você dá o rabo para ele. Não vai dar outra: igual aos
outros, ele vai te escangalhar!
Desta forma Duruca fazia com que o outro não precisasse lutar por
ela. Os dois princípios que regem o ser humano são a preservação da
espécie, que é o sexo, e a preservação do ser humano. Por este, desde a
época de nossos ancestrais, o ser humano tem a necessidade de lutar. Nos
primórdios, o combate era para se preservar, entretanto, até em nossos
dias, ainda há a vontade do enfrentamento, de ganhar a batalha. Duruca
se esfrangalhava para conseguir ficar com seus companheiros, porém eles
não. Era só deitar na rede e ficar por lá. Ela era tão fácil, que eles se
cansavam, abusando, traindo, etc., etc. e tal, pois não precisavam lutar
por ela.
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Ela nunca havia tomado água filtrada nem potável. Por isso, estava
cheia de vermes. Suas taxas de sangue estavam alteradas.
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horas, ela não gostou. Para piorar, com exceção da proprietária do salão,
que queria agradar a mãe e tê-la como cliente, os outros funcionários se
esquivavam de atendê-la, além de rirem e ridicularizarem-na. Sempre
longe da mãe. Enquanto todos se acotovelavam para ter a honra de
atender Amada, que os desprezava, sentiam-se inferiorizados de atender
Malvina, apesar de ela procurar agradá-los no que podia.
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mãe se conformou dela comer na cozinha, quando quisesse. Ali ela ficava
como gostava: sentada no chão e se alimentando com as mãos. Quem não
gostou foi sua empregada de décadas. Ela já havia assimilado certos
modos da patroa. Comia em mesinha e tinha nojo da filha resgatada,
inclusive se achava muito superior, Só não debochava dela, pois tinha
muito afeto à patroa. Resolveu não ficar lá enquanto ela comia, ou se
alimentar de costas.
Com tudo isso, Malvina não se sentia bem naquele meio e tinha
saudades de seu barraco na Vila das Cruzes. Principalmente da avó
Margarete, que vinha frequentemente visitá-la. Ao chegar, queria comer o
máximo que conseguia e levar dinheiro. A jovem pegava quase tudo que
tinha e dava a ela. Por medida de segurança, ela só podia ficar na área
externa da casa. Apesar de ter sido atitude humilhante, nenhuma delas se
ofendeu. Estavam tão acostumadas ao rebaixamento moral que isso lhes
pareceu normal.
Lelé foi proibida de chegar perto. Seu crime não foi denunciado,
porém, como o advogado do caso a ameaçou, ela acatou a proibição por
medo.
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A sua mestra lhe ajudava em suas aulas e ela ficava horas na tal
cartilha. Aí havia espontaneidade. Para surpresa de todos, ela passou no
primeiro exame escrito, e, depois, pelas aulas práticas necessárias.
Também passou na chamada prova de direção. Todas ficaram surpresas
com o fato, principalmente suas irmãs, separadamente. Apesar de sua
mãe lhe dar mil parabéns, etc., etc., também ficou admirada.
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- Você nunca devia ter levado essa história desses dois marginais
adiante. Se eu não estivesse nesta cama de hospital...
- E daí?
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Como não sabia muito bem o que estava para acontecer diante
dessa mudança tão brusca na vida da filha, ela lhe comprou para o
apartamento somente as coisas essenciais. Eles estavam tão
deslumbrados que não cabiam em si de contentamento.
Malvina não se sentia bem na nova vida, pois não estava integrada
nela. As pessoas não eram iguais a ela, e, por sua vez, ela também não
parecia semelhante àquele meio. Tinha muitas saudades de Vila das
Cruzes. Lá sentia que fazia parte daquela comunidade, entretanto não
gostava de recordar a miséria, a insegurança e as ameaças no ar.
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Assunção se calou. Não é que, numa tarde, sua assessora lhe disse
que a prima da cuidadora queria lhe falar. Ela atendeu pensando ser um
problema de acerto de pagamento. E pasmem: a tal prima lhe disse que
seu marido estava assediando moral e sexualmente Keity. Acrescentando
que tinham um vídeo gravado pela adolescente com ele apalpando a
moça e ela bolinando as partes genitais do acamado. Segundo a prima, ele
induziu uma menor de idade a praticar atos libidinosos.
Maria Sílvia falou para ela voltar em outro dia, pois estava chocada
e iria pensar. Então conversou com seu colega advogado, que estaria mais
capacitado nesse caso. Foi aí que soube: o homem, quando fica idoso e
doente, debilitado, não tem condições de fazer o sexo normal, com
penetração, e fica só bolinando... É quando pessoas desonestas se
aproveitam da situação e, para ganhar dinheiro, gravam, ameaçam e, às
vezes, conseguem seu objetivo sórdido. O gravado não está certo? e
aquela que gravou também não?
