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Textos relacionados ao bônus

“Como contar histórias”

Índice

G.K.Chesterton: contos de fadas, fábulas e brinquedos:


“A ética da Elfolândia”: 2
“O Anjo vermelho”: 3
“As fábulas de Esopo”: 5
“O teatro de marionetes”: 7

“A respeito dos contos de fadas”


P.-J. Stahl: 9

“Bienvenidos a la fiesta”: 11

“A beleza é a única vestimenta para a verdade”


George MacDonald: 13

O contador de histórias: 14

Quatro fábulas para exercício de leitura em voz alta:


Jardineiros e Jardins: 18
O Sol e o Vento: 19
O Galo e a Raposa: 20
O Pernilongo e a Onça: 22

1  
 
G. K. Chesterton:
contos de fadas, fábulas e brinquedos

“A Ética da Elfolândia”

“O conto de fadas discute o que o homem sensato fará num mundo


de loucura.” (página 29)
“Se você discutir com um louco, é extremamente provável que leve a
pior; pois sob muitos aspectos a mente dele se move muito mais rápido
por não se atrapalhar com coisas que costumam acompanhar o bom juízo.
Ele não é embaraçado pelo senso de humor ou pela caridade, ou pelas
tolas certezas da experiência. Ele é muito mais lógico por perder certos
afetos da sanidade. De fato, a explicação comum para a insanidade nesse
respeito é enganadora. O louco não é um homem que perdeu a razão. O
louco é um homem que perdeu tudo exceto a razão.” (página 34)
“No final do livro espero dar uma resposta definitiva, que alguns
vão achar definitiva demais. Mas por enquanto é possível da mesma
maneira unicamente prática dar uma resposta geral sobre o que na
história da humanidade concreta mantém a sanidade humana. Enquanto
se tem um mistério se tem saúde; quando se destrói o mistério se cria a
morbidez. O homem comum sempre foi sadio porque o homem comum
sempre foi um místico. Ele aceitou a penumbra. Ele sempre teve um pé na
terra e outro num país encantado. Ele sempre se manteve livre para
duvidar de seus deuses; mas, ao contrário do agnóstico de hoje, livre
também para acreditar neles. Ele sempre cuidou mais da verdade do que
da coerência. Se via duas verdades que pareciam contradizer-se, ele
tomava as duas juntamente com a contradição. Sua visão espiritual é
estereoscópica, como a visão física: ele vê duas imagens simultâneas
diferentes e, contudo, enxerga muito melhor por isso mesmo.” (páginas 47
e 48)

(Do capítulo “A Ética da Elfolândia”, presente na obra “Ortodoxia”.


Tradução: Almiro Pisetta.
Editora Mundo Cristão, São Paulo, 2008.)

“O Anjo vermelho”
2  
 
“Observo que realmente há seres humanos que pensam que
contos de fadas são maus para crianças. (...) Mas uma senhora
escreveu-me uma enérgica carta dizendo que contos de fadas não
deviam ser contados às crianças mesmo que fossem verdade. Ela diz
que é cruel contar contos de fadas a crianças porque elas se assustam.
Da mesma forma poder-se-ia dizer que é cruel dar romances
sentimentais às moças porque as fazem chorar. Todo esse gênero de
conversa é baseado naquele completo esquecimento de como é uma
criança e que foi o fundamento firme de tantos esquemas educacionais.
Se você mantiver os fantasmas e os duendes longe das crianças, elas os
inventarão por si mesmas. (...)” (p. 111)
“Dessa forma, os contos de fadas não são responsáveis por
produzir nas crianças o medo ou qualquer uma de suas formas; os
contos de fadas não dão à criança a ideia do mau ou do feio; estas já
estão nela, porque já estão no mundo. Os contos de fadas não dão à
criança sua primeira ideia de fantasma. O bebê conhece intimamente o
dragão desde que começa a imaginar. O que o conto lhe dá é um São
Jorge para matá-lo. O que o conto de fadas faz é exatamente isto:
acostuma-a, através de uma série de imagens claras, à ideia de que
esses terrores ilimitados têm um limite, que esses inimigos sem forma
têm como inimigos os cavaleiros de Deus, que há no universo algo mais
místico do que a escuridão e mais forte do que o medo intenso.” (p.112)
“Tome por exemplo o mais terrível dos contos de Grimm em
acontecimentos e imagens, o excelente conto do “Menino Que Não Sabia
Tremer” , e você verá o que quero dizer. Há choques vivos nesse conto.
Lembro-me especialmente das pernas de um homem que caíam
sozinhas pela chaminé e andavam pela sala até se reunirem com a
cabeça decepada e o corpo que desciam a chaminé atrás delas. Isso era
muito bom. Mas o núcleo da história e dos sentimentos do leitor não é
que essas coisas fossem assustadoras, mas o fato muito mais chocante
de que o herói não se assustava com elas. A mais amedrontadora de
todas essas maravilhas era sua própria ausência de medo. Batia nas
costas dos fantasmas e convidava os demônios a beber vinho consigo;
muitas vezes na juventude, sufocado por alguma morbidez moderna,
rezei por uma dose dupla de sua coragem.” (p. 113)

