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Christopher West Teologia Do Corpo para Principiantes PDF
Christopher West Teologia Do Corpo para Principiantes PDF
PARA PRINCIPIANTES
CHRISTOPHER WEST
TEOLOGIA DO CORPO
PARA PRINCIPIANTES
Tradução de
ClÁUDIO A. CASASOLA
Editora Myrian
Porto Alegre, 2008
Título do original em inglês:
THEOLOGY OF THE BODY FOR BEGINNERS
© 2004 Ascension Press
Direitos de edição da obra em Língua Portuguesa
adquiridos pela Editora Myrian
Arte:
Mirian Raquel F. Cunha
AGRADECIMENTOS DOTRADUTOR
Um agradecimento muito especial aos amigos que,
livremente, se dispuseram a nos ajudar na finalização
deste livro, em seus aspectos de:
Revisão da tradução: Pe. Dr. João Quaini
Precisão teológica: Pe. Dr. Achylle A. Rubin
Redação final: Oliva Cesca
Digitação, revisão e acompanhamento: Maria Burin Cesca
APRESENTAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
ABREVIATURAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14
I NTRODUÇÃO DO AUTOR . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
CAPÍTU LO 1
QUE É A TEOLOGIA DO CORPO? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
Deus, sexo e sentido d a vida/20; O cristia n i s m o não reje ita o
co rpo/21 ; A sacra m e nta l idade do corpo/22; A tese de João Pa u l o
11/23; O m i stério d ivino/24; Íco ne d a Tri ndade, i magem d e Cris
to e da lgreja/25; A a n a log i a esponsa l/27; A natu reza das a n a lo
gias/28; O corpo e a l uta espi ritua l/29; Os fundamentos da ética
e da c u ltu ra/30; Re ivi n d i c a n d o a ve rd a d e so bre o s exo/3 1 ;
O método do Pa pa e suas a bo rdagens/32.
CAPÍTU LO 2
ANTES DAS FOLHAS DE FIGUE IRA: O PLANO
ORIGINAL DE DEUS PARA O CORPO E O SEXO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35
No começo não e ra ass im/35; Expe riências o r i g i n a i s do ser h u
ma no/36; Solidão orig i n a l: a p r i m e i ra descoberta da "perso
n a l idade"/37; Unidade origi nal: a com u n hão de pessoas/39; Nu
dez origi nal: a chave para entender o plano primordial de Deus/41 ;
O s i g n ificado espo nsal do corpo/44; O el emento fu n d a m e nta l
da existência/45.
CAPÍTU LO 3
AS FOLHAS DE FIGUEIRA EM CENA:OS EFE ITOS
DO PE CADO E A REDENÇÃO DA SEXUALIDADE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
5
Ad u ltério no co ração/48; Pa lavras d e salvação, nã o de conde
naçã o/49; Questionando o dom d e Deus/50; A segund a des
cobe rta do sexo/52; O etos cristão: a mo rali d a d e "do co ra
ção"/54; Liberdade em fa ce da l e i/55; A g raça da cri ação tra ns
fo r m a -se e m g raça d a redençã o/57; Arre pend e i -vos e crede
na Boa Nova/58; Vida no e s pír ito e red ençã o do co r po/59;
Pu reza não é pudor/60; A i n terp retação da s u s pe ita/62; Cres
cendo na pureza a d u lta/64; D i sce rnindo os m ovi m entos do
co raçã o/66.
CAPÍTU LO 4
ALÉM DAS FOLHAS DE FIGUEIRA:
A RESSURREIÇÃO DO CORPO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68
Céu - uma expe riência corpórea/68; Cristo nos d i reciona pa ra
o "casa m ento" fi nal/70; Ícones e ídolos/7 1 ; A visão beatífica/
73; A rea l ização do s i gnificado es ponsal do corpo/74; A co m u
nhão dos santos/76; O nosso Deus é rico e m m isericórd i a/77.
CAPÍTU LO 5
O CELIBATO CRISTÃO:
UM CASAMENTO CELEBRADO NO CÉU . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
Eunucos "po r causa do Rei n o dos Céus"/80; O celi bato d eve
ser esco l h ido l ivremente/8 1 ; O celi bato brota da redenção da
sexua l idade/82; O ens ina me nto de São Pa u lo/83; É o ce l i bato
"me l h or" que o m a t r i môni o?/84; M at r i mônio e ce l i bato se
co m plementa m/85; O ce l i bato expressa o sentido es ponsal do
corpo/86; O casa mento ce l i batá rio d e José e M a r ia/88.
CAPÍTU LO 6
O MATRIMÔNIO CRISTÃO:
IMAGEM DA UNIÃO DE CRISTO COM A IGREJA . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90
Uma s íntese do ens ina mento cristão/9 1 ; O gênio evangel izador
de São Pa u lo/92; Mútua s u b m issão e reverência po r Cristo/93;
O ma rido vi rtuoso/94; A sub m issão na ana logia es pons a l/96;
"Auto ridade" é um chamado a se rvir/97; A resta u ra �ão da san
tidade/98; Esco l h idos e m Cristo desde o começo/99; Este é u m
"g rande m i stéri o"/1 00; O s i gnifica d o d a v i d a humana/1 02;
6
A l i nguagem do corpo/1 02; Disti ngu i r entre os ve rdadeiros e
os fa lsos profetas/1 04.
CAPÍTU LO 7
TEOLOGIA NO QUARTO DE DORMIR:
UMA MORALIDADE SEXUAL LIBERTADORA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1 OS
A p l i c a n d o o p r i n c í p i o b á s i c o /1 06; S e x o e m a t r i m ô n i o
redefinidos/107; Precisamos d e uma "visão total do homem"/1 08;
A es posa como "irmã" e "ja rd i m fechado"/1 1 O; U n i ã o sexu a l:
um teste d e vida o u m o rte/1 1 1 ; Ét i ca d o s i n a l/1 1 3; Fidel i d a d e
à s pro messas do casa me nto/1 1 4; Pate r n i dade/matern idade res
po nsáve l /1 1 6; Qua l a d ife re nça?/1 1 7; Amor ou l uxúria?/1 1 8;
Ca stidade e i ntegração do a mor/1 1 9; Es piritua l idade matrimo
n ia l/1 21 ; A a ntítese da espi ritual idade matri m o n ial/1 22.
CAPÍTU LO 8
A TEOLOGIA DO CORPO NUMA
"NOVA EVANGELIZAÇÃO" . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12 5
Que ve m a ser a "Nova Eva ngel ização?"/1 25; Traze r à terra os
m i stérios d o céu/1 27 ; Enca r n a n d o o Eva ngel ho/1 28; O a n
s e i o h u m a n o leva a Cr isto/ 1 28; O tra bal h o d a Nova Eva n
ge l ização/1 30; O Eva ngelho do corpo/1 31 ; Analogia esponsal
e "a nalogia da fé"/1 32; Co ncl usão/133.
G LOSSÁRIO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 5
FONTES DE I N FORMAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1 50
7
-
AP RES E NTAÇAO
9
Mostra sua importância fundamental na vida humana, como
se vê desde as primeiras páginas da Bíblia.
Já ali aparece o sentido teológico do sexo. Com efeito, a
teologia busca evidenciar tudo o que se refere às realidades que
Deus, em sua bondade, se dignou revelar-nos. E a mais sublime
realidade, entre as coisas criadas deste nosso universo, foi o ser
humano. Criou-o à sua imagem e semelhança ... criou-os à imagem
de Deus, criou-os homem e mulher. Deus os abençoou e disse: sede
fecundos e multiplicai-vos, enchei a terra . . . (Gn 1, 26-28) .
Vê-se então que o ser humano, perfeita imagem e seme
lhança de Deus, não é só homem ou só mulher, mas é homem
mulher. Homem-mulher representa a união íntima, profun
da, de dois seres feitos à imagem de Deus uno e trino: três
pessoas numa só natureza . Por isto, se o homem só já era bom
(Gn 1 ,25), com a mulher chegou à perfeição, resultou muito
bom (Gn 1, 3 1 ) .
E m razão disso, o sentido profundo d a união dos sexos é
chamado por João Paulo II de ícone da Trindade, por represen
tar a união eterna das três Pessoas num só Deus. Nas igrejas
russa e grega denominam-se ícones certas imagens que têm o
dom de evidenciar para os que as contemplam a realidade que
representam. Assim, a união homem-mulher se constitui em re
presentação da "imagem e semelhança" de Deus Trindade.
A união dos sexos tem ainda o dom de revelar a própria
natureza do amor. Esse, com efeito, busca alcançar o máximo
de união com o máximo de distinção. Na Trindade é isto mes
mo que acontece: o máximo de união numa só natureza, e o
máximo de distinção: três Pessoas perfeitamente distintas. As
sim é também o amor entre homem e mulher. Testemunha-o a
Bíblia. Não é bom que o homem esteja só- conclui Deus ao cri�r
Adão. Vou dar-lhe uma auxiliar (Gn 2, 18). Criou a mulher e
levou-a para jun to do homem, que exclamou: Eis agora o osso de
meus ossos e a carne de minha carne . .. por isso o homem deixará
pai e mãe para se unir à sua mulher, e eles se tornarão uma só carne
(Gn 2, 22-24) .
Está aqui o sentido do amor: a máxima união na máxima
10
distinção de pessoas. Na linguagem bíblica, uma só carne signifi
ca união tal quase como se duas pessoas se tomassem uma coi
sa só. No entanto, permanecem bem distintas, dotadas de liber
dade, pela qual devem crescer no respeito e no mútuo estímulo.
Além do mais, do ponto de vista psicológico, o amor verda
deiro, ao atingir determinado grau de crescimento, toma-se ca
paz de aproximar os esposos ao estado de inocência, ainda que
não os imunize das conseqüências do pecado original. O amor,
na verdade, tem a propriedade de transfigurar o corpo. O fenô
meno da vergonha não acontece quando existe um profundo
amor, o que vem a revelar essa transfiguração do corpo. Assim,
os esposos que se amam de verdade não se envergonham da
própria nudez. O mesmo se diga das mães diante dos filhos. A
vergonha é resultado de uma presença ameaçadora, mas, no
amor não existe ameaça, só respeito e proteção.
O mesmo se diga dos processos todos da geração e do par
to. Quando há amor, eles são vividos pelos pais, em especial
pelas mães, como acontecimentos sublimes, divinos - coisas que
a cultura banaliza. Na Folha de São Paulo de 11 de maio deste
ano (2008) leio uma entrevista com o famoso romancista italia
no Umberto Eco. Ao lhe perguntarem qual tinha sido o momen
to mais feliz de sua vida, respondeu: "Quando nasceu meu fi
lho ! " . Há poucos dias, ao fim de uma Missa, convidei os fiéis a
se aproximarem para uma bênção especial. Uma jovem esposa
nos encantou a todos. Grávida, prestes a dar à luz, aproximou
se e pôs-se à frente, feliz, alegre de uma alegria irradiante.
A cultura, infelizmente, não coloca o sexo dentro de suas
verdadeiras dimensões, isto é, ordenado ao amor. Confunde por
demais genitalidade com amor. Tal confusão leva a sentimentos
e atitudes que vulgarizam a relação sexual, vista num contexto
estranho à sua própria natureza.
Para ilustrar isto, permito-me citar uma página escrita por
uma de minhas sete irmãs, descrevendo sua experiência na ges
tação de três filhos .
. . . engravidar - escreve ela - foi o momento mais humano
divino que pude sentir em minha vida. Continuaria dizendo e me
11
perguntando: que plenitude de Espírito Santo acontece numa mu
lher grávida ? f f O que é que enche de I uz o coração dos pais nos
nove meses de gravidez, especialmente no nascimento de um filho ? f
Meu marido, por exemplo, pegava a Paula recém-nascida e rodava
com ela nos braços, dançava e me dizia: Quero outra igual a esta,
quero mais, muito mais filhos, porque é bom demais! Durante a
terceira gravidez, a da Paula, todo mundo me perguntava se era a
primeira, tanta era a alegria, a satisfação que eu transmitia. E dizer
que eu já andava pelos 34 anos. Eu corria, eu sorria, eu cantava o
tempo todo. E quando estive grávida do Marcelo, aos domingos eu
jogava canastra até a madrugada; segunda cedo pegava no traba
lho e não sentia canseira ! E a gravidez do Rodrigo ? Estava no 2°
ano de faculdade, e fazia estágio direto das 7 às 13 horas. A tarde
freqüentava as aulas. A noite saía para reuniões . . . Eu sempre dizia
que durante minhas gravidezes eu tinha um Deus poderoso dentro
de mim, tanta era a disposição que sentia ...
Em resumo, a dificuldade não consiste em saber de que
maneira resolvemos o problema do sexo, mas sim, de que ma
neira resolvemos o problema do amor. Por que se tenta, de to
das as maneiras, desvincular o amor da procriação? O grande
motivo é certamente o egoísmo. O egoísmo conduz à rejeição da
procriação, porque os filhos condicionam dependência. O mes
mo se diga com respeito à rejeição de Deus. Ambas as realida
des acarretam dependência, cada uma a seu modo. Ora, a má
compreensão da liberdade induz a pensar que toda dependên
cia é alienação. Entretanto, o amor é a máxima dependência na
máxima liberdade e felicidade.
Ademais, minha irmã e meu cunhado sentiram ao natural
a relação da procriação com Deus. Quantas outras mães, ao me
ouvirem falar sobre o assunto, me testemunharam essa mes�a
relação! Acontece que o amor é um bem limitado que apela para
a fonte ilimitada de todo bem, o Sumo Bem. Toda a água que
corre sobre a terra é tributária do mar. Assim, todo o amor pro
cede da fonte, de Deus. E não se entendendo a natureza do
amor, rejeita-se a dependência que ele traz.
Essa reflexão que faço brota da leitura meditada deste livro
12
de Christopher West, A Teologia do Corpo para Principiantes de
João Paulo II. Almejo de coração que o nobre leitor faça desse
livro um companheiro fiel de frutuosas meditações. Se nossa
cultura não se empenhar na revalorização do sexo, segundo sua
natureza própria, não podemos esperar como resultado uma
humanidade mais humana.
13
ABREVIATU RAS
14
-
I NTRO D U ÇAO
DO AUTOR
15
precisamente o que o papa João Paulo li explora em profundi
dade e com uma visão penetrante em sua "teologia do corpo" .
Este enfoque novo da teologia do corpo deu e continua dan
do que falar dentro da Igreja. Na verdade, já começou o que
muitos qualificam de "contra-revolução sexual". Ela está avan
çando a todo vapor, e ninguém consegue detê-la.
Para a grande maioria dos cristãos, entretanto, os ensina
mentos do Papa nesta área continuam sendo um tesouro des
conhecido. Por quê? Segundo seu biógrafo George Weigel, um
fator determinante desta situação é "a densidade do material
de João Paulo II; e outro, a falta de uma linguagem capaz de
'transpor ' a teologia do corpo em palavras mais simples e aces
síveis" (WH p. 343) .
Com esta finalidade, lancei, anos atrás, o livro Teologia do
Corpo Explicada, de umas 500 pp., contendo um amplo comen
tário dos ensinamentos do Papa sobre o corpo e o amor sexual.
Nele procurei desdobrar as intuições do Papa e torná-las mais
acessíveis; mas por ser volumoso e de estilo acadêmico, ainda
assustava o leitor de nível médio. Era preciso simplificá-lo ainda
mais. Ao responder a essa necessidade, com humildade apre
sento esta breve introdução sobre "Teologia do Corpo para Prin
cipiantes".
Nela, após uma importante fundamentação, no capítulo
UM, passo a delinear, do capítulo DOIS ao SETE, as princi
pais idéias do ensinamento de João Paulo II de acordo com a
estrutura de seis partes na qual ele a apresentou. O capítulo
OIT O apresenta uma breve conclusão sobre o papel da teolo
gia do corpo em relação à "nova evangelização" . Segue-se um
glossário que não só oferece definições de palavras e frases
chave para uma consulta rápida, mas serve também de res�
mo do livro em si. Por último indico a seção das fontes de in
formação, com nomes de organizações que podem ser usadas
pelos que sabem inglês e querem aprender mais sobre a teolo
gia do corpo segundo o Papa.
No entanto, confesso que esta minha tentativa de popula
rizar a teologia do corpo está longe de ser fácil - é como expio-
16
rar um território desconhecido. Encontrar os melhores termos,
imagens e "estórias" não é brincadeira e continua sendo um
trabalho em andamento. Embora meu objetivo seja expressar
o conteúdo essencial do ensinamento do Papa, faço-o sob o
meu ponto de vista. Como todos os que interpretaram os tra
balhos dele, eu também o faço dentro de minhas perspectivas,
dons e limitações. Quanto ao leitor, pense no que diz São Pau
lo: "Examinai tudo e guardai o que for bom" (1 Ts 5, 21).
Peço a Deus que este livro o ajude a descobrir um mundo
novo. Realmente, se assumirmos de coração a "revolução sexu
al" de João Paulo li, a nossa visão de nós e do mundo não será
mais a mesma.
Christopher West
Abril de 2004
17
CAPÍTULO 1
Q U E É A TEO LOG IA
DO CORPO?
19
DEUS, S EXO E S ENTI DO DA V I DA
20
da exploratória - ao âmago do plano de Deus em relação ao
universo (cf. Ef 5, 31-32) .
21
Noutras palavras, se o Maniqueísmo afirma que " o corpo é mau",
o Cristianismo responde que, ao contrário, ele "é tão bom que
somos incapazes de avaliar toda a sua bondade".
Então, o problema da nossa cultura saturada de sexo não é
propriamente a supervalorização do corpo e do sexo. O proble
ma está em termos falhado na compreensão de quanto o corpo
e o sexo são realmente valiosos. O cristianismo não rejeita o corpo!
Numa espécie de "ode à carne", o Catecismo proclama: "' A car
ne é o eixo da salvação'. Cremos em Deus que é o criador da
carne. Cremos na Palavra feita carne para redimir a carne. Cre
mos na ressurreição da carne, na consumação da criação e na
redenção da carne" (CIC 1015, ênfase do autor).
22
Nós não podemos ver Deus, que é puro espírito. No entanto, o
cristianismo é a religião do Deus que se manifesta. Deus quer
revelar-se a nós. Ele quer tornar visível a todos o seu mistério
espiritual invisível, de forma a podermos "vê-lo". Como faz isto?
Quem de nós não experimentou ainda um profundo senti
mento de pasmo, de admiração, ao contemplar uma noite estrela
da, ou um magnífico pôr-do-sol, ou a delicadeza de uma flor? Em
tais momentos estamos, de certo modo, "contemplando a Deus".
Ou, mais exatamente, vendo seu reflexo. Sim, porque " a beleza da
criação reflete a beleza infinita do Criador" (CIC n. 341). E, contu
do, quem é a coroa da criação? Quem, com mais eloqüência que as
outras criaturas de Deus, "fala" na beleza divina? A resposta é: o
homem e a mulher e o seu chamado a uma comunhão fecunda.
"Deus criou o ser humano à sua imagem. À imagem de Deus o
criou. Homem e mulher ele os criou. Deus os abençoou e disse:
'Sede fecundos e multiplicai-vos"'( ... ) (Gn 1, 27-28).
23
dar o corpo humano - não como um organismo biológico e sim
como uma teologia, como um "estudo de Deus". O corpo não é
divino, mas é um "sinal" do mistério divino.
Sinal é algo que aponta para uma realidade nova, além dele
mesmo, e de certo m o d o faz com que e s s a r e a l i d a d e
transcendental s e torne presente diante d e nós. O mistério divi
no situa-se sempre e infinitamente "além" do sinal, razão por
que não pode reduzir-se ao sinal. O sinal, contudo, é indispen
sável para "tornar visível" o mistério invisível. Conforme lem
bra o Catecismo, o homem, como ser social, "precisa de sinais e
de símbolos para comunicar-se. O mesmo vale para a sua rela
ção com Deus" (CIC n. 1146).
Claro, há que manter cuidadosamente a distinção essencial
entre espírito e matéria, e (mais ainda) entre Criador e criatura.
Mas, ao mesmo tempo, devemos afirmar a profunda união entre
ambos. O cristianismo é a religião da união de Deus com a huma
nidade. É a religião da Palavra (que é puro espírito) que se fez
carne! No " corpo de Jesus, 'Deus, que por sua natureza é invisível,
tomou-se visível aos nossos olhos"' (CIC n. 477). O mistério de
Deus revela-se na carne humana, motivo por que se pode falar em
teologia do corpo. Este não é simplesmente o título de uma série de
palestras do Papa; é a verdadeira "lógica" do cristianismo.
Se, à primeira vista, pode parecer estranho falar no corpo
como uma teologia, essa estranheza se dissipa diante de novos
estudos. Lembre o Natal: não é ele o mistério de um Deus que se
revestiu de carne humana e nasceu de uma mulher? Conforme
João Paulo II, "pelo fato de a Palavra de Deus ter-se feito carne,
o corpo entrou na teologia ( ...) pela porta principal" (02.04.1980).