Mais um fato para decepcionar-se com esse homem que havia sido
o amor de sua vida.
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Nem almoçar quiseram, pois Lelé não tinha nada para comer.
Também eles nem fome tinham. “Seu” Hugo apareceu com sua esposa e
esta os convidou para fazerem uma refeição, porém eles não aceitaram.
Ainda Malvina entrou um pouco na casa deles para papear.
Agora já não era mais Pipão e sim Philis Bordeaux de Lima. O nome
era feminino, entretanto, por ser muito diferente, ninguém nunca
percebeu. Na hora da inclusão do sobrenome, Maria Sílvia entrou com
pedido para mudar a ortografia já em desuso, e como concedido, o nome
dele ficou Fílis Bordeaux de Lima. Ele gostou do nome e já se apresentava
assim. Malvina também tinha o mesmo sobrenome.
A religião foi uma das poucas coisas que aproximaram mãe e filha.
Na secretaria da igreja, Malvina conheceu Justina, moradora de bairro
classe média, mas não longe dali. Aos poucos, a amizade foi crescendo e
ela passou a frequentar a igreja do tal bairro. Ali, ela se sentia mais à
vontade.
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Ela tinha carro próprio e apartamento em nome dos pais. Ele sabia
que os pais dela não lhe tinham nenhum apreço, portanto o imóvel não
contava. Como ela trabalhava, tendo seu rendimento, e a mãe ainda lhe
dava dinheiro esporadicamente, ele a tinha como rica. O relacionamento
deles ia indo “à la Duruca”, como ironicamente qualificava tia Assunção.
Eis que, numa tardinha, ela foi sequestrada. Nos primeiros dias,
ninguém percebeu, pois ela tinha comportamentos fora da normalidade.
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O que eles queriam? Seu cartão de crédito, do qual ela lhes deu a
senha. Seu carro, o qual ela assinou o documento para transferência. Além
de dinheiro. Ela lhes deu o que possuía, entretanto eles queriam quantia
maior, pois imaginavam ter ela mais posses do que realmente tinha. Ela
estava passando um pesadelo grande.
- Agora talvez você consiga ver a vida como ela é realmente. Sem
fantasias. O mal nos relacionamentos é que as pessoas colocam seus
sentimentos antes de se harmonizar e antes de procurar parceiro. Por isso
muitos, como você, minha querida, repetem em várias vezes a mesma
história.
Tudo isso abalou muito a jovem. Sem falar quase com ninguém,
passou uns dias na casa de praia da tia. Depois voltou para seu
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- Que horror!
Foi quando Maria Sílvia se pôs a fazer oração em voz alta. Até um
pouco alta demais. Por sorte, o fórum estava perto e as duas saltaram do
veículo.
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MS – Maria Sílvia,
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S – tio Sabino e
A – tia Assunção.
MS – Qual, tia?
pessoas que ficam numa tristeza sem fim, podendo chegar à depressão ou
coisa pior.
A – Que horror!
S – Para se ter saúde, devemos ter projetos, desafios, coisas novas,
abertura de espírito, disponibilidade para o novo.
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S - Você é bonita, tem até saúde e corpo bom para sua idade. Tem
carreira brilhante, internacional. Possui estabilidade financeira. Tem
amigos, é considerada por todos que a conhecem. Tem independência
(soletrando espaçadamente as sílabas), fato este que mais inveja provoca.
MS – Eu lutei e me empenhei para isso.
S – Concordo. Para uma pessoa comum, com bons princípios,
existem normalmente três coisas para se ter sucesso: estudo - não
necessariamente o estudo convencional -, trabalho - preferencialmente no
que gosta, sem perceber que está trabalhando -, e treino. Tem até
exceções, porém são raras. Como você seguiu esta regra, conseguiu
chegar à sua posição atual.
Isso porque, na minha frente, ele sempre dizia aquela famosa frase: “Você
é a mulher da minha vida e eu a amo muito”. É por isso que eu sempre
digo que o importante é o que a pessoa está fazendo, não o que fala.
MS – Eu não o via como ele era realmente. Eu o fantasiava.
A – Coitadinha...!
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com sua prole. Muitas vezes exageradamente. Aquela mulher que ama
demais tem como consequência ser abusada. Aí eles crescem e, na
adolescência, normalmente batem asas. A partir daí, ela até tenta manter
essa família – muitas obstinadamente, podendo chegar a criar tragédias
domésticas – porém, às vezes, não consegue. Diante disso, ela se
entristece. É quando olha para seu relacionamento conjugal, pode estar
bom, entretanto ela pode perceber, dia após dia, que não está nada bom
Pode estar até péssimo. Então tenta resgatar o seu amor adolescente.
