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PROJETAR EM MADEIRA:
UMA NOVA ABORDAGEM
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO:
TECNOLOGIA
ORIENTADOR:
ORIENTADOR:
PROF. DR. PAULO CASTILHO LIMA
BRASÍLIA
JULHO DE 2007
ROBERTO LECOMTE DE MELLO
PROJETAR EM MADEIRA:
UMA NOVA ABORDAGEM
BANCA EXAMINADORA
2
AGRADECIMENTOS
3
RESUMO
4
ABSTRACT
5
SUMÁRIO
AGRADECIMENTOS
RESUMO
ABSTRACT
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE QUADROS
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CAPÍTULO I
1. INTRODUÇÃO --------------------------------------------------------------------------------------------------
-------------------------------------------------------------------------------------------------- 19
CAPÍTULO II
2. A MADEIRA COMO MATERIAL DE CONSTRUÇÃO ------------------------------------------------- 25
2.1. USO MÚLTIPLO E SUBUTILIZAÇÃO NA CONSTRUÇÃO CIVIL -------------------------------
------------------------------- 25
2.1.1. A QUESTÃO DA NORMATIZAÇÃO ------------------------------------------------------------------ 28
2.1.2. A QUESTÃO CULTURAL E A FALTA DE QUALIFICAÇÃO ----------------------------------- 29
2.2. OS MITOS DA FALTA DE DURABILIDADE E DO COMPORTAMENTO AO FOGO ------ 31
2.3. UM MATERIAL COM CARACTERÍSTICAS ÚNICAS ---------------------------------------------- 36
2.4. PRODUTOS DA MADEIRA PARA A CONSTRUÇÃO --------------------------------------------- 39
2.4.1. MADEIRA ROLIÇA E MADEIRA SERRADA
SERRADA ------------------------------------------------------- 40
2.4.2. MADEIRA EM LÂMINAS -------------------------------------------------------------------------------- 43
2.4.3. COMPOSTOS DE MADEIRA ------------------------------------------------------
--------------------------------------------------------------------------
-------------------- 44
6
CAPÍTULO III
3. AS PROPRIEDADES DA MADEIRA ---------------------------------------------------------------------- 65
3.1. CARACTERIZAÇÃO TECNOLÓGICA DA MADEIRA ---------------------------------------------- 65
3.1.1. PROPRIEDADES FÍSICAS
FÍSICAS ----------------------------------------------------------------------------- 67
3.1.1.1. CARACTERES GERAIS ------------------------------------------------------------------------------ 68
3.1.1.2. TEOR DE UMIDADE -----------------------------------------------------------------------------------
----------------------------------------------------------------------------------- 71
3.1.1.3. DENSIDADE --------------------------------------------------------------------------------------------- 73
3.1.1.4. ESTABILIDADE DIMENSIONAL --------------------------------------------------------------------
-------------------------------------------------------------------- 74
3.1.1.5. COMPORTAMENTO TÉRMICO -------------------------------------------------------------------- 75
3.1.1.6. COMPORTAMENTO ACÚSTICO ------------------------------------------------------------------ 77
3.1.1.7. CONDUTIBILIDADE ELÉTRICA
ELÉTRICA -------------------------------------------------------------------- 78
3.1.2. PROPRIEDADES MECÂNICAS ----------------------------------------------------------------------- 78
3.1.2.1. COMPORTAMENTO DA MADEIRA À COMPRESSÃO --------------------------------------
-------------------------------------- 80
3.1.2.2. COMPORTAMENTO DA MADEIRA À TRAÇÃO ----------------------------------------------- 81
3.1.2.3. COMPORTAMENTO DA MADEIRA AO CISALHAMENTO ---------------------------------- 82
3.1.2.4. COMPORTAMENTO DA MADEIRA À FLEXÃO ------------------------------------------------
------------------------------------------------ 83
3.1.2.5. COMPORTAMENTOS À TORÇÃO, DUREZA, FENDILHAMENTO E RESISTÊNCIA
AO IMPACTO ------------------------------------------------------------------------------------------ 84
3.1.3. FATORES QUE AFETAM A RESISTÊNCIA DA MADEIRA
MADEIRA ------------------------------------ 85
3.2. A MADEIRA E A SUSTENTABILIDADE DOS MATERIAIS --------------------------------------- 87
CAPÍTULO IV
4. OS SISTEMAS CONSTRUTIVOS EM MADEIRA ------------------------------------------------------ 92
4.1. AS TÉCNICAS
TÉCNICAS TRADICIONAIS -------------------------------------------------------------------------- 92
4.1.1. AS CONSTRUÇÕES DE MADEIRA MACIÇA EMPILHADA------------------------------------
EMPILHADA------------------------------------ 93
7
4.1.2. AS CONSTRUÇÕES COM ENTRAMADO ESTRUTURAL -------------------------------------
------------------------------------- 96
4.2. AS TÉCNICAS CONTEMPORÂNEAS ----------------------------------------------------------------- 99
4.2.1. O SISTEMA POSTE-
POSTE-VIGA OU PILAR-
PILAR-VIGA ------------------------------------------------------102
------------------------------------------------------102
4.2.2. OS ENTRAMADOS MODERNOS: SISTEMAS
SISTEMAS BALLOON E PLATTFORM ------------- 104
NORTE--AMERICANA ---------- 107
4.2.2.1. CONSIDERAÇÕES SOBRE A CASA DE MADEIRA NORTE
4.2.3. AS CONSTRUÇÕES EM PAINÉIS INDUSTRIALIZADOS DE MADEIRA ---------------- 111
4.2.4. AS SOLUÇÕES ESTRUTURAIS DE COBERTURAS E HALLS ---------------------------- 114
4.2.5. AS CIDADES DE MADEIRA (WOODEN
(WOODEN TOWNS)
TOWNS) --------------------------------------------- 132
4.3. TÉCNICAS CONSTRUTIVAS EM MADEIRA NO BRASIL -------------------------------------- 139
CAPÍTULO V
5. O PROJETO DE ARQUITETURA EM MADEIRA ---------------------------------------------------- 149
5.1. CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROJETO DE ARQUITETURA ------------------------------- 149
5.2. ESPECIFICIDADES DO PROJETO EM MADEIRA ----------------------------------------------- 151
5.3. SOBRE
SOBRE A INTERAÇÃO ENTRE ARQUITETURA E ESTRUTURA --------------------------- 157
5.4. ESTUDO COMPARATIVO ENTRE DUAS EDIFICAÇÕES DE MADEIRA ------------------ 163
8
LISTA DE FIGURAS
9
Figura 17 – Revestimentos de fachadas em residência no Japão e em galeria
comercial em Londres utilizando chapas de cimento-madeira---------------------------------- 53
10
Figura 34 – Produtos de madeira-plástico-------------------------------------------------------------- 64
Figura 37 – Exemplos de grã direita e grã irregular (no caso, espiralada) ---------------- 69
Figura 45 – A solicitação por tração pode se dar nas direções paralela e perpendicular
às fibras da madeira -------------------------------------------------------------------------------------------- 81
11
Figura 52 – Seqüência de fabricação de habitação pelo sistema “lafte” ------------------- 94
Figura 53 – Tipos de encaixes de peças nos cantos (corner style) utilizados nas log
homes norte-americanas-------------------------------------------------------------------------------------- 95
Figura 66 – Transporte com embalagem e entrega da mobile home nos EUA--------- 106
12
Figura 73 – Execução, obra acabada e detalhe construtivo de habitação com solução
construtiva em vigas biapoiadas-------------------------------------------------------------------------- 115
Figura 80 – Ponte estruturada em treliça plana de madeira com vão central de 54m e
comprimento total de 108m, nos Alpes suíços------------------------------------------------------ 119
Figura 85 – Ponte para pedestre com estrutura em arcos de madeira laminada colada
na Suíça------------------------------------------------------------------------------------------------------------ 122
Figura 87 – Pontes em arco (acima) e arco treliçado (abaixo) executadas com peças
de madeira maciça, em Goiânia (GO) e Brasília (DF) ------------------------------------------- 123
13
Figura 90 – Grelhas em atelier de carpintaria na França e como apoio de caixa d’água
em escritório do IBAMA em Santa Catarina---------------------------------------------------------- 124
Figura 96 – Casca de cobertura de uma piscina, que se apóia sobre três pontos no
solo, com vãos de 58m entre os pontos, na França----------------------------------------------- 127
Figura 99 – Seqüência de fabricação de casa com cúpula geodésica nos EUA, com
execução de embasamento em concreto armado, armação em montantes de madeira,
enrijecimento com chapas de compensado, execução de complementos, com vista
interna mostrando mezanino, e a obra acabada---------------------------------------------------- 128
14
Figura 106 – Cidade de madeira do final do século 18 no Estado de
Washington, EUA----------------------------------------------------------------------------------------------- 132
Figura 108 – A Cidade Livre, hoje Núcleo Bandeirante, era totalmente construída em
madeira, que foi substituída por alvenaria------------------------------------------------------------- 134
Figura 113 – Vistas de ruas internas nas cidades de madeira de Oulu e Tuusula,
Finlândia------------------------------------------------------------------------------------------------------------ 137
Figura 115 – Cidade de Friisla, Finlândia, com habitações térreas em madeira------- 138
Figura 117 – Casa bandeirista de meados do século 17 na cidade de São Paulo, num
sistema misto alvenaria - madeira------------------------------------------------------------------------ 140
Figura 118 – Igreja Matriz de Pirenópolis (GO), onde se observa a gaiola com madeira
de alta durabilidade (aroeira), que permitiu a sua reutilização estrutural em suas
restaurações------------------------------------------------------------------------------------------------------ 141
Figura 119– Projetos de Lúcio Costa da década de 1930, onde se observa a gaiola de
madeira (figura no alto), a concepção neocolonial de alvenaria e madeira (foto), e a
concepção moderna da gaiola de madeira inserida na estrutura de
15
concreto armado------------------------------------------------------------------------------------------------ 142
Figura 122 – Edificações em tábua e sarrafo em área rural no sul do Pará e na cidade
de Florianópolis, em Santa Catarina-------------------------------------------------------------------- 144
Figura 123 – Casas de madeira com paredes em peças maciças com encaixe do tipo
macho-e-fêmea-------------------------------------------------------------------------------------------------- 145
Figura 124 – Detalhe de sistema construtivo com parede dupla em peça maciça de
madeira------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 145
Figura 128 – Coberturas de teatro em Santa Catarina com madeira laminada colada e
de hangar no Paraná com arcos treliçados de madeira------------------------------------------148
Figura 130 – Vistas interna e externa do Clube Naval de Brasília, onde a estrutura de
madeira define espaços, confere imponência e contribui para integrar a obra
arquitetônica à paisagem do lago------------------------------------------------------------------------ 162
16
Figura 132 – Vistas externas do CENAFLOR, com as “caixas” de alvenaria e madeira
apoiadas sobre a estrutura de madeira roliça-------------------------------------------------------- 165
17
LISTA DE TABELAS
18
ABREVIATURAS E SIGLAS
19
CAPÍTULO I
1. Introdução
20
brasileiros, mas os latinos de forma geral, acham que a madeira deve ser
empregada apenas em detalhes da construção, como as esquadrias”.
