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Quando, diante de Pilatos, Jesus se negou a afirmar que era Rei de Roma, confessando,

ao contrário, que seu reino não era desse mundo, queria dizer alguma coisa. Ou quando
expulsou os mercadores do templo, gritando: “A César o que é de César”, também. Ora,
tudo o que é Estado é de César, de modo que Jesus quis dar um recado às gerações futuras:
“não quero uma bancada evangélica para legislar sobre um reino que não me pertence,
obrigado”. A ética cristã é pessoal, e quando se desdobra em direção ao outro é só para
aceitá-lo, nunca para atirar a primeira pedra. Nunca importou a Jesus a orientação sexual
de alguém, o avanço da ciência ou a legalização do aborto. Para os neuróticos que desejam
dar pitaco na vida alheia, além de um bom jato d’água que os acalme, poderíamos jogar
com o seguinte argumento: Jesus disse “vinde a mim todos os que estão cansados” e não
colocou nota de rodapé para excetuar nenhum grupo. Jesus era legal, era inclusivo. Quem
quis tornar o cristianismo religião oficial do Estado foi Paulo, que não tinha nada a ver
com Cristo (ele sequer o conheceu pessoalmente, droga) e detestava mulheres. Mas não
Jesus, que gostava de estar na companhia de mulheres, crianças, mendigos, epiléticos e
aloprados em geral. Esse plano de dominação evangélica não é cristão, mas – demoníaco.
A teologia da prosperidade promete ao crente as mesmas coisas que Satã prometeu (com
muito mais charme) a Jesus durante as tentações do deserto: emprego, casa própria com
piscina e land rover. Em “A Essência do Cristianismo”, Feuerbach denuncia que os
homens foram separados de suas próprias qualidades, todas arremetidas à esfera celeste
dos eternos anjinhos harpistas. Reconciliar os homens entre si e cada qual consigo mesmo
através do resgate de seus atributos (“uma religião do futuro dos homens”) espelhados no
gênero humano foi a tarefa a que se propôs Feuerbach, cuja barba de esquerdista
hegeliano Marx copiou. Fazer descer tudo do céu à terra, das ideias à realidade material,
contra o próprio Hegel, Platão e Paulo de Tarso, era seu principal ofício. Infelizmente, a
teologia da prosperidade, que colocou Deus no papel de mágico e gerente de banco,
acabou realizando tortamente o que Feuerbach pretendia. O problema é que quando tudo
desceu, encontrou a sociedade do espetáculo: canais de tevê, internet, estupidificação
coletiva. Foi só deitar e fazer a festa. O pior é que essa gente segue acreditando tanto na
costela falante de Adão quanto no cartão de crédito. O pior é que essa gente vota.

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