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DA REDE TRANS EDUC BRASIL AO INSTITUTO BRASILEIRO TRANS DE EDUCAÇÃO

Andréia Laís Cantelli


Fernanda Ribeiro Pereira
Julia Jorge de Oliveira
Rebecka de França
Sayonara N. B. Nogueira

No cenário educacional brasileiro, professoras e professores transexuais são cada vez mais visíveis.
Ainda que estabeleçam uma minoria em termos numéricos, originam para o debate na educação,
diversas questões polêmicas, sobretudo por conta da curiosidade que instauram e do impacto nos
modos de relação profissional no ambiente escolar1. A Rede Trans Educ Brasil nasceu sob o
protagonismo da professora Marina Reidel, de Porto Alegre (RS), mestre e hoje Diretora do
Departamento de Promoção de Direitos LGBT.
A Rede Trans Educ Brasil surgiu a partir da visibilidade de diversas das professoras travestis e
transexuais, e pela necessidade de se instituírem para dar conta de problemas comuns e de
legislação que lhes favoreça. A especificidade de serem professoras coloca certas questões, que
são novas no cenário das lutas das travestis e transexuais. Em particular trocar experiências e se
apoiar para enfrentar as dificuldades no relacionamento com os colegas de trabalho e os gestores
dos sistemas educacionais são os objetivos da Rede2.
A procura por estes (as) profissionais obedeceu a uma miscelânea de procedimentos. O mais
simples deles foi conseguir contatos em encontros de educação e em encontros do movimento
LGBT. A partir das primeiras, umas foram indicando outras, e algumas foram descobertas por
notícias de jornal e referências nos ambientes virtuais3.
A Rede Trans Educ Brasil até fevereiro de 2012 havia localizado 51 profissionais da educação,
predominantemente travestis e/ou transexuais femininas. Podem supor que esta questão esteja
relacionada à maior presença das mulheres na profissão docente, revelando um processo de
feminização do perfil. Já em 2015 já existia um conjunto de 92 professores (as) transexuais4.
E estes (as) profissionais se distribuem por praticamente todos os estados do Brasil, em capitais,
cidades médias e muitas delas em cidades pequenas pelo interior. A maior parte está em efetivo
exercício em sala de aula, variando entre as séries iniciais, o ensino fundamental e o ensino médio
e docência superior. Algumas exercem funções em secretarias de educação, e outras são
supervisoras, orientadoras educacionais, bibliotecárias e diretoras de escola, neste último caso

