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SEMINÁRIO TEOLÓGICO PRESBITERIANO REV.

DENOEL NICODEMOS ELLER

CURSO DE BACHAREL EM TEOLOGIA

MARCO ANTONIO RIBEIRO

DA CERTEZA DA GRAÇA E DA SALVAÇÃO: análise da doutrina e a


importância de seu resgate

BELO HORIZONTE

2019
1

SEMINÁRIO TEOLÓGICO PRESBITERIANO REV. DENOEL NICODEMOS ELLER

CURSO DE BACHAREL EM TEOLOGIA

MARCO ANTONIO RIBEIRO

DA CERTEZA DA GRAÇA E DA SALVAÇÃO: análise da doutrina e a


importância de seu resgate

Trabalho de conclusão de curso


apresentado ao Seminário Presbiteriano
Rev. Denoel Nicodemus Eller como
parte dos requisitos da disciplina de
Monografia II ministrada pelo professor
Rev. Cleverson Gilvan de Oliveira
Moreira.

BELO HORIZONTE
2019
2

MARCO ANTONIO RIBEIRO

DA CERTEZA DA GRAÇA E DA SALVAÇÃO: análise da doutrina e a importância de


seu resgate

Orientador:____________________________________________________
Nome: Prof. Rev. Manassés Júmior Villaça
Instituição: Seminário Teológico Presbiteriano Rev. Denoel Nicodemos Eller

Examinador:____________________________________________________
Nome: Prof. Rev. Cleverson Gilvan de Oliveira Moreira
Instituição: Seminário Teológico Presbiteriano Rev. Denoel Nicodemos Eller

Examinador:____________________________________________________
Nome:
Instituição:

Belo Horizonte, ____/____/_____


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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................... 03

CAPÍTULO 1 CONCEITUAÇÃO GERAL DA DOUTRINA DA GRAÇA E DA


SALVAÇÃO ....................................................................................................... 06

1.1 Definição da doutrina ................................................................................. 06


1.1.1 Distinção entre graça e salvação ................................................................. 08
1.2 Fundamentos bíblicos da doutrina ........................................................... 09
1.2.1 Antigo testamento ....................................................................................... 09
1.2.2 Novo testamento ......................................................................................... 12
1.3 A certeza da salvação na visão da teologia reformada ............................. 16
CAPÍTULO 2 AS VERDADES DA CERTEZA DA GRAÇA E DA SALVAÇÃO 18
2.1 A falsa certeza da salvação ......................................................................... 18
2.2 A verdadeira certeza ................................................................................... 20
2.3 A ausência da verdadeira certeza .............................................................. 22
2.4 O cuidado puritano com a doutrina da certeza da salvação ..................... 23
CAPÍTULO 3 A DOUTRINA DA CERTEZA DA GRAÇA E DA SALVAÇÃO
HOJE .................................................................................................................. 26
3.1 A doutrina da certeza da graça e da salvação na modernidade ................ 26
3.2 A doutrina da certeza da graça e da salvação na pós-modernidade ....... 27
3.3 O resgaste da doutrina da graça e da salvação para a saúde
espiritual da igreja hoje ..................................................................................... 31
CONCLUSÕES .................................................................................................. 36
REFERÊNCIAS .................................................................................................. 38
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INTRODUÇÃO

É possível ter a plena certeza da graça e da salvação? Infelizmente, quando


esta pergunta tem sido respondida afirmativamente, ela vem acompanhada de um tom
de dúvida e não de convicção. Afinal, o crente genuíno, eleito por Deus poderia ainda
nesta vida gozar desta certeza? Não seria arrogância possuir tal convicção?
As Escrituras Sagradas, do antigo ao novo testamento, está repleto de textos
que apontam para a existência da plena certeza da graça e da salvação. Esta
convicção já era ensinada deste a era dos pais apostólicos, sendo lapidada no período
escolástico, pré-reforma e reforma, mas é na pós-reforma que ela foi sistematizada e
apresentada como é conhecida hoje. É justamente neste período que a Inglaterra se
torna o berço do desenvolvimento desta e de outras doutrinas e tem como pano de
fundo, grandes turbulências políticas motivadas pela economia, política e motivos
religiosos.
Ao necessitar de dinheiro e tropas para combater os presbiterianos escoceses
que se rebelaram contra a imposição do anglicanismo, Carlos I, rei da Inglaterra, não
encontra outra opção a não ser eleger um parlamento, contudo, para a infelicidade do
rei, os ingleses elegem um parlamento composto de adeptos ao puritanismo. Carlos
I, prontamente dissolve o parlamento, convoca novas eleições e é novamente
derrotado, pois o número de puritanos se torna ainda mais expressivo, e desta vez se
recusa a ser dissolvido, dando início à guerra civil.
Carlos I tenta impor o anglicanismo aos puritanos ingleses e aos escoceses
presbiterianos, porém, o parlamento, influenciado pela reforma protestante e tendo em
sua composição grande quantidade de adeptos ao puritanismo, derrota Carlos I em
1651 e traz à Inglaterra e ao País de Gales, a maior liberdade religiosa que aquele
povo jamais havia experimentado até então.
Neste meio tempo, a igreja reformada que estava avançando convoca os mais
notáveis pastores ingleses e escoceses para reestruturar a igreja da Inglaterra e
durante 6 anos estes homens se reuniram para criar aquilo que nortearia a igreja.
Nasce então em 1º de julho de 1643, o Concílio de Westminster cujos
trabalhos se estenderam por cinco anos e meio, durante os quais houveram mais de
mil reuniões do plenário e centenas de reuniões de comissões e subcomissões.
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Cria-se então nesta assembleia, 3 documentos: o breve catecismo, o


catecismo maior e a confissão de fé, sendo este último, o documento que abarca as
doutrinas basilares da fé cristã sob a ótica reformada. A Confissão de Fé de
Westminster em seu capítulo XVIII, que trata especificamente sobre a doutrina da
certeza da graça e da salvação, apresenta a ênfase pastoral quanto a essa importante
matéria. Vale notar que essa é uma doutrina que até o século XVII, não era tratada de
maneira tão específica. Geralmente os reformadores tratavam da segurança e certeza
da salvação vinculado ao estudo da fé, uma vez que havia o entendimento de que a
segurança era parte da essência da fé.
Tanto a reforma protestante, quanto o concílio de Westminster aconteceram
durante o período classificado como modernismo, como a pesquisa aponta, muito
material doutrinário foi produzido nesta época. Este material nutriu teólogos e a igreja
até os dias atuais, mas, durante o pós-modernismo, esta produção de cunho
doutrinário especialmente acerca da plena certeza da graça e da salvação sofreu um
arrefecimento, e juntamente com crescimento desordenado das igrejas
neopentecostais, que professam o arminianismo que em si é diametralmente oposto
ao calvinismo, foram fatores que culminaram no esquecimento desta doutrina.
Diante do que se observa no presente século, é perceptível a necessidade de
que haja um resgate dessa doutrina, que ela esteja presente nos púlpitos, nos
gabinetes pastorais, que de fato ela esteja presente na vida dos crentes e, seja um
meio para que Deus possa conduzir o seu povo em segurança e certeza, dando
sobejos frutos, crentes sedentos por Cristo e por sua volta, que buscam viver o céu
na terra, enquanto todas as coisas não são finalmente consumadas.
O cuidado dos puritanos com a referida doutrina vem também para desfazer
os erros direcionados a ela e colocar alguns pontos que foram tratados pelos
reformadores, de forma que traz consolo aos crentes mais fracos, que são cheios de
dúvida e desprovidos de segurança e certeza da salvação.
Sendo assim, o presente trabalho, baseado no capítulo XVIII da Confissão de
Fé de Westminster, tem como objetivo conceituar e definir a matéria em questão,
apontar os aspectos bíblicos e históricos da doutrina da plena certeza da graça e da
salvação, citar o pensamento reformado, mostrar e diferenciar a falsa certeza da
verdadeira salvação, expor a possibilidade do crente genuíno, lavado e remido ser
encontrado em pleno estado de graça, porém não possuir tal convicção. Além de
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observar o cuidado que os puritanos dedicaram à matéria em questão, apontar


algumas possíveis causas do esquecimento da referida doutrina, a necessidade de
seu resgate nos púlpitos das igrejas, sua importância e as implicações que a aplicação
da doutrina em questão produz na espiritualidade do crente.

igrejas, sua importância e as


implicações que a aplicação da
doutrina em questão produz na
espiritualidade do crente.
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CAPÍTULO 1 CONCEITUAÇÃO GERAL DA DOUTRINA DA GRAÇA E DA


SALVAÇÃO

O primeiro capítulo pretende apresentar os conceitos que abarcam a doutrina.


Em primeiro plano será apresentado a distinção entre os conceitos de graça e certeza
da salvação, posteriormente, será exposto através de uma investigação bíblico-
confessional, os fundamentos bíblicos da doutrina, como ela se apresenta no Antigo
e no Novo Testamento e por fim, expor como a doutrina da certeza da graça e da
salvação é vista pela ótica da teologia reformada.

1.1 Definição da doutrina

Todo crente que pretende se tornar um membro comungante da Igreja


Presbiteriana do Brasil, quando submetido ao exame que antecede o batismo e/ou
pública profissão de fé, é questionado pelo concílio sobre a certeza de sua salvação
e o candidato precisa responder satisfatoriamente e com convicção sobre esta
certeza, caso contrário, pode o concílio entender que este irmão não está apto para
professar sua fé de forma pública ou então ser batizado.
O capítulo XVIII da Confissão de Fé de Westminster (CFW) expõe como o
verdadeiro crente poderá ter a plena convicção de sua salvação da seguinte maneira:

Ainda que os hipócritas e os outros não regenerados podem iludir-se vãmente


com falsas esperanças e carnal presunção de se acharem no favor de Deus
e em estado de Salvação, esperança essa que perecerá, contudo, os que
verdadeiramente crêem no Senhor Jesus e o amam com sinceridade,
procurando andar diante dele em toda a boa consciência, podem, nesta vida,
certificar-se de se acharem em estado de graça e podem regozijar-se na
esperança da glória de Deus, nessa esperança que nunca os envergonhará
(CFW, 2008, p. 139).