O M I STÉRIO DIVI NO
24
realidades, porém, situam-se tão longe, tão além das coisas que
podemos entender, que só nos resta valer-nos da palavra "mis
tério" . Mas, mesmo assim, Deus toma-se "cognoscível" - não
por nossa habilidade em decifrar enigmas divinos - e sim por
que ele mesmo se deu a conhecer.
Como ensina o Catecismo, "Deus revela o seu segredo mais
íntimo: Deus mesmo é eternamente intercâmbio de amor: Pai, Fi
lho e Espírito Santo, e nos destinou a participar desse intercâmbio"
(CIC n. 221). Esta afirmação resume o mistério último de Deus e
expressa o sentido da existência humana: amor. Deus é amor, nos
diz o apóstolo João (1 Jo 4, 8). Não só pelo fato de nos amar, mas
porque, em Deus, as três pessoas da Trindade vivem num "inter
câmbio eterno de amor". Este "é o mistério central da fé e da vida
cristã. O mistério de Deus em si mesmo. E, portanto, a fonte dos
demais mistérios da fé, a luz que os ilumina" (CIC n. 234).
Na linguagem do Papa, Deus é uma eterna comunhão de
Pessoas. Uma "comum união" (comunhão) de pessoas se esta
belece quando duas ou mais delas se doam uma à outra, em
amor e serviço. Nenhuma explicação da Trindade pode satisfa
zer. Pela revelação, no entanto, ficamos sabendo que o Pai " gera"
eternamente o Filho, ao qual e para o qual se doa eternamente.
Por sua vez, o Filho (o "amado do Pai") recebe eternamente o
amor do Pai e a ele se doa eternamente. E o amor que eles parti
lham é o Espírito Santo, o qual, como dizemos no Credo de
Nicéia, "procede (eternamente) do Pai e do Filho" .
É aqui que s e encontra a razão d a nossa existência: ó amor,
que por natureza tende a expandir sua própria comunhão. Deus
certamente não necessitava de ninguém mais. O amor da Trindade
é perfeito e completo em si mesmo. No entanto, por pura bondade
e generosidade, decidiu criar uma multidão de pessoas, para que
pudessem partilhar da sua eterna e estática "partilha de amor".
25
primeiro, ser Deus uma comunhão de amor e, segundo, de estar
mos destinados a participar desse intercâmbio. Este duplo "misté
rio" é o que significa o corpo humano desde o primeiro momen
to de sua criação. Como assim? Precisamente pela beleza e pelo
mistério da diferenciação sexual e do chamado a tornar-se com
outro "uma só carne" (cf. Gn 2, 24).
Deus imprimiu em nossa sexualidade o chamado a partici
par, numa "versão criada", do seu eterno "intercâmbio de amor".
Noutras palavras, criou-nos homem e mulher, para podermos
assim reproduzir o seu amor, tornando-nos uma doação sincera
de um ao outro. Essa doação de si estabelece uma "comunhão de
pessoas", não só entre sexos, senão também - se tudo decorrer
normalmente - com uma "terceira" pessoa, que poderá provir de
ambos. Desta forma, o amor sexual transforma-se, em certo sen
tido, num ícone ou imagem terrena, em certo sentido, da vida
íntima da Trindade. (Não sei do leitor, mas eu nunca ouvi os mei
os de comunicação descreverem a coisa desta maneira).
Além de espelhar, por assim dizer, a Trindade, o amor sexu
al retrata a união de Deus com a humanidade. A própria doação
redentora de Cristo é uma nova efusão do amor da Trindade so
bre toda a criação. A Igreja acolhe esse amor e tenta retribuí-lo.
Formando nossos corpos como homem e mulher, Deus lhes deu a
capacidade sacramental de repetirem de alguma forma esse in
tercâmbio entre Cristo e a Igreja. Como diz São Paulo, citando o
Gênesis, "por essa razão, o homem deixará pai e mãe e se unirá à
sua mulher, e os dois serão uma só carne. Este mistério é grande
eu digo isto com referência a Cristo e à Igreja" (Ef 5, 31-32).
Esta passagem da Carta aos Efésios constitui um texto-cha
ve - e até diria, o texto-chave - para entender o corpo e a sexua
lidade, " teologicamente". Cristo é aquele que deixou o Pai no c�u.
Ele também deixou a casa de sua mãe na terra. Para quê? Para
entregar o corpo à sua Esposa (a Igreja), a fim de nos podermos
tornar "uma só carne" com ele. E onde é que nos unimos corpo
ralmente com Cristo? Da maneira mais profunda, na Eucaristia.
Quando todos os mal-entendidos forem aclarados e as
distorções retificadas, o sentido mais profundo da sexualidade
26
humana - da nossa criação como homem e mulher e do nosso
chamado à comunhão - é "eucaristia". João Paulo II descreve a
Eucaristia "como o sacramento do Esposo e da Esposa ". Como o sa
cramento de comunhão, a Eucaristia - segundo o Papa - serve, de
certa maneira, "para expressar o relacionamento entre homem e
mulher, entre o 'feminino' e o 'masculino"' (MD 26). Desde o iní
cio, Deus nos criou homem e mulher, a fim de vivermos numa
"comunhão santa", que prefigura a Comunhão Santa de Cristo
com a Igreja. Por outro lado, a doação do corpo de Cristo à Esposa
Igreja (celebrada na Eucaristia) projeta uma luz definitiva sobre o
significado da comunhão íntima entre homem e mulher.
Não cheguei a conhecer meu sogro; morreu antes que mi
nha esposa e eu nos encontrássemos. No entanto, nutro por ele
a maior admiração por causa deste fato: Durante a Missa, no
dia seguinte ao do casamento, que ele consumara apenas na
noite anterior, ao receber a Comunhão, comoveu-se até as lágri
mas. Indagado pela esposa sobre o motivo de tanta emoção,
respondeu: "Pela primeira vez na vida entendi o significado das
palavras de Cristo 'Isto é o meu corpo, que é dado por vós"' .
A ANALOG I A ESPONSAL
27
quer "impregnar" nossa humanidade com sua vida divina.
Embora seja este um modo bem "terra-a-terra" de falar, ele é
muito mais que uma simples metáfora. Representando a cada
um de nós, uma mulher que caminhou neste planeta abriu-se
de tal maneira ao amor de Deus, que chegou, literalmente, a
conceber a vida divina em seu ventre. Desta forma, como nos
assegura o Catecismo, Maria realizou em plenitude o sentido
esponsal da vocação humana em relação a Deus (cf. CIC n. 505).
É isto que aprendemos da teologia do corpo segundo o Papa:
Deus quis que esse eterno "plano esponsal" fosse tão claro e tão
óbvio para nós, que imprimiu uma imagem dele em nosso pró
prio ser, criando-nos homem e mulher e convidando-nos a tor
nar-nos "uma só carne" .
28
infinita de Deus" (CIC n° 370, ver também n. 42 e 239).
Mesmo admitindo que todas as analogias são inadequadas,
João Paulo II acredita que a analogia matrimonial seja a menos
inadequada. Falando na comunhão do homem e da mulher e
na vida que ela pode gerar, afirma: "Não há neste mundo outra
imagem mais perfeita e mais completa de Deus, Unidade e Co
munhão. Não existe outra realidade humana que corresponda
mais, humanamente falando, àquele mistério divin o "
(30. 12. 1981). A o mesmo tempo que insistimos nesta realidade
humana como imagem da realidade divina, porém, precisamos
respeitar a diferença infinita entre Deus e suas criaturas.
29
do homem está sendo deflagrada no plano da verdade de seu
corpo. Não é por nenhuma coincidência que o apóstolo Paulo,
depois de apresentar o "grande mistério" da "união numa só
carne", na Carta aos Efésios, 5, continua, no capítulo seguinte,
convocando-os a pegar em armas para a batalha cósmica do
bem contra o mal. Enquanto origem da família e da vida em si,
a união dos sexos "está no centro da grande batalha entre o
bem e o mal, entre a vida e a morte, entre o amor e tudo o que a
ele se opõe" (FC, n. 23). Se, portanto, queremos vencer a bata
lha espiritual, a primeira coisa, segundo São Paulo - não estou
brincando, confira você mesmo - é "ter a verdade como cinturão"
(Ef 6, 14). A teologia do corpo é o toque de clarim de João Paulo
li a todos os homens e mulheres, convidando-os a fazer exata
mente isto - vestir-se com a verdade que os libertará para amar.
30
lhares e milhões de indispensáveis uniões sexuais. Suprima ape
nas uma dessas uniões em sua árvore genealógica, e você sim
plesmente não teria existido. Nem tampouco os demais que pro
vieram daquela união. O mundo seria um lugar diferente. Da
mesma forma, retroceda a um certo número de gerações e in
troduza uma união contraceptiva em sua linhagem, e você não
existiria. Tampouco outro qualquer que descendeu daquela ár
vore genealógica, daquele ponto em diante. Uma vez mais o
mundo seria um lugar diferente.
Quando interferimos no plano de Deus em relação ao sexo,
estamos interferindo no fluxo cósmico da existência. A raça hu
mana - sua existência, seu equilíbrio - é literalmente determi
nada pelos que se unem sexualmente, com quem e de que ma
neira o fazem. Quando a união sexual se orienta para o amor e
a vida, ela constrói famílias e, por sua vez, culturas que vivem a
verdade do amor e da vida. Quando, porém, se posiciona con
tra o amor e a vida, o ato sexual gera a morte - o que João Paulo
II descreve com palavras duras e precisas, como a "cultura da
morte". A "cultura da morte" é aquela que, não reconhecendo
o valor infinito de cada ser humano, opta pela "solução" da morte
para seus problemas.
31
encíclica Evangelium Vitae (O Evangelho da vida): "Seria ilusão
pensar que podemos construir uma cultura verdadeira da vida
humana, se não ( . . . ) aceitamos e experimentamos a sexualida
de, o amor e a totalidade da vida segundo seu significado ver
dadeiro e sua interconexão íntima" (n. 97) .
Esta lógica está longe d e ser um bom presságio para a nos
sa cultura. Não vai nenhum exagero em dizer que a preocupa
ção do século XX foi livrar-se da ética sexual cristã. Se quere
mos construir uma "cultura da vida", a tarefa no século XXI
deve ser a de recuperá-la. Infelizmente, porém, a abordagem
muitas vezes repressiva de gerações cristãs anteriores - o cos
tumeiro silêncio ou, na maioria das vezes, a norma incompleta
"não faça isto" - é largamente responsável pela reação cultu
ral ao ensinamento da Igreja acerca do sexo. Precisamos de
uma "nova linguagem" para quebrar o silêncio e reverter a
negatividade. Precisamos de uma nova teologia, capaz de ex
plicar como a ética sexual cristã - longe de ser uma lista ame
açadora de p roibições, como tantas vezes é entendida -
corresponde perfeitamente aos mais profundos anseios de nos
sos corações pelo amor e a união.
Foi por isto que João Paulo II dedicou o primeiro grande
projeto doutrinai de seu pontificado ao desenvolvimento da te
ologia do corpo. Uma volta ao plano original de Deus para a
união dos sexos é o único meio adequado para construir uma
cultura que respeite o sentido e a dignidade da vida. Mas antes
de mergulhar nos ensinamentos do Papa, demos uma rápida
olhada em seu método e sua abordagem.
32
da Igreja "se coaduna com as aspirações mais íntimas do coração
humano" (CIC n. 2126), o Papa não precisa nem tenta forçar a
aceitação de suas propostas. Em vez disto, convida os homens e
as mulheres a refletirem honestamente sobre as próprias experi
ências de vida, para ver se elas confirmam as propostas dele.
Os que foram desiludidos com a avaliação tendenciosa de
certos moralistas acharão esta abordagem encantadoramente
construtiva. O Papa não impõe coisa alguma nem aponta o dedo
contra ninguém. Ele simplesmente reflete com amor sobre a Pa
lavra de Deus e a experiência humana, para demonstrar a pro
funda harmonia entre ambas. Em seguida, com o maior respei
to à liberdade, convida a abraçar a nossa própria dignidade.
Não importa saber quantas vezes falhamos, preferindo o que é
inferior. Esta é uma mensagem de cura e redenção sexual e não
de condenação.
Com essa abordagem compassiva - a abordagem do Evan
gelho - João Paulo II desloca o debate sobre a moralidade sexu
al, do legalismo para a liberdade. Para o legalista a pergunta é:
"Até onde posso ir sem transgredir a lei?" Mas para o Papa, a
pergunta é outra: "Qual é a verdade a respeito do sexo, que me
torna livre para amar?" Em resumo, através de uma reflexão
bem profunda sobre as Escrituras, especialmente sobre as pala
vras de Jesus, a teologia do corpo de João Paulo II pretende res
ponder a duas perguntas universais: "Que significa ser homem?"
e "Como devo viver minha vida para chegar à verdadeira felici
dade?". Essas perguntas delineiam as duas partes mais impor
tantes do estudo do Papa. Cada uma delas, por sua vez, tem
três etapas ou subdivisões, como se vê a seguir.
Para entender o que somos como homem e mulher, deve
mos considerar os três níveis ou etapas do drama humano:
• ETAPA 1: Nossa origem. Diz respeito à experiência hu
33
Fundamenta-se nas palavras de Jesus no Sermão da Montanha,
quando fala no adultério cometido no coração (cf. Mt 5, 27-28).
• ETAPA 3: Nosso destino. Reporta-se à experiência huma
34
CAPÍTULO 2
35
lhes dizendo mais ou menos o seguinte: "Você acha normais es
sas tensões, conflitos e preocupações na relação homem-mulher?
Não, isto não é normal. Não foi esta a intenção de Deus ao insti
tuir o casamento. Algo terrivelmente errado aconteceu".
Eis aqui uma comparação que gosto de usar para esclare
cer este ponto. Imaginem estarmos todos rodando pela cidade
em automóveis de pneus vazios. A borracha caindo aos peda
ços, os aros se amassando e se deformando, e todo mundo
achando isto muito normal. Afinal, todos os pneus são vistos
rodando assim. De acordo com a analogia, Jesus estaria dizen
do aos fariseus (e a todos nós): "No começo havia ar nos pneus".
Se queremos, pois, entender o sentido da união "numa só
carne", de acordo com Cristo, devemos retomar ao "começo",
antes que o pecado desfigurasse as coisas. Este é o padrão. Esta
é a norma. Lendo neste nível as reflexões de João Paulo II sobre
os textos da criação, nos damos conta de quanto nos distancia
mos do plano de Deus. Mas não se desespere! Cristo não veio
para condenar os que andam de pneus vazios, e sim para enchê
los e calibrá-los novamente. Não podemos voltar ao estado de
inocência, já o perdemos. No entanto, seguindo Cristo, pode
mos recuperar o plano original de Deus sobre os sexos e vivê-lo
com a ajuda de Cristo (cf. CIC n. 1, 15).
36
Temos estas experiências através do "simbolismo da lingua
gem bíblica" (CIC n. 375) . Simbolismo é o meio mais adequado
para transmitir verdades espirituais profundas, como procura
fazer o Gênesis. Não percamos tempo com a afirmação de que a
ciência moderna "rejeitou" as estórias da criação apresentadas
pelo Gênesis. As estórias da criação nunca pretenderam apre
sentar cientificamente a origem do mundo. O conhecimento ci
entífico é certamente valioso pelo seu grande avanço, mas é in
capaz de explicar o significado espiritual da nossa existência.
Dali porque os autores divinamente inspirados da Bíblia usam o
simbolismo, com o qual estamos familiarizados.
Demos uma comparação. Veja que diferença faz para uma
mulher quando o oftalmologista olha para os olhos dela, e quan
do faz isto seu marido ou namorado. O cientista olha sua
córnea e registra os fatos científicos, ao passo que o marido ou
o namorado olha para a alma dela e proclama algo mais poé
tico e inspirado. É ao menos o que se espera. Perguntamos:
acaso o cientista "rejeita" aquele que ama? Não. Trata-se ape
nas de duas perspectivas da mesma realidade. O autor do
Gênesis não foi um cientista, mas um amante inspirado por
Deus, para proclamar os mistérios espirituais, a origem do
mundo e da humanidade. Precisamos ter isto em mente ao
examinar as estórias da criação.
De acordo com João Paulo, três experiências especiais defi
nem o ser humano em seu estado de inocência: solidão, unidade
e nudez. Muita tinta poderia ser gasta para destrinçar as pro
fundas reflexões do Papa sobre essas experiências. Limito-me a
apresentar aqui um esboço básico. Assim como faço eu, veja
também o leitor se consegue perceber um "eco" dessas experi
ências em seu próprio coração.
"O Senhor Deus disse então: 'Não é bom que o homem es
teja só. Vou fazer-lhe uma auxiliar que lhe corresponda"' (Gn 2,
37
18). O significado mais óbvio desta "solidão" é que o homem se
encontra sozinho, sem mulher. No entanto, deste versículo o
Papa extrai um sentido mais profundo. No relato da criação
nem sequer se faz distinção entre homem e mulher, até o " sono
profundo" de Adão. Aqui Adão nos representa a todos - ho
mens e mulheres (adão, no hebraico, significa "homem" em sen
tido genérico) . Ele surpreende-se "sozinho", pois é a única cria
tura corpórea feita à imagem e semelhança de Deus. Como ho
mem, está "sozinho" no mundo visível como uma pessoa.
Quando se põe a dar nomes aos animais, descobre também
seu próprio "nome", sua identidade. Ele procurou uma "auxili
ar" entre os animais, e não a encontrou (cf. Gn 2, 20) . Ele era
diferente dos animais. E que é que o ser humano tem e os ani
mais não? A liberdade. Adão não é determinado por sua
instintividade. Como os animais, também ele foi tirado do "pó"
(tem um corpo). Concomitantemente, porém, ele possui um "so
pro de vida" que inspira seu corpo (cf. Gn 2, 7). E um corpo
inspirado é bem mais que um simples corpo, é alguém, uma pes
soa. E uma pessoa pode decidir o que fazer com seu corpo. Sim
ples pó, não!
Nesta liberdade, Adão experimenta-se como um eu. Ele é
mais que um "objeto" no mundo. É um "sujeito". Possui um
"mundo interior" ou uma "vida interior", coisa que não se pode
dizer de um esquilo ou de uma galinha. É precisamente essa
"vida interior" que as palavras "sujeito" e "pessoa" incluem.
Apesar de certas propagandas modernas afirmarem o contrá
rio, sabemos intuitivamente que as galinhas não são "gente".
Devemos ter um respeito especial a todas as criaturas de Deus
(cf. CIC n°. 2415-241 8), apesar de nenhuma outra criatura
corpórea participar da dignidade de ser criada à imagem de D«;us.
Por que foi Adão dotado de liberdade? Por ter sido chama
do a amar e, sem liberdade, é impossível amar. Em sua solidão,
o primeiro homem percebe que sua origem, sua vocação e seu
destino é o amor. Percebe que, diferentemente dos animais, é
convidado a entrar em "aliança de amor" com o próprio Deus.
É esta união de amor com Deus que, mais do que qualquer ou-
38
tra coisa, define sua "solidão". Ao experimentar esse amor, com
todo o seu ser anseia por partilhá-lo com outra pessoa igual a
ele. É por isto que "não é bom para o homem ficar sozinho" .
É n a solidão, portanto, que Adão descobre a sua dupla vo
cação: amar a Deus e amar ao próximo (cf. Me 12, 29-31) Des
.
39
deslumbramento ao ver a mulher. Sua exclamação: "Eis enfim o
osso dos meus ossos e a carne da minha carne ! " (Gn 2, 3) ex
pressa todo o seu fascínio e admiração.
Note-se o enfoque no corpo. Adão está fascinado pelo corpo
dela, porque, como explica o Papa, este "finalmente" é um cor
po que expressa uma pessoa. Todos os animais aos quais deu
nome eram corpos, mas não pessoas. Em nosso idioma, essas
palavras não dizem muito, mas para os judeus, "carne" e "os
sos" significavam o ser humano inteiro. Por isto, a criação da
mulher a partir de um osso de Adão (cf. Gn 2, 21-22) é uma
forma figurada de expressar que ambos, homem e mulher, par
ticipam da mesma humanidade. Ambos são pessoas feitas à
imagem de Deus. Ambos estão "sozinhos" no mundo, pois são
diferentes dos animais (solidão original); mas ambos são chama
dos a viver numa aliança de amor.
"Por isso deixará o homem seu pai e sua mãe e se unirá à
sua esposa, e os dois se tornarão uma só carne" (Gn 2, 24) . Esta
experiência de unidade suplanta a solidão do homem, no sentido
de ele estar sozinho sem o "outro". Mas afirma tudo sobre a
solidão humana, no sentido de o homem e a mulher serem pes
soas diferentes dos animais. A união humana "numa só carne"
está a mundos de distância da copulação dos animais. Qual a
grande diferença? Embora, biologicamente, se pareça, a união
sexual humana é muito mais do que uma realidade biológica. É
também uma realidade espiritual e teológica. O corpo humano
revela o mistério espiritual do amor divino e dele participa. Como
declara o Catecismo, "no casamento a intimidade corporal dos
esposos torna-se um sinal e um penhor de comunhão espiritu
al" (CIC, n. 2360). Os animais são incapazes dessa "comunhão
espiritual" por não serem espirituais. O seu "pó" ou a sua "l}la
téria" carecem de inspiração. Falta-lhes o espírito, pois não fo
ram feitos à imagem de Deus.