(Da crônica “O anjo vermelho”,

3  
 
presente no livro “Tremendas trivialidades”.
Este livro reúne algumas crônicas publicadas originalmente no jornal
“Daily News” entre 1901 e 1913.
Tradução: Mateus Leme.
Editora Ecclesiae, Campinas/SP, 2012.)

4  
 
“As fábulas de Esopo”

“Esopo encarna um epigrama que não é raro na história humana;


sua fama é acima de tudo merecida porque ele nunca fez por merecê-la.
As sólidas bases do senso comum, os lances de astúcia do senso
incomum, que caracterizam todas as Fábulas, pertencem não à ele mas
à humanidade. Na mais antiga história humana, tudo o que é autêntico
é universal; e tudo o que é universal é anônimo.” (p. 67)
“Mas a fábula e o conto de fadas são coisas totalmente distintas.
Há muitos elementos de diferença; mas o mais óbvio é óbvio o bastante.
Não pode haver fábula boa com seres humanos. Não pode haver conto
de fadas bom sem eles.
Esopo, ou Babrius (ou seja o nome qual for), compreendeu que,
para uma fábula, todas as pessoas devem ser impessoais. Devem ser
como abstrações em álgebra ou como peças em um tabuleiro de xadrez.
O leão deve sempre ser mais bravo do que o lobo, tanto quanto quatro é
sempre o dobro de dois. A raposa numa fábula deve sempre se
movimentar em curvas, como o cavalo no xadrez deve se movimentar
em curvas. A ovelha numa fábula deve sempre seguir adiante, como
deve o peão no xadrez seguir adiante. A fábula não deve permitir os
ataques em curva do peão; não precisa levar em conta aquilo a que
Balzac chamou “a revolta de uma ovelha”. O conto de fadas, por outro
lado, reflete exatamente o centro da personalidade humana. Se nenhum
herói se apresentasse para combater os dragões, sequer saberíamos que
havia dragões. Se nenhum aventureiro fosse lançado a uma ilha
desconhecida – ela permaneceria desconhecida. Se o terceiro filho do
moleiro não achasse o jardim encantado onde as sete princesas estão
brancas e congeladas – eis porque elas permaneceriam brancas,
congeladas e encantadas. Se não houver um príncipe especial para
encontrar a Bela Adormecida, ela simplesmente ficará adormecida. As
fábulas repousam totalmente sobre a ideia oposta: que todas as coisas
são elas próprias, e em todo caso irão falar por si próprias. O lobo será
sempre egoísta; a raposa será sempre astuta.” (p. 69)
“Esta é a justificativa imortal da Fábula; que não poderíamos
ensinar as verdades mais evidentes de maneira tão simples sem
converter os homens em peças de xadrez. Não podemos falar de coisas
tão simples sem usar animais que absolutamente não falam.
Suponhamos, por um instante, que o lobo foi transformado em um
barão egoísta, ou a raposa, em um astuto, e em um certo momento
alguém se lembrará de que mesmo os barões são humanos, e será
incapaz de esquecer que até os diplomatas são homens. Sempre se
estará procurando por aquele bom humor inesperado que deveria vir

5  
 
com a brutalidade de algum sujeito brutal; por aquela aprovação a
todas as coisas delicadas, incluindo a virtude, que devem existir em
qualquer bom diplomata. Assim que colocar a coisa em duas pernas ao
invés de quatro e despi-las de penas, não se poderá deixar de procurar
por um ser humano, seja um herói, como nos contos de fadas, ou um
anti-herói, como nos romances modernos.” (p. 69 – 70)
“Nesta linguagem, como em um vasto alfabeto animal, estão
escritas algumas das primeiras certezas filosóficas dos homens. Da
mesma forma que a criança aprende A para asno, ou B para búfalo ou
C para cavalo, também o homem tem aprendido aqui a relacionar as
criaturas mais simples e grosseiras com as verdades mais simples e
grosseiras. (...) [As fábulas] são o alfabeto da humanidade (...)” (p. 70 –
71)

(Da obra “O tempero da vida e outros ensaios”. Tradução: Luciana Viégas.