De acordo com a exposição do primeiro parágrafo do capítulo dezoito da


Confissão de Fé de Westminster, é possível que um não crente tenha a falsa
esperança de se encontrar no favor de Deus e é também possível que o verdadeiro
crente se ache neste estado de graça e tenha plena certeza de sua salvação sem ser
envergonhado.
Mas para que o eleito desfrute desta certeza, é necessário, de acordo com a
confissão de fé em seu referido capítulo, que ele possua duas evidências, a saber, a
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interna que é caracterizada pela confirmação do Espírito Santo ao espírito do eleito e


externa que é caracterizada pelo uso dos meios comuns tais como uma crença
genuína na pessoa de Jesus e sua obra, amor verdadeiro a Deus e obediência à Sua
Palavra.

Esta certeza não é uma mera persuasão conjectural e provável, fundada


numa falsa esperança, mas uma infalível segurança da fé, fundada na divina
verdade das promessas de salvação, na evidência interna daquelas graças a
que são feitas essas promessas, no testemunho do Espírito de adoção que
testifica com os nossos espíritos sermos nós filhos de Deus, no testemunho
desse Espírito que é o penhor de nossa herança e por quem somos selados
para o dia da redenção (CFW, 2008, p. 140).

Já a evidência externa, é caracterizada pelo devido uso dos meios comuns,


sem uma revelação extraordinária de Deus.

Esta segurança infalível não pertence de tal modo à essência da fé, que um
verdadeiro crente, antes de possuí-la, não tenha de esperar muito e lutar com
muitas dificuldades; contudo, sendo pelo Espírito habilitado a conhecer as
coisas que lhe são livremente dadas por Deus, ele pode alcançá-la sem
revelação extraordinária, no devido uso dos meios ordinários. É, pois, dever
de todo o fiel fazer toda a diligência para tornar certas a sua vocação e
eleição, a fim de que por esse modo seja o seu coração no Espírito Santo
confirmado em paz e gozo, em amor e gratidão para com Deus, em firmeza
e alegria nos deveres da obediência que são os frutos próprios desta
segurança. Este privilégio está, pois, muito longe de predispor os homens à
negligência (CFW, 2008, p. 142).

A Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã define a certeza da


salvação como “a confiança do crente em Cristo de que ele, a despeito da sua
condição pecaminosa mortal, é, de forma irrevogável, um filho de Deus e um herdeiro
do céu” (ELWELL, 1988, p. 271). Sendo assim, Elwell afirma de forma clara que o
estado de graça do crente eleito no Senhor é irrevogável e que não depende de suas
obras ou pecados, sendo possível inferir de forma lógica que Deus não apenas salva
o eleito, mas também, garante este estado até o fim.
John Murray, por sua vez, define esta certeza da seguinte maneira: “Quando
falamos de certeza da fé nos referimos à certeza nutrida por um crente que está em
estado de graça e salvação, o conhecimento que ele tem de que está salvo, passou
da morte para a vida e tornou-se possuidor da vida eterna e de uma herança na glória”
(MURRAY, 1977, p. 264). Um dos grandes escritores puritanos, Thomas Geoffrey, de
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uma maneira simples a define como: A segurança da salvação é aquela que o crente
possui e lhe dá a certeza de que é um crente e que o capacita a dizer “eu sei que
meus pecados estão perdoados; eu sei que vou para o céu; eu sei porque...”, e dá as
razões” (GEOFFREY, 1996, p. 7).

1.1.1 Distinção entre graça e salvação

Todavia, o capítulo XVIII da Confissão de Fé de Westminster, trata da certeza


da graça e da salvação, mas não faz uma distinção destes dois conceitos. Existe uma
diferença entre graça e salvação? São conceitos similares? Existe alguma relação
entre elas? Sendo assim, faz-se necessário apontar a distinção entre estes dois
conceitos.
O dicionário da língua portuguesa define graça da seguinte maneira: “Ato de
benevolência ou favor que se faz ou se concede a alguém; benesse, mercê.”
Louis Berkhof, em sua teologia sistemática afirma que a palavra graça é
proveniente da tradução do termo hebraico chanan e do grego charis e é definida
como: “a graça é a concessão de bondade a alguém que não tem nenhum direito a
ela” (BERKHOF, 2012, p. 69).
E por fim, A.A Hodge, não distante das demais definições de graça,
complementa o entendimento sobre este conceito da seguinte forma:

A graça de Deus é sua bondade procurando comunicar seus favores,


sobretudo, a comunhão da Sua própria vida e felicidade, a Suas criaturas
morais – as quais, como criaturas, necessariamente não tem nenhum
merecimento – e proeminentemente Seu amor eletivo, obtendo, mediante um
preço infinito, a felicidade deles, sendo que eles merecem positivamente o
castigo divino, por serem criaturas pecaminosas (HODGE, 2001, p. 212).

Ao abordar o conceito de salvação, R.C Sproul ensina que embora a ação de


salvar possua inúmeros contextos, nas Escrituras Sagradas ela está especificamente
relacionada à redenção suprema do pecado e a reconciliação da criatura com seu
Criador:

Neste sentido, somos salvos da pior de todas as calamidades - o juízo de


Deus. A salvação suprema é concretizada por Cristo, o qual "nos livra da ira
vindoura" (1 Tessalonicenses 1.10). A Bíblia anuncia claramente que haverá
um dia de julgamento quando todos os seres humanos prestarão contas
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diante do tribunal de Deus. Para muitos, este "dia do Senhor" será um dia de
trevas, sem luz alguma. Será o dia quando Deus derramará sua irá sobre o
ímpio e impenitente. Será o holocausto supremo, a hora mais triste, a pior
calamidade da história da humanidade. Salvação suprema significa ser
poupado da ira divina que certamente virá sobre o mundo. Esta é a operação
que Cristo realiza por seu povo como seu Salvador (SPROUL, 1999, p. 191-
192).

Sendo assim, é possível afirmar que a graça de Deus é o meio pelo qual o
pecador chega ao estado de salvação e apesar de distintos, caminham lado a lado. O
homem regenerado pode, na presente vida, ter a certeza de que mesmo não
merecendo, foi alcançado pelo favor de Deus e é abençoado por Ele diariamente
(graça) e, dessa forma, agora se encontra livre da ira divina e da condenação eterna
(salvação).

1.2 Fundamentos bíblicos da doutrina

Embora soe como um pleonasmo afirmar que toda doutrina bíblica precisa ser
embasada na Bíblia, faz-se necessário citar que nem toda doutrina é bíblica, portanto
é necessário o apontamento da base bíblica tanto no antigo, quanto no novo
testamento da doutrina da certeza da graça e da salvação.

1.2.1 Antigo testamento

Olhando para o relato do nascimento de Noé vê-se a confiança do seu pai,


que por ser descendente de Adão, da linhagem de Sete, era detentor da promessa da
semente.
Lameque faz uma declaração, em Gênesis 5.29, que expressa bem essa
segura esperança: “pôs-lhe o nome de Noé, dizendo: Este nos consolará dos nossos
trabalhos e das fadigas de nossas mãos, nesta terra que o SENHOR amaldiçoou”.
Gênesis 6 – 10, mostra Noé como o homem que “achou graça diante do SENHOR”
(Gênesis 6.8); aponta Noé como um homem que gozava de segurança por meio de
seus atos de obediência e que age como quem tem certeza da sua salvação,
obedecendo cabalmente às ordens do SENHOR. Logo após o dilúvio, Deus, tendo
preservado a Noé e a sua família, estabeleceu uma aliança com ele (Gênesis 8.20-
22).
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Abraão, o reconhecido “Pai da Fé” que segundo o apóstolo Paulo, “esperou


contra a esperança” (Romanos 4.18). Teria Abraão abandonado sua terra e parentela
para um local que seria mostrado posteriormente por Deus, simplesmente por
curiosidade e não pela plena convicção da fidelidade do cumprimento das promessas
de Deus? Teria Ele obedecido ao Senhor e oferecido seu filho Isaque sem ao menos
crer em sua promessa de se fazer n’ele benditas todas as famílias da terra? Moisés
escreve em Gênesis 15.6 que “Abraão creu no Senhor e isso lhe foi imputado para
justiça”.
A despeito dos momentos inconstantes de fé que Abraão demonstra durante
sua vida quando compele sua esposa Sarai a mentir à Faraó (Gênesis 12.10-19) e
quando por influência da esposa toma sua escrava Agar e coabita com ela (Gênesis
16.1-14), é possível enxergar que a confiança que ele tinha no Deus vivo é a mesma
que todo crente genuíno deve possuir, gerando em seu coração a certeza da glória de
Deus.
Outro grande expoente da confiança em Deus no Antigo Testamento é
Moisés. A fé de seus pais fez com eles o ocultassem para que não fosse morto (Êxodo
2.3; Hebreus 11.23). Embora, inicialmente relutante, Moisés obedece ao chamado do
Senhor para ir libertar o Seu povo. A intrepidez de Moisés ante o faraó mostra a sua
segurança no SENHOR todo poderoso que o assegurara de que estaria com ele
(Êxodo 3.12), e que o havia enviado para aquela missão.
Outro ponto a ser destacado, é a amizade que Moisés desenvolveu com Deus
ao longo do tempo. Ele afirma que seu relacionamento para com o Senhor era como
o de um amigo (Êxodo 33.11).
O resultado deste relacionamento pode ser expresso através da afirmativa
que Moisés faz em seu cântico dizendo: “O SENHOR é a minha força e o meu cântico;
ele me foi por salvação; este é o meu Deus; portanto, eu o louvarei; ele é o Deus de
meu pai; por isso, o exaltarei” (Êxodo 33.2).
Com a morte de Moisés, Deus levanta Josué para dirigir o seu povo, e a
promessa para o seu servo é a seguinte: “como fui com Moisés, assim serei contigo;
não te deixarei, nem te desampararei” (Josué 1.5). Josué também demonstra
segurança e certeza de salvação por meio da sua obediência às ordenanças do
SENHOR, que demonstra sua fidelidade, graça e misericórdia para com ele e para
com o seu povo.
12