Desta forma, o problema aqui abordado diz respeito ao fato de que o
tema do projeto e construção em madeira ainda é ignorado no Brasil, país onde
a vocação florestal manifesta-se inclusive no seu nome, que tem origem em
uma espécie madeireira outrora abundante em nossa região. Fatores diversos
contribuíram para a inexistência de uma cultura “madeireira”, sendo o uso do
material cercado por desinformação e preconceito, chegando a ponto de,
mesmo sendo o único material renovável dos canteiros de obras, seu uso ser
considerado “antiecológico”. CARUANA (citado por BORGES, 2002) aponta a
responsabilidade dos lobbies do concreto e do metal, hoje nas mãos de poucos
fabricantes, de forma que as normas técnicas e os programas universitários
foram feitos sob a orientação e a serviço das indústrias do cimento e das
siderúrgicas, consideradas há várias décadas indústrias estratégicas para o
crescimento econômico do Brasil.
No entanto, é inegável a constatação de que uma grande parcela da
população brasileira vive em edificações de madeira. Segundo BITTENCOURT
(1988), cidades como Presidente Prudente, no oeste do Estado de São Paulo,
possuíam em 1986 cerca de 32% de suas edificações urbanas construídas
predominantemente em madeira, sendo 26% exclusivamente de madeira.
Estima-se que estas porcentagens devam ser maiores em cidades do sul do
país e também da região Norte.
Cabe, portanto contribuir para reverter a imagem negativa das
construções em madeira no país, indo além de apregoar algumas vantagens
inerentes ao material como sua trabalhabilidade, excelente relação entre peso
e resistência mecânica, baixo consumo energético em seu beneficiamento,
reaproveitamento e renovabilidade.
A difusão do material e suas qualidades para a construção civil passam
pela formação dos profissionais envolvidos no processo de produção da
edificação em madeira, desde arquitetos e projetistas até os profissionais dos
canteiros de obras. No entanto o ponto de partida está na concepção e
21
elaboração do projeto arquitetônico, que será o responsável por desencadear
todo o processo que culminará com a obra pronta.
A literatura técnica nacional oferece informações variadas sobre o
material, desde as características físicas e mecânicas até os procedimentos de
secagem e preservação, mas raramente se refere à concepção do projeto em
madeira, item essencial para promover a sua familiarização entre os
profissionais projetistas e difundir o seu uso racional e sustentável na
construção civil. Segundo BITTENCOURT (1995), praticamente inexistem
pesquisas teóricas sobre a concepção da arquitetura em madeira, e as
experiências relatadas atendem a critérios específicos e soluções localizadas,
que não abordam o contexto deste tema.
O aspecto aqui apresentado é o do projeto de arquitetura em madeira,
abordando as dificuldades com que se depara o projetista ao experimentar o
uso do material em seu trabalho, e tentando identificar procedimentos que
contribuam para facilitar e enriquecer esta experiência. Para tanto, alguns
questionamentos relativos ao tema serão analisados:
1) Quais são as principais características do material madeira e
sua aplicabilidade para a construção civil?
2) Quais são os parâmetros para identificar a madeira como um
material “antiecológico” ou não?
3) Quais são os sistemas construtivos em madeira utilizados no
Brasil e no exterior?
4) A concepção dos sistemas construtivos em madeira exige
metodologia específica?
5) Como se aplica a relação entre arquitetura e estrutura nas
obras em madeira e qual a sua contribuição para a concepção
arquitetônica?
Este trabalho pretende contribuir para um aprofundamento no tema da
concepção arquitetônica em madeira, de forma que possa ser familiarizado
pelos profissionais da área de projeto. Baseado nas considerações
mencionadas, a hipótese deste trabalho está expressa na seguinte questão:
22
“A prática do projeto em madeira, diferentemente dos sistemas
convencionais em alvenaria e concreto, exige procedimentos específicos que
se refletem na execução da edificação, e a relação entre a concepção
arquitetônica e estrutural tem um papel decisivo na consolidação desta prática”.
Os procedimentos metodológicos norteadores do trabalho serão:
23
possibilidades tecnológicas a partir dos diversos produtos derivados
disponíveis no mercado nacional e internacional.
O capítulo III expõe as propriedades físicas e mecânicas da madeira,
como um recurso de origem biológica que demanda procedimentos específicos
para o aproveitamento de suas potencialidades como material estrutural e
construtivo. Complementando o capítulo, é feita uma abordagem sobre
aspectos da sustentabilidade do seu uso, englobando o impacto sobre o meio
ambiente do seu processo de extração, beneficiamento e utilização na
construção civil.
Trata-se de uma abordagem de extrema relevância no atual contexto de
transformações ambientais em que vivemos, e onde, ao contrário do que se
supõe, a madeira possui um desempenho excepcional que a coloca como um
dos materiais de construção ambientalmente mais corretos. Este tema adquire
um peso maior quando aplicado à realidade brasileira, onde o rótulo de
construção “antiecológica” imposto à madeira não condiz com o que demonstra
todo o conhecimento produzido sobre o assunto, e apenas reflete uma
conjuntura de descontrole sobre o uso dos recursos naturais do país.
No capítulo IV estão descritos os variados sistemas construtivos em
madeira utilizados no Hemisfério Norte e no Brasil, onde se percebe as
diversas possibilidades construtivas com o material, sendo muitas delas ainda
desconhecidas em nossa área da construção.
O capítulo V discorre sobre o questionamento básico desta dissertação,
a concepção arquitetônica da obra em madeira como ponto de partida para a
familiarização dos profissionais com o material e o conseqüente estímulo ao
seu uso. A partir do reconhecimento de que esta concepção possui
especificidades, são descritos quatro princípios básicos para se conceber e
executar a obra em madeira, que são a dissociação entre estrutura e vedações,
flexibilidade e evolutividade das técnicas construtivas, a questão do rigor da
execução e a importância do detalhamento na obra em madeira.
Complementando esta abordagem, é analisada a relação entre a
concepção arquitetônica e estrutural e suas implicações na obra em madeira.
Sua importância decorre da observação de que na obra em madeira a
24
concepção da estrutura possui grande impacto e resulta em uma interferência
significativa sobre a proposta arquitetônica, merecendo uma consideração e
interpretação ainda nos primeiros momentos de elaboração do projeto.
Ao final, é apresentado um estudo comparativo entre duas edificações em
madeira, procurando-se identificar e avaliar o atendimento aos princípios
preconizados para a concepção e execução da obra em madeira, a serem
descritos.
O estudo não faz juízo subjetivo de ordem estética dos edifícios, estando
concentrado na análise técnica de aspectos como a dissociação entre estrutura
e vedações, flexibilidade e evolutividade das técnicas construtivas empregadas,
a questão do rigor da execução e a importância do detalhamento na obra em
madeira. Busca-se assim avaliar o resultado da aplicação destes princípios
para o conjunto das obras, sinalizando para a possibilidade de
desenvolvimento tecnológico e construtivo das edificações em madeira no
Brasil com a adoção destas diretrizes no projeto de arquitetura.
25
CAPÍTULO II
26
O seu emprego como principal elemento estrutural e construtivo da
edificação ainda representa uma pequena parcela nos canteiros de obras em
nosso país. De acordo com o IPT (2003), o uso em estruturas de cobertura, ou
seja, na forma de madeira serrada, representando um baixo valor agregado,
corresponde à maior parte da madeira consumida no Estado de São Paulo, que
é o maior consumidor do material proveniente da Amazônia. De acordo com a
Tabela 1, o uso da madeira em casas pré-fabricadas é bastante restrito,
retratando a desvalorização do material para usos nobres.
Concorre para esta situação a baixa qualidade das obras em madeira, que
estão concentradas em edificações residenciais de baixo e de alto custo, com
pouca aplicação em edificações não-residenciais. Resulta daí que a maioria
destas edificações é de propriedade de particulares, o que também impede que
possam ser observadas e assimiladas pelo público.
27
A imagem da casa de madeira no Brasil está muito associada a uma
moradia provisória e de baixa durabilidade. A constatação de que uma grande
parcela da população brasileira está abrigada em casas de madeira não
significa que estas atendam aos requisitos de qualidade necessários; muito
provavelmente estas moradias não estarão atendendo às exigências dos
usuários e sim contribuindo para reforçar a imagem extremamente negativa da
utilização da madeira na construção civil brasileira.