Editora Graphia, Rio de Janeiro, 2010. O ensaio “As fábulas de Esopo”
serviu de introdução a uma edição limitada de “Fábulas de Esopo”
publicado por William Heinemann, London and Doubleday Page & Co.,
Nova York, 1912. Ilustrações de Arthur Rackham.)

6  
 
“O teatro de marionetes”
“Há apenas uma razão pela qual os adultos não brincam com
brinquedos; e é uma razão justa. É que brincar exige muito mais tempo
e dedicação do que tudo mais. A brincadeira, da forma como as
crianças a encaram, é a coisa mais séria do mundo; e assim que
passamos a ter pequenos deveres ou pequenas penas temos de
abandonar em parte esse plano de vida tão enorme e ambicioso. Temos
força suficiente para a política e o comércio, a arte e a filosofia; não
temos força suficiente para brincar. Esta é uma verdade que será
reconhecida por qualquer um que, quando criança, já brincou com
qualquer coisa: qualquer um que tenha brincado com blocos, com
bonecas ou soldados de chumbo. Meu trabalho como jornalista, que me
dá dinheiro, não é executado com tão terrível persistência quanto
aquele outro trabalho que não rendia nada.
Tome o exemplo dos blocos. Se você publicar amanhã um livro em
doze volumes (seria típico de você) sobre a “Teoria e Prática da
Arquitetura Europeia”, seu trabalho poderá ser laborioso, mas é
fundamentalmente frívolo. Não é sério como o de uma criança
empilhando um bloco sobre o outro, pela simples razão de que se o seu
livro é ruim ninguém conseguirá em última análise e completamente
provar-lhe isso. Ao passo que, se o equilíbrio dos blocos for ruim, a
pilha simplesmente cairá. E, se conheço algo sobre crianças, o menino
voltará solene e tristemente ao trabalho de reconstruí-la. Ao passo que,
se conheço algo sobre autores, nada o induzirá a reescrever seu livro,
ou até a pensar nele novamente se puder evitar.
Tome o exemplo das bonecas. É muito mais fácil cuidar de uma
causa educacional do que cuidar de uma boneca. (...)
Lembro-me de uma menina em Battersea que levava a passear
sua irmã menor apertada em um carrinho e boneca. Quando
questionada sobre isso, ela respondia: “Eu não tenho uma boneca, e a
Bebê está fazendo de conta que é a minha.” A Natureza estava de fato
imitando a arte. Primeiro uma boneca substituía uma criança; depois a
criança se tornava um mero substituto de uma boneca. Mas isso abre
outros assuntos; o ponto aqui é que tanta devoção exige a maior parte
do cérebro e a maior parte da vida, quase como se fosse realmente a
coisa que é simbolizada. O ponto é que o homem que escreve sobre a
maternidade é meramente um educador; a criança que brinca com uma
boneca é uma mãe.” (pág. 147 -148)

7  
 
(Da crônica “O teatro de marionetes”,
presente no livro “Tremendas trivialidades”.)
Este livro reúne algumas crônicas publicadas originalmente no jornal
“Daily News” entre 1901 e 1913.
Tradução: Mateus Leme.
Editora Ecclesiae, Campinas/SP, 2012.)