Posteriormente, após o período dos juízes, aprouve a Deus pactuar com Davi,
filho de Jessé, fazendo com ele uma aliança de um reinado eterno por meio da sua
descendência (2 Samuel 7.14-16), na qual o SENHOR deixa expresso que o Seu amor
não lhe seria tirado ao declarar: “Mas a minha misericórdia se não apartará dele” (2
Samuel 7.15).
É notório que Davi nunca foi um exemplo a ser seguido, adúltero, sanguinário,
péssimo pai, mas ainda assim, foi um homem que em momentos de tribulação, se
apegava a Deus na certeza de que Ele era a sua salvação conforme o salmo 31 que
diz: “Somente em Deus, ó minha alma, espera silenciosa; dele vem a minha salvação.
Só ele é a minha rocha, e a minha salvação, e o meu alto refúgio; não serei muito
abalado”.
Ao analisar cuidadosamente os livros proféticos, é possível encontrar
evidências desta certeza de salvação, uma leitura mais atenciosa no livro do profeta
Isaías, já no capítulo 6 que narra o seu chamamento ao ministério profético, Deus se
dirige ao profeta e declara seu atributo imutável e fidedigno em cumprir suas
promessas demonstradas até aquele momento, sobre a preservação da semente:
“Mas, se ainda ficar a décima parte dela, tornará a ser destruída. Como terebinto e
como carvalho, dos quais, depois de derribados, ainda fica o toco, assim a santa
semente é o seu toco” (Isaías 6.13).
Posteriormente, Isaías demonstra a segurança de sua salvação em Deus
dizendo: “Eis que Deus é a minha salvação; confiarei e não temerei, porque o
SENHOR Deus é a minha força e o meu cântico; ele se tornou a minha salvação”
(Isaías 12.2). Ao estudar o capítulo 25, é possível ver o profeta apontando para a
fidelidade do Senhor em cumprir suas promessas trazendo livramento para o seu povo
e também muitas outras passagens que falam do messias que viria para trazer
descanso final ao povo de Deus.
Quando Deus fala a Jeremias, o profeta é usado como boca do Senhor para
dizer que Deus estabeleceria uma nova aliança com seu povo (Jeremias 31.31), ou
seja, ao mesmo tempo em que esta era uma mensagem de conforto e restauração
para a comunidade pós-exílica, era também, uma mensagem para o tempo do Senhor
Jesus Cristo que nesta nova aliança, Deus reafirma sua intenção de restaurar a
humanidade para si mesmo e também os céus e a terra, como fica claro nos textos de
Mateus 11.28, 26.28; Primeira epístola de Paulo aos Coríntios 11.25; Segunda
epístola aos Coríntios 3.6 e a carta aos Hebreus 8.8-12.
13

Em Lamentações de Jeremias, o profeta expressa sua segurança na infinita


misericórdia de Deus e em sua fidelidade dizendo que a benignidade do Senhor jamais
acaba, as suas misericórdias não têm fim, elas se renovam a cada manhã. Grande é
a fidelidade de Deus, sua porção é o Senhor, diz a sua alma; portanto esperara nele.
Bom é o Senhor para os que esperam por ele, para a alma que o busca. Bom é ter
esperança, e aguardar em silêncio a salvação do Senhor (Lamentações 3.22-25).

1.2.2 Novo testamento

Logo no início do Novo Testamento, no Evangelho segundo Mateus é possível


encontrar fortes evidências que sustentam a doutrina da segurança e certeza da
salvação. Ao analisar a genealogia de Jesus, em Mateus 1.1-16, é notório a fidelidade
de Deus em manter o seu pacto, independente dos pecados cometidos por aqueles
que são listados na genealogia e por aqueles que foram convertidos posteriormente,
como é o exemplo de Raabe e Rute.
Ainda no Evangelho de Mateus, outra passagem que fundamenta e evidencia
a doutrina da segurança e certeza da salvação é o relato da grande comissão (Mateus
28.18-20). Antes de ser assunto aos céus, o Senhor Jesus faz uma declaração muito
importante para os discípulos: “Eis que estou convosco todos os dias da minha vida
até a consumação dos séculos”. Essa segurança é tanto temporal, como pode ser
observada na declaração no Salmos 23 “todos os dias da minha vida”, bem como
eterna, a presença do Senhor é a garantia de segurança primordial para o crente
eleito.
Já o evangelho de Marcos inicia seu livro com uma expressão que aponta para
aquele em que culmina o processo de revelação Marcos utiliza a expressão -
εὐαγγέλιον, que quer dizer: Boas novas (Marcos 1.1). Essas boas novas apontam para
o cumprimento das promessas pactuais do antigo testamento, e também para a
fidelidade de Deus em cumprir suas promessas independente da ação do homem.
O doutor Lucas, em seu evangelho, apresenta várias evidências que também
fundamentam a certeza da salvação por meio do cumprimento das promessas de
Deus. Logo no primeiro capítulo, ao fazer o anúncio do nascimento de Jesus, o anjo
diz à Maria que aquela criança será grande e será chamada Filho do Altíssimo; Deus,
o Senhor e lhe dará o trono de Davi, seu Pai; e ele (Jesus) reinará para sempre sobre
14

a casa de Jacó, e o seu reinado não terá fim” (Lucas 1.32.33). Nesta referência em
especial, é encontrada a promessa feita a Davi registrada no segundo livro do profeta
Samuel se cumprindo na pessoa de Jesus, uma clara demonstração da fidelidade de
Deus no cumprimento de suas promessas.
Ainda no evangelho de Lucas, Maria, a mãe de Jesus, ao entoar um cântico
de louvor a Deus após a visitação do anjo, aponta para a certeza de sua salvação
declarando que sua alma engrandece ao Senhor e que o seu espírito se alegra em
Deus, o seu salvador.
O Evangelho segundo João também apresenta diversas evidências que dão
sustentação à doutrina da certeza da graça e da salvação. Iniciando pela descrição da
encarnação do Verbo (João 1.1-3) e com a seguinte declaração: “Mas, a todos quanto
o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, a saber, aos que creem
no seu nome; os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da
vontade do homem, mas de Deus” (João 1.12, 13). Aqui é possível ver a imensidão
da graça de Deus, sua incondicional fidelidade para salvar o eleito, independente de
seus atos, e também a ampliação a todos aqueles que crerem independente de
fazerem parte do povo de Israel ou não, que são caracterizados por nascer da vontade
de Deus.
Paulo é tido por muitos estudiosos como o maior líder do cristianismo, em seus
escritos é possível encontrar uma série de versículos que demonstram que o apóstolo
tinha plena certeza de sua salvação. Começando pela Epístola de Paulo aos
Romanos, no capítulo 5, o apóstolo mostra a segurança e certeza que ele tem na
justificação por meio de Cristo, por meio de quem, o homem, é reconciliado com o Pai
(8-11). John Murray declara que Romanos 5: 5 tem um notável exemplo de
combinação das bases objetivas e da certeza subjetiva da esperança do crente:

Neste versículo, somos informados das razões por que a esperança é firme
e segura. Não se trata de uma esperança que nos envergonhará, tampouco
é uma esperança na qual precisemos nutrir qualquer vergonha. Pelo
contrário, é uma esperança da qual podemos nos gloriar e protestar contra
todos os adversários. Ela jamais nos desapontará e se mostrará ilusória. Por
quê? Por que o amor de Deus é derramado em nosso coração, pelo Espírito
Santo que nos foi outorgado (MURRAY, 2012, p. 190-191).

Ainda em Romanos, Paulo faz um exponencial discurso retórico, repleto de


perguntas e respostas, claramente utilizando o estilo diatríbico presente também em
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sua epístola aos Coríntios. Paulo pergunta: “Quem nos separará do amor de Cristo?”
(Romanos 8). A resposta final que o apóstolo traz ao conhecimento de seus leitores é
que nenhum poder, nenhum homem, absolutamente nada é capaz de separar os
eleitos do amor de Deus que está em Cristo Jesus.
Em Filipenses, Paulo faz uma das suas principais afirmações que embasam
a certeza na salvação. No capítulo 3, versículo 8 ele diz: “Sim, deveras considero tudo
como perda, por causa da sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor,
por amor do qual perdi todas as coisas e as considero como refugo, para ganhar a
Cristo”. Para perder o que perdeu, abrir mão de toda uma vida consolidada, farta e
confortável que qualquer cidadão romano poderia desfrutar, tal sentença só poderia
ser proferida por alguém que realmente tivesse certeza de sua salvação, caso
contrário, seria abandonar o certo para trocar pelo duvidoso.
Ao analisar as epístolas gerais, é possível encontrar fundamento para a
doutrina da certeza da graça e da salvação na primeira epístola de Pedro, ele inicia
sua carta louvando a Deus pela salvação de seus leitores dizendo: “Bendito o Deus e
Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, segundo a sua muita misericórdia, nos
regenerou para uma viva esperança, mediante a ressurreição de Jesus Cristo dentre
os mortos, para uma herança incorruptível, sem mácula, imarcescível, reservada nos
céus para vós outros que sois guardados pelo poder de Deus, mediante a fé, para a
salvação preparada para revelar-se no último tempo” (1 Pedro 1.3-5).
Ora, o que seria uma “viva esperança”, “herança incorruptível”, “imaculada”,
“imarcescível” e que está “reservada nos céus”, senão a plena certeza da salvação
que o homem pode ter em Cristo Jesus? De forma maravilhosa e clara, a primeira
epístola de Pedro assegura aos eleitos que sua salvação não dependia da obediência
deles, mas daquilo que o Senhor Jesus fez já antes da fundação do mundo –
derramando seu sangue para remir os pecados dos escolhidos (capítulo 1, versículos
19, 20). Aqui Pedro estabelece um forte argumento da salvação pela graça, pois o
eleito de Deus é salvo através do derramamento de sangue do cordeiro antes da
fundação do mundo o qual é aplicado pela fé, tanto no Antigo Testamento como no
Novo Testamento.
No verso 25, ainda no primeiro capítulo, Pedro ressalta a fidelidade e
imutabilidade de Deus em cumprir suas palavras: “a palavra do Senhor permanece
para sempre”. Pedro ainda fundamenta a segurança do crente mostrando Cristo como
16

