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Os Puritanos e A Conversão - Vários Autores PDF
Os Puritanos e A Conversão - Vários Autores PDF
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Os Puritanos
e a conversão
Pecado: O Mal sem Par
Samuel Bolton
A Conversão de um Pecador
Nathaniel Vincent
A Coisa Indispensável
Thomas Watson
Editora:
Soli Deo Gloria Publications
Tradução do inglês:
Marlene Marques Prado
Revisão:
Antonio Poccinelli Capa:
Ailton Oliveira Lopes
Composição e impressão:
Imprensa da Fé
ÍNDICE
Prefácio do Editor
À Sua Glória
DonKistler
Soli Deo Gloria Publications
PREFÁCIO PARA
"OS PURITANOS E A CONVERSÃO"
O tema mais crucial com o qual a mente e o coração humano podem se
ocupar está ligado com a questão, "como pode o pecador se tornar justo diante
de Deus?" Todos os que têm se apegado à fé bíblica e apostólica concordam
que a única base de aceitação dos pecadores por Deus está incluída na obra
dohomem-Deus, Jesus Cristo, Aquele que levou os pecados do Seu povo,
como substituto dele, e adquiriu a justiça perfeita como fruto de Sua vida,
morte e ressurreição (Rom. 5:12).
Entretanto, as Escrituras deixam bem claro que ninguém chega a
possuir a justiça operada por Cristo, exceto através da total conversão a Deus
(Atos 26:16-18; Mateus 18:3). A verdadeira conversão compreende a área na
qual há grande confusão e terrível engano em nossos dias, sim, mesmo entre
os evangélicos que são esclarecidos na questão do fundamento da aceitação
do pecador por Deus. É precisamente na área da apresentação da doutrina
bíblica da conversão que os pregadores puritanos têm muito a nos ensinar.
Enquanto o livro de Joseph Alleine Um Guia Seguro para o Céu e Um
Chamado ao não Convertido de Richard Baxter foram editados inúmeras vezes
nas últimas décadas e se tornaram um modelo da pregação puritana sobre a
doutrina da conversão, os três menores tratados reunidos neste livro nos dão a
essência do mesmo entendimento puritano sobre a doutrina da conversão.
As vantagens desta trilogia é que cada sermão tem sua área distinta de
força na apresentação de uma sã teologia da conversão e um profundo
discernimento pastoral do método de conversão. Contrastando com muitas
pregações e publicações evangélicas em nossos dias, estes três sermões são
marcados por características distintivas no extenso conteúdo da doutrina
puritana da conversão, e a maneira pela qual pregaram essa doutrina.
O CONTEÚDO DA DOUTRINA DA
CONVERSÃO
1. Eles mostram o terrível mal do pecado sem, de modo algum, tirar o
brilho da magnitude da graça de Deus. O tratado de Bolton é muito útil ao
mostrar que ninguém consegue exagerar o tremendo mal do pecado. Além
disso, o referido tratado em conjunto com os outros dois sermões silencia para
sempre qualquer acusação de que uma preocupação com os detalhes e a
extensão do mal do pecado poderiam obscurecer a magnitude da graça de
Deus.
2. Os sermões demonstram a necessidade de um exame consciente do
pecado sem, de modo algum, restringir a liberdade de acesso do pecador a
Cristo ou a necessidade imediata de suplicar a misericórdia perdoadora de
Deus.
3. Cada um destes sermões desperta a consciência sobre a absoluta
necessidade de um profundo e completo arrependimento, se é que deva
existir uma fé genuína na promessa de perdão para os pecadores que crêem.
Ao contrário do conceito de "graça barata" em nossos dias, estes autores
demonstram de uma maneira convincente, que Jesus Cristo veio para salvar
Seu povo de seus pecados, mas não em seus pecados.
4. Cada um destes autores é claro em relação a tão discutida questão, se
Cristo pode ser ou não recebido como Salvador enquanto não conhecido como
Senhor. Como um exemplo dessa asserção, Vincent mostra que na verdadeira
conversão, os convertidos são tirados das "trevas da ignorância". E assim, cita
uma das áreas específicas na qual esta libertação ocorre. Ele escreve: "Ele os
faz saber que Cristo deve ser recebido por fé, que não existe salvação em
nenhum outro, e que é vão esperar qualquer coisa dEle como Salvador, a não
ser que haja consenso em obedecê-lO como Senhor. Estas e outras verdades
não são mais desconhecidas por eles." Mais tarde no mesmo tratado ele
escreve: "O convertido vê Deus como Senhor. Ele se apropria de Sua soberania
e submete-se ao Seu cetro. Na verdade em tempos passados outros senhores tiveram
domínio sobre ele (Is. 26:13), mas agora sua resolução é firme e imperiosa em
não pertencer a nenhum outro Senhor, senão somente a Deus. Sua vontade se
submete em obediência à vontade de Deus e concorda com ela."
5. Estes tratados mostram uma visão da conversão centralizada em
Deus. Embora não haja nada obscurecendo as realidades de paz e de alegria
que goza o penitente e convicto pecador, há uma constante ênfase sobre o fato
de que na conversão é propósito de Deus trazer o pecador de volta à intenção
original para a qual ele foi criado - a saber, para uma vida centralizada em
Deus. Novamente as palavras de Vincent deixam isso bem claro quando ele
escreve: "O convertido vê Deus como seu objetivo máximo, vê que Deus deve
ser glorificado, vê que pode se deleitar em Deus e no Seu plano de conversão.
O pecador é consciente do fato de que ele, enquanto não convertido, viveu
para desonra dAquele que é o seu Criador, em cujas mãos está o seu fôlego de
vida. Agora, entretanto, tem um forte desejo de caminhar de modo digno do
Senhor em tudo o que lhe seja agradável."
6. Eles constantemente descrevem a magnitude da obra da conversão, e
sua total impossibilidade sem a intervenção soberana e direta de Deus. Uma
das maldições de nossos dias é a difundida noção de que a salvação é
"simples". Apesar de que a essência da mensagem da salvação dada por Deus
é realmente simples, para o pecador se desligar completamente de seus
pecados, sua justiça própria, e se entregar a Deus conforme exige o evangelho,
é exatamente o que o nosso Senhor disse: "é impossível para o homem". Estes
autores puritanos tinham captado a realidade dessa declaração do nosso
Senhor, e não temeram apresentá-la de maneira ousada e convincente.
7. Eles nos mostram que é possível pregar as verdades elementares
referentes à conversão, de uma maneira vigorosamente doutrinária e
eminentemente bíblica. Estes sermões em toda a sua extensão mostram as
Escrituras ilustrando e reforçando a si mesmas, e também uma evidente
compreensão do equilíbrio da verdade. Nos seus mais veementes apelos à
consciência de seus ouvintes, estes autores nunca transtornaram o delicado
equilíbrio de uma autêntica teologia sistemática.
A MANEIRA PELA QUAL ELES PREGARAM A
DOUTRINA DA CONVERSÃO
1. DEMONSTRAÇÃO
Aquilo que luta contra e se opõe ao maior Bem, deve ser o maior mal,
portanto, o pecado se opõe e luta contra o maior Bem. Por isso um dos Pais da
Igreja chamou o pecado de "Deus-matança", aquele que luta contra o ser e a
essência de Deus, aquele que, se fosse suficientemente forte e infinitamente
mau como Deus é infinitamente bom, porfiaria para "acabar" com Deus. Deus
é summum bonun, e realmente non datur summum malüm, o pecado não pode
ser infinito.
Se o pecado fosse tão mau quanto Deus é bom, isto é, adequada e
proporcionalmente, se fosse infinitamente mau como Deus é bom, o pecado
seria difícil demais para Deus perdoar. Seria difícil demais para Deus
subjugar, difícil demais para Deus vencer. O pecado se empenharia em vencer
Deus.
Realmente há mais mal no menor pecado do que há do bem em
qualquer um dos anjos do céu. Por isso o pecado conquistou-os espoliando
toda a bondade deles, tornando-os demônios, o que não aconteceria se o bem
existente neles tivesse sido maior do que o mal do pecado.
Contudo, ele não é capaz de conquistar a Deus, de vencê-lO (há mais
bem em Deus do que mal em dez milhares de infernos de pecado e por isso
ele não pode vencer o poder de Deus, a misericórdia de Deus, a santidade de
Deus), ainda assim ele batalha e faz complô contra Deus continuamente.
Reúne todas as forças contra Ele e vem em campo aberto desafia- IO todos os
dias.
E não somente isso, quando expulso do campo aberto pelo poder de
Deus e Suas ordenanças, então o pecado tem fortalezas, como diz o apóstolo
em II Cor. 10:4, e a partir delas luta e se opõe a Ele. Usa sua concupisciência
contra Ele, sua vontade contra Ele, seu coração se levanta contra Ele.
Quando o pecado é expulso do campo, ainda leva um longo tempo até
que seja expulso da fortaleza. Quando ele na prática é vencido e conquistado,
mesmo assim, na afeição é difícil de ser vencido. A oposição que há entre
Deus e o seu coração pecaminoso é difícil de ser vencida. Custará a você
muitas batalhas, muitos assaltos, até que possa vencê-lo em suas fortalezas,
vencê-lo em seu coração.
Embora às vezes possa parecer estar vencido e extirpado, ele ainda
posteriormente se refaz e fará novas investidas contra você, para enfraquecê-
lo e feri-lo.
Ora, aqui está a malignidade, a maligna e venenosa natureza do pecado,
embora Deus o tenha conquistado, contudo ele nunca foi enfraquecido, ele
ainda irá agir contra Deus e expelir seu veneno.
Temos um exemplo disso no ladrão sobre a cruz. Quando ele foi
pregado na cruz, mãos e pés cravados, somente um membro não ficou fixo, e
esse membro podia ainda expelir seu veneno, injuriando Cristo. Assim, apesar
de Deus ter crucificado o pecado, enquanto houver vida nele, ele agirá por si e
expelirá veneno contra Deus, o que mostra essa grande oposição entre Deus e
o pecado. E por isso essa obstinação e oposição ao maior Bem deve mostrar
que o pecado é o maior mal.
2. DEMONSTRAÇÃO
Aquilo que é universalmente mal não tendo bem nenhum em si, deve
ser o maior mal do mundo. O pecado é inteiramente mal. Como podemos
dizer de Deus "não há mal nEle pois Ele é bom" então posso dizer do pecado,
não há bem nele, pois ele é inteiramente mal!
Há algo de bom nas piores coisas do mundo e há algo nas piores coisas
para torná-las elegíveis a nossa escolha em alguns casos; algo bom na doença,
algo bom na morte. Entretanto, não há bem algum no pecado e nem pode
qualquer situação no mundo fazer do pecado o objeto de nossa escolha.
Embora um pecado pudesse evitar a morte, ainda assim o pecado é
universalmente mal e não há bem algum nele. Você não deve fazer uso do
pecado a fim de evitar a morte.
Por isso vemos que quando o apóstolo Paulo se referia ao pior pecado,
ele não encontrou nenhuma expressão pior do que esta para descrevê-lo em
Rom. 7:13 "excessivamente maligno ". Ele o chama de excessivamente maligno -
maligníssimo!
3. DEMONSTRAÇÃO
Aquilo que é o único objeto da ira de Deus deve ser o supremo mal.
Mas o pecado é o único objeto, não somente o objeto, porém o único objeto da
ira de Deus. Ele não odeia nada a não ser o pecado. Seu amor flui nos diversos
ribeiros em direção a tudo o que Ele tem criado, contudo a Sua fúria corre por
somente um canal, e este em direção ao pecado.
Se o homem fosse feito o centro de todos os outros males no mundo,
Deus ainda assim poderia amá-lo se o pecado não estivesse nele. Se existe
uma confluência de todos os outros bens, saúde, beleza, riqueza, aprendizado
e tudo o mais, Deus o abomina se existir nele pecado. O amor de Deus não
habitará nele, e sim a Sua ira.
4. DEMONSTRAÇÃO
Aquilo que separa a alma do Bem maior, aquilo que separa a alma e
Deus, o Bem maior, deve ser o maior mal. O pecado faz separação entre a
alma e Deus: "mas as vossas iniquidades fazem divisão entre vós e o vosso Deus" (Is.
59:2), entre sua alma e a graça de Deus, entre sua alma e o conforto de Deus,
sua alma e as bênçãos de Deus.
Diz-se que Naamã era um grande homem, um homem honrado, um
poderoso homem de guerra, porém ele era um homem leproso. (II Reis 5:1).
Quaisquer ornamentos que o homem tenha, quaisquer dons, beleza, bens,
riquezas, etc, entretanto se ele for leproso, apesar de ser um homem letrado,
um homem rico, ele é um homem repulsivo e isso estraga tudo.
5. DEMONSTRAÇÃO
Aquilo que é o fundamento e a causa de todos os outros males deve ser
o mal sem par, pois o pecado é a causa de todos os outros males. O mundo
antigo foi submerso em água? Isso foi por causa do pecado. Sodoma foi
destruída com fogo, se transformando num lago de asfalto até o dia de hoje?
Isso foi por causa do pecado. Jerusalém foi transformado em ruínas? O pecado
fez isso. Se eu continuar citando nunca encontrarei um fim.
O pecado é a causa de todos os males nacionais. A seguir daremos
nomes a alguns deles.
1. Guerras "E se escolhia deuses novos, logo a guerra estava às portas".
(Juízes 5:8).
"De onde vem as guerras e pelejas entre vós? Porventura não vem dos
vossos deleites?". (Tiago 4:1).
2. Fome "Ele converte a terra frutífera em terreno salgado, pela
maldade dos que nela habitam. (Salmo 107:34). "Por isso também vos dei
limpeza de dentes (por causa de seus pecados) em todas as vossas cidades, e
falta de pão em todos os vossos lugares, etc." (Amós 4:6).
3. Pestilência Observe o pecado de Davi em numerar o povo em
Deuteronômio 28:21: "O Senhor te fará pegar a pestilência, até que te
consuma da terra a que passas a possuir." Como o pecado é a causa dos males
nacionais, assim ele é também a causa dos males pessoais, e eles são (1)
temporais, (2) espirituais, e (3) eternos.
O pecado é a causa, a conseqüência, o responsável por tudo. Todos os
males têm origem no pecado. O pecado é um mal protuberante e todos os
outros males provêm dele. Alguns se manifestam sobre os seus corpos:
doenças, dores, temores, enfraquecimentos. Outros sobre suas almas: medos,
corações feridos, terrores, horrores. Se você pudesse rasgar o pecado,
encontraria tudo isso habitando no interior do menor pecado.
Quer saber de uma coisa? O pecado foi o fundador do inferno, aquele
que assentou a pedra angular da câmara mortuária das trevas, pois antes do
pecado não existia inferno. E ainda, foi o pecado que edificou o inferno e o
tem equipado com aqueles tesouros e riquezas da ira, fogo e enxofre. E não
somente isso, entesoura ira para o dia da ira (Rom. 2:5).
Portanto, sendo um mal universal, um mal católico, o útero dos males e
a causa de tudo, é o maior mal.
6. DEMONSTRAÇÃO
Aquilo que é pior do que o mais terrível dos males, há de ser o pior dos
males, porém o pecado é o mal sem par. Aquilo que é maior do que o maior
mal é excessivamente mau. O inferno é o mais terrível mal, todavia o pecado é
pior do que o inferno em si. O inferno separado do pecado é somente
miserável, não pecaminoso; um lugar punitivo, não um pecado em si.
Separe o inferno do pecado (embora não possamos fazê-lo, ainda
podemos fazer uma separação intelectual, abstrair o inferno do pecado só em
nosso entendimento), digo então que o pecado é pior do que o inferno, porque
o inferno é somente um lugar punitivo, o pecado é um mal excessivamente
maligno. Existe o bem na punição, o bem na justiça, mas não existe bem
nenhum no pecado, portanto, o pecado em si é o maior mal.
Agora vamos ao segundo ponto, que é o principal. O pecado em si, na
compreensão do povo de Deus, é o mal sem par. Seus lamentos pelo pecado, e
seus sofrimentos a fim de evitá-lo, mostra que ele reconhece ser o pecado o
mal sem par.
1. Concernente a seus lamentos pelo pecado - pode ser visto nos salmos
penitenciais de Davi quantas foram as lamentações e os gemidos dele por
causa do pecado. Leiam o Salmo 51. Por que, qual foi a razão para eles? Todos
os sofrimentos, todos os males no mundo não o teriam afetado tanto quanto o
seu pecado. Paulo diz em Rom. 7:24: "Miserável homem que sou! Quem me
livrará do corpo desta morte ? " A morte de seu corpo não era nada para ele em
comparação com o corpo da morte!
Paulo passou por muitas tribulações, suportando grande sofrimento,
como vocês podem ler em II Cor. 11:23-25. No entanto, todos esses flagelos,
essas prisões e perseguições não machucaram tanto o seu coração como o
pecado, isto é, não o poder do pecado, e sim sua simples presença. Ainda que
tenha sofrido muito, não lemos que ele tenha lamentado por tudo isso. Mas
lamentou pelo pecado, "Oh miserável homem que sou! Quem me livrará deste
corpo do pecado?" Assim fez Pedro, Manasses e outros.
2. Concernente ao sofrimento deles para evitar o pecado - Daniel estava
contente ao ser atirado na cova dos leões, os três jovens no fogo, Paulo e Silas
nos troncos. E muitos filhos de Deus escolheram prisões, estacas, fogo, e as
mais ardentes perseguições em vez de pecar, o que claramente evidencia para
nós que consideraram ser o pecado o maior mal.
Eles consideraram-no pior que a pobreza, que é um grande mal.
"Melhor mendigar do que pecar" disse alguém. "Moisés escolheu antes ser
maltratado com o povo de Deus do que por um pouco de tempo ter o gozo do pecado ".
(Heb. 11:24-28). Alguém semelhante a Moisés, Caleacius Caracciolus, foi um
nobre príncipe e marquês que, para não pecar, deixou tudo o que tinha e foi
morar em pobreza com o povo de Deus, meramente para se deleitar nas
ordenanças.
Músculus, um homem de grande sabedoria e famoso teólogo, em vez de
pecar preferiu se submeter a qualquer condição. A história conta-nos que
sendo despojado de tudo quanto tinha, contentou-se, a fim de não pecar, em
tornar-se um pobre comerciante, tecelão, para conseguir pão para sustentar
sua esposa e filhos. Posteriormente, sendo marginalizado, o mundo
considerando-se bom demais para ele, foi trabalhar com uma pá nas valas
comuns da cidade para conseguir sua sobrevivência. Ele aceitaria qualquer
condição, menos a que o levasse a pecar.
Eles não somente compreenderam que o pecado é um mal pior do que a
pobreza, compreenderam que é algo pior do que a própria morte em si. Este
foi o discurso de Ambrósio: "Você me lançará na prisão? Você tirará minha
vida? Tudo isso é preferível para mim do que o pecado."
Quando Eudóxia, a Imperatriz, ameaçou Crisóstomo, aquele a quem
posteriormente baniria, ele enviou-lhe esta mensagem: "Vá e diga-lhe", disse
ele, "Eu não temo nada neste mundo a não ser o pecado".
3. Eles consideraram o pecado como sendo um mal maior do que a
morte. Basil fala de uma jovem rica, à qual, sendo condenada ao fogo e
sentenciada a perder todos os seus bens por não adorar ídolos, foi oferecida a
promessa de vida e a restituição de seus bens se ela se retratasse. Ela
respondeu, "Adeus vida, que pereça o dinheiro." Olhem para o caso das "Dez
Sangrentas Perseguições" e os nossos recentes dias cruéis sob a rainha Maria, e
encontrarão muitos exemplos dessa natureza.
4. Ademais, eles não somente compreenderam que o pecado é um mal
maior do que a morte; mais do que isso, viram-no como um mal maior do que
o inferno em si. Isto foi o que disse Crisóstomo: "Assim penso, e
conseqüentemente sempre irei pregar, que é mais amargo pecar contra Cristo
do que sofrer os tormentos do inferno."