A - E aí, a felicidade?
S – Não, não é não. Uma pessoa que consegue passar um dia, como
o domingo, sozinha, descansando e fazendo um lazer calmamente que
goste, está em estado de felicidade. Entendendo as amarguras do
passado, não se exigindo perfeição no presente e, apesar de fazer planos
com esperança para o futuro, não o fantasiar.
MS – Tão diferente...
A – Ela não gosta de ter sido filha da Kiki, ter se casado, e o pior:
continuar vivendo com o cafajeste do marido dela. E também ser mãe
daquelas duas ingratas. Sem contar a resgatada.
MS – Amada é uma boa filha. Não diga isso não. Sem falar na infeliz
Malvina.
Assunção se calou.
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MS – Qual?
A – Você pode ter saudades dos dias que se passaram, das alegrias
que teve. De você somente.
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A – Meus pais tinham uma harmonia perfeita entre si. Os dois foram
seus primeiros namorados. Meu pai talvez tenha tido alguma iniciação
sexual. Não sei. Um vivia para o outro, não lançando seus olhos de amor
para ninguém mais. Eles tinham uma confiança enorme um no outro. Os
filhos, nós, viemos para dar ainda mais alegria ao outro. Um sentia a
felicidade ao lado do ser amado e pronto.
A – Não. Então você diria que essa harmonia é ótima para os filhos.
Durante a vida em família, sim. Entretanto, quando nós fomos para a vida,
éramos muito, muito ingênuos.
MS – Eu mesma achava que todo homem era igual meu pai. Hoje
não me conformo de ser tão boba. Mas tia, meus avós não tinham
problemas com as outras pessoas? Não eram também passados para trás?
A – É isso aí.
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MS – Por que, tia? Não são as feias que são passadas pra trás?
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MS – Mas tio, o idoso tem ainda muito para dar. Inclusive conselho
e carinho.
Todos sorriram.
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Cipriano morreu.
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Para se entrosar com toda aquela papelada, Maria Sílvia lhe indicou
um contador, “seu” Miguel. Ele era calmo, alegre e muito honesto. Seu
escritório inclusive ficava perto da nova morada. Mãe e filho se deram
muito bem com ele. Fílis então passou a frequentar o seu escritório
algumas vezes na semana. “Seu” Miguel não tinha filhos e também se
encantou com o rapaz. Essa amizade fez bem aos dois, principalmente ao
jovem, que não teve pai, nem figura masculina. O contador lhe dava
relacionamento positivo, considerando-lhe bem mais que amigo.
Daí, Maria Sílvia teve a ideia de Malvina começar a fazer bolos para
padarias, confeitarias, etc. Incentivados pela psicóloga Lucy, ela se
encantou e o filho também. Eles levaram o projeto a “seu” Miguel, que se
entusiasmou e disse que lhes daria suporte. Propôs que Fílis também
entrasse na sociedade. Abririam uma microempresa.
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Quando viu, até Amada gostou, entretanto disse que sabia ter ali o
dedo da mãe. As duas riram. Foi a primeira vez que a irmã chique não
rejeitou, nem esnobou sua gêmea.
O que Maria Sílvia queria era lhe dar algo positivo para ela ocupar
seu tempo, pois já diz o ditado popular “a ociosidade é mãe de todos os
vícios”. E deu certo. Fílis também se entusiasmou e ajudava muito a mãe,
principalmente nos negócios e nas entregas. Como ele fez dezoito anos,
depois da herança que veio para sua mãe, ganhou carro só para si. Quis
um modelo que se adaptasse à sua nova atividade. Já pensava em estudar
mais. Nisso foi incentivado pela psicóloga Lucy, pelo novo mentor “seu”
Miguel e por sua avó biológica.
Fílis dizia ter parado com as drogas, porém, vez por outra, numa
ansiedade, tensão ou simplesmente alguma mágoa, pegava um baseado
de maconha. Mas era muito pouco, se compararmos com seu passado.
Agora já fazia sexo tranquilamente sem estar drogado. Isso foi fácil
conseguir, pois era muito jovem.
Ela sempre fazia questão de visitar “seu” Hugo e sua esposa, seus
antigos vizinhos. Eles a recebiam de braços abertos e estavam muito
felizes com sua nova vida.
Ela não ficou rica, entretanto sua situação financeira era estável e
muito boa. Seu dinheiro sobrava, pois vivia com muito pouco, o essencial
para a subsistência de uma pessoa. A mãe biológica e “seu” Miguel
administravam o excesso. Continuou a morar na mesma casa. Vez por
outra, fazia manutenção e mudava uma coisa aqui, outra ali. O reduto de
seu lar estava ficando bonito. Sem luxo nem ostentação. Também havia,
aqui e ali, detalhes cafonérrimos, como a grade dourada da entrada.