“pastor e bispo da vossa alma” (capítulo 2, versículo 25); mostrando a eficácia da


morte de Cristo para conduzir o homem a Deus (capítulo 3, versículo 18), bem como
os benefícios de sua ressurreição e exaltação.
Ainda analisando as epístolas gerais, é encontrado uma variedade enorme de
passagens que evidenciam a doutrina da certeza da graça e da salvação. João, em
sua primeira carta, logo no primeiro capítulo declara que Cristo é o advogado dos
crentes junto ao Pai, e que se o crente pecar Ele advogará a sua causa. João vai
também estabelecer diretrizes para o verdadeiro crente aferir sua verdadeira eleição:
O cristão que está seguro e certo da sua salvação vai buscar viver de acordo com um
cidadão do céu.
Outro aspecto muito forte nessa Epístola é a exposição que João faz acerca
do amor de Deus para com o eleito. Aqui se encontra mais um dos grandes
fundamentos da doutrina da segurança e certeza da salvação (capítulo 3, versículos
7-21). João declara que “no amor não existe medo; antes o perfeito amor lança fora o
medo” (versículo 8a). Logo, diante dessa afirmação o crente repousa seguro no
perfeito amor de Deus, o qual nos faz amar a Ele.
Por fim, o livro o apocalipse pode ser considerado um compêndio da doutrina
da segurança e certeza da salvação. O livro coroa a revelação de Deus, deixando
claro o caráter progressivo da Escritura, com o maior número de alusões ao Antigo
Testamento, o que, por sua vez, mostra ao leitor que “a redenção em Cristo é o
cumprimento dos planos eternos de Deus. A forma como João apresenta Jesus
(versículo 5-8), a saber: a Fiel Testemunha, o Primogênito dos mortos e o Soberano
dos Reis da terra, aponta para o cumprimento fiel das promessas de Deus no Antigo
Testamento. No versículo 5, o amor de Deus é apontado, bem como, a eficácia da
obra expiatória do Senhor, assim como seus benefícios na vida dos crentes (versículo
6).
Diante desses primeiros versos do livro de apocalipse, o crente verdadeiro é
conduzido a segurança e certeza salvação ao ver a ratificação das promessas, bem
como a confirmação da eficácia da obra de Cristo ao seu favor, sendo assim,
conduzido à certeza da entronização obtida, na escatologia inaugurada, em Cristo
Jesus, sua morte, e ressurreição.
17

1.3 A certeza da salvação na visão da teologia reformada

A doutrina da certeza da graça e da salvação não foi cunhada na reforma


protestante. Ainda no período dos pré-reformadores, John Wycliffe entendia que “se
a salvação é inteiramente de Deus, então a graça nunca pode ser perdida. Graça
salvífica é graça preservadora – Deus aguardará os predestinados antes da fundação
do mundo seguros por todas as eras porvir” (LAWSON, 2013. p. 440). Wycliffe já
utilizava um raciocínio lógico para entender a certeza da salvação, se ela é aplicada
ao eleito pela graça de Deus, é impossível que o homem, mesmo que ele deseje, a
perca.
A Igreja Católica Apostólica Romana ligava a questão da segurança da
salvação diretamente ao fato de o indivíduo estar coligado à Igreja, obtendo dela os
benefícios de segurança da sua salvação. Não é à toa que ela declara que: “fora da
Igreja não há salvação nem remissão de pecados” (BETTENSON, 2007, p. 192),
sendo assim, ela transformava o sentimento de esperança nas eternas promessas de
salvação em instrumento de ameaça para arrebanhar cada vez mais fiéis, não por
amor a Cristo e sua obra, mas por medo de ser condenado ao inferno.
Martinho Lutero, o estopim do movimento reformador, entra em cena, começa
a divergir da Igreja Católica e busca corrigir as tenebrosas distorções doutrinárias que
imperavam sobre o cristianismo. Dentro de sua maior obra, as 95 teses, na de número
52, ele escreve a seguinte afirmação acerca da certeza: “A certeza da salvação por
cartas de perdão é vã, mesmo que o comissário, ou melhor, mesmo que o próprio
papa desse sua alma sobre ela” (LUTERO, 2009, p. 11). O desejo de Lutero era para
que os homens tivessem a plena convicção de que serão salvos, não pelas cartas
expedidas pelo papado e muito menos pela ameaça de que fora da igreja não existia
a possibilidade de salvação, mas pela certeza da graça e da salvação que vem de
Deus.
João Calvino dava muita atenção à doutrina da certeza da salvação que
segundo ele, estava intimamente ligada à questão da fé:

Ora, onde quer que exista esta fé viva, necessariamente irá acompanhada da
esperança na vida eterna; ou, melhor dizendo, ela a engendra e produz. E,
portanto, pode-se obter uma definição perfeita de fé, se dissermos que ela é
o firme e seguro conhecimento da divina benevolência para conosco, fundado
18

sobre a veracidade da promessa graciosa feita em Cristo, não só é revelado


à nossa mente, mas é também selado em nosso coração mediante o Espírito
Santo (CALVINO, 2006, p. 67).

Pelo que foi exposto acima, analisando partes do antigo e do novo testamento,
e através do pensamento dos dois grandes homens da reforma, é necessário afirmar
que a doutrina da certeza da graça e da salvação é encontrada nas Sagradas
Escrituras, tanto no antigo, quanto no novo testamento e é amplamente defendida
pelos reformadores Martinho Lutero e João Calvino.
19

CAPÍTULO 2 AS VERDADES DA CERTEZA DA GRAÇA E DA SALVAÇÃO

Uma vez definido os conceitos da doutrina estudada, a doutrina da certeza da


graça e da salvação, seus fundamentos bíblicos no Antigo e Novo Testamento e sua
visão à luz da teologia reformada, faz-se necessário distinguir os aspectos da falsa e
da verdadeira certeza acerca da graça e da salvação. Além disso, apontar a existência
da possibilidade do eleito de Deus viver sem esta certeza, mesmo vivendo em estado
de graça, e por fim, expor o cuidado puritano com a referida doutrina na questão
prática, uma vez que tal assunto será novamente abordado no capítulo final deste
estudo.

2.1 A falsa certeza da salvação

A Confissão de Fé de Westminster (2008) apresenta a existência de duas


certezas acerca da graça e da salvação, sendo uma falsa e a outra, verdadeira. E uma
vez que a verdadeira certeza está reservada somente para os eleitos de Deus, é
factível pensar que existe uma parcela de pessoas que, embora não façam parte
daqueles que Deus chamou através da vocação eficaz, possuem esta falsa certeza.
O próprio Senhor Jesus, em Mateus, 7.22,23 afirma sobre esta possibilidade
de o ímpio possuir esta falsa certeza fazendo a seguinte afirmação:

Muitos, naquele dia, hão e dizer-me: Senhor, Senhor! Porventura, não temos
nós profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios, e em
teu nome não fizemos muitos milagres? Então, lhes direi explicitamente:
nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a iniquidade.

Jesus não apresenta um número estatístico, Ele apenas diz que existem
pessoas que estão enganadas acerca da salvação, que estão convictos de sua
salvação quando na verdade não estão, daí caracteriza-se esta falsa certeza.
Hodge (2016), em seus comentários acerca da CFW, reafirma a possibilidade
desta falsa certeza dizendo o seguinte:

Que os não regenerados, seduzidos pelo desejo natural de obter a felicidade,


lisonjeados pelo amor próprio e traídos pelo espírito de autojustiça e
autoconfiança, com frequência nutrem uma infundada segurança de sua
própria condição de graça, torna-se antecedentemente provável à luz do que
conhecemos da natureza humana (...) (HODGE, 2016, p. 324).
20

Através das palavras de Hodge, fica claro o entendimento de que a falsa


certeza não é fruto de uma confusão ou de dúvida, mas esta falsa convicção é oriunda
do próprio ego do indivíduo por pensar estar salvo mediante as obras de suas mãos
e não pelas de Cristo.
João Calvino, em sua obra mais conhecida, mostra que existem muitos que
vivem em falsa segurança, como é possível ver em seu comentário:

Há também aqueles que vão além, porque não só têm a Palavra de Deus por
oráculo certíssimo, nem negligenciam totalmente seus preceitos, mas até de
certa forma se deixam afetar pelas ameaças e promessas. A tais, na verdade,
atribui-se o testemunho da fé, mediante κατάχρησιν [Katáchrēsin – uso
impróprio], uma vez que não resistem à Palavra de Deus em manifesta
impiedade, nem a rejeitam nem a desprezam; pelo contrário, antes lhe exibem
certa aparência de obediência (CALVINO, 2006, p. 33).

Em seguida, Calvino assevera que essa fé é indigna do título de fé trazendo


a lembrança o relato de Simão, o Mago (Atos 8.13,18,19). Calvino fala acerca dessa
falsa fé, a qual não chega ao coração, e aponta a ineficácia dela:

Compreendam, pois, os que se gloriam de tais aparências e simulacros de fé


que, neste aspecto, em nada lucram aos diabos. Aqueles de quem primeiro
falamos lhes são de fato muito inferiores, os quais, apalermados, ouvem e
compreendem coisas por cujo conhecimento os diabos estremecem [Tiago
2.19]; os outros nisto lhes são pares: qualquer que seja a natureza do
sentimento de que são tocados, termina, afinal, em terror e consternação
(CALVINO, 2006, p. 34).