Anselmo disse que se por um lado lhe fosse apresentado os males do
pecado, e por outro lado os tormentos do inferno, ele preferiria escolher cair
no inferno do que cair em pecado. Tal era a distância que estavam os corações
deles do pecado. E nada é mais comum do que expressões como essas feitas
pelos santos em tentações, em tribulações de espírito, ou num esclarecimento
de seus próprios corações: "Prefiro que me matem, prefiro que me
amaldiçoem, prefiro que me lancem no inferno, do que me permitir pecar
contra Ti."
Isso deve ser o suficiente para esclarecer a parte doutrinária. Agora
vamos à aplicação.
1. CONSEQÜÊNCIA
Se o pecado é o maior mal no mundo, então vamos nos prostrar e
admirar a sabedoria e adorar a bondade de Deus, Aquele que do maior mal,
traria o maior bem, Aquele que faz do maior mal uma ocasião para o maior
bem jamais feito antes. Bernardo foi tão absorvido por tais pensamentos a
ponto de dizer: "Bendito erro que proporcionou tal Redentor."
Deveríamos ficar humilhados pelo erro e agradecidos a Deus pelo
Remédio, e dessa maneira admirar a sabedoria e a bondade que foram
reveladas por causa da maldade do homem para declarar a bondade de Deus;
pelo pecado do homem tornou conhecida e expressa Sua infinita sabedoria,
poder, misericórdia, justiça, etc. Esta seria então uma oportunidade para
manifestar todos os Seus gloriosos atributos; pois Ele traria bem do mal, vida
da morte, céu do inferno, bem do pecado, licor do veneno.
Nunca duvidemos, nunca suspeitemos, de que Deus pode trazer o bem
de qualquer coisa, pode tornar os maiores males na manifestação de Sua
glória e o bem do Seu povo, Ele pode tirar benefício do pecado e do inferno. O
que é para Ele transformar as aflições, perseguições, conspirações
emalignidades do homem? O que é para Ele transformar os problemas,
guerras, etc., em Sua própria glória, e o progresso de Sua causa? Ele que foi
capaz de transformar o maior mal em bem?
Ele que pode transformar o mal do pecado, o qual é a quintessência do
mal e o maior dos males, pode muito mais transformar o mal do problema no
bem de Seu povo. Isso fez com que o apóstolo dissesse que todas as coisas
cooperam para o bem daqueles que amam a Deus. Aquele que tem
experiência disso não precisa duvidar de nada mais. Esse Deus, que pode
transformar o pecado, pode transformar as aflições, cruzes, perseguições e
tantas outras coisas, no bem de Sua Igreja e de Seu povo.
2. CONSEQÜÊNCIA
Daí se conclui que ser entregue ao pecado, é a mais triste punição, o
mais terrível julgamento que existe no mundo.
Esta é a pior punição que Deus impõe sobre os homens, portanto, é a
maior de todas as punições.
Deus normalmente age em etapas em Sua maneira de julgar. Primeiro,
Ele começa com a menor. Se não der resultado, então Ele aumenta a
intensidade. Ele punirá sete vezes mais, e quanto mais longe Ele for maiores
serão Seus golpes.
Esta é a conclusão, o golpe final; esta é a última punição e a maior de
todas elas, entregar o homem ao estado lamentável do pecado, dizendo-lhe:
"Aquele que é sujo, suje-se ainda, aquele que é imundo seja imundo ainda ". Ele disse
isto em Ez. 24:13:"... pois te purifiquei, e tu não te purificaste; nunca mais serás
purificada da tua imundícia..." Ele diz ainda aos israelitas: "Porquanto Efraim
multiplicou os altares para pecar; teve altares para pecar. " (Os. 8:11).
Oh, não há outro julgamento mais triste no mundo do que o homem ser
abandonado à corrupção do seu próprio coração! Isso traz como conseqüência
eterna noite de trevas.
"Bom Deus, liberta-me de mim mesmo" disse Agostinho. Seria melhor
você ser entregue à corrupção dos homens, à malícia e crueldade de homens
sanguinários; melhor ser abandonado a extrema fúria e malícia dos nossos
irlandeses rebeldes do que ser entregue à consupciência do seu próprio
coração. Uma pessoa estaria em vantagem se fosse entregue a satanás do que
ser entregue a si mesma e aos seus pecados.
Segundo lemos em I Cor. 5:5, a pessoa incestuosa foi entregue a satanás,
e foi restaurada novamente. Contudo, nunca lemos de alguém que fosse
entregue a si mesmo e que tenha retornado, de alguém que fosse entregue à
concupiscência do seu próprio coração que tenha se recuperado. Melhor
então, ser entregue a satanás do que ao pecado, pois nenhum outro mal é tão
grave como o pecado.
Trata-se de Deus na posição de juiz, que pode punir um pecado com
outro e amaldiçoar o pecado com dureza de coração. Mas com relação a nós é
um mal pecaminoso. Trazemos o escrito e a cera e Deus coloca Sua chancela
sobre ela, e então somos aprisionados para sempre. E vocês estão caminhando
para esse destino, vocês que andam em pecado e não querem ser corrigidos.
Apesar de Deus ter operado através da doença e das aflições para recuperá-
los, vocês ainda estão de caminho para este julgamento final: "Aquele que está
sujo, suje-se ainda".
3. CONSEQÜÊNCIA
Se o pecado é o maior mal no mundo, então vejam quão loucos são
aqueles que procuram livrar-se de outros males, admitindo o pecado. Aquele
que trabalha para evitar outros males, ou removê-los praticando o pecado,
incorre no maior de todos os males. Ele se mata para salvar-se. Ele se destrói
para preservar-se. Aquele que tenta salvar a sua vida dessa forma, perdê-la-á.
Jamais houve tempos tão ruins que o povo de Deus não pudesse estar
seguro neles se apenas tivesse confessado o pecado. No entanto, ele achou sua
segurança no sofrimento, quando devia tê-la achado na confissão do pecado.
Vemos isso exemplificado na ação dos três jovens: Sadraque, Mesaque e
Abednego.
Este era o argumento dos cristãos primitivos quando foram ameaçados
com prisões e mortes, caso não renunciassem a Cristo. "Bom Imperador, você
ameaça com prisão, mas Cristo ameaça com o inferno!"
Quando Cipriano foi sentenciado a morrer pela mesma causa, o
governador tentou discutir com ele que deveria ter pena de si e renunciar seu
erro ao invés de perder sua vida. Cipriano, porém, respondeu-lhe: "Senhor tu
és meu juiz, e não meu conselheiro. Em tão clara e justa causa não há
necessidade de conselho. Não irei desonrar a justiça da minha causa, entrando
em discussão e conselho como se fosse decidir entre sofrer ou pecar". É como
o caso da jovem de quem Basílio fala, que preferiu dizer adeus à vida e aos
seus bens do que abandonar sua profissão de fé.
Quão deplorável coisa seria assegurarmos as nossas vidas através
daquilo que é a nossa ruína, comprar nossa liberdade através da escravidão,
nossa salvação através do pecado. Vejam o que isso custou a Frances Spira e
Cranmer nos dias da rainha Maria. Cranmer não sabia como vingar-se por seu
próprio ato, a não ser queimando primeiro aquela mão que tinha contribuído
para o pecado.
É melhor ainda estar na prisão do que pelo pecado abrir a porta da
prisão, porque é melhor ser prisioneiro de Deus do que ser um homem livre,
pertencendo ao diabo. Melhor perder tudo do que preservar nossos bens pela
prática do pecado.
E portanto, quaisquer que sejam seus problemas, quaisquer que seja
seus temores, quaisquer que sejam seus perigos, tenham cuidado em
preservar-se ou comprar liberdade ou mesmo vida por um preço tão alto
como abraçar-se ao pecado, desonrando a Deus e ferindo suas próprias
consciências. Tenham cuidado ao se tornarem amigos do homem, fazendo de
Deus o seu inimigo.
Não sabemos ainda qual será o rumo dos nossos tempos, porém está
fora do alcance do poder ou da malícia dos homens fazer de você um
miserável, meu amigo, se eles primeiro não fizerem de você um pecador.
4. CONSEQÜÊNCIA
Se o pecado considerado separadamente é um mal tão grande, o que é
então o pecado circunstancial? O pecado contra o conhecimento? Contra
intenções? Se há tanto mal no pecado, no menor pecado, quanto haveria,
então, no maior? Se os átomos são tão grandes, quão grandes então são as
montanhas? Se os pensamentos impertinentes são tão pecaminosos, tendo
mais pecado neles do que todos os tesouros do céu possam expiar (a exceção
de Deus e Cristo) o que seriam então, os pensamentos rebeldes, os
assassinatos planejados, o adultério, a maldade premeditada, os meios e fins
gananciosos, o desrespeito a Deus, negligenciando e desvalorizando Seus
caminhos? Se há tanto pecado e inferno numa vã e tola palavra, que inferno
de pecado, que montanha de ira há em seus discursos apodrecidos, fétidos,
seus terríveis juramentos de sangue e blasfêmias?
Se existe tanto mal num pecado, considerando-se simplesmente um
pecado, o que devemos pensar do pecado composto, pecado pormenorizado,
pecado feito excessivamente maligno? Pecado contra a sabedoria? Contra as
intenções? Contra as misericórdia? Oh, sente-se e considere um pecado e veja
como ele é grande! Aquele pecado que eu cometi contra o conhecimento,
contra os avisos da consciência, contra o mover do Espírito, etc. E me diga se o
menor pecado não é excessivamente pecaminoso.
5. CONSEQÜÊNCIA
Se o pecado é um mal tão grande, então vejam quão loucos são aqueles
que zombam do pecado: "Os loucos zombam do pecado " (Prov. 14:9), eles
brincam com o pecado. É um esporte jurar, ficar bêbado, etc. Eles irão pecar
por esporte e recreação. É recreação para eles praticar o mal, beber, jurar,
mentir, profanar o dia do Senhor. Estes são loucos. Loucos naturais? Não.
Aquele que prossegue assobiando, tagarelando e na ociosidade, está numa
situação melhor. Este é um louco espiritual, o maior dos loucos.
Vocês se divertiriam com veneno? Vocês se divertiriam com o inferno?
Não, e ainda mais, vocês se divertiriam com sua própria destruição?
Vocês se divertiriam com aquilo que foi tão amargo para Cristo, e que
também lhes será, caso não sejam perdoados?
Quem se divertiria com aquilo que é a miséria dos homens e demônios
perdidos, tanto aqui quanto no inferno eternamente?
Consideraríamos desprezível alguém divertir-se dilacerando o corpo,
ferindo e derramando o sangue de um estranho, de um inimigo, porém
quanto mais do nosso mais querido Amigo? Vocês que se divertem com o
pecado, fazem o mesmo com Cristo. Vocês se divertem matando Cristo,
crucificando-O, dilacerando Seu corpo novamente. Toda blasfêmia é um
punhal no Seu coração, como uma lança no Seu lado novamente.
Divertir-se com o pecado é a maior manifestação da natureza
demoníaca no mundo. Ninguém a não ser os demoníacos fazem isso. Este é o
fardo de Deus. Ele Se queixa disso e considera um alívio ficar livre de vocês:
"Ah! consolar-me-ei acerca de meus adversários." (Is 1:24).
Isto é o ferir a Cristo, o pesar do Espírito, o problema dos anjos, a
destruição das criaturas. Acaso vocês se divertiriam com aquilo que trouxe
todo o mal sobre o homem e mesmo sobre Cristo? Divertir-se--iam com o que
gerou o inferno e o abasteceu, com o que tem sido o tormento das almas e o
será para sempre?
Oh, não se alegrem naquilo que foi o sofrimento de Cristo e será o seu
também para sempre, caso sua alegria no pecado não se transforme em pesar
pelo pecado!
6. CONSEQÜÊNCIA
Se o pecado é o maior mal, então vejam a absoluta impossibilidade de
recebermos alívio e socorro da parle de qualquer um debaixo do céu, por
causa da culpa do nosso pecado, a não ser que venha do próprio Senhor Jesus
Cristo. Você, pecador, cometeu um único pecado? Então, disso nem todos os
tesouros da justiça nos céus e na terra são capazes de livrá-lo ou ajudá-lo, a
não ser o Senhor Jesus Cristo. O que é exigido para expiar a culpa de milhares
de pecados é também exigido para expiar a culpa de um só pecado. Infinita
justiça é exigida para um, e não mais é exigida para milhares. E tal justiça,
ninguém tem a não ser Cristo somente.
Ninguém pode nos libertar do mal do pecado, a não ser Aquele que é
justo. Ora, não existe justiça no mundo que seja proporcional ao mal do
pecado senão a justiça de Cristo. A nossa própria justiça, vocês sabem, é muito
pequena e é chamada de trapos de imundícia (Is. 64:6). Um trapo, portanto,
não pode cobrir-nos; uma imundícia, portanto, embora pudesse cobrir-nos,
cobriria somente a imundícia com outra imundícia, como diz o profeta em Is.
30:1: "...se cobriram com uma cobertura, mas não do meu espírito, para acrescentarem
pecado a pecado, " ou seja, eles acrescentam o pecado de sua justiça ao pecado
de sua injustiça. Eles cobrem mancha com mancha, adicionam pecado a
pecado, esterco a esterco.
A justiça da lei ainda não seria suficiente, supondo-se que o homem
fosse capaz de cumprir toda a justiça e guardar toda a lei. A obediência
presente, embora supostamente adequada à justiça da lei, jamais irá responder
pelas ofensas e desobediências passadas.
A lei é forte o suficiente para amaldiçoar a milhares, porém é incapaz de
salvar uma só alma. Pode trazer o inferno, a ira e a condenação sobre um
mundo de pecadores, todavia é incapaz de trazer a graça ou dar justificação
para um só deles. O apóstolo nos diz em Rom. 8:3: "Portanto o que era
impossível à lei, visto como estava enferma pela carne, Deus, enviando o seu Filho em
semelhança da carne do pecado, condenou o pecado na carne " . O mesmo apóstolo
nos diz em Gal. 3:21: "... se dada fosse uma lei que pudesse vivificar, a justiça, na
verdade, teria sido pela lei. " O apóstolo também nos diz em Gal. 3:17: "... a lei que
veio quatrocentos e trinta anos depois... ", para mostrar que não precisamos
trabalhar para que sejamos justificados, e sim sermos justificados para sermos
capazes de trabalhar. Se Deus pretendesse que a lei fosse o instrumento da
justificação, Ele teria dado a lei quatrocentos e trinta anos antes da promessa.
E, ainda mais, essa não é a justiça dos anjos (a qual é maior do que a da
lei, visto que os anjos estavam acima do homem em inocência) porque esta
também foi uma justiça criada finita e de maneira alguma proporcional ao mal
do pecado. Se o tivesse sido, um pecado não teria despojado imediatamente
aqueles gloriosos anjos de sua bondade e feito deles demônios, o que o pecado
fez, mostrando que existiu mais mal no pecado do que bem ou justiça neles.
Bem, então isso mostra a absoluta impossibilidade de sermos libertos do
mal do pecado por qualquer outro no céu ou debaixo do céu, que não seja
Jesus Cristo. Nada a não ser infinitude pode lidar com o pecado. É necessário
infinita sabedoria para tratar disso. É necessário infinita misericórdia para
perdoar, infinito poder para subjugar; infinito mérito para purificar e limpar, e
infinita graça para aniquilar o pecado.
Seja lá o que for que vocês pensem sobre o pecado, na verdade ele tem
sido o grande inimigo com o qual Deus e a Sua graça têm contendido
incessantemente desde que o mundo começou. E é por isso que Deus tem Se
empenhado totalmente, até mesmo a Sua infinitude, em nos resgatar, em nos
salvar das mãos e do poder do pecado. Sua infinita sabedoria, poder,
misericórdia, verdade e santidade, tudo tem sido empregado para vencer o
pecado; quero dizer, tanto para subjugar o pecado como para salvar vocês
pecadores.
O grande propósito de Deus ao enviar Cristo ao mundo, Sua
encarnação, humilhação, paixão e morte, foi exatamente este: subjugar e
destruir o pecado. Que grande inimigo era esse para que Deus enviasse Seu
Filho para subjugá-lo? Ele pode Se utilizar de moscas, piolhos, a menor das
criaturas, para destruir a maior e mais poderosa força sobre a terra, mas nada
menos do que Seu Filho era forte o suficiente para conquistar o pecado.
Vocês podem desprezar o pecado tanto quanto queiram, engoli-lo sem
medo, viver nele sem percebê-lo, cometê-lo sem remorso, no entanto isso que
vocês tornam tão sem importância, requereu nada menos do que o infinito
poder de Deus para ser subjugado, a infinita misericórdia de Deus para ser
perdoado, o infinito mérito de Cristo para expiá-lo. Foi isto que feriu e fez
sangrar o coração de Cristo e fará o seu também, se não se interessarem por
Ele.
7. CONSEQÜÊNCIA
Se o pecado é o mal sem par, então vejam o quanto estamos presos a
Cristo, Aquele que carregou os pecados e todos os males de vocês que têm
interesse nEle.
Oh, o amor de Cristo! Quão admirável que Ele pudesse carregar o
pecado, o qual é maior que todas as misérias, um mal maior do que a morte,
do que o inferno em si!
Caro leitor, se houvesse alguém no mundo que ficasse contente em ser
pobre no seu lugar, levar as suas dores, ficar doente, ser preso, morrer por
você, e ainda sofrer a ira de Deus e padecer as dores do inferno no seu lugar, o
quanto você se. consideraria preso e devedor a tal pessoa por tudo isso?
No entanto, Cristo fez isso por você. Ele carregou o pecado - o maior de
todos os males, aquele que abrange todos os outros em si -pois, ninguém
senão Cristo, seria capaz de fazê-lo.
Se Deus colocasse sobre você o menor pecado, simplesmente um
pecado (o qual ninguém exceto Cristo jamais carregou neste mundo), isso o
faria em pedaços com seu peso, ainda que todos os pilares do céu e todos os
anjos gloriosos contribuíssem com sua força para o ajudar a carregá-lo.
O menor pecado merece e atrai para si uma infinita ira que nem você,
nem todos os anjos do céu são capazes de ficar em pé debaixo dela. Os
perdidos carregam esse peso no inferno. Eles sofrem-no, porém sem forças
para suportá-lo. Eles são moribundos sem poder morrer. Sempre consumindo,
nunca consumidos! Portanto, veja quanto você está endividado a Cristo -
Aquele que carregou o pecado, o maior de todos os males, e com o pecado,
todos os tormentos, ira e justiça atribuíveis ao pecado.
O mundo todo não é capaz de expressar que tormentos Cristo suportou
quando levou o pecado, quando Ele suou gotas de sangue, quando Ele lutou
com a justiça e suportou a ira de Deus: quando Ele clamou: "Deus meu, Deus
meu, por que me desamparaste?" Que estranha exclamação dAquele que era o
Filho de Deus, Ele que fez os patriarcas da Igreja Grega dizerem: "Pela virtude
de Teu desconhecido labor, e aqueles sofrimentos não revelados ao homem,
tenhas misericórdia de nós". Não é desonra dizer que quaisquer que fossem os
sofrimentos dos perdidos, Cristo suportou-os, contudo não em espécie. E
portanto, enfatizo novamente o quanto você deve a Cristo que levou seus
pecados para você. De fato, está mais preso ainda por ter sido um ato
voluntário de Cristo; ninguém poderia forçá-lO ou constrangê-lO a isso.
Quanto mais voluntária for a gentileza feita, tanto melhor ela é. A gentileza é
muito mais digna quando feita voluntariamente.
