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O
Conselho Indigenisto / Amigos
Missionário — — k ((K ( da Terra the Earth
Organismo «nadado á tonfersnda Nááohal dosBispos db Brasil - CNBB
BRaSiL
W orld R ainforest M ovement
International
CONSELHO INDIGENISTA MISSIONÁRIO
Órgão vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)
Regional Amazônia Ocidental
TRINTA ANOS
POS-AS3ASS1NATO DE
CHICO MENDES
E DESTRUIÇÃO OCULTA DE
FLORESTAS E VIDAS NO ACRE
Apoio:
ixfd-tôfresolidaíre
Rio Branco, dezembro de 2018.
■
SUMÁRIO
& Balanço dos 30 anos sem Chico Mendes (Dercy Teles de Carvalho) 7
Esta publicação tem como objetivo principal Acre que os mercadores da natureza
décadas após o seu assassinato. A carga de Publicado pelo Cimi como documento especial
chumbo disparada no peito de Chico Mendes para a Cúpula dos Povos realizada no Rio de
pelo fazendeiro Darli Alves e seu filho Darci, Janeiro em 2012, o referido dossiê apresentou
naquela fatídica noite de 22 de dezembro de o núcleo das críticas formuladas no Acre pelas
1988, calou a voz vibrante do líder sindical vozes dissonantes do consenso em torno do
amazônica. Termina aí uma parte desta Em linhas gerais, o dossiê analisou "as
História e tem início uma outra, que condições históricas que possibilitaram a
pelas tentativas de apagamento da memória economia verde'; e de como a 'tutela dos povos
para legitimar nova fase de espoliação na amplo processo de lutas contra hegemônicas
Amazônia, tal como mostrado no Dossiê: o travadas desde a Amazônia até outras regiões
APRESENTAÇAO
que trata exatamente deste "segundo radical da sociedade. O vigor do seu legado,
Enfim, homenageamos com esta publicação o luta contra o capitalismo verde "y de todos los
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~ U X U a. O t - f o , ,
Á4.ãj> u t& JL A. - J / (M e u s ?
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"Atenção jovem do futuro -6 de setembro do ano de 2120, aniversário do primeiro centenário da revolução socialista
mundial, que unificou todos os povos do planeta num só ideal e num só pensamento de unidade socialista, e que pôs
fim a todos os inimigos da nova sociedade. Aquificam somente a lembrança de um triste passado de dor, sofrimento e
morte. Desculpem. Eu estava sonhando quando escreví estes acontecimentos que eu mesmo não verei. Mas tenho o
prazer de ter sonhado" (Chico Mendes)
BALANÇO DE 30 ANOS SEM CHICO MENDES
Dercy Teles de Carvalho
município de Xapuri, mora e vive na Chico Mendes, o que houve foi um retrocesso
"colocação"1 pimenteira, seringal Boa Vista. naquilo que se defendia para a ciasse
Base (CEBs) e ainda muito jovem foi eleita, em extrativistas. Na verdade, tudo que a gente
Chico Mendes, que foi eleito no final de 1982. utilizando o nome de Chico Mendes. Inclusive,
Foi a primeira mulher a exercer esse cargo no dizendo que o sonho dele está sendo realizado,
Acre e uma das primeiras no Brasil. Participou que era o homem sobreviver da floresta em pé.
como educadora popular do Projeto Eu nunca vi floresta deitada, não; toda floresta
Seringueiro nos anos 1980 e retornou à direção é em pé, acho uma aberração esse tipo de
2006-2014, e como vice-presidente entre O que Chico Mendes defendia foi por
no Acre (Fetacre). Sua gestão na direção do que nós, extrativistas, moradores das florestas
Denominação dada ao lugar de vida e trabalho dos seringueiros e sua família. Constituída geralmente pela casa de moradia e uma área
destinada à pequena agricultura e criação de animais, circundada pelas estradas de seringa. O tamanho médio dessas colocações gira em torno
de 300 ha.
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BALANÇO DE 30 ANOS
SEM CHICO MENDES
da Amazônia, vamos se adequar com plantio porque a primeira coisa que eles fizeram foi
qualquer espécie porque não faz parte da para enfraquecer o movimento e aí poder fazer
nossa cultura. A nossa cultura é extrativista: é essas distorções, porque o primeiro plano de
explorar o que a natureza já tem pronto e fazer utilização das Resex foi construído em
agricultura de subsistência. Foi assim que a assembléias, com participação dos próprios
gente nasceu, cresceu e vive até agora.
moradores.
E tudo o que a gente defendia, com a
Através das mudanças no SNUC2, as leis
eleição, com a chegada do PT aos governos
que regem as Unidades de Conservação, eles
estadual, federal e municipal, foi distorcido.
foram retirando a autonomia dos moradores
Eles distorceram a política que nós
corn a criação de um conselho gestor da Resex
defendíamos porque passaram a defender os
que não tem autonomia, não tem paridade.
interesses do grande capital, que é quem
Eles foram desconstruindo o plano de
financia os candidatos que se elegem.
utilização através de normativas elaboradas
Tem mais um detalhe: nesses 30 anos,
em Brasília, de acordo com os interesses do
tudo que se construiu de organização na
grande capital, e trazendo apenas para o
sociedade civil foi desfeito porque houve
conselho homologar, com a lista de presença
interferência do Estado na oferta de benesses
dos conselheiros, e aí poderem dizer que os
para as principais lideranças que conduziam o
representantes dos trabalhadores estavam de
movimento. E deu no que deu porque a
para implantar o que aí está. Com a sociedade E criaram todas essas mudanças que
mobilizada, seria difícil chegar no patamar que prejudicaram a vida dessa população,
Na verdade, o que aconteceu foi um porque ela não tem poder sobre seu território,
membros do PT porque eles desconstruíram porque se libero minha "colocação" para fazer
construído ao longo dos 20 anos de ditadura. deixa de me pertencer, e eu não tenho mais
Eles destruíram em 20 anos de gestão do PT autonomia de tirar uma árvore, de fazer nada,
2
Sistema Nacional de Unidades de Conservação. de fazer um roçado.
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BALANÇO DE 30 ANOS
SEM CHICO MENDES
autonomia até o extrativista desistir e dali verdade, mais uma atividade predatória que
abandonar sua moradia espontaneamente e não traz benefício, e sim, sacrifício para o
virar delinquente nas periferias. Eu chamo de morador da floresta. É uma das atividades que
uma expulsão moderna, que não usa mais o considero das mais predatórias. Ela, além de
pistoleiro, a força policial, mas tem a estratégia levar as árvores de madeira de lei, também
de expulsar tão sutil que as pessoas saem de afugenta as caças e tira as árvores que
livre e espontânea vontade, e quem vê eles produzem alimentos para essas caças. A
saindo não percebem que estão saindo de tendência, se essa atividade continuar, é a
espontânea vontade. desertificáção da floresta. Ou seja, o
Apesar de ter havido investimentos desaparecimento do ser humano porque não
r omo construção de ramais3, política de vai ter razão para permanecer. É uma atividade
habitação ter entrado na Resex, com que mexe no meio ambiente como um todo.
construção de banheiros e tudo mais, isso não Tem várias famílias que se
garante a permanência porque não existe decepcionaram e saíram do manejo, porém
nenhuma alternativa de geração de renda para eles assinaram contrato que os obrigaram a
que essas pessoas possam permanecer lá, ceder a área inventariada para a empresa que
vivendo dignamente. inventariou, porque ela teve um custo. Por
Essas modificações foram feitas na isso, a exploração nessa área vai continuar,
legislação em nome da preservação ambiental
independente da decisão do morador em sair.
que chamam de "desenvolvimento
A gente nunca viu esse contrato porque eles
sustentável" - que de sustentabilidade não tem
não deixam cópia com o morador.
nada, porque o principal a ser sustentável é o
Essa história do manejo comunitário
ser humano, e quem garante a
dos produtos florestais é uma balela porque
sustentabilidade são as pessoas. Se essas
não tem nada de comunitário. A única
pessoas não têm sustentabilidade, não têm
participação da comunidade é autorizar que se
renda para garantir e atender o consumismo
tire a madeira, mas eles sequer acompanham.
que foi demandado com essa infraestrutura
O corte é empresarial; é forte razão para que
que foi colocada no setor rural, não tem como
tirem madeira de várias espessuras, brancas e
elas permanecerem lá.
duras.