Ainda falando da aparente e ineficaz fé dos réprobos, que conduz a falsa


segurança, Calvino diz:

(...) enquanto são levados de súbito impulso de zelo, enganam-se a si


próprios com uma opinião falsa. Nem há dúvida de que deles se assenhoreie
a displicência, de sorte que não examinam devidamente o próprio coração,
como seria de esperar. É provável que tais tenham sido aqueles em quem,
conforme o testifica João, ‘Nem mesmo Jesus confiava neles, porque
conhecia a todos; e não necessitava de que alguém testificasse do homem,
porque ele bem sabia o que havia no homem’ [João 2.24, 25]” (CALVINO,
2006, p. 37).

De forma prática, Lloyd-Jones mostra que a falsa segurança da salvação é


uma arma que o Diabo usa para manter as pessoas em suas ciladas. Diante disso,
ele declara: “A primeira coisa que ele faz é tentar dar-nos uma falsa segurança, uma
21

falsa tranquilidade, uma falsa paz e uma falsa alegria” (LLOYD-JONES, 1991, p. 199).
Lloyd-Jones chama atenção para uma lista de características que apontam falsa
segurança na vida de um indivíduo, a saber:

A pessoa não apresenta mudança de vida, não há transformação substancial


nele, o que se vê são falsas evidências que podem ser imitadas; essa pessoa
nunca fica preocupada consigo mesma quanto a sua salvação; sempre tem
grande aversão pelo autoexame, pois eles estão sempre muito bem; outro
problema é que essas pessoas nutrem uma forma de antinomianismo, ou
seja, suas ações não condizem com suas grandes reivindicações (LLOYD-
JONES, 1991, p. 200-203).

2.2 A verdadeira certeza

Diferentemente da falsa certeza da salvação que é caracterizada pelo desejo


de obter a felicidade mediante o amor próprio e a promoção da auto-justiça, a
verdadeira certeza tem seu início em Deus mediante o testemunho interno do Espírito
Santo e é corroborado pela existência do testemunho externo que serão expostos a
seguir.
Fazendo uma breve distinção destes dois testemunhos, o interno pode ser
caracterizado da seguinte forma: “A base para a verdadeira certeza está nas
promessas contidas no Evangelho, a qual remete à toda a Escritura Sagrada. E essas
promessas só são aplicadas, ao coração do eleito, pelo Espírito da promessa, o
Espírito Santo” (DIAS, 2017, p. 47).
Calvino também fala acerca da importância do testemunho do Espírito Santo
conferindo segurança e certeza ao coração do crente. Quanto a isso, ele diz: “(...) o
Espírito Santo é o eterno ensinador, pela operação de quem à mente nos penetra a
promessa da salvação, promessa que, de outra sorte, apenas feriria o ar ou nossos
ouvidos” (CALVINO, 2006, p. 22.)
A certeza da salvação, portanto, não repousa sobre experiências emocionais,
mas sobre a convicção pessoal criada pelo Espírito Santo no coração dos pecadores,
de que foram perdoados, foram adotados na família de Deus como filhos amados e
que pertencem a Ele para sempre.
Paulo em sua epístola à igreja de Roma, Romanos 8.14-16, afirma sobre o
testemunho interno do Espírito Santo que testifica ao nosso espírito esta verdadeira
certeza:
22

Pois todos os que são guiados pelo Espírito de Deus são filhos de Deus.
Porque não recebestes o espírito de escravidão, para viverdes, outra vez,
atemorizados, mas recebestes o espírito de adoção, baseados no qual
clamamos: Aba, Pai. O próprio Espírito testifica com o nosso espírito que
somos filhos de Deus.

Sendo assim, a evidência interna desta certeza não é uma mera conjectura
ou algo proveniente do coração do crente, mas da parte do Espírito Santo. É uma obra
que tem seu início em Deus e é testificada ao espírito do eleito.
Já o testemunho externo é definido pela confissão de fé (CFW) como uma
verdadeira crença no Senhor Jesus, amor sincero a Ele e o andar diante dele em toda
a boa consciência.
Nesse sentido, há também uma forte demonstração e cuidado pastoral, por
parte dos puritanos, de que a certeza do crente seja evidenciada por meio de frutos,
ou seja, manifestações externas, visíveis. Isso fica bem evidente na obra de Thomas
Watson, na qual ele mostra alguns frutos ou evidências que acompanham de perto
aqueles que tem a plena segurança e certeza da salvação em suas vidas. Diante
disso, Watson, destaca os seguintes frutos que a segurança e certeza vão gerar na
vida do crente:

Primeiro, a certeza nos fará amar a Deus e louvá-lo... Segundo, a certeza


contagiará todas as demais alegrias da criatura... Terceiro, certeza nos fará
ativos e vivos no serviço a Deus; estimulará nossa oração e aguçará nossa
obediência. Quarto, a certeza será um escudo dourado para vencer a
tentação e ajudará a triunfar sobre ela... Quinto, a certeza nos fará contentes,
embora tenhamos pouca coisa no mundo. Aquele que tem o suficiente está
contente... Sexto, a segurança apoiará o coração nos sofrimentos, fará o
cristão suportar problemas com paciência e com alegria... Sétimo, a
segurança trará paz a uma consciência agitada... Oitavo, a segurança nos
fortalecerá contra os medos da morte... (WATSON, 2009, p. 291–295).

Na perspectiva de Watson, o crente seguro deve andar da seguinte maneira:


primeiramente ele deve buscar não desprezar essa certeza vivendo em pecados e
descuidado das suas obrigações; ele deve ser extremamente grato a Deus e admirar
sua misericórdia dispensada em sua vida; deve admirar o amor de Deus em sua vida;
deve também desenvolver essa certeza a cada dia fazendo com que ela aumente
mais e mais, e isso, para glória de Deus, de maneira que possa encorajar outros,
ajudar outros a aumentar o consolo em suas vidas e ainda andar de maneira celestial;
além disso, ele deve desejar um estado de glorificação e cuidar em cultivar essa
segurança e certeza da salvação para que não a perca.
23

Lloyd-Jones, enfatiza que a certeza na vida do crente gera alguns desejáveis


frutos. Primeiramente ele mostra que a certeza gera regozijo. Diante disso, ele declara
que: “se não temos certeza, não podemos nos regozijar-nos, de modo que a obra de
Deus em nós, pela graça, está incompleta, a não ser que tenhamos certeza” (LLOYD-
JONES, 2009, p 56).
É possível inferir que ambos testemunhos, interno e externo, caminhem juntos
no tocante à certeza da graça e da salvação. O Crente que possui esta certeza
aplicada pela exclusiva obra do Espírito Santo, precisa necessariamente apresentar
frutos desta convicção sendo impossível a dissociação destes dois testemunhos. É
possível que o crente, em vida não tenha certeza de sua salvação, assunto que será
abordado a seguir, mas é impossível que ele, sendo eleito por Deus, salvo mediante
a obra de Cristo, não apresente estes dois testemunhos porque pelo fruto se conhece
a árvore (Mateus. 12.33).

2.3 A ausência da verdadeira certeza

A Confissão de Fé de Westminster (CFW) se cala sobre a possibilidade da


ausência da verdadeira certeza da graça e da salvação na vida dos eleitos de Deus.
Ela afirma que o crente pode ter esta certeza interrompida por um espaço de tempo,
mas não viver sem experimentá-la.
Davi, no salmo 22, versículo 1, o salmo que é citado por Jesus durante sua
crucificação, expõe esta ausência afirmando ter sido desamparado por Deus e
distante de sua salvação, ao analisar o salmo 33, é possível encontrar o mesmo Davi
dizendo no versículo 22 que estava excluído da presença de Deus. Ainda não
possuindo tal convicção, Davi não deixou nutrir verdadeira fé.
Os reformadores como Lutero e Calvino, apresentam bastante dificuldade em
aceitar a possibilidade de o eleito de Deus viver sem ter a plena certeza de seu estado
de graça. Martinho Lutero classifica este comportamento como sendo um
comportamento de um incrédulo dizendo: “a falta de segurança é incompatível com o
fato de ser um cristão” (BEEKE, 2003, p. 42).
João Calvino também se apresenta resistente com relação à esta
possibilidade, ele faz duras asseverações direcionadas aos que possuem dúvidas
quanto à certeza se expressando da seguinte maneira: “afirmo que ninguém é fiel
24

senão aquele que, arrimado na certeza de sua salvação, zomba confiadamente do


diabo e da morte” (CALVINO, 2006, p. 41).
Doravante, ao expressar o pensamento puritano e sua ênfase pastoral,
Thomas Brooks se dirige ao duvidoso dizendo que: “O homem que não tem certeza
do amor e do favor de Deus, ou da remissão dos pecados e da salvação de sua alma,
pode, contudo, ter a verdadeira graça da redenção” (WATSON, 2009, p. 291).
R.C Sproul (2013) desenvolve um posicionamento semelhante ao de Brooks,
apontando a possibilidade da ausência de certeza. Ele defende seus argumentos
baseados em 1Pedro 1.3-11, indicando que algumas pessoas podem estar em um
estado de salvação, sem terem realmente a segurança de salvação.
Sendo assim, a Confissão de Fé de Westminster, juntamente com os teólogos
reformados supracitados concordam que existe de fato duas certezas acerca da graça
e da salvação, sendo que a primeira certeza é oriunda de uma falsa presunção, que
faz com que o ímpio, alimente dentro de si certeza de que este se encontra em estado
de graça e salvação, todavia esta certeza é confundida pelo forte desejo da obtenção
da felicidade e pelo engano da autoconfiança, já a outra, a verdadeira certeza, é fruto
da evidência interna caracterizada pela confirmação do Espírito Santo com o espírito
do homem e da evidência externa que é caracterizada pelos frutos, ou no caso,
silogismos gerados no coração do verdadeiro crente.
Entretanto, ainda que a confissão de fé de Westminster e os dois maiores
expoentes da fé reformada não reconheçam a ausência desta verdadeira certeza na
vida do eleito, é possível encontrar textos bíblicos que apontam para esta perspectiva
e teólogos de renome que corroboram com esta possibilidade, porém, conforme
averiguado acima, ainda que o eleito não possua tal convicção, ele não deixa de
cultivar verdadeira fé em Cristo Jesus.