Quando uma cortesia é voluntária, costumamos dizer que é uma dupla
cortesia. A voluntariedade torna tudo maior, pois quanto maior o mal que está
no pecado, maior é o pecado. Isto se aplica ao pecado contra o Espírito Santo.
Ele é praticado com volição desesperada e diabólica.
Quanto maior o desejo de se prestar um serviço, maior será a aceitação
dele. O que quer que você faça para Deus, quanto maior for a vontade de fazê-
lo, maior será a apreciação de Deus. Quanto maior foi a voluntariedade
envolvida naquele ato de Cristo, tanto maior deve ser a nossa vinculação a Ele
por isso.
Ora, se você considerar isto em toda a sua extensão, não encontrará
nisso outra coisa senão amor e pura boa vontade. Sua primeira aquiescência
foi voluntária. Foi um acordo voluntário feito entre Deus e Cristo, um contrato
de bom grado feito no céu com Deus, de que Ele Se incumbiria dessa grande
obra. E Ele veio ao mundo com tanta voluntariedade: "Pelo que, entrando no
mundo, diz: sacrifício e oferta não quiseste, mas corpo me preparaste; holocaustos e
oblações pelo pecado não te agradaram. Então disse: eis aqui venho (no princípio do
livro está escrito de mim), parafazer, ó Deus, a tua vontade " (Heb. 10:5-7),
evidenciando a liberdade e a voluntariedade de Cristo ao incubir-Se desta
obra.
E por isso os anjos entoaram por ocasião da Sua encarnação, boa
vontade para com os homens. Isso mesmo - boa vontade. E quando Ele estava
no mundo, realizou Seu trabalho com a maior boa vontade. Ele nos fala: "para
esse fim eu nasci, e para esse fim eu vim para o mundo ", e Ele disse que estava em
angústia até que chegasse a hora, a saber, em ânsia de amor até que a hora
chegasse.
E quando chegou o momento, foi uma negra e desoladora hora,
chamada "A hora das trevas"; ainda assim Ele não nos abandonou, não nos
deixou. Se o tivesse feito, teria nos deixado no inferno sem qualquer
recuperação. Contudo, Ele não o fez, embora (em relação a Sua humanidade)
isso fizesse da obra de Sua misericórdia uma coisa estranha. Não, Ele carregou
o pecado, levou a ira e derramou até a última gota de sangue do Seu corpo.
Oh, leitores, pensem consigo mesmos, vocês que são o povo de Deus, o
quanto estão dependentes de Cristo!
Quantos de nós podemos dizer como Bernardo: "Tu és minha vida, sou
Tua morte; Tu és minha justiça, sou Teu pecado; Tu és meu céu, sou Teu
inferno; Tu és minhas riquezas, sou Tua pobreza." Oh, quanto vocês estão
dependentes de Cristo, dAquele que carregou o pecado!
E ainda mais, vocês sabem o quanto estão dependentes de Cristo,
dAquele que carregou o pecado de maneira como jamais poderíamos fazê-lo,
pagando assim o débito do qual estamos absolvidos? "Havendo riscado a cédula
que era contra nós nas suas ordenanças, a qual de alguma maneira nos era contrária, e
a tirou do meio de nós, cravando-a na cruz." (Col. 2:14). Como a morte de Cristo
foi o pagamento necessário para nosso resgate, assim também a Sua ressur-
reição constitui-se em nossa absolvição. "O qual por nossos pecados foi entregue, e
ressuscitou para nossa justificação. " (Rom. 4:25). Somos justificados pelo Seu
sangue? Somos. Todavia Ele não ressuscitou formalmente para justificar-nos,
e sim para declarar que já estávamos justificados, que estávamos
desobrigados, e que nossos pecados foram perdoados.
Se Cristo ainda fosse prisioneiro sob as cadeias da morte, não
poderíamos ter nenhuma certeza de que nosso débito fora pago. Como diz o
apóstolo Paulo: "Se Cristo não houvesse ressuscitado, estaríamos ainda em nossos
pecados". Mas agora Cristo - preso, levado prisioneiro, posto no túmulo e
tendo quebrado os grilhões da morte, na qual era impossível prendê-lO -
tendo ressuscitado, declara, por tudo que passou, que nossos pecados estão
perdoados.
Se realmente Cristo levou o pecado e nós também tivéssemos que levá-
lo, qual a nossa vantagem? No entanto, Cristo levou o pecado de maneira tal
que não temos de levá-lo, então quão infinitamente somos devedores a Ele por
isso!
Cristo não deixou nada para fazermos, a não ser receber o que Ele
adquiriu e entregou nas mãos do Pai: nada além de pedir uma absolvição,
sim, e das mãos dEle que é justo e nunca nos decepcionará, das mãos dAquele
que certamente concederá o que quer que seja que Seu Filho tenha tão
custosamente adquirido pela Sua obra expiatória.
Se umhomem morre e deixa legados nas mãos de alguém que é fiel, não
podemos requerê-los? Quando Cristo morreu, Ele confiou todos os Seus
méritos nas mãos de Seu Pai, e Ele não deixou nada para fazermos, a não ser
requerê-los todos.
Deus fez um pacto com Cristo que, se Ele levasse o pecado, não
precisaríamos carregá-lo também; que se Ele morresse pelo pecado, o mesmo
seria perdoado por Ele; pois tudo isso está incluso em Isaías, capítulo 53,
versículo 11: "O trabalho de sua alma ele verá, e ficará satisfeito ".
Ora, Cristo colocou em nossas mãos todas as cédulas e fianças de Seu
Pai, e ainda uma procuração pela qual estamos autorizados a reivindicar tudo
isso das mãos de Deus.
Foi por nós que Cristo Se incumbiu do trabalho e tudo o que Cristo fez
foi para nos comprometer com Deus, para satisfazê-lO e depois comprometê-
lO, fazer de Deus o devedor daqueles que foram Seus devedores. E enquanto
houver uma gota do sangue de Cristo para ser distribuída (o qual nunca se
esgotará, é uma justiça eterna) haverá a misericórdia de Deus, ou melhor, a
justiça de Deus incumbida de transmiti-la a nós que pela fé chegamos a Ele. E
não sobrou nada para fazermos em relação à justificação, a não ser requisitar
tudo o quanto Cristo já adquiriu.
Vivemos no mundo como se tivéssemos que comprar o perdão, quando
temos apenas de recebê-lo. Deus nos detém pelo débito do nosso pecado, mas
vocês pensam que temos de pagar por ele? Ai de nós, pobres criaturas, se
tivéssemos que pagar! Isto não é senão para tirar-nos de nós mesmos e trazer-
nos para Cristo - Aquele que já pagou o débito.
Oh, como isso nos faria proclamar Cristo, admirá-lO, prezá-lO! O que
poderia aproximar mais o nosso coração a Cristo do que o fato de que Ele
levou os nossos pecados, e o fez de modo que nunca teremos que levá-los se
tivermos interesse nEle?
8. CONSEQUÊNCIA
Se o pecado é o maior mal, então isso deve conduzir-nos para:
1. a maior tristeza
2. o maior ódio
3. o maior cuidado em evitá-lo
4. o maior empenho em livrar-nos dele.
Se o pecado é o maior mal, então precisa haver a maior tristeza por sua
causa. Nenhuma aflição, nenhum problema, nenhum mal deve ser tão amargo
para nós como o pecado, porque o pecado é o maior mal. É uma coisa triste
ver nossos corações suscetíveis e sensivelmente afetados com males menores e
problemas, e ainda permanecerem duros e insensíveis ao pecado, o qual é o
maior dos males.
Seria sábio de nossa parte, portanto, quando nenhum outro mal estiver
sobre nós, voltarmos todos os nossos lamentos, lágrimas e tristezas para o
pecado.
É um aforismo na medicina que, se um homem sangrar copiosamente
num lugar, os médicos o farão sangrar em outro lugar, a fim de fazer o fluxo
de sangue mudar de direção. Seria sábio de nossa parte, quando nossas almas
sangrarem e nossos corações lamentarem por outros males, direcionar todos
os lamentos angustiosos para o pecado. Deixem que eles corram pelo canal
certo.
Lágrimas derramadas deveriam ser derramadas novamente se não
foram derramadas pelo pecado. A tristeza é como a influência de Mercúrio:
boa, se unida a outro planeta bom, má, se ligada a um planeta mau. Não é
tanto a tristeza em si como o é a base e a fonte da tristeza. O motivo dela é que
deve chamar a atenção. A tristeza era nula em Judas, sincera em Pedro, foi
nula em Saul, sincera em Davi. Mundana em um, divina em outro - "A tristeza
do mundo opera a morte ". E tal é toda tristeza que não tem o pecado como seu
fundamento, a graça como seu princípio e Deus como seu fim.
Onde o pecado é entendido como sendo o ma ior mal, será objeto da
maior tristeza, tristeza para exceder todas as outras tristezas.
1. Embora nem sempre em quantidade c tamanho, mas em qual ida de
e equivalência: um pouco de ouro vale tanto quanto unia grande quantidade
de terra e entulho.
2. Embora não em força - porém em extensão e continuidade -outras
tristezas são como terra inundada, ocasionada pela tempestade a qual quando
se vai, a inundação desaparece. Esta tristeza divina vem de um manancial, e
tendo uma fonte para alimentá-la, é permanente mesmo quando a outra se
vai. Esta é a diferença entre a tristeza divina e a outra.
As tristezas do povo de Deus, que são espirituais, vêm de um
manancial. A tristeza mundana surge da tempestade, da comoção. As tristezas
do ímpio surgem de suas tristezas emocionais, surgem de uma tempestade, de
peso na consciência, de temor da ira, portanto suas tristezas mundanas
surgem de uma fonte.
Onde o pecado é compreendido como sendo o maior mal, haverá a
maior tristeza, (1) a tristeza é proporcional à medida e gravidade do pecado e
(2) a tristeza é proporcional ao merecimento e valia do pecado.
Como o merecimento do pecado é infinito, então a tristeza por ele deve
ser uma tristeza infinita. Infinito, digo, não em ação e expressão, porém no
desejo e afeição da alma. Aquele cujo coração e olhos secam ao mesmo tempo,
cuja expressão em lágrimas e inclinação à tristeza terminam ao mesmo tempo,
embora tenha chorado um mar de lágrimas, não tem ainda verdadeiramente
chorado pelo pecado. Se a tristeza vem de Deus, há uma disposição ao
lamento mesmo quando cessam as expressões de lamento, porque cada gota
de lágrima vem de uma fonte interior de lágrimas.
Como cada ato de fé surge de uma disposição de crer, um hábito de fé
interior, todo ato de amor surge de um princípio de amor interior, assim toda
expressão de tristeza surge de uma disposição à tristeza no espírito. Por isso
lemos em I Sam. 7:6 que as tristezas dos filhos de Israel são expressas por esta
metáfora:"... e tiraram água (vinda de um poço) e a derramaram perante o Senhor
". Seus olhos não davam vazão à medida que seus corações se enchiam. Seus
olhos não podiam extravasar tão rápido quanto seus corações produziam.
Todas as suas expressões de lamento, estavam aquém da disposição ao
lamento que havia em seus corações.
Esta é a tristeza pelo pecado: uma tristeza proporcional à medida, ao
demérito do pecado; uma tristeza que excede todas as outras tristezas, embora
não em quantidade, mas em qualidade; embora não em força, porém, em
extensão e continuidade.
O pecado é o supremo mal? Então exige que seja manifestada uma
aversão ainda maior. Nada é propriamente o objeto de aversão a não ser o
mal, no entanto, nem todos os tipos de males, e sim o mal do pecado. Males
puníveis são mais objetos de medo do que de aversão, porque eles são males
impróprios. Nada realmente é mal a não ser o que nos torna maus, e esse pode
ser um meio de nos tornarmos bons e, por isso, não é propriamente mal e sim
um objeto de aversão.
O mal pecaminoso é objeto de inimizade por que é mal e, sendo o maior
dos males, deveria então ter o máximo de nossa aversão." Vocês que amam o
Senhor, odeiem o pecado. (Sal. 97:10). Não é suficiente ficar irritado e descontente
com ele, pois é assim que o homem age com alguém que seja seu amigo,
alguém a quem ele ame, no caso de alguma descortesia. Nem é suficiente
desferir golpes contra o pecado, pois assim muitos o fazem hoje e o abraçam
amanhã. Entretanto, vocês precisam se esforçar para matar o pecado. O ódio
procura anular aquilo que ele odeia. Nada a não ser a destruição dele irá
satisfazer a alma que realmente odeia o pecado.
Há muitos erros nos homens com relação à este ponto. Em resumo, eu
mostrarei a vocês os enganos secretos do espírito em relação a isso e quão
longe estão de odiar o pecado.
1. Um homem pode desavir-se com um pecador pelo qual ele foi
persuadido a pecar, e ainda assim não odiar o pecado; pode matar o traidor e
ainda gostar da traição.
2. O homem pode desavir-se consigo mesmo pelo pecado e ainda assim
não odiá-lo quando este o incomoda, pois ele gosta de pecar.
3. O homem pode indispor-se com o pecado e ainda assim não odiá-lo;
atira fora o carvão em brasa quando ele o queima, e ainda assim não se
contraria com o negrume ou a sujeira que vem dele.
Se o pecado é o maior mal, então isso requer o maior cuidado para
evitá-lo. Os homens naturalmente têm medo de cair no mal. Que estudos, que
cuidados, que esforços há para prevenir o mal? Se vocês entendem que o
pecado é o maior mal, devem então não medir esforços em evitá-lo. Vocês
precisam se esforçar para andarem o mais próximo e corretamente com Deus,
a fim de estarem atentos a todas as ocasiões, tentações e seduções que
poderiam atraí-los para o pecado. Ninguém está totalmente seguro; pode cair
em pecado aquele que negligenciar a vigilância cristã.
Assim, onde o pecado é entendido como sendo o maior mal existirá
maior cuidado e seriedade contra o pecado. Tal homem é familiarizado com as
falhas dos outros, as quais para ele não são limites da terra para orientá-lo, e
sim limites da maré e rochas a evitar. Ele é familiarizado com a fraqueza e a
iniqüidade de seu próprio coração e espírito, e por conseguinte vigia. Ele sabe
que não pode confiarem nenhum dos seus membros sem que esse esteja
debaixo de vigilância.
Os olhos estão cheios de pecado: adultério, orgulho, inveja, concu-
piscência dos olhos (I João 2:16) e ele não pode confiar em seus olhos sem o
pacto de Jó: "Fiz um concerto com meus olhos, como eu os colocaria sobre uma
virgem ? (Jó 31:1).
A língua está cheia de pecado: de maldição, murmurações, injúrias,
palavras vãs e não há confiança nela sem o freio de Davi: Eu disse: guardarei os
meus caminhos para não delinqüir com a minha língua" (Sal. 39). Ele conhecia sua
própria fraqueza e iniqüidade, e por isso não ousava confiar em nenhum
membro sem ser vigiado.
Tal homem está familiarizado com o poder e estratégia de satanás, que
é, como Lutero o chamou, um inimigo sutil, cujas tentações são chamadas de
"as profundezas de satanás". Apoc. 2:24; seus ardis, II Cor. 2:11, seus métodos
Ef. 4:14. Ele também adapta espertamente suas tentações.
Tal pessoa está familiarizada com os perigos e as estratégias do pecado,
e como ele é (1) enganoso em seu objetivo; (2) enganoso em seus argumentos;
(3) enganoso em suas pretensões e artimanhas; (4) enganoso em suas intrusões
e (5) enganoso em suas promessas. E assim tal pessoa manterá uma santa
sobriedade, um temor humilde, grande e cuidadoso sobre seu próprio espírito
de modo a não cair em pecado. Ele vê o pecado como seu mal sem par,
emprega seu maior esforço e cuidado para evitá-lo.
Se o pecado é o maior mal, então devemos principalmente nos
empenhar em nos livrar do pecado. Todo homem deveria se esforçar para
livrar-se do mal, e quanto maior o mal, tanto maior deveria ser o desejo dele
de se livrar desse mal. Ora, o pecado é o maior dos males. Quanto mais então
deveríamos labutar e esforçarmo-nos para sermos libertos do maior dos
males?
Ai, ai de mim! O que são os outros males comparados ao mal do pecado
- o qual torna nosso bem em mal? E ainda para se ver a vileza do íntimo dos
homens, ficam felizes em se livrar de todos os outros males, senão o do
pecado. Assim disse Faraó: "Retire esta morte, esta praga." Eles reclamam do
resultado do mal, porém não do mal em si, da punição do mal, no entanto não
do mal punido. Eles uivam sob os castigos e aflições presentes, mas nunca
lamentam o pecado. Eles ficariam felizes em se livrar da dor, todavia ainda
prefeririam manter os dentes. Infelizmente, até que o pecado seja removido,
não seremos tratados em misericórdia, e sim em julgamento; uma temporária
libertação somente nos reservaria o mais severo golpe. Pelo contrário, onde o
pecado é removido, a aflição será removida. Eles são como o corpo e a
sombra: remova o corpo e a sombra será removida. O pecado é o corpo e as
aflições são sua sombra.
Se, por outro lado, as aflições continuam, ainda que Deus tenha levado
embora o pecado, a vileza do mal terá sido retirada. O pecado é a lança de
toda aflição. O pecado é aquilo que amarga toda cruz, e o pecado sendo
retirado, aquilo que é malévolo é retirado e aquilo que é terapêutico e para a
salvação, permanece. Trata-se de resultados mais do que da punição em si.
Tudo acaba na misericórdia quando pela misericórdia o pecado é retirado.
Se o pecado é o maior mal, então vamos escolher cair em qualquer
grande mal do mundo, exceto no menor mal do pecado. Todos os outros
males têm algum bem neles e são objetos de escolha, no caso de não podermos
evitá-los, mas no caso do pecado é questão de admissão e não de escolha.
Desse modo, vejamos o que Moisés fez, como se lê em Hebreus, capítulo onze.
Ele preferiu ser maltratado com o povo de Deus do que gozar os prazeres do
pecado por um pouco de tempo. Todavia o pecado é totalmente mau, sem
nenhum bem nele, e não existe nada no mundo que deveria nos obrigar a
escolher o pecado.
Seria o pecado o maior mal? Deixemos que isso nos leve a sentir
compaixão e a orarmos por aqueles que estão sob o domínio do pecado. Vocês
se compadecem de amigos doentes, de amigos pobres, amigos arruinados.
Contudo, o que são todos esses males comparados com o mal do pecado? O
que é a pobreza? O que é a doença? O que é qualquer coisa comparada com o
mal do pecado? Todos eles são males exteriores, o pecado é um mal interior.
Tudo isso tem uma natureza temporal, a morte é o fim de tudo, entretanto este
mal é de natureza eterna. Todos os outros males não tornarão ninguém em
objeto da inimizade e ira de Deus. Portanto, gastem algumas lágrimas e
orações por aqueles que estão dominados pelo pecado. "Oh!", disse Abraão:
"Quelsmaelviva diante de ti". Mencionem então os amigos, um irmão, um pai,
etc., que estão debaixo do domínio do pecado, que estão sob a tirania do
pecado. Oh, que vocês possam compadecer-se de suas almas! Oh, que vocês
possam arrebatá-las do domínio do pecado!
Se o pecado é um mal tão grande, então prostremo-nos e admiremos a
grandiosidade da paciência de Deus em suportar os pecadores e a grandeza
da misericórdia de Deus em perdoar o pecado. Admiremos a grandeza da
paciência de Deus em suportar os pecadores. É possível que você, amigo,
tenha sido um pecador depravado, um beberrão,umblasfemomiserável nesses
vinte, trinta, quarenta, talvez sessenta anos ou mais. Deus desistiu de você?
Oh, veja nisso a maravilha da paciência de Deus.
Se não fosse por Deus ser Todo-poderoso na extensão da Sua paciência,
teria sido impossível para Ele suportá-lo por tanto tempo. Assim Ele nos fala
em Os. 11:9: "Eu sou Deus e não homem — eu entrareina cidade para destruí-la ".