O tornar-se "uma só carne", repetimos, não consiste ape
nas na união de dois corpos (como no caso de animais); é "uma
expressão 'sacramental' que corresponde à comunhão de pes
soas" (25.06.1980) . Lembre-se aqui o que dissemos sobre a
40
"sacramentalidade" do corpo. Ele toma visível o mistério invisí
vel de Deus, que é em si mesmo uma eterna comunhão de Pes
soas; de Deus, que em si mesmo é amor.
Nesta altura, o Papa faz uma explanação dramática do
pensamento católico. Tradicionalmente, o pensamento de mui
tos teólogos era que nós somos retratos de Deus enquanto indi
víduos, mediante nossa alma racional. Não resta dúvida de que
isto é verdade. João Paulo 11, porém, dá um passo adiante: "O
homem torna-se imagem de Deus não tanto no momento da
solidão, quanto no da comunhão". Noutras palavras, ele reflete
Deus, "não apenas através de sua própria humanidade, senão
também através da comunhão de pessoas, que o homem e a
mulher formam desde o começo". E chega a dizer que isto "cons
titui, talvez, o aspecto teológico mais profundo de tudo o que se
pode falar sobre o homem" . "Sobre tudo isto - observa por fim
- desde o começo desceu a bênção da fertilidade" (14. 11 . 1 979) .
Deus não podia ter dado uma finalidade e uma dignidade
maiores ao amor sexual. Como dissemos há pouco, a união con
jugal deve ser um ícone da vida íntima da Trindade! Se pudésse
mos assimilar esta verdade e refletir sobre ela, nunca mais enca
raríamos o sexo do mesmo jeito. Deus - lembre uma vez mais -
não é sexual. A imagem terrena empalidece quando comparada
com a realidade divina. Deus, no entanto, nos 'criou homem e
mulher e nos chamou à comunhão, como revelação primordial
(original, fundamental) de seu próprio mistério no mundo cria
do. É isto que deseja significar o Papa ao descrever o matrimônio
como o "sacramento primordial". Toda a realidade da vida matri
monial toma-se, naturalmente, um sacramento. Em nenhum lu
gar, porém, o "grande mistério" se expressa com mais evidência
do que no momento em que os dois se tomam "uma só carne".
41
Após descrever sua união, a Bíblia conta que "o homem e a
mulher estavam nus e não se envergonhavam" (Gn 2, 25). De
todas as passagens nas estórias da criação, segundo o Papa, esta
é "precisamente a chave" para compreender o plano original de
Deus para a vida humana. Trata-se de uma afirmação corajosa.
Em resumo, se não compreendemos o sentido de Gênesis 2,25,
não entendemos o sentido da nossa criação como homem e mu
lher; não compreendemos a nós mesmos e o sentido da vida.
Mas de que jeito podemos entender a nudez original se
nós, tendo herdado as "folhas de figueira", não temos dela
uma experiência direta? Só podemos fazê-lo por comparação:
olhando para nossa própria experiência de vergonha e "dan
do-lhe meia-volta" .
A mulher não sente necessidade d e cobrir o corpo quando
está sozinha no chuveiro. Se, porém, um estranho entra de sur
presa, ela prontamente reage, tapando-se. Por quê? Segundo o
Papa, aqui a "vergonha" é uma forma de autodefesa contra o
perigo de ser tratada como simples objeto sexual. Ela tem cons
ciência de que, desde sempre, nunca se disse que ela podia ser
tratada como " coisa", para o prazer de alguém. E por experiên
cia também sabe que os homens (por causa da luxúria resultan
te do pecado original) tendem a ver o corpo da mulher como
uma coisa. Por isto o cobre, não por julgá-lo "mau" ou "vergo
nhoso", e sim para resguardar a própria dignidade ante os "olha
res sensuais" de estranhos - olhares que não respeitam sua dig
nidade de pessoa, concedida por Deus.
Tome essa experiência de medo (vergonha) diante de outra
pessoa e, "dando-lhe meia-volta", chegamos à experiência da
nudez de Adão e Eva sem sentirem a menor vergonha. A luxú
ria (desejo sexual para satisfação própria) ainda não tinha pe
_
netrado no coração humano. Daqui porque nossos primeiros
pais não sentiram necessidade de autodefesa na presença do
outro, simplesmente por que o outro não representava nenhu
ma ameaça à sua dignidade. Como se expressa poeticamente o
Papa, eles "se olham e se conhecem ( . . . ) com toda paz do olhar
interior" (02.01 . 1980). Esse "olhar interior" indica não apenas
42
a presença de um corpo, e sim de um corpo que revela um mis
tério pessoal e espiritual. Eles viram o plano de amor de Deus
(teologia) como que gravado em seus corpos nus, e isto era exa
tamente o que desejavam: amar como Deus ama, em e através de
seus corpos. E não existe medo (vergonha) no amor. "O perfeito
amor lança fora o temor" (1 Jo 4, 18).
Tal a razão porque a "nudez sem envergonhar-se" é a cha
ve para entender o plano de Deus sobre nossas vidas - ela reve
la a verdade original do amor. Guarde bem este detalhe: Deus
criou o desejo sexual "no princípio", para que fosse o verdadei
ro poder de amar como ele ama - em livre, sincera e total doa
ção de si mesmo. Foi assim que o casal descrito no Gênesis o experi
mentou . O desejo sexual não era sentido como uma compulsão
ou instinto de gratificação egoísta. A experiência da luxúria só
vem com o alvorecer do pecado. É o resultado do que podemos
chamar de "síndrome dos pneus furados" .
"Totalmente inflados" que estavam com o amor d e Deus, o
primeiro homem e a primeira mulher sentiam-se plenamente
livres para transformar-se em doação mútua. Eram livres "com
a liberdade própria da doação", como destaca o Papa
(16.01 . 1 980) . Somente uma pessoa livre da compulsão da luxú
ria é capaz de tornar-se um verdadeiro "dom" para o outro. A
"liberdade da doação" é, portanto, a liberdade para abençoar,
que significa estar livre da compulsão de agarrar e possuir. Foi
esta liberdade que permitiu ao primeiro casal �iver "nu sem a
mais leve sombra de vergonha" .
E m conseqüência d o pecado, a nossa experiência d e sexo
ficou terrivelmente distorcida. Em meio a essas distorções, po
demos até pensar que deve realmente haver algo de errado com
o sexo em si mesmo (a mentalidade "corpo-mau/ sexo-sujo" parte
daqui). As distorções, porém, não estão no âmago do sexo. No
âmago do sexo descobrimos, isto sim, um sinal da própria bon
dade de Deus. "Deus contemplou sua obra e viu que tudo era
muito bom" (Gn 1,31).
Conforme João Paulo li, a nudez sem envergonhar-se mos
tra que o primeiro casal participou da mesma visão de Deus.
43
Eles conheceram sua bondade. Conheceram o glorioso plano de
amor traçado por Deus. Viram-no inscrito em seus corpos e o
experimentaram na atração mútua. Com o surgimento do peca
do, porém, perdemos essa gloriosa visão. Mas não esqueça que
"Jesus veio restaurar a criação na sua pureza original" (CIC n.
2336) . Claro, isto só se completará no céu; no entanto, através
da graça da redenção, podemos começar a reconquistar ainda
nesta vida o que se perdeu.
44
tanto, a sua "capacidade de expressar o amor: precisamente
aquele amor no qual a pessoa se torna um dom e - através desse
dom - realiza o verdadeiro significado de seu ser e de sua exis
tência" (16.01 . 1980) .
Se você está procurando o sentido da vida, saiba que, de
acordo com João Paulo II, ele se encontra impresso ali mesmo em
seu corpo - em sua sexualidade! A finalidade da vida consiste em
amar como Deus ama, e é isto que seu corpo como homem ou
como mulher o chama a fazer. Pense desta maneira: tanto o cor
po do homem como o da mulher não têm sentido por si só. Mas,
vista à luz de um para o outro, a diferenciação sexual revela o
plano inequívoco de Deus, isto é, que o homem e a mulher foram
feitos para serem um dom de um para o outro. E não só isto: a sua
mútua doação (no curso normal dos acontecimentos) desemboca
num "terceiro". Conforme o Papa, o "conhecimento" leva à ge
ração: " Adão conheceu sua mulher e ela concebeu" (Gn 4,1).
Paternidade e maternidade " coroam" e revelam plenamente
o mistério da sexualidade. A primeira orientação de Deus, no
Gênesis: "Sede fecundos e multiplicai-vos" (Gn 1,28), não é mera
imposição para a propagação da espécie. É um chamado para
amar à imagem de Deus e assim "realizar o sentido próprio do
nosso ser e da nossa existência" .
45
Ef 5, 31-32). Também isto ficará bem claro mais adiante; mas aque
les que optam pelo celibato cristão "passam por cima" do matri
mônio terreno para se entregarem totalmente àquele eterno.
Seja qual for a nossa vocação pessoal, somos todos chama
dos a participar no amor de Deus e a partilhá-lo com outros.
Quando temos a necessária pureza para entender isto, veremos
que é isto mesmo que nos ensinam o corpo e a sexualidade. O
significado esponsal do corpo (isto é, o chamado para amar ins
crito por Deus em nossa carne) revela o que o Vaticano li des
creveu como "o chamamento universal à santidade". Quanta
gente, no entanto, despreza o corpo e a sexualidade em nome
de uma suposta santidade! O significado esponsal do corpo cons
titui "o elemento básico da nossa existência no mundo"
(16.01 . 1980). Não desprezemos isto! Quanto mais crescemos em
santidade autêntica (isto é, encarnada), tanto mais "descobri
mos e fortalecemos o vínculo que existe entre a dignidade do ser
humano (homem ou mulher) e o significado esponsal de seu
corpo" (21 .07. 1 982).
Como crescer nesta santidade autêntica, encarnada? Como
devemos começar a resgatar algo da felicidade e da paz experi
mentadas pelo primeiro homem e a primeira mulher? É o que o
Papa tenta responder no próximo capítulo.
46
CAPÍTULO 3
47
ADULTÉRIO NO CORAÇÃO
48
a atração da luxúria é que vai fazer a diferença. Depende se,
neste momento, voltamos nossa atenção a Deus e lhe pedimos
ajuda para resistir, ou nos entregamos a ela. Se a aceitamos, re
solvendo " em nosso coração" tratar aquela pessoa como um mero
objeto para a nossa própria satisfação, estamos violando grave
mente a dignidade dela e também a nossa. Fomos criados para
sermos amados "para o nosso bem", e não para sermos usados
como objetos de satisfação para outros. Para João Paulo li, o oposto
do amor não é o ódio, mas o uso de alguém para fins egoístas.
Ademais, é significativo que Cristo se refira a olhar com lu
xúria para uma "mulher" no sentido genérico. Não distingue se é
uma outra mulher ou a própria esposa. Como observa o Papa,
um homem comete " adultério em seu coração" não somente quan
do olha com luxúria para uma mulher com a qual não está casa
do, "mas precisamente por olhá-la de forma ilícita. Até mesmo
olhando assim para a própria mulher, poderá cometer adultério
'em seu coração'" (08.10.1980). Noutras palavras, o casamento
não justifica a luxúria. Usar a mulher não é " correto", mesmo que
seja sua esposa. Sei que isto é um chavão, mas por que será que
tantas esposas alegam estar com "dor de cabeça", quando os
maridos querem unir-se sexualmente a elas? Se uma mulher nota
que está sendo usada pelo marido, é plenamente compreensível
que se recuse. O amplexo sexual deve ser sempre figura e expres
são do amor divino. Qualquer coisa em contrário é uma falsifica
ção que, além de não satisfazer, machuca terrivelmente.
49
As palavras de Cristo sobre a luxúria nos convidam a "as
sumir nossa imagem total" (cf. 23.04.1980) . Como parte da he
rança do pecado original, a luxúria obscureceu em nós o mara
vilhoso plano original de Deus a respeito do amor sexual - mas
não o apagou. O Papa insiste que a herança depositada em nos
sos corações é mais profunda que a luxúria; e se formos honestos
conosco mesmos, ainda aspiramos ao que é mais profundo. Sen
do o coração humano um poço abismal, é normal que se encon
trem nele muita sujeira e barro. Mas, se penetramos além da
lama e do lodo, bem no fundo encontramos uma fonte que, uma
vez ativada, pouco a pouco vai enchendo o poço de água viva e
pura, até transbordar. Essa fonte representa a "herança mais
profunda" de nossos corações. Conforme João Paulo II, as pala
vras de Cristo reativam aquela herança mais profunda, e infun
dem verdadeiro poder em nossas vidas (29 . 1 0 . 1 980).
Isto não significa que devemos passar a vida inteira comba
tendo a nossa luxúria e a nossa desordem interior. Cristo não
morreu na cruz e ressuscitou dos mortos só para nos dar maio
res mecanismos na luta contra nossos pecados. Já tínhamos es
tratagemas de sobra, antes da vinda do Salvador. Se Cristo mor
reu na cruz e ressuscitou dos mortos, foi para que pudéssemos
viver uma vida nova (cf. Rom 6,4). Essa "vida nova" - sublinhe
mos uma vez mais - somente se completará na ressurreição no
final dos tempos. "Mas não é menos verdade que, de certo modo,
já ressuscitamos com Cristo" (CIC n. 1 002). Aqui e agora já po
demos começar a experimentar a redenção de nossos desejos
sexuais, a transformação gradual do coração. É uma empreita
da difícil e até árdua, mas possível de ser realizada.
50
O Papa descreve o pecado original como o " questionamento
do dom". Permita explicar-me. O mais íntimo anseio do cora
ção humano é ser "igual a Deus", participar em sua vida, em
seu amor. Desde o início, Deus já havia concedido ao homem e
à mulher uma certa participação em sua própria vida, em seu
amor, de forma absolutamente gratuita. Usando a imagem
esponsal, Deus iniciou o dom de si mesmo como "esposo", e dis
pôs o ser humano (homem e mulher) para receber o dom como
"esposa" . Por sua vez, o homem e a mulher foram habilitados a
refazer essa mesma imagem de "intercâmbio de amor", através
da mútua doação na união matrimonial.
Para manterem esta semelhança divina e permanecerem
em seu amor, Deus só lhes pediu uma coisa: não comer "da
árvore da ciência do bem e do mal". Caso contrário, perderiam
o contato com a fonte da vida e do amor. Em outras palavras,
morreriam (cf. Gn 2,16-17).
Parece tão simples. Por que então deu tudo errado? " Atrás
da desobediência de nossos primeiros pais, esconde-se uma voz
sedutora oposta a Deus que, por inveja, os leva a cair na morte. A
Escritura e a Tradição da Igreja vêem neste ser um anjo decaído,
chamado 'Satanás' ou 'Diabo"' (CIC n. 391). Como observamos
no capítulo 1, Satanás não é burro. Ele sabe que Deus criou a
união dos sexos como uma participação na vida divina; e seu
objetivo foi, e continua sendo, apartar-nos disto. Daqui porque
ele centraliza seu ataque " exatamente no coração daquela união
que, 'desde o começo', era formada pelo homem e pela mulher,
criados e escolhidos para serem 'uma só carne"' (05.03. 1980).
Aproximando-se da mulher - aquela que nos representa a
todos como "esposa" em nossa receptividade em relação ao dom
de Deus - a serpente insiste: "De jeito nenhum vão morrer. Pelo
contrário, Deus sabe muito bem que, no dia em que comerem da
árvore proibida, os olhos de vocês se abrirão, e serão como Deus,
conhecedores do bem e do mal" (Gn 3,4-5). Mas também é possí
vel entender assim a tentação da serpente: "Deus não os ama
coisa nenhuma, não liga o mínimo para vocês. Ele é um tirano,
um senhor de escravos, que, no fundo, não está afim de lhes dar
51
o que reahnente desejam. Foi por isto que lhes proibiu comer da
quela árvore. Se quiserem ter vida e felicidade, se quiserem ser
'como Deus', devem ir à luta e apanhar vocês mesmos as frutas
da árvore, porque Deus não lhas dará jamais de mão beijada".
Aqui está o questionamento e, por fim, a negação do dom de
Deus. No momento em que se recusam a recebê-lo de Deus e ten
tam agarrar a sua "felicidade", dão as costas ao amor de Deus, ao
dom de Deus. De certa forma, expulsam o amor de Deus de seus
corações. "Então seus olhos se abriram e, vendo que estavam nus,
teceram para si tangas com folhas de figueira" (Gn 3,7).
A tendência de "agarrar" parece estar implantada em nos
sa natureza decaída. Podemos constatá-la até nas criancinhas.
Por exemplo, quando meu filho pede um doce de sobremesa,
antes ainda de eu tirá-lo da caixinha para lho entregar, que é
que ele faz? Agarra a caixinha. Então aproveito para ensiná-lo,
dizendo-lhe, por exemplo: "Calma, Tomás, deste jeito você está
desprezando o presente do papai. Papai gosta de você. Quer
dar-lhe este doce de presente. Se você acredita, não precisa fa
zer outra coisa que estender sua mãozinha e receber o doce". Este
é o problema de todos nós. Não acreditamos bastante no amor do
Pai, e por isto avançamos e tentamos agarrar a felicidade.
A S EG U N DA DESCOBERTA DO S EXO
52
mento de doação tomou-se um relacionamento de apropriação"
(23.07. 1980) . "Apropriar-se", neste sentido, significa "apode
rar-se de" com desejo de usufruir.
O Papa chama a isto de " segunda descoberta do sexo". Na
"primeira" descoberta do sexo, eles experimentaram uma paz e
uma tranqüilidade totais. De repente, porém, sentem-se " amea
çados" . Originariamente a nudez revelava-lhes sua dignidade
de semelhança divina. Agora eles, instintivamente, escondem
sua nudez do olhar do outro.
A vergonha tem, pois, um duplo sentido: primeiro, indica
que eles perderam de vista o significado esponsal de seus corpos
(o plano de Deus em relação ao amor, inscrito na sexualidade);
em segundo lugar, revela uma inerente necessidade de proteger
o sentido esponsal do corpo contra a degradação da luxúria.
Conforme o expressou poeticamente o Papa, a luxúria "passa
sobre as ruínas" do sentido esponsal do corpo, para satisfazer
direta e unicamente sua "necessidade sexual" (cf. 1 7.09.1980) .
Busca a "sensação da sexualidade", sem levar em conta o ver
dadeiro dom de si mesmo e a verdadeira comunhão de pessoas.
A luxúria, na verdade, espedaça a sua comunhão.
Seguidamente ouve-se falar em benefícios que a luxúria
pode trazer ao relacionamento sexual ou é concebida como um
aumento ou intensificação do desejo sexual. Na realidade, a luxú
ria é uma redução da plenitude original prevista por Deus para
o desejo sexual. Nós não ganhamos "mais" quando nos damos
à luxúria, mas perdemos muito. Entregar-se à luxúria equivale
a matar a fome comendo lixo, quando Deus nos convida para a
festa da vida eterna. Por que então escolhemos o lixo? A respos
ta só pode ser uma: porque realmente não acreditamos no gran
dioso dom do banquete de Deus - um dom que o homem e a
mulher rejeitaram com o pecado original. A vergonha, por ou
tro lado, revela nossa atração para o "lixo".
De modo geral, homem e mulher acusam de luxúria seus
corp o s . Uma tal afirmação, porém, não passa de uma
"ocultação", ou quase uma "desculpa", para não enfrentarem
a desordem profunda de seus corações. Como Jesus acentua no
53
Sermão da Montanha, a luxúria é, primeiro e antes de tudo, um
problema do coração, não do corpo. Enquanto não colocarmos
ordem nos desejos desordenados do coração, jamais consegui
remos viver de acordo com a imagem de homens e mulheres,
como quis Deus ao criar-nos. Como observamos anteriormente,
a luxúria costuma afetar de maneira diferente o homem e a
mulher. Os corações de ambos, porém, "tornaram-se um cam
po de batalha entre o amor e a luxúria" (23.07. 1 980).
54
Isto parece quase cruel. Mesmo sabendo-nos cheios de luxú
ria, Jesus insiste: "Não ceda à luxúria". Muito bem! Que fazer
então? Cristo apresenta um padrão, mesmo sabendo que não
podemos fazê-lo nosso. Ele parece impossível - a não ser que ( ... ) a
não ser que seja possível experimentar alguma espécie de reden
ção ou transformação de nossos desejos. É aqui, precisamente,
que o Evangelho se toma boa nova. Como repetidas vezes acen
tua João Paulo li, o "caráter novo", proclamado por Cristo no
Sermão da Montanha, não nos é dado somente como uma tarefa.