2.4 O cuidado puritano com a doutrina da certeza da salvação

É importante citar o cuidado puritano aqui nesta última parte do capítulo. A


assembleia de Westminster foi composta majoritariamente por teólogos e pastores
puritanos, sendo assim, a confissão de fé e as doutrinas contidas nela exalam o
puritanismo e faz-se necessário observar como estes nobres homens sistematizaram
25

a doutrina da certeza da graça e da salvação e como ela é aplicada de forma prática


na vida do eleito.
A partir do século XVII, o pensamento puritano desenvolveu uma certa
unidade de pensamento sobre a supracitada doutrina, ao observar suas pesquisas
acerca da certeza da salvação, Joel Beeke, conclui que “na década de 1640, o
pensamento puritano inglês era quase unânime aos distintivos da segurança...”
(BEEKE, 2003, p. 155). Essa unidade de pensamento, pode ser observada nos
seguintes pontos:

primeiro, os puritanos ensinavam que a fé salvadora deve ser distinguida da


segurança; segundo, eles ensinavam que é, especialmente, mediante a obra
do Espírito Santo que os crentes obtêm a segurança pessoal; terceiro,
ensinavam ainda que, essa obra asseguradora do Espírito tem como base o
pacto da graça e a obra salvadora de Cristo, a qual baseia-se no soberano
propósito e amor de Deus na eleição eterna; quarto, ensinavam também que
ainda que essa segurança não fosse completa nesta vida, ela deveria ser,
pelos meios de graça, buscada com todo empenho (BEEKE, 2003, p. 155 –
163).

Os puritanos cultivaram um aspecto muito prático no tocante à doutrina da


certeza da salvação. Tanto eles, como a Confissão de Fé de Westminster declaram
convictamente que a salvação é uma obra monergística da parte de Deus, ou seja,
Deus age em favor do eleito sem que este necessite fazer algo para que seja salvo.
Esta salvação é executada pelo sacrifício vicário e cabal de Cristo Jesus na cruz do
calvário e aplicada ao coração do eleito mediante a vocação eficaz proveniente do
Espírito Santo que testifica ao coração do eleito sua salvação em Cristo Jesus,
contudo, o testemunho interno do Espírito Santo não é o único testemunho que
evidencia esta certeza, existe ainda os frutos externos que são uma espécie de
resposta visível diante de uma convicção sincera que o eleito precisa desenvolver ao
longo de sua caminhada cristã, alguns puritanos como Thomas Watson e Joel Beeke
chamam estas evidências externas de silogismos.
Thomas Watson entendia que a certeza de salvação consistia de um silogismo
prático e lógico na qual a Escritura exerce o papel principal: “A Palavra de Deus diz
que quem teme e ama a Deus é amado de Deus. Essa é a proposição principal, então
a consciência faz o papel secundário, “mas eu temo e amo a Deus”, então, o Espírito
faz a conclusão: “Portanto és amado de Deus” (WATSON, 2009, p. 290).
26

Thomas Brooks, também apresenta alguns silogismos que são evidenciados


na vida daquele que nutre a certeza da salvação. Ele diz que "Estar no estado de
graça concede ao homem o céu no futuro; saber que está no estado de graça concede
o céu agora e no futuro" (BROOKS, 2014, p. 167).
Faz-se necessário apontar que tais posicionamentos são claramente
encontrados na Confissão de Fé de Westminster. Posto isto, vê-se que a preocupação
pastoral dos puritanos quanto a verdadeira segurança do crente, é fruto de uma
preocupação fundamentada e exemplificada nas Escrituras, bem como o alinhamento
com o pensamento dos reformadores.
27

CAPÍTULO 3 A DOUTRINA DA CERTEZA DA GRAÇA E DA SALVAÇÃO HOJE

O terceiro capítulo do presente trabalho destina-se a apresentar a doutrina da


certeza da graça e da salvação nos dias de hoje. Evidenciando como ela tem sido
vista em tempos de modernidade e pós-modernidade e o principal, qual a importância
da necessidade do resgate de tal doutrina e sua relevância para a saúde espiritual da
do eleito e da igreja hodierna.

3.1 A doutrina da certeza da graça e da salvação na modernidade

A Idade Moderna é uma época da História que tem início em 1453, com a
tomada de Constantinopla pelos turcos otomanos, indo até 1789, que marca o início
da Revolução Francesa. Dentro deste cenário, dois acontecimentos em especial
transformaram o mundo, o primeiro deles foi a reforma protestante, liderada por
Martinho Lutero em 31 de outubro de 1517 e o outro, oriundo da reforma que foi a
assembleia de Westminster, um concílio formado pelos mais notáveis pastores da
Inglaterra e que em quase sua totalidade, era formado por puritanos. A assembleia
convocada pelo parlamento inglês teve seu início em julho de 1634 em uma das salas
da Abadia de Westminster, em Londres, este concílio elaborou três documentos: A
confissão de fé, documento que abarca dentre outras, a doutrina da certeza da graça
e da salvação, e os catecismos (breve e maior), portanto, torna-se impossível falar da
Confissão de Fé de Westminster e não falar dos puritanos.
Augustus Nicodemus Lopes faz uma importante análise do pensamento
puritano dentro do contexto social no período da idade moderna. Ele liga a ousadia
dos puritanos ao enfrentarem reis e rainhas à certeza da salvação.
Nicodemus diz:

Quando nós pensamos que uma das coisas que impulsionava a máquina
puritana, ou todo o movimento puritano, e os levava àquela ousadia de
enfrentar reis e rainhas, lembramo-nos que tudo era decorrente da convicção
e da certeza advindas do fato de estarem plenamente seguros de que Deus
estava ao lado deles. Portanto, esta questão da certeza da salvação, da
certeza da eleição, é fundamental no movimento puritano. Eles achavam que
esta era a maior bênção que alguém poderia ter ainda neste mundo. Por isso
este tema é importante de ser conhecido (LOPES, 2019).
28

Com o foco ainda nas palavras de Nicodemus, ele reforça a importância que
os puritanos davam para a certeza da salvação:

Os puritanos davam muita ênfase na certeza plena da sua salvação. Sabiam


que o propósito do homem é glorificar a Deus e gozá-lo para sempre, mas
entendiam que, enquanto não se alcançasse essa certeza plena de que você
era um eleito, não poderia glorificar a Deus de forma total (LOPES, 2019a).

Sendo assim, este pensamento acerca da certeza da salvação era a base das
reformas externas que eles pretendiam fazer na Igreja que havia rompido com o
catolicismo romano, mas aspirava ameaças do sistema episcopal por meio do
Anglicanismo e no Estado que por três vezes dissolveu um parlamento porque era
formado em sua grande maioria por puritanos. A certeza que eles tinham de que eram
povo eleito de Deus, lhes dava coragem para além das portas da Igreja e enfrentar o
mundo aplicando a Palavra de Deus em todos os aspectos da vida.

3.2 A doutrina da certeza da graça e da salvação na pós-modernidade

O período pós-moderno, tem seu início após a Segunda Guerra Mundial que
começa em 1939 e perdura até os dias atuais. Se no modernismo, a produção de
material acerca da certeza da salvação foi efervescente após a assembleia de
Westminster, no pós-modernismo essa produção teve uma drástica diminuição. Os
teólogos reformados do Século XX sempre empreenderam esforços para defender a
doutrina da certeza da salvação, porém, lançando mão de produções literárias do
modernismo.
D.A Carson, em seu artigo intitulado de Reflection on Christian Assurance, ou
traduzindo para o português, reflexões sobre a segurança cristã, publicado no
Westminster Theological Journal afirma que em cinco décadas não houve um
tratamento importante acerca da referida doutrina. Carson diz: “Tanto quanto sei, não
houve tratamento em grande escala em língua inglesa da teologia bíblica da
segurança cristã por mais de cinquenta anos” (CARSON, 1992, p. 1).
Sendo assim, os teólogos do pós-modernismo se serviram do material
produzido no período moderno, criando uma lacuna e enfraquecendo o ensino
doutrinário acerca da certeza da salvação.
29

Porém, essa escassez de produção de material confessional, não foi o único


causador do arrefecimento desta e das demais doutrinas. Outros dois possíveis
causadores deste esfriamento da produção e propagação foram a herança da teologia
apostólica romana levada por novos convertidos para dentro das igrejas evangélicas
e a invasão da terceira onda do movimento pentecostal, mais popularmente conhecida
como neopentecostalismo que surgiu em meados dos anos 70 e trouxe em si uma
doutrina diametralmente antagônica ao Calvinismo, o Arminianismo.
A Igreja Católica Apostólica Romana, fortemente influenciada pelo
pelagianismo (doutrina de convicção dos pelagianos, segundo a qual o homem era
totalmente responsável por sua própria salvação e que minimizava o papel da graça
divina), se inclinou por negar, não totalmente, a possibilidade da certeza da graça e
da salvação, porém, ela repudia a absoluta segurança, indo contra a visão reformada
da referida doutrina. Sérgio Lyra, em seu artigo sobre a certeza de salvação faz esta
importante constatação, ligando a decisão da igreja romana ao concílio de Trento que
aconteceu em 1647. Lyra diz:

É neste contexto que em 1647 o Concílio de Trento estabelece que as


pessoas não podem ter certeza de sua salvação, exceto se houver uma
revelação especial. Na verdade, a posição da Igreja de Roma não foi a
negação total da doutrina da segurança da fé, mas uma rejeição da absoluta
segurança repudiando a visão protestante (LYRA, 2019).

