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“O martelo de matar moscas”: os anos de

chumbo

Professor: Marcus Pierre de Carvalho Baptista

TERESINA/PI, 2018
 Costa e Silva é afastado em agosto/setembro de 1969 e é
substituído por uma junta militar que impede a posse de seu
vice, Pedro Aleixo.

 Se Costa e Silva juntamente a seu grupo mergulharam o país


no chamado “porão da história” é uma questão contestada na
historiografia. Alguns defendem que Costa e Silva tentou
promover uma certa abertura a partir da constitucionalização das
leis de exceção e de autoritarismo. Nessa perspectiva, Costa e
Silva não queria passar para a História como mais um ditador.

 Durante o período que a junta governou buscava-se um novo


general para assumir a presidência, um que pudesse liderar
todas as correntes existentes nos militares naquele momento:
castelistas, nacionalistas, palacianos de Costa e Silva.
 O equilíbrio e a unidade das Forças Armadas eram
fundamentais para combater a guerrilha, bem como a oposição.
Era preciso manter o sistema político sob a tutela da Presidência.

 A Junta Militar que assume após o afastamento de Costa e


Silva não consegue acalmar os diferentes grupos militares e as
divergências referentes a política econômica ou mesmo como
combater a guerrilha.

 1969 também marca um momento de relativo triunfo para os


guerrilheiros, com diversos ataques a bancos e ações ainda mais
audaciosas, a exemplo do sequestro do embaixador norte-
americano e o roubo do cofre de Adhemar de Barros. Cada vez
mais o nome de Marighella crescia nacionalmente e
internacionalmente.
 Era preciso resolver essa crise e a eleição de Médici seria um
primeiro passo para isso.

 Toma posse em outubro de 1969 juntamente com a reabertura


do Congresso para legitimar e confirmar o presidente-general
escolhido. O Congresso confirmou a escolha com 293 votos a
favor e 79 abstenções.

 Seu discurso de posse em 30 de outubro foi um tanto


contraditório. Nele o presidente comenta sobre a vontade
nacional de se ter um regime democrático, além da necessidade
de se consolidar o sistema representativo através da pluralidade
dos partidos e na garantia dos direitos fundamentais dos
homens.
 Nos idos de 1969 a repressão do Estado ia na via inversa de
uma suposta democracia. Além disso, o discurso foi reprovado
pelas lideranças militares que viam na guerrilha a possibilidade
do fim da Revolução de 1964.

Fiuza de Castro: “Certa vez, eu disse a um entrevistador que,


quando decidimos colocar o Exército na luta contra a subversão –
que praticamente foi estudantil e intelectual [...] –, foi a mesma
coisa que matar uma mosca com um martelo-pilão”.

 Qual era o tamanho dessa mosca? Será que era algo tão
pequeno a ponto de ser irrelevante? De qualquer forma é preciso
apontar o que proporcionou o surgimento da guerrilha no Brasil.
 Frustração com o resultado das lutas pelas reformas de base, a
queda do governo constitucional e o fim de qualquer perspectiva
de uma ação política de massas juntamente com as classes
populares.

 Esse contexto levou a um debate decisivo no interior das


Esquerdas: Quem havia sido o culpado pela derrota em 1964,
consequentemente do “processo histórico” em curso?

 Jango em função de sua política de conciliação e o PCB, a


maior organização de esquerda naquele momento, por conta do
seu viés reformista.

 O Reformismo, a Moderação e o Pacifismo falharam frente a


Direita. A solução seria pegar em armas, ir à guerra.
 Parte das esquerdas se inspiram no exemplo cubano na ideia
de que um pequeno grupo armado conseguiriam derrotar um
exército bem armado e conquistar o Estado, visto que iniciado a
luta as massas apoiariam os guerrilheiros em função das
frustrações das opressões diárias.

 Deve-se lembrar que as dissidências comunistas não foram as


primeiras a aderir a luta armada. Esta partiu, primeiramente, dos
militares expurgados após o golpe ainda em 1966, muitos
cooptados pela liderança de Brizola, constituindo o Movimento
Nacional Revolucionário (MNR), tendo seu fim em 1967 com a
prisão de seus membros.