3Denominação dada regionalmente às estradas vicinais.
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TRINTA ANOS PÓS-ASSASSINATO DE CHICO MENDES
E OS DESAFIOS DO SINDICALISMO RURAL NO ACRE
Elder Andrade de Paula1
Este artigo foi extraído da parte ordem são "preteridas pelo espetáculo
ao escopo desta publicação. Nosso objetivo Assim como ocorreu nos eventos
principal foi mostrar que hoje, assim como no anteriores, as "com em orações" alusivas a esse
'Professor Titular do Centro de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal do Acre (UFAC). Coordenador do Núcleo de Pesquisa:
Estado Sociedade e Desenvolvimento na Amazônia Ocidental (NUPESDAO). Atua junto às lutas de resistência por terra/território na Amazônia
desde o "tempo de Chico Mendes", precisamente desde 1984.
20 referido relatório apresenta os resultados da pesquisa Sindicalismo rural na Amazônia, conflitos sociais por terra\território e o legado de Chico
Mendes, realizada durante Estágio Pós-Doutoral no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade\lnstituto de
Ciências Humanas e Sociais\Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (2018).
3 Para mais detalhes a respeito dessa interpretação, ver Paula (2016), indicado nas referências ao final deste artigo.
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TRINTA ANOS POS-ASSASSINATO DE
CHICO MENDES E OS DESAFIOS DO
SINDICALISMO RURAL NO ACRE
O que está em curso, na verdade, é um Sob o capitalismo verde, a apropriação
novo ciclo de "acumulação via espoliação", nos do discurso ambientalista pelo capital diluiu em
termos propostos por David Harvey (2004). De torno da "defesa do patrimônio amazônico" ,
se. expressa, sobretudo, na precarização das comunidades camponesas e povos indígenas têm
fundamental para analisar criticamente essa ambos subordinam-se a uma lógica de espoliação
nova fase do processo de exploração econômica praticada pelo capital de acordo com seus
governado, desde 1999, por uma ampla coalizão estado do Acre possui uma extensão territorial
de partidos liderada pelo Partido dos de 164.221,36 km2 (16.422.136 ha), com
Sob seus auspícios, logrou-se a por florestas nativas - que estão em crescente
ideologia do "desenvolvimento sustentável" madeira via PMFS -, das quais cerca de 50%
bastante eficaz - pelo menos até 2018, quando encontram-se em "áreas naturais protegidas".
essa coalizão foi derrotada eleitoralmente - Com uma população composta por 830 mil
para concretizar um amplo pacto social no habitantes, dos quais 72,61% residentes em
estado. Conforme mostramos no livro Estado e áreas urbanas, é considerado um dos mais
(Des)Envolvimento insustentável na Amazônia .em pobrecidos do Brasil: 86 mil famílias
Ocidental: dos missionários do progresso aos (equivalentes a 43 % da população do Estado)
mercadores da natureza, esse pacto recebem o Bolsa Família, conforme mostra
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TRINTA ANOS POS-ASSASSINATO DE
CHICO MENDES E OS DESAFIOS DO
SINDICALISMO RURAL NO ACRE
V C A R
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TRINTA ANOS POS-ASSASSINATO DE
CHICO MENDES E OS DESAFIOS DO
SINDICALISMO RURAL NO ACRE
"modelo original" de REDD+ Indígena a ser segue fortemente protegida por uma blindagem
retumbante fracasso e dos conflitos internos poder imperial quanto aos interesses políticos
" Em pleno apogeu da ideologia do "d e se n vo lvim e n to su ste n tá v e l", tra ta m o s de m o strar (PA U LA, 2 0 0 5) fu n d a m e n ta lm e n te que
aquilo que e stava sendo ap resen tad o com o so lu ção , o "d e se n vo lvim e n to s u ste n tá v e l", d e veria se r in terp reta d o , na re alid ad e , com o
um a nova ordem de pro b lem as da exp a n sã o ca p italista na A m azô n ia m arcad a por um d ese n vo lvim e n to in su ste n tá v e l. Po rtan to , sob
a p ersp ectiva das classe s do m in ad as e dos su je ito s co m p ro m etid o s com as lutas em a n cip a tó ria s, dita ideologia d e veria ser
com b atida.
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TRINTA ANOS POS-ASSASSINATO DE
CHICO MENDES E OS DESAFIOS DO
SINDICALISMO RURAL NO ACRE
m aio res rep ercu ssõ es, com o fo ram os casos dos registros do núm ero de conflitos por terra
no Acre. De quatro (4) registros em 2010,
d ocum en tos: a Carta do Acre, o Dossiê: o Acre
p ara c in q u e n ta e o ito (5 8) em 2 0 1 5 ,
que os m ercadores da natureza atingindo m ais 4.750 fam ílias e um a m édia
de vinte e três mil e setecen tas pessoas
escondem 5 conhecido com o Dossiê A cre, e os
(23.700). A inda nos b aseand o nos dados
artigos Lei de Pagam ento por Serviços apresentado s pela Com issão Pastoral da
Terra, percebem os que os conflitos não se
Am bientais do Acre beneficia mercado lo c a liz a m e s p e c ific a m e n te em u m a
fin a n c e iro (A m yra El Khalili, regional administrativa específica do Acre.
M as, atingem todo o estado e as mais
h ttp ://te rra m ag a zin e .te rra .co m .b r/b lo g d a am a z d iv e r s a s c a t e g o r ia s d e c a m p o n e s e s
onia/blo g /2012/08/14/lei-d e-p ag am ento-p or- flo resta is, com o p o sseiro s, rib eirin h o s,
s e m - t e r r a , s e r in g u e ir o s e in d íg e n a s
se rv ic o s-a m b ie n ta is-d o -a c re -b e n e fic ia - (ROCHA, 2016, pág. 66).
m ercad o -fin an ceiro /) e o Acre contra Chico
cap italism o verd e, os conflitos pela posse e uso fo ra m a n im a d as por um a m arch a a sce n d e n te de
da te rra e territó rio se espraiam por todo o luta co n tra a d itad u ra m ilita r, pela
estado do A cre, a exem p lo do que ocorre nos d e m o cra tização da so cied ad e e do estad o no
dem ais estad o s da Am azônia b rasileira. M ilenna B ra sil, ag o ra, d e sa fo rtu n a d a m e n te , vive m o s o
Rocha (2016) analisou em sua d issertação de seu re v e rso . Isto é, um a m arch a reg ressiva de
m estrad o os velh os e novos conflitos sociais pela in sp iração fa scista no Brasil e em p arte
posse da te rra e te rritó rio no A cre. De acordo su b sta n cial do m u n d o . T o d a v ia , a luta co n tin u a,
com ela, o xalá insp irad a nos ideais lib e rtá rio s que
Dados da Com issão Pastoral da Terra - CPT
registram o aum ento consid erável nos
m o tiva ra m a vida de Chico M e n d e s...
5Os artigos e entrevistas reunidos no Dossiê Acre expressaram o núcleo das críticas formuladas no Acre pelos signatários do referido documento.
Na sua apresentação, diz o seguinte: "0 Dossiê trata, ainda, das condições históricas que possibilitaram a consolidação da experiência acreana no
contexto da geopolítica ambiental da ONU, do Banco Mundial e de ONGs gigantes; de como e com que interesses forjaram a imagem de um Chico
Mendes supostamente 'patrono da economia verde1; e de como a 'tutela' dos povos da floresta viabiliza a implementação dos ambiciosos planos
de manejo madeireiro, e facilita o comércio de carbono e de 'serviços ambientais', gerando lucros para empresas e ONGs" (Cimi, 2012, pág. 2).
Referências bibliográficas
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de Ja n e iro : CPDA U FR R J, 2 0 1 8 .
M O RAIS, M . d e J. A crean id ad e: in venção e re in v e n çã o d a id en tid ad e a c re a n a . Rio B ran co : ED UFA C, 2 0 1 6.
ROCHA, LYVIA M . Capitalism o verd e, cam pesinato e conflitos por te rra/territó rio s na Am azônia: o caso A cre . D issertação de
M estrad o . Ric B ran co : PPG M D R-U FA C, 2 0 1 6 .
PAULA, E ld e r A . (Des) Envolvim ento insustentável na Am azôniá O cidental: dos m issio n ário s do pro g resso aos m e rcad o res da
n atu re za . Rio B ran co : Edu fac, 2 0 0 5.
_________________________Seringueiros e sindicatos: um povo da floresta em busca da liberdade. Rio Bran co : Nepan Ed ito ra , 2 0 1 6 .
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CHICO MENDES VIVE NA LUTA ANTICAPITALISTA
E ANTIFASCISTA! (QUE É UMA SÓ)
O que queremos realmente dizer,
Michael F. Schmidlehner1
quando afirmamos que "Chico Mendes vive"? A
"desenvolvimento sustentável". Aspectos mais
frase expressa a ideia de que as pessoas que
radicais ou polêmicos do pensamento de Chico
tiraram a vida dele não conseguiram destruir
Mendes foram sistematicamente omitidos nesta
seus ideais, e que estes ideais continuam sendo
narrativa governamental. Criava-se, assim, uma
defendidos hoje. Mas, eis a pergunta: quais
espécie de "Chico Mendes light", que servia
seriam estes ideais e . quem poderia ser
perfeitamente como produto promocional para
considerado defensor do legado de Chico
inserir as florestas do Acre no emergente
Mendes? Um texto do jornal Empate, de 2003,
mercado global das "soluções" ambientais e
mostra o quanto esta questão é controversa e
climáticas - manejo madeireiro "sustentável",
polêmica:
carbono florestal, serviços ambientais - , e atrair
Os princípios que projetaram as lutas dos financiamentos de bancos e agências de
trabalhadores rurais acreanos e lançaram
desenvolvimento internacionais.
seu representante maior no cenário
internacional foram abandonados em Tirando foto com busto de Chico Mendes no estande do
tro ca de um enganoso pro jeto de governo do Acre na Rio+20
'd e s e n v o lv im e n to e s t a d u a l' com
'sustentabilidade'. Os inimigos de Chico
Mendes o eliminaram fisicamente. Os que
se diziam seus amigos e aliados que, hoje,
vivem e acumulam cargos e benefícios à
custa de sua memória, tratam de eliminar
seus sonhos, seus projetos, sua herança,
seus princípios de não mercantilizar a
floresta (cit. in MORAIS, 2012, p.26).
Analisando a apropriação e
Fonte: ac.gov.br, fotografia Gleison Miranda
ressignificação dos 'sonhos e ideais' de Chico
Voltando à pergunta inicial, sobre o que
Mendes pelo Governo da Frente Popular do Acre
queremos dizer com "Chico Mendes vive",
- FPA, Maria de Jesus Morais (2012) mostra
devemos ter em mente duas coisas. Primeiro: ao
como este governo criou um discurso sobre a
proclamar que Chico Mendes vive, situamo-nos
identidade acreana associando a luta dos
inevitavelmente na esfera da interpretação. O
seringueiros com seu modelo de*
homem não está mais aqui, fisicamente, para
‘Michael Franz Schmidlehner é mestre em Filosofia pela Universidade de Viena, nativo da Áustria e brasileiro naturalizado, pesquisador e professor
de filosofia do IFAC/Campus Sena Madureira e da União Educacional do Norte, UNINORTE
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CHICO MENDES VIVE NA LUTA
ANTICAPITALISTA E ANTIFASCISTA!
(QUE É UMA LUTA SÓ)
nos contradizer ou dar razão. Portanto, ninguém Neste sentido, propomos, para fins deste
pode ser único ou "legítimo" articulador de seu ensaio, a seguinte resposta: "Chico Mendes
legado na atualidade. O grau de legitimidade da vive" quer dizer que a luta da qual ele se tornou
nossa interpretação vai depender de quanto ela símbolo se renova e aprofunda na medida em
é referenciada nas ações e palavras da pessoa que muda a realidade sociopolítica à qual ela
histórica de Chico Mendes. precisa reagir.
Segundo: as ações e as palavras de Chico
Legado anticapitalista
Mendes têm que ser interpretadas como sua
reação - a aplicação de seus ideais - a uma Para hoje fazer referência aos ideais de
outro momento histórico, estes mesmos ideais aspectos do seu pensamento que foram
tinham e terão que se expressar de outra forma. omitidos ou suprimidos na versão oficial das
Enquanto Chico Mendes estava vivo, sua luta era últimas duas décadas.
contra a espoliação da Amazônia pelos Neste contexto, precisa ser lembrado
fazendeiros. Diante da mercantilização da Euclides Fernandes Távora, que é a pessoa que
floresta em seu nome, os ideais de Chico provavelmente mais contribuiu com a formação
Mendes foram - em nossa interpretação -
do pensamento de Chico Mendes. Euclides era
defendidos pelos dissidentes deste projeto
militante do Partido Comunista brasileiro que
(como por exemplo o autor do artigo do jornal
havia se refugiado na floresta acreana. Elder
Empate, citado acima). E, em reação à nova
Andrade de Paula e Sílvio Simione da Silva (2012,
conjuntura política do Brasil a partir de 2019, a
p.105) resumem sua importância na vida de
luta em nome de Chico Mendes terá que se
Chico Mendes assim:
reformular novamente.
Com as ferramentas ofertadas por Euclides
Entendemos que Chico Mendes tinha Távora, Chico Mendes não só aprendeu a
forte espírito comunitário e não queria ser ler e escrever. Apreendeu, sobretudo, a
paixão pelas idéias revolucionárias de seu
"advogado" dos povos da floresta, no sentido de
"velh o am igo e in stru to r" (form a
falar por eles. O apelo dele hoje, provavelmente, respeitosa com que se referia a Euclides), e
ao seu modo, um método de análise da
seria para não nos fixarmos demais em sua
realidade que orientou sua trajetória
pessoa ou idolatrá-lo. Honrar o legado de Chico política e o projetou para reescrever a
história da luta de resistência de uma
Mendes significa também usar nossa própria
parcela dos segmentos sociais subalternos
capacidade crítica e criatividade para levar a luta na Amazônia brasileira.
adiante.
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CHICO MENDES VIVE NA LUTA
ANTICAPITALISTA E ANTIFASCISTA!
(QUE É UMA LUTA SÓ)
Os ideais comunistas de Chico Mendes e políticas de extrema direita ganham espaço com
sua clara ideia de luta social estão evidentes em um discurso de perseguição de minorias. No
seus textos, por exemplo, quando ele escreve Brasil, além desta perseguição, espera-se, nos
Estado do Acre - PDSA), usando estas palavras: romper com o sistema anterior, de fato - e isso
"com isso, a ONU e as entidades ambientalistas pretendemos mostrar neste texto - conserva,
desde 2016, se insere naquilo que críticos mesmo com os meios mais brutais. Segundo
chamam de "surto fascista", fenômeno com que Dimitrov (1938, p. 2, tradução nossa), fascismo
atualmente se deparam diversos países, onde é uma "ditadura abertamente terrorista dos
CHICO MENDES VIVE NA LUTA
ANTICAP1TALISTA E ANTIFASCISTA!
(QUE É UMA LUTA SÓ)
"camaleônico", com dois principais discursos O discurso das falsas soluções na esfera
oscilando na sua superfície, que no contexto das
ambiental e climática foi idealizado inicialmente
atuais crises neoliberais se apresentam assim:
no âmbito do Banco Mundial e da ONU, e
» O primeiro discurso é de um suposto
consolidado nas grandes convenções que foram
"consenso", socialmente "inclusivo" e
assinadas na Eco-92. Consagrando o conceito de
"politicamente correto", reconhecendo
consequências violentas e destrutivas ele oculta equilíbrio climático sem questionar o principal
- como "soluções" através das quais "todos paradoxo do desenvolvimento capitalista: seu
ganham". Este discurso legitima mecanismos
paradigma de crescimento econômico ilimitado
hegemônicos (menos violentos) de dominação.
diante da limitação dos recursos naturais.
Ele pode ser chamado como o d isc u rso das
O governo da FPA, como descrevemos no
f a ls a s s o lu ç õ e s .
início do texto, reproduziu o novo discurso a
• O segundo discurso opera a partir da construção
nível local. No centro do desenvolvimento
de um inimigo que possa ser excluído e
sustentável, configuraram inicialmente os
abertamente perseguido. A crise global é
projetos de manejo madeireiro. O discurso
basicamente negada, e a "crise nacional",
apresenta estes projetos como inclusivos e
simplesmente atribuída à atuação deste inimigo,
participativos, denominando-os "manejo
dando-se a solução através da sua eliminação
florestal comunitário sustentável", enquanto os
(política, cultural ou física). Este discurso
impactos violentos são sistematicamente
legitima mecanismos coercitivos (mais
ocultados.
violentos) de dominação. Ele pode ser chamado
O relatório da Plataforma Dhesca de
como o d isc u rso d a n e g a ç ã o .
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CHICO MENDES VIVE NA LUTA
ANTICAPITALISTA E ANTIFASCISTA!
(QUE É UMA LUTA SÓ)
O violento regime de dominação que Envira (MCFARELAND, 2015, p.42) lemos, por
perdura nas florestas acreanas desde o primeiro exemplo, que eventuais queixas por parte da
surto da borracha não só não mudou com a nova comunidade seriam atendidas pela empresa do
economia florestal promovida pelo governo da promotor local do projeto, Duarte José de Couto
FPA, mas reafirmou-se na lógica dos projetos Neto. Esta empresa seria, ao mesmo tempo,
serve para maximizar a estocagem de carbono que pode ser esperado do "atendimento" por
na biomassa. O que mudou drasticamente com este empreendedor ambientalista pode ser
quais afirma, entre outros, "ter saudade, e Seguindo nossa tese, de que o discurso
muita, do regime militar" (cit. in KILL, 2018). das falsas soluções e o discurso da negação se
produto, implementa-se um novo modo de capitalista, esta mudança não pode afetá-los
produção nas florestas, assentado nas antigas fortemente. Sem nos alongar em especulações
relações de dominação capitalista criadas pelos sobre o futuro, podemos mencionar duas
seringalistas. Para vender este produto - circunstâncias que apontam para a persistência
Surge a questão sobre o futuro dos projetos valor de mercado do carbono vendido pelo
do tipo REDD no novo cenário político no Acre projeto Envira em dois anos totalizaria mais que
e no Brasil a partir de 2019. As esperadas 7,5 milhões de dólares.
políticas de eliminação do "ativismo xiita Projetos privados de REDD,
ambienta " - como diz o presidente eleito - , e a teoricamente, podem se tornar ainda mais
reduzida fiscalização ambiental vão afetá-los ou lucrativos num cenário geral de desmatamento
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CHICO MENDES VIVE NA LUTA
ANTICAPITALISTAE ANTIFASCISTA!
(QUE É UMA LUTA SÓ)
mais "adicionalídade". Que significa isto? Na uma oportunidade de fazer um jogo duplo de
florestal acaba "valorizando" o carbono florestal novo presidente do Brasil. Por que razão
Os europeus fazem questão de destacar para central neste sistema de compensação, uma vez
Bolsonaro e para os poderosos interesses
que pode ser usada para fazer a obrigação de
agrícolas que o apoiam que o Brasil é um dos
maiores beneficiários de ser signatário do Reserva Legal ser cumprida em outra
Acordo de Paris. Como o país está na
vanguarda da vulnerabilidade às mudanças
propriedade; o proprietário que desmatou além
climáticas e da capacidade de combatê-lo, ele do permitido, por exemplo, um sojeiro da
recebe milhões em subsídios como parte do
regime de Paris, que desaparecería se Amazônia mato-grossense, pode compensar
abandonasse o acordo (KAETING, 2018,
essa dívida através de CRAs de outro local,
tradução nossa).
dentro do mesmo bioma, seja no Mato Grosso
Para sustentar seu vício em combustíveis
ou no Acre.
fosseis, os países industrializados necessitam do 0 novo Código Florestal, em seu artigo
pretexto de "compensar" suas emissões. Para o 41, inclusive, incentiva a "cumulação" de
Brasil, por sua vez, esta dependência apresenta diversos tipos de compensações, quando
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autoriza o Poder Executivo a instituir programas redução das emissões dos agricultores
ambientais [...] isolada ou c u m u la tiv a m e n te " O novo Código Florestal cria fortes
(grifos nossos), listando os sete serviços sinergias entre dois poderosos mecanismos de
na Lei Sisa, e acrescentando como oitavo item "a agronegócio e o do carbono. Além disso, ele
no M ato Grosso explica este "uso cumulativo" Ou seja, de se apropriarem do discurso das
Agricultura (CNA), Kátia Abreu, comenta que sua Nos últimos três anos, houve forte
agronegócio mundial são: Corteva Agriscience expansão do agronegócio no Brasil. Entre 2014
2015), Chem China (que comprou Syngenta em Desenvolvimento da Alemanha (BMZ) apoiou o
2017), Bayer (que comprou Monsanto em 2018) Cadastro Ambiental Rural - CAR com 5,5 milhões
Para nossa análise, a Bayer - agora a Mas, sobretudo, temos que mencionar
merecem especial atenção. Após a compra da programa alemão REDD Early Movers - REM
empresa americana Monsanto pela Bayer por ("Pioneiros do REDD" na tradução ao português)
cerca de US$ 66 bilhões, a Basf - por exigência no estado de Mato Grosso. Por que a Alemanha
das autoridades de defesa da concorrência - quer "premiar" por >sua «política climática
adquiriu ativos da Bayer no valor de cerca de justam ente aquele estado brasileiro, que desde
US$ 7,24 bilhões. Com isto, estas duas décadas é considerado o líder em
Monsanto no Brasil somam R$ 15 bilhões anuais financiar o REM em Mato Grosso foi fechado
Ao mesmo tempo, por serem fortes compra da Monsanto pela Bayer. Neste
componentes da economia exportadora alemã, momento, já se sabia que a Bayer teria que lidar
Bayer e Basf vêm participando em diversas com as grandes polêmicas em torno dos
iniciativas juntas com o governo daquele país. produtos agrotóxicos que assumiría da
os fóruns para "soja responsável" e "óleo de Roundup com o princípio ativo glifosato, que
que veem nelas uma "lavagem verde" para as O presidente da Associação dos
Código Florestal pelo governo alemão é veneno: "sem glifosato, não tem safra no Brasil"
igualmente consistente com seu interesse na e "hoje, produtor não sabe mais plantar de outra
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forma a não ser esta" (ESTADÃO 2018). A função mensal da IG Farben de maio 1938: "De fábrica
momento.
sua simples expressão no título da revista atos de violência contra os povos da floresta que
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se iniciam com a nova presidência, assim como política - isto é, uma abordagem que reconhece
civil a adotar formas mais diretas de resistência. ambiental - inspirada na luta anticapitalista do
..... _ v*>
Porém, o perigo neste momento é que o movimento dos povos da floresta e nos ideais de
discurso das falsas soluções possa se fortalecer Chico Mendes pode nortear a esperada
"única alternativa" para lidar com a crise. Não As palavras que Euclides Távora dirigiu a
devemos cair neste engano. Os movimentos Chico Mendes • em 1964 parecem valer
sociais precisam reconhecer que os dois novamente para nós hoje: "[...] por maior que
promovem a espoliação capitalista da que renascerá e aí você terá que entrar, mesmo
extingue vida na terra, a luta da esquerda se vida pelo capitalismo não nos permite mais
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ASCENSÃO E QUEDA - O "DESENVOLVIM ENTO SUSTENTÁVEL"
E A FORÇA POLÍTICA DA FRENTE POPULAR DO ACRE
Israel Souza1
longo dos últimos 20 anos (1999-2018). Orleir Cameli (1995-1998) expressou de forma
como tal relação se expressa, positiva ou funcionalismo chegava a atrasar por meses
entendido numa dupla acepção: como população e já estendia seus tentáculos até os
mercadificação e exploração dos bens É com razão que Paula (2005) afirma
naturais, e como eixo ideológico- que os primeiros oito anos da década 1990
sua vez, força política será entendida como um período de estiolamento governamental,
amplamente, como eixo ideológico- legada da década anterior. Isso teve efeito
1 Cientista social e mestre em Desenvolvimento Regional pela Universidade Federal do Acre. Autor dos livros Democracia no Acre: notícias de
uma ausência, e Desenvolvimentismo na Amazônia: a farsa fascinante, a tragédia facínora. Atualmente, é professor e pesquisador do Instituto
Federal do Acre/Campus Cruzeiro do Sul, onde coordena o Grupo de Pesquisa Trabalho, Território e Política na Amazônia (TRATEPAM).
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ASCENSÃO E QUEDA - O "DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL" E A FORÇA POLÍTICA
DA FRENTE POPULAR DO ACRE
de vida dos segmentos historicamente ajudaram-no a tirar 28,34% dos votos, contra
forças para as disputas eleitorais, ajudando a - PDS), levando a disputa para o segundo turno.
construir aquilo que viria a se configurar como No segundo turno, porém, perdeu. Ficou com
a nova força política acreana: a FPA. 45,39% dos votos, contra os 54,61% do
Desta forma e um tanto ironicamente, adversário.
no combate à oligarquia apoiaram-se em parte
Ainda que derotado, Jorge Viana sâiu
dela. Nunca é demais frisar que os irmãos
do pleito ostentando chances reais de vitória
Viana (Jorge e Tião), figuras de maior projeção
em eleições vindouras. E assim ocorreu. Foi
na FPA, são parte da oligarquia local. No seio
vitorioso nas eleições municipais de 1992,
desta oligarquia, disputaram politicamente a
ganhando mandato de prefeito da capital
hegemonia com setores mais tradionais,
acreana (Rio Branco) entre os anos de 1993 e
vencendo-os.
1996. Primeiro a vitória, e depois a boa
Com isso, num certo sentido,
avaliação de seu mandato consolidaram ainda
conseguiram modernizá-la, dando-lhe feições
mais seu nome, sendo eleito governador em
democráticas e populares. À testa do Partido
1998. Ele venceu as eleições daquele ano ainda
dos Trabalhadores - PT, lograram se beneficiar
no primeiro turno, conquistando 57,70% dos
da estrutura que a Igreja Católica e os
votos, contra 26,30% do segundo colocado
movimentos sociais e sindicais haviam
construído ao longo dos anos de 1970-1980 em (Alécio Dias - PFL) e 14,70% do terceiro (Chicão
Sobre isso, consultar Souza (2014), destacadamente o ensaio A atuação da Igreja Católica no Acre (1920-2013): história de uma involução
política, p. 15-76. Ver também Paula (2005).
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SUSTENTÁVEL" E A FORÇA POLÍTICA
DA FRENTE POPULAR DO ACRE
3Outros já haviam usado o termo "epopeia" para se referir à história acreana, sempre no sentido de glorificá-la. Até onde sabemos, nosso trabalho
(SOUZA: 2005) foi o primeiro a utilizá-lo no sentido crítico para se referir à historiografia recente, forjada na reinterpretação que a FPA lhe confere.
Mais recentemente, também Carneiro (2015) lançou mão dele em sentido crítico.
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SUSTENTÁVEL" E A FORÇA POLÍTICA
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terra e a preocupação ambiental para com a em dia e dando a ele credibilidade no mercado
Amazônia são características próprias do local. Além disso, forçoso é dizer, ainda, que
acreano, Desse modo, atribuíram a adoção do conseguiu desm ontar o crime organizado. Esse
vinda da luta de Chico M endes e dos "povos da chefes (Hildebrando Pascoal) e ganhou ampla
Como é consabido, em 2003, com Lula, abre-se uma série de governos petistas que vão até 2016, quando Dilma Rousseff será deposta através
de impedimento.
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SUSTENTÁVEL" E A FORÇA POLÍTICA
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convidada para assumir o Ministério do Meio "m elhor lugar para se viver na Amazônia".
Ambiente. Esse convite representou o Segundo afirm ava, o governo anterior havia
de seu vínculo com a questão ambiental. competia ao novo governo consolidá-lo e, mais
Em 2004, a FPA consegue outra vitória que isso, universalizá-lo. Por isso o "para
significativa: Raimundo Angelim é eleito todos" ou, como também se dizia, "com todos
uma série de governos que irá até o ano de Como se pode ver, o desenvolvimento
nos âmbitos municipal, estadual e federal. Nos propagandística de que gozava no governo
dois primeiros conseguiu, ainda, maioria nos anterior, cedendo, neste quesito, espaço e
inegável força política de que dispunham, Por certo que ele continua importante, sendo
gozando de condições mais que favoráveis ainda utilizado profusamente em discursos e
Desenvolvimento para todos e se colocou o a Jorge Viana. Na última eleição (2002), Jorge
ousado objetivo de transformar o Acre no Viana havia tirado 63,5% dos votos, contra
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SUSTENTÁVEL" E A EORÇA POLÍTICA
DA FRENTE POPULAR DO ACRE
tirou 53,05%, mesmo sendo o vice-governador atacad o» frontalm ente, como experimento
Desenvolvimento Humano e Inclusão Social) do governo de Binho Marques deve ser visto
da oposição somaram mais de 46% dos votos. para todos quer indicar que alguns ainda não
Portanto, a oposição teve, já ali, expressiva foram contemplados, mas serão. Tendo esse
votação. A oposição pode não ter ganhado quadro em conta, é lícito aventar que o uso do
Márcio Bittar tinha por nome Frente da Acrescentar o "para todos" e falar
do governo. Márcio Bittar reiterou essa crítica acreana. Sobre isso, é esclarecedora uma carta
inúmeras vezes, não perdendo a oportunidade que o jornalista Sílvio Martinello dirigiu a Jorge
desenvolvimento sustentável como contrário à o jornalista assevera que "em meus 25 anos de
produção local e incapaz de gerar emprego e jornalism o no Acre, nunca tivemos um governo
renda, acenando tanto para o homem do tão contencioso, tão difícil, tão repressor e
campo como para o da cidade. Bocalom disse policialesco quanto o seu", afirmando, em
dos governos de Jorge Viana, que desejava imprensa (...) vivem um verdadeiro clima de
fazer "um governo das pessoas, e não da terror. Seus donos são ameaçados de
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SUSTENTÁVEL" EA FORÇA POLÍTICA
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retaliações, até de prisão (...). Seus editores e virou piada. Isso impunha desdobrar esse
repórteres trabalham com medo (...)" experim ento, seguindo rumo à "economia
Com Binho, a relação com a imprensa por isso, impunha-se também insistir nele
explicações que teve que dar em uma para consumo externo. Por força dessas
ser um problema. E, mostrando que o governo posse de Binho, tornando-se ainda mais
atuava mais nos efeitos que nas causas, prementes nos governos de Tião Viana. Então,
destaca com orgulho o que deveria causar evocando as mudanças climáticas como
vergonha: "o Acre também é o Estado que justificativa para as políticas locais, Binho dizia:
Viana ganha as eleições de 2010. Tirou 50,51% Nestas eleições, a oposição continuou
da FPA, Sérgio Petecão conquista uma das produção e a geração de emprego. Sua
cadeiras do Senado naquelas eleições, coligação tinha por nome Liberdade e Produzir
naquela Casa. A outra cadeira ficou com ex- Tião Viana usa Pra você vencer na vida, como
quão perto Petecão fica de Jorge Viana em resolvidos. Para seu governo, escolheu o
percentagem devotos. Principal estrela da FPA s lo g a n Servir de todo coração (ver imagem
e considerado por muitos como o "melhor supra), como a dizer que seu governo não seria
tirou 31,77% dos votos, ao passo que Petecão Isso ficou apenas no s lo g a n . Os
tirou consideráveis 30,90%. Trata-se de uma problemas com a imprensa continuaram. Certa
5 O segundo candidato ao Senado pela Frente Popular foi Edvaldo Magalhães, que conseguiu 19,13% dos votos.
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p esad a mão do governo. Lembremos, apenas sorte dos que nele habitam (SOUZA, 2014, pág.
de cortar ponto e salário. Ameaçou, até, de Tião Viana tira 49,73% dos votos contra 30,10%
sustentável para consumo externo. Digno de deixando a oposição com duas cadeiras no
destaque foi um evento promovido na Rio+20, Senado, e a FPA com apenas uma. Cameli tirou
que recebeu um simbólico nome: Faça do Acre o total de 218.756 votos, mais do que Tião para
investidores para a Amazônia. Baseada na tese continuou insistindo nas mesmas críticas,
ASCENSÃO E QUEDA - O "DESENVOLVIMENTO
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NovoAcreV
Governo parceiro, povo empreendedor, f l
e/ou gás).
A exemplo das empresas Peixes da Amazônia, afundada em dúvidas trabalhistas e ações judiciais, a fábrica de tacos, o Álcool Verde e a fábrica
de borracha, em Sena Madureira, desta vez foi a fábrica de preservativos Natex, localizada no município de Xapuri, que abriu falência no
governo do Acre (disponível em https://contilnetnoticias.com.br/2018/05/tiao-consegue-levar-mais-uma-empresa-a-falencia-e-fabrica-de-
camisinhas-fecha-as-portas/
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maiores que antes, levando insegurança a toda eleições governamentais de 2018. Durante
Acre teve a "segunda maior taxa percentual de Marcus Alexandre de Tião Viana, da própria
Hoje, o Estado não pode mais contrair afirmados. A ascensão. Com Binho,
apontar Tião Viana como "o pior governador sutilezas. O que era trunfo virou pedra de
conquistam as duas cadeiras do Senado em trágico disso tudo é que, como a FPA se
disputa nestas eleições de 2018, deixando sem apropriou do ambientalismo e ficou colada
mandato Jorge Viana, a maior figura da FPA. nele, qualquer preocupação real com a
Petecão ficou com 30,72% dos votos. Bittar proteção da floresta e com seus habitantes
ficou com 23,28%. Jorge Viana com 14,74%, pode ser atrelada aos fracassos de seus
acompanhado de perto por Ney Am orim , com governos. Com isso, é lícito dizer: não
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41
A "SEBRAELIZAÇÃO DO IN DIGENISM O" NA AMAZÔNIA OCIDENTAL COMO
ESTRATÉGIA PARA A MERCANTILIZAÇÃO E A FINANCEIRIZAÇÃO
Lindomar Dias Padilha1
aprofundados sobre uma leitura, talvez épocas históricas, de inserir os povos indígenas
por outro, não as admitimos quando são que foi iniciada a luta pelas demarcações
de terra, a criação da Constituinte de 1988
colocadas de forma absoluta e inquestionável. e o surgimento do movimento político
indígena, bem como suas organizações"
Nossa análise, mesmo considerando todo o
(IGLESIAS & AQUINO, 2005). (grifo nosso)
processo histórico, situa-se nas décadas de
1 Lindomar Dias Padilha é licenciado em Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará (UECE), pós-graduado em Desenvolvimento e Relações
Sociais no Campo, Povos Indígenas, Quilombolas e Comunidades Tradicionais pela Universidade de Brasília (UnB), e mestrando em Direito pela
Universidade Católica de Petrópolis.
2Adoto este termo desde 2012, por ocasião da Rio+20, quando foi publicado o Dossiê Acre. A expressão surge após uma leitura comparativa dos
objetivos contidos no estatuto do Sebrae, e a forma e objetivos contidos na Lei 2.308, a chamada Lei Sisa do Acre. Ao comparar, notei que o
estatuto geral do Sebrae em seu capítulo 5S repete para todos os estados a mesma objetividade, acrescendo apenas as siglas referentes às
unidades da federação (TO -Tocantins; A C -A c re ), e que o mesmo ocorria com a lei acreana que era apenas adaptadas aos estados, repetindo
porém, os objetivos.
42
A "SEBRAELIZAÇAO DO INDIGENISAAO" NA
AMAZÔNIA OCIDENTAL COMO ESTRATÉGIA
PARA A MERCANTILIZAÇÃO E A FINANCEIRIZAÇÃO
O texto de Terri Aquino e Marcelo pior, coloca os povos indígenas como meros
histórica para realizar o que chamo aqui de Os direitos passam a ser uma dádiva,
primeira adequação dos povos e comunidades um presente, uma concessão por parte dos
Vejamos como essa estrutura teórica justifica a oficial nos informa que a princesa Izabel
possuem um pensamento histórico linear. Esta No caso dos indígenas no Acre a ideia é
é uma forma de pensar do Ocidente europeu, a mesma: depois que os direitos lhes foram
colonialista e expansionista. Segundo Padilha dados por pura generosidade das autoridades
(PADILHA, 2016), " f a la r e m t e m p o s h i s t ó r i c o s do Governo da Floresta, a eles, os povos
como se a verdadeira história indígena não paralisados. E raras foram as vozes que se
significasse nada e como se só fosse possível levantaram contra esse ataque aos direitos dos
significá-la a partir de uma "criação povos.
atores de fora, do colonizador. de novas terras, ou das terras que não foram
admitiremos, necessariamente, que no Acre se problema dos povos indígenas no Acre não é a
chegou a um tempo identificado como o falta de terra, mas sim, a falta de gestão. Os
especialmente crítico porque enfraquece a serem gestores de suas terras e dos recursos
43
A "SEBRAELIZAÇÃO DO INDIGENISMO" NA
AMAZÔNIA OCIDENTAL COMO ESTRATÉGIA
PARA A MERCANTILIZAÇÃO E A FINANCEIRIZAÇÃO
Entretanto, a representação tradicional gestão fica limitada aos seus escritórios, sem
dos povos indígenas supostamente não dá uma prática interna, local, nas comunidades. A
conta desta nova demanda, já que os caciques alternativa apresentada, então, é uma:
quase sempre são vistos como incapazes, transform ar as comunidades ou setores dessas
organização sociopolítica dos povos. Por esta indígenas terem acesso a recursos, mas os
razão, se justifica a criação de setores governos, ONGs e empresas terem acesso aos
O fim da UNI deixa um enorme vazio na política indigenista como um todo, e principalmente, na política de atenção à saúde, terra e
educação. Há uma grande perplexidade sobre os caminhos a serem percorridos em relação ao movimento indígena. Passa a ser urgente a
criação de novos espaços para reflexão. Mas, esses espaços são negados e obscurecidos por força da ação político-partidária que ainda atua
de maneira decisiva e controla os recursos destinados à saúde e aos demais setores da vida indígena.