EmMal. 3:6 -."EusouJeováe não mudo; por isso vós, ofilhos de Jacó não sois
consumidos ", significando que se Ele não fosse Deus, se não fosse Todo-
poderoso na extensão de Sua paciência, eles teriam sido certamente
eliminados muitos antes.
Se o homem é provocado diariamente e irritado com ofensas e não
revida, atribuímos isso à sua pusilanimidade ou à sua impotência; ou à sua
falta de coragem ou à sua falta de poder. Mas não é assim com Deus. Sua
paciência é o Seu poder (Num. 14:17-18). Quando Deus tinha ameaçado
destruí-los Moisés orou a Deus para perdoá-los, e chamou este ato de Sua
paciência nada menos que Seu poder: "Agora, pois, rogo-te que a força do meu
Senhor se engrandeça; como tens falado, dizendo: o Senhor é longânimo... " Vejam,
Ele faz Sua paciência ser Seu poder. E é isso realmente, se vocês considerarem
o que é o pecado. Eu não direi nada mais sobre o assunto além do que Deus
diz em Lev. 26:21 - pecar é contrariar Deus.
1. Pecar é contrário às obras de Deus. Tão logo que Deus revelou e
aperfeiçoou o sistema do mundo, o pecado deu um golpe na tentativa de
abalar esse sistema, e ele gostaria de ter feito tudo em pedaços. Se não fosse
pela promessa de Cristo, tudo teria se desintegrado.
Se um homem viesse ao atelier de um artesão e com um golpe
quebrasse em pedaços a peça de arte que custou muitos anos de estudo e
dores para idealizá-la, como o artesão suportaria isso? Assim fez o pecado, e
será que Deus deveria suportá-lo? Oh, onipotente paciência!
2. E ainda mais, tudo isso é contrário à natureza de Deus. Ele é santo, o
pecado é obsceno; Deus é puro; o pecado é impuro e, por isso, é comparado
ainda à coisa mais impura do mundo: o veneno de áspides, úlceras, feridas,
etc. Se toda a contaminação nociva do mundo se concentrasse em um antro
comum, não seria igual à contaminação do pecado.
Deus é bom, perfeitamente bom; o pecado é mau, universalmente mau.
Existe o bem em todas as outras coisas, pragas, doenças. O inferno em si tem
um tipo de bem nele. Mas no pecado não. Pecado é a blasfêmia prática do
nome de Deus. É o desafio à Sua justiça, a violência à Sua misericórdia, o
zombar de Sua paciência, o desrespeito ao Seu poder, o desacato ao Seu amor.
É totalmente contrário a Deus.
3. O pecado é contrário à vontade de Deus. Deus nos ordena a fazer
algo. O pecado diz: "Eu não vou fazer isso". "Santificado seja meu sábado", diz
Deus. "Eu não o santificarei", diz o pecado. Aqui há contradição, e quem pode
suportar a contradição?
Isso é considerado como parte importante dos sofrimentos de Cristo
(Heb. 12:3). Ele suportou a contradição dos pecadores contra Si mesmo.
Certamente esse foi um grande sofrimento. Como pode um homem sábio
suportar a contradição de um tolo? É aqui que Cristo -a sabedoria do Pai -
suportou tal contradição dos tolos, a qual Lhe causou grande sofrimento.
O pecado contradiz Deus. Ele põe a vontade contra a sabedoria e o
inferno de uma vontade corrupta contra o céu da infinita sabedoria.
Imaginem! Deus suportando pecadores. Eis a maravilha!
Vocês sabem que em todas as criaturas a oposição opera toda a
combustão. Ela faz toda a guerra na natureza, ela provoca um elemento para
brigar contra outro. Fogo contra água, água contra fogo. Ela faz as muitas
pedras suarem e partir em pedaços.
Percorram toda a criação e não encontrarão nenhuma criatura que possa
suportar ser contrariada. Como pode o pecador viver num mundo onde Deus
e o pecado estão em oposição? Eis aí a maravilha: uma extraordinária
paciência!
O pecado seria um mal tão grande? Então prostremo-nos, e admiremos
a grandeza da misericórdia de Deus em perdoar o pecado. Vejam como o
profeta clama e o admira: "Quem, ó Deus, é semelhante a ti, que perdoas a
iniqüidade, e que te esqueces da rebelião do restante da tua herança?... " (Miq. 7:18).
Esta é uma das maiores obras que Deus faz no mundo: perdoar o
pecado. É uma obra na qual Ele revela todos os Seus gloriosos atributos: Sua
sabedoria, Seu poder, Sua justiça, Sua misericórdia, Sua santidade e assim por
diante, ao perdoar o pecado.
Os homens que pensam que a misericórdia perdoadora de Deus é
simples e sem importância, dão dessa forma um sinal evidente de que nunca
receberam perdão, nunca souberam o que era realmente receber o perdão.
Seja houve alguma obra no mundo que pôs Deus à prova, o perdão foi
essa obra. E se algum dia Deus intentou algo de bom para você, Ele o instruirá
e o orientará quanto ao perdão do pecado. Entretanto, Deus humilha os
homens em sua prestação de contas para elevar o conceito deles sobre o
perdão, para promover a grandeza de sua própria misericórdia em perdoar o
pecado. E realmente não precisaríamos de tão grandes preparações e
humilhações ao virmos para Cristo se tivéssemos pensamentos mais elevados
sobre o perdão do pecado. Os homens consideram perdão aquilo que não
passa de um lamento: "Deus, tenha misericórdia!" Cometem uma blasfêmia e
então dizem: "Deus, me perdoe!" ou dizem: "Senhor tenha misericórdia de
mim quando eu morrer!"
Dizem que Luiz II, rei da França, usava um crucif i xo em seu chapéu e
quando ele pecava, beijava o crucifixo e então tudo estava resolvido. Os
papistas fizeram o mesmo com o crucifixo e a confissão. Ah, meus irmãos, se
Deus destinou o bem para vocês, Ele os fará saber o que é perdão. Em Is. 55:8,
quando Deus atraiu os homens para mostrar-lhes o perdão, Ele os chamou
para um lugar alto acima do mundo "... meus pensamentos não são os vossos
pensamentos, nem os vossos caminhos os meus caminhos ", diz o Senhor. "Se eles
fossem, então Eu não poderia multiplicar o perdão, mas como os céus são
mais altos do que a terra, assim são os Meus pensamentos mais altos do que
seus pensamentos, e Meus caminhos mais altos do que seus caminhos. Eu sou
infinito".
Se a misericórdia criadora de Deus é tão grande, como Davi com dupla
admiração declarou no Sal. 8:1 e no último versículo: "O Senhor, Senhor nosso,
quão admirável é o teu nome em toda a terra, pois puseste a tua glória sobre os céus "
o que dizer então de Sua misericórdia perdoadora?
Finalmente, seria o pecado um mal tão horrendo? Então vejam que
motivo temos para humilhar nossas almas diante de Deus neste dia devido
termos pensamentos tão superficiais sobre o pecado, e desde que Deus tem
classificado o pecado como o maior de todos os males. Que pensamentos
levianos temos do pecado? Podemos engoli-lo sem medo, podemos viver nele
sem percebê-lo, podemos cometê-lo sem remorso. Tudo isso mostra a
superficialidade dos nossos pensamentos sobre o pecado. Não avaliamos o
pecado como sendo um mal tão grave como realmente ele é.
Agora, para que vocês possam ter conceitos mais adequados sobre a
magnitude dele, para que sejam capazes de ver o pecado como algo
excessivamente maligno, irei apresentá-lo resumidamente sob seis aspectos.
1. Olhem para ele sob o prisma da natureza a qual, embora seja um
cristal pouco transparente, é um refletor autêntico. O pecado tem ofuscado
essa lente, ainda assim ela é capaz de revelar-nos muito do mal do pecado.
Mesmo os pagãos têm visto e julgado por eles mesmos, muitos pecados como
sendo o maior dos males.
Embora os pecados espirituais fossem ocultos a eles, sua luz não era
capaz de descobrir a infidelidade e os pecados íntimos. Todavia eles têm
descoberto os pecados morais, e os evitado, e prefeririam correr o risco de
sofrer do que cometer tais pecados. Os exemplos de Platão, Cipião, Catão, e
muitos outros irão elucidar isso. Tudo isso foi descoberto pelo prisma da
natureza, feito por ela própria, porém não pela mera natureza caída, e sim
pela natureza bem administrada, pela natureza desenvolvida, pela
implantação de princípios morais juntamente com a graça restringedora e de
outros dons comuns do Espírito.
O grande ódio que sentem pelo pecado, o grande cuidado que têm para
evitá-lo, o grande sofrimento que experimentam por não quererem cometer
pecado, deveriam ser suficientes para revelar-nos quão grande é o mal do
pecado - mas interromperemos o assunto aqui.
2. A segunda lente pela qual vocês podem ver até onde vai o pecado é a
lente da lei, a lente que revela o pecado em todas as suas dimensões: a culpa, o
demérito, a corrupção e a malignidade do pecado. Portanto, o apóstolo diz em
Rom. 7:7 "... mas eu não conheci o pecado senão pela lei..." Isto é, eu não teria
conhecido o pecado como sendo tão abominável quanto ele o é, eu não teria
conhecido o pecado em sua amplitude e latitude. Eu não teria conhecido a
gravidade do pecado se não tivesse sido pela lei, se a lei não tivesse sido a
lente para revelar o pecado a mim.
Ela revelou a grandeza do pecado para Davi: "A toda a perfeição vi limite,
mas o teu mandamento éamplíssimo " (Sal. 119:26), isto é, por revelar a extensão
do pecado em proporção a sua amplitude e grandeza.
Que lástima! Isso irá revelar a vocês mais nudez num pecado do que o
mundo todo pode cobrir, mais indigência num pecado do que todos os
tesouros da justiça disponível são capazes de suprir; mais obliqüidade e
injustiça num pecado, num pensamento errado, do que a morte de todos os
homens e o extermínio dos anjos seriam capazes de expiar.
Procurem na lei e vocês descobrirão milhares de pecados que caem sob
toda e qualquer lei de Deus. Eis aqui a lente!
3. Olhem para o pecado sob a lente das dores, feridas penetrantes e
tristezas, as quais os santos encontraram em seu acesso e primeira entrada no
estado de graça, em suas reincidências e retornos à insensatez.
Para o primeiro, vejam que gemidos e humilhações tiveram que
suportar em sua primeira admissão ao estado de graça - Manasses em II Crôn.
33:12, Paulo em Atos, capítulo nove, os judeus convertidos em Atos 2:37 -
admissão semelhante à ocasião quando os pregos perfuraram Cristo, agora
cravados em seus corações como a lança no lado de um animal.
Quantos dos muitos santos que já existiram estiveram presos num leito
de miserável angústia, acamados sob os golpes da justiça possi velmente por
muitos anos, e tudo isso por causa do pecado. Em todas as épocas houve
milhares de exemplos dessa natureza.
Olhem para as angústias e quebrantamentos que os santos t i veram
quesuportar por causa de suas reincidências no pecado. Vejam nos em Pedro e
em Davi. Leiam as tristes expressões que ele tem no Sal. 6:1-7 e no Sal. 32:3-5.
Do mesmo modo no Sal. 51. Como ele lamenta pela sua alma perturbada, seus
ossos quebrados, seus olhos consumidos pela tristeza, sua cama está
encharcada com lágrimas! E tudo isso por causa do pecado. Aqui está a lente
pela qual pode-se ver o mal do pecado como sendo o maior mal. Sim, quando
Deus o enfoca, o menor pecado resultará em tudo isso.
4. Olhem para o pecado em Adão e vejam a extensão dele. Aquele único
pecado de Adão trouxe todas as misérias, doenças, morte e outras desgraças,
sobre toda a sua posteridade desde aquele tempo. O pecado tem sido a
maldição de milhares de homens e ainda continua sendo. A justiça de Deus
ainda não foi satisfeita. Se ela tivesse sido, haveria um fim. Não morreríamos,
nem ficaríamos doentes jamais, etc. Oh, aqui vocês podem ver o pecado em
sua extensão!
5. Olhem para o pecado sobre Cristo. Vejam que humilhações, que
quebrantamentos, que feridas cruciantes, que ira isso trouxe sobre o próprio
Cristo. Foi isso que misturou aquele cálice amargo com ingredientes tão
terríveis, os quais, se tivéssemos que libá-lo quando assim estava temperado,
teriam colocado nossas almas debaixo de uma ira pior do que aquela que
todos os condenados sofremno inferno. Cristo suportou plena justiça por
causa do pecado.
Isso fez com que Ele que era tanto Deus quanto homem, santificado
pelo Espírito para essa missão, fortalecido pela Deidade, suasse gotas de
sangue, e até lutasse, parecendo recuar e orar contra a obra de Sua própria
misericórdia, querendo desistir do propósito de Sua própria vinda ao mundo.
Ah, ninguém sabe senão Cristo, nem é o finito entendimento humano
capaz de conceber, o que Cristo suportou quando estava para carregar o
pecado e com isso lutou contra a infinita ira e justiça do infinito Deus, os
terrores da morte, e os poderes do mundo vindouro. Aqui está uma lente pela
qual vocês podem ver a grandeza, a amplitude, a culpa, o demérito do
pecado, tudo o que é revelado ao indivíduo na morte, sofrimentos,
quebrantamentos e feridas do Filho de Deus.
Você, amigo, que despreza o pecado, vá para Cristo e pergunte a Ele
quão duro isso foi, aquilo que você despreza esmagou-O contra o chão. E o
menor pecado esmagaria você e todos os pilares do céu para o fundo do
inferno para sempre.
6. A sexta lente: olhem para o pecado na condenação eterna da alma,
que nada satisfaria à justiça de Deus a não ser a destruição da criatura. Nem
doenças, nem prisões, nem sangue, nem sofrimentos, a não ser os sofrimentos
do inferno! E esses não por um tempo, mas para sempre! Ah, vejam aqui a
enormidade do pecado, o qual poderia ser ainda mais ampliado
considerando-se a preciosidade da alma, a qual o pecado arruina por toda a
eternidade. E portanto, vocês conheceriam o pecado? Perguntem aos
condenados: o que é pecado? Volvam seus ouvidos ao inferno e ouçam todos
aqueles berros, aqueles gritos, aqueles rugidos dos condenados, e tudo isso
por causa do pecado. Oh, eles foram os prazeres custosamente comprados, os
quais precisam ser conseqüentemente pagos com dores sem fim.
Assim através destas lentes vocês vêem o que é o pecado. E por
conseguinte como devemos ser humilhados por causa de nossa indiferença
em relação ao pecado, o qual é um mal tão grande!
APLICAÇÃO
(1)
Então, se é assim, vejam a necessidade que temos de enfatizar
sobremaneira o pecado em nossas confissões, pois tudo o que podemos dizer
dele será infinitamente deficiente diante da gravidade do pecado. Vocês não
podem tornar o pecado mais grave do que eleja é, elevá-lo acima dele mesmo.
Vocês não podem ter lentes de aumento para tornar o pecado maior do que
eleja é. Vocês têm tais lentes para aumentar o tamanho dos objetos, as quais
são capazes de apresentar pequenas coisas como sendo grandes, ampliando-as
em seu tamanho, mas não têm lentes para multiplicar o pecado e fazê-lo
parecer maior do que ele já é.
Os sofrimentos e as tristezas dos santos, os sofrimentos dos condenados
em relação ao pecado são diminutos. A lente da lei, a lente dos sofrimentos de
Cristo, (o qual é a maior de todas), essas não mostram o pecado maior do que
intrinsecamente ele é, elas somente revelam o pecado em suas exatas
proporções e dimensões.
Não teria sido justo se Deus requeresse mais sangue e colocasse Seu
próprio Filho sob maior sofrimento do que o pecado merecia. Porventura seria
condizente com o amor de Deus, Sua piedade e misericórdia para com Seu
Filho, expô-lO além daquilo que o pecado merecia? Embora haja mais do que
suficiente misericórdia para os maiores pecadores, como o apóstolo diz em I
Tm. 1:14, não houve mais do que justiça suficiente aplicada em Cristo pela
ofensa e culpa do pecado.
A morte de Cristo foi um resgate adequado de nossas almas do pecado,
e ainda haveria um excesso de mérito, uma superabundância de mérito, na
satisfação de Cristo para resgatar milhares de mundos mais do que se
necessita resgatar. Como o pecado é infinito em relação a seu efeito, assim a
satisfação é infinita em relação ao seu mérito. Portanto, a morte de Cristo não
é somente considerado uma satisfação, mas uma aquisição; não somente um
pagamento, e sim uma compra.
A morte de Cristo é a plena satisfação da justiça de Deus pelo pecado, é
a aquisição de todas as coisas boas da misericórdia de Deus pela qual Sua
justiça, quanto ao valor e mérito da satisfação de Cristo, é ligado a nós
indiretamente.
Vejam, então, o que é necessário para acentuar sobremaneira o pecado,
porque não podemos multiplicá-lo ainda mais. Fazendo assim haverá muitos
frutos: (1) isso produzirá vergonha e contrição de espírito por causa do
pecado; e (2) isso fará vocês avançarem e apreciarem melhor a misericórdia.
Quando o débito parece pequeno, estamos prontos e aptos para
subestimar o perdão. No entanto, quando o pecado parece excessivamente
maligno, isso faz com que valorizemos a misericórdia e apreciemos o perdão.
Quando o pecado é visto como o maior mal, misericórdia e perdão serão
compreendidos como os maiores bens.
Isso nos coloca numa posição mais próxima de abandonarmos o
pecado. Como aquele que minimiza o pecado está decidido a permanecer
nele, aquele que realmente enfatiza o pecado deseja ficar livre dele. Além
disso, ficamos irritados conosco mesmos quando consideramos como temos
menosprezado a Deus. Isso produz auto-julgamento e auto-condenação como
vemos em Davi, no Sal. 51. Isso produzirá uma brandura espiritual e
compaixão de coração diante do pecado, porém tenho que deixar isso de lado.
(2)
Se o pecado é o maior mal, então é a maior misericórdia do mundo ficar
livre do pecado. Quanto maior o mal, maior é a misericórdia para se livrar
dele. Ora, o pecado é o maior mal. Portanto verão esse livramento como a
suprema misericórdia que vem através de Cristo: "E Ele se chamará JESUS,
pois, salvará seu povo de seus pecados ". (Mat. 1:21). Como se todas as outras
coisas vindas através de Cristo estivessem incluídas nesta, "Ele salvará seu povo
de seus pecados ". Ele não diz que salvará Seu povo do inferno, mas do pecado;
de nenhum outro mal no mundo, e esta é a maior misericórdia.
Quando Deus quis declarar-Se de forma suprema, ou mesmo expressar
Seu maior pensamento de misericórdia que jamais viera ao Seu coração,
quando Ele quis manifestar a maior obra da Sua misericórdia que ela haveria
de operar, Ele disse nada mais do que isto: "Ele salvará seu povo de seus pecados
". O pecado foi o mal máximo, e portanto, salvar-nos do pecado foi o maior
bem. E por isso Davi no Sal. 32:1-2, declara: "Bem-aventurado é aquele cuja
iniqüidade é perdoada, e cujos pecados são cobertos. Bem-aventurado é o homem a
quem o Senhor não imputa pecado ".
Na verdade, temos pensamentos insignificantes, pensamentos
mesquinhos sobre o perdão do pecado, e a razão é porque temos pensamentos
superficiais sobre o pecado. Entretanto, se Deus abrisse nosso entendimento e
nos fizesse ver a imensidade e a amplitude do mal do pecado, e se Ele juntasse
o sentido do tato ao da visão e nos fizesse sentir o que é o pecado; se Ele
deixasse a menor faísca de Sua ira cair sobre nosso espírito, por causa do
pecado, isso faria nossas faces cobrirem-se de carvão. Rapidamente
mudaríamos nosso tom e diríamos: "Oh, abençoados sejam para sempre todos
aqueles cuja iniqüidade é perdoada e cujos pecados são cobertos."