 Ainda em 1967 os militares cassados e expulsos do Exército


formam a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR).
 O VPR foi um dos mais ativos grupos guerrilheiros na luta
contra o regime e em 1969 ingressa em seu quadro o Capitão
Carlos Lamarca. Em 1969 a VPR se une ao Comando de
Libertação Nacional (Colina) e se torna Vanguarda Armada
Revolucionária – Palmares.

 É preciso lembrar que muitas vezes as ações destes grupos


provocavam a morte de soldados de baixa patente e isso era
usado como propaganda pelo governo contra a guerrilha.

 No ano de 1967 surge a outra grande organização guerrilheira


dissidente do PCB: A Aliança Libertadora Nacional, liderada por
Carlos Marighella.
 Mas, afinal, qual era os objetivos das ações dos guerrilheiros?

 Arrecadar dinheiro para montar sua infraestrutura e fazer


propaganda para as massas, além da passagem para uma
“guerrilha rural”, considerada momento decisivo na luta contra a
ditadura.

 Em 1969 o número de ações da guerrilha aumenta culminando


no sequestro do embaixador norte-americano, Charles Elbrick –
Reação do Regime Militar e morte de Marighella no mesmo ano.
Dois anos depois morreria Carlos Lamarca.

 Iniciava-se a operação de extermínio aos guerrilheiros.


 O PCdoB, por sua vez, se organizava na região do Araguaia
desde meados de 1967. A ideia que se tinha era de montar uma
base sólida de guerrilha rural.

 Em 1972 inicia-se os embates com o Exército Brasileiro e no


final de 1973 a maior parte dos membros havia sido mortos ou
tinham desaparecido.

 A questão teórica dentro das organizações de esquerda – A


revolução era nacionalista, democrática ou socialista? Deveria
ser feito lutas no campo ou mesclar com a guerrilha urbana –
Cisão e fragmentação das esquerdas.

 Além disso, quem eram os mortos e desaparecidos? A ditadura


poupou alguém?
 O medo deixado pela repressão e pela derrota da luta armada
– A morte sob a tortura.

 Para limitar as ações das guerrilhas e de qualquer um que se


opusesse o regime militar criou uma máquina repressiva
baseada no seguinte tripé: vigilância, censura e repressão.

 Lei de Segurança Nacional, leis de censura, os AIs e a CF de


1967.

 Várias agências eram responsáveis por garantir esse tripé e


trocavam informações entre si, embora não houvesse uma
coordenação comum.
 Com relação a censura o regime militar ampliou a legislação
que já versava sobre esta e que vinha desde a República Velha.

 Necessidade de qualificar o censor – Trapalhadas técnicas –


Eficácia da censura: Rádio, TV, Teatro, Textos, Cinema (AI – 5),
Música (Anos 80), Imprensa (Caso Singular), Livros (Ineficaz).

 Vigilância: Produzir informações sobre pessoas, movimentos


sociais, instituições, grupos políticos legais ou ilegais.

 O Serviço Nacional de Informações – SNI era o principal eixo


deste sistema.

 SNI: Divisões de Segurança e Informação (DSI) e Assessoria de


Segurança e Informação (ASI) – Estrutura informativa.
 Ministérios Militares: Tinham o próprio sistema de informações
– Informativos e Operativos, assim como as delegacias e
departamentos das polícias estaduais – DOPS.

 Os informes eram classificados de A1 até F6.

 Quem era vigiado? Funcionários públicos civis, lideranças


políticas, intelectuais, artistas, dentre outros.

 A repressão fechava o tripé garantindo o combate direto a


ações contrárias ao regime.

 1960 – Atuação do Dops; Não havia um sistema nacional


integrado e militarizado de repressão policial.
 1968 – Surgimento do DOI-Codi (Destacamentos de Operações e
Informações-Centro de Operações de Defesa Interna)

 Antes do DOI-Codi cada força militar tinha o próprio serviço de


informações e combate a guerrilha – Combate a guerrilha
errático, com várias metodologias e procedimentos diferentes.