8  
 
“A respeito dos contos de fadas”
P.–J. Stahl

“Nada, absolutamente nada podereis revelar às crianças, se


pretendeis ocultar-lhes o maravilhoso, o inexplicado, o inexplicável, o
impossível, que são encontrados no real tanto quanto no imaginário. A
História é cheia de inverossimilhanças, a ciência, de prodígios; a
realidade é fértil em milagres, e nem todos os seus milagres são
benvindos, infelizmente! O real é um abismo recheado com o
desconhecido. Perguntai aos verdadeiros sábios. A ciência explica o
relógio, mas ainda não conseguiu explicar o relojoeiro. A derrota da
razão está no final, no topo de todo o saber – e vós mesmo, homem
positivo, vós sois um mistério.
Oh, devolvei, devolvamos os contos de fadas para as crianças, se,
mais exigentes que La Fontaine, não formos bastante puros para
voltarmos nós próprios a eles.” (pág. 21)
“Pois se alguém julga que o que é prodígio para o homem é
também prodígio para as crianças, está inteiramente enganado. Se
existe ma coisa que distingue a criança do homem, é sem dúvida
nenhuma o seu sangue-frio. Aos seis meses, ela estende o dedinho para
tocar numa montanha que se acha a duas léguas de distância; abre a
mão para pegar um pássaro perdido na imensidão do céu e acena para
uma nuvem que passa. Aos dois anos, pede ao pai a lua, e a receberia
de suas mãos sem piscar, se o pai pudesse despregá-la do céu em seu
benefício. Que é que surpreende, então, as crianças? É o que é, ao invés
do que não é: é que a água molha, o fogo queima; é o que as aborrece e
as faz sofrer. A dor é o seu maior assombro.” (pág. 34)
“Resta-me terminar por onde talvez devesse ter começado, isto é,
respondendo às boas almas que receiam não haver uma moral bastante
sólida, bastante visível – eu ia dizer, bastante pesada – nos Contos de
Perrault.” (pág. 42)
“Feliz idade essa em que ser bom é obedecer a quem te adora e te
mima.” (pág. 43)
“Tudo o que diverte uma criança sem prejudicá-la, seja livro ou
brinquedo, diz-se com razão que é moral. A alegria, o contentamento, as
risadas são a saúde do espírito das crianças. Tudo o que mantém essa
saúde – a bola, o arco de madeira, a própria corneta e o terrível tambor
(se os pais não são sujeitos a enxaquecas) – é parte essencial, podeis
estar certa, cara leitora, da moral infantil.

9  
 
Sim, tudo o que faz rir e sorrir essas pequenas criaturas é para
elas o começo da sabedoria. O bom humor e a curiosidade do espírito
são a sua ginástica mental.” (pág. 44)
“Os contos são curtos e isso lhes permite ser cheios de espírito em
cada palavra sem ultrapassarem o duplo objetivo a que se propõem:
cativar a criança e provocar sorrisos e reflexões no adulto.” (pág. 46)

A vida e a obra de Charles Perrault

“Charles Perrault nasceu em Paris no dia 12 de janeiro de 1628 e


morreu em maio de 1703. Perrault chegava aos setenta anos quando
publicou (em 1697), como uma obra precoce do seu filho Perrault
d’Armancourt, de dez anos de idade, os contos que viriam a obter
celebridade universal.” (pág. 207)
“Mas sua redação é simples, fluente, de uma boa-fé ingênua, um
tanto ou quanto maliciosa, porém, e livre; de tal forma que todo mundo
repete suas palavras imaginando tê-las criado.” (pág. 210)
“Ele encontrou a sua veia quando passou a redigir em prosa estas
“histórias do tempo passado”, o que ocorreu muito mais cedo do que
comumente se acredita.” (pág. 212)
“Por mais longe que possa remontar a nossa história literária, ela
sempre mostrará o conto francês marcado pelas características que
encontramos em Perrault, e será infinita a lista de escritores que, até a
época dele, se divertiram em contar as lendas populares. Nenhum antes
dele, entretanto, conseguiu tornar-se um clássico. Essa honra lhe
pertence exclusivamente. Seria isso devido à invenção? Absolutamente,
ele não inventa nada a não ser os detalhes. Os volteios do seu
pensamento são sua única originalidade. De resto, ele se serve de todas
as fontes, à semelhança mesmo dos contadores de histórias mais
humildes, mais indiferentes a qualquer pretensão literária; e assim
como eles, Perrault não tem a menor preocupação em verificar de onde
lhe vêm os floreios que introduz em sua fábula.” (pág. 218-219)

“Contos de Perrault”. Tradução: Regina Regis Junqueira. Editora Vila


Rica, Belo Horizonte/Rio de Janeiro, 1994. Quarta Edição.
Ilustrações: Gustavo Doré (1832 -1883) Esta obra foi publicada
originalmente em 1883. Introdução: P.-J.Stahl – pseudônimo do escritor e
editor Pierre Jules Hetzel (1814-1886).)
 