Ele nos é dado também como um dom. Não estamos à mercê de
nossos defeitos, fraquezas e pecados. No "Sermão da Montanha
( . . . ) o Espírito do Senhor dá forma nova aos nossos desejos, estas
moções interiores que animam nossa vida" (CIC n. 2764).
Segundo o Papa, "o caráter cristão identifica-se pela trans
formação da consciência e das atitudes de ( . . . ) ambos, homem e
mulher, de forma a expressar e realizar o valor do corpo e do
sexo conforme o plano original do Criador" (22.10.1980) . Que
notícia maravilhosa! Que esperança! Que alegria! Não somos
reféns da luxúria. "A nova dimensão do caráter está sempre
conectada com ( . . . ) a nossa libertação da 'luxúria"' (08.1 0.1980) .
Na medida em que somos libertados de suas correntes, ficamos
livres para amar segundo o plano original de Deus. Esta é - diz
o Papa - ''uma moral viva", na qual realizamos o verdadeiro
sentido de nossa humanidade (cf. 16.04.1980).
55
Um exemplo do que é a liberdade em face da lei: acaso ex
perimenta você o desejo de matar seu melhor amigo? Pode pa
recer uma pergunta estranha, no entanto, serve para demons
trar meu ponto de vista. Ao admitir que não experimenta esse
desejo, você não precisa do mandamento "não matar o melhor
amigo", pois nunca pensou em transgredi-lo. Quanto a isto, você
está "livre da lei" . Não a experimenta como uma imposição,
porque seu coração já se conforma com ela.
Antes do pecado, o coração humano estava em total sintonia
com a vontade de Deus. Por exemplo, o primeiro casal não preci
sava de uma lei que proibisse o adultério. Eles nem sentiam dese
jo de cometê-lo (e não só pelo fato de não haver mais ninguém
por lá). Somente com a "síndrome dos pneus furados" passamos
a perceber uma ruptura entre nossos desejos e a vontade de Deus
a nosso respeito. É aqui onde a lei cumpre seu objetivo essencial.
Ela nos foi dada para convencer-nos do pecado (cf. Rm 7,7). Por
outro lado, quando Cristo diz: "Ouvistes o que dizem os manda
mentos ( . . . ) mas eu vos digo . . . " ele quer indicar que precisamos
de algo mais do que os meros preceitos podem oferecer.
A lei do Antigo Testamento é boa e justa. Mas "não dá por si
mesma a força, a graça do Espírito, para cumpri-la" (CIC n. 1963).
Noutras palavras: ela prova que "dirigimos com os pneus fura
dos", mas por si mesma é incapaz de recalibrá-los. "A Lei Evan
gélica", no entanto, "reforma a raiz dos atos, o coração, onde o
homem faz a opção entre o puro e o impuro" (CIC n. 1968).
Na medida em que permitimos a Cristo "recalibrar nossos
pneus", a necessidade da lei irá diminuindo, pois estamos deci
didos a não mais transgredi-la. De que leis precisamos então?
Que ensinamentos da Igreja nos parecem ainda como uma car
ga ou imposição? O problema, talvez, nem seja com a le.i ou
com a Igreja, e sim com a sua própria "dureza de coração" .
Não jogue fora a lei; entregue a Cristo seus desejos desordenados
e deixe que ele os transforme.
É inútil tentar seguir todas as regras, sem buscar o ar neces
sário para encher os pneus. Os que assim fazem tomam-se fariseus
hipócritas, ou então abandonam a lei de Deus, substituindo-a por
56
uma versão racionalizada e diluída do Evangelho. Tanto num
caso como no outro, será um "evangelho" sem a boa nova, um
cristianismo sem Cristo. Ambos, os hipócritas farisaicos e os sem
lei, precisam ainda "passar" da escravidão do código ético para a
liberdade do "novo etos" - a liberdade da redenção.
Tal liberdade liberta-nos, não da "coação" externa, que nos
chama para o bem, mas da coação interna que retarda a nossa
escolha do bem. Somente quando aspiramos ao que é verdadei
ro, bom e bonito, é que somos realmente livres - livres para amar,
57
coração humano para o dom: para a autocomunicação de Deus no
Espírito Santo (DV n. 51).
Quando, no Sermão da Montanha - observa o Papa - Cris
to nos chama a dominar a luxúria, suas palavras afirmam que a
graça original da criação se tornou para cada um de nós graça
da redenção (cf. 29. 10.1980) . O Filho do Homem assumiu a car
ne e morreu na cruz, a fim de que junto morresse também a
nossa humanidade pecadora. Ressurgiu da morte para "recri
ar" nossa humanidade. Subiu corporalmente para dentro da
Trindade, a fim de, uma vez mais, "inspirar" em nossos corpos
a vida e o amor de Deus. Pelo dom da nossa redenção, Cristo
insufla em nossa carne o mesmo espírito (graça) que "expirou"
de nossos corpos quando renegamos o dom (cf. Jo 20,22).
58
Na medida em que nos abrimos a esse dom, a graça da re
denção passa a "reavivar" nossa humanidade, a vivificar nosso
coração com a bondade mesma de Deus. Na medida em que per
mitimos que a graça nos informe e transforme, o Espírito Santo
de Deus impregna nossos desejos sexuais "com tudo o que é no
bre e belo", com "o valor supremo que é amor" (29.10.1980).
De onde jorra a graça da redenção? Primeiro, da vida sa
cramental da Igreja. Os sacramentos não são meros rituais reli
giosos. Eles "injetam santidade no plano humano do homem:
penetram a alma e o corpo, (nossa) feminilidade e masculinida
de ( . . . ) com o poder da santidade" (04.07. 1984) . Noutras pala
vras, os sacramentos fazem com que a morte e a ressurreição de
Cristo sejam uma realidade viva em nossas próprias vidas. Infe
lizmente, muitos cristãos não ligam muito para o poder dos sa
cramentos. Somente pelo batismo foi depositado, digamos as
sim, um trilhão de reais em nossa conta bancária, mas parece
que poucos são os que usam mais de setenta e cinco centavos.
Nos sacramentos, o amor de Deus "é derramado em nossos co
rações pelo Espírito Santo" (Rm 5,5). Nós precisamos " aprovei
tar" este dom.
59
o Espírito" não rejeita seu corpo. Ao contrário, abre toda a sua
personalidade corporal-espiritual à "inspiração" divina.
Com grande esperança, João Paulo li proclama que, da mes
ma forma como a luxúria nos escraviza e desordena os nossos
impulsos, o "viver segundo o Espírito" nos toma livres para doar
nos aos outros. Contrariamente à luxúria, que nos cega para a
verdade do plano de Deus sobre o corpo, a "vida segundo o
Espírito" nos abre os olhos para o significado esponsal do corpo
(cf. 0 1 . 12.1982) . Assim, na medida em que nos abrimos à "vida
no Espírito", experimentamos também a "redenção de nossos
corpos" (Rm 8,23).
A "redenção do corpo" - insiste João Paulo li - não é somen
te uma realidade celestial. Nós aguardamos sua consumação no
céu; mas ela já agora está atuando em nós. O que significa: na
medida em que permitimos que a nossa luxúria seja "crucificada
com Cristo" (cf. Gl 5,24), podemos ir redescobrindo progressiva
mente no erotismo aquele primeiro " significado esponsal do cor
po" e vivê-lo. Esta "libertação da luxúria" e a liberdade que ela
proporciona é - ainda segundo o Papa - a condição para todos
viverem juntos a verdadeira vida (cf. 08.10.1980).
60
oneiro da luxúria, a advertência do Antigo Testamento - " des
via seu olhar da mulher enfeitada" (Eclo 9,8) mantém ainda
sua validade. Nós, classicamente denominamos isto corno " evi
tar a ocasião de pecado", mediante o "controle dos olhos". Este
seria o primeiro passo, mas para o Papa esta é apenas urna pu
reza "negativa". À medida que crescemos na virtude, chega
mos a urna experiência "positiva" ou a urna pureza "madura".
"Na pureza madura o homem se deleita com os frutos conse
guidos pela vitória sobre a luxúria". Ele goza da "eficácia do
dom do Espírito Santo", que recoloca na sua experiência do corpo
"toda a sua simplicidade, sua franqueza e também sua alegria
interior" (01 .04.1981 ).
Na prática, todos começamos da "estaca zero" a caminha
da para urna pureza madura. Muitos, infelizmente, se estag
nam nessa etapa, convencidos de que é tudo o que podem al
cançar. Há que ir em frente. Não é preciso dizer: estou longe de
ser urna pessoa perfeita, mas posso dar testemunho de que, à
medida que assumimos o dom da redenção, a luxúria vai per
dendo seu ímpeto em nós. Pouco a pouco, chegaremos não só a
compreender, corno também a ver e experimentar o corpo corno
urna "teologia", corno um sinal do próprio mistério de Deus.
"Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus! "
(Mt 5,8). S e entendemos bem o que o Papa nos apresenta, pode
mos acrescentar: "Bem-aventurados os puros de coração por
que verão o mistério de Deus revelado através do corpo".
Pureza, portanto, não é o mesmo que pudor. Ela não rejeita
o corpo. "A pureza é a glória do corpo humano diante de Deus.
É a glória de Deus no corpo humano, através do qual a mascu
linidade e a feminilidade se expressam" (18.03.198 1 ) . A pureza
plena somente será alcançada no céu. Contudo, corno ensina o
Catecismo, "desde já (a pureza do coração) nos concede ver se
gundo Deus ( . . . ) ; permite-nos perceber o corpo humano - o nos
so e o do próximo - corno um templo do Espírito Santo, urna
manifestação da beleza divina" (CIC n. 2519).
Devemos agradecer pelo fato de termos tido um Papa
que, durante a restauração da Capela Sistina, mandou remo-
61
ver várias tangas que pontífices anteriores tinham mandado
colocar sobre os nus originais de Miguel Ângelo. E fez isto em
nome da pureza cristã. Durante a homilia, na cerimônia de
dedicação dos afrescos restaurados, João Paulo proclamou a
Capela Sistina o san tuário da teologia do corpo humano. E acres
centou: "Parece que Miguel Ângelo, a seu modo, se deixou
guiar pelas evocativas palavras do Gênesis, no qual se lê: 'O
homem e a mulher estavam nus e não se envergonhavam'
(Gn 2,25) " ( 1 3 . 04 . 1 984) .
Qual é então a diferença entre pornografia e um au
têntico retrato artístico da nudez? A diferença - conforme
o Papa - está na intenção do artista . Pinturas pornográfi
cas do corpo suscitam obj eções, "não por causa do seu ob
j eto, já que o corpo humano sempre traz em si mesmo sua
inalienável dignidade, mas por causa da qualidade ou
modo como foi reproduzido " (06 . 05 . 1 98 1 ) . O artista por
nográfico só busca provocar a luxúria naquele que olha,
ao passo que o verdadeiro artista (como Miguel  ngelo)
aj uda a ver "todo o mistério pessoal do homem " . Verda
deiras pinturas da nudez corporal nos ensinam, "de certa
forma, aquele s i gnific a d o e s p o n s a l do c o r p o , o q u a l
corresponde à 'p ureza do coração' e é , ao mesmo tempo,
sua medida" (06 . 05 . 1 9 8 1 ) . Os que experimentam a pure
za adulta entendem o corpo nu pelo que é - a revelação do
plano de amor de Deus.
A I NTERPRETAÇÃO DA S U S PEITA
62
a verdade completa de nosso ser; tornou a nossa liberdade livre
da dominação da luxúria" (VS n. 1 03).
Como Karol Wojtyla escreveu em Amor e Responsabilidade,
não podemos, pura e simplesmente, equiparar nudez com
imodéstia e luxúria. A imodéstia, por certo, encontra-se presen
te "quando a nudez desempenha um papel negativo no tocante
ao valor da pessoa, quando sua finalidade é provocar luxúria".
Wojtyla, porém, acrescenta: "Isto não é inevitável" (AR, p . 1 76).
Se admitimos que o "olhar luxurioso" é a única maneira de se
poder olhar o corpo humano, então subscrevemos o que João
Paulo II denomina "a interpretação da suspeita". Os que vivem
na suspeição continuam tão fechados em sua própria luxúria
que projetam a mesma sujeição nos outros. Não conseguem
imaginar outro modo de entender o corpo humano e a relação
sexual, senão pelo da luxúria.
Quando mantemos o coração humano "num estado de
suspeição contínua e irreversível" (29 . 1 0 . 1 980), por causa da
luxúria nos condenamos a nós mesmos a uma existência sem
esperança e sem amor. Condenamo-nos a observar regras ( éti
cas) sem uma mudança do coração (etos) . À s vezes acabamos
abandonando a lei de Deus simplesmente por não conseguir
mos observá-la. Um tal tipo de suspeição permanente acaba
distanciando-nos do poder do Evangelho.
Como nos adverte São Paulo, precisamos evitar a armadilha
de "cultivar a aparência da piedade", enquanto "negamos sua
força" (2 Tm 3,5). "A redenção é uma verdade, uma realidade,
em cujo nome a pessoa deve sentir-se chamada, e chamada com
eficácia" (29.10. 1980). Noutras palavras, a morte e a ressurreição
de Cristo são eficazes, podem mudar nossas vidas, nossas atitu
des, nossos corações e também nossos desejos sexuais. "Não esva
ziar de sua força a cruz de Cristo " (cf. 1 Cor 1,17). Este - segundo o
Papa - "é o grito da Nova Evangelização" (OL n. 3).
Muita coisa está em jogo. "O sentido da vida é a antítese
da interpretação 'de suspeita'. Esta interpretação é bem dife
rente, radicalmente diferente daquela do Sermão da Monta
nha. Aqui as palavras de Cristo revelam ( . . . ) uma outra visão
63
das possibilidades do homem" (29 . 1 0 . 1 980) . Se não entramos
nesta "outra visão das possibilidades do homem", acharemos
impossível amar como Cristo ama; e ficaremos distantes do
sentido da vida.
64
que nos livre deles. Na medida em que fazemos isto, "o Espíri
to do Senhor dá nova forma aos nossos desejos" (CIC n. 2764) .
Ou seja: ao permitirmos que a nossa luxúria seja "crucificada",
experimentamos também a "ressurreição" do plano original
de Deus sobre o desejo sexual. Não instantaneamente, de um
momento para outro, mas pouco a pouco, gradativamente. Na
medida em que tomamos, dia após dia, a nossa cruz e a carre
gamos, começamos a sentir o desejo sexual como o poder de
amar como Deus ama.
Mas para essa transformação, só uma vontade firme não
basta; requer-se também uma fé sólida. É o Espírito Santo que
transforma nossos corações, que "recalibra nossos pneus". E a
fé, como se recorda, é a abertura do coração humano ao dom de
Deus - o Espírito Santo (cf. DV n. 51).
Quando a luxúria tentar você, ou mesmo o dominar, reze
uma oração como esta:
Obrigado, Senhor, pelo dom dos meus desejos sexuais.
Entrego-vos esses desejos e peço, por favor, pela força da
vossa morte e ressurreição, que "desenroleis " em m im
tudo o que o pecado enrolou, de modo a experimentar o
desejo sexual de acordo com a vossa intenção - como o
desejo de amar à vossa imagem.
Para fortalecer ainda mais seu desejo de "morrer" para a
luxúria, poderá também colocar-se em forma de cruz, com bra
ços e mãos abertos, repetindo a oração acima. O objetivo aqui
é harmonizar-se com Cristo, carregar "no corpo a morte de
Jesus, para que a vida de Jesus se manifeste em nossa existên
cia mortal" (2 Cor 4,10).
A resolução de não se entregar à luxúria pode ser muito
difícil, pode até causar contorções emocionais e físicas. Parece
que poucos homens e mulheres experimentam a liberdade para
a qual Cristo nos libertou, porque, ao sentirem na pele esse
tipo de "crucificação", ao invés de prosseguirem no caminho
que leva à ressurreição, "descem da cruz" . Mesmo quando os
cravos começam a furar as mãos e o peso da cruz parece es-
65
magador, não desista, vá em frente! Você está à beira de passar
da morte para a vida, da luxúria para o verdadeiro amor. So
mente quando estamos dispostos a morrer com Cristo, pode
mos viver a vida ressuscitada que ele nos oferece.
66
Quem é realmente mestre de si mesmo sabe orientar seus de
sej os eróticos " p a r a o verdadeiro, o b om e o b onito "
( 1 2 . 1 2 . 1 980) . Na medida em que isto acontece, compreende
mos e experimentamos o mistério da sexualidade "numa pro
fundidade, simplicidade e beleza até agora totalmente des
conhecidas" (04.07. 1 984 ) .
Parafraseando uma passagem de muita percepção, o
Papa adverte que para chegar a este ponto requer-se "perse
verança e consistência" na aprendizagem do sentido de nos
sos corpos, de nossa sexualidade. Precisamos aprender isto,
não apenas em abstrato (embora isto também sej a necessá
rio), mas, acima de tudo, nas reações internas de nossos "co
rações" . Esta - acrescenta o Papa - é uma "ciência" que não
se adquire só nos livros, pois aqui se trata do profundo co
nhecimento da nossa vida interior. É no fundo de nosso cora
ção que aprendemos a discernir entre o que, de um lado, cons
titui a riqueza da sexualidade e da atração sexual e, do ou
tro, o que somente exibe sinais de luxúria. Embora estes mo
vimentos internos do coração possam, às vezes, confundir-se
entre si, somos chamados por Cristo a fazer deles uma com
pleta e madura avaliação. "Deve-se acrescentar - conclui o
Papa - que isto pode ser alcançado e constitui certamente uma
tarefa digna do homem" ( 1 2 . 1 1 . 1980).
Concluamos com uma oração pedindo a pureza.
Ajudai-me, Senhor, a discernir os movimentos do meu co
ração. Ajudai-me a distinguir entre as grandes riquezas da
sexualidade, tal como quisestes que ela fosse, e as deforma
ções da luxúria. Eu vos autorizo, Senhor, a tirar de mim os
sentimentos de luxúria. Levai-os para longe. Crucificai-os,
para que eu possa, desta forma, experimentar a ressurrei
ção do desejo sexual tal como ele foi projetado por vós.
Concedei-me um coração puro. Amém.
67
CAPÍTULO 4
C É U - U MA EXPER I Ê N C IA CORPÓREA
68
"Creio na ressurreição da carne e na vida eterna. Amém". E o
Catecismo observa: "Em nenhum ponto a fé cristã se depara com
mais contradição do que no da ressurreição da 'carne'. Aceita
se muito comumente que, após a morte, a vida humana prosse
gue de modo espiritual. Como, porém, admitir que este corpo
tão manifestamente mortal possa ressuscitar para a vida eter
na?" (CIC n. 996) . Que mistério! Em Cristo, "este corpo mortal
se reveste de imortalidade" (1 Cor 15,54).
Com freqüência falamos das "almas" no céu. Quando enter
ramos minha avó, eu vi seu corpo entrar na terra, e estou confiante
que sua alma esteja agora gozando uma forma de união com Deus.
As almas que atualmente estão no céu ("atualmente" é sem dúvi
da uma palavra relacionada com o tempo, e não faz sentido usá-la
com relação ao céu), porém, permanecem em estado " desumano"
(sem a humanidade) até a ressurreição de seus corpos. Nem pode
haver outro caminho para nós, seres humanos. Como Deus nos
criou numa união de corpo e alma, a separação dos dois na morte
é inteiramente "artificial". Nossos corpos serão, claro, diferentes
em seu estado de ressuscitados (lembre que os discípulos não reco
nheceram imediatamente Jesus, após a ressurreição - cf. Lc 24, 15-
16), mas nós ainda continuaremos com eles.
A diferença é que nossos corpos serão totalmente
"espiritualizados" (cf. 1 Cor 15,44). Espiritualização quer dizer
que "as forças do espírito irão permear as energias do corpo"
(09. 12. 1981). E porque o "espírito" que permeará nossos corpos
não será somente o nosso próprio e criado espírito humano, mas
também o divino e incriado Espírito Santo, João Paulo II fala
também na "divinização" do corpo. De um modo totalmente
inacessível para nós agora, participaremos em corpo e alma "da
natureza divina" (2 Pe 1,4) .
Lembre a nossa exposição anterior sobre o mais íntimo se
gredo de Deus: "Ele mesmo é eternamente intercâmbio de amor,
Pai, Filho e Espírito Santo, e nos destinou a participar desse in
tercâmb i o " (CIC n . 22 1 ) . É isto que entendemos com
"espiritualização" e "divinização" do corpo. Até onde é possí
vel às criaturas, participaremos em corpo e alma no eterno inter-
69
câmbio do amor de Deus. E, desde o início, este "grande misté
rio" encontra-se prefigurado no "intercâmbio de amor" entre
homem e mulher, isto é, em e através do seu ser, "uma só carne".
Muitos perguntam se haverá sexo no céu. Depende do que
entendermos por esta palavra. Sexo não é, em primeiro lugar, o
que as pessoas fazem, e sim o que as pessoas são corno homem
ou mulher. João Paulo II lembra três vezes, na sua audiência de
02.12.1981 (e noutras ocasiões também), que ressuscitaremos
corno homem e mulher. Neste sentido sim haverá sexo no céu.