Posto isto, aqueles que abandonam o catolicismo e abraçam a fé evangélica,


iniciaram uma caminhada cristã não tendo o conhecimento da doutrina da certeza da
salvação ou então, tendo o conhecimento muito raso, e instruído por certo tempo pela
igreja romana, aprendeu erroneamente que tal absoluta segurança só era possível
mediante a uma revelação especial, ou então era repudiável.
O Arminianismo é uma escola de pensamento baseada sobre as ideias do
holandês Jacobus Arminius e seus seguidores históricos conhecidos como
remonstrantes. Ainda no período do modernismo, mais precisamente em 1610,
quarenta e cinco ministros seguidores da doutrina de Armínio, apresentaram ao
Estado Holandês um documento chamado de Remonstrância cujo teor apresentava
os cinco pontos do arminianismo que dentre estes, faz-se necessário a evocação de
dois deles sendo: A possibilidade do homem resistir à graça de Deus e a possibilidade
do crente cair de seu estado de graça.
30

Usando o raciocínio lógico, é possível inferir que se o homem tem a liberdade


de escolher ser salvo ou não e que, se ele escolhe, mas em qualquer momento de
sua vida, pode perdê-la, de forma implícita significa que ele não pode oferecer
nenhuma garantia de certeza uma vez que, a qualquer momento é possível que esta
salvação, da mesma forma que foi conquistada, seja perdida. Sendo assim, o
arminianismo anula a possibilidade da existência desta certeza pois é impossível
confiar plenamente na certeza da salvação uma vez que ela está depositada em
homens e não em Deus. Vale lembrar que este conceito é diametralmente oposto ao
que é ensinado pelos reformadores.
Enquanto os remonstrantes afirmavam que o homem poderia resistir à graça
de Deus e caírem deste estado, os calvinistas diziam exatamente o contrário, eles
entendiam que a graça divina é irresistível e que, uma vez que Deus é soberano, Sua
vontade de forma alguma pode ser frustrada. Deus é o autor da salvação, Ele elege,
predestina e salva o pecador regenerado e uma vez salvo, não existe a menor
possibilidade de que o homem perca esta salvação.
Pode parecer que estes motivos, separadamente não oferecem grandes
problemas, contudo, quando são colocados juntos e ao serem observados com o
cruzamento de dados estatísticos, dá para se perceber o tamanho do estrago que fé
reformada e o cuidado para com as doutrinas sofreram no período da pós-
modernidade.
Algumas análises de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), mostram que atualmente existe um crescimento no número de evangélicos no
Brasil. Apesar de um terço da população brasileira se declarar católica, os evangélicos
(protestantes fiéis de igrejas oriundas da Reforma Protestante, pentecostais e
neopentecostais) nas últimas décadas cresceram 67,3%, elevando sua taxa de
crescimento médio anual para 7,9% (ROSAS, 2013). Segundo o IBGE, se esse
crescimento se mantiver estável ao longo dos anos, no ano de 2020, metade da
população brasileira será evangélica (LOPES, 2011).
Segundo mostram várias interpretações do Censo, em 1940, os evangélicos
perfaziam apenas 2,6% do total da população brasileira, já em 2000, totalizavam
15,4%. Tal crescimento, contudo, não se deveu às igrejas do protestantismo histórico.
Estas, ao contrário, apresentaram taxa de crescimento negativa, de -0,4%. Em
contraste, o pentecostalismo aumentou e tem aumentado vertiginosamente o número
31

de fiéis, atingindo a cifra de 8.179.666 de adeptos, ou seja, 65% dos cristãos


evangélicos do Brasil (ROSAS, 2013).
Dentro do período pós-moderno, mesmo diante deste arrefecimento de
produção de conteúdo voltado para as doutrinas elaboradas no Concílio de
Westminster, mesmo diante da Igreja Católica, suas decisões tomadas no concílio de
Trento e sua repudia ante à plena certeza da salvação e a invasão maciça do
neopentecostalismo trazendo em si uma teologia que retira esta certeza e planta a
dúvida, uma mudança no pensamento Cristão vem chamando atenção.
A teologia reformada está começando a ganhar proeminência dentro das
igrejas, os crentes estão começando a ler conteúdo de cunho reformado e a doutrina
calvinista vem ganhando destaque. O artigo com o título “TULIP blooming”
(florescimento da TULIP) da revista Christianity Today escrito em janeiro de 2008,
aponta que quase 10% dos pastores da SBC (Southern Baptist Convention) se
declaravam calvinistas e que 30% dos recém-formados no seminário da mesma
denominação se identificavam como calvinistas. É importante ressaltar que a
Convenção Batista do Sul é uma das maiores denominações batistas no Estados
Unidos (WALKER, 2008).
Falando sobre a perspectiva em território brasileiro, o pastor presbiteriano
Augustus Nicodemus afirma que a teologia reformada tem ganhado espaço não
apenas entre os batistas, mas principalmente, entre os pentecostais. Ele diz:

Mas, o interesse maior na fé reformada no Brasil parece ser da parte dos


pentecostais. Cresce a presença de pastores e líderes pentecostais nos
grandes eventos reformados no Brasil. Cresce também o número de
pentecostais que estão adquirindo literatura reformada. E cresce o número
de igrejas pentecostais independentes que estão nascendo já com uma
teologia influenciada pelo calvinismo. Algumas denominações pentecostais
também vêm recebendo a influência calvinista a passos largos. Tenho tido o
privilégio de pregar e ministrar palestras em eventos de grande proporção
organizados por instituições pentecostais interessadas em explorar os
grandes temas reformados (LOPES, 2008).

Com essa reintrodução da doutrina reformada nos círculos tradicionais e a


imersão dos pentecostais dentro da teologia calvinista, espera-se que o conhecimento
das doutrinas cunhadas pelos reformadores continue ganhando ainda mais espaço
dentro das igrejas, culminando assim, na produção de material de cunho confessional
e doutrinário, fortalecendo a igreja e inspirando os eleitos a permanecerem fiéis na
32

santa doutrina, todavia, deve-se ressaltar que é mister que tais materiais sejam
voltados à discussão da doutrina da certeza da graça e da salvação.

3.3 O resgaste da doutrina da graça e da salvação para a saúde espiritual da


igreja hoje

Por fim, o último tópico do presente capítulo tem como objetivo apresentar a
importância do resgate da doutrina da certeza da salvação e sua relevância para a
saúde espiritual da igreja, para isso, é necessário um retorno aos escritos puritanos
acerca desta doutrina pois eles apresentavam a necessidade de buscar a segurança
e certeza da salvação.
Thomas Watson, além de incentivar o crente a buscar a segurança e certeza
da salvação, afirma que essa busca deve ser diligente. Quanto a isso ele diz: “Lute
para obter a certeza” (WATSON, 2009, p. 295). Ele vai direcionar o crente a aferir
algumas questões cruciais, como por exemplo: “se tem a verdadeira obra da graça em
sua vida; se de fato tem grandes sentimentos por Cristo; se tem a presença do Espírito
Santo em sua vida” (WATSON, 2009, p. 295).
Da mesma forma, Thomas Brooks não deixa de trazer à tona a ordem para
que os crentes busquem a segurança e certeza da salvação. Brooks cita o texto da
primeira epístola de Pedro 1.10, afirmando que o Espírito Santo exorta os crentes por
meio dessa passagem que diz: “Foi a respeito desta salvação que os profetas
indagaram e inquiriram, os quais profetizaram acerca da graça a vós outros
destinada”. Brooks reafirma essa verdade dizendo: “É especialmente necessário; é de
importância interna e eterna fazer firme e segura diligência por sua alma, irmão”
(BROOKS, 2014, p. 30).
Brooks ainda convoca os crentes a buscarem esta certeza uma vez que Deus
a promete em sua Palavra. Com isso ele assevera essa verdade dizendo que: “É
propósito da Escritura em geral levar as almas, primeiro, a um conhecimento de Cristo,
depois, a aceitarem a Cristo, e depois, a edificarem em uma serena certeza do seu
real interesse por Cristo” (BROOKS, 2014, p. 22).
Tanto Thomas Watson quanto Thomas Brooks, enfatizam a necessidade da
busca pela certeza da salvação. Ela existe e o crente precisa empenhar-se e busca-
33

la arduamente e diligentemente, a pergunta que se segue é porque? Qual é o benefício


que o crente recebe ao encontrar esta certeza?
Uma boa resposta para esta pergunta pode ser encontrada nas palavras de
J.C Ryle que apresenta importantes benefícios e frutos da segurança na vida do
crente, sendo os principais deles:

A capacidade de suportar pobreza e prejuízos sofridos olhando para as


riquezas no céu (Habacuque 3.17-18); sustento em meio as piores
calamidades (2 Reis 4.26; Hebreus 13.8; Romanos 6.9; 2 Samuel 23.5);
capacidade de louvar ao Senhor e mostrar-lhe gratidão nas adversidades (Jó
35.10; Salmos 42.8); capacidade de dormir em paz, mesmo que esteja
esperando a morte (Salmos 4.8); capacita o homem a rejubilar-se ao ter de
sofrer afrontas por amor a Cristo (Atos 5.41); também, capacita o homem a
enfrentar a morte (At 7.59); dá forças ao crente em seu leito de morte (2
Coríntios 5.1; Filipenses 1.23; Salmos 73.26). Além disso tudo, faz com que
o crente se torne consolado, atuante, resoluto e cada vez mais santo em
Cristo” (RYLE, 2009, p. 156-163).