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Durante sua vida, ela não sentiu do pai nem amor nem proteção. Ao
contrário. Talvez por isso deixasse seus companheiros abusarem tanto
dela. Ela se achava incapaz de ser amada e respeitada. Muito triste a sua
situação.
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- Sei lá...!
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Cada dia que passava, Amada estava mais rica. Agora já trabalhava
só três dias na semana, pela manhã. E somente três horas. Fora suas
viagens, que eram muitas. Trabalhava porque tinha em sua mãe seu
modelo. Parece incrível, a sua agenda era lotada, e, apesar do preço caro,
havia disputa entre clientes para serem atendidos por ela.
- Eu é que não sou boba de ficar confiando. Se alguém sabe que ele
a trai, ela fica como panaca.
- Será que ele realmente não a trai? Nem todo homem é adúltero.
- Eu não acredito!
A sua boa aparência também era uma de suas neuroses, pois queria
a admiração de seu marido. Na verdade, nada daquilo dava-lhe os bons
sentimentos de Josué. O corpo escultural, malhado ao exagero na
academia, e a pele e o cabelo demasiadamente cuidados faziam-na uma
bonequinha somente. Para ele, o mais importante era ela ser o que era.
Fiel, boa mãe – tirando os excessos -, boa esposa e boa filha. Tinha o
defeito de ser gastadeira e gostar de empetecar tudo, além de seus
ciúmes doentios. Porém Josué a amava e desculpava suas fraquezas.
Quanto à sogra, as duas se acertaram o mínimo necessário para diminuir
seus próprios sofrimentos.
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começou a ler a Bíblia para elas. Malvina escutava calada e mesmo a irmã
tentando evangelizá-la, ela nunca lhe respondia nada. Evidentemente isso
a desencorajava. Amada dizia-lhe uns impropérios, pois não queria a
aproximação fraterna. Na família, a única pessoa com quem ela se
entrosava era a mãe, à qual ela tinha profunda admiração, apesar de
algumas palavras ardidas vez por outra.
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A faculdade dos dois foi muito puxada e ambos deram todo seu
empenho. Logo depois, entrou na vida dela Cipriano, que o afastou
peremptoriamente. Eles se uniram em matrimônio e a história já
conhecemos. Tristemente Cipriano se encaixava melhor nas necessidades
neuróticas das carências afetivas de Maria Sílvia, em relação à sua mãe.
Cristóvão casou-se também com uma colega, pois com a mãe de sua filha
não houve união. Sua esposa não podia ter filhos e eles adotaram um
menino. Este, no futuro, deu-lhes muitos problemas. A união ainda se
arrastou por muitos anos, entretanto não foi adiante. A esposa foi ficando
arrogante e importuna. Um dia, quase assim, ele se viu sozinho e sem lar.
haverá pessoas que podem não acreditar, entretanto foi isso o que se
passou.
Cristóvão ainda tentou uniões que não lograram êxito. Ele já estava
achando que não nasceu para casamento. Sua filha foi morar em outro
estado, e, depois de terminar a pensão alimentícia, quase não se falavam.
Vez por outra, desabafava com Maria Sílvia, que também fazia o
mesmo em relação a seus problemas. Na época, logo após o acidente
sofrido por seu marido, no hospital, ele lhe deu todo o apoio. Depois que
Cipriano foi para a UTI, também.
- Por que vocês não deram certo com seus parceiros? Porque eles
eram pessoas egoístas. Para finalizar a vida com calma, paz e
tranquilidade, vocês merecem um ao outro.
Cada um quis morar em sua própria casa, com suas coisas, suas
manias e seus silêncios. Quando um deles precisava do outro, ele ou ela
ficava alguns dias, ou mais, para lhe dar apoio. Também havia épocas em
que cada um deles ficava dias juntos para se acalentar e se aconchegar.
Normalmente era Cristóvão quem mais ficava, porém, às vezes, ela
também. Quando não estavam juntos, telefonavam-se longamente todos
os dias. Um gostava da presença e da conversa do outro.
Em sua vida sexual, ele se pôs a se esmerar para transar muito bem.
Como Cipriano era mulherengo e suas conquistas ficavam
interessadíssimas por ele, Cristóvão o imaginava com artifícios de alcova.
Na verdade, o falecido era só cafajeste – a maioria das mulheres adora um
velhaco que a faz lutar – e não queria se envolver com outra pessoa.
Queria só a esposa, que se encaixava perfeitamente em seus propósitos
egoístas. A própria cônjuge, no final do casamento, já estava considerando
muito a desejar o sexo com o marido. Na verdade, Maria Sílvia não
entendeu todo esse empenho de Cristóvão para a cama. Mas isso não
teve consequência.
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FIM