Em 1969 surge a Oban (Operação Bandeirante), prenúncio do


DOI-Codi. Não contava com verbas públicas, mas sim privadas.
Método: Torturas e execuções.

 A Oban não agradava a cúpula militar. Cria-se em 1970 o DOI-


Codi, inspirado no modelo da Oban, garantindo uma
intercomunicação entre os serviços de inteligência.
 Os DOI eram os braços armados do Codi, os Codi articulavam
todas as agências de informação encarregadas da repressão em
uma determinada área. Os DOI eram responsáveis pelo combate,
captura e interrogatório – Sistema no limite da autonomia.

 O que acontecia com os presos? Prisioneiros, mortos sob


tortura e a partir de 1971: Desaparecimento – desaparecimento
do corpo e contrainformações para os familiares.

 Aparato ilegal de repressão x Criação de Novas Leis para


sustentar a repressão.

 Em 1972 surgem denúncias no exterior dos desaparecidos e


em 1974 com a esquerda armada desarticulada e vencida, o
regime militar elege um novo inimigo: o PCB.
 Nesta mesma época o movimento estudantil volta a reagir em
função da morte do estudante Alexandre Vanucchi Leme, além
da atuação da Igreja Católica contrária ao regime.
 Como explicar a tortura? Descontrole do aparato repressivo?
Utilização de indivíduos sádicos ou psicopatas? A tortura é um
sistema e é este que faz a tortura, não o torturador. Dentro do
sistema o torturador se torna apenas um funcionário público.

 Dessa forma, a repressão brasileira combinava repressão


militar e instrumentos jurídicos para culpabilizar tendo em vista a
Lei de Segurança Nacional.

 Era um sistema complexo, com uma série de etapas para


aqueles que eram presos: Prisão (muitas vezes sequestros),
equipes diferentes capturavam e interrogavam, interrogatórios
monitorados e gravados, a prisão poderia durar 30 dias e, caso
sobrevivesse, o preso era entregue a autoridade policial para
abertura de inquérito e abertura de processo pela justiça militar.
 Esse ritual sempre se cumpria? Necessidade de mais
informações e documentos.

 No fim das contas tira-se duas questões: A repressão no Brasil


foi branda? Pra quê se torturava?

 Extrair informações?

 Prisão/Exílio/Derrota/Morte heroica vs Tortura (dor física e


desagregação mental).

 Historicamente a tortura nunca ganhou guerras: Argélia,


Vietnã, Alemanha Nazista. No caso do Brasil: derrocada em
função da reduzida base social (juventude intelectualizada da
classe média, camponeses e operários) da guerrilha.
 A eficácia da tortura e a construção de um imaginário do medo.

 O medo pode ter desarticulado a adesão de novos quadros


para a guerrilha – Argumento duvidoso.

 O desaparecido político e o ciclo incompleto da memória.

 Revisionismo contemporâneo:
- Sistema de tortura = Contraface da violência guerrilheira. A
tortura vs revolução socialista.
- Repressão insignificante em termos quantitativos

 Reflexos na contemporaneidade: Potencialização da violência


policial como forma de controle social/militarização da segurança
pública.
 A repressão a guerrilha criou uma nova cultura policial. Uma
cultura baseada na autonomia e impunidade dos agentes,
baseada no desrespeito aos direitos humanos.

 O bandido se torna o novo inimigo. É necessário ser


identificado e eliminado.

 A ausência de direitos civis e a explosão demográfica da cidade


possibilita o surgimento de vários territórios do crime e essa
política herdada do regime militar vai se mostrar incapaz de
resolver o problema, desgastando a imagem da polícia.

 Surgimento de uma cultura anti-direitos humanos e de


impunidade.
 “O trauma e a herança da repressão, portanto, ainda que restrito
quantitativamente, foi mais amplo e determinante do que se pensa
para a história recente do Brasil.” (NAPOLITANO, 2014, p.132)
REFERÊNCIA

NAPOLITANO, Marcos. 1964: História do Regime Militar Brasileiro.


São Paulo: Contexto, 2014.
Muito Obrigado!

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