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Coloque o dedo na ferida. Vá até o fundo e não tenha medo de dizer tudo o que
nunca você diria.
Porque se na literatura houver filtros, não poderemos mais assim chamá-la. Ela é
justamente a medida delirante e violenta que suspende todas as convenções e
protocolos.
Basicamente, o que sempre me orientou foi ter em mente que, quando a inspiração
se baseava em pessoas reais e acontecimentos verdadeiros, tudo aquilo era
invenção ao ser reelaborado na página de um conto ou romance.
Eu não podia ter em mente que pessoas com as quais eu havia convivido estavam
sendo representadas por mim, no livro. Eu sempre tive que me descolar das
pessoas e dos acontecimentos para produzir o delírio sobre a linguagem. Eu só
conseguia escrever quando a subversão da realidade se tornava uma nova
formulação ficcional. Sobretudo, somente com a liberdade de delirar sobre pedaços
de memórias era de fato possível produzir literatura.
É preciso romper com quase todos os princípios éticos para a formulação de uma
nova estética. Ou pelo menos de algo que a essa se assemelhe.
Se poupar amigos e familiares for mais importante que sua literatura, você nunca
será um escritor de verdade.
Posso dizer que perdi pessoas ao não filtrar críticas severas a quem estava por
perto. Mas sempre deixo avisado que não estou aqui para fazer uma biografia fofa
somente para agradar.
Mas a minha Joana também tem dívida com a Joana do Marcelo Mirisola em seu
Joana A Contragosto (Editora Record).
Pior ainda quando você superestima a inteligência de alquém que resumiu sua vida
a memes e a dependência crônicas de ervas naturais. Sem contar outras pequenas
ilusões infantis.