10  
 
BIENVENIDOS A LA FIESTA
Cuaderno de notas e diccionario de
literatura infantil y juvenil”

WWW.bienvenidosalafiesta.com

Luis Daniel Gonzáles


Valladolid - España

“A sabedoria dos contos populares”


“Dizem que uma vez uma mulher perguntou a Einstein o que
fazer para que seus filhos fossem mais inteligentes. Einstein respondeu:
- Leia contos de fadas.
A mulher, rindo, tornou a perguntar:
- E o que devo fazer depois de ter lido os contos de fadas?
E Einstein disse:
- Leia mais contos de fadas.
Certamente, afirma quem narrou o diálogo - a escritora Mem Fox
-, Einstein pensava que "os contos de fadas requerem uma mente
atenta aos detalhes, muito ativa na resolução de problemas, capaz de
viajar pelos corredores da adivinhação e na busca dos significados.” De
toda forma, a verdadeira importância dos contos, e não dos contos
populares em geral, mas daqueles que, depois de um processo que
levou séculos, são majoritariamente considerados como os melhores, é
que estes contêm um destilado da sabedoria que necessitamos para a
vida.

Isso é bem formulado por Italo Calvino quando explica que "os
contos de fadas são verdadeiros" porque ”tomados em conjunto, com
sua sempre reiterada e sempre diversa casuística de acontecimentos
humanos", nos dão uma explicação geral da vida e nos mostram todo
”um catálogo dos destinos que podem ter um homem ou uma mulher".

11  
 
NOTAS

1) Este artigo foi publicado em “Nuestro Tiempo”, em maio de


2006, número 623 (onde, por erro, aparece outra pessoa como autora
do artigo), e foi revisado em junho de 2007.

2) O caso sobre Einstein foi contada por Mem Fox em sua obra
“Leer como por arte de magia: cómo enseñar a tu hijo a leer em edad
preescolar y otros milagros de la lectura en voz alta” (Reading Magic,
2001). Barcelona: Paidós Ibérica, 2003; 156 pp.; col. Guías para padres;
ilust. De Judy Horacek; trad. De Joan Carles Guix; ISBN: 84-493-1359-
7. [Mem Fox é autora de “Wilfrid Gordon McDonald Partridge”, com
ilustrações de Julie Vivas, lançada originalmente em 1984. No Brasil,
esta obra foi lançada pela Editora Brink Book com o título “Guilherme
Augusto Araújo Fernandes”. WWW.memfox.net ]

3) A citação de Italo Calvino está presente no prólogo à obra


“Cuentos populares italianos” – organizada por ele. Madrid: Siruela,
2004, segunda impressão; 944 pp.; col. Biblioteca Italo Calvino; trad.
De Carlos Gardini; ISBN: 84-7844-796-2.

12  
 
“A beleza
é a única vestimenta
para a verdade.”

George MacDonald

“É possível que, em um conto de fadas, a beleza esteja mais


aparente que a verdade, mas sem a verdade não haveria beleza e o
conto de fadas não proporcionaria alegria alguma.”

  Sugestão de leitura:

“Cuentos de hadas para todas las edades”

George MacDonald

Ediciones Atalanta ( Coleccione Ars brevis)

Girona – España

2012

http://www.atalantaweb.com/libro.php?id=83  

13  
 
O contador de histórias
Chico dos Bonecos

Eu estava passeando pela internet, quando, de repente, encontrei o


senhor Chesterton - e começamos a conversar pelo skype. Quando ele já
estava pronto pra se despedir, respirei fundo, tomei coragem, e convidei o
escritor pra gravar um depoimento. Vocês querem saber se ele aceitou?

***

Fui convidado pra falar sobre o meu livro “Ortodoxia”. Mas... Já


me avisaram, de cara, na lata, que eu tenho apenas sete minutos pra
realizar essa tarefa. Aí eu pensei com os meus botões: “E eu heim...
Esse desafio é de alta periculosidade!” Resultado: Aceitei na hora, quer
dizer, no minuto. Vamos lá...

Eu poderia definir o meu livro como uma autobiografia


desconjuntada. Mas eu prefiro dizer que é um livro de aventura: ele
conta a história de como eu descobri aquilo que todo mundo já sabia.
Podem rir à vontade... Esta aventura não deixa de ser uma comédia...

E a história começa na minha infância. Eu devia ter uns três ou


quatro anos de idade. Eu adorava as aulas de filosofia. Não perdia uma!
É que eu adorava ouvir contos de fadas. A minha primeira e última
filosofia eu aprendi exatamente nos contos de fadas.

Pra começo de conversa, descobri que o conto de fadas é a terra


ensolarada do bom senso. É por isso que o herói é sempre uma pessoa
comum. Suas aventuras é que são estranhas, deslumbrantes,
surpreendentes.

Mas nos contos de fadas, o que eu mais aprendi, mesmo!, foi um


“certo modo” de olhar a vida. Vou tentar explicar...