Mas, de acordo com as palavras de Cristo sobre a ressurreição,
a união dos sexos, corno a conhecemos agora, cederá lugar a
urna união infinitamente maior. Os que ressuscitarem para a gló
ria experimentarão urna felicidade tão superior à união sexual
terrena, que nossos pequeninos cérebros, nem de longe, conse
guem imaginar. "Os olhos não viram, os ouvidos não ouviram,
nem o coração humano imaginou os bens que Deus preparou
para os que o amam" (cf. 1 Cor 2,9).
70
primordial" dará lugar à realidade divina. Noutras palavras, se
Deus estabeleceu a união dos sexos como uma prefiguração do
céu, Cristo está dizendo: "Não precisam mais de prefigurações
para explicar-lhes o céu, já se encontram nele. Já estão ali. A der
radeira união chegou".
Muitas vezes o povo pergunta: "Quer dizer que, no céu,
não vou estar com minha esposa?" Supondo que ambos disse
ram "sim" ao convite de Deus para o casamento, é claro que
estarão juntos. E todos os que aceitam este convite viverão "jun
tos" numa comunhão que lhes trará superabundantemente tudo
o que é bom, verdadeiro e bonito no casamento e na vida fami
liar aqui na terra. O que precisamos entender é que a união dos
sexos, por bela e maravilhosa que seja, não é tudo o que se pode
ser nem o fim de tudo. Ela é apenas um "ícone", um sinal de
algo infinitamente maior. Parafraseando o Santo Padre, o ma
trimônio não expressa definitivamente o sentido mais profundo
da sexualidade; apenas apresenta uma expressão concreta do seu
significado na história (cf. 13.01 .1982). No fim de tudo, a expres
são "histórica" da sexualidade vai ceder lugar a outra inteira
mente nova, do nosso chamado à comunhão geradora de vida.
ÍCO N ES E ÍDOLOS
71
os dois tomam-se uma só carne". Para quê? Para revelar, proclamar
e antecipar a união eterna de Cristo com a Igreja (cf. Ef 5,31-32).
O desejo sexual foi-nos dado por Deus como, digamos as
sim, o combustível de um foguete destinado a nos levar rumo às
estrelas, e para mais além. Imaginem agora o que aconteceria
se, de repente, os motores desse foguete fossem manipulados
em favor, exclusivamente, de nossos desejos, e não mais em di
reção às estrelas? Lançado esse foguete, o resultado seria um
gigantesco estrondo de autodestruição. Descobrimos aqui a im
portância das palavras de Cristo sobre o novo estado do corpo e
do sexo na ressurreição: Elas nos ajudam a centrar nosso olhar
naquela união, a única capaz de satisfazer. Quando deixamos
que o "poder" dessas palavras penetre em nossos corações, elas
podem redirecionar o nosso foguete para as estrelas. Uma vez
mais o ídolo se torna o ícone que devia ser no plano originário.
Somente quando nossos motores estão orientados para as
estrelas é que o casamento assume seu verdadeiro sentido como
sacramento. E os sacramentos, quando devidamente vividos, nos
proporcionam um antegozo do céu já nesta terra. Mas, chega
do o céu, os sacramentos cessam, pois já alcançaram seu objeti
vo. Não haverá sacramentos no céu (cf. CIC n. 671 ). Não por
que serão anulados, e sim por estarem já plenamente realiza
dos. Por isso, o fato de não casarmos na ressurreição não deve
ser motivo de tristeza e sim de alegria. Todo desejo humano,
todo desejo de amor e de união será satisfeito, de uma forma
que supera os nossos mais fantásticos sonhos. Aquela dor" pro
11
72
e estático do céu - muitíssimo superior a tudo o que é próprio à
vida terrena - poderá eliminar a "dor" humana da solidão.
A VISÃO BEATÍFICA
73
que ele já nos conhece). Participaremos "plenamente" da sua divin
dade, e ele participará inteiramente da nossa humanidade (embora
já participe, por tê-la assumido na Encarnação).
Deus como que se abaixou para participar da nossa huma
nidade, e nos permitir que participássemos de sua divindade.
Que gloriosa permuta, não é? Como diz o Catecismo, "o Filho de
Deus se fez homem para nos fazer Deus" (CIC n. 460), e assim
podermos participar da natureza divina (cf. 2 Pe 1,4) . O que,
obviamente, não quer dizer que vamos perder nossa natureza
humana e tornar-nos iguais a Deus. Significa, isto sim, que Deus
quer nos dar uma participação em sua própria divindade, no
grau em que a nossa humanidade é capaz de recebê-la.
Tal permuta divino-humana expressa alguma coisa do " con
teúdo" ou da dinâmica interna da visão beatífica. Lembre que foi
justamente isto que a serpente fez para nos convencer de que
Deus estava retendo para si a vida divina e a nossa felicidade.
"Se querem ser 'como Deus' - ela insinuou - vocês mesmos de
vem partir para a luta e agarrar o que desejam". Mas não é as
sim! Deus sempre desejou a nossa plena participação em sua di
vindade. Trata-se de um dom gratuito, e todos precisamos abrir
nos para acolhê-lo. Nada de avançar para agarrar o que Deus dá
gratuitamente. O pecado - e todas as misérias humanas - come
ça aqui, isto é, quando nós mesmos queremos agarrar o presente.
74
mo" (GS n. 24). Além disto, Deus inscreveu este chamado à
autodoação justamente em nossos corpos como homem e mulher.
O "sentido esponsal" do corpo prende-se ao fato de sermos capa
zes de expressar o amor divino, "precisamente aquele amor no
qual a pessoa se faz um dom e - através desse dom - realiza o
verdadeiro sentido de seu ser e de sua existência" (16.01 .1980).
Parafraseando João Paulo II, na ressurreição descobrimos
numa nova e eterna dimensão - o mesmo significado esponsal do
corpo. Desta vez, porém, o significado esponsal se realiza em nosso
encontro com o Deus vivo, através da nossa visão "face a face"
com Ele (cf. 09. 12.1981). O Papa não explicita isto, mas, através
da analogia esponsal, podemos concluir que, na ressurreição, o
divino Esposo expressará seu dom ("isto é meu corpo dado por
vós") na sua mais plena realidade. Todos os que respondem ao
convite nupcial se abrem para acolher esse dom, quais esposas de
Cristo. Em retribuição a esse dom, nos doaremos totalmente ao
divino Esposo, num abraço eternamente vivificante.
Como declara o Catecismo, a Igreja "aspira a estar unida a
Cristo, na glória do céu", onde "se alegrará com o (seu) Bem
amado, num gozo e deleite sem fim" (CIC n. 1 821). Nesta reali
dade celestial - segundo o Papa - " a penetração e impregnação
do essencialmente humano pelo essencialmente divino atingirá
seu ponto máximo" (09 . 12. 1981).
A imagem nupcial é inconfundível. Claro, quando se fala em
união nupcial como imagem do céu, é imprescindível, mais do
que nunca, recordar também a inadequação das analogias. Há
que ter muita precaução . O céu não é uma eternamente
engrandeci da experiência da união sexual na terra. Como obser
va João Paulo II, a futura união "será uma experiência totalmen
te nova" . " Ao mesmo tempo", porém, "não será alienada" do
amor que homem e mulher experimentaram no "começo" e pro
curaram reaver ao longo da história (cf. 13.01 .1982). A significa
ção original do corpo "será então revelada novamente na mesma
simplicidade e esplendor" quando todos os que respondem ao
convite matrimonial viverão na plena liberdade sua autodoação
de amor (cf. 13.01 .1980) . Os que ressuscitam para a vida eterna
75
experimentarão "o absoluto e eterno significado esponsal do cor
po glorificado na união com o próprio Deus" (24.03.1982).
76
Esta é - repetimos - a finalidade da união sexual no pla
no divino : prefigurar de certa forma a glória, o êxtase e a
felicidade que nos aguardam no céu (cf. Ef 5,31 -32) . Como
reconhece o Catecismo, "nas alegrias do seu amor aqui na ter
ra, Deus lhes dá (aos esposos) um antegozo do festim de núp
cias do Cordeiro" (CIC n. 1 642) .
Por que então admirar-se do grande interesse de todos pelo
sexo? Deus depositou em cada ser humano este desejo inato
de tentar entendê-lo. Para quê? Para nos conduzir a Ele. Mui
to cuidado, porém, com as falsificações! Pelo fato de o sexo ter
por finalidade encaminhar-nos para o céu, é que o demônio
ataca justamente por ali. Enquanto a nossa "curiosidade" ina
ta em relação ao sexo não for vivida no contexto do "grande
mistério" do plano divino, inevitavelmente continuaremos ca
indo, de um modo ou de outro, no plano contrário. Ou seja,
enquanto o nosso desejo de compreender o corpo e a sexuali
dade não estiver unido à verdade, inevitavelmente caímos,
dominados por mentiras.
Mesmo que até aqui sua curiosidade sobre sexo tenha sido
alimentada com mentiras, não se desespere. O nosso Deus é rico
em misericórdia. Por que teria sido Cristo Jesus tão compassivo
com os pecadores sexuais, em especial com as mulheres? Por
que, atrás de suas decepções, ele sabia que estavam a sua pro
cura, o verdadeiro Esposo.
Pense na mulher flagrada em adultério (cf. Jo 8,2-11). Ela saí
ra em busca de amor, de intimidade e união com outro, mas uma
vez mais comprovou que o amor falso não conseguiu satisfazê-la.
Cheia de vergonha, viu-se jogada diante de Cristo por uma turba
furiosa, disposta a apedrejá-la. E qual foi a resposta de Cristo?
"Aquele de vocês que não tem pecado pode atirar-lhe a primeira
pedra". De acordo com suas próprias palavras, Cristo - o sem
pecado - poderia lançar-lhe a primeira pedra, mas não o fez, pois
não veio para condenar e sim para salvar (cf. Jo 3,17).
77
E "Jesus - escreve São João - ficou sozinho, com a mulher
diante de si" (Jo 8,9). Lendo um pouco nas entrelinhas, pode
mos supor que, naquele encontro com o Esposo Divino, ela teve
urna virada interior do falso para o verdadeiro. Ou pensaria
você que, ao ouvir Jesus lhe dizer: "Vai e não peques mais" (Jo
8,11), teria se voltado resmungando: "Quem é este cara para
me dizer o que posso ou não posso fazer com meu corpo?" Ou,
ao contrário, tendo encontrado o amor que realmente procura
va, saiu transformada, renovada no mais profundo de seu ser
corno mulher? É isto que Jesus quer oferecer a cada um de nós!
Quais foram as mentiras que lhe irnpingirarn, as falsidades
que engoliu, pensando serem verdades? Também aqui precisa
mos ficar atentos, porque, atrás de tudo, encontra-se o seu an
seio por um amor autêntico. O pecado sexual é urna busca de
satisfação de urna sede que nenhuma "água tônica" consegue
saciar. É justamente aqui que Jesus se encontra conosco, sem
jamais nos condenar. Foi exatamente num encontro com outra
pecadora que ele falou: "Se conhecesses o dom de Deus ( . . . ) tu
mesma lhe pedirias água e ele te daria urna água viva" (Jo 4,10).
O pecado fecha para o dom, enquanto a fé abre para o receber
e com ele satisfazer-se.
Não tenha medo! Jogue bem abertamente a sua sexualida
de diante de Cristo. Ele jamais nos despojará de nossa humani
dade. Ao contrário, no-la revelará plenamente. "Pela revelação
do mistério do Pai e do seu amor, Cristo manifesta o homem a si
mesmo totalmente e lhe revela claramente sua vocação supre
ma" (GS n. 22). Qual seria essa "vocação suprema"? A teologia
responde: a nossa vocação suprema é participar da comunhão
dos santos, a qual, por sua vez, participa da comunhão com
Cristo na Comunhão da Trindade. Sua verdadeira tradução se
ria: o nosso chamado supremo é êxtase eterno; incomparável
arrebatamento; abundante e belíssima felicidade.
Concede-nos, Senhor, a fé. Ajuda-nos a crer nesse dom glo
rioso. Amém.
78
CAPÍTULO 5
79
E U N UCOS " PO R CAUSA DO REI NO DOS C É U S "
80
te o seu profundo significado. É uma palavra negativa, pois só
diz o que essas pessoas não fazem. "Eunuco" tem conotações
ainda piores. Definiríamos melhor essa vocação dizendo o que
ela abraça e antecipa, ao invés de falar do que ela priva. Ela
abraça e antecipa o "matrimônio celestial" .
81
sexuais, se casasse, estaria condenando sua esposa a ser um mero
objeto, um brinquedo para satisfazer sua desordem. A única
maneira de eliminar o escândalo do pecado sexual, seja ele co
metido por quem for, é experimentar a redenção em Cristo da
sua sexualidade" (p. 163).
O autêntico cristão celibatário testemunha dramaticamen
te essa redenção. É verdade que, como uma disciplina da Igreja
Latina (não como uma doutrina), a exigência do celibato para a
ordenação sacerdotal poderia mudar. No entanto, quando nos
dermos conta de que o celibato nos orienta para o sentido últi
mo do sexo, reconheceremos que o nosso mundo, hoje mais do
que nunca, precisa do testemunho do celibato cristão.
82
ram do mistério da redenção do corpo ( . . . ), assim como o fazem
os demais homens" (07.04.1982) . Tal é a razão por que ele ad
verte que o chamado ao celibato não é apenas um assunto ou
matéria de formação, mas de transformação (cf. 05.05 . 1 982) . A
pessoa que vive essa transformação não se sente compelida a
satisfazer sua luxúria. Vive livre, com a liberdade da doação.
Para essa pessoa, sacrificar a união sexual (o ícone) pelo reino
(a realidade para a qual o ícone aponta) não só se torna possí
vel, mas também muito atraente. A realidade é infinitamente
mais cativante que o ícone! Os que pensam de outra maneira, é
porque transformaram o ícone em ídolo.
83
Tomados fora de contexto, os versículos 1 a 27: "É bom para o
homem abster-se de mulher" (v.1); "gostaria que todos fossem
(celibatários) como eu . . (v.7)."; "não procure ligar-se a alguma
mulher" (v.27) - podem levar a pensar nisto. Mas uma leitura
atenta de todo o texto - diz ainda o Papa - leva-nos a uma con
clusão diferente.
São Paulo combate diretamente a falsa idéia que então cir
culava entre os habitantes de Corinto: que o matrimônio e a
união sexual eram pecaminosos. O matrimônio é um " dom es
pecial de Deus" (v.7). Os esposos "não devem recusar-se um ao
outro, a não ser de comum acordo e por algum tempo" (v. 5). E
chega a elogiar "aquele que se casa com sua amada, (pois) ele
está agindo bem" (cf. v.38).
84
Se o celibato é tido como um chamado "excepcional" é por
que o casamento continua sendo o chamado "normal" da mai
oria. Se o celibato é "melhor", não o é por si mesmo, mas por ser
abraçado para o reino. É melhor no sentido de ser o matrimônio
celeste (ao qual os celibatários se dedicam mais diretamente)
superior ao matrimônio terreno. O celibato cristão proporciona
aos que o vivem autenticamente um mais forte "antegozo" da
futura comunhão com Deus e com todos os santos.
Mas quererá isto dizer que, se realmente queremos seguir a
Deus, devemos ser todos celibatários? Não. "Cada um - escreve
São Paulo - recebe de Deus o seu próprio dom; um de uma ma
neira, outro de outra" (v. 7). Cuidadosamente e com muita ora
ção, procure cada um discernir qual o "dom" que Deus lhe con
cedeu. Subjetivamente falando, a "melhor" vocação é a que Deus
nos dá como nosso dom pessoal e próprio. Se o casamento é seu
dom, alegre-se! Este é o caminho da sua felicidade. Se, ao invés, é
o celibato, alegre-se também; é o seu caminho para a felicidade.
85
uma fecundidade espiritual. Desta forma vemos como a reali
dade "natural" do matrimônio nos orienta para a realidade "so
brenatural" do celibato para o reino. De fato, o conhecimento
completo e a valorização do plano de Deus para o matrimônio e
a vida familiar são indispensáveis à pessoa celibatária. Inclusi
ve, segundo frisa João Paulo II, para que a pessoa celibatária
"esteja bem consciente do que está escolhendo ( . . . ) deve tam
bém ter boa c onsciência do que ela está renunciando"
(05.05 . 1 982) .
O celibato, por sua vez, "tem uma particular importância e
uma eloqüência especial para os que abraçaram a vida matri
monial" (14.04. 1982) . O celibato, como antecipação direta do
matrimônio celeste, mostra aos casais que tipo de união o sacra
mento deles representa. Noutras palavras, o celibato ajuda os
casais a perceber que também o amor deles se orienta para "o
Reino". E, pelo fato de se absterem da união sexual, os celibatá
rios demonstram o grande valor dessa união. De que maneira?
O tamanho de um sacrifício mede-se pelo grau de valor dado à
coisa sacrificada. Por exemplo, não fazemos o propósito de não
pecar durante a quaresma; pois o pecado deve ser evitado sem
pre. Para que o nosso sacrifício tenha merecimento, devemos
sacrificar algo que tenha valor real. A Igreja aprecia muito o ce
libato precisamente porque ela avalia altamente o que ele sacrifi
ca, isto é, a união sexual e tudo o que a ela está ligado.
A negação de si mesmo, incluída em tal sacrifício - lembra
mos uma vez mais -, não deve ser vista como uma repressão da
sexualidade. O celibato para o reino deve ser uma frutuosa
vivência da libertação do desejo sexual, entendido como o dese
jo de fazer de si mesmo um "sincero dom" para os outros.
86
prio", à imagem de Deus. Daqui porque, quando uma cultura
desvaloriza a sexualidade, não surpreende que, inevitavelmen
te acabe desvalorizando tanto o casamento quanto a vocação
para o celibato. A revolução sexual do século XX está ali para
demonstrá-lo escancaradamente.
Em seus pronunciamentos, o Papa não se cansa de repetir
que a vida celibatária proposta por Cristo deve brotar de um
"conhecimento profundo e maduro do significado esponsal do
corpo". Somente nesta base é que o celibato para o reino "en
contrará plena justificativa e motivação" (28.04.1982). Se alguém,
portanto, optar por esta vocação baseado no medo ou na rejei
ção do sexo, ou por causa de profundas feridas sexuais que im
pedem uma sadia vida conjugal, ele não está respondendo sin
ceramente ao chamado de Cristo (cf. 28.04.1982).
Ninguém pode rejeitar o sentido esponsal de seu corpo sem
fazer violência à sua humanidade como homem ou mulher cri
ados à imagem de Deus. O significado esponsal do corpo é "o
elemento fundamental da existência humana no mundo"
(16.01 . 1980) . Ele revela que o ser humano foi criado para tor
nar-se um dom "para" o outro. As palavras de Cristo sobre o
celibato, "conseqüentemente, mostram que este 'para', existen
te desde o início como base do matrimônio, pode também en
contrar-se na base da abstinência 'para' o reino do céu". Por
isto, "sobre a base do próprio significado esponsal do corpo ( . . . )
tanto pode encontrar-se o amor que dispõe para o casamento
por toda a vida, como pode estar o amor que dispõe para uma
vida de castidade 'em prol do reino do céu'" (28.04.1982) .
O detalhe é que a sexualidade nos chama a doar-nos a
nós mesmos num amor que dá vida. O celibatário, pelo fato
de não exercer sua sexualidade, não está rejeitando este cha
mado; ele apenas o vive em forma diferente. Todo homem,
em virtude do significado esponsal de seu corpo, é chamado
a ser, de um ou outro modo, um marido e um pai. E toda
mulher, em virtude do significado esponsal de seu corpo, está
chamada a ser, de um ou de outro modo, uma esposa e uma
mãe. Como imagem de Cristo, o celibatário "casa-se" com a
87
Igreja. Mediante o dom corporal de si mesmo, ele gera nume
rosos "filhos espirituais" . Como imagem da Igreja, a mulher
celibatária "desposa-se" com Cristo. Pela doação corporal de
si mesma, ela também gera numerosos "filhos espirituais" . É
por isto que as palavras marido, esposa, pai, mãe, irmão, irmã,
tanto são aplicáveis na vida matrimonial e familiar, quanto
na vida sacerdotal e religiosa.
88
nas "núpcias" do céu . Para ela, um casamento terreno como
os outros teria sido, por assim dizer, um "passo atrás" .
No entanto, apresentando a Sagrada Família qual modelo
para todas as famílias, a Igreja não pretende sequer sugerir que
os casais que desejam ser "verdadeiramente santos" devam abs
ter-se das relações sexuais. Se fosse este o caso, as famílias "san
tas" eventualmente acabariam nem sendo famílias, por falta da
procriação. Se José e Maria são modelo para todos os casais,
deve-se isto ao seu exemplo de total autodoação. O que normal
mente se pede aos esposos é que imitem a Sagrada Família, vi
vendo sua união "numa só carne", em total doação mútua. Desta
forma, eles também "trazem Cristo ao mundo", visto que o abra
ço matrimonial - quando vivido de acordo com o plano de Deus
- proclama o mistério de Cristo (cf. Ef 5,31 -32) .