A conseqüência mais nefasta do desprezo pela madeira como material
construtivo é a desconsideração da sua imensa disponibilidade na Região
Amazônica, que seria capaz de zerar o déficit habitacional brasileiro, estimado
em cerca de sete milhões de moradias.
Tomando-se como exemplo o projeto de habitação popular do LPF/IBAMA,
ilustrado na Figura 1, com consumo aproximado de quinze metros cúbicos de
madeira incluindo as perdas devidas ao rendimento na serraria, e considerando
uma estimativa de estoque na floresta amazônica que gira em torno de 40
bilhões de metros cúbicos, chega-se a incrível porcentagem de 0,3% deste
total para oferecer moradia para todos os brasileiros que não a possuem.
28
Esta idéia foi sendo formada ao longo do tempo porque as indústrias do
aço e do concreto, que sempre foram em menor número e de maior
porte que as indústrias de madeira tiveram um grande investimento em
pesquisas, com seus resultados sendo rapidamente divulgados e
acompanhados pelas normas de cálculo, propiciando a elaboração de
projetos com alto grau de qualidade técnica (Calil, 1999 p.1).
Um dos aspectos que mais contribuem para este atraso tecnológico dos
setores de produção e comércio de madeiras, que se reflete nos canteiros de
obras, é a desconsideração das normas técnicas existentes principalmente no
contexto do mercado interno, pois a madeira destinada à exportação tem de se
adequar às exigências técnicas dos compradores provenientes em sua maioria
dos países desenvolvidos.
29
obras, representando uma grande desvantagem em relação aos outros
materiais da construção e motivo de queixas do setor da construção civil.
Decorre daí que, em virtude da grande variabilidade especialmente de
madeiras tropicais, que são identificadas pelos nomes vulgares, espécies com
características físicas semelhantes como cor e densidade, mas com
propriedades mecânicas e de durabilidade natural distintas, sejam
comercializadas como espécies semelhantes.
Segundo o IPT (2003), há processos de seleção de madeira tecnicamente
mais elaborados, como o utilizado na norma NBR 7190 “Projeto de Estruturas
de Madeira” da ABNT, onde foram estabelecidas três classes de resistência –
C 20, C 25 e C 30 – para as madeiras de coníferas (pinus e pinho-do-Paraná,
por exemplo), e quatro classes – C 20, C 30, C 40 e C 60 – para as madeiras
de dicotiledôneas (ipê, jatobá, maçaranduba, etc).
Esta classificação foi estabelecida a partir das propriedades físicas e
mecânicas das espécies, e elimina a necessidade de se especificar a espécie,
no entanto é desconsiderada e mesmo desconhecida pelo setor madeireiro.
30
superior para os profissionais da área de madeira no Brasil é caracterizada por
grandes lacunas, podendo-se concluir que os agentes desta área são
autodidatas ou formados pelas empresas.
(...) tem sido usual – mas não ideal – que as estruturas de madeira
sejam concebidas por oficiais carpinteiros, muitas vezes bem
intencionados, mas não preparados para esta tarefa. Outro exemplo é a
existência de inúmeras marcenarias que trabalham com equipamentos
ultrapassados e mão-de-obra pouco qualificada, prejudicando a
qualidade dos produtos finais. Os problemas daí decorrentes incentivam
a formação de uma mentalidade distorcida por parte dos usuários (Calil,
2003 p.6).
31
2.2. Os mitos da falta de durabilidade e do comportamento ao fogo
32
situação de maior exposição do material. Exemplos de diferentes soluções de
fixação do pilar, sendo engastado em bloco de concreto para madeiras de alta
durabilidade natural, e fixado em chapas metálicas afastadas do solo, para
madeiras de baixa durabilidade natural, estão ilustrados na Figura 2.
33
de gás tóxico), o pincelamento e pulverização, as imersões rápida e prolongada
em soluções preservativas, o banho quente-frio (imersão que utiliza o choque
térmico para a absorção do preservativo) e a substituição de seiva
(aproveitamento do efeito de capilaridade em madeiras recém cortadas para
penetração do preservativo).
34
Os métodos de pressão, considerados bem superiores aos métodos sem
pressão, possuem como desvantagens a necessidade de usinas de tratamento,
o transporte da madeira até as usinas e mão-de-obra especializada. São
normalmente classificados em processos de célula cheia e de célula vazia,
sendo esta diferença em função da distribuição do preservativo nas células da
madeira.
35
Uma peça de madeira exposta ao fogo torna-se um combustível para a
propagação das chamas, porém, após alguns minutos, uma camada
mais externa da madeira se carboniza tornando-se um isolante térmico,
que retém o calor, auxiliando, assim, na contenção do incêndio,
evitando que toda a peça seja destruída (...) Outra característica
importante (...) é o fato de não apresentar distorção quando submetida a
altas temperaturas, tal como ocorre com o aço, dificultando assim a
ruína da estrutura (...) (Calil, 1999 p.12).
36
Quando os procedimentos de manutenção e preservação da edificação são
efetivados, aliados a conceitos de projeto que os fortalecem, o resultado é a
durabilidade da obra, independentemente do material construtivo utilizado.
Como exemplo da durabilidade do material cite-se a obra em madeira mais
antiga do mundo, o templo japonês Horyuji, datado do ano 607 d.C. e
patrimônio da humanidade tombado pela UNESCO, com mais 1.300 anos de
idade e ainda hoje se encontrando em bom estado de conservação (Figura 4).
37
A madeira é o único recurso natural renovável com propriedades
estruturais e um dos materiais mais resistentes por unidade de peso,
sendo fácil de trabalhar, resultando em grande diversidade de formas e
de seções. Por ser relativamente leve, implica em baixo custo de
transporte e montagem, e por ser biodegradável os resíduos podem ser
totalmente aproveitados (Melo, 2004 p.1).
TABELA 2 – Materiais
Materiais estruturais / dados comparativos.
MATERIAL A B C D E F G
Concreto 2,4 1.920 20 20.000 96 8 8.333
Aço 7,8 234.000 250 210.000 936 32 26.923
Madeira conífera 0,6 600 50 10.000 12 83 16.667
Madeira dicotiledônea 0,9 630 75 15.000 8 83 16.667
Fonte: Calil Jr. e Dias (1997).
38
A leveza do material resulta em baixos custos de transporte e montagem, o
que se torna bastante significativo em processos construtivos com base na pré-
fabricação. Basta se comparar, por exemplo, estes custos com os de um
sistema de pré-fabricação de pré-moldados de concreto. Segundo GOTZ et al.
(1983), os fatores que favorecem o emprego da madeira na construção são:
• É um material relativamente
relativamente leve
• É um material de grande trabalhabilidade
• Possui propriedades físicas vantajosas, com o isolamento térmico
• Existem inúmeros sistemas construtivos que podem ser executados
com elementos em madeira
• A construção em madeira permite formas muitas
muitas vezes difíceis e às
vezes impossíveis de serem executadas com outros materiais
Fonte: a partir de Gotz et al. (1983).
39
2.4. Produtos da madeira para a construção
Tapume
Forma
Escoramento
Fundação
Piso Estrutura X X X X
Assoalho (piso)
Veda-
Veda- Estrutura X X X X
ção Revest.interno
Revest.externo X X X
Portas Folha X X X
Batente
Janelas Folha X X X
Batente
forro
Cober-
Cober- Estrutura X X
tura Telhas X
40
2.4.1. Madeira roliça e madeira serrada
Figura 5 – Execução de uma log home e casa finalizada no Estado do Oregon, EUA.
Fonte: MELLO (2006).
41
Quanto à forma serrada originou-se da madeira “lavrada”, que era cortada
e entalhada com ferramentas manuais, até que as máquinas de corte (serras)
pudessem ser agregadas a este processo, gerando os produtos atuais.
Corte tangencial
Corte transversal
Corte radial
42
Os produtos de madeira oriundos das serrarias no Brasil possuem uma
grande diversidade, desde pranchas, pranchões, blocos, tábuas, caibros, vigas,
vigotas, sarrafos, pontaletes, ripas e outros. De acordo com a NBR 7203
(1982), os principais produtos das serrarias estão descritos na Tabela 4.
43
A madeira beneficiada é definida como um subproduto proveniente da
usinagem das peças serradas, num processo que agrega valor à estas peças.
De acordo com o IPT (2003), neste processo são utilizados equipamentos com
cabeças rotatórias providas de facas, fresas ou serras, que usinam a madeira
dando a espessura, largura e comprimento definitivos, em operações como
desengrosso, desempeno, destopamento, aplainamento, molduramento,
torneamento, e ainda recorte, furação, respigado e outros.
A Tabela 5 apresenta as dimensões dos principais produtos usinados, de
acordo com a NBR 7203 (1982).
44
sua espessura, sendo que pisos de 2,5 a 4,0mm são colados sobre superfícies
regularizadas, e pisos de 7mm de espessura são encaixados pelo sistema
macho-e-fêmea. A Figura 8 apresenta um detalhe do piso laminado de madeira
com sistema de encaixe.
45
Os produtos derivados dos compostos podem ser caracterizados como
chapas planas, vigas ou produtos moldados. A madeira sólida inicial é
desmanchada e reconstituída, por isso alguns autores os chamam de produtos
reconstituídos à base de madeira (SOUZA et al., 2002).
Os principais compostos de madeira disponíveis no mercado brasileiro até
o ano de 2002 ou em fase de desenvolvimento são:
46
Segundo o IPT (2003), os compensados surgiram no início do século como
um grande avanço, ao transformar toras em painéis de grandes dimensões.
A Figura 9 apresenta uma seqüência esquemática de elaboração do
compensado de pinus, do qual segundo a ABIMCI (2007), o Brasil é o maior
produtor mundial.