Contudo, a fim de que eu não pareça como que desferindo golpes no ar,
iremos circunstanciar essa misericórdia um pouco e vocês verão a grandeza
dela - embora, realmente, fosse suficiente dizer a vocês que o pecado é o maior
mal. Portanto, necessariamente se segue que estarmos livres do pecado é a
maior misericórdia no mundo, a qual se tornará mais claro se considerarmos
as seguintes particularidades.
Primeiro, então, o perdão do pecado é a misericórdia mais
custosamente adquirida e isso é algo para mostrar a grandeza dela. Vocês
sabem, quanto maior for a soma que deve ser paga pela compra de uma coisa
(contanto que não exista falta de sabedoria do comprador ou nenhuma
desonestidade no vendedor), ainda maior, e mais valioso é o bem comprado
ou adquirido. Portanto essa misericórdia, o perdão do pecado, foi a
misericórdia mais custosamente adquirida. Isso custou sangue, segundo Mat.
26:28. Vejam também: "Porque é impossível que o sangue dos touros e dos bodes tire
os pecados'',, como diz o escritor em Heb. 10:4.0 sangue significa isso então?
Trata-se do precioso sangue de Cristo: "Sabendo que não foi com coisas corrup-
tíveis, como prata ou ouro, quefostes resgatados da vossa vã maneira de viver que por
tradição recebestes dos vossos pais, mas com o precioso sangue de Cristo, como de um
cordeiro imaculado e incontaminado".(IPed. 1:18-19). "E este, o sangue de Deus:"...
Para apascentardes a igreja de Deus, que ele resgatou com seu próprio sangue." (Atos
20:28).
Agora sentem-se e imaginem que grande misericórdia deve ser esta
equivalendo ao preço de sangue, e este do Filho de Deus. Não havia nenhuma
falta de sabedoria no comprador, Ele não podia ser ludibriado, Ele conhecia o
valor do bem. Nem houve falta de justiça ou bondade do Vendedor. Ele foi
justo e não aceitaria unia gota de sangue a mais do que o bem valia. Ele
também era Pai e não exporia a Seu Filho a maiores sofrimentos além
daqueles que o bem merecia.
Essa misericórdia é mais pura do que todas as outras, o perdão do
pecado, uma misericórdia que vem do coração e da boa vontade de Deus para
com vocês. Deus pode dar-lhes todas as outras coisas e odiá-los. Vocês podem
ser ricos e ainda assim ser reprovados, grandes no mundo presente e malditos
no porvir. Dives pôde ter riqueza, Herodes eloqüência, Saul autoridade,
Agripa vestes gloriosos; um homem pode agir perversamente e ainda assim
prosperar. Essas coisas não são realmente boas ou realmente más. Se boas, os
ímpios não devem tê-las, se más, os santos não devem possuí-las. Essas são
coisas que Deus estende das Suas mãos, não de Seu coração. Esses são favores
gerais, não amor especial. Mas eis aqui um favor especial, peculiar aos santos,
misericórdia pura, a misericórdia que vem das entranhas da misericórdia, do
coração da misericórdia.
Esta é a misericórdia mais autêntica que todas as outras, o perdão do
pecado. Não houve nada para obrigar Deus a fazer isso, nem houve nada que
pudéssemos fazer para adquiri-la. Todas as nossas orações, nossas lágrimas,
nossas obras, não poderiam comprar o perdão de um pecado sequer. Não
poderíamos comprá-lo se dependesse do que fazemos e se dependesse do que
sofremos, nem se pudéssemos sofrer tanto quanto todos os santos sofreram
desde o começo do mundo até hoje.
Se pudéssemos chorar tantas lágrimas quanto o mar possa conter, se
pudéssemos nos humilhar tantos dias quantos o mundo já passou desde o
momento da criação, tudo isso seria muito pouco para comprar o perdão de
um único pecado, ainda que fizéssemos tudo isso sem pecado.
No entanto, que lástima! Tudo o que podemos fazer está tão longe de
cancelar qualquer dívida culposa do passado que, ao contrário, nos torna
ainda mais endividados. Tão longe estamos de adquirir o perdão que o que
fazemos será aumentar a insubordinação. Não precisamos trabalhar para
sermos justificados, porém somos justificados para que possamos trabalhar.
De modo que é a misericórdia mais gratuita. E por conseguinte, nas Escrituras
lemos que isso tudo é atribuído à graça. "Para que, sendo justificados pela sua
graça " (Tito 3:7); "Deus justifica o ímpio. " (Rom.3:24). Não há motivo em nós,
tudo vem de Deus. E verão isso claramente em Is. 43:23-25: "... não me
compraste por dinheiro, cana aromática, nem com a gordura dos teus sacrifícios me
enchestes, mas me deste trabalho com os teus pecados, e me cansaste com as tuas
maldades. Eu, eu mesmo, sou o que apaga as tuas transgressões por amor de mim, e
dos teus pecados me não lembro ".
Poderia o homem ter esperado isso? Isso mostra espontaneidade não
somente quando não a merecemos, porém quando merecemos exatamente o
contrário: "... E me cansaste com tuas maldades... " Oh, infinita e livre
misericórdia! Deus é misericordioso somente porque Ele quer ser
misericordioso.
Esta é uma misericórdia outorgada, uma misericórdia que outorga a
vocês um bem maior do que sou capaz de expressar ou do que vocês são
capazes de conceber. Esta é a misericórdia que os envolve em todas as outras
misericórdias. Isso outorga-lhes todos os bens sobre a terra, toda a glória do
céu. Esta é a misericórdia produzindo misericórdia, a misericórdia que faz
com que todas as outras coisas sejam misericórdia para vocês.
Coisas boas são misericórdias. Tudo que vocês possuem - riquezas,
grandeza, posses, maridos, esposas, crianças, e tantos outros bens; todas essas
coisas não são bênçãos enquanto não associadas ao perdão, o que faz delas
bênçãos. Não, não somente boas coisas, e sim as coisas más também são
misericórdias para vocês. O perdão do pecado faz a pobreza, a aflição, a
doença, e mesmo a morte em si uma misericórdia. Semelhante ao chifre do
unicórnio, o perdão tira a malignidade e o veneno de toda água. Como a
pedra do filósofo, isso transforma tudo em ouro. Como disse o apóstolo:
"Todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus. " Uma cruz
santificada é melhor do que um conforto não santificado. A perda na
misericórdia é melhor do que o deleite na ira.
Vocês nunca serão capazes de tornar bom aquilo que Deus concede em
misericórdia, até que o pecado seja perdoado. A culpa do pecado sobre nós
muda a natureza das coisas, e f az com que aquelas coisas que são boas em si
mesmas sejam um mal para nós.
Esta é uma misericórdia irrevogável. Deus pode dar outras miseri-
córdias e retirá-las novamente. Na verdade, outras coisas são mais
emprestadas do que dadas: marido emprestado, mulher emprestada, etc.
Portanto elas são chamadas de talentos em suas mãos e somos mordomos
delas por um tempo. Deus pode retirá-las quando desejar ou podemos ser
privados delas e perdê-las.
Quão freqüentemente somos privados e perdemos coisas boas por
causa do nosso caminhar indigno no prazer que elas proporcionam! "Portanto,
tornar-me-ei, e a seu tempo tirarei o meu grão, e o meu mosto no seu determinado
tempo... " (Os. 2:8 Tudo isso era de Deus, e vocês saberiam qual a razão dlile
em retini las? Vejam o versículo citado acima. Eles não reconheceram Deus
como sendo o doador delas, mas atribuíram nas a Baal como se fosse ele que
as tivesse dado.
Ora, esta misericórdia é irrevogável, uma misericórdia que Deus nunca
retira, uma misericórdia da qual Ele nunca Se arrepende. Os dons e os favores
de Deus são sem arrependimento, e esta é a misericórdia que jamais será
perdida.
Podemos perder o senso de perdão, podemos perder o conhecimento
do perdão, assim como foi com Davi, porém jamais poderemos perder o
perdão. Se toda esta presciência não pôde impedir Deus de dar o perdão, nem
tampouco pode fazer com que ele Se arrependa do perdão quando já o tem
dado.
A estabilidade da misericórdia é aquilo que confere maior valor a ela. Se
as coisas que são más são intensificadas em relação à continuidade,
estabilidade e durabilidade delas, muito mais as coisas que são boas. Então
esta é uma misericórdia estável. Vejam a seguinte referência: "Porque isso será
para mim como as águas de Noé, pois jurei que as águas de Noé não inundariam mais
a terra: assim jurei que não me irarei mais contra ti, nem te repreenderei. Porque as
montanhas se desviarão, e os outeiros tremerão, mas a minha benignidade não se
desviará de ti, e o concerto da minha paz não mudará, diz o Senhor que se compadece
de ti. " (Is. 54:8-10).
Esta é a diferença entre a Aliança das Obras e a Aliança da Graça. Uma
é transitória, a outra é eterna. É uma aliança transitória, embora seja uma
regra eterna. A outra é eterna e imutável.
O perdão do pecado é uma misericórdia universal, o berço da
misericórdia, uma misericórdia produtiva. Todas as outras misericórdias
crescem sobre esta árvore do perdão do pecado. Esta é uma árvore, cuja raiz
está em Cristo, cujos frutos são todas as boas coisas sobre a terra e no céu. Há
sete frutos gloriosos do perdão do pecado os quais mencionarei antes de
expor a aplicação final.
1. Reconciliação com Deus (II Cor. 5:19), admissão ao Seu favor. Aquele
que antes era um inimigo se torna agora seu Amigo, pois, nada faz de Deus
um inimigo a não ser o pecado. E tal Amigo Ele é, que será um Amigo na
vida, um Amigo na morte - quando todos os outros o abandonarem - e
também um Amigo depois da morte.
2. Adoção de filhos, o que vem após nosso perdão na justificação.
3. Acesso a Deus como Pai com a intimidade de filho. O pecado era o
grande abismo entre Deus e nós. Agora, o pecado sendo perdoado, essa
parede divisória desmoronou e abriu-se o acesso a Deus, e acesso com
intrepidez.
4. Aceitação de nossas obras. Até que o pecado seja perdoado, não há
aceitação de qualquer obra. Até que sejamos aceitos e reconciliados, nossas
ações são abomináveis. Mas agora o pecado sendo perdoado, há aceitação de
todos as nossas obras. Ele toma o leite tanto quanto o vinho (Cant. 5:1) e come
favo com mel, etc.
5. Santificação de toda nossa condição, após o pecado ter sido removido
- o qual foi a maldição de tudo.
6. Sustentação sob cruzes após a remoção do pecado - o qual foi de
todos o mais pesado dos fardos.
7. Participação em todos os privilégios da Nova Aliança. Estes são os
inseparáveis frutos do perdão.
Há outros tais como paz, alegria, consolo (Rom. 5:1), os quais realmente
não são tanto frutos do perdão como frutos da certeza do perdão; não o
perdão em si, porém os mais indiretos frutos do perdão.
(3)
E finalmente, seria o pecado o maior mal no mundo? Oh, então, acima
de tudo neste mundo esforcemo-nos para nos livrar do pecado. Recebam o
perdão do pecado. Digam como Davi: "Oh! retira o pecado de teu servo ". Que
proveito terá o gozo de todas as outras boas coisas se seus pecados não são
perdoados? Que proveito teve Dives de sua riqueza? Ou Saul de seu reino?
Uma coisa a ser profundamente lamentada é ver quão ativos e séri os
são os homens sobre a remoção de outros males e na aquisição de outros bens,
porém ainda quão negligentes, quão superficiais eles são quanto a alcançar o
perdão do pecado.
Você, leitor, está sob a culpa do pecado. Permanece como um homem
ou uma mulher debaixo da condenação. Deus tem lhe dado tempo, e esse
tempo não é somente de alívio temporário, mas é um tempo em que Deus tem
permitido a você alcançar o perdão. E custou nada menos do que o sangue de
Cristo para alcançar você. Isso foi o que fez cessar os atos de justiça de Deus
contra você, senão já estaria no inferno há muito tempo. E irá desperdiçar esse
tempo? Negligenciará esta questão? Negligenciará tal perdão?
Se houvesse um homem condenado a morrer, cuja execução fosse
adiada para que pudesse procurar seu perdão, e se o rei estivesse disposto a
conceder-lhe perdão, você não acha que tal homem mereceria ter morrido,
desde que agora desperdiça seu tempo bebendo, festejando ou coisa parecida?
Ora, este é o seu caso.
Existe ainda um outro tipo de pessoas que buscam o perdão, no entanto
o procuram com indiferença. Eles o buscam formal, negligente e
superficialmente. Eles o buscam como se não tivessem nenhuma necessidade
dele, como se fossem bons o suficiente, embota necessitem perdão.
Há muitos que brincam com Deus sobre esta importante questão.
Muitos homens no mundo só fazem zombar de Deus sobre isso. Vou
enumerar cinco ou seis tipos de homens que são zombadores de Deus no que
diz respeito a este importante assunto, e mesmo eles não são os piores.
Todavia eu não vou falar agora das pessoas debochadas, e sim daquelas que
parecem fazer alguma coisa para obter perdão.
1. Os do primeiro tipo são: aqueles que buscam e talvez clamem
sinceramente, mas ainda continuam na prática de todos aqueles pecados para
os quais imploram perdão. Não estou falando agora de pecado, e sim de
pecados como, por exemplo, pecados habituais, pecados de enfermidade,
fraqueza e imperfeição na obediência. Estes, os melhores, apesar de suas
orações diárias por perdão, ainda caem em pecado freqüentemente.
Entretanto eu falo de pecados mais graves, pecados que ferem profundamente
a consciência. Zombar de Deus é uma coisa terrível.
O que vocês pensariam de um homem que deveria implorar o perdão e
ainda, antes que o perdão lhe fosse dado corresse para cometer novos atos de
traição? Esse é o seu próprio caso. Eu vejo muitos de vocês vivendo na
maldição do pecado: bebendo cerveja, bebida forte, praguejando. Estou
envergonhado só em mencioná-los.
Vocês oram por perdão? Ou não oram? Se não oram, vocês não são
melhores do que os ateus. Vocês oram por perdão e ainda vivem na prática
daqueles pecados pelos quais oravam? Oh, quão perigoso é brincar assim com
Deus!
Acaso vocês não vêem que barreira forte é contra o pecado, orar pelo
seu perdão? O quê? Vocês têm confessado pecado, humilhado suas almas por
causa dele, implorado perdão, e tão logo voltam suas costas para Deus e
retornam ao pecado? Ah, realmente esta é uma brincadeira perigosa!
Este é um terrível agravante do pecado. Vocês pensam que virá
resultado favorável sobre seus dias de humilhação por causa de suas orações
pelo perdão. Pensam que há algum bemnisso. Porquê? Vocês imploraram
perdão, embora tivessem pecado; ainda assim têm orado, e portanto esperam
que, apesar de seus pecados, Deus ouça suas orações. Todavia, vocês vivem
no pecado e confessam o pecado? Praticam-no, e ainda oram pelo perdão
dele? Vocês os cometem e ainda se humilham por ele? Oh, estes são grandes
agravantes do pecado. Estes adicionam mais peso a ele!
Vocês acham que seria um atenuante ou um agravante para o malfeitor
implorar perdão, e ainda correr para a mesma rebelião novamente? Ele
pensaria que seu pecado seria amenizado por que tem formalmente
implorado perdão? Não, certamente! Ele olharia para isso como um grande
agravante. Pois bem, esse é o caso de vocês!
E este, como podem ver, foi a posição de Israel que tanto desagradou a
Deus: "... Pai meu, tu és o guia da minha mocidade " (Jer. 3:4). Aquele povo disse a
Deus boas palavras, honrou-O com boas expressões, mas o Senhor disse: "...
Eis que tens feito coisas más, e nelas permaneces ", versículo 5.
2. O segundo tipo que brinca com Deus são aqueles que buscam o
perdão de alguns pecados, porém ainda continuam a amar e a simpatizar-se
com outros. Pode ser que vocês estejam aflitos e preocupados com alguns
pecados grosseiros, e implorem o perdão deles quando, possivelmente, exista
algum problema de corrupção interior, o qual vocês desprezem; alguma
obsessão secreta de maldade que seus corações repelem mas que não podem
deixar, pois, não têm intenção de desfazer-se dela.
Oh, leitor, homem vão! Você pode clamar toda sua vida e nunca se
tornará bom. Poderá orar tanto quanto queira. Aquele pecado, guardado com
amor e afeição, irá transformar todas suas orações em pecado. Deus nunca
ouvirá as orações de um pecador que se apega ao pecado. Vejam Sal. 66:18: "...
Se eu atender à iniqüidade no meu coração, o Senhor não me ouvirá" - embora eu
(Davi) nunca a pratique na minha vida.
Mas se você conhecesse o conteúdo da Aliança da graça e da
misericórdia, o rigor do evangelho e a severidade da misericórdia em si contra
o pecado, veria a impossibilidade de ter um pecado perdoado enquanto não
abandonar totalmente o pecado! Justificação e santificação, o perdão de Deus
e nossa renúncia, são de igual tamanho - tanto um quanto o outro. Assim
como Deus justifica da culpa do pecado, assim Ele santifica da corrupção de
todo pecado. A graça de Deus perdoa todo pecado, e a graça em nós faz com
que renunciemos a todo pecado. Onde o pecado é perdoado, então ele é
abandonado.
3. O terceiro tipo é o daqueles que buscam o perdão do pecado sem o
senso do pecado, que buscam perdão do pecado sem remorso pelo pecado;
homens que nunca estão preocupados com nenhum sentimento, com
nenhuma contrição de coração pelo pecado.
Porventura vocês não tomariam como brincadeira se alguém os
ofendesse em grande medida e desejasse seu perdão, sem mostrar sentimento
algum ou arrependimento? O que pensam que Deus fará?
Isso é certo, sem sangue não liá remissão de pecado, como diz o
apóstolo. Cristo foi ferido, e você, leitor, precisa ser ferido também, antes que
receba o perdão. Cristo sangrou, e a consciência precisa sangrar antes que Ele
conceda o perdão. Acaso um homem de boa fé imploraria o perdão sem nunca
ter sido ligado a perfídias, nem ter dado evidências de ser culpado disso?
4. O quarto tipo são aqueles que clamam por perdão, todavia n unca
aguardam por uma resposta. Você não acharia ser negligência se um homem
que lhe tivesse ofendido viesse e pedisse perdão, e tão logo que dissesse
algumas palavras a você voltasse-lhe as costas e fosse embora sem esperar sua
resposta?
Por que você se comporta assim com Deus? Você apresenta suas
orações porém não espera por respostas. Aquele que suplica em sinceridade
observará diligentemente aquela palavra de conforto que Deus dará, aquelas
consolações que Deus produzirá em seu espírito, e será grandemente zeloso
delas, como fizeram os servos de Benadade. (I Reis 20:31-33). Após terem
apresentado seu pedido, o texto diz: "Os homens tomaram isso por bom presságio,
e apressaram-se em apanhar a sua palavra ". Deveríamos fazer assim. Vir com
roupas de saco apresentar nossas orações com arrependimento, e assim sendo,
quando temos recebido respostas às nossas orações, devemos esperar para ver
queconsolaçõesreceberemosdocéu. Assim comoDavi: "Escutarei o que Deus o
Senhor disser; porque falará de paz ao seu povo, e aos seussantos". (Sal. 85:8). "Pela
manhã ouvirás a minha voz, óSenhor, pela manhã me apresentarei a ti e vigiarei".
(Sal. 5:3).