O que fazer para que a união do casal "numa só carne" se
torne uma proclamação do mistério de Cristo, veremos mais
pormenorizadamente no próximo capítulo.
89
CAPÍTULO 6
O MATRI M Ô N I O CRISTÃO :
-
I MAG E M DA U N IAO
D E CRI STO COM A I G REJA
90
veremos mais claramente neste capítulo, quando vivido auten
ticamente, o matrimônio logo mergulha o casal no coração do
mistério de Cristo.
91
e nós somos membros de seu corpo! Por isto, o homem dei
xará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher, e os dois
serão uma só carne. Este mistério é grande - eu digo isto
com referência a Cristo e à Igreja (Ej 5,2 1-32).
92
expressamente os cristãos que "não devem continuar vivendo à
moda dos pagãos". Esses "têm a inteligência obscurecida ( . . . )
por causa da dureza de seus corações" . Por isto, "abandonai a
vossa antiga maneira de viver ( . . . ), que se corrompe ao sabor
das paixões enganadoras ( . . . ) ; precisais renovar-vos pela trans
formação espiritual de vossa mente e revestir-vos do homem
novo, criado à imagem de Deus, na verdadeira justiça e santi
dade" (Ef 4, 1 7-18; 22-24). Já deveríamos estar bem familiariza
dos com tudo isto. Quem, antes dele, já havia falado em " dure
za dos corações" e em quanto ela deturpa o relacionamento
sexual? Quem já havia convidado homens e mulheres a viverem
em "verdadeira justiça e santidade", para assim experimentar a
libertação da luxúria? Como Cristo, São Paulo conclama homens
e mulheres a retornarem ao plano original de Deus! A viverem de
acordo com a imagem divina segundo a qual Deus os criou.
Como se vê, quando os versículos contestados (e detesta
dos) de Efésios 5 são lidos em seu contexto integral, longe de
humilhar mulheres e absolver homens desregrados, simplesmente
procuram restaurar a única base segura para a estabilidade pró
pria do amor entre os sexos. Com efeito, podemos concluir que
São Paulo está dizendo algo assim: "Claro, já que esta é a lin
guagem que usam, podemos falar em 'submissão' no casamen
to. Mas se isto pode significar alguma coisa para os pagãos, aqui
está agora o que deve ser entendido pelos seguidores de Cristo".
93
mulher ( . . . ). O amor torna o marido simultaneamente submisso
à mulher" (11 / 08 / 1982) . E ser "submisso" à mulher - acres
centa ele - significa viver em "completa doação a ela"
( 1 8.08. 1 982) . Portanto, mútua sujeição significa "recíproca
autodoação" (11 .08.1982). Significa dizer que ambos realizam e
vivem o significado esponsal de seus corpos, que os convida a
urna sincera e mútua autodoação.
Cristo, que "ofereceu o próprio corpo" por sua Esposa,
deve ser a fonte e o modelo dessa autodoação. Os cônjuges
cristãos se doam um ao outro "no amor reverente de Cristo"
(5,2 1 ) . O Papa chega a dizer que esse amor reverencial "não é
senão urna forma espiritualmente madura" da atração mútua
entre os sexos (4. 7. 1984) . Noutras palavras, a "reverência a
Cristo" resulta de urna experiência vivida da libertação da atra
ção e do desejo sexual. Através de urna contínua conversão,
iremos experimentar gradualmente aquele maduro nível de
pureza de que falamos antes.
Homens e mulheres puros vêem o mistério de Cristo revela
do através de seus corpos. Não é apenas urna idéia religiosa;
homens e mulheres puros sentem isto em seus corações. Com
preendem que o chamado à união, inscrito em sua sexualidade,
é realmente um "grande mistério" a proclamar a união de Cris
to com a Igreja. Quando experimentamos isto corno o "conteú
do" de nossas atrações sexuais, não queremos mais a luxúria,
mas a genuflexão. Se vivemos corno São Paulo recomenda, a
luxúria torna-se inconcebível. O "grande mistério" da sexualida
de enche-nos de profundo assombro, admiração e maravilha.
Noutras palavras, nos enche de reverência por Cristo.
O MARI DO VIRTUOSO
94
importante, ele convida os homens a terem autocontrole, a usa
rem de ternura, a demonstrarem profundo respeito e reverên
cia a suas esposas. Se um marido - escreveu Wojtyla - ama de
fato sua mulher, "a relação sexual não deve servir apenas para
(ele) chegar ao orgasmo ( . . . ). Ele precisa levar em consideração
(a) diferença de reações que ocorrem no homem e na mulher
( . . . ), a fim de que o orgasmo seja alcançado (por) ambos ( . . . ) e,
quando possível, simultaneamente". O marido deve fazer isto,
"não por motivos hedonistas e sim altruístas". Neste caso, se
"levarmos em conta a curva mais curta e mais violenta do estí
mulo no homem, (tal) delicadeza de sua parte, no contexto das
relações matrimoniais, adquire o significado de um ato de virtu
de" (Carta às Famílias, 272-275).
Por favor, leia esta passagem a cada um e a todos quantos
acham que o Papa ou a Igreja são "contra o sexo". Nada mais
distante da verdade! Como reconheceu aquela mulher que, to
mada de admiração, exclamou, depois de ler esta passagem:
The Pape rocks! - (O Papa mexe mesmo!).
A história atesta que poucos homens expressam a ternura e
a retidão de que fala o Papa, como se viu acima. De um modo
geral, não foi pequeno o sofrimento pelo qual passaram as mu
lheres, por causa de homens luxuriosos e dominadores, como
predisse o Gênesis (cf. 3,16). Por isso, a todas as mulheres que
lerem este livro, se nunca ouviram isto antes, vou dizê-lo agora.
Como um representante do lado masculino da raça humana,
peço-lhes humildemente perdão pelo modo como a luxuria
masculina as tem ferido. Feridas essas que entram bem fundo
na alma de uma mulher! Sinto-me muito, muito triste por isso
tudo. Por favor, perdoem-nos, não sabemos o que fazemos.
Aos homens eu digo: estejam preparados! Acaso estão pre
parados para a missão que o apóstolo Paulo lhes indica? Estou
convocando-os para um combate - um combate que exige de
vocês toda a coragem e força de que são capazes; um combate
que envolve morte, derramamento de sangue e muitos sacrifíci
os. Se existem homens perversos, dispostos a matar para satisfa
zer sua luxúria (por trás de cada aborto encontra-se virtual-
95
mente um homem luxurioso), nós, pelo contrário, devemos es
tar dispostos a morrer, antes de ceder à nossa luxúria.
96
Como amou Cristo a Igreja? "Entregando-se todo por ela" (5,
25), isto é, até a morte! E deixou claro que não veio para ser servi
do, e sim para servir e entregar sua vida pela Esposa (cf. Mt 20,28).
97
é este tipo de amor que as mulheres estão procurando? Se não é
assim, por que então se dá tanta importância aos príncipes en
cantados da fantasia romântica?
98
te nupcial da Eucaristia quando fala no "alimento" que Cristo
oferece à sua Esposa (cf. Ef 5,29).
Mas não é apenas luz que o matrimônio lança sobre o ba
tismo e a Eucaristia. Em certo sentido, segundo o Papa, o matri
mônio serve de modelo ou protótipo a todos os sacramentos da
nova aliança (cf. 20.10.1982). Todos eles têm uma característica
"nupcial", visto que sua finalidade é unir a Esposa (Igreja) com
o Esposo (Cristo). Através desta grande analogia, a união dos
esposos torna-se, talvez, o meio mais compreensivo para enten
dermos o próprio cristianismo. "Toda a vida cristã traz a marca
do amor esponsal de Cristo e da Igreja" (CIC, n° 1617) .
99
do homem e também do universo. Como ele escreveu na pri
meira linha de sua primeira carta encíclica, "Jesus Cristo é o
centro do universo e da história" (RH, n. 1). Deus destinou-nos
à união com Cristo, não somente após o pecado e nem somente
para nos redimir do pecado. Ele "nos escolheu (em Cristo) antes
mesmo da criação do mundo" (Ef 1,4).
Isto significa que a graça da inocência original (lembre as
expressões de solidão original, unidade e nudez) "foi concedida
em vista dele (Cristo) ( . . . ) mesmo que isto - segundo as dimen
sões do tempo e da história - tenha precedido a Encarnação"
(06. 10.1982) . Noutras palavras, o amor (graça) que o primeiro
casal humano conheceu em seus corpos foi, em certo sentido,
um antegozo e uma previsão do amor (graça) que Cristo derra
maria, no decorrer da história, através de seu corpo. Com efei
to, o amor que o primeiro casal humano conheceu "no princí
pio" em seus corpos dependeu, de alguma forma, do amor que
Cristo derramaria sobre sua Esposa, a Igreja. A criação nos pre
nuncia a redenção e para ela nos prepara. A união do primeiro
Adão com a primeira Eva prenuncia e nos dispõe para a união
do novo Adão com a nova Eva: Cristo e a Igreja.
Apesar de isto nos exigir, muitas vezes, um repensar de idéi
as comumente aceitas, a Encarnação não é um plano posterior
na mente de Deus. Como afirma o Catecismo, "desde o início,
Deus tinha em vista a glória da nova criação em Cristo" (CIC n.
280). Podemos deduzir isto das palavras de São Paulo, que conecta
a união "numa só carne" do Gênesis, com a união de Cristo com
a Igreja. "Por isto, o homem deixará pai e mãe e se unirá à sua
mulher, e os dois serão 'uma só carne'. Este mistério é grande - eu
digo isto com referência a Cristo e à Igreja". (Ef 5, 31-32). Desde o
início - antes do pecado - a união conjugal já prenunciava a
Encarnação, a união de Cristo com a humanidade "numa só carne".
1 00
mais importante de todo o texto e, num certo sentido, sua pedra
fundamental" (08.09.1982) . Ambas as uniões, "a de Cristo com
a Igreja, e a conjugal, do homem com a mulher no casamento,
são desta forma iluminadas por uma luz sobrenatural muito
particular" (25.08.1982) .
Guiado por essa luz sobrenatural, São Paulo revela uma
aguda compreensão da "sacramentalidade" do corpo. Recorde
o mais amplo sentido desse termo. O corpo é um "sacramento"
porque torna visível o invisível. Com base em Efésios 5, o Papa
volta a lembrar sua tese: "O corpo, na realidade, e somente ele,
pode tornar visível o invisível: o espiritual e o divino. Ele foi
criado com o fim de transferir para a realidade visível do mun
do o mistério escondido em Deus desde toda a eternidade e tor
nar-se assim o seu sinal" (06.10.1982) .
Lembre o que se quer dizer com "o mistério escondido em
Deus desde toda a eternidade": (1) Deus é uma comunhão de amor,
e (2) nós somos destinados a participar desse intercâmbio, através
da nossa união com Cristo. Segundo o Papa, o "sacramento
consiste na 'manifestação' desse mistério, através de um sinal
capaz de não somente proclamá-lo, senão também de realizá-lo
no homem" (08.09.1982) . Os sinais sacramentais, efetivamente,
realizam o que significam. São Paulo menciona dois deles - um
da ordem da criação e outro da ordem da redenção - que ver
dadeiramente comunicam o mistério do amor de Deus.
Na criação - lembra o Papa -, o mistério do amor de Deus
"se fez uma realidade visível através da união do primeiro homem
com a primeira mulher" (cf. Gn 2, 24) . Na redenção, aquele
mesmo mistério do amor divino torna-se "uma realidade visível
(através) da união indissolúvel de Cristo com a Igreja, união esta
que o autor da Carta aos Efésios apresenta como a união nupcial
dos esposos" (13.10.1982). Quanto a estes sinais, essas duas
uniões nos "servem de referência à obra total da criação e da
redenção" (13. 10.1982). Esta é a grandiosa abrangência dos si
nais sacramentais. Além de misteriosamente "conterem" a rea
lidade última, nos põem em contato com ela. Conforme o Papa,
eles "abraçam o universo".
101
O S I G N I F ICADO DA V I DA H UMANA
A L I NG UAG E M D O CORPO
1 02
Justamente ao nível desta 'linguagem do corpo' ( . . . ) homem e
mulher se expressam, reciprocamente, da maneira mais íntima
e mais profunda possível para eles" (22.08.1984) .
Se o "amor carnal" - corpóreo, sexual - deve expressar "a
linguagem do 'ágape"' (01 .09. 1982), nós precisamos entender
devidamente esta linguagem. Veja, o amor de Cristo distingue
se por quatro características. Primeira: Cristo dá livremente seu
corpo ("Ninguém me tira a vida, mas eu a dou por própria von
tade" Jo 10,18). Segunda: entrega seu corpo totalmente, isto é,
sem reservas, condições ou cálculos egoístas ("até o extremo ele
os amou" Jo 13,01). Terceira: dá seu corpo fielmente. ("Estarei
convosco todos os dias, até o fim dos tempos" Mt 28, 20) . Quar
ta: entrega seu corpo frutuosamente ("Eu vim para que tenham
vida" Jo 10,10). Se homens e mulheres souberem evitar as ar
madilhas do falso amor e viver plenamente sua vocação, a união
deles deve expressar o mesmo amor - livre, total, fiel e frutuoso
que Cristo expressou.
Outro nome para esse tipo de amor é matrimônio. E isto é
precisamente o que uma noiva e um noivo fazem diante do al
tar. Quando o celebrante pergunta: "Viestes aqui livremente e
sem reservas para vos entregardes um ao outro no matrimônio?
Prometeis serfiéis até a morte? Prometeis receber amorosamente
os filhos que Deus vos mandar?" Noivo e noiva, cada um, por
sua vez, responde: "sim ! "
Este mesmo "sim" eles devem expressá-lo com seus corpos,
cada vez que se tornam uma só carne. "Realmente - diz o Papa
- as palavras: 'Eu te aceito por minha mulher - meu marido' só
podem realizar-se por meio da união conjugal". Com ela "reali
zam o que essas palavras querem expressar" (05.01 . 1983). É pois
na relação sexual que as promessas do matrimônio sefazem car
ne. É onde o homem e a mulher encarnam o amor divino. É
muito bom e bonito ver um casal voltando à igreja para renovar
suas promessas matrimoniais, por ocasião de um aniversário
especial, mas isto, entretanto, não o dispensa de renovar, com a
"linguagem de seus corpos", os votos do casamento cada vez
que se unirem sexualmente.
1 03
D I STI NG U I R ENTRE OS VERDADE I ROS
E OS FALSOS PROFETAS
1 04
CAPÍTULO 7
TEOLOGIA NO Q UARTO DE DO RM I R :
U MA M O RALI DADE S EXUAL
LI B E RTADORA
1 05
cativa. Aí não está escrito: "Renuncie a tudo o que lhe dá pra
zer e observe estas miseráveis regras, caso contrário, só lhe res
ta o inferno" . Pelo contrário, ela diz: "Reconhece, ó cristão, a
tua dignidade ( . . . )" (CIC n. 1 69 1 ) . Foi isto que a teologia do
corpo de João Paulo li proclamou desde o início - nossa digni
dade, nossa "grandeza" como homem e mulher. Chegou ago
ra o momento de ver isto mais detalhadamente a fim de não
ser enganado. Não tenha medo!
1 06
Homens e mulheres sábios ao longo da história (não só ca
tólicos) reconheceram que o respeito à função procriativa da
união sexual é a chaveta de toda a moralidade sexual. Também
Sigmund Freud reconheceu isto. "O abandono da função
reprodutiva - escreveu ele - é a característica comum de todas
as perversões. Na realidade, nós qualificamos como perversa
uma atividade sexual, se ela deixa de lado o objetivo da repro
dução, procurando apenas o prazer como um objetivo indepen
dente dela" (Introductory Lectures in Psychoanalysis).
Considere isto: se aceitamos a separação do sexo da sua
natural orientação para uma nova vida, que argumentos nos
sobram para impedir a justificação deste ou de qualquer outro
meio capaz de nos levar ao orgasmo? Esterilizando o sexo, de
sorientamos fundamentalmente o ato. Ele não aponta mais para
a necessidade do casamento e da constituição de uma família.
Entregar-se à libido (deixar-se dominar totalmente pelo instinto
sexual) se tornaria o nome do jogo; nesse jogo, eventualmente
passaríamos a considerar a relação sexual vaginal apenas como
uma forma, entre milhares de outras, para satisfazer nossa libi
do. Ao separarmos o sexo da sua mais natural conseqüência,
perdemos inevitavelmente nossa bússola moral. Bem-vindos ao
mundo em que vivemos.
1 07
certa: para que esse tipo moderno de "liberação" sexual pudesse
vingar, a conseqüência natural do sexo (procriação) devia ser eli
minada. A revolução sexual do século XX é simplesmente
inexplicável sem a aceitação quase universal da contracepção.
Os pregoeiros da anticoncepção, no começo de 1900 e nos
anos seguintes, sabiam que sua causa só poderia ser levada adi
ante com a "bênção" das igrejas cristãs. Até 1 930, católicos, or
todoxos e protestantes estiveram unidos na condenação de toda
tentativa de esterilizar o ato matrimonial. Naquele ano, a Igreja
Anglicana rompeu com mais de 1900 anos de ininterrupto ensi
no cristão. Quando a pílula debutou, em 1 960, a Igreja Católica
era o único grupo cristão a defender aquilo que em trinta anos
passou a ser visto como uma posição arcaica e até absurda.
Inspirados por uma badalada mas falsa visão do Concílio
Vaticano li, muitos esperavam que a bênção do Papa aos
contraceptivos estivesse iminente. No entanto, enfrentando uma
incomensurável pressão global, o papa Paulo VI chocou o mun
do ao reafirmar, em 1968, o ensinamento tradicional contra a
contracepção, em sua carta encíclica Humanae Vitae (Da vida
humana) . O efeito da encíclica foi o de uma bomba. A contro
vérsia por ela provocada ainda perdura em nossos dias.
108
O Papa Paulo VI estava consciente que seria difícil para o
mundo moderno compreender a imoralidade da contracepção.
Homens e mulheres modernos tinham perdido de vista a gran
deza, a dignidade e a finalidade divina da vida humana (Humanae
Vitae). Quando isto acontece, não se vê mais a união sexual
corno um "grande mistério" proclamando o amor de Deus à
humanidade e prenunciando o paraíso. Em três tempos reduzi
mos a sexualidade a um processo biológico, sujeito a todos os
tipos de manipulação humana. Hoje, devido a este modo de
pensar, a maioria dos homens e mulheres não se preocupa com
sua fertilidade, talvez menos até que com a cor de seus cabelos.
O sexo é certamente biológico, mas isto é apenas urna pers
pectiva parcial. Corno observou Paulo VI, para se entender o
ensino cristão sobre o sexo e a procriação, devemos olhar "além
das perspectivas parciais", precisamos de urna "visão total do
homem e de sua vocação" (HV, n.7). Foi isto que João Paulo II se
propôs fazer na sua teologia do corpo - dar-nos a "visão total
do homem", de maneira a permitir-nos entender o ensinamento
da Igreja sobre a contracepção. De fato, corno diz João Paulo II
- toda a teologia do corpo pode ser considerada corno "um
amplo comentário à doutrina contida na encíclica Humanae
Vitae" (28. 11 .1984).
Todas as cinco etapas anteriores nos ajudaram a chegar a
este ponto. Se consegui introduzi-lo com êxito na bela visão de
João Paulo II sobre o corpo e o sexo, deve ter-lhe ficado bem
clara a base lógica da Humanae Vitae. No entanto, alguns im
portantes questionamentos levantados pela encíclica de Paulo
VI ainda permanecem. Que critério especial nos oferece a teolo
gia de João Paulo II para entendermos a Humanae Vitae? Por
que a Igreja rejeita a contracepção, mas aceita os métodos natu
rais de regulação da fertilidade? O que pretende a Igreja dizer
com a prática da "paternidade-maternidade responsável"? Seu
ensino sobre a contracepção não está impedindo os casais de
expressarem mutuamente seu amor?
Antes de entrar diretamente nessas questões, demos urna
rápida olhada nalguns versículos-chave do Cântico dos Cânticos
1 09
e do Livro de Tobias. João Paulo II reflete sobre eles como uma
espécie de prefácio à sua explanação da Humanae Vitae. Por isso,
eles devem conter elementos capazes de esclarecer ainda mais
as questões levantadas acima.
110
ção. Para respeitar a mulher como "a mestra de seu próprio
mistério", o amante não tem outra coisa a fazer que fiar-se à
sua liberdade. Ele só mete "a mão na fechadura" (Ct 5,4) de
pois do "sim" que ela lhe dá livremente. Na liberdade mais
total - sem qualquer mostra de coação - ela diz: "Eu sou para
o meu amado" (Ct 6.3) .