O pastor presbiteriano Hernandes Dias Lopes afirma que quando o crente não
possui esta segurança, ele corre o risco de viver uma instabilidade espiritual em sua
vida e que tal instabilidade além de cruel, gera um enorme fardo na vida do crente,
Hernandes diz:

A pessoa imagina o seguinte: eu não posso ter essa certeza, embora salva
porque creu em Jesus, ela não desfruta da certeza, ela não usufrui alegria,
ela fica instável, com medo de estar salva de manhã e perdida à noite, com
medo de ser filho de Deus de manhã e ser filho do diabo à noite, com medo
de estar indo para o céu de manhã e ir para o inferno à noite. Esta
instabilidade é cruel na vida de um cristão (LOPES, 2019b).

Uma vez tratado estes benefícios particularmente na vida do crente, é


necessário apresentar o que o corpo de Cristo, ou seja, a igreja militante ganha
quando ela firma seus pés em cima desta certeza, o pastor presbiteriano Augustus
Nicodemus enumera quatro benefícios que ajudam a corrigir uma visão distorcida
acerca da certeza da graça e da salvação, o primeiro benefício é o correto
entendimento da doutrina, Augustus diz:

“Primeiro, a doutrina puritana sobre a certeza de salvação pode nos ajudar a


corrigir a influência da Igreja Católica que diz que a certeza de salvação é
impossível nesta vida. Os puritanos diziam: De forma nenhuma! A obra
completa de Cristo, e a obra do Espírito em nós, torna esta certeza possível.
34

É pecado não buscar esta certeza depois do que Cristo fez na cruz do
Calvário, depois que o seu Espírito foi derramado no dia de Pentecostes. Isso
nos ajuda a combater esta tendência” (LOPES, 2019a).

Em seguida, Nicodemus analisa a distorção criada por aquilo que ele mesmo
chama de evangelho barato e as decisões por Cristo tomadas como respostas aos
constantes apelos durante os cultos nas igrejas evangélicas.

“Em segundo lugar, nos ajuda também, como já mencionado, a corrigir a


influência do evangelho barato, que oferece uma certeza de salvação com
base em decisões feitas em resposta a apelos (por decisão), sem que haja
sinais que podem ser observados de arrependimento, de mudança, de fé
verdadeira. Os puritanos diriam: Certeza de salvação depende da
santificação. É necessário crescer na graça, no auto-exame, na percepção
da graça de Deus no coração. E isso, eu acredito, é muito importante e
prático, especialmente na hora em que vamos examinar os candidatos à
Profissão de Fé” (LOPES, 2019a).

Em seu terceiro ponto, Augustus cita a relação entre o legalismo e a salvação


pelas obras, uma vez que ela, erroneamente é baseada no cumprimento da lei.

“Em terceiro lugar, essa doutrina puritana pode nos ajudar contra a influência
do legalismo proveniente, infelizmente, de alguns círculos pentecostais que
torna a certeza de salvação inatingível, porque é baseada no rigorismo do
cumprimento da Lei. Ou então baseada em evidências legalistas. O puritano
diria: A certeza de salvação não se baseia na auto-avaliação, como sendo
algo pessoal do crente, mas na percepção da graça de Deus agindo em seu
coração. Não tem nada de legalismo” (LOPES, 2019a).

E por fim, Augustus termina sua ponderação citando o misticismo existente


nas igrejas evangélicas que foi o causador esquecimento do fim principal do homem
que é glorificar a Deus e gozá-lo para sempre.

“E por fim, em quarto lugar, acredito que é uma influência, um corretivo


saudável para o misticismo que existe hoje inundando as igrejas (inclusive
presbiterianas) que esquecem que a prioridade do homem é o seu
relacionamento pessoal com Deus. O puritano diria: O fim principal do homem
é glorificar a Deus, e isso através da obediência que parte de um coração
seguro da sua salvação” (LOPES, 2019a).

Portanto, o que se conclui é que o período moderno foi o grande caldeirão


efervescente que produziu teologia de alta qualidade após a reforma protestante e
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que neste período, a Assembleia de Westminster elaborou e sistematizou dentre


várias doutrinas basilares da fé cristã, a doutrina da certeza da graça e da salvação e
que no período que sucedeu o modernismo, houve um esfriamento desta produção,
criando uma lacuna temporal, os teólogos pós-modernos se serviram, e ainda se
servem daquilo que fora produzido após a idade média.
Este esfriamento fez com que a doutrina da certeza da graça e da salvação
caísse no desuso, dando lugar à dúvida no que diz respeito à salvação. Juntamente
com este esfriamento, aqueles que vieram do catolicismo romano e foram convertidos
à fé evangélica, negam a possibilidade se se ter certeza da salvação, e por fim, o
movimento neopentecostal, encharcado com sua doutrina arminiana, entra dentro da
igreja dando ao homem um poder que nunca pertenceu a ele: a decisão sobre a
eternidade e uma vez que o homem pode escolher se ouve ou não o chamado da
vocação, da mesma forma ele pode estar salvo pela manhã, mas condenado ao
inferno no final da tarde.
O que se encontra nos dias atuais, são crentes que ainda que possuam uma
fé genuína em Cristo Jesus, não compreendem a certeza da salvação, possuem
dúvidas gritantes em relação à salvação e mais, ao se discutir sobre a referida
doutrina, o assunto soa como uma espécie de soberba e arrogância.
Esta linha de raciocínio é nociva para a fé do indivíduo pois o mesmo vive uma
caminhada cristã baseada no medo de não ser condenado ao inferno e apostando
que talvez ele passe sua eternidade ao lado de Cristo.
Porém, como bem pontuou o pastor Augustus Nicodemus, quando o crente
possui a plena e verdadeira certeza de sua salvação, ele passa a viver de forma mais
vibrante e confiante. Suas preocupações acerca da eternidade já não existem e sua
vida espiritual deixa de ser uma aposta e consequentemente, um fardo. Ele observa
as Escritura e se depara com a história da redenção, a infinita misericórdia de Deus,
Seus decretos, Sua providência, Suas promessas, Sua fidelidade, imutabilidade,
bondade, infinito amor, e, ao ver essas promessas serem cumpridas ao longo do
progresso da revelação, ele é conduzido a um estado de plena segurança.
Ele olha para o sacrifício vicário de Cristo, se alegra e demonstra gratidão
sabendo que não é por obras, mas unicamente pela graça de Deus, mediante a fé
(Efésios 2.8).
36

Já a igreja, caminha na perspectiva de que a busca diligente pela certeza da


salvação não é apenas correta, é salutar e deve ser incentivada porque esta é a
vontade de Deus para com seus eleitos. A comunidade cresce espiritualmente
saudável, corrige sua visão acerca desta doutrina, desenvolve um caráter humilde,
piedoso e obediente às leis de Deus, não por medo, não por aposta, mas por pura
gratidão por tamanha salvação que os encontrou, sabendo que esta graça é favor
imerecido de Deus.
É necessário que essa doutrina esteja presente no púlpito das igrejas de
Cristo, que ela esteja sedimentada na vida dos pregadores, que ela esteja nos
gabinetes pastorais, para que o povo de Deus não seja levado por ventos de falsas
doutrinas, que ela direcione o corpo de Cristo, à luz da Escritura e na dependência do
Espírito, em plena segurança, para que assim, o povo de Deus seja fortalecido,
instruído e plenamente munido para a batalha, caminhando em frente, crente que a
salvação e a certeza dela não é por obra de homens, mas ela vem do Senhor.
Afim de que o povo de Deus possa gozar dos frutos dessa certeza e viver o
céu na terra, em quanto aguarda o grande Dia do Senhor.
37

CONCLUSÃO

Afirmar que o homem, salvo unicamente pela graça de Deus, pode gozar em
vida a plena certeza desta salvação, não é apenas salutar, é o desejo daquele que o
salvou. Toda a escritura, do antigo ao novo testamento, de gênesis ao apocalipse,
aponta para a realidade de que, uma vez que o eleito é salvo mediante os méritos de
Cristo, não existe a menor possibilidade de essa salvação se perca no meio da
caminhada cristã.
É usar de raciocínio lógico para obter uma conclusão lógica: Se a salvação
fosse conquistada pelo poder humano, essa salvação estaria em risco
constantemente, pois da mesma forma que o homem conquista seu estado de graça,
infere-se a possibilidade de perder tal estado, da mesma forma uma vez que algo de
poder igual ou superior se proponha a tirá-la, mas, se a salvação é obra do poder de
Deus, quem poderia se igualar ou O sobrepor em poder?
Portanto, certo de que a salvação é proveniente da graça, mediante a fé em
Cristo Jesus, não por obras para que ninguém se glorie (Efésios 2.8-9), quem poderá
separar o eleito do amor de Deus que está em Cristo Jesus? Nada, nem ninguém!
(Romanos 8.38-39).
O plano e o desejo de Deus para com seus eleitos é que cada um possa
desfrutar desta certeza, pois estar convicto da salvação traz consolo para a alma e
alívio para os ombros, crer na certeza da graça e da salvação é caminhar seguro ainda
que o trajeto seja em meio ao vale da sombra da morte, é andar olhando para Cristo,
o autor e o consumador da fé com gratidão, humildade, com o reconhecimento de
quem recebeu algo que não merecia.
A plena certeza da graça e da salvação precisa ser resgatada nos púlpitos
das igrejas de hoje. Pastores devem enfatizar a certeza da salvação da mesma forma
que enfatizam o juízo, o amor e o perdão de Deus. O eleito precisa voltar a ouvir sobre
esta maravilhosa doutrina para que ele pare de pensar que sua vida espiritual é feita
por um jogo de apostas, na qual um dia se ganha e no outro se perde, um dia ele está
no céu, e outro, no inferno. Isso é nocivo, é maléfico, transforma o deleite da
caminhada cristã em fardo pesado, carregado das muitas obras, tapando o gentil
convite do Cristo que diz; “vinde a mim todos vós que estais cansados e
sobrecarregados e eu vos aliviarei! Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim,
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que sou manso e humilde de coração; e encontrareis descanso para as vossas almas.
Porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve” (Mateus 11.29-30).
O Deus que salva é o mesmo Deus que garante esta salvação e chama os
seus a descansarem nesta certeza.
Glória somente a Deus!
39

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