5. O quinto tipo dos que zombam de Deus são aqueles que não
acompanham suas orações com esforço para ter certeza de que seus pecados
foram perdoados; não examinam a Aliança da Graça, não se informam das
promessas da graça, não perscrutam a Palavra da Graça, não usam os recursos
da graça. Esses homens escarnecem quando deixam de fazer uso da Palavra,
das ordenanças, etc., como meios para obter a certeza do perdão.
A CONVERSÃO DE UM PECADOR
Explicado e Aplicado
"... convertei-vos, convertei-vos dos vossos maus caminhos, pois por que razão
morreríeis, ó casa de Israel? (Ezequiel 33:11)
Nathaniel Vincent
(Primeira edição: 1669)
A DEDICAÇÃO
À Tua sagrada e mais gloriosa majestade, Deus dos céus e da terra, REI
DOS REIS e SENHOR DOS SENHORES; que está muito acima dos mais altos
poderes e dos governos no mundo, do que estes estão acima de seus servos
mais insignificantes. Senhor Todo-poderoso, a Ti, a quem tenho me devotado,
dedico meu livro, tudo o que há de bom nele é Teu, e se ele trouxer algum
bem, a Ti dou todo o louvor. O escritor seria realmente envergonhado e
desencorajado se não soubesse que Tu podes operar tão bem tanto pelos
meios fracos quanto pelos fortes. Algumas vezes Tu escolhes o fraco com o
propósito de não permitir à carne gloriar-se, c sim que a excelência do poder
seja somente Tua.
Foi pela mais rica e voluntária graça de Deus - a qual a eternidade será
pequena demais para admirar e adorar que eu recebi a salvação, eu que uma
vez estive tão contaminado quanto qualquer outro; eu que andei tão longe no
caminho largo e pequei até estar bem próximo da destruição eterna! Todavia,
devido não ser somente um convertido, e sim também um instrumento usado
para converter outros, minha obrigação em manifestar Teu louvor é ainda
maior, embora já seja infinitamente grande.
Este é o desejo de minha alma, ó Senhor, que Teu reino seja estendido e
que o domínio usurpado pelo pecado e por satanás seja destruído. Sendo Teu
jugo tão suave e Teu governo tão doce e benevolente, por que não deveriam
ser numerosos Teus súditos? Cinja-te de Tua espada sobre Tua coxa, única e
Todo-poderoso! Cavalgue conquistando e para conquistar; que Tua mão
direita mostre Tuas maravilhas. Que Tuas flechas sejam aguçadas e Tua
Palavra penetrante como espada de dois gumes; que o mundo todo, quer pela
conversão quer pela subversão, mas especialmente pela conversão, se prostre
diante de Ti!
Tu és o Deus dos espíritos de toda a carne. Existiria alguma coisa difícil
para Ti? Quando Lúcifer pecou contra Ti (e com isso tornou-se o diabo) Tu
facilmente o expulsaste do céu e o agrilhoaste em cadeias nas trevas.
Porventura Tu não poderias facilmente tirá-lo fora dos corações daqueles
pecadores, os quais ele tem possuído completamente, e derrubar todas as suas
fortalezas? Sendo o pecado algo tão poderoso que Adão em sua inocência foi
vencido por ele, diante do qual nem mesmo os anjos do céu puderam
permanecer, ainda assim Tu és capaz e prometeste subjugá-lo. Oh, mostre Teu
poder e Tua graça!
Já que Tua misericórdia é tão grande, por que deveriam ser tão poucos
os participantes dela? Visto que Teu Filho é capaz de salvar até os mais
ímpios, por que deveria ser tão pequeno o número de salvos por Ele? Posto
que a nova Jerusalém é tão ampla, por que o inferno deveria se encher tão
rapidamente? Oh, que Teu amor especial seja mais amplamente manifestado!
Que Teu poder de cura e Tua graça salvadora fluam por um canal mais largo e
que Tuas tendas sejam alargadas e que as cortinas de Tua habitação sejam
esticadas. Que não haja tantas almas prisioneiras do diabo, pois estas são mais
valiosas que o mundo, as quais são capazes de amar, admirar, e glorificar a Ti
para sempre! Atenda, ó meu Deus, desejos tais como estes, tanto quanto sejam
eles consistentes com os segredos de Teu conselho e Teus caminhos e
julgamentos, os quais são insondáveis e imensuráveis.
Que Teu evangelho seja espalhado por todo este país (Inglaterra)! Que o
sol da justiça brilhe com maior força e glória, dispersando a neblina do erro e
expulsando as trevas da ignorância! Que assim como as águas cobrem o mar
seja também esta terra cheia do conhecimento da Tua glória! Enquanto existir
Tua Igreja no mundo, que ela exista também neste país. E que o lâmpada da
Tua Palavra brilhe intensamente sobre nós tanto quanto o sol e a luz brilham
no firmamento.
Tu que tens os corações de todos em Tuas mãos, inclines alguns para
lerem estes sermões, e que todos os que os lerem sejam abençoados por meio
deles. Que nestes seus dias entendam as coisas que dizem respeito à paz e
obedeçam ao Teu chamado para serem convertidos, antes que Tu Te decidas a
não mais chamar ou clamar por eles. Que ninguém se torne mais cego do que
é pelo brilho da verdadeira luz em seus olhos! Que ninguém seja mais
endurecido pelos meios designados para sensibilizá-los! Não permitas que a
Palavra da Vida se transforme em sabor de morte! Faças com que algumas
almas registrem a data de suas conversões pela leitura deste livro, e aqueles
que são convertidos sejam mais fortalecidos por ele. Encorajes Teu servo que
tem se resignado e se rendido a Ti, cuja maior honra e verdadeira felicidade é
ser Teu para sempre, tornando este trabalho o mais bem sucedido.
Nathaniel Vincent
CARTA AO LEITOR
Caro leitor, imediatamente antes de começar a leitura, pare e olhe para
o céu! Como se obter algum proveito na leitura a não ser que o Pai das Luzes
abra seus olhos e lhe dê um coração compreensivo! Ele pode mostrar-lhe
maravilhas nas verdades mais simples, as quais eram desconhecidas para
você. Do mesmo modo que seu julgamento pode ser aprofundado em relação
àquelas doutrinas que são pregadas com mais freqüência, estou certo de que
seu ânimo precisa ser estimulado na proporção adequada para suportar o
peso e a concernência de tais doutrinas.
Ao ver como alguns mestres tornam enjoativas algumas verdades,
entristeci-me e cheguei quase à indignação. E ainda que se trate de verdades
tão puras, as quais são freqüentemente ouvidas, eles não as conhecem como
deveriam conhecer. No que se refere às intenções dos corações e ao
conhecimento operante, estas pessoas que fantasiam, julgando-se muito
inteligentes, são excessivamente ignorantes. Suas consciências são
obscurecidas e nunca estiveram sob o poder da palavra que lhes é pregada. Os
deveres, embora clara e freqüentemente obrigatórios, são negligenciados e os
pecados comumente reprovados, ainda assim, são praticados por eles.
Você que não aprecia um sermão a menos que ele satisfaça sua fantasia
e lhe provoque coceiras nos ouvidos, você tem toda razão para questionar se
sua natureza já foi renovada. Pois aqueles que nasceram de novo desejam o
genuíno leite da palavra (embora exista uma pequena mistura com aquilo que
é humano) de tal modo que eles possam crescer através dela.
Leitor, acaso você é totalmente ignorante e incrédulo? O quanto então,
você estaria interessado em utilizar-se dos meios disponíveis para alcançar a
sabedoria? Sem o conhecimento seu coração não poderá ser bom, nem você
estará seguro. Você estará perdido. Oh, seja convertido imediatamente para
que seu próximo passo não seja dado em direção ao túmulo e ao inferno.
Ignorar o perigo é uma falsa segurança. É uma alegria deplorável ignorar sua
própria miséria, pois esta mesma ignorância aumenta o perigo e tornará sua
miséria ainda mais inevitável. O pecado é algo tão terrível que ninguém
jamais se arrependeu de tê-lo abandonado. Portanto conscientize-se da
necessidade de rejeitar toda sua irreligiosidade e comportamento mundano a
fim de viver sóbria, justa e santamente no presente mundo mau.
Se você é um professante mas não um praticante da religião, considere
isto: "Não é para uma conversão aparente, e sim para uma conversão genuína,
de coração, que a vida é prometida e assegurada". Se você mostra uma
aparente santidade mas sem o poder, isso prova o quanto você ainda é ímpio.
Certamente pensa que o Senhor não o observa e nem irá puni-lo, cuidando
que ao menos com você Ele será parcial. Eu me espanto como você se atreve a
vir constantemente a Sua presença, tão próximo a Sua arca onde Seu zelo é tão
ardente, e tão freqüentemente envolve-se em funções referentes à Sua
adoração, mantendo em seu coração algum pecado ou vaidade que o afasta
dEle.
Mas se você é realmente convertido, oh, chegue mais perto de Deus e
volte-se mais e mais a Ele. A graça é algo tão excelente que eu creio que você
deveria persistir sem descanso para obter uma medida maior dela. Quanto
mais você conhecer o Senhor tanto mais O amará, e mais relutante será em
deixá-lo para retornar à loucura.
A conversão é o prego no qual os profetas do passado martelaram
incansavelmente. Nosso Senhor e seus apóstolos insistiram neste assunto, e
ultimamente Deus não só tem enviado seus ministros para ocuparem-se disso
mas tem tomado Ele mesmo o martelo dos julgamentos para fazer com que
este prego penetre. Agora, quanto maior a resistência que ofereçamos, tanto
maiores serão os golpes vindos desse martelo. Temos visto ultimamente dias
de grandes calamidades e aflições, porém ainda assim eles tem sido, em certo
sentido, dias de graça. Portanto, os julgamentos temporais têm vindo para que
as misericórdias possam ser valorizadas e os julgamentos eternos possam ser
evitados.
Deus tem um desígnio de amor por trás de toda Sua severidade. Vamos
corresponder a isso pois se ainda continuarmos a andar na contra-mão, Ele
tem ameaçado castigar-nos furiosamente sete vezes mais do que Ele já o tem
feito. E eu tremo só em pensar em tais julgamentos, os quais serão sete vezes
piores do que as pragas e o fogo. Entretanto, se adquirirmos instrução e
sabedoria através de Sua correção e nos convertermos a Ele que tem nos
afligido, encontraremos as expressões de Seu favor e benevolência muito
maiores do que jamais foram os sinais de Seu descontentamento.
N. Vincent
A CONVERSÃO DE UM PECADOR
"... convertei-vos, convertei-vos dos vossos maus caminhos, pois por que razão
morreríeis, ó casa de Israel?" (Ez. 33:11)
APLICAÇÃO
2. DO TERROR
Quem quer que você seja, alto ou baixo, rico ou pobre, mulher ou
homem e que esteja lendo estas linhas e nunca foi convertido, eu sou um
enviado de Deus para você e trago duras notícias, tais como: se você continuar
sendo cruel e irracional, pode lhe acontecer como aconteceu com Belsázar, que
viu aquela mão na parede escrevendo: "Então se mudou o semblante do rei, e os
seus pensamentos o turbaram, as juntas dos seus lombos se relaxaram, e seus joelhos
bateram um no outro. " (Dan 5:6). Eu não vou profetizar coisas boas a seu
respeito, porém coisas más. Tenho algo a dizer-lhe, o qual está escrito com
lamentação, tristeza e pesar. Possivelmente você está feliz e seguro, entretanto
isso é como a alegria e o riso de um homem que está emocionalmente
desequilibrado, cuja condição reflete que seu desequilíbrio é o mais doloroso.
Pecador, você não tem razão para sorrir enquanto estiver nesse estado.
Quantas ameaças pesam agora contra você? Suponha que estivesse cercado
por canhões, todos prontos para serem disparados contra você. Isto seria
considerado como nada se comparado às terríveis ameaças e maldições que o
justo e zeloso Deus tem proferido. Abra os seus olhos e observe em toda e
qualquer direção. Isso seria suficiente para que seu coração se enchesse de
terror; acima um Deus irado; abaixo, um inferno flamejante; atrás uma
inumerável hoste de pecados perseguindo você; na frente, satanás e o mundo
lhe conduzindo ao longo de um largo caminho rumo a destruição.
Quero explicar mais particularmente as seguintes verdades e aplicá-las
ao seu coração:
(1) Enquanto não for convertido, você também não estará perdoado.
Está endividado em muitos milhões de cruzeiros e até agora nem um cruzeiro
dessa dívida foi pago. A menor transgressão faz você sujeito à maldição da lei;
poderia, então, imaginar o que seus muitos pecados têm feito de você,
miserável condenado? Deus tem determinado eliminar tudo isso se retornar e
confessar sua iniqüidade. Ele irá depositar todo o fardo nos ombros do
Mediador, todavia, se você não concordar em ser salvo, então terá que
suportar as conseqüências sozinho. O pecado é uma coisa diferente daquilo
que você imagina. A primeira transgressão de Adão ao comer o fruto proibido
(a qual foi agravada porque ele teria sido como Deus, porém ele creu na
serpente e tornou Deus mentiroso, o que na realidade significou uma
completa rejeição do pacto de vida feito com ele) oh, como isso lhe foi penoso!
E não somente ele, mas toda a sua descendência, o que é o pior de tudo. E se
um pecado trouxe a maldição sobre todos os filhos dos homens, pense, ó alma,
como será possível a você suportar o peso de todos os pecados que tem
cometido? O pecado faz toda a criação gemer, faz o condenado lamentar e se
desesperar, pois estará com um fardo insuportável sobre si para sempre.
Nosso Senhor achou o pecado pesado. Isso levou-O a agonizar e tornou
Sua alma excessivamente triste até à morte. Deus lamenta que Cristo seja
pressionado pela iniqüidade. A carroça é pressionada pela carga que leva, e
você, pecador, tratará isso levianamente? Oh, um dia quão pesado você achará
seu fardo!
(2). Enquanto não for convertido você estará entesourando mais e mais
ira para o dia da ira. Sua contagem já é alta, mas a cada dia seu placar
aumenta. Cada dia você faz novos pontos, embora a consciência esteja tão
cauterizada que agora não sente nada. Como a sua pele cobre o seu corpo,
proporcionalmente, assim também os vasos da indignação divina ficam mais
cheios, os quais por fim serão todos derramados sobre sua cabeça. É uma
crueldade anormal fazer mal a si próprio, ser o assassino de sua própria alma.
Você está continuamente afastando--se de Deus e fazendo com que Ele fique
mais e mais contra você, Aquele que unicamente pode ser seu refúgio e
salvação. Você verá afinal que tem sido seu próprio adversário e que tem
agido para sua própria confusão. "Acaso é a mim que eles provocam à ira, diz o
Senhor, e não antes a si mesmos, para confusão dos seus rostos?" (Jer.7:19).
(3) . Enquanto não for convertido você se torna cada vez menos apto
para a glória e a santidade. Quanto mais impuro você for, menos apto estará
para ver Deus. As abominações que você pratica e ama o tornam um habitante
inadequado para a Nova Jerusalém. A herança celestial é a herança dos
santos. É uma herança incorruptível e impoluta. (I Ped. 1:4). A companhia
toda é santa e santos são todos os afazeres. Não há sequer uma palavra vã ou
pecaminosa falada, nem é encontrado sequer um desejo ou pensamento
impuro dentre os que estão lá. E o que faria lá entre eles, a não ser que uma
mudança fosse operada em você?
(4) . Se não se arrepender, é certo que morrerá eternamente. Assim
como a vida é longínqua, assim a morte está próxima. O salmista nos fala que
"Deus é um juiz justo, um Deus que se ira todos os dias. Se o homem se não
converter, Deus afiará a sua espada; já tem armado o seu arco e está aparelhado. "
(Sal. 7:11-12). E quando os instrumentos da morte estiverem preparados é um
sinal que Deus fará um trabalho rápido e repentinamente eliminará o ofensor.
A morte é chamado de "Rei dos Terrores", e em relação aos ímpios este nome é
bem merecido. As coisas boas deles são todas recebidas e seus males vêm
sobre eles, os quais nunca serão removidos. Tem início seus tormentos para
nunca terem um fim. Enquanto Deus for Deus, eles O terão como inimigo.
Enquanto Deus for feliz, eles estarão na mais extrema miséria! Poderia a
língua pronunciar ou o coração imaginar o horror de tudo isso? Um Senhor
irado, vingando-Se do pecado colocará sobre você a carga que merece, e ainda
impedirá que você afunde no nada. Ele susterá seu ser para que não se esvaia
e você possa ser atormentado para sempre. Ele mostrará Seu supremo poder
ao levantá-lo com uma das mãos, para que possa chicoteá-lo com a outra por
toda a eternidade.
3. DA CONSOLAÇÃO
A vocês que têm obedecido o chamado de Deus para arrepender--se, eu
devo dar uma mensagem de paz e consolo: "Consolai, consolai o meu povo, diz o
vosso Deus ". (Is. 40:1). Os incrédulos não são tão amaldiçoados quanto vocês
são abençoados. Eu tenho várias coisas para dizer-lhes que farão seus corações
saltarem de alegria.
(1). Deus tem tido pensamentos de amor para com vocês desde antes
que os fundamentos da terra fossem lançados. Ele os predestinou e os
escolheu para a doação de filhos, muitos antes de existirem. (Ef. 1:4-5). Desde
a eternidade Ele determinou fazê-los herdeiros e co-herdeiros com Cristo
daquele reino e glória com os quais os sofrimentos do tempo presente não são
dignos de serem comparados. E como o amor de Deus para com vocês vem
desde a eternidade, é co-eterno com Ele, nunca poderá ser mudado em tempo
algum.
(2). Deus os justificou livremente pela Sua graça através da redenção em
Jesus Cristo. (Rom. 3:24). "Quanto está longe o oriente do ocidente, assim afasta de
nós nossas transgressões". (Sal. 103:12). E certamente isto é tão distante quanto
se possa desejar. Eles são aprisionados no fundo do mar, o qual implica que
quando forem procurados não serão encontrados, tanto quanto as coisas que
estão presas no fundo do mar, as quais não temos esperanças que sejam
recuperados. "Mas ele foi ferido pelas nossas transgressões, e moído pelas nossas
iniquidades". (Is. 53:5). E como a imputação de seus pecados a Cristo fez com
que Ele passasse por reais sofrimentos, assim a imputação de Sua justiça a
vocês trará uma real isenção da ira e das punições que, pelo pecado, vocês
justamente mereciam. Alegrem-se, convertidos, seus pecados são perdoados e,
conseqüentemente, a maldição das aflições e também o estigma da morte foi
retirado.
(3). Vocês que são convertidos, não demorará muito para serem
glorificados: "E aos que predestinou a estes também chamou: e aos que chamou a
estes também justificou: e aos que justificou a estes também glorificou. " (Rom. 8:30).
Deus prometeu que aqueles que vencessem sentariam com Ele em Seu trono.
Vocês não serão apenas vencedores, porém serão mais do que vencedores por
Aquele que os amou. As mansões já estão preparadas, e quando vocês
estiverem prontos para elas, serão recebidos lá. Então nem a fúria nem o favor
do mundo serão mais tentações. Os dardos inflamados de satanás não serão
capazes de atingi-los quando alcançarem o terceiro céu. Quando estiverem
entrando na Nova Jerusalém darão um adeus ao pecado e à miséria às portas,
pois nenhum deles será capaz de entrar com vocês. Todas as lágrimas serão
enxugadas e a causa das tristezas não mais existirá. Haverá uma visão clara de
Deus sem a mínima nuvem. O Sol da Justiça brilhará para sempre sem
nenhum eclipse. Haverá completo gozo sem pesar, perfeita paz sem quaisquer
problemas, completa santidade sem o mínimo resquício de corrupção, benção
completa sem interrupção.