Os contos de fadas me revelaram que a vida é, ao mesmo tempo,


uma preciosidade e um enigma. E eu fiquei feliz com essa descoberta. E
essa felicidade despertou em mim um sentimento de gratidão – mas eu
ainda não sabia a quem agradecer...

14  
 
Os contos de fadas me revelaram também que tudo depende de
um “mas”, um limite, uma proibição. E foi o vidro que me ajudou a
entender tudo isso...

Eu comecei a observar que o “vidro” estava muito presente nos


contos de fadas: a montanha de vidro, a flauta de vidro, o rio que se
transforma em vidro...

E eu comecei a me perguntar: “Ora, ora, carambola! Por que tanto


vidro?”

Um dia, tropecei numa pedra e descobri aquilo que estava mais


na cara do que nariz: o vidro é a expressão de um fato: a felicidade
brilha, mas é frágil – qualquer pessoa ou qualquer gato pode quebrar
um vidro.

Mas cuidado! Não confunda conhaque de alcatrão com catraca de


canhão. Ser quebrável não é o mesmo que ser perecível. Experimente
dar uma pancada no vidro: ele se quebrará no exato momento do golpe.
Experimente não dar uma pancada no vidro: ele vai resistir mil anos. O
teste de toda a felicidade é a gratidão – mas eu ainda continuava sem
saber a quem agradecer...

E o tempo, é claro, foi passando e eu fui crescendo... Quando


entrei na juventude, a aventura ganhou um ritmo alucinante: eu fui
descobrindo que as mais famosas filosofias do mundo simplesmente
negavam a filosofia das fadas. Foi uma trombada atrás da outra!

Vou dar um exemplo. Espia só...

Eu tinha descoberto que a vida é uma preciosidade. Então, uma


filosofia veio correndo me avisar que a vida não vale nada, porque
diante da imensidão do universo nós somos uma coisa muito pequena,
um cisquinho de nada. Aí eu comecei a pensar... Ora, ora, carambola!
Nós somos pequenos, pequeniníssimos, isso é uma verdade. E não
precisa comparar com o universo, basta comparar com a árvore da
esquina. E motivado pela minha filosofia das fadas, cheguei a lançar
uma pergunta para o céu: “Irmãozinho Universo, entre as suas galáxias
eu também posso encontrar brinquedos, canções, coragem e perdão?”

Vou dar só mais um exemplo...

Eu tinha descoberto que a vida é um enigma. Então, outra


filosofia chegou voando e fez o favor de me alertar que é uma perda de
tempo decifrar o sentido da vida. Esta filosofia me explicou, tintim por
tintim, que a vida é apenas uma peça numa engrenagem, uma coisa

15  
 
fria, seca, vazia, porque tudo na vida é uma eterna repetição: acordar,
trabalhar, comer, dormir; nascer, crescer, morrer; um ano atrás do
outro, um dia atrás do outro... Aí eu comecei a pensar... Ora, ora,
carambola! A partir da minha filosofia das fadas, eu posso muito bem
entender que o sol nasce e se põe todos os dias por um motivo muito
simples: ele adora fazer esse passeio! A minha vó costumava dizer: “Um
dia atrás do outro: piloto.”

Já posso imaginar o que vocês estão imaginando: “Ah... Assim


não vale. Esse argumento é pura fantasia.” Pois eu posso mostrar pra
vocês que esse argumento é pura realidade. Vamos observar, por
exemplo, o caso das crianças. Quando descobre um brinquedo novo, a
criança brinca várias vezes, sem parar. E a criança repete a brincadeira
não por falta de vida, mas por causa de uma grande vitalidade. As
crianças são ousadas e livres, por isso querem sempre as mesmas
coisas, querem sempre repetir as coisas. Nós, adultos, é que temos uma
enorme dificuldade em acompanhar essa vitalidade transbordante – e
ficamos cansados, exaustos, desmilinguidos. É que nós, adultos, não
somos fortes o suficiente para viver a monotonia com alegria.

Sentiram o tamanho das trombadas? De repente, eu estava ali, na


vida real, aprendendo a lutar contra dezenas de dragões e milhares de
monstros...

Por falar nisso... Quando eu era criança, os contos de fadas me


fizeram perceber que a própria vida é uma história. Então, comecei a
desconfiar...