47
São encontrados no mercado como laminados (produzidos com lâminas de
madeira prensada), sarrafeados (com miolo formado por vários sarrafos de
madeira), e multisarrafeados (considerados os mais estáveis, com miolo de
lâminas prensadas e coladas na vertical). No entanto, muitos autores
consideram que apenas o compensado feito de lâminas pode assim ser
denominado, identificando-se os demais como contraplacados.
De fato, o princípio que caracteriza o compensado é o da sobreposição de
camadas de lâminas com orientações diferentes, sendo que o número mínimo
para balancear as suas tensões é de 03 camadas (Figura 10).
48
Quanto ao aglomerado, nascido da necessidade de se aproveitar as sobras
das serrarias, é considerado o composto mais comum no mercado brasileiro no
momento. Sua produção é feita a partir da seleção de partículas de madeira,
sua aglutinação com adesivos sintéticos e prensa a quente. São chapas
estáveis, podendo ser cortadas em qualquer direção (IPT, 2003).
Segundo BITTENCOURT (1995), a partir de 1905, com a instalação da
primeira usina piloto do sistema “Flakeboard”, os EUA e Europa desenvolveram
variados processos produtivos, sempre buscando a produção da chamada
“tábua artificial”, que se consolidou após a Segunda Guerra Mundial.
O uso de resíduos de serraria foi substituído pelo plantio de coníferas como
o Pinus, sendo que na América do Norte já estão sendo produzidas chapas
comerciais usando alguns tipos de gramíneas e palha de trigo (SOUZA et al.,
2002). A Figura 12 apresenta modelos de aglomerados.
49
As chapas de fibras de média densidade (MDF) vieram para preencher
grande parte dos requisitos técnicos não atendidos pelos aglomerados, como
maior usinabilidade e acabamento, devidos aos cantos firmes, maior densidade
e maiores espessuras. Apresentam superfície plana e lisa, adequada a
diferentes acabamentos como pintura, envernizamento, impressão,
revestimentos e outros (IPT, 2003).
Trata-se de uma chapa para uso relativamente especializado e nobre,
sendo, portanto um produto mais caro e sofisticado. Seu processo de produção
é semelhante a dos aglomerados, sendo encontrada no mercado em três
versões: natural, revestida com laminado melamínico de baixa pressão (BP)
com acabamento liso ou texturizado, e revestida com película celulósica do tipo
Finish Foil (FF) com superfícies lisas ou texturizadas. A Figura 13 ilustra
algumas espessuras de chapas de MDF disponíveis no mercado.
50
Os painéis de partículas orientadas ou oriented strand boards, mais
conhecidos como OSB, surgiram no mercado para atender a uma demanda
não resolvida com os aglomerados e as chapas de MDF, que era a de possuir
resistência mecânica exigida para fins estruturais (IPT, 2003).
Estes painéis são formados por camadas de partículas orientadas em uma
mesma direção e prensadas com resinas, podendo alcançar a resistência dos
compensados por preços bem inferiores. Sua utilização na construção
habitacional na América do Norte é intensa, principalmente em paredes
internas e externas, pisos, forros e peças estruturais, conforme a Figura 14.
51
Transporte das toras Lavagem Descascamento
52
Os painéis ou chapas PCL são produzidos a partir de tarugos de madeira
colados lateralmente em uma prensa especial, com adesivos à prova d’água.
São utilizados principalmente pela indústria de móveis, empregando-se
madeira de eucalipto. De acordo com SOUZA et al.(2002), são chapas com alta
resistência mecânica, fáceis de se trabalhar e colar, no entanto têm alto custo e
limitações de medidas, o que as torna pouco competitivas em nosso mercado.
Quanto às chapas de fibrocimento, estas têm como grande vantagem o uso
de fibras vegetais que substituem a fibra do amianto, cuja extração é
considerada danosa à saúde. O processo combina as características
aglomerantes do cimento com as de resistência da fibra vegetal, que pode ser
papelão descartado ou cavacos de madeira de pinus ou eucalipto.
O produto resultante tem a mesma resistência e conforto térmico superior
ao das chapas com fibra de amianto, alta estabilidade dimensional e resistência
ao ataque de microorganismos, podendo ser usado para telhados, forros,
fechamentos de paredes e interiores. O Laboratório de Produtos Florestais
(LPF/IBAMA) desenvolve pesquisas avançadas com estas chapas, estimando-
se que sejam cerca de 15% mais caras que as tradicionais.
As chapas de cimento-madeira são manufaturadas com partículas de
madeira, cimento, água e aditivos, sendo prensadas a frio (Figura 16). São
utilizadas como material de construção em paredes, telhados, forros, pisos e
cercas. Segundo SOUZA et al.(2002), a produção dessas chapas tem custo
relativamente baixo e requerem baixo consumo de energia.
53
Segundo o REMADE (2006), a produção em larga escala de chapas de
cimento-madeira surgiu em 1976 na Alemanha e atualmente estes painéis são
bastante utilizados além da Alemanha, no Japão, Rússia, Inglaterra e Estados
Unidos (Figura 17). No Brasil, esta produção inexiste em escala industrial.
54
A viga laminada colada, resultante da técnica da madeira laminada colada
(MLC), surgiu no início do século passado, mas nas últimas décadas houve um
grande impulso no seu desenvolvimento. No Brasil, embora existam indústrias
com mais de 40 anos neste mercado, localizadas na Região Sul, esta
tecnologia ainda não é muito empregada, por motivos que incluem o seu custo
e a falta de divulgação e conhecimento sobre o seu desempenho.
Seu processo de fabricação permite a produção de peças estruturais de
grandes dimensões e variadas curvaturas. Tanto pode ser confeccionada de
forma manual, que é o caso das indústrias nacionais, como de forma
mecanizada para peças retas de tamanhos medianos, que é o caso das
indústrias européias e norte-americanas (Figura 19).
55
Secagem Eliminação de nós e execução de
emendas finger joint
56
Figura 21 – Detalhes de peças de MLC. Fonte: SIPBUILDLTD (2006).
57
Outro aspecto que exige soluções específicas diz respeito ao transporte do
material. Embora a peça de madeira laminada colada possa ser produzida em
comprimentos de 5 a 50m, suas dimensões ficam limitadas pelo tamanho do
local de produção e pelas condições de transporte até a obra.
Para ilustrar a potencialidade do material e seus fatores limitantes, há o
exemplo das estruturas do Parque de Exposições de Brasília, onde as peças
arqueadas destinadas à edificação principal possuíam 26 metros de
comprimento para um vão livre total de 48 metros, e tiveram sua curvatura
definida em função da sua altura sobre a carroceria do caminhão, de forma a
não atingirem a altura mínima de viadutos das estradas percorridas da
indústria, localizada próxima a Porto Alegre, até a capital federal (Figura 22).
58
Figura 23 – Edificações no Canadá (foto superior) e na Inglaterra com uso de
peças curvas de MLC. Fontes: CWC (2006) e AJASMITH (2006).
59
Figura 25 – Edificação de 05 pavimentos com estrutura plana de MLC destinada à
Escola Técnica Federal da Madeira em Biel-Bienne, Suíça. Fonte: MELLO (1998).
60
Esta tecnologia foi inicialmente utilizada para fabricar hélices de avião e
outros componentes durante a Segunda Guerra Mundial, até começar a ser
conhecida na década de 1960 nos EUA (REMADE, 2004).
Seu uso estrutural é bastante difundido, tanto como componente das
bordas de vigas I, também com OSB, e como único elemento constitutivo de
peças destinadas a grandes estruturas (Figura 27).
61
As vigas Parallam são um produto patenteado por uma empresa
multinacional da área de produtos florestais, e estão presentes na América do
Norte e Europa. São produzidas a partir de tiras finas, estritas e longas
cortadas de lâminas de madeira selecionadas, que são coladas e prensadas a
quente, produzindo-se unicamente peças retas (SOUZA et al., 2002).
As lâminas são arranjadas na forma de feixes, prensadas sem emendas
em todo o comprimento da peça e aquecidas por radiofreqüência. Sua
resistência e linearidade são superiores às de uma peça de madeira maciça,
além de serem confeccionadas a partir de resíduos (Figura 28).
62
A aplicação das vigas Parallam em estruturas de grande porte destaca as
suas grandes qualidades estruturais, sendo consideradas os produtos à base
de madeira com maior resistência mecânica (Figura 30).
63
Os painéis autoportantes de madeira, destinados a pisos, cobertura,
vedações e revestimentos são produtos de última geração na área de
compostos de madeira, possuindo excelente comportamento ao fogo e
proporcionando isolamento acústico e térmico. Fabricados em peças com até
9m de comprimento, são recomendados inclusive para reconstituição de pisos
e paredes de obras antigas especialmente na Europa (Figuras 32 e 33).
64
Segundo SOUZA et al.(2002), o produto madeira-plástico é resultante da
associação de partículas de madeira em variadas proporções com pellets de
plástico como matriz, sendo confeccionado numa prensa sob pressão e alta
temperatura, resultando em chapas ou perfis de diversas formas (Figura 34).
O produto final pode ter até 100% de material reutilizado como embalagens
plásticas e serragem de madeira, incluindo o pó de serra. O plástico funciona
como um protetor do produto contra intempéries, além de dar estabilidade
dimensional às partículas ou fibras da madeira. É bastante empregado em usos
externos como decks, passarelas e escadas (Figura 35).
65
CAPÍTULO III
3. As propriedades da madeira
66
Por caracterização tecnológica, compreende-se a determinação das
seguintes características da madeira:
• Caracteres gerais
gerais (cor, cheiro, grã, textura)
• Teor de umidade
• Densidade
• Estabilidade dimensional
• Comportamento térmico
• Comportamento acústico
• Condutibilidade elétrica
• Comportamento mecânico
• Comportamento à secagem
• Durabilidade/preservação
• Trabalhabilidade
Fonte: a partir de IBDF (1981) e Melo (2004).