O detalhe aqui é que o amor autêntico proporciona uma
certa " entrada" no mistério do outro, sem nunca violar o mistério
pessoal (cf. 30.05.1984). Se o "amor" de uma pessoa viola o amado
ou a amada, não é amor e nem pode chamar-se amor. É uma
falsificação do amor, é luxúria.
111
"Tu és bendito, Deus de nossos pais, e bendito é teu nome
pelos séculos dos séculos. Bendigam-te os céus e toda a cri
ação por todos os séculos. Tu fizeste Adão e lhe deste Eva
como auxiliar e amparo, e de ambos surgiu a descendência
humana. Foste tu que disseste que não era bom o homem
ficar só: façamos para ele uma auxiliar que lhe seja seme
lhan te. Agora não é por luxúria que me caso com esta mi
nha irmã, e sim com reta intenção. Ordena que tenhas mi
sericórdia de mim e dela e possamos chegar os dois a uma
ditosa velhice. Ambos disseram: amém, amém, e dormi
ram a noite inteira " (Tb 8, 5-8).
112
ÉTICA DO S I NAL
1 13
do matrimônio (cf. 12.01 .1983) . Ao inserir a anticoncepção na
linguagem do corpo (consciente ou inconscientemente), o casal
cria um contra-sinal do "grande mistério", uma espécie de "anti
sacramento" . Ao invés de proclamar: que "Deus é amor que dá
vida", a linguagem do relacionamento com anticoncepcionais
afirma o contrário: "Deus não é amor que dá vida" .
Desta maneira, o s esposos, (consciente ou inconscientemen
te) tomam-se "falsos profetas" . Eles blasfemam. Seus corpos ain
da proclamam teologia, mas não teologia cristã; de forma algu
ma, teologia daquele Deus que se revela como Pai, como Filho e
como Espírito Santo. Sexo com anticoncepcionais nega e ofende
a nossa criação à imagem da Trindade.
1 14
Durante o relacionamento conjugal, "um momento assim
rico de significado ( . . . ) especialmente importante é aquele em
que a 'linguagem do corpo' é relida de acordo com a verdade"
(11 .07. 1984) . Somos livres frente à opção de fazer sexo ou não.
Mas se optamos por unir-nos sexualmente, não somos livres
para mudar-lhe o sentido. A linguagem do corpo tem "signifi
cados bem claros", e todos eles estão "programados" - explica
o Papa - no consentimento conjugal e nas promessas. Um exem
plo é com relação à "pergunta: 'Estais dispostos a aceitar com
responsabilidade e amor os filhos que Deus pode lhes dar?'
( . . . ) tanto o homem como a mulher, em separado, responde:
'sim"' (19.0 1 . 1983) .
Se os esposos dizem "sim" diante do altar, mas depois este
rilizam sua união, estão mentindo com seus corpos. Estão sen
do infiéis às promessas do casamento. Tal desonestidade, bem
no coração da aliança matrimonial, só pode ter efeito deletério.
Alguém poderá revidar: "Vamos e venhamos ! Diante do
altar posso prometer 'aceitar os filhos', mas isto não quer di
zer que cada um dos meus relacionamentos conjugais precisa
incluir a aceitação de filhos" . Na verdade isto parece o mes
mo que dizer: "Diante do altar posso prometer fidelidade,
mas isto não significa que cada um dos meus relacionamentos
sexuais deva ser com minha esposa" . Se você pode reconhe
cer a inconsistência de uma promessa de fidelidade ( . . . ) mas
não sempre, você deve também reconhecer a inconsistência
de uma promessa de estar disposto a receber os filhos ( . . . )
mas não sempre.
Que tal se os noivos, durante a celebração do matrimônio
diante do altar, simplesmente suprimissem sua " disposição de
aceitar filhos?" Neste caso, pelo menos, não estariam os dois
"mentindo" com seus corpos ao usarem contraceptivos ! Será
mesmo? Isto refletiria o que prometeram fazer, sim. Mas com
tal compromisso, eles não estariam amando como Deus ama. O
casamento deles não seria válido. Como a Igreja sempre ensi
nou, excluir conscientemente a aceitação dos filhos anula o
matrimônio já no início.
1 15
PATERNI DADE/MATERN I DADE RESPONSÁVEL
1 16
lia, quando têm justas razões para evitar uma gravidez, nunca
tornam inférteis seus atos sexuais, nunca p r aticam a
contracepção. Eles estudam sua infertilidade e somente se unem
quando são naturalmente infecundos. Os leitores não familiari
zados com os métodos naturais de limitação devem saber que a
sua garantia é de 98 a 99 por cento, desde que sejam usados
corretamente. Além disso, qualquer mulher, independente da
regularidade de seus ciclos menstruais, pode usá-los com suces
so. Claro, não é o "método do ritmo" de nossas avós.
Q UAL A DI FERENÇA?
117
menos de quatro anos de idade, e a situação emocional deles
chegou aos últimos limites. Nada, entretanto, justifica a tentati
va de esterilização do ato sexual, assim como nenhuma situa
ção justifica provocar a morte da vovó.
Tanto a morte natural dela quanto o período natural de
infertilidade da mulher são determinados por Deus. Mas, ao
encurtarmos a vida da vovó ou esterilizarmos o sexo, estamos
tomando em nossas próprias mãos as forças da vida - assim como
o enganador nos tentou a fazer no início - com a promessa de
tornar-nos como Deus (cf. Gn 3,5). Portanto - conclui o Papa
"a contracepção deve ser considerada tão profundamente imo
ral, que nunca, por razão nenhuma, seja tida como aceitável.
Pensar ou dizer o contrário equivaleria a afirmar que, ao longo
da vida, podem surgir situações nas quais seria legítimo não
reconhecer Deus como Deus" (10.10. 1983).
1 18
to ao contrário - diz ele - é uma negação do ( . . . ) amor" (AR,
150-151). Na realidade, o que muitas vezes chamamos de amor,
11
quando o submetemos a um exame crítico minucioso, ao con
trário de todas as aparências, não passa de uma forma de 'usar '
a outra pessoa" (AR p.167).
Para que serve realmente a anticoncepção? À primeira vis
ta, a pergunta pode parecer estranha, mas vamos pensar um
pouco. Os contraceptivos não foram inventados para evitar a
gravidez. Já dispúnhamos de um meio cem por cento eficaz,
cem por cento seguro para isto - a abstinência. Em última análi
se, a contracepção tem como objetivo poupar-nos a dificuldade
que experimentamos ao ter de optar pela abstinência. Quando
toda a fumaça desaparecer, veremos que os contraceptivos fo
ram criados por causa da nossa falta de controle; para justificar
a nossa entrega à luxúria.
Por que castramos ou esterilizamos nossos cachorros e ga
tos? Porque eles são incapazes de dizer não aos seus impulsos
de união, porque não são livres. Se nós fazemos isto através dos
anticoncepcionais, estamos rebaixando o "grande mistério" da
união numa só carne, o estamos colocando no mesmo nível de
um par de cachorrinhos no cio. O que é que, em primeiro lugar,
nos distingue dos animais (lembra a solidão original)? A respos
ta é: a liberdade. Deus nos deu a liberdade como a capacidade
de amar. A anticoncepção nega essa liberdade . Ela diz: "Eu
não posso abster-me" . Por isto, a união sexual contraceptiva
não só ataca o sentido procriativo do sexo, mas também faz
11
com que a união sexual deixe de ser um ato de amor"
(22.08.1984) . Se você não é capaz de dizer não ao sexo, que
significado tem o seu "sim"? Somente a pessoa que é livre com
a liberdade "para a qual Cristo nos libertou" (cf. Gl 5, 1) é
capaz de um autêntico amor.
119
va e libertadora. Sim, porque livra o impulso sexual da "ati
tude utilitarista", da tendência de usar os outros para a pró
pria gratificação e prazer. A castidade requer "uma aprendi
zagem do domínio de si, que é um treino da liberdade humana.
A alternativa é clara : ou o homem comanda suas paixões e
obtém a paz, ou se deixa subj ugar por elas e se torna infeliz"
(CIC, no 2339).
Como vimos n o capítulo 3, o autodomínio não significa
apenas resistir com a força de vontade aos desejos desregra
dos. Este é apenas o lado "negativo" da questão . "Ao desen
volvermos o autocontrole, o experimentaremos também como
a habilidade para direcionar as reações (sexuais), tanto em
seus conteúdos quanto em seu caráter" (31 . 1 0 . 1 984) . Quem é
efetivamente casto é capaz de orientar o desejo erótico "para
o verdadeiro, o bom e o bonito" - tanto assim que o próprio
erótico se torna verdadeiro, bom e bonito" (12. 11 . 1 984) . Na
medida em que os esposos experimentam a libertação da lu
xúria, entram na liberdade da " doação", que os torna capa
zes de expressar "a 'linguagem do corpo' numa forma tão
profunda, simples e bonita como até aqui nunca tinham co
nhecido" (04 .07. 1984).
É claro que a castidade exige "ascetismo", entendido como
pronta e decidida vontade de resistir aos impulsos da luxúria.
Mas sempre é bom lembrar que a castidade autêntica não repri
me. Ela entra na morte e ressurreição de Cristo. Na medida em
que a luxúria morre, o autêntico amor ressuscita. Como disse o
Papa, "se a castidade conjugal (e a castidade em geral) se mani
festa primeiramente como a capacidade de resistir (à luxúria),
com o decorrer do tempo, passa a revelar-se gradativamente
também como uma capacidade única de perceber, amar e pôr
em prática aqueles significados da 'linguagem do corpo', que
permanecem totalmente desconhecidos para a luxúria em si
mesma". Daqui porque o ascetismo exigido pela castidade não
empobrece nem impede as expressões de amor e de afeição do
casal. Ao contrário, "torna-os espiritualmente mais íntimos e,
conseqüentemente, mais ricos" (24.10.1984) .
120
ESPI RITUALI DADE MATRI MON IAL
121
seja, se os corações de ambos estão fechados ao poder transfor
mador do Espírito Santo - inevitavelmente verá os ensinamentos
da Igreja contra a anticoncepção como uma regra opressora.
Em contrapartida, para os casais que fazem da sua relação se
xual uma expressão de "vida no Espírito Santo" seria impensável
tornar sua união estéril. Eles entendem que sua união deve sim
bolizar o amor vivificante de Cristo à sua Igreja. Em outras pa
lavras, eles compreendem a teologia de seus corpos. Cheios " de
veneração pelos valores essenciais da união conjugal (14. 11 . 1984),
estão preparados e dispostos a fazer qualquer sacrifício para
que a luxúria não vença o amor" .
Estou longe de ser um homem perfeito, um marido perfei
to, mas esta visão da espiritualidade matrimonial é real para
mim. Como já disse, houve um momento em que estive a ponto
de abandonar a Igreja, por causa do seu ensino contra os
contraceptivos. Via esta sua determinação como uma ética opres
siva e arbitrária. Mas quando, finalmente, desisti do meu orgu
lho obstinado, e rezei: "Ó meu Deus, se isto é verdadeiro, deves
mudar meu coração", imagine só! Deus começou a mudar meu
coração. Pouco a pouco, eu comecei a experimentar o "etos da
redenção". Para os que vivem um autêntico etos cristão, a idéia
de envolver contraceptivos nas relações sexuais torna-se repul
siva. Eles sentem-se livres da lei! Não a sentem mais como uma
imposição. Ela brota do fundo como uma expressão de "vida
segundo o Espírito". Quando tal mudança acontece no cora
ção, a pessoa começa a entender por que os mártires preferiram
morrer a transgredir a lei de Deus. Repito: não sou um homem
perfeito, mas posso dar testemunho dessa transformação. E se
tal mudança foi possível em minha vida, também o será na vida
de qualquer um.
1 22
derem, juntamente com todas as manifestações possíveis de
amor e afeto, o "singular, ou melhor, o excepcional sentido" do
amplexo sexual (cf. 21 .11 . 1984) .
A prática dos contraceptivos - e a mentalidade que se es
conde por trás dela - denota uma total falta de compreensão do
significado extraordinário do amplexo sexual, no plano de Deus.
Uma falta que constitui, em certo sentido - afirma o Papa -, a
"antítese" da espiritualidade matrimonial (cf. 21 . 1 1 . 1984) . Se a
espiritualidade matrimonial inclui, por parte dos esposos, a aber
tura de seus corpos - e "daquele corpo" que formam no ato
sexual - para o Espírito Santo, a contracepção manifesta um
específico "fechar-se" ao Espírito Santo. Quem é o Espírito San
to? Como rezamos, em cada domingo, no Credo de Nicéia, ele é
o "Senhor e doador da vida". A contracepção, entretanto, diz:
"Senhor e Doador da vida, não te queremos aqui".
Não acham esta negação bastante parecida com a do peca
do original? No ato da criação, Deus "inspirou" o corpo huma
no com sua própria vida e seu amor ( cf. Gn 2, 7). Quando peca
ram, porém, o homem e a mulher "expiraram", isto é, sopra
ram para fora de seus corpos o Espírito de Deus. Ou, noutras
palavras, pela "dureza de seus corações", recusaram-se a acei
tar o Espírito Santo. Uma vez mais renovo o apelo: "Hoje, se
ouvirdes sua voz, não endureçais vossos corações" (Hb 3, 15) .
Desde o começo, a união sexual destinou-se a tornar o ca
sal participante do intercâmbio eterno do amor de Deus. Na
verdade, o que pretendem expressar com seus corpos os casais
quando excluem de sua união o Senhor, Doador da Vida? Cons
ciente ou inconscientemente, eles dizem isto: "Preferimos o pra
zer momentâneo de um orgasmo esterilizado que participar na
vida íntima da Trindade". A esses eu digo: é uma decisão errada!
Porém acha você que, se os casais realmente soubessem o que
estão escolhendo, continuariam nesta prática equivocada? Só
me resta apelar para as palavras de Cristo, no alto da cruz; "Pai,
perdoai-lhes, pois não sabem o que fazem! " (Lc 23, 34) .
Não há nada de trágico em admitir que temos pecado. Não
é nenhuma tragédia reconhecer que fomos enganados com pro-
1 23
messas falsas, que nos venderam um "osso" difícil de roer. A
única tragédia é a dureza de coração que se recusa a admitir
seu próprio pecado. Não tenha medo! Como dissemos repetidas
vezes ao longo deste livro, Cristo veio para salvar, não para con
denar (cf. Jo 3, 1 7). Não importa quantas vezes a luxúria domi
nou sua vida. Não importa se você foi "disléxico", isto é, inca
paz de ler e entender, ou até "analfabeto" em ler a linguagem
divina do corpo. Graças ao presente da redenção - proclama
corajosamente João Paulo li - "existe sempre a possibilidade de
passar do 'erro' à 'verdade' . . . , a possibilidade de . . . conversão
do pecado à castidade, como uma expressão de vida segundo o
Espírito" (09.02.1983).
Vinde, Espírito, vinde! Convertei nossos corações da luxú
ria ao amor. Impregnai de paixão divina os nossos desejos
sexuais, amando como Deus amou aqui na terra, a fim de
podermos um dia nos alegrar na consumação das "núpcias
do Cordeiro " no céu. Amém.
1 24
CAPÍTULO 8
1 25
partir de então, passou a "recordar repetidas vezes a urgência
de uma nova evangelização " (FR n. 103). Tal urgência decorre
não só do fato de nações inteiras não terem ainda recebido o
anúncio do Evangelho, mas também do fato de " grupos inteiros
de batizados terem perdido o sentido de viver a fé, ou não se
considerarem mais membros da Igreja, e levarem uma vida alheia
a Cristo e ao seu Evangelho" (RM. n. 86).
A "novidade" nessa evangelização é que ela se dirige em lar
ga escala a ''batizados não-crentes". Homens e mulheres, em grande
número, são "culturalmente cristãos", mas não experimentaram
ainda uma conversão de coração para Cristo e seus ensinamentos.
O apelo para uma conversão interior foi, de fato, um dos temas
capitais do Vaticano II. Como o Concílio compreendeu muito bem,
isto só poderá acontecer mediante um autêntico, persuasivo e evan
gélico testemunho da salvação, através de Jesus Cristo.
Como explicou o Papa em sua carta apostólica "No começo
do novo milênio ", a nova evangelização "não consiste em inven
tar 'um novo programa'. Este já existe e é o plano que se encon
tra no Evangelho e na Tradição viva, é o mesmo de sempre" (n.
29) . O essencial para levar o Evangelho ao mundo moderno é
uma proclamação que seja "nova no ardor, nos métodos e na
forma de expressão" (09.03.1983).
Falando aos bispos americanos em 1998, o Papa lembrava que
"a nova evangelização (envolve) um esforço vital para chegar a uma
compreensão mais profunda dos mistérios da fé e encontrar uma
linguagem mais apropriada para convencer os nossos contempo
râneos a sentirem-se chamados a uma vida nova, através do amor
de Deus". É o esforço por partilhar com os homens e as mulheres
de hoje "as 'riquezas insondáveis de Cristo' e dar-lhes a conhecer
de maneira clara ' o plano do mistério escondido, desde toda a eter
nidade, em Deus, que tudo criou' (Ef 3, 8-9". (SE 53,55).
"Como se pode fazer isto?" - pergunta você. Eis aqui urna
sugestão: fale sobre sexo. Que grande ponto de partida para a
evangelização - todo mundo está interessado! Digo isto com
um bocado de humor, mas também com toda a seriedade. Se
queremos dar a conhecer aos outros "o plano do mistério escon-
1 26
dido desde toda a eternidade em Deus", como aprendemos nes
te livro, lembremos que existe uma imagem desse mistério es
tampada bem aí em nossa sexualidade. A teologia do corpo pro
porciona exatamente a "linguagem apropriada" de que preci
samos "para persuadir nossos contemporâneos de que eles são
chamados a uma renovação da vida através do amor de Deus" .
127
só pode ser compreendido se temos em mente o 'grande misté
11
128
profunda. Mas, como aprendemos neste livro, a singularida
de humana é que a dimensão espiritual se manifesta em nossa
dimensão física.
Foi no corpo que Adão se apercebeu estar "sozinho" no
mundo e que não era bom existir assim. Fomos feitos para amar,
para a comunhão com um " outro". É isto que o corpo nos ensi
na: somos destinados ao amor. Como declarou eloqüentemente
João Paulo II, "o homem não pode viver sem amor. Ele perma
nece para si próprio um ser incompreensível, e a sua vida é des
tituída de sentido, se não lhe é revelado o amor, se não encontra
o amor, se não o experimenta e se não o toma próprio, se nele
não participa vivamente. Esta ( . . . ) é a razão porque Cristo o
Redentor 'revela plenamente o homem a si mesmo."' (RH. n.
10); visto que seu corpo "oferecido por nós" revela a verdade
sobre o amor encarnado.
A vocação para o " amor encarnado" não é abstrata. Mes
mo que o pecado nos tenha distanciado da beleza e da pu
reza do plano original de Deus, cada um de nós conhece a
" dor" da solidão e o anseio de comunhão. Cada um conhe
ce a "atração magnética" do desej o erótico. Este anseio bá
sico de união é, na realidade, o mais concreto laço de união
de cada coração humano com "aquele homem que viveu há
mais de dois mil anos atrás". Porque todo anseio humano,
quando purificado, nos leva a Cristo, e nenhum outro mais
do que o anseio de união com um "outro" no amplexo sexu
al. " Por esta razão ( . . . ) os dois tornam-se uma só carne " .
Para quê? Para manifestar, proclamar e antecipar a união
com Cristo e a Igreja (cf. Ef 5, 3 1 -32) .
Só a comunhão eterna, estática, "esponsal" com Cristo e a
comunhão dos santos - incomparavelmente superior a qualquer
coisa própria à vida terrena que podemos imaginar - somente
ela pode aliviar a "dor" da solidão humana. É este o Pólo Norte
para o qual a atração magnética do desejo erótico está orienta
da. Segundo Santo Agostinho, fomos feitos para a comunhão
com Cristo, e nossos corações continuarão inquietos enquanto
não repousarem neste eterno abraço.
1 29
O TRABALHO DA NOVA EVANGELIZAÇÃO
1 30
ceber que, no fundo, o que realmente desejamos é amor e ale
gria eternos. Para isto é que fomos criados. E a boa nova do
Evangelho é que esse amor já foi revelado e está sendo dado
livremente. Como? Onde? No corpo de Cristo. Esta é a razão
porque "Jesus é a resposta".
Se o espírito do Evangelho não for encarnado deste modo,
nos desejos reais de homens e mulheres, ficará para sempre se
parado daquilo que experimentamos como "essencialmente
humano" . Ainda, Cristo assumiu a carne para casar-se com o
que é essencialmente humano. Se, portanto, o Evangelho não
estiver encarnado no essencialmente humano, não será essenci
almente o Evangelho de Jesus Cristo.
131
evangelizadora, mas ela começa por evangelizar-se a si mes
ma" (n. lS). Não resta dúvida de que, ao apresentar sua teologia
do corpo, João Paulo II esperava ser, antes de tudo, ouvido pela
própria Igreja.