E numa bela manhã de chuva, tropecei numa pedra e descobri


aquilo que o mundo inteiro já sabia: “Ora, ora, carambola! Se existe
uma história, existe um contador de histórias!” Mas eu só fui descobrir
isso muito tempo depois, muito tempo mesmo! Eu já era adulto, bem
adulto... Resumo da aventura: terminei onde comecei. Cheguei na
minha segunda infância. Com uma diferença: agora, eu já sei a quem
agradecer. Dá pra calcular a minha felicidade?

Bem... Em todo caso, dá pra calcular o tempo: sete minutos.

16  
 
Quatro fábulas
para exercício de leitura em voz alta
 

Chico dos Bonecos

17  
 
Jardineiros e Jardins

O jardineiro Jardel observa o seu jardim: algumas plantas


sufocando as plantas menores; outras plantas roubando o
espaço das plantas mais vagarosas; aquelas plantas
desengonçadas, espalhafatosas...
Conclusão: o jardim de Jardel era um verdadeiro matagal.
Numa bela manhã de chuva, o jardineiro Jardel ouviu a
seguinte notícia pelo rádio:
— Você sabia que o Jardineiro Jasmim cuida de jardins
há oitenta anos? Se você deseja alguma orientação, não se
desoriente. Procure o jardineiro Jasmim na Rua da Surpresa,
pertinho da Praça da Descoberta.
Ainda naquela bela manhã, o jardineiro Jardel foi visitar
o jardim de Jasmim. Foi chegando e logo se admirando:
— O que significa isto? Então eu ouço falar de um
experiente jardineiro e, chego aqui, o senhor está tratando as
plantas com uma tesoura?
O jardineiro Jasmim não se admirou com a admiração do
visitante:
— Muitas vezes, meu amigo, as plantas lançam tantos
galhinhos pra lá e pra cá, tantos raminhos pra cá e pra lá,
que acabam perdendo a força para crescer. Quando isso
acontece, vou com a minha tesoura e corto, com muito
carinho, os galhos e ramos que estão sobrando.
— Ah... Estou entendendo.
— Muitas vezes, meu amigo, as plantas crescem tanto, de
maneira tão exagerada, que acabam roubando o sol e a terra
das outras plantas. Quando isso acontece, vou com a minha
tesoura e corto, com muito carinho, o exagero das plantas.
O jardineiro Jardel agradeceu as orientações, deu um
beijo na testa do jardineiro Jasmim e foi embora repleto de
sabedoria.
Seis meses depois...
Seis meses depois, o jardim de Jardel, que era um
verdadeiro matagal, virou um verdadeiro deserto.

18  
 
O Sol e o Vento

Era uma vez um dia comum como outro qualquer, com o


sol de todo dia e o vento de todo momento. Tudo muito
comum, até que...
Até que o Sol e o Vento avistaram, lá embaixo, no tal
planeta Terra, um homem andando pela estrada. Um homem
vestido num casaco e andando pela estrada. Homem, casaco
e estrada.
Depois de muito observar aquela cena, o Vento inventou:
— Amigo Sol, mas que diazinho jibiriba, ismiguça,
agaxenió. Está vendo aquele andarilho no planetinha? Eu
lanço um desafio: quem será capaz de tirar o casaco daquele
homem?
O Sol aceitou e solfejou:
— Lá si dó ré mi fá sol. Quem lança a peleja puxa o fio do
desafio.
O vento, puxando o fôlego, convocou um tubé de nuvens,
reuniu ciclones, enfileirou tornados e redemoinhos, e lançou
todo esse roscolofe em direção à estrada, ao homem e ao
casaco.
Quanto mais o Vento vergava as árvores, quanto mais
enfurecia a poeira, quanto mais zunia, chiava e sibilava, mais
o homem apertava o casaco sobre o corpo, mais o homem se
agarrava aos pedregulhos, mais o homem tapava os ouvidos,
fechava os olhos e prendia a respiração.
Assim, o Vento, com o fôlego por um fio, fez o tufão
virar ventania, fez a ventania virar ventarola, recolheu as
sobras do seu sopro e passou a vez para o Sol.

E milhões de fios de luz espalharam as nuvens, azularam


o céu e foram aquecendo a Terra. Lentamente, o Sol fez o
homem se levantar do chão, erguer o corpo e respirar
confiante. Profundalentamente, o calor foi encorajando o
coração do andarilho.
Tanto aqueceu e tanto encorajou que o homem
tirou o seu casaco. Tirou o seu casaco e pôs dentro da sacola.
Tirou o seu casaco, pôs dentro da sacola e continuou
andando pela estrada. Homem, estrada e casaco na sacola.
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O Galo e a Raposa

No galho mestre da laranjeira central estava o mestre


cantor:
_ Não sei se é fato ou se é fita.
Não sei se é fita ou se é fato.
O fato é que ela me fita.
Aaai, me fita, mesmo, de fato.
De fato, de fita, de fita de fatooo.