67
3.1.1. Propriedades físicas
68
A anisotropia da madeira é determinante para se estabelecer algumas de
suas propriedades físicas, como a estabilidade dimensional, propriedades
térmicas e acústicas e condutibilidade térmica.
As propriedades físicas são estabelecidas através de avaliação qualitativa e
quantitativa e manipulação de amostras de madeira, sendo submetidas a
procedimentos de secagem, saturação e análise microscópica para sua
descrição anatômica.
69
sensação de cor é baseada na sua luminosidade, tonalidade e cromaticidade
(intensidade da cor predominante).
O cheiro, presente em algumas espécies, está diretamente relacionado
com alto teor de umidade e a presença de substâncias, que por sua volatilidade
tendem a desaparecer com o passar do tempo. A sua importância decorre da
possibilidade de algumas espécies exalarem odor desagradável, o que pode
ser incompatível com usos como interiores de edificações e engradados para
transporte de alimentos, por exemplo.
A grã representa a direção dos elementos estruturais da madeira, como
fibras, vasos e traqueídes, em relação ao eixo de crescimento da árvore, e em
relação à superfície exposta da madeira serrada (MELO, 2002). Vários fatores
contribuem para a sua disposição quando do crescimento da árvore, sendo
classificados em grã direita (reta) e grã irregular (Figura 37).
70
processamento, maior resistência estrutural e estabilidade dimensional para
secagem (Figura 38).
71
Figura 39 – Exemplos de figuras da madeira e seus usos. Fonte: AUBURN (2006).
72
ÁGUA LIVRE ÁGUA DE IMPREGNAÇÃO
- contida nas cavidades das células - encontrada nas paredes das células
- proveniente da seiva elaborada - fixada por ligações químicas a nível
molecular
- pode ser retirada com relativa - sua retirada requer grande consumo
facilidade por processos de secagem de energia e resulta em retração
- circula livremente sem afetar a madeira - ocasiona alterações significativas nas
propriedades da madeira
Fonte: MELO (2002).
73
se uma umidade de equilíbrio de 12%), pode ser acelerada em ambientes onde
estes parâmetros são controlados, como as estufas de secagem.
A umidade de equilíbrio da madeira varia em função da região em que se
encontra, o que representa uma variação considerável em países de
dimensões continentais como o Brasil. Portanto, é muito importante o controle
da umidade da madeira na região em que será utilizada, que pode ser feito por
medidores portáteis, evitando-se problemas decorrentes de suas alterações
dimensionais (Figura 40).
3.1.1.3. Densidade
74
No caso da madeira, como a massa e o volume englobam tanto a parte
sólida (madeira) quanto a parte líquida (água) e vazios celulares e
intercelulares, os valores de densidade variam em função das condições de
umidade. Por exemplo, o volume da madeira é constante no estado verde,
diminuindo quando a umidade de equilíbrio é menor que o PSF e tornando-se
novamente constante no estado seco (CARTAGENA, 1982).
Em conseqüência destas variações, pode-se distinguir quatro densidades
para uma mesma amostra de madeira, conforme segue:
75
estabilidade dimensional também é abordada com os termos retração e
inchamento (HELLMEISTER, 1982) ou retratibilidade (CALIL, 1999).
Devido à sua natureza anisotrópica, apresenta comportamentos diferentes
de acordo com a direção em relação às fibras e aos anéis de crescimento,
ocorrendo em porcentagens diferentes nas direções tangencial, radial e
longitudinal (CALIL, 1999) (Figura 41).
76
A condutibilidade térmica é uma medida da rapidez com que flui a energia
térmica ou calor através de um material submetido a um gradiente de
temperatura (FERNANDEZ-VILLEGA, 1983). Vários fatores influenciam na
condutibilidade térmica da madeira, como o teor de umidade, a densidade e a
estrutura celular.
Desta forma, madeiras de baixa densidade e baixo teor de umidade são
melhores isolantes térmicos, uma vez que nestas madeiras os vazios
intercelulares são preenchidos com água e ar, que possuem menor
condutibilidade térmica que o material lenhoso. A Tabela 6 apresenta os
coeficientes de condutibilidade térmica de alguns materiais, onde se observa
que a madeira é um dos materiais mais isolantes da construção civil.
77
3.1.1.6. Comportamento acústico
78
Figura 42 – Sala de concertos do Sibellius Hall, com revestimentos de balcões,
paredes, pisos e teto em madeira, em Lahti, Finlândia. Fonte: ARTEC-USA (2006).
79
deformação residual, é considerada como um material elástico para a maioria
dos usos estruturais.
As propriedades de resistência da madeira estão diretamente relacionadas
com a sua densidade, de forma que as madeiras mais densas são
normalmente as mais resistentes, embora haja variações destas propriedades
em madeiras com a mesma densidade (MELO, 2002).
Tanto as propriedades de elasticidade quanto as de resistência diferem de
acordo com a direção das fibras em relação à direção de aplicação da força na
madeira, devido ao seu caráter anisotrópico. Além disto, como suas
propriedades não variam numa mesma direção, mas de uma direção para
outra, a madeira possui um caráter ortotrópico.
80
A tensão é definida como a força por unidade de área, sendo que na
madeira existem três tipos de tensões a que pode estar submetida: tensão de
compressão, tensão de tração, de flexão e cisalhamento (CARTAGENA, 1982).
A alteração dimensional resultante da atuação de esforços é chamada de
deformação, e a relação entre esforço e deformação é proporcional dentro do
chamado regime elástico; ou esta relação perde esta proporcionalidade, dentro
do chamado regime plástico.
A Figura 43 apresenta o gráfico Tensão x Deformação, onde se visualiza o
trecho onde a madeira se comporta como um material elástico, e o limite de
proporcionalidade, após o qual a madeira caminha para a ruptura.
Tração
Tensão
Limite de proporcionalidade
Compressão
Limite de proporcionalidade
Deformação
81
Figura 44 – A madeira pode ser submetida a três tipos de compressão:
perpendicular, paralela ou inclinada. Fonte: a partir de CALIL (1999).
82
A máxima resistência à tração se manifesta quando o esforço é paralelo às
fibras, no entanto os ensaios são de difícil execução e pouco confiáveis devido
à possibilidade de esmagamento das fibras do corpo-de-prova pelas garras do
equipamento (MELO, 2002). Esta propriedade é utilizada para
dimensionamento de treliças e comparação entre espécies.
Quanto à tração perpendicular às fibras, a madeira apresenta baixos
valores de resistência, e como os esforços agem tendendo a separar as fibras
e afetando a integridade estrutural da peça, os resultados de ensaios
apresentam grandes variações. Esta propriedade, que chega a apresentar
valores quarenta vezes menores que os da tração paralela, é utilizada em
estruturas em arco (FERNANDEZ-VILLEGA, 1983).
a) b) c)
83
cisalhamento “rolling” produz uma tendência das células rolarem umas sobre
as outras.
O cisalhamento horizontal é o mais crítico, pois a separação e o
escorregamento entre as células de madeira podem levar à ruptura da peça. O
comportamento da madeira ao cisalhamento é importante no dimensionamento
de vigas, ligações e comparação entre espécies.
84
Segundo MELO (2002) as propriedades referentes ao comportamento da
madeira à flexão são utilizadas para dimensionamento de peças fletidas tais
como vigas, além da comparação entre espécies, arqueamento, etc.
85
3.1.3. Fatores que afetam a resistência da madeira
86
FATOR INFLUÊNCIA
- densidade - quanto maior, maior a quantidade
quantidade de
madeira, com aumento da resistência
- grã (direção longitudinal dos - a grã direita representa uma menor
elementos anatômicos estruturais variabilidade de resistência
da madeira) - a grã inclinada afeta bastante o
O comportamento estrutural da madeira
C
I
M - nós (soltos e firmes, com - reduzem a sua resistência por
Ô
T diferenças de tamanho, localização,
A interromperem a continuidade e
N forma, firmeza, e do tipo de tensão direção das fibras da madeira
A
considerada) - podem causar efeitos de tensão
localizada
localizada
- falhas naturais (encurvamento do - alteração do alinhamento das fibras
tronco, presença de alburno, pode influir na resistência
medula e faixas de parênquima) - redução da resistência da madeira
- defeitos por ataques biológicos - afetam as propriedades físicas e
LA (perfurações,
(perfurações, podridão, manchas) mecânicas da madeira
T
N - temperatura (exposição a altas - diminuem as propriedades
EI
B temperaturas por longo período) mecânicas
M
A - aumentam as propriedades com
diminuição da temperatura
- defeitos oriundos da secagem - originados pela deficiência dos
(encanoamento, arqueamento, sistemas de secagem, influenciam na
encurvamento, torcimento e sua resistência e qualidade
rachadura)
O - defeitos de processamento da - resultam em perda de resistência e
Ã
Ç madeira (arestas quebradas e qualidade da madeira
AZ
IL variação da seção transversal)
IT
U
- influência do tempo de - carregamentos de longa duração
carregamento ocasionam deformações adicionais
(fluência da madeira)
87
3.2. A madeira e a sustentabilidade dos materiais
88
Estes programas são ferramentas para se estimular a eficiência energética
e encorajar a adoção de escolhas ambientalmente responsáveis desde a
concepção até a execução das edificações. A Tabela 8 apresenta alguns
destes programas:
89
Neste novo contexto de abordagem de critérios de sustentabilidade para a
construção civil, a madeira ressurge como o material ambientalmente correto,
com desempenho superior ao de qualquer outro material construtivo. Em linhas
gerais, as características do material que sustentam esta posição são:
• É o único
único material construtivo/estrutural renovável da construção civil
• Requer menos energia no beneficiamento: o concreto requer 2,2
vezes mais e o aço 1,5 vezes mais energia que a madeira
• Produz menos gases do efeito estufa: o concreto produz 1,5 vezes
mais e o aço 1,22 vezes mais gases que a madeira
• Produz menos poluição do ar: o concreto produz 2,15 vezes mais e o
aço produz 1,7 vezes mais poluição do ar que a madeira
• Produz menos poluição da água: o concreto produz 2,15 vezes mais
e o aço produz 3,47 vezes mais poluição da água que a madeira
• Produz menos resíduos sólidos: o concreto e o aço produzem 1,57
vezes mais resíduos sólidos que a madeira
Fonte: a partir de CWC (2002).