Pouquíssimos cristãos parecem entender que uma imagem
do Evangelho se encontra impressa em seus próprios corpos e em
seu anseio de união. Grande número de católicos caíram na ar
madilha das tantas falsidades que rolam por aí com ares de ver
dades, e se opõem ao ensinamento da Igreja. Até, portanto, que a
tendência não mudar na Igreja - até que a Igreja não evangelizar
primeiro a si mesma - não poderá evangelizar os outros.
132
Em contrapartida, como demonstram as últimas décadas de
divergências, o cristianismo começa a desintegrar-se nas emen
das - sua lógica interior desmorona e não poucas de suas verda
des centrais são contestadas -tão logo nos divorciamos do " grande
mistério" da comunhão esponsal revelada através do corpo.
CONC LUSÃO
133
Se a teologia do corpo fornece a resposta à crise de nosso
tempo, é só pelo fato de ser capaz de restabelecer a ligação do
mundo moderno com o "grande mistério" de Cristo e da Igreja.
Como escreve o Papa, "não vamos certamente nos deixar sedu
zir pela ingênua expectativa de que, ao enfrentarmos os gran
des desafios de nosso tempo, seremos salvos por alguma fórmu
la mágica. Não, não é por uma fórmula mágica que seremos
salvos, e sim por uma Pessoa e pela garantia que ela nos dá: Eu
estou convosco " (NMI, n. 29) . Cristo, o Esposo, está conosco! (cf.
CF, parte II) .
Esta é a nossa viva esperança. Esta é a esperança que João
Paulo li nos oferece em sua teologia do corpo. Se partilharmos essa
esperança com o mundo, juntos, conseguiremos renovar a terra.
Que tudo, Senhor, se realize segundo a vossa vontade. Maria,
mulher da glória e estrela da nova evangelização, rogai por
nós. Amém.
134
G LOSSÁRI O
1 35
6 . Mistério divino - Refere-se ao duplo
"segredo interior"
de Deus: primeiro, que Deus existe como uma Trindade de pes
soas, num eterno "intercâmbio de amor"; segundo, que desti
nou o ser humano (homem e mulher) a participar desse inter
câmbio de amor.
7. Comunhão de pessoas - Alude à união ou "comum
união" que se estabelece quando duas pessoas dão e recebem
mutuamente "o dom sincero de si mesmas" . A comunhão ho
mem-mulher no casamento é uma imagem criada daquela Co
munhão de Pessoas existente na Trindade.
8. Sincera doação de si mesmo - Cristo demonstra que o
amor se realiza na e através da autodoação. Para dizer que o
ser humano só pode encontrar-se através do "sincero dom de si
mesmo" deve-se dizer também que ele só consegue ser o que é,
ao amar como Cristo ama.
9 . Analogia esponsal - Refere-se à prática bíblica do amor
matrimonial, como uma imagem terrena do amor de Deus ao
povo de Israel e, no Novo Testamento, do amor de Cristo à Igre
ja. Como todas as demais, também a analogia esponsal é inade
quada para expressar o mistério infinitamente transcendente
de Deus. No entanto, conforme João Paulo II, é a imagem hu
mana mais apropriada do mistério divino.
10. Batalha espiritual - Refere-se ao conflitoentre o bem e
o mal, que acontece em nós e ao redor de nós. A união dos sexos
encontra-se no centro desse grande conflito.
11. Cultura da morte - Refere-se ao ambiente cultural
utilitarista, no qual as pessoas não somente são tratadas como
meios para atingir um fim, mas, se não se prestam para isto, são
desprezadas, maltratadas ou até eliminadas.
12. Cultura da vida - Refere-se ao ambiente em que a vida
humana é respeitada como o maior de todos os dons, em que
não se medem sacrifícios para salvaguardar a dignidade e o valor
inestimáveis de cada pessoa.
1 36
CAPÍTU LO 2 - ANTES DAS FOLHAS DE FIG U E I RA.
O PLANO O RI G I NAL DE DEUS PARA O CORPO E O S EXO
137
21. Nudez original - É a experiência original da nudez,
sem sentir a vergonha. Adão e Eva não a sentiam, por não te
rem qualquer experiência de luxúria. Antes do pecado, homem
e mulher experimentavam o desejo sexual como um desejo de
amar à imagem de Deus.
22. Vergonha - Em sentido negativo, indica que perdemos
de vista a dignidade e a bondade do corpo como uma "teolo
gia" - a revelação do mistério de Deus. Em sentido positivo, a
vergonha indica a preocupação de proteger a bondade do cor
po contra a degradação da luxúria.
23. Luxúria - Trata-se do desejo sexual destituído do amor
de Deus. A luxúria conduz a pessoa à satisfação de si própria à
custa de outra, ao passo que o amor leva à autodoação para o
bem do outro. Luxúria é pois uma redução da plenitude origi
nal prevista por Deus para a relação sexual.
24. Olhar interior - Refere-se ao "olhar puro" que Adão e
Eva livremente trocaram entre si, quando ainda em estado de
inocência. Incluía não somente uma visão do corpo com os pró
prios olhos, mas, através da visão física, serem capazes de con
templar a realidade interior do outro.
25. Livre doação - Antesdo pecado, nem o homem nem a
mulher experimentavam o desejo sexual como uma compulsão
ou um impulso incontrolável. Eram totalmente livres, e nesta
liberdade cada um só desejava tomar-se um dom para o outro.
Em Cristo somos chamados a reconquistar essa liberdade. Foi
para sermos plenamente livres que Cristo nos libertou (Gl S, 1).
2 6 . O b e m original n a visão d e Deus - Conforme Gênesis
1, 31, "Deus olhou para tudo o que tinha feito e achou que era
muito bom" - o que significa: tudo o que Deus criou é funda
mentalmente bom. O mal, portanto, não é uma realidade em si
mesma, mas somente e sempre uma privação, uma redução do
bom que Deus criou.
27. Santidade - Refere-se ao estado da pessoa que ama
1 38
corretamente. A santidade de Deus manifesta-se no seu inter
câmbio eterno de amor. A santidade humana é que nos possibi
lita ser imagem de Deus, através do sincero dom de nós mes
mos. Tanto em nós quanto em Cristo encarnado, a santidade se
expressa em e através do corpo humano.
28. O amor conj ugal - É o amor de "autodoação total" . O
matrimônio oferece um modelo desse amor, mas não é a única
forma de expressar o dom total de si mesmo.
29. O significado esponsal do corpo Refere-se ao cha
-
1 39
mesmo é a nossa autodoação ("dom"). Com o amanhecer do
pecado, passamos a ver Deus mais como um tirano, sempre
pronto a nos recusar o que desejamos.
34. A segunda descoberta do sexo - Refere-se à experiên
cia posterior ao pecado original, quando a relação sexual pas
sou de um relacionamento de amor e comunhão para um de
luxúria e dominação.
35. Luxúria - (ver n. 23).
36. Vergonha - (ver n . 22) .
37. Uma moralidade vivenciável - Refere-se à "vida" que
Cristo nos oferece e nos capacita a desejar e livremente escolher
o que é verdadeiro, bom e bonito. Não deve ser confundida com
aquela visão de moralidade "sem vida" que, por causa da sedu
ção do demônio, considera a lei de Deus uma carga e um impe
dimento
38. É tica e etos -Ética é uma lei moral objetiva ou um
mandamento. E tos, por outro lado, refere-se aos desejos íntimos
do coração, o que atrai ou repele uma pessoa. No Sermão da
Montanha, Cristo mostra que a ética só não basta ("Ouvistes os
mandamentos . . . mas eu vos digo . . . "). Cristo veio para transfor
mar nosso etos, para mudar nossos corações.
39. O etos da redenção - (também o etos cristão) ou o novo
etos: caracteriza-se por uma transformação do coração huma
no, o que leva a desejar e a realizar o plano original de Deus
acerca da vida e da união dos sexos.
40. Liberdade diante da lei - Realiza-se quando, através
do etos da redenção, o coração fica de tal modo transformado
que não precisa mais "da lei" (da ética), pois não quer mais
transgredi-la.
41. Graça - É o amor de Deus derramado no coração hu
mano pelo Espírito Santo. A graça habilita homens e mulheres
"a serem o que são", a viverem e amarem como Deus quer. A
graça penetra a pessoa humana total, corpo e alma, tornado-
1 40
nos capazes de "doar nossos corpos" pelo sincero dom de si.
42. Fé - Na sua essência mais profunda, a fé é a abertura
do coração à graça de Deus, ao dom divino, ao amor derrama
do no coração humano pelo Espírito Santo.
43. A graça da criação - Refere-se ao dom do
amor de Deus
derramado na criação do mundo, especialmente na criação do
homem e da mulher. Essa graça habilitou o primeiro casal hu
mano para o amor recíproco, segundo a imagem divina antes
do pecado.
44. A graça da redenção - Refere-se ao dom do amor de
Deus derramado para a redenção do mundo, em especial para
a redenção do homem e da mulher. Essa graça os habilita, na
medida em que seguem a Cristo, a recuperar gradualmente o
plano original de Deus e a vivê-lo. Mas a graça da redenção só
se realizará plenamente na ressurreição do corpo.
45. A vida segundo o Espírito - Refere-se a uma vida in
fundida com a graça da redenção, isto é, a vida no Espírito San
to. Na medida em que vivemos "segundo o Espírito", nos liber
tamos da lei, pois os nossos corações já se conformaram com
ele. Viver segundo o Espírito não significa que rejeitamos o cor
po, e sim que o abrimos à inspiração do Espírito Santo.
46. A vida segundo a carne - Refere-se a uma vida alheia à
inspiração divina. Para os prisioneiros da luxúria e de outros
vícios, a lei de Deus se afigura como uma carga e uma imposi
ção. Isto, porém, não significa que a nossa carne seja "má", e
sim que precisa ser insuflada pelo Espírito de Deus.
47. A redenção do corpo - Na medida em que experimen
tamos a "vida segundo o Espírito", experimentamos também a
redenção de nossos corpos. Isto é, a restauração da pessoa hu
mana em sua integridade como unidade de corpo e alma. Isto
possibilita a recuperação do plano original de Deus no coração
humano. Tal redenção não é somente algo que aguardamos na
ressurreição da carne. Ela já está se realizando em nós dentro
da história.
141
48. A pureza de coração - Na medida em que somos puros
de coração, compreendemos, vemos e experimentamos o corpo
corno Deus o criou e deve ser, corno urna revelação de seu pró
prio mistério divino. "Felizes os puros de coração, porque verão
a Deus" (Mt 5, 8).
4 9 . A interpretação da suspeita - Os que vivem sob essa
interpretação ficam tão fechados em sua própria luxúria, que
projetam a mesma dependência sobre todos os demais. Nem
sequer são capazes de imaginar um outro modo de ver o corpo
e o relacionamento sexual fora do prisma da luxúria. Esta visão
é urna antítese do sentido da vida.
1 42
à sua Esposa, a Igreja; e essa, por sua vez, quer retribuir o dom,
doando-se ao Cordeiro. Através desta mútua doação de amor,
Deus e o homem viverão em eterna comunhão.
54. Visão beatífica - É a visão eterna de Deus concedida
aos que correspondem ao convite para o casamento do Cordei
ro. A beleza e o esplendor incomparáveis dessa visão eterna de
Deus encherá de uma felicidade sem fim a todos os que a con
templarem.
55. A realização do significado esponsal do corpo - Na
ressurreição, o significado esponsal do corpo será definitivamente
revelado e consumado na acolhida de Deus que se dá, e na re
tribuição de si mesmo a Deus.
56. Comunhão dos santos - Os santos do céu não se con
tentam em viver em eterna comunhão com Deus, mas desejam
viver em eterna comunhão com cada um de nós também. Tal
comunhão já existe entre os que estão no céu e os que continu
am na terra e caminham para ele. Na ressurreição, essa comu
nhão dos santos completará definitivamente aquela união da
raça humana, desejada por Deus desde o início.
1 43
reno. No entanto, subjetivamente falando, a vocação "melhor"
é aquela para a qual alguém se sente chamado.
60. Maniqueísmo - (ver n. 3).
61. Complementaridade das vocações - Refere-se ao fato
de que o casamento cristão e o celibato não devem entrar em
conflito ou competir entre si, mas, ao contrário, se enriquece
rem e completarem mutuamente. O casamento revela o caráter
"esponsal" do celibato, bem como o celibato revela a orientação
sacramental do casamento.
62. O celibato expressa o significado esponsal do corpo
O celibato cristão não envolve rejeição do corpo e da sexualida
de, mas expressa a finalidade e o significado último do corpo e
da sexualidade, apontando mais profundamente para as núp
cias do Cordeiro. Homem e mulher celibatários expressam o sig
nificado esponsal do corpo, tornando-o um sincero dom para
os outros. Isto, por sua vez, leva a uma fecundidade espiritual.
1 44
corpo. A autoridade dele não deve implicar um controle autori
tário e dominador, e sim uma razão para ser o primeiro a servir,
para doar sua vida à esposa (e filhos), à imitação de Cristo.
66. Sacramentalidade do corpo - (ver n. 18).
67. Sacramento da criação - Refere-seao fato de o "misté
rio do amor de Deus" se tornar mais visível na criação, através
do "sinal" da união entre homem e mulher.
68. Sacramento da redenção - O "mistério do amor" de
Deus fica definitivamente revelado na redenção, através do "si
nal" da união de Cristo com a Igreja, união comparada por São
Paulo com a união matrimonial.
69. A linguagem do corpo - Refere-se à capacidade do cor
po de "falar" ou "proclamar" o amor de Deus. Isto acontece
ou deveria acontecer - da maneira mais profunda na união
"numa só carne" dos esposos. Aqui, com seus corpos, procu
ram renovar as promessas matrimoniais.
70. Ágape - Palavra grega que significa "amor", e se usa
para o amor divino. O amor livre, total, fiel e fecundo de Cristo.
No matrimônio cristão, eros e ágape são chamados a unir-se e a
produzir fruto. Se os esposos querem ser fiéis à "linguagem de
seus corpos", sua união sexual deve expressar ágape.
71. O profetismo do corpo - O corpo é "profético", foi feito
para proclamar o amor de Deus. Há, no entanto, que distinguir
cuidadosamente entre verdadeiros e falsos profetas. Se podemos
dizer a verdade com o corpo, com ele podemos também mentir.
1 45
73. Uma visão total do homem - Na Humanae Vitae, Paulo
VI afirma que, para entender os ensinamentos da Igreja acerca
da moralidade sexual, precisamos vê-los dentro de uma visão
total do homem e da sua vocação. Quem é o homem? Por que
existe e qual seu destino? É essa mesma "visão total do homem"
que João Paulo II esboça em sua teologia do corpo.
74. "Minha irmã, minha esposa" - Esta expressão do
Cântico dos Cânticos indica que o noivo (namorado) reconhece
que sua noiva (amada) participa da mesma humanidade que
ele. Chamando-a de "irmã" em vez de "esposa", indica que o
motivo da sua aproximação não é a satisfação da própria luxú
ria e sim o desejo de uma sincera doação de si mesmo.
75. "Um j ardim fechado" - Com esta expressão, tirada
também do Cântico dos Cânticos, o namorado reconhece sua
amada como "mestra do seu próprio mistério". Noutras pala
vras, vê e respeita sua dignidade como uma pessoa inviolável e
autodeterminável. O único meio de penetrar neste "jardim" é o
"sim" dela, dado livremente. Se tentasse manipulá-la ou arrom
bar-lhe a porta, estaria violando sua individualidade pessoal.
76. Teste de vida ou morte - O casamento de Tobias e Sara
mostra que a união "numa só carne" leva os esposos ao centro
da grande luta entre o bem e o mal, entre a vida e a morte. Mas
o amor confia na vitória e está disposto a fazer tudo o que ajuda
a vida a vencer a morte.
77. É tica do sinal - A norma para a moralidade sexual é que
um determinado comportamento manifeste ou signifique verda
deiramente o amor livre, total, fiel e fecundo de Cristo. Se não faz
isto, será uma falsificação do amor que realmente desejamos.
78. Paternidade responsável - Na linguagem da Igreja, a
paternidade responsável tanto é praticada pelos que, prudente
e generosamente, decidem ter muitos filhos, como por aqueles
que, por uma razão séria e respeitando a linguagem do corpo,
decidem espaçá-los e/ ou limitá-los.
79. Planej amento familiar natural - Refere-se aos méto-
1 46
dos de planejamento familiar que condizem com o plano de Deus
a respeito da fertilidade e do amor matrimonial. Os métodos
naturais modernos de planejamento familiar não devem ser con
fundidos com o antigo "método do ritmo", muito menos segu
ro. Os métodos modernos de NFP ( Natural Family Plan
ning=Planej amento Familiar Natural) têm uma precisão de 98-
99%, quando usados corretamente, e podem valer-se dele todas
as mulheres, independentemente da regularidade ou irregulari
dade de seus ciclos.
80. Castidade - É a virtude que orienta o desejo sexual para
o valor supremo da pessoa e da verdade do amor como doação
de si.
81. Espiritualidade matrimonial É a "vida segundo o
-
147
comunhão. Se o Evangelho não for encarnado desta forma, fica
rá desvinculado daquilo que é "essencialmente humano". E se o
Evangelho não for encarnado no essencialmente humano,
tampouco será essencialmente Evangelho de Cristo.
84. Amor encarnado - O amor é supremamente espiritual.
O paradoxo humano, porém, está no fato de o espiritual mani
festar-se no corpo. É em nossos corpos que experimentamos o
chamado divino para o amor e a doação mútua. Tal é a razão
porque Cristo "revela plenamente o homem a si mesmo"; pois
revela a verdade sobre o amor encarnado "dando seu corpo"
por nós.
85. O Evangelho do co rp o - Se o Evangelho é a "boa nova"
da nossa salvação em Cristo, a expressão " evangelho do corpo"
indica que o corpo humano é sinal e instrumento da mesma
mensagem de nossa salvação em Cristo. Numa palavra, o Evan
gelho é um chamado à comunhão. É isto que nossos corpos pro
clamam: comunhão! - "digo-o com relação a Cristo e à Igreja"
(Ef 5, 32) .
86. Analogia d a fé - Refere-se à coerênciadas verdades da
fé entre si mesmas, dentro do plano total da revelação de Deus.
Existe uma interconexão nas verdades da fé, cada uma é inte
gralmente relacionada com as demais. A teologia do corpo aju
da a demonstrar como as várias peças do quebra-cabeça do
mistério cristão se encaixam perfeitamente.
148
E AGO RA, MÃOS À O B RA
O TRADUTOR
-
FONTE S D E I N FORMAÇAO
LIVROS
• Good News About Sex & Marriage (Boas Notícias Sobre Sexo
& Matrimônio):Answers to Your Honest Questions about
Catholic Teaching (Respostas às suas Honestas Perguntas
referentes ao Ensino Católico) (Servant, 2000)
• Crash Course in the Theology of the Body (Curso Introdutório
sobre a Teologia do Corpo): A Study Cuide (Um guia de Es
tudos) (GIFT Foundation/ Luminous Media, 2002)
• Theology of the Body Expla ined ( Teologia do Corpo
Explicada): A Commentary on fohn Paul II's "Gospel of the
Body" (Um Comentário sobre o "Evangelho do Corpo " con
forme João Paulo li). (Pauline, 2003)
150
WEB S ITE OFIC IAL
• Visite christopherwest.com ou theologyofthebody.com
para informações sobre os horários de palestras de
Christopher, artigos que se pode copiar e arquivos auditi
vos, ou para comprar seus livros e conhecer outras fontes.
Luminous Media
151
João Paulo II: Human Lave in the Divine Plan (0 Amor
Humano no Plano Divino) e Theology of the Body Explained:
A commentary on John Paul II's Gospel of the Body (Teologia
do Corpo Explicada: Um Comentário sobre "O Evangelho do
Corpo ", de João Paulo li)
• Visite pauline.org ou chame (nos EUA) 800-876-4463.
ORGANIZAÇÕES
Domestic-church.com
Family Honor
152
Theology of the Body (TOBET)
1 53
mulheres para começarem um "new feminism" . WTTN
oferece uma variedade de retiros para mulheres e homens
• Visite wttm.org ou chame: (nos EUA) 740-282-9062
154
leigos (homens e mulheres), sacerdotes, seminaristas e re
ligiosos/ as para participarem mais ativamente no ensino
e divulgação da teologia do corpo de João Paulo li.
• Visite teologyofthebody.com e clique sobre "Summer
Institute" ou chame (nos EUA) 610-696-7795.
1 55
156
RECON H E C I M E NTOS DO AUTOR
• A m i n ha es posa Wendy,
por seu fiel a m o r e assistência.
157
E D ITO RA MYRIAN
Co n h eça ta m bém n ossas o u tras ed i ções
158
O PADRE PIO CAMIN HANDO COM O PADRE PIO - Clarice Bruno. A
história de um dos maiores místicos de todos os tempos
São Pio de Pietrelcina -, acompanhada de perto no seu
dia-a-dia por uma escritora norte-americana. 200 pp.
R$ 1 6,00.
1 59
160