O Galo estava empoleirado no galho mestre, muito


engalanado, crista levantada, ciscando a paisagem, quando
surgiu, no meio do terreiro, pisando macio, muita pose,
aquela cujo nome rima com “mariposa”.
Já debaixo de uma laranja gudanja de gurrunfanja de
maracutanja xiringabutanja, a Raposa descascou a prosa:
— Meu amigo do peito, meu irmão Galo, ó, com que
regalo venho trazer esta retumbante notícia. Acaba de ser
decretada a paz geral na Floresta da Brejaúva. Chega de
inimizades e perseguições.
O Galo engalanado, crista levantada, ciscou as palavras
da Raposa.
— A paz geral? Na Floresta da Brejaúva? Foi decretada?
Sinceramente, eu “não sei se é fato ou se é fita. Não sei se é
fita ou se é fato. O fato é que ela me fita. Aaai, me fita,
mesmo, de fato. De fato, de fita, de fita, de fatooo.”
— De fato. A paz geral. Isso mesmo. Desce daí, meu
irmãozinho Galo, vem receber o abraço caloroso da sua
amiga. Vamos juntos espalhar esta notícia e vamos juntos
preparar a festa geral.
O Galo engalanado, crista levantada, ciscou o inesperado
convite e meteu o bico na conversa:
— Isso me traz uma felicidade florestal, sesquipedal. A
paz entre os animais. A fraternidade brejauvense. Já estou
descendo, amiga Raposa, já estou descen... O quê? O que
estou vendo? Daqui do galho mestre da laranjeira central já
posso ver... É inacreditável. São os três cachorros-do-mato.
Eles vêm correndo! Devem estar trazendo a notícia da paz na

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Brejaúva. Já estou descendo, amiga Raposa. E vamos nos
abraçar num abraço cinco vezes fraterno. Estou descendo.
Jazinho.

De repente, de rompante, nesse instante de puf-puf, a


Raposa repisou a prosa:
— Fico muito feliz com a sua felicidade, irmãozinho
Galo. Infelizmente, não posso esperar mais. Tenho muito
trabalho pela frente. Preciso esparramar esta notícia pelos
quatro cantos da Brejaúva. Não faltará ocasião para um
caloroso abraço. Até breve. Breve. Brevíssimo.

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O Pernilongo e a Onça

Era uma vez um Pernilongo zumbindo pernilongamente,


quando a Onça resolveu acabar com aquele zunzunzum:
— Ô bichinho espandongado. Coisinha bijuriba. Chispa.
Sai.
— Saio sim, senhora Onça, mas só saio se eu quiser.
— O quê? Será que eu escutei bem?
— Escutou muito bem, senhora Onça.
— Então, você vai repetir o que falou.
— Repito sim, senhora Onça, mas só repito se eu quiser.
Como em toda boa fábula... Não, não me digam? que
vocês estão pensando isso que eu estou pensando que vocês
estão pensando. A Onça desafiou o Pernilongo para um
duelo.
Enfurecida, a Onça lançou uma patada veloz. Percebendo
o perigo, o Pernilongo escapuliu da patada fatal e começou a
zumbir ao redor do focinho da Onça. A Onça, vesga,
atabalhoada, lançou patadas pra lá e pra cá, pra cá e pra lá.
O Pernilongo peralta despejou sete picadas picantes no
pescoço da senhora enfurecida. A Onça, boquiaberta,
estupefata, correu para a Floresta da Brejaúva.
O Pernilongo, senhor de si, alegre com a sua peripécia,
saiu zumbindo e zombando com ar de todo poderoso.
O zumbidor e zombeteiro, entretanto, não percebeu uma
pequena teia de aranha entre os galhos mais baixos da
laranjeira central. O Pernilongo caiu na teia e se embaralhou.
Era o início de outro duelo. Quanto mais enroscado, mais
esperneava. Quanto mais esperneava, mais enroscado ficava.
Um verdadeiro xis-bola-parafuso-guindaste.
Depois de muitas peripécias e esperneios, o Pernilongo,
finalmente, felizmente, conseguiu escapulir da teia e da
aranha. Ufa! Conseguiu escapulir e saiu zumbindo
pernilongamente.

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