90
A Figura 48 apresenta uma análise comparativa de materiais empregados
na construção de um edifício comercial de 03 pavimentos na Canadá, com
fundação convencional, analisando-se os aspectos de sua sustentabilidade.
Equivalente CO 2 (Kg x 10 3)
6 120 12
10
Valor do índice x 10
90 9
4
60 6
2
30 3
0 0 0
M adeira Aço C oncreto M adeira Aço Concreto M adeira Aço Concreto
Construção C onstrução Construção
Extração Extração Extração
200 70
150
60
Valor do índice (Kg x 10 3)
5
120
Valor do índice Kg x 10
150 50
8
Valor do índice x 10
90 40
100
30
60
50 20
30 10
0 0 0
M adeira Aço C oncreto M adeira Aço Concreto M adeira Aço Concreto
91
100%
80%
60%
Outro aspecto que adquire cada vez mais importância no contexto mundial
é o mecanismo de mudanças climáticas, onde o acúmulo de gases do efeito
estufa tem contribuído dramaticamente para o aquecimento global.
O comportamento da madeira neste aspecto pode levar o material à
categoria de “material do futuro”, na condição de produto derivado da celulose
que é obtida pelo seqüestro de dióxido de carbono da atmosfera: atualmente
uma das principais estratégias frente ao aquecimento global tem sido o
estímulo ao plantio de árvores, o que resultará em grande valorização da
madeira como material ecologicamente estratégico para a humanidade.
92
CAPÍTULO IV
93
4.1.1. As construções de madeira maciça empilhadas
94
Figura 51 – Feltro desenvolvido para vedação entre peças do sistema “lafte” e
habitação concebida na Noruega. Fonte: HYTTELIV (2006).
95
Figura 53 – Tipos de encaixes de peças nos cantos (corner style) utilizados nas log
homes norte-americanas. Fonte: CEDARMILLLOGHOMES (2004).
96
4.1.2. As construções com entramado estrutural
97
A definição do enxaimel também pode ser aplicada às nossas construções
de taipa de pilão ou pau-a-pique, pois da mesma forma o entramado estrutural
é preparado para receber o material das vedações. No entanto, esta
denominação é mais utilizada para designar as edificações dos imigrantes
europeus (Figura 56).
98
O caráter estético da construção em enxaimel foi bastante explorado
especialmente no continente europeu, em países como a Alemanha, a França
e a Inglaterra. São edificações que expressam muita robustez, se destacando
também a grande inclinação dos telhados (Figuras 58 e 59).
99
4.2. As técnicas contemporâneas
100
CARTAGENA (1982) propõe duas classificações das edificações de
madeira: quanto ao sistema estrutural e quanto ao sistema construtivo. A
primeira classificação identifica três tipos básicos de soluções estruturais em
madeira: os entramados, os sistemas poste-viga e os sistemas treliçados.
Quanto ao sistema construtivo, é proposta uma abordagem a partir dos
processos de fabricação da obra em madeira, conforme a tabela 11:
101
A Tabela 12 apresenta a descrição de INO (1992) sobre a classificação dos
sistemas construtivos em madeira presente na literatura internacional:
102
4.2.1. O sistema poste-viga ou pilar-viga
103
Trata-se de um sistema construtivo bastante empregado em países com
pouco desenvolvimento tecnológico no setor da construção em madeira, como
é o caso do Brasil. No entanto, está presente especialmente na América do
Norte, sendo bastante conhecidas e demandadas as post beam houses, por
sua versatilidade de construção e estética arquitetônica (Figura 61).
104
4.2.2. Os entramados modernos: sistemas ballon e plattform
Caibros Barrotes
Vigamento
Montantes
Vedação
Barrotes
105
O uso de peças longas, característica que dá nome ao sistema por
assemelha-lo à armação de um balão, foi responsável pela sua decadência,
devido à necessidade de peças com dimensões especiais para edificações
com vários pavimentos, das dificuldades de obtenção de rigidez no sistema,
problemas de montagem nas obras e comportamento ao fogo, uma vez que as
peças contínuas não permitiam barreiras eficientes contra a sua propagação.
A despeito de sua superação, este sistema foi responsável por
desencadear o desenvolvimento da indústria de casas pré-fabricadas de
madeira na América do Norte, culminando com o sistema plattform, que
resultou na habitação que é considerada a de melhor qualidade do planeta.
O sistema plattform possui como principal característica a execução do
piso como uma plataforma, sobre a qual são edificados os entramados das
paredes, que por sua vez receberão a plataforma do piso superior. A
plataforma inicial ou basement é feita em concreto ou pedra, assentada
diretamente sobre o solo.
Conforme ilustrado na Figura 64, todo o sistema é constituído de peças
leves, cujas paredes levam montantes de seções pequenas (2” x 4”), todos
ligados por pregos ou elementos metálicos.
106
A versatilidade do sistema plattform pode ser observada sob o ponto de
vista do grau de industrialização, podendo ser fabricado em painéis portantes e
até em módulos volumétricos, as chamadas mobile homes ou casas móveis.
Estas são produzidas dentro de grandes indústrias diretamente sobre chassis
extendidos de caminhões e transportadas até os locais de implantação,
chamados de mobile home parks (Figuras 65 e 66).
107
4.2.2.1. Considerações sobre a casa de madeira norte-americana
108
significativo do isolamento térmico destas habitações, o emprego do sistema
construtivo em madeira resulta num melhor desempenho global da moradia.
A fácil renovação da habitação, que inclui o aumento do seu tamanho ou o
rearranjo dos espaços também contribui para o sucesso da casa americana.
De acordo com a Associação Nacional dos Construtores de Casas, em 2001,
os proprietários de residências gastaram cerca de 160 bilhões de dólares na
reforma de suas casas, sendo que nos EUA as moradias em madeira
representam cerca de 74% do total, chegando a 94% no Canadá (CARUANA,
2002).
A facilidade de se modificar a residência é um grande atrativo, pois o
sistema construtivo baseado em peças leves fixadas com pregos (“studs”,
montantes de madeira nas dimensões de 2x4 polegadas) e uso de chapas de
madeira e gesso acartonado, sendo todo este material manipulado por
máquinas manuais, permite que o próprio dono possa efetuar estas
modificações. Trata-se de uma grande vantagem comparativa, pois nas
construções convencionais de alvenaria e concreto armado, as alterações da
moradia têm de ser feitas por equipes de pedreiros e produzem muita poluição
decorrente da demolição.
Outra questão que afeta particularmente a América do Norte em relação à
habitação é a ocorrência de terremotos. Neste campo, as construções em
madeira se mostram como um dos sistemas construtivos mais seguros por
causa de algumas vantagens comparativas:
109
A questão da durabilidade da moradia norte-americana é abordada de
diversas formas, desde o uso intensivo de barreiras químicas no solo para
afastar a presença dos cupins (item obrigatório na maioria dos Estados
americanos) até tratamentos de última geração com produtos químicos em
painéis de vedação e peças estruturais.
110
americano, e a prova disto é a altíssima aceitação da casa de madeira por
parte da população como um produto proveniente de práticas sustentáveis.
Na atual condição de alteração climática que vive o planeta, e
considerando a grande contribuição que especialmente os EUA têm para a
emissão de gases que provocam o efeito estufa, a casa de madeira representa
um contraponto à imagem negativa do país perante a comunidade
internacional.
A casa que produz menos impacto em aspectos como o uso de energia, a
produção de gases do efeito estufa, a poluição da água e do ar, além de ser a
casa mais fácil de construir e reformar, também é a casa com padrão estético
satisfatório, conforme apresentado na Figura 67, e que garante o título de
melhor habitação do mundo em conforto, segurança e qualidade.
111
4.2.3. As construções em painéis industrializados de madeira
112
Atualmente, este setor da construção oferece painéis de pequenas e
grandes dimensões, totalmente pré-fabricados e prontos para montagem na
obra. Segundo BITTENCOURT (1995), os painéis fabricados podem ser os
“semifechados” (entramado + fechamento interior ou exterior) ou “fechados”
(entramado + fechamento interior ou exterior + isolamento), sendo bastante
executados na Europa, principalmente na França.
A França, de acordo com INO (1992), possui um detalhado sistema de
classificação da construção em painéis, conforme a Tabela 13:
113
Figura 70 – Montagem de painéis nas obras. Fonte: IDEESMAISON (2007).
114
4.2.4. As soluções estruturais de coberturas e halls
115
As soluções estruturais com vigas biapoiadas ou contínuas são
consideradas simplificadas, o que não diminui a sua capacidade de resposta às
intenções arquitetônicas e estruturais. Além disso, a gama de produtos da
madeira permite diferentes opções de vigamentos (Figuras 73 e 74).
116
Outra forma de utilização das vigas de madeira é a chamada viga
tensionada ou estaiada, onde a sua rigidez é aumentada com o uso de cabos
ou tirantes metálicos, resultando num melhor desempenho da peça. Trata-se
de uma solução utilizada inclusive em obras de madeira nacionais (Figura 75).
117
TABELA 14 - Classificação das treliças de madeira.
Tipo Descrição
- forma de treliça tradicionalmente
Triangular (tesoura) utilizada no Brasil, de modo geral
vence vãos de 6 a 30m e pode ser
executada com peças
peças de madeira
simples, duplas ou triplas.
– considerada estruturalmente a
Plana (banzos paralelos) menos eficiente, pode ser vantajosa
para suporte de pisos e grandes
vãos; indicada para vãos entre 6 e
30m, substitui as vigas maciças.
– para cargas distribuídas é mais
Bowstring (banzo superior arqueado) eficiente, devido ao banzo superior
com mesmo desenho da linha de
pressão correspondente (parábola);
pode vencer vãos entre 20 e 50m.
Fonte: a partir de FERNANDEZ-VILLEGA (1983) e CWTA (2007).
118
A Figura 77 apresenta de forma sintética o processo de fabricação de uma
treliça de madeira na América do Norte, onde o uso de madeira de baixa e
média densidade permite um menor desgaste do maquinário.
Estocagem
Máquina de desenho
e corte
Montagem
Empilhamento e entrega
119
Figura 79 – Treliças planas de madeira em edificação do INCRA no Pará, e com
diagonais metálicas no museu de Ballenberg, Suíça. Fonte: MELLO (1998-2002).
120
As tesouras articuladas apresentam como vantagem a execução rápida de
grandes vãos com componentes menores, que se fixam nas articulações
(Figura 81). De acordo com GOETZ et al.(1983), a forma de montagem e sua
flexibilidade são essenciais para o seu dimensionamento, sendo também
imprescindível considerar com atenção a ação dos ventos.
121
Figura 83 – Pórticos treliçados concebidos para o projeto da nova sede do Jardim
Botânico de Brasília (DF). Fonte: MELLO (2003).
122
Os arcos em madeira, assim como os pórticos, podem ter duas ou três
articulações, também sendo considerados hiperestáticos para o primeiro caso e
isostáticos para o segundo. A sua forma assemelhada à parábola lhe confere
excelente desempenho particularmente para grandes vãos (Figura 85).
Figura 85 – Ponte para pedestre com estrutura em arcos de madeira laminada colada
na Suíça. Fonte: HSB (2006).
123
As estruturas em arcos também podem ser confeccionadas com madeira
maciça, aproveitando a grande aptidão do material, pois a sua composição de
fibras lhe confere aumento da rigidez no arqueamento (Figura 87).
124
As vigas suspensas, de acordo com GOETZ et al.(1983), trabalham como
arcos invertidos, ou seja, respondendo a solicitações de tração. A verificação
de estabilidade, que é determinante para os arcos comprimidos, aqui não é
essencial, devendo-se, no entanto observar cuidadosamente a ação do vento
no sistema estrutural (Figura 89).
125
As estruturas plissadas são definidas a partir do princípio onde um módulo
inicial é repetido ou transformado por rotação, translação, superposição ou
duplicação, gerando estruturas paralelas com trava de estabilização, estruturas
radiais ou em forma de arcos ou pórticos (Figura 91).
126
As superfícies curvas podem ser executadas com soluções de chapas
armadas sobre vigas, estruturas treliçadas, pórticos e estruturas reticuladas em
arcos, sendo de simples curvatura ou dupla curvatura (Figuras 94 e 95).
127
As cascas de madeira podem ser executadas com nervuras, em curvaturas
invertidas, e com formas diversas como ovóides, elípticas, cúpulas regulares,
etc, num variado repertório de soluções (Figuras 96, 97 e 98).
Figura 96 – Casca de cobertura de uma piscina, que se apóia sobre três pontos no
solo, com vãos de 58m entre os pontos, na França. Fonte: CRIT (2005).
128
As estruturas de cúpulas geodésicas são dimensionadas a partir das forças
de compressão e tração que atuam nas suas barras, sendo que a transmissão
das cargas provoca esforços tangenciais e radiais (GOETZ et al., 1983).
São composições estruturais diferenciadas, e a aptidão da madeira para
estes sistemas é responsável por um movimentado setor de construção de
casas com cúpulas geodésicas, especialmente nos EUA (Figura 99).
Figura 99 – Seqüência de fabricação de casa com cúpula geodésica nos EUA, com
execução de embasamento em concreto armado, armação em montantes de madeira,
enrijecimento com chapas de compensado, execução de complementos, com vista
interna mostrando mezanino, e a obra acabada. Fonte: HORTONDOME (2004).
129
As estruturas especiais de madeira são aqui apresentadas de forma livre,
ou seja, sem nenhuma classificação quanto ao sistema estrutural proposto,
pretendendo-se desta forma ilustrar as inesgotáveis possibilidades construtivas
do material e de seus derivados.
A sua concepção e realização são resultado de grande investimento em
desenvolvimento tecnológico na área de construção em madeira nos países do
Hemisfério Norte, e servem de exemplo da posição estratégica que pode
ocupar a madeira em nosso setor da construção civil.
Do ponto de vista da concepção arquitetônica, são exemplos de perfeita
integração entre a proposição estética e tecnológica, que caracterizam as
obras referenciais em madeira (Figuras 100, 101, 102, 103 e 104).
130
Figura 101 – Jardim botânico em Sheffield, Inglaterra. Fonte: FINNFOREST (2002).
131
Figura 103 – Igreja na Itália, projeto do arquiteto Renzo Piano. Fonte: FINNFOREST
(2002).
132
4.2.5. As cidades de madeira (wooden towns)
133
No Brasil houve experiências pioneiras, como a cidade de madeira
construída pelo americano Henry Ford na Amazônia, com o intuito de
estabelecer uma base na floresta para a exploração da borracha.
Esta cidade, chamada de Fordlândia, foi transferida para a localidade de
Belterra, no oeste do Pará, onde se encontra até hoje. A presença da
concepção americana das construções em madeira pode ser observada nos
seus principais edifícios e residências (Figura 107).
134
Outras experiências de construção de pequenas cidades de madeira no sul
do Brasil e para instalação de operários de grandes empreendimentos como
hidrelétricas se sucederam pelo país. Um marco histórico é a Cidade Livre,
hoje Núcleo Bandeirante, que foi criada para abrigar os operários que vieram
construir a nova capital do Brasil, Brasília.
Nos primórdios da cidade, todas as suas edificações eram de tábuas e
possuíam até dois pavimentos (Figura 108). Com o propósito de prestigiar os
construtores da nova capital, o então presidente da república Juscelino
Kubitschek mandou erguer a residência oficial com a mesma tecnologia
empregada nas habitações da Cidade Livre (Figura 109).
Figura 108 – A Cidade Livre, hoje Núcleo Bandeirante, era totalmente construída em
madeira, que foi substituída por alvenaria. Fonte: BANDEIRANTE (2007).
135
Atualmente, as cidades de madeira estão presentes na América do Norte e
nos países escandinavos, como a Finlândia. De modo geral, as wooden towns
norte-americanas se destinam a abrigar pólos turísticos tais como estações de
ski e outros, onde se pode observar todo o aparato tecnológico que acompanha
as soluções construtivas em madeira presentes (Figura 110).
136
A Finlândia pode ser considerado o país mais avançado do mundo no tema
das cidades de madeira. Graças a bem elaborados programas de governo em
conjunto com a iniciativa privada, há inúmeras cidades planejadas e
construídas dentro deste conceito.
137
Figura 112 – Cidades de Oulu e Sodankyla, Finlândia. Fonte: PUUINFO (2007).
138
Figura 114 – Cidade com habitações coletivas de três pavimentos em madeira
na periferia de Helsinque, Finlândia. Fonte: MELLO (2004).
139
4.3. Técnicas construtivas em madeira no Brasil
140
De acordo com SERAPIÃO (2006), a taipa de pilão é a técnica que utiliza a
terra umedecida prensada em uma fôrma de madeira, chamada taipal, sendo
esta técnica decorrente da falta de madeira para se executar toda a parede,
principalmente no planalto paulistano do período colonial, de onde se originou a
arquitetura bandeirista (Figura 117).
Figura 117 – Casa bandeirista de meados do século 17 na cidade de São Paulo, num
sistema misto alvenaria - madeira. Fonte: SERAPIÃO (2006).
141
O termo “gaiola de madeira” também pode ser considerado como uma
regionalização do sistema enxaimel, pois também parte do princípio de uma
estrutura de madeira travada em várias direções (engradamento) com
vedações em alvenaria, pedra, adobe ou qualquer outro material disponível.
Sua presença também pode ser observada na arquitetura colonial goiana,
onde a maior disponibilidade de madeira permitiu o seu emprego em obras de
grande porte como igrejas (Figura 118).
Figura 118 – Igreja Matriz de Pirenópolis (GO), onde se observa a gaiola com madeira
de alta durabilidade (aroeira), que permitiu a sua reutilização estrutural em suas
restaurações. Fonte: MATRIZDEPIRENÓPOLIS (2006).
142
Esta tecnologia construtiva atravessa os tempos e é defendida por Lúcio
Costa num período de grandes transformações da arquitetura brasileira, a
década de 1930, onde começa a se pronunciar a nossa arquitetura moderna. O
arquiteto propõe resgatar e ao mesmo tempo avançar na nova linguagem da
qual o arquiteto francês Le Corbusier é o porta-voz, em projetos onde o
neocolonial e o moderno se fundem de forma original (Figura 119).
Figura 119– Projetos de Lúcio Costa da década de 1930, onde se observa a gaiola de
madeira (figura no alto), a concepção neocolonial de alvenaria e madeira (foto), e a
concepção moderna da gaiola de madeira inserida na estrutura de concreto armado.
Fonte: VITRUVIUS (2006).
143
Nos tempos atuais, a gaiola de madeira está presente em edificações
diferenciadas, usualmente destinadas a residências, ao turismo e atividades
afins (Figura 120). O aperfeiçoamento e a simplificação deste sistema
construtivo resultaram no sistema pilar-viga, que é intensamente empregado
nas edificações estruturadas em madeira no Brasil (Figura 121).
144
Outro sistema construtivo em madeira que é considerado tradicional no
Brasil é o chamado sistema tábua-e-sarrafo, onde a trama estrutural em
pequenas peças (tarugos) é reforçada pelo material da vedação, normalmente
tábuas verticais e sarrafos como mata-juntas. Esta trama reforçada pela
vedação suporta a cobertura da edificação, sendo esta solução encontrada
normalmente em habitações de baixo custo de norte a sul do país, podendo-se
afirmar ser esta uma genuína arquitetura vernacular em madeira (Figura 122).
Figura 122 – Edificações em tábua e sarrafo em área rural no sul do Pará e na cidade
de Florianópolis, em Santa Catarina. Fonte: MELLO (1999).
145
A partir daí, este mercado se direcionou para as casas de veraneio ou
lazer, e as exigências dos novos clientes resultaram no aperfeiçoamento dos
sistemas construtivos. De acordo com PRECASA (2007), no final dos anos de
1970 e início de 1980, o mercado se baseava em dois sistemas construtivos:
as casas de paredes duplas com chapas de madeira e as casas com paredes
simples com peças maciças de madeira com encaixe (Figura 123).
Figura 123 – Casas de madeira com paredes em peças maciças com encaixe do tipo
macho-e-fêmea. Fonte: CAMPER (2007).
Figura 124 – Detalhe de sistema construtivo com parede dupla em peça maciça de
madeira. Fonte: PRECASA (2007).
146
Em termos gerais, os sistemas construtivos em madeira existentes no
Brasil estão relacionados às casas de madeira, de acordo com classificação
sugerida por BITTENCOURT (1995) e INO (1992), que discrimina estes
sistemas em pilar-viga e de painéis, de acordo com a Tabela 15:
147
Ainda assim, manifestações de arquitetura em madeira ligadas ao passado
da tradição indígena podem ser encontradas especialmente nas Regiões Norte
e Centro-Oeste, onde os traços culturais dos nossos primeiros habitantes se
fazem sentir mais forte. A estética destas edificações causa impacto
extremamente positivo e estimula o uso estrutural da madeira (Figura 125).
148
Com presença bastante discreta no cenário da construção civil no Brasil,
são observados outros sistemas construtivos especialmente na Região Sul,
desde estruturas de madeira laminada colada até estruturas treliçadas em
geral, que expõem as possibilidades do material e sua grande aptidão para
soluções tecnologicamente arrojadas no país (Figuras 127 e 128).
Figura 128 – Coberturas de teatro em Santa Catarina com madeira laminada colada e
de hangar no Paraná com arcos treliçados de madeira. Fonte: EMADEL (2000).
149
CAPÍTULO V
150
De acordo com GRAEFF (1986), a arquitetura constitui uma atividade
artística, mas não deixa de ser uma atividade comprometida com rigorosas
exigências prático-funcionais formuladas fora do seu campo específico, sendo
a realização de uma obra assim como do projeto previamente programados a
partir da obediência a um Programa de Necessidades.
O Estudo Preliminar compreende a abordagem das soluções consideradas
viáveis a partir das informações consolidadas no Programa de Necessidades,
representando invariavelmente a síntese do produto final. As demais fases
subseqüentes representam o desenvolvimento da concepção arquitetônica até
se chegar às exigências necessárias à sua exeqüibilidade, englobando aí as
soluções tecnológicas e construtivas propostas para a edificação.
Esta é uma característica intrínseca do projeto de arquitetura, que é
justamente o de espelhar o que se deseja construir. STROETER (1986) afirma
que a conhecida expressão “construir corretamente”, de Bruno Zevi, é um
“projetar corretamente”, assinalando a importância de se “projetar corretamente
a construção”. O mesmo autor considera, no entanto, que o fato de se
empregar corretamente a técnica construtiva na concepção arquitetônica, ou
seja, com praticidade e eficiência, não necessariamente é arquitetura. Nas
palavras de um dos ícones da arquitetura brasileira:
151
Como afirma Lúcio Costa, reveste-se o projeto de arquitetura de uma
importância maior, pois deve conter ao mesmo tempo uma intenção plástica
associada à técnica. WILSON (1971) observa que a arquitetura combina forma
externa e espaço interno, estrutura e material em uma única essência.
Ressalta-se, portanto, que o projeto de arquitetura é o de uma construção,
mas o processo mental envolvido e o resultado final são o de uma arquitetura,
estando este conceito sintetizado por STROETER (1986) quando diz que a
arquitetura é uma arte que se realiza na construção.
Tendo como pano de fundo a escassa e limitada (tanto técnica quanto
plasticamente) produção de edificações de madeira no Brasil, que não é
mensurada na pouca produção bibliográfica sobre o tema, mas é reconhecida
visualmente na paisagem das cidades brasileiras, retorna-se à questão do
projeto e à produção da arquitetura.
Faz-se necessário reconhecer que esta pouca expressividade da
“arquitetura em madeira” brasileira está obrigatoriamente assentada em
princípios básicos, como a elaboração do projeto. Considerando que a nossa
arquitetura em concreto armado é reverenciada mesmo fora do país, o que
atesta a qualidade dos projetistas e construtores brasileiros, é de se supor que
o projetar em madeira exija requisitos específicos que não são observados ou
mesmo reconhecidos pelos profissionais.
Neste panorama, onde não há domínio sobre a(s) técnica(s) e não há
intenção plástica que explore as características peculiares do material, tem-se
o resultado que, com raras exceções, se observa em nossa realidade, ou seja,
há “construções em madeira”, mas não “arquitetura em madeira”.
152
Na pesquisa bibliográfica efetuada, apenas o relatório de pesquisa “La
maison à ossature bois – une nouvelle pratique architecturale”, de BIGNON
(1986), e a tese de doutorado “”Concepção arquitetônica da habitação em
madeira”, de BITTENCOURT (1995), abordam este tema sob a mesma ótica da
presente dissertação.
Os princípios básicos peculiares à arquitetura e por conseqüência à
construção em madeira defendidos por BIGNON (1986) e BITTENCOURT
(1995) estão descritos na Tabela 16:
153
O princípio técnico básico da dissociação da estrutura, do fechamento e do
paramento está presente em todas as técnicas construtivas em madeira, com
exceção das construções de madeira maciça empilhada, onde a estrutura e as
vedações são um único componente.
Segundo BITTENCOURT (1995), nas construções em alvenaria a parede é
um elemento abstrato e as partes do edifício não possuem uma autonomia
funcional claramente definida. As paredes monolíticas e paralelepipedais não
apresentam problemas de fechamento, o que empobrece o detalhamento
construtivo e a especificação dos acabamentos.
No caso da madeira, o princípio de dissociação das partes da construção
obriga à concepção do fechamento (vedações) e do paramento (acabamento),
adquirindo estes um valor que não existe nas obras em alvenaria.
154
Com relação à técnica de concepção e realização da edificação em
madeira ser flexível e evolutiva, isto pode ser facilmente observado
especialmente na realidade norte-americana onde a profusão de soluções
construtivas ressalta as qualidades inerentes do material.
155
Os sistemas construtivos em madeira possuem como característica
marcante o fato de serem definidos a partir de peças, o que conceitualmente os
coloca na condição básica de sistemas pré-fabricados, pois em princípio as
peças foram pré-fabricadas pela natureza.
Uma das peculiaridades dos sistemas pré-fabricados é a exigência de
precisão, pois o erro em uma das peças compromete o conjunto. O mesmo se
aplica aos sistemas construtivos em madeira, embora haja um senso comum
de que estes sistemas possuem uma simplicidade construtiva.
156
O detalhe possui várias conotações quanto à sua função na concepção e
execução da edificação em madeira, sendo que de modo geral participa
ativamente da estética arquitetônica e possibilita verificar a harmonia da
construção. É ponto de partida e não resultado da solução de problemas
técnicos e construtivos da edificação.
Segundo BITTENCOURT (1995), o detalhe participa da definição do
projeto arquitetônico em madeira, sendo uma ferramenta de trabalho na
elaboração do projeto; através dele são questionados os pontos críticos, não
somente para se responder aos problemas, mas também para tornar a
edificação mais “eficiente” do ponto de vista construtivo.
No processo construtivo o detalhe expõe a sua racionalidade e economia,
num contexto de variadas técnicas construtivas dos elementos e componentes
que caracterizam a edificação em madeira. BITTENCOURT (1995) assinala
que nos países com grande tradição em construções em madeira, os detalhes
estão incorporados às habilidades dos profissionais nos canteiros de obras, o
que permite aos profissionais de projeto uma maior atenção a questões
estéticas e relacionadas ao desenvolvimento de novas tecnologias.
BIGNON (1986) ressalta as múltiplas finalidades do detalhe arquitetônico
na edificação em madeira:
157
5.3. Sobre a interação entre arquitetura e estrutura
158
Embora a concepção estrutural esteja intrinsecamente ligada à execução
da edificação, pode-se afirmar que o aspecto mais significante da estrutura seja
a sua contribuição para a forma arquitetônica. Da mesma forma, torna-se difícil
dissociar a arquitetura da estrutura. Nas palavras de STROETER (1986):
159
(...) estrutura é vertical, horizontal, ou uma combinação dos dois, onde
o projetista pode intencionalmente reforçar ou realizar idéias. Neste
contexto, colunas, paredes e vigas podem atender a conceitos de
freqüência, padrão, simplicidade, regularidade, e complexidade. Desta
forma, a estrutