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Existia racismo na

“Grécia Antiga”?
Marcus Pierre de Carvalho Baptista
Andrômeda Quem era
Andrômedra?
Andrômeda era uma princesa da
Etiópia, oferecida como sacrifício a
um monstro marinho para acalmar a
fúria de Poseidon. Foi salva por
Perseu que a tomou como esposa.

Uma breve reflexão


Como os gregos viam os etíopes?
Heródoto - As pessoas mais belas do mundo
Homero - Zeus e os demais deuses
alegravam-se com os etíopes
Na narrativa homérica a pele escura era
elemento de distinção e superioridade
A pele branca, por sua vez, aspecto
associado ao feminino e à fraqueza
O caso de Mêmnon e a guerra de Troia -
Aethiopis
As mulheres na
“Grécia Antiga”
Marcus Pierre de Carvalho Baptista
e v a m o s d e b a te r ?
O q u récia”?
ulher vivia na “G
Como a m

apenas um recorte?
Ou
is c uss ã o é re le v a nte ?
Por qu e e st a d

m o s e sta b e le ce r um a
Como pod e
o p a ss a d o /p re s e nt e ?
rela çã
A mulher ateniense
Desprovidas de direitos políticos ou
jurídicos
Viviam de modo submisso no tecido social
no contexto em questão
A mulher casada destinava boa parte do
seu tempo ao ambiente doméstico
Mesmo as solteiras não tinham liberdade
para sair sozinhas e viviam reclusas na
própria casa
O que dizia Aristóteles?
Inferioridade Graça Natural
Percebida a partir da Deviam, sempre que
não plenitude de uma possível, permanecer
suposta racionalidade em silêncio

Silenciamento Exclusão
O que significava Seu silenciamento
silenciar a mulher signifiicava sua
neste contexto? exclusão da
cidadania
O que dizia Aristóteles?
“Isto nos leva imediatamente de volta à natureza da alma: nesta,
há por natureza uma parte que comanda e uma parte que é
comandada, às quais atribuímos qualidades diferentes, ou seja,
a qualidade do racional e a do irracional. (...) o mesmo princípio
se aplica aos outros casos de comandante e comandado. Logo,
há por natureza várias classes de comandantes e comandados,
pois de maneiras diferentes o homem livre comanda o escravo, o
macho comanda a fêmea e o homem comanda a criança. Todos
possuem as diferentes partes da alma, mas possuem-nas
diferentemente, pois o escravo não possui de forma alguma a
faculdade de deliberar, enquanto a mulher a possui, mas sem
autoridade plena, e a criança a tem, posto que ainda em
formação. (...) Devemos então dizer que todas aquelas pessoas
tem suas qualidades próprias, como o poeta (Sófocles, Ájax,
vv.405-408) disse das mulheres: ‘O silêncio dá graça as
mulheres’, embora isto em nada se aplique ao homem”
(Aristóteles, Política, I, 1260 a-b, pp. 32 e 33).
O que dizia Aristóteles?
Ausência Decisão
Ainda que pudesse
O que faltaria para deliberar faltaria a
a mulher? mulher na perspectiva
aristotélica a
capacidade de
decidir
Fraqueza Alma e Corpo
A mulher aparece Pertencimento ao
não apenas em gênero humano com
uma dimensão todas as partes da
fisiológica, mas alma presentes, mas
ética e metafísica estas de modo
distintos
Aristóteles Aristófanes O que esta
(384 a.C. - 322 (447 a.C. - 385 obra
a.C.) a.C.) significava?
Sua perspectiva A Assembleia de De que modo esta
representaria o mulheres e a obra permite que
social ou um olhar participação discutamos sobre
particular? feminina na vida esta questão?
pública

Outros olhares?
Como podemos interpretar esta obra?

Inusitado Comédia?
A participação
feminina na vida Ainda que não fosse
pública seria algo algo impossível seria
improvável, mas não algo risível
impossível
Uma nova Cidadania?
pólis? As mulheres não
A pólis neste contexto podiam e nem
já via de forma mais reivindicavam o
positiva o papel da direito de participar
mulher enquanto mulheres da
assembleia citadina
Significava dizer que a mulher
continuou excluída do espaço público?
Outros modos de integração
Divulgava informações em outros grupos sociais
no restante da Pólis

Como isso ocorria?


Em momentos de atividades coletivas como na
colheita de frutos, visita a vizinhas, ida a fontes
públicas etc.

Por que era importante?


Não apenas garantia a transmissão de
informações, mas que se mantivessem informadas
sobre os acontecimentos da pólis
Seria possível
considerar uma
participação
indireta da mulher
na política neste
contexto? De que
modo?
c a s o d e E s p a r ta ?
E o feminina?
a condição
Como era

Igual a ateniense?

Ou havia diferenças?

od emo s pensar estas


Como p
questões?
O que dizia Aristóteles?
"(...) da mesma forma que o homem e a mulher são parte da família,
é óbvio que a cidade também é dividida em uma metade de
população masculina e outra metade de população feminina, de tal
forma que em todas as constituições nas quais a posição das
mulheres é mal ordenada se pode considerar que metade da cidade
não tem leis. Foi isto que aconteceu na Lacedemônia, pois o
legislador, querendo que toda a comunidade fosse igualmente
belicosa, atingiu claramente o seu objetivo com relação aos
homens, mas falhou quanto às mulheres que vivem
licenciosamente,entregues a todas as formas de depravação e da
maneira mais luxuriosa. Disto resulta inevitavelmente que numa
cidade assim estruturada a riqueza é excessivamente apreciada,
especialmente se os homens se deixam governar pelas mulheres (...)
Existia tal característica entre os Lacedemônios, e no período de sua
hegemonia muitos assuntos eram decididos pelas mulheres (...) as
mulheres se tornaram possuidoras de cerca de dois quintos de todo
o território da Lacedemônia, por causa do grande número delas que
herda propriedades e da prática de dar grandes dotes (...) o mau
comportamento da mulher não somente infunde um ar de
licenciosidade à própria constituição, mas também tende de certo
modo a estimular o amor à riqueza” (Aristóteles, Política, VI, 1270 a-
b, pp. 60-61).
O que dizia Aristóteles?
Liberdade Falhas
Teriam as espartanas As mulheres eram vistas
uma liberdade maior como ameaças à cidade
que as atenienses? espartana

Direito à terra Diferenças?


Possibilidade de Seriam elas mais
viúvas casarem relevantes socialmente,
novamente e levarem considerando sua
consigo os lotes de participação na vida
terra pública, como no
treinamento militar?
O caso espartano
Tinham sua utilidade ainda
mais reduzido na pólis.
Enquanto as atenienses
aprendiam os afazeres
domésticos, por vezes a ler,
realizar cálculos e a prática
da música, no caso das
espartanas o treinamento só
existia considerando a
função da mulher de
reproduzir. Mulheres e
homens fortes neste sentido
gerariam homens fortes.
c a s o d e E s p a r ta ?
E o c e rta idade
A criança a pa rtir d e
pertencia a o E st a d o

im pe d id a d e c ria r o s
Mulher
filhos

je t ivo era forta le ce r a


O ob
nid ade de g ue rre iro s
com u
E o casamento?
O homem Contrato?
Escolhia o marido e O matrimônio era como
tomava as decisões um contrato. Entregava-
consideradas se a mulher em troca de
necessárias um penhor

O dote Função Social


O dote podia
significar a diferença Reprodução e
entra um casamento transmissão da
legítimo ou a prática cidadania..
do concubinato
E o casamento?
Ruptura Ruptura e lei
A ruptura era possível se Tribunais podiam decidir
houvesse casos de sobre a ruptura.
infidelidade conjugal ou Dependendo dos motivos o
esterilidade marido poderia conservar ou
não o dote

O esperado Alterações?
Às mulheres casados o
esperado era que se Modificações a partir do
focassem século IV a.C. Exemplo da
exclusivamente ao ida a casa de vizinhas para
ambiente doméstico, empréstimo de objetos ou
esquivando-se de diálogos
interesse da vida pública
O que gerou
estas alterações
paulatinas na
participação da
mulher ateniense
no tecido social
da pólis?
u e s t ã o d o a m o r
Aq o o amor?
Como era p er ce bid

relações a m oro sa s?
Existiam

Ou havia diferenças?

od emo s pensar estas


Como p
questões?
O amor
Possibilidade O casamento
Relações entre iguais
eivadas de amor. Não necessariamente
Deveriam cessar a partir deveria estar presente
do aparecimento de nestas relações, ainda que
pêlos. pudesse ocorrer entre os
desiguais.

Concubinato Cortesãs
Em alguns casos possuíam
Podiam ser escravas, educação superior às
estrangeiras ou mulheres casadas, mas
atenienses. Havia viviam à margem da
também a possibilidade sociedad. Em certos casos a
de amor nestas relações prostituição feminina era
e reconhecimento legal. sacralizada.
O que podemos concluir?
Afinal, seria possível estabelecer uma
relação passado/presente no tocante a
estas questões?
Tratar-se-ia de uma condição social
que generalizava-se por todo território
grego ou aspectos espacialmente e
historicamente localizados?
Por fim, a partir de quais documentos
discutimos estas questões e por que é
importante problematizá-los?
As mulheres na
Magna-Grécia
Marcus Pierre de Carvalho Baptista
e v a m o s d e b a te r ?
O q u recorte?
o a m u lh e r vi via ne ste
Co m
ç a s p ar a a c o n d iç ã o
Ex is t ira m d if e r e n
r e m o u tr a s c id a d e s?
soc ia l da m u lh e
r id a d e ” o u t ra ta v a -s e
Havia u m a “ in f e rio
le it u ra p ro b l em á t ic a ?
de um a
is c u ss ã o é re le v a n t e ?
Po r q u e e sta d
A mulher na Magna-Grécia
Situação semelhante a das mulheres em
outras localidades
Relevância no tocante ao casamento e à
fertilidade
Número significativo de vasos entre os
séculos V a.C. e IV a.C.
Por que estes registros foram produzidos?
O que significam e o que podemos inferir
a partir deles?
Semelhanças e Diferenças?
Comparação Regiões
Qual a importância Vasos de diferentes
da análise regiões permitem
comparativa? leituras singulares
sobre o papel da
mulher neste contexto

Papel social Poder


Importante pensar o Ao mesmo tempo que
casamento a partir marca a violência
simbólica contra
das múltiplas relações mulher tratava-se dea
de poder um modo de exercer
poder e influência
Am u l h e r
m c o nd iç ã o in fer ior ?
e d e a l g u é m e
Tratava-s
p o si ç ão s ec un dá ria?
e ría m o s fa la r d e u m a
Ou p od
e n to s co n st ru ía m e st a
Quais docu m
se n t a ç ã o d a m ulh e r ?
rep re
ju d a m a re fl e tir s ob re
Como nos a
est e co n te x to ?
O discurso masculino
Qual era o seu objetivo?

Naturalizar as desigualdades sociais e de


gênero
Legitimar a divisão sexual e social
existente no contexto
Mitigar uma suposta participação social
da mulher em outros cenários sociais, a
exemplo da política
A divisão entre os sexos parece estar na
“ordem das coisas”, como se diz por vezes
para falar do que é normal, natural, a ponto
de ser inevitável: ela está presente, ao
mesmo tempo, em estado objetivado nas
coisas (na casa, por exemplo, cujas partes
são todas “sexuadas”), em todo mundo social
e, em estado incorporado, nos corpos e nos
habitus dos agentes, funcionando como
sistemas de esquemas de percepção, de
pensamento e de ação

Pierre Bourdieu
Por que é importante entender o
que é o gênero?
“Grécia Antiga”?
Permite a compreensão da condição social
da mulher nesta sociedade
Diferenças Sexuais
Entender como estas distinções são
produzidas no âmbito da cultura e do poder
simbólico auxilia na compreensão desta
conjuntura
As representações
Perceber como estas representações são
socialmente construídas também fomenta a
apreensão destas relações de “dominação”
O casamento sobre outra ótica
Qual era o sentido na Magna Grécia?
Sentido político? Patrimonial?
Dominação?
Qual a mulher ideal representada neste
momento?
A importância do casamento:
reprodução, ritos fúnebres e civismo
Por que, apesar de sua relevância, tratou-
se de um momento apropriado pelo
universo masculino?
sa m en to en qu an to
O ca ia sim bó lic a
violênc
o a m ulh e r s e to rn a
Quand
m si m b ó lic o ne st a
um be
a de , p e rm itin d o s u a
socied
do m in a ç ã o ?
O casamento e seu duplo significado
Instrumento para disciplinarização e
dominação dos corpos femininos
Momento que a mulher poderia, até certo
ponto, projetar-se socialmente
O poder de garantir a cidadania dos
filhos não seria um modo de resistência à
dominação simbólica?
A transmissão do poder masculino
passava pelas mulheres. Por que essa
percepção é importante?
Os v a s o s n a M a gn a
Gr é c i a ?
erâmica
n c ia d os va s os d e c
A imp o rtâ
m é s tic a e c o m e rcial
Tinha m u t ilid a de d o
n ta ç õ e s e e s ta s , p or
Prod u z ia m re p r e s e
p o r e st e s te rr itó rio s
sua ve z , c ir c u la va m

re n c ia v a m n a M a g n a
Como se d if e
Grécia?
Os vários significados dos vasos magno-grecos

Presença maior de representações


relacionadas ao casamento
A mulher não aparece na condição de
submissa do homem
Ação central realizada pelas mulheres ou,
por vezes, estando lado a lado com um
homem
Seria uma representação fidedigna do
real? Ou permitem outros tipos de
análises?
As mulheres representadas nos
vasos magno-grecos
Quem eram essas mulheres?
Mulheres oriundas de outras pólis? Ou mulheres que
constituíram família com os helenos que ali se instalaram?
Uma tradução cultural?
Por que entender estas questões nos
ajudam a compreender as representações
socialmente presentes e construídas nesta
coultura material?
A importância do matrimônio
Por que era importante para os “gregos”
que ali se instalavam estabelecer laços
matrimoniais com as mulheres locais?
As mulheres representadas nos
vasos magno-grecos
O matrimônio e o poder
O poder legado ao matrimônio, isto é, o de legitimar a presença
destes sujeitos e estabelecer alianças políticas denota a
importância do papel da mulher neste contexto
A helenização
Outro aspecto pertinente quando se pensa nestes enlaces
refere-se a helenização deste território, a mulher tendo
papel fundamental nisto e na transmissão cívica
A identidade e o matrimônio
Seria possível que a importância dada a helenização da
região fornecesse uma explicação para o número de vasos
que tratavam sobre o casamento?
As linhas de fuga?
De que modo este papel social
permitiu a algumas mulheres
certo poder simbólico?
O que podemos
interpretar desta
quantidade de vasos?
Os vários significados dos vasos magno-grecos
Significaria um papel mais ativo na
procura de vasos e em sua escolha?
Haveria uma visão mais positiva sobre
elas? Ou a existência de um espaço que
permitisse uma maior liberdade social?
A figura feminina torna-se elemento
cívico fundante em algumas destas
cidades
Os helenos seriam aqueles nascidos
destas mulheres nativas; mitos de origem
conectando a fundação de algumas
destas cidades às mulheres
Existiram, então, mulheres
que também tiveram
certa atuação em
espaços públicos e na
política nestas cidades?
O caso de Damarete e o
tratado de paz entre
Siracusa e Cartago
As mulheres na Magna
Grécia eram percebidas
de modo mais positivo?
Encontravam-se em
posição social superior às
demais da “Grécia”? As
mulheres percebiam esta
diferença e dela se
beneficiavam?
Os r i t o s f ú n e b r e s
os
s m a s c u lin o s u ti liz ad
Presença d e o bje t o
po r m u l h e re s
s e ri a m e s te s o b je to s ?
Quais
d e a n im a is ou m e sm o
Arma s p ar a a b a te
a s o s p a ra se r vi r vin h o
v
p e l d ife re n c i a d o q u e
Denota o pa
he re s a ss u m ia m a q u i
estas mul
O que podemos concluir?
Alterações mais perceptíveis em
momentos posteriores
Mulheres tendo propriedades, cuidando
dos próprios negócios
Ainda que permanecesse a figura do
guardião, este era meramente figurativo
Documentos, a exemplo de papiros
egípcios, permitem esta inferência neste
momento
O que podemos concluir?
Há continuidades e descontinuidades ao
considerarmos o contexto socio-cultural
No tocante às mulheres é notável uma maior
liberdade na Magna Grécia, ainda que,
geralmente, relacionada ao matrimônio
Pode-se citar o exemplo da prática de
esportes em detrimento às atenienses
Certos registros indicam que as mulheres
da Magna Grécia tinham significativa
influência na moda da época
O que podemos concluir?
Seria possível afirmar que também
influenciavam o comportamento feminino em
outras regiões gregas?
Isto pode ser considerado haja visto o
ornamento deste vestuário que ia em
desencontro com os padrões estabelecidos em
outras localidades
É possível indicar isso a partir das
representações presentes nos vasos
Nos séculos III e IV a.C. pode-se inferir uma
maior autonomia feminina na Magna Grécia
Para concluir
A dominação masculina permanecia
existindo na Magna Grécia. No entanto,
o interessante aqui é perceber as várias
táticas que as mulheres deste período
utilizaram para “escapar” a uma certa
disciplina imposta e como puderam
servir-se desta dominação.
O matrimônio, neste sentido, assume um
duplo significado. Permanece sendo um
dos modos de estabelecer e legitimar a
dominação masculina perante o corpo
feminino, mas também torna-se o meio
pelo qual essas mulheres podem
“subverter”, ainda que de forma
limitada, esta disciplina.
Referências
SANTOS, Sandra Ferreira dos. A mulher na Magna
Grécia: um “objeto” de valor. Revista Classica, Belo
Horizonte, v. 29, n. 1, p. 29-48, 2016.
TÔRRES, Moisés Romanazzi. Considerações sobre a
condição da mulher na Grécia Clássica (sécs. V e IV
a.C.). Mirabilia, Espanha, v. 1, n. 1, p. 48-55, 2001.

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