1
SEFFNER, Fernando; REIDEL, Marina. Professoras travestis e transexuais: saberes docentes e pedagogia do salto alto.
Currículo sem Fronteiras, v. 15, n. 2, p. 445-464, maio/ago. 2015.
2
Ibidem, 2015.
3
Ibidem, 2015.
4
Ibidem, 2015.
eleitas pela comunidade escolar5.
O 1º Encontro Nacional da Rede Trans Educ ocorreu entre os dias 6 e 9 de maio de 2012, em Belo
Horizonte, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Esse encontro inicial utilizou da
mobilização do 7º Encontro de Transexuais e Travestis da Região Sudeste que é uma das etapas
que também ocorre em outras regiões do país para preparar o encontro nacional de travestis,
transexuais e transgêneros, o ENTLAIDS (Encontro Nacional de Travestis e Liberados que
Trabalham com AIDS) 6,7.
É preciso ressaltar que este encontro aconteceu graças à parceria do NUH - Núcleo de Direitos
Humanos e Cidadania LGBT da UFMG, e o apoio do professor Doutor em Psicologia Social, Marco
Aurélio do Máximo Prado, além do apoio da ANTRA Associação Nacional de Travestis e
Transexuais do Brasil. Ao final do evento registrou-se a primeira ata da Rede tendo em vista os
aspectos apontados bem como a necessidade de continuidade de encontros e seminários das
professoras travestis e transexuais.
Durante os grupos de trabalhos instituídos em 2012, foi retirada uma comissão para organizar um
estatuto próprio da Rede, definição de cargos, e de que maneiras os próximos encontros seriam
realizados, neste momento tivemos a presença das professoras: Carla Silva (RJ), Sayonara
Nogueira (MG), Adriana Sales (MT), Marina Reidel (RS), Giulia (RS), Bruna Raiza (SE), Adriana
Lohanna (SE), Thina (MG) que faleceu em decorrência da aplicação de silicone industrial.
Todavia, o contato entre esses (as) professores (as), ficou limitado às redes sociais e e-mails, na
busca de novos professorxs que pudessem agregar ao movimento. Em 2015 foi criado um grupo
de WhatsApp com o nome da Rede Trans Educ Brasil, que gerou um maior contato destes (as)
profissionais com seus pares, através de indicações. Após a ida da professora Marina Reidel para a
gestão pública, o grupo passou para a administração das professoras Andreia Laís Cantelli e
Sayonara Nogueira.
Em 2017 após um encontro das professoras Andreia Laís Cantelli e Sayonara Nogueira em Belo
Horizonte, propôs-se a formulação novamente da Rede Trans Educ Brasil, com o nome Instituto
Brasileiro Trans de Educação. Foi nesse seminário, que em uma conversa informal demos início a
esse trabalho que se tornou realidade, a partir de 10 de outubro de 2017 em uma assembleia,
reorganizando as funções e pensando no IBTE como um instituto de produção de pesquisa e
conhecimento, parcerias com grupos de pesquisa e estudos de gênero, sexualidade e educação de
Universidades Públicas e Privadas, bem como com secretarias de ensino das esferas municipais,
estaduais e o MEC.
Dentro desse processo de produção de conhecimento, pretendemos, com todas as parcerias
educacionais que desenvolveremos, montarmos uma grade de monitoramento de violência contra
5
SEFFNER, Fernando; REIDEL, Marina. Professoras travestis e transexuais: saberes docentes e pedagogia do salto alto.
Currículo sem Fronteiras, v. 15, n. 2, p. 445-464, maio/ago. 2015.
6
TORRES, Marco A.; PRADO, Marco A. Professoras Transexuais e Travestis no Contexto Escolar: entre estabelecidos e
outsiders. Educação & Realidade, Porto Alegre, v. 39, n. 1, p. 201-220, jan./mar. 2014.
7
TORRES, Marco A. Docência, transexualidades e travestilidades: a emergência Rede Trans Educ Brasil. In: 36ª
Reunião Nacional da ANPEd – 29 de setembro a 02 de outubro de 2013, Goiânia-GO.
pessoas travestis, homens e mulheres transexuais em todos os níveis dos processos de educação.
A grande necessidade de propor essas ações no IBTE surge das ações históricas do movimento
homossexual, depois do movimento GLBT e mais recentemente do movimento LGBT, que suas
agendas de discussão e pautas de monitoramento perpassam por caminhos de direitos humanos
voltados em certa medida pelas questões do HIV/AIDS e pelos direitos humanos dirigidos pelas
vertentes da violência. Dentro desse processo, experimenta-se ainda uma busca por políticas
públicas que abarcam as populações LGB, deixando às questões das travestilidades e
transexualidades a margem de um processo de inserção social.
Dessa maneira, o IBTE, tem como grande característica promover as discussões de pesquisa,
produção de conhecimento e todas as demandas que envolvem processos de educação, bem
como o monitoramento da violência contra as pessoas trans, porém tudo desenvolvido pelas
próprias pessoas trans, que durante todo esse percurso histórico dos movimentos “homossexual,
GLBT e LGBT” no Brasil, a população de travestis, mulheres e homens transexuais viveram na
margem desse processo de produção de políticas públicas, do mercado de trabalho, da educação e
demais demandas sociais cotidianas e rotineiras para todas as pessoas cisgêneras, inclusive as que
tangem os processos de exclusão, que para as pessoas trans isso é algo ainda mais agravante e
violento.
Por isso, tomamos isso como necessidade de desenvolver o IBTE para deixarmos de sermos
pesquisadas/os ou como se costuma chamar coautores/as de trabalhos científicos, porém sem
devolutivas sociais ao seguimento trans. Jamais, em tempo algum, excluiremos parcerias formadas
com pesquisadoras/es, professoras/es e demais produtoras/es de conhecimento e de política que
sejam pessoas cisgêneras, não, essa não é a intenção!
Buscamos com a criação do IBTE uma nova forma de produzir conhecimento, pesquisas, políticas
públicas e demandas educacionais para pessoas trans, e com isso promovermos visibilidade e
abrirmos caminhos, mesmo que a passos lentos, porém largos, dentro de uma sociedade que
condena as pessoas que estão fora de certa heterossexualidade compulsória. O IBTE nesse
sentido, é mais que um instituto, é monitoramento, é parceria, é educação, é política pública, é
produção científica, acadêmica, educacional, ou seja, é produção de vida, de vida trans.

Imagem PARFOR/UESPI

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