44
 "SEBRAELIZAÇÃO DO INDIGENISMO" NA
AMAZÔNIA OCIDENTAL COMO ESTRATÉGIA
PARA A MERCANTILIZAÇÃO E A FINANCEIRIZAÇÃO
governos e ONGs.
45
A "SEBRAELIZAÇÃO DO INDIGENISMO" NA
AMAZÔNIA OCIDENTAL COMO ESTRATÉGIA
PARA A MERCANTILIZAÇÃO E A FINANCEIRIZAÇÃO
empresas transnacionais do norte, trazendo posse das terras a que se refere este
a tiracolo os governos de seus países, com artigo, ou a exploração das riquezas
propostas "ecologicamente corretas" e naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas
carregando em seu bojo a subordinação ainda exi stentes, ressal vado rel evante
maior dos povos do sul. A terra, lastro do interesse público da União, segundo o
capital natural, está sendo comercializada em que dispuser lei complementar, não
bolsas de valores. Tal sanha também se gerando a nulidade e a extinção do direito
estende aos outros elementos da natureza, a indenização ou a ações contra a União,
como o ar, a biodiversidade, a cultura, o salvo, na form a da lei, quanto às
carbono - patrimônios da humanidade, (grifo benfeitorias derivadas da ocupação de
nosso) boa-fé.
Art. 232. Os índios, suas comunidades e
organizações são partes legítimas para
ingressar em juízo em defesa de seus
A Constituição Federal brasileira, em direito s e in te re sse s, intervindo o
Ministério Público em todos os atos do
seu artigo 231, é clara quanto ao processo (BRASIL, CF Art. 231 e 232).
(grifo nosso)
reconhecimento dos direitos dos povos
4
Jutta Kill é bióloga, ativista e pesquisadora. Sua pesquisa é orientada à ação e apoio aos movimentos sociais e comunidades tradicionais, na
análise de novas tendências na conservação da natureza e proteção ambiental e seu impacto sobre as comunidades. Desde 2000, vem
documentando os impactos locais de inúmeros projetos de carbono florestal e biodiversidade, em particular os que comercializam compensação
de carbono. Combinando pesquisa de campo e análise crítica com fundamento teórico, seu trabalho vem apoiando fortemente a formulação de
argumentos contrários aos esquemas de mercantilização e financeirização da natureza, assim como denunciando as violações aos direitos das
comunidades indígenas e tradicionais na África e América Latina.
46
A "SEBRAELIZAÇÃO DO INDIGENISMO" NA
AMAZÔNIA OCIDENTAL COMO ESTRATÉGIA
PARA A MERCANTILIZAÇÃO E A FINANCEIRIZAÇÃO
Público Federal do Acre - MPF, no contexto do modo tradicional de vida dos povos indígenas
para uma "sebraelização" aprofundada até o
inquérito civil 1.10.001.000166/2016 - 90,
lim ite da m ercantilização total, chegando à
ao falar de financiamento de atividades em financeirização.
Terras Indígenas do Acre diz:
CONCLUSÃO
indicar o ponto onde paramos neste ano de dados por um governante bonzinho que olha
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A "SEBRAEUZAÇAO DO INDIGENISMO" NA
AMAZÔNIA OCIDENTAL COMO ESTRATÉGIA
PARA A MERCANTILIZAÇÃO E A FINANCEIRIZAÇÃO
para os povos da floresta e vela por seus sonhos, f) Hipoteca das Terras Indígenas e áreas de
d) C o n trata çã o de ONGs que prestam conservação com discurso inversamente oposto
consultoria ao governo na formulação de leis e na para confundir.
aplicação de mecanismos ligados aos interesses g) E, por fim, controle absoluto pelo capital
mercadológicos. sobre os bens naturais comuns a todos nós, por
é) Desqualificação e desautorização das meio da mercantilização e financeirização da
lideranças tradicionais em benefício de novas natureza.
lideranças que melhor "dialogam" com essas
novas form as do v e l h o c a p i t a l i s m o ,
"empreendedorismo" e desenvolvimentismo.
Referências bibliográficas
KILL, Jutta. A relação entre o REDD+ e o programa "REDD para pioneiros" - REDD Early Movers, ou REM do banco público alemão
KFW. 2017.
NUNES, Rosenilda Padilha. (Org.) Indígenas em espaços urbanos no acre. Acre: Ed. Mensageiro (Cimi), 2011.
NUNES, Rosenilda Padilha. Entre o Português e o Jaminawa: o bilinguismo e o ensino da língua oficial. Dissertação de Mestrado em
PADILHA, Lindomar D. etal. Dossiê Acre: O Acre que os mercadores da natureza escondem. DF: Cimi, 2012.
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USOS E ABUSOS DA IMAGEM DE CHICO MENDES
NA LEGITIMAÇÃO DA "ECONOM IA VERDE"
Maria de Jesus Morais1
As diferentes trajetórias de vida dos índios,
seringueiros, regatões, ribeirinhos e sulistas A ênfase a "diferentes trajetórias" é
caracterizam, hoje, a identidade do povo acreano e
recorrente desde o início de 1999, quando se
constitui a base para a construção do novo modelo
de desenvolvimento, baseado na valorização dos
instala a primeira gestão do governo da Frente
recursos florestais e da sociobiodiversidade (ACRE,
2010a). Popular do Acre - FPA^ Desde então, a imagem
Com este parágrafo publicado no de Chico Mendes é performaticamente
Resumo Educativo, do livro "O uso da terra apresentada como o idealizador do
acreana com sabedoria", do Zoneamento direcionamento econômico que toma corpo no
Ecológico Econômico do Acre, iniciamos esta Estado, sendo utilizada, também, para
conversa sobre usos e abusos de imagens de ilustração de documentos do governo, como a
Chico Mendes pelo Governo do Estado Cartilha do Plano de Valorização Ambiental.
acreano. Aqui, em nossa conversa, tentaremos
Capa da cartilha do Plano de Valorização Ambiental responder a duas perguntas: 1 - Por que o
Programa REDD (Governo do Acre) discurso identitário ganhou tanta visibilidade e
Plano d e Valorização d o Ativo Am biental
Programa do Ativo Florestal importância no Acre na primeira década do
século XXI? 2 - Quais são os projetos políticos e
V*M|t*‘i*>*f>*#*»<F ‘**n* Sfc*e*«V«*»»»••« u econômicos vinculados a esse discurso
Pr o | * t o dw Pa ^ a m o n tö p s r
identitário? Para respondê-las, vamos começar
S e rv ic e * •**2
discutindo um pouco da trajetória entre o
‘ Professora Associada 3 e pesquisadora do Centro de Filosofia e Ciências Humanas e do Programa de Mestrado em Linguagens, Letras e Identidades da
Universidade Federal do Acre (UFAC). E-mail: mjmorais@hotmail.com.
2Frente de partidos políticos liderada pelo Partido dos Trabalhadores
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USOS E ABUSOS DA IMAGEM DE
CHICO MENDES NA LEGITIMAÇÃO DA
"ECONOMIA VERDE"
com as principais questões do povo acreano, hoje em sua quinta versão. Nas duas primeiras
"desenvolvimento sustentável"; e o outro foi o (o que, não raras vezes, deu-se por cooptação
3 Primeira e segunda gestão 1999 - 2006 (Jorge Viana), terceira 2007 - 2010 (Binho Marques), e quarta e quinta 2011 - 2018 (Tião Viana).
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USOS E ABUSOS DA IMAGEM DE
CHICO MENDES NA LEGITIMAÇÃO DA
"ECONOMIA VERDE"
das lutas e anseios dos movimentos sociais. no Acre, sem, no entanto, negar os signos
acionou um discurso identitário para reivindicar mais de 100 anos de história do Acre. Sentido
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USOS E ABUSOS DA IMAGEM DE
CHICO MENDES NA LEGITIMAÇÃO DA
"ECONOMIA VERDE"
m ig ran tes n o rd estin o s tiv e ra m que tra v a r para A u to n o m ista foi esco lh id o Jo sé G u io m a rd dos
pela d efesa dos serin g ais (R evo lu çã o A c re a n a ); Estado do A cre . E do m o vim en to se rin g u e iro foi
qu arta foi a luta co n tra os "p a u lista s" do g o vern o , com o este da figura 0 2 , onde
(m o vim e n to s so cia is); e a ú ltim a , co n tin u ação fig u ra m Plácido de C a stro , Luiz G á lve z e Chico
d e se n vo lvim e n to e co n ô m ico .
D estes e ve n to s, fo ra m co n stru íd o s os
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USOS E ABUSOS DA IMAGEM DE
CHICO MENDES NA LEGITIMAÇÃO DA
"ECONOMIA VERDE"
atualmente, mais falado e mais acionado para a oficiais, é o reencontro do acreano com a
"venda da imagem Acre", tanto interna quanto
floresta (propiciado pelo governo da FPA),
externamente. Internamente, entre os
através do reconhecimento de uma matriz
seringueiros, para ganhar adesão à proposta do
florestal da sociedade acreana e da
governo e, externamente, dado o simbolismo
implementação de políticas florestais. É o
que carrega o nome de Chico Mendes no
mundo afora, para angariar fundos externos. processo de valorização do passado, ou seja,
'proferido' por Luiz Gálvez, em 1989, é (realizado pelo Governo da Floresta via
discursos como o de que "hoje, somos a que fizeram o Acre; construído, enquanto
continuidade dos ideais dos primeiros discurso, a partir da chegada dos migrantes
acreanos", ou:
nordestinos aos altos rios, os quais foram
[...] nosso projeto é mostrar que é tiveram que aprender a viver com os índios. É
possível viver na floresta sem destrui-la,
também a releitura do passado, a busca dos
a p ro v e ita n d o seu s re cu rso s com
sabedoria, apontando o caminho que a
conhecimentos e valores dos povos que aqui
humanidade procura. Uma sociedade da
f lo r e s t a , ju n ta n d o t r a d iç ã o e a viviam e que aqui chegaram, do aprendizado
modernidade, o passado e o futuro, eis o
com o passado ao longo dos mais de 100 anos
que podemos ser (governador Jorge
Viana, durante as comemorações do de história.
Centenário). A acreanidade funda uma nova
ordem de significados sem negar, no entanto,
as anteriores, e agregando vários discursos:
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USOS E ABUSOS DA IMAGEM DE
CHICO MENDES NA LEGITIMAÇÃO DA
"ECONOMIA VERDE"
"resgate" e uma valorização da história do Acre REDD. Nesta cartilha, o texto ganha o título de
Manifesto dos Povos da Mata:
com a construção de outros sentidos, em
com uma vocação florestal. Vejamos alguns Nós, os povos estabelecidos aqui há
muito tempo, fazemos brilhar, hoje, sob o
trechos de discursos de membros do governo céu do Amazonas, o arco-íris de uma
aliança dos povos da mata. E declaramos
da FPA em alusão aos sonhos e ideais de Chico nosso desejo de preservar nossas formas
de v id a e as r e g iõ e s o n d e n o s
O segredo da sustentabilidade defendido estabelecemos. Temos certeza de que o
pela Florestania foi criado por Chico fu tu ro de n o ssa s co m u n id ad es se
Mendes, cuja proposta de criar as Resex encontra no desenvolvimento de suas
(Reservas Extrativistas) como forma de capacidades pessoais e econômicas, mas
g a ra n tir o m e io de p ro d u ç ã o d o s também que a nação brasileira por amor à
seringueiros uniu a preservação ambiental sua identidade e em respeito consigo
ao interesse econômico. Nós somamos à própria dê-nos garantia de proteção. O
ecologia e ao meio ambiente os elementos a c o rd o d o s P o vo s da M a ta , que
da é tic a , c u lt u r a , o c o n h e c im e n to concluímos aqui no Acre, reúne índios,
tradicional e a distribuição de renda, que seringueiros e habitantes das margens
dão sustentabilidade à Florestania (Gilberto dos rios no espaço comum de proteger e
Siqueira,7Página 20,05-06-2005). preservar aquele grande, no entanto,
frágil ciclo vital, formado por nossas
matas, lagos, rios e fontes. Pois ele é fonte
de nossas tradições culturais.
Em outro discurso, o então
5 O engenheiro florestal Carlos Ovídio Duarte, conhecido como Resende (dada a sua origem geográfica, nascido em Resende -
Rio de Janeiro) nos concedeu entrevista em abril de 2008. Resende foi coordenador do setor de indústria florestal da Funtac,
coordenador do Projeto BID e Secretário de Floresta desde a segunda gestão do governo de Jorge Viana, em 2003.
6Um dos intelectuais articuladores da acreanidade.
7 Secretário da Secretaria de Planejamento do governo do Acre, desde 1999.
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USOS E ABUSOS DA IMAGEM DE
CHICO MENDES NA LEGITIMAÇÃO DA
"ECONOMIA VERDE"
No texto de 1989, toda a ênfase é dada Meu sonho é ver toda esta floresta
preservada, porque nós entendemos que
sobre os "povos" e "populações" e sua relação
ela é a garantia de todo o futuro dos povos
orgânica com o "imenso" "sistema de vida", que da flo resta. Não é só isso, nós não
queremos, nós estamos conscientes de que
faz existir povos e territó rio s (seringueiros, a Amazônia não pode ser um santuário
in díg ena s, r i b e i r i n h o s , floresta, rios, intocável. Agora, nós acreditamos que com
as reservas extrativistas, e basta que o
varadouros...). Para o "desenvolvimento destas governo leve a sério as propostas dos
populações e das regiões", o seu sentido comum seringueiros e dos índios, que eu acredito
que, em poucos anos, a Amazônia poderá
mais profundo é aquele dado pela "comunidade". se t r a n s f o r m a r em u m a r e g i ã o
economicamente viável, não só para nós,
Ali, são povos e populações que tomam a
mas para o país e para toda a humanidade.
centralidade. Para todo o planeta. Agora, sua destruição
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USOS E ABUSOS DA IMAGEM DE
CHICO MENDES NA LEGITIMAÇÃO DA
"ECONOMIA VERDE"
relação ao papel do Estado junto ao movimento para legitimar questões como a exploração e a
condições necessárias para que os ocupantes naquele momento em que Chico viveu e militou
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USOS E ABUSOS DA IMAGEM DE
CHICO MENDES NA LEGITIMAÇÃO DA
"ECONO MIA VERDE"
governo da FPA não é continuidade dos sonhos sobreviver". Opinião também da sindicalista
do Chico Mendes. Com relação a este Dercy Teles: "o movimento em nenhum
madeireiros. Nesse aspecto, tem havido uma visibilidade e importância no Acre na primeira
onde viveu Chico Mendes, que foi "comprado" Mendes) em consonância com a lógica global
Referências bibliográficas
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CONSELHO INDIGENISTA MISSIONÁRIO
Órgão vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)
Leime Regional Amazônia Ocidental
ccfd-terre solidaire