4. DA EXORTAÇÃO
Diante disso, quem não gostaria de ser convertido? Alguém teria
alguma coisa a dizer contra o perdão ou contra a glória que tem sido
revelada? Deveríamos perguntar se preferem antes os prazeres eternos ou os
tormentos eternos? Oh, que possam voltar-se para si mesmos! E então estou
certo de que se voltarão para Deus imediatamente. Os argumentos para
persuadi-los são diversos.
(1). Se não se arrependerem, não poderão corresponder àquilo para o
que foram criados. Não pensem que Deus lhes deu um ser e enviou--os ao
mundo para agradarem-se a si próprios, para satisfazerem seus desejos
desordenados e corruptos, e para viverem negligente e rebeladamente contra
Ele. No entanto, é assim mesmo até que vocês sejam convertidos. Porventura
o Senhor lhes deu a capacidade de discernir, e não deseja ser compreendido e
conhecido por vocês? Ele lhes deu um coração para amar e desejar, e não
desejaria Ele ser o principal objeto dessas afeições? Ele lhes deu afeições para
que as dedicassem à vaidade e ao pecado? Oh, não contrariem mais o fim para
o qual vocês foram feitos, a fim de não fazer o Senhor arrepender-Se de haver
feito o homem sobre a terra, e pesar-Lhe o coração, e assim decida destruir a
obra das Suas próprias mãos. Se continuarem obstinados e sem entendimento,
"... aquele que o fez não se compadecerá dele, e aquele que o formou não lhe mostrará
nenhum favor. " (Is. 27:11).
(2). A não ser que se arrependam, vocês não poderão corresponder à
finalidade da morte de Cristo e a redenção ganha através dela. Nosso Senhor
não morreu somente para expiar ofensas, como também a fim de purificar
para Si um povo peculiar, zeloso de boas obras, e "No corpo da sua carne, pela
morte... vos apresentar santos, e irrepreensíveis, e inculpáveis " (Col. 1:22) "...pelo
espírito eterno se ofereceu a si mesmo imaculado a Deus, purificará as vossas consci-
ências das obras mortes, para servirdes ao Deus vivo. " (Heb. 9:14). Destes e de
outros textos semelhantes, segue-se evidentemente que não somente nosso
perdão e sim também nossa purificação foi designado pelo Senhor Jesus. Mas
como podemos ser puros, a não ser que voltemos para Deus do pecado que
nos contamina? Cristo sabia que o pecado é a doença e a degradação da nossa
natureza, portanto Ele mesmo foi aniquilado para que o pecado pudesse ser
exterminado. E vocês se atreverão a viver no pecado? Ouçam o apóstolo em I
Ped. 2:24: "Levando ele mesmo em seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro, para
que, mortos para os pecados, pudéssemos viver para a justiça; e pelas suas feridas
fomos sarados. " E como a morte de Cristo é um argumento para nos persuadir
a sairmos do pecado, assim dessa morte resultam a virtude e o poder para que
o pecado seja subjugado.
(3). Vocês estão ainda mais obrigados a arrepender-se porque Deus Se
dignou permitir-lhes que fizessem isso. Se o abismo fosse fixado após a
primeira transgressão, se o arrependimento do homem caído tivesse sido tão
impossível quanto o arrependimento dos anjos que caíram, não se poderia
imputar ao Senhor a menor injustiça. No entanto desde que vocês se
afastaram, Ele lhes tem chamado. Sem detrair da Sua justiça ou prejudicá-la
Ele encontrou uma maneira de mostrar-lhes misericórdia. Os demônios nunca
foram chamados à conversão. Assim que pecaram foram acorrentados nas
cadeias das trevas de onde nunca sairão. Mas ouçam o que a sabedoria diz em
Prov. 8:4: "A vós, ó homens, clamo: e a minha voz se dirige aos filhos dos homens. "
Vocês têm freqüentemente fechado seus ouvidos. Oh, se pelo menos
quisessem ouvir para que suas almas pudessem viver. O prolongado
ensurdecimento de seus ouvidos pode levar o Senhor a fechar Sua boca e
então nunca mais serão convertidos, nunca serão curados.
(4). Considerem Quem é que os chama ao arrependimento e o que Ele
deseja com isso. Vocês são uns perdidos miseráveis, que não têm capacidade,
nem vontade, nem o poder para salvar a si mesmos. E Aquele que os chama é
um Deus ao qual pertencem o poder e a misericórdia, e Seu propósito é o de
tornar conhecidos para vocês esse poder e essa misericórdia. Seu desejo é
trazê-los para perto, de modo a manifestar-Se a vocês, como Ele Se manifestou
ao mundo, abrigá-los do perigo, suprir suas necessidades de acordo com as
riquezas de Sua glória, libertá-los de toda obra má, e preservá-los para Seu
reino celestial - e haveria algum mal nisso tudo?
(5). Não é razoável que o mundo e o pecado sejam obstáculos a
continuarem afastando-os de Deus. Bem, vocês devem deixar o pecado, pois
ele merece sua indignação. Bem podem seus corações deixar de idolatrar o
mundo e as coisas dele, pois estes merecem seu desprezo. Todas as coisas, a
não ser as de Deus, são tanto prejudiciais quanto inúteis. Nada é mais
prejudicial do que o pecado, e todos aqueles que esperaram ajuda das
criaturas foram decepcionados e desamparados em sua situação
desesperadora.
(6). Se se voltarem para Deus, Ele não deixará de voltar-Se para vocês.
Seus ouvidos estarão abertos e voltados ao seu clamor. Sua mão estará sobre
vocês para o bem, e na palma de Sua mão estarão seguros. Ele é maior do que
tudo, e ninguém é capaz de arrancá-los de Suas mãos. Ele não irá esconder-Se,
mas voltará Sua face na direção de vocês. Ele lhes dará paz como também
misericórdia. Ele os fará saber que o perdão é multiplicado para que seu amor
também seja aumentado. A quem muito se perdoou muito se amou.
Finalmente a fonte de Seus benefícios estará voltada para vocês. O Senhor lhes
fará bem e Se alegrará em fazê-lo. As coisas temporais não serão desejadas. As
bênçãos espirituais serão derramadas em abundância, e no final vocês subirão
e serão admitidos em Sua presença pessoal, onde Deus estará com vocês para
nunca mais retirar-Se. Não desfaleçam nem temam, seja quem for que se
coloque contra vocês por causa de sua conversão. O próprio Senhor está com
vocês, e Ele tornará em bem tudo o que os seus adversários propuserem para
o seu mal.
(7). Não somente Sua Palavra, Seus ministros e o Espírito Santo, mas
também Sua providência conclamam vocês a voltarem-se para Deus. Tanto
Suas misericórdias como Seus juízos pressionam esta exortação à conversão.
As fontes da bondade que continuamente correm em sua direção, as quais às
vezes se intensificam e transbordam abundantemente, significam que é sábio
deixar as cisternas quebradas e vir para a fonte das águas vivas. Suas
misericórdias falam esta linguagem, que é bom voltar e interessarem-se pelo
Pai delas. Então estas estarão agindo. Cordões de amor são lançados com o
propósito de trazê-los para junto do Deus de amor e paz. Oh, que vocês
possam correr para Ele! As riquezas de Sua bondade estão abertas e descober-
tas para que por elas possam ser levados ao arrependimento. (Rom. 2:4).
Seus juízos, da mesma forma, são infligidos de conformidade com os
mesmos propósitos. Esta é a voz que os proclama: "Vinde e tornemos para o
Senhor, porque ele despedaçou, e nos sarará; fez a ferida, e a ligará. " (Os. 6:1). O
incêndio de Londres* chama os seus habitantes e toda a terra (já que não
somente ouviram falar de Deus com seus ouvidos mas seus olhos O tem visto
marchar tão ameaçadoramente sobre eles), para que rejeitem a si mesmos e
arrependam-se no pó e nas cinzas. Aqueles muitos milhares que foram mortos
pela praga da pestilência, apesar de estarem mortos, eles ainda falam, e isto é
o que eles dizem: "Oh, vocês que estão vivos, voltem-se para o Senhor seu
Deus, pois após a morte será muito tarde para fazê-lo."
(8). Considerem isto: ainda não é muito tarde para voltarem-se para
Deus. Embora até aqui vocês tenham sido estúpidos, se agora acordarem;
embora tenham sido teimosos até aqui, se agora se renderem ao Senhor;
embora até aqui tenham fechado a porta, deixando o pecado do lado de
dentro e Cristo do lado de fora, se agora mesmo abrirem ao bater do
evangelho e consentirem que suas iniquidades sejam expulsas e que o Senhor
Jesus entre, Ele está pronto para recebê-los em favor e graça, e todas as
rejeições passadas, afrontas e repulsas serão esquecidas e perdoadas.
_____________
* A cidade de Londres esteve incediada por uma semana em 1666.
O cetro real continua apontado para vocês; o Senhor não foi removido
do Seu trono de misericórdia. Misericórdia e graça estão agora ao seu alcance
se vocês virem recebê-las. Contudo se não reconhecerem uma boa proposta,
por estarem decididos a não dar fim ao seu obstinado caminho, subitamente
um juramento poderá ser pronunciado que vocês nunca mais entrarão em
descanso. Deus poderá dizer: "Aquele que é sujo, suje-se ainda. Aquele que é
injusto seja injusto ainda. Aquele que é amante dos ganhos e prazeres do
mundo, os quais se tornaram seus ídolos, deixe-o só. Aquele que desprezou a
oferta da graça não terá outra oferta; aquele que agora recusa a ser convertido
nunca será um convertido."
Oh, que eu possa convencê-los através destes argumentos. Todavia,
caso eles não os impressionem, caso eles escapem de suas mentes e assim não
tenham influência em seus corações, eu reforçarei os mesmos da seguinte
maneira:
A. Com a voz do inferno;
B. Com a voz do céu;
C. Com a voz de Cristo.
A. Com a voz do inferno. Imaginem, portanto, um pecador condenado
que tivesse permanecido muitos anos no lago de fogo. Suponham que ele
pudesse voltar e aparecer diante desta assembléia e um rio de lágrimas
jorrasse de seus olhos, e então finalmente parando de chorar ele dissesse:
"Maldito seja o dia em que nasci, e a noite em que disseram: foi
concebido um menino! Seja este dia trevas, que Deus nas alturas não atente
para ele, nem permita que a luz brilhe sobre ele. Ai de mim, teria sido melhor
nunca ter existido do que ser um miserável eternamente! Quão insuportáveis
são as mordidas contínuas do verme que nunca morre! Quão ardentes e
inextinguíveis são aquelas chamas que e o sopro do Senhor, semelhante a uma
fonte de enxofre, incendeia!"
"O mundo está completamente enganado em relação ao pecado. As
pessoas pensam nele leviana e prazerosamente, e era exatamente assim que eu
pensava no princípio. Mas agora eu descobri quão miseravelmente eu estava
enganado. Estou provando o sabor e o peso do pecado; sim, eu estou bêbado
com o fel e a amargura dele. Estou descobrindo ser verdade aquilo que antes
me foi falado mas que não cria, a saber, que é coisa terrível cair nas mãos do
Deus vivo. Suas poderosas mãos me agarraram e prenderam minhas mãos e
pés, lançando-me nas trevas exteriores, onde terei que permanecer em torturas
por toda a eternidade! Oh, esta palavra dilacera meu coração, mata toda a
esperança, afunda-me e esmaga-me inteiramente em completo desespero".
"Se após milhares e milhares de eras meus tormentos por fim
terminassem, eu seria fortalecido nas minhas angústias, porém desde que
após tão longo espaço de tempo eu estarei tão longe de ser liberto quanto no
primeiro momento em que fui aprisionado, isto é o que faz minha tristeza não
conhecer limites, pois a miséria não os conhece. Oh, que loucura apoderou-se
de mim para que em troca de um pequeno ganho e prazer temporário me
rendesse ao pecado, me aventurando a morar com o fogo devorador, e a
morar com chamas eternas!"
"Mas eu devo culpar somente a mim. Deus é severo, entretanto nem um
pouco injusto. Ele me chamou, porém eu recusei. Ele estendeu Sua mão,
todavia eu O desprezei. Eu menosprezei todos os Seus conselhos e não fiz
caso de nenhuma de Suas reprovações. Lembro-me muito bem que Ele me
falava sempre para que deixasse os caminhos que conduzem à destruição e
miséria, mas eu teimei em andar neles. Fui avisado para fugir da ira que
estava por vir, contudo não atentei para nenhum aviso. Fui instado para que
fosse reconciliado com Deus, porém resolvi continuar em rebeldia. Eu não
quis ser salvo, embora o Senhor me aguardasse com Sua graça salvadora!"
"Que direi? Poderá algum de vocês continuar com os mesmos
pensamentos que eu tinha? Vocês ainda acalentariam os mesmos pecados que
foram minha ruína? Vejam as chamas nos meus olhos. Oxalá vocês pudessem
compreender a angústia do meu coração. Sejam sábios, sejam sábios, e aceitem
misericórdia e salvação enquanto estão ao seu alcance, pois uma vez que
venham para este lugar de tormento, o Senhor Se esquecerá de ser
benevolente, e Sua misericórdia será totalmente retirada - e isso para sempre!"
B. Com a voz do céu. Suponham que um dos santos glorificados que
habita a Jerusalém celestial que tenha conversado com uma inumerável
companhia de anjos e tenha visto Deus face a face, possa, por um tempo,
deixar sua gloriosa mansão, e tendo abundância de alegria e glória diante de
seus olhos, proferisse uma mensagem tal como esta diante de vocês:
"Oh, a altura, o comprimento, a profundidade e largura do amor de
Cristo, o qual ultrapassa o conhecimento! Quão inescrutável é Sua bondade e
Sua misericórdia revelada! Digno é o Cordeiro que foi morto, de receber
poder, e riquezas, e sabedoria, e força, e honra, e glória, e bênção, pois Seu
sangue me redimiu, com milhões de outros de todo grupo, língua, povo e
nação! Fui chamado para me arrepender e viver, e através da rica graça fui
capacitado a obedecer ao chamado.
E agora descobri quão gloriosa é aquela vida para a qual serão trazidos
os convertidos sinceros e perserverantes. Esta é uma vida livre do pecado, a
qual nunca verá a morte".
"O melhor de tudo é estar perto de Deus. Cristo é sem qualquer dúvida
o melhor Mestre. Estar sujeito a Ele é reinar, e reinar para sempre! O que afeta
este cego e estúpido mundo e faz com que os homens não vejam nenhuma
formosura nem atrativos em Cristo - o mais belo e desejável dentre outros dez
milhões, a luz de cuja face faz o céu não precisar da luz do sol, da lua, ou das
estrelas? Sua beleza ultrapassa a tudo, Sua graça vale muito mais do que o
ouro que perece, mas a Sua glória não me é lícita ou possível expressar".
E agora algum de vocês continuará a menosprezá-lO? Abram seus olhos
e vejam claramente que vocês são filhos da perdição, os filhos da morte sem
Ele. Mas através dEle podem ser convertidos. Através dEle podem ser salvos
com uma grande e eterna salvação. Certamente, então, vocês têm razões para
valorizá-lO acima de tudo, embora o mundo todo, sim, dez milhões de
mundos, pudesse estar competindo com Ele."
C. Com a voz de Cristo. Imaginem o Senhor Jesus aparecendo numa luz
que exceda a luz do sol. Suponham que alguns de Seus anjos viessem como
anunciadores e precursores, vindo à frente dEle e anunciando: "Santo, santo,
santo éo Senhor dos Exércitos", e por fim que Ele mesmo viesse visivelmente
enchendo este lugar com Sua majestade e Sua glória. E, tendo inspirado em
vocês profunda reverência e tendo provocado em vocês uma admiração por
Sua excelência e grandeza, suponham que Ele fale então:
"Olhai para Mim e sereis salvos, todos os confins da terra. Eu sou Seu
Redentor, e não há outro. Vocês têm se auto-destruído, mas em Mim, e
somente em Mim, poderão encontrar ajuda. A não ser que Eu os torne livres, o
pecado continuará reinando em vocês, e se ele reinar, também destruirá. A
não ser que Eu amarre o homem forte, ele irá mantê-los presos e os levará
cativos ao seu bel prazer. A não ser que Eu Me volte e os traga para perto de
Deus, vocês correrão cada vez para mais longe dEle, até que por fim não haja
mais nenhuma possibilidade de retorno. Por quanto tempo vocês, almas
simples, amarão a simplicidade, e vocês, tolos, odiarão o conhecimento?
Voltem-se para Mim; ouçam a Minha reprimenda. Olhem, Eu derramarei Meu
Espírito sobre vocês, Eu lhes revelarei Minha Palavra".
"Os desrespeitos passados Eu desconsiderarei se agora por fim Me
receberem. Eu os libertarei da culpa e do poder do pecado. Pacificarei a ira de
Meu Pai, embora por quebrarem a Sua lei e Me desprezarem - Eu, Seu Filho -
vocês O tenham enfurecido como nunca. Embora cativos por natureza, Eu os
farei reis e sacerdotes. Embora traidores pelo pecado e inimigos, Eu os farei
filhos e herdeiros de Deus e co-herdeiros coMigo que sou o herdeiro de todas
as coisas. De modo algum vocês serão miseráveis, se toda a plenitude que
habita em Mim puder satisfazê-los e torná-los felizes."
Depois de tudo isso, meus irmãos, vocês se devotarão ao pecado e à
ruína? Oh, ouçam a voz do filho de Deus, que não deseja que pereçam. O que
posso fazer para persuadi-los? Eu penso que desejaria que estas fossem
minhas últimas palavras, sob a condição de que fossem poderosas e eficazes
para a conversão, a cura, e a salvação de todos os que estão ao alcance do som
delas. Eu estaria disposto a expirar aqui e ser levado morto fora do púlpito
sob a condição de que todos vocês pudessem ouvir de modo a voltarem-se
dos seus maus caminhos e viverem.
A maioria daqueles milhares que estão diante de mim é me
desconhecida, mas isto eu sei, que vocês têm almas e que cada alma é mais
valiosa do que o mundo. Oh, que todos possam considerar o interesse e a
segurança de suas almas!
No entanto, caso que eu esteja falando em vão a vocês, eu dirigirei
minhas palavras a Ele que é Senhor sobre todos: "Oxalá, que Tu que operas e
que ninguém pode obstruir ou impedir, operes uma completa mudança
salvadora nestas almas! Oh, que Tu tenhas compaixão daqueles entre elas que
são cruéis consigo mesmos! Oh, que Tu possas despertar as almas que não
estão apenas dormindo, mas mortas! E quebrantes os corações que têm se
tornado corações de pedra! Oh, que Tu os convenças de seu pecado e miséria,
e efetivamente os tires do primeiro para que possam ser livres para sempre da
segunda!"
Que cada coração diga, "Amém!" a estas petições.
5. DA DIREÇÃO
Eu gostaria de crer que agora vocês estão desejando ouvir, e igualmente
desejando seguir, algumas indicações de modo a se tornarem sinceros
convertidos. Direções sobre como libertarem-se da dor, como recobrar saúde
quando estiverem doentes, ou uma determinada condição que tenham
perdido, estou confiante que vocês dariam atenção. E não seriam as
orientações vindas da infalível Palavra da verdade de muito maior
conseqüência?
As orientações são as seguintes:
(1). Pensem em seus caminhos e com um espírito contrito os
considerem. Esta consideração teve uma grande influência no salmista: "
Considerei os meus caminhos e voltei os meus pés para os teus testemunhos. Apressei-
me e não me detive. " (Sal. 119:59). Esta injunção é dupla em Ageu 1:5, e
novamente no versículo sete: "Aplicai os vossos corações aos vossos caminhos. " E
esta passagem em Ez. 18:14 deve ser observada: "E eis que, se ele gerar um filho
que veja todos os pecados que seu pai fez, e, vendo-os, não cometer coisas
semelhantes... "
Se os pecadores considerassem o que eles fazem quando cometem o
mal, isso seria um meio de pôr um fim no mal que praticam e de aprender a
fazer o bem. Considerem a miséria e o perigo de estar distantes de Deus. Os
caminhos pelos quais vocês naturalmente caminham os conduzem para longe
dEle, e as Escrituras dizem: "Pois eis que os que se alongam de ti, perecerão; tu tens
destruído todos aqueles que, apostatando, se desviam de ti. " (Sal 73:27). Pensem
longamente nestas coisas até que elas atinjam seus corações, de modo a
considerarem ser loucura vocês permanecerem seguros num estado de
incredulidade. Deixem que este pensamento cause uma profunda impressão:
todo o tempo que persistirem nos seus maus caminhos vocês estão
abandonando o Senhor, como também abandonando as misericórdias
disponíveis para vocês, e estão viajando rapidamente para as regiões de eterna
miséria e trevas."
(2). Estudem a vaidade das desculpas anteriores. Eu sei que os lábios do
homem natural estão cheios delas, mas é muito fácil respondê-las.
"O pecado", vocês dizem, "está cravado na nossa natureza." Portanto
vocês precisam clamar ao céu para que sua natureza possa ser transformada.
"Ora, o pecado é uma prática comum."
Portanto seu perigo é ainda maior e vocês devem ser mais cuidadosos
para que não sejam soterrados na ruína que será quase total.
"Mas," dirá alguém, "minhas iniquidades são tão vantajosas e
agradáveis, por que deveria abandoná-las?"
Considere, alma, se os condenados que perderam suas almas e a bênção
eterna, e sofrem a vingança do fogo eterno, têm quaisquer razões para
orgulharem-se do ganho ou do prazer.
"Concordo com isso, porém os homens me ridicularizarão e
desprezarão se eu me tornar um convertido."
Todos os que agem desse modo estão loucos, e as pessoas sóbrias não
precisam estar preocupadas com as risadas daqueles que estão fora de si. Oh,
condenem a desobediência deles, desprezem a vergonha que eles lançam
sobre vocês. Muito em breve eles mesmos desejarão que, ao invés de
desprezarem, tivessem sido seus imitadores.
"Exato, contudo voltar-se a seguir a Deus é muito duro, e a dificuldade
é um grande desencorajamento."
O trabalho é realmente difícil, todavia a força e a assistência que lhes
serão proporcionadas são grandes. O Senhor operará toda a Sua obra em
vocês e a seu favor. (Is. 26:12). Deus não ordena nada que Ele não esteja
pronto para ajudá-los a desempenharem.
"Mas se sou um convertido, eu nunca terei uma hora de prazer. Minhas
lágrimas serão minha comida e bebida e minhas tristezas serão minhas eternas
companheiras."
Oh, terrível engano! Irracional preconceito contra os caminhos da
santidade! Se a bondade de Deus é algo tão melancólico, porque então as
Escrituras nos falam de paz que ultrapassa todo entendimento, e de gozo que
é indizível e cheia de glória? Por que Davi cantava tão freqüentemente, tocava
harpa, se a alegria e a religião fossem inteiramente incompatíveis?
"Ora, se eu me arrepender estarei exposto ao sofrimento." Bem,
suponhamos que sim. Os sofrimentos desse tempo presente não podem ser
comparados com a presente graça e consolação que ajudarão suas tentativas,
muito menos com a gloria que está por ser revelada.
Estudem a inconsistência de todas estas desculpas!
(3) . Salvem-se dessa geração perversa na qual vocês vivem. liste foi o
aviso que o apóstolo deu àqueles que haviam sido despertados e pungidos
nos seus corações. (Atos 2:40). Vocês devem despedir-se de seus antigos
companheiros de iniqüidade, pois de outro modo eles serão uma grande
tentação e armadilha para vocês. Companhia carnal é um demônio encarnado
que pretende puxar tantos quantos possa para o inferno juntamente com ele.
Portanto, os homens mais sábios usam muitas palavras de advertência. "Não
entres na vereda dos ímpios, nem andes pelo caminho dos maus. Evita-o; não passes
por ele: desvia-te dele epassa de largo. " (Prov. 4:14-15). Embora vocês não sejam
forçados a ser mal humorados e mal educados para com o ímpio, tomem
cuidado para não ser muito familiarizados. Muitas convicções e boas decisões
têm se esfriado e desvanecido por causa de nossa aquiescência na sociedade
dos ímpios. Não alimentem nenhum preconceito destes contra a verdadeira
piedade, quando eles se atrevem falar contra orações, o ouvir a Palavra, os
jejuns, as profissões de fé, quando eles debatem contra o dia do Senhor e
censuram o povo do Senhor, quando eles focalizam tudo isso como sendo o
delírio daqueles que estão perturbados, num sentido espiritual.
(4) Não desprezem profecias. O ministério da Palavra é ordenado com o
propósito de operar fé e trazer os pecadores a Deus. Portanto, não deixem o
entorpecimento, a distração, os cuidados, os prazeres, as iniquidades ou o
engano das riquezas abafarem esta Palavra a fim de impedi-la de prosperar
naquilo para o qual ela foi designada. Quando Ezequiel profetizou sobre os
ossos secos, eles reviveram e o vale de ossos se transformou num exército
vivo. E quem sabe, enquanto estão profetizando a vocês sobre o ministério do
evangelho, talvez inesperadamente possam ser avivados, vocês que estiveram
mortos, em transgressões. Permitam-se ser frequentadores assíduos da
pregação que é cheia de poder. Certamente a Palavra tem um poder para
converter quando aplicada pelo Espírito Santo. "A lei do Senhor é perfeita, e
refrigera (converte) a alma; o testemunho do Senhor é fiel, e dá, sabedoria aos
símplices. (Sal. 19:7).
(5) Não apaguem o Espírito. (I Tess. 5:19). Vocês não devem abafar a
convicção que provém dEle, mas devem desenvolvê-la. O Espírito do Senhor
às vezes aproxima-Se muito do ébrio, do blasfemo, do ganancioso, e da pessoa
impura, e lhes mostra que o caminho que está adiante deles é perverso, e que
há somente um passo entre eles e a morte, entre eles e a maldição. Portanto
isso os leva à humilhação e à transformação. Ele lhes mostra que é melhor
deixar os seus pecados do que ser destruído por eles. Ora, tal convicção talvez
conduzisse à conversão, se fosse acolhida e aproveitada, porém milhares
resistem ao Espírito Santo. Eles preferem continuar pecando sem serem
perturbados, ao invés de aproximarem-se das águas agitadas para serem
curados, seja qual for a doença ou tormento espiritual que sofram. Você,
pecador, sente a proximidade do Espírito? Oh, atente para Sua advertência.
Aquieça a todos os seus movimentos. Suplique para que tudo isso em você
não seja apenas uma coisa sem importância, e sim que sua salvação possa ser
devidamente realizada.
(6) Aprenda e suplique o pacto do Senhor. Nesse pacto Ele tem Se
comprometido a dar-lhe um novo coração, a limpá-lo de sua impureza e de
seus ídolos, dar-lhe Seu Santo Espírito e levá-lo a caminhar em Seus estatutos
(Ez. 36:25-27), o que em outras palavras significa convertê-lo. Empenhe-se
para que essas promessas possam ser concretizadas. Decida-se a não
responder com um "não". O Senhor ficará satisfeito se você O importunar com
um assunto que é ponto de honra para Ele. Não poderá converter a si mesmo,
contudo Ele pode facilmente fazer tal obra se você se dispor a que ela seja
feita. Uma palavra de vida e poder irá levantá-lo. E assim que Ele disser:
"Arrependei-vos, arrependei-vos, de seus maus caminhos, por que morreríeis, ó casa
de Israel?" - então faça disso uma oração!" Arrependo-me, arrependo-me, de
meus maus caminhos, porque eu morreria, ó Deus de Israel?"
A COISA INDISPENSÁVEL
"Como escaparemos nós, se não atentarmos para uma tão grande salvação...?"
(Hebreus 2:3)
Thomas Watson
Pastor da Igreja de São Estevão,
Walbrook na cidade de Londres
Excelência,
Não era minha intenção ter este sermão publicado (eu o considerava
despretencioso), mas primeiro recebi o convite de Vossa Senhoria, e depois fui
convidado pelo seu honrado Gabinete. Eu não soube como recusar, caso que,
esquivando-me de suas ordens, eu incorresse em sua justa censura. Meu
Senhor, foi meu desejo neste sermão chamá-lo para fora do vazio, das noções
exageradas, e disputas litigiosas destes tempos para buscar aquilo que é mais
sólido, no que, estou certo, todo homem está muito interessado, a saber, o
desenvolvimento de sua salvação. Este é um trabalho que talvez exija, que
demande os mais vigorosos atos espirituais da alma na sua realização. Este
trabalho tem necessidade de ser bem feito, pois o mesmo é para a eternidade.
Meu Senhor, esta é a verdadeira sabedoria: ser sábio para a salvação. (I
Tm. 5:15). Através desta santa linha de ação nós iremos superar todos os
políticos de todos os tempos. Nós escaparemos do inferno. Nós sentar-nos-
emos no verdadeiro lugar de honra. Deus será nosso Pai, Cristo nosso irmão,
o Espírito nosso Consolador, os anjos nossos companheiros. Quando
morrermos, levaremos conosco uma consciência limpa e deixaremos um bom
nome atrás de nós. Não discorrerei mais. Meu desejo é que este sermão possa
ser patrocinado por sua Excelência. Certas pequenas adições serão
encontradas no final deste, as quais preparei de antemão para Vossa Senhoria,
porém me faltou tempo para acrescentá-las. Que o Senhor Deus o enobreça
com Seu Espírito, e o coroe com prosperidade de alma, a qual será a oração
daquele que é,
Seu Honrado,
no serviço do evangelho
Thomas Watson
Do meu gabinete na
Capela de S. Estevão, Walbrook
15 de outubro de 1656
A COISA INDISPENSÁVEL
"...desenvolvei a vossa vocação com temor e tremor... "
(Filipenses2:12)
Questão 1. Mas por que Deus fez o caminho para o céu tão difícil? Por
que tanto trabalho?
Resposta 1. Para ensinar-nos a valorizar as coisas celestiais. Se a
salvação viesse facilmente, não lhe daríamos o devido valor. Se os diamantes
fossem comuns teriam pouca importância, entretanto, visto que são tão
difíceis de serem conseguidos, são tão valorizados. Tertuliano conta que
quando as pérolas eram comuns em Roma, as pessoas as usavam em seus
sapatos, cujo próximo passo era esmagá-las sob seus pés. A salvação é uma
pérola que Deus não permite ser desconsiderada. Portanto, deverá ser
conseguida com trabalho santo. Deus não permitirá que baixem os preços das
misericórdias espirituais. Aqueles que têm esta preciosa flor da salvação
devem colhê-la com o suor de seus rostos.
Devemos trabalhar e nos esmerar para podermos estar qualificados
para o céu. Um pai deixará sua herança ao filho, todavia primeiro ele lhe dará
uma educação para que possa estar qualificado para ela. Deus nos dá a
salvação, contudo primeiro Ele "nos fez idôneos para participar da herança dos
santos na luz. " (Col. 1:12). Enquanto estamos trabalhando, estamos correndo e
nos adequando para o céu. O pecado está sendo enfraquecido, a graça está
sendo amadurecida. Enquanto estamos em combate, estamos nos preparando
par a a coroa. Primeiro se amadurece o odre antes de colocar o vinho. Deus irá
nos amadurecer com a graça antes de derramar o vinho da glória.
Questão 2. Mas se deve haver este trabalho, como se diz que o jugo de
Cristo é suave?
Resposta 2. Para a parte carnal é difícil, porém onde há a infusão de um
novo e santo princípio, o jugo de Cristo é suave. Não é um jugo, e sim uma
coroa. Quando as rodas da alma são lubrificadas com graça, então um cristão
se move no caminho da religião com facilidade e alegria. Uma criança se
alegra em obedecer a seu pai. Para Paulo servir ao Senhor era o céu: "...
segundo o homem interior tenho prazer na lei de Deus. " (Rom. 7:22). E quão
rapidamente a alma é levada por essas asas! O serviço de Cristo é a liberdade
de Cristo, portanto o apóstolo chama isso de "lei da liberdade " (Tg. 1:25).
Servir a Deus, amar a Deus, ter prazer em Deus, é a mais doce liberdade
do mundo. Cristo não faz como fez Faraó: "... faziam servir os filhos de Israel com
dureza " (Ex. 1:13), mas Ele põe sobre eles os constrangimentos do amor: " ...o
amor de Cristo nos constrange... "(II Cor. 5:14). Seus preceitos não são cargas, são
privilégios; não são obstáculos, são ornamentos. Portanto, Seu jugo é leve, mas
para o homem não regenerado este fardo tem um peso que o atormenta e
aborrece. Quando a corrupção prevalece, ainda o melhor coração encontra
alguma relutância. É isso que precisa ser levado em conta quanto à primeira
razão que citamos, a dificuldade do trabalho. A segunda razão porque
precisamos de muito suor santo e esforço no desenvolvimento da salvação é
devido à excelência desse traba lho. Pouco serão salvos, portanto devemos
trabalhar o máximo que puder mos para estarmos entre esses poucos. O
caminho para o inferno ó largo, ele está repleto de riquezas e prazeres. Ele tem
uma rua de ouro, por isso há muitos que viajam por ele; no entanto, o
caminho para o céu não lhes é atraente. Não é uma trilha batida, e poucos
podem achá-la.
Os anunciadores da graça universal dizem que Cristo morreu
intencionalmente por todos, mas então por que nem todos são salvos? As
intenções de Cristo poderiam ser frustradas? Alguns afirmam tão
grosseiramente que todos serão realmente salvos, porém não foi o que disse o
Senhor Jesus: "estreita éaporta e apertado o caminho que leva à vida, epoucos há que
a encontrem. " (Mat. 7:14). Ora, como todos podem entrar por essa porta e
poucos a encontrarem, para mim parece um paradoxo! A manada dos homens
vai para o matadouro, "mas o remanescente será salvo. " (Rom. 9:27). A peça
inteira é cortada e vai para o diabo. Somente um remanescente será salvo. A
maioria das pessoas no mundo é fruto caído da árvore, derrubado pelo vento.
Aquela oliveira em Is. 17:6 com duas ou três azeitonas na mais alta ponta dos
ramos, é um símbolo apropriado do reduzido número daqueles que serão
salvos. Satanás vai embora com a colheita, Deus tem somente alguns rabiscos.
Nesta grande cidade se fizéssemos uma votação ou uma pesquisa de opinião,
o diabo certamente venceria.
Baseado no que aprendemos, observe que se fôssemos dividir o mundo
em trinta partes iguais, dezenove destas trinta estão cobertas de idolatria
barbaresca, seis dos onze restantes com a doutrina de Maomé, de modo que
restaria apenas cinco partes das trinta onde há um pouco de cristianismo.
Entre estes "cristãos" há muitos seduzidos pelos papistas por um lado e
protestantes formais por outro, de forma que há poucos que são salvos. Assim
sendo, isso deve levar-nos a um esforço cada vez maior para fazermos parte
do pequeno número daqueles que herdarão a salvação.
A terceira razão porque devemos pôr tanto vigor neste trabalho é
devido a possibilidade do mesmo. A impossibilidade mata todo o esforço.
Quem irá sofrer por algo que não tenha a esperança de conseguir? Mas "... no
tocante a isto ainda há esperança para Israel. " (Esd. 10:2). A salvação é algo
viável, ela pode ser conseguida. Ó amigos, embora a porta do paraíso seja
estreita ela ainda está aberta. Está fechada para os demônios, aberta porém
para vocês. Quem não se esforçaria por entrar por ela? É uma questão de
livrar-se de seus pecados, remover esta fina camada de barro que os mascara,
desinflar seu orgulho e assim talvez vocês possam entrar pela porta estreita.
Esta possibilidade da salvação, aliás probabilidade, deve fazer com que vocês
empenhem sua vida neste esforço. Se há alimento, por que continuarem por
mais tempo morrendo de fome em seus pecados?
APLICAÇÃO
1. Informação. Este texto mostra que a salvação não é algo tão fácil
como tantos imaginam. Muitos fantasiam um modo elegante e fino de se
chegar ao céu; um suspiro, ou lágrima, ou "Senhor, tenha misericórdia"
supondo que isso irá salvá-los. Aqueles que assim crêem estão num sonho
dourado. O texto nos fala de desenvolver nossa salvação. Basílio compara o
caminho para o céu com um homem passando por uma ponte estreita. Se ele
caminhar muito na beira ele cai e se afoga. Aquele que pensa que o caminho é
fácil, nunca esteve realmente no caminho. Há tantos preceitos a serem
obedecidos, tantas promessas nas quais crer, tantas tentações para se resistir
que não acharemos fácil o caminho.
Não basta apenas a diligencia, tem que haver também a violência.
Amados, a porta do céu não é igual àquela porta de ferro que se abriu para
Pedro espontaneamente. (Atos 12:10). Não, é necessário bater e forçar. Jacó
obteve a bênção por causa dos trajes de Esaú, os quais vestiu. O nome Esaú
em Hebraico significa trabalho. Se alguém usa o traje bordado da salvação,
deve consegui-lo trabalhando: "desenvolvei a vossa salvação ". O general Anibal
abriu caminho para seu exército através dos Alpes. Devemos abrir nosso
caminho para a glória em meio as dificuldades. Gosto da resposta dada, de
pronto, por um homem com uma picareta escavando um caminho através da
rocha: "Encontrarei o caminho ou abrirei um!"
Devemos ir para o céu através do suor e do sangue. Não se consegue
nada sem trabalhar duro. Você não pode ter o mundo sem trabalhar, e como
teria Cristo e a salvação sem fazê-lo? Um homem escava para achar uma saída
e não escavaria muito mais para achar ouro? Observa--se que Adão no paraíso
não ficou ocioso, mas ele cuidou da vinha. Mesmo os anjos, embora sejam
espíritos gloriosos, são também espíritos ministradores. (Heb. 1:14). Deus
colocou diligência mesmo nas criaturas destituídas de razão. A abelha é a
criatura mais laboriosa, todas têm sua própria tarefa para desenvolver na
colmeia. Algumas abelhas produzem o mel, outras fazem a cera, algumas
moldam o favo, e outras ficam de sentinela à porta da colmeia para afastar o
zangão. A abelha seria tão diligente em função do instinto da natureza na
fabricação do mel? Oh, quão laboriosos devemos ser no desenvolvimento de
nossa salvação!
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* Do Socínio. Salvação pelas obras.
Os Puritanos
e a conversão
Não há doutrina sobre a qual ê mais importante sermos completamente
ortodoxos do que a doutrina da conversão. Se o arrependimento estiver ausente, então
teremos antinomianismo ou fideismo. Se a fé estiver ausente, teremos apenas salvação
pelas obras. Se o entendimento da fé ou do arrependimento estiver defeituoso, haverá
pouca probabilidade que a conversão seja genuína. O Pastor Albert N. Martin, da
Trinity Baptist Church, Montville, New Jersey, diz no seu prefácio:
"A verdadeira conversão compreende a área na qual há grande confusão e
terrível engano em nossos dias, sim,mesmo entre os evangélicos que são esclarecidos
na questão da base de aceitação do pecador por Deus. Ê precisamente na área da apre-
sentação da doutrina bíblica da conversão que os pregadores puritanos têm tanto para
nos ensinar. "
Estes três tratados puritanos ajudarão o leitor a compreender melhor a doutrina
da conversão. Cada obra examina a conversão a partir de um ângulo diferente. Estes
tratados, nunca antes disponíveis em forma impressa, são:
Pecado: O Mal sem Par - Samuel Bolton
A Conversão de um Pecador - Nathaniel Vincent
A Coisa Indispensável - Thomas Watson
Cada obra tem sua própria área particular de peso em apresentar uma sã
teologia da conversão, tanto como compreensões penetrantes sobre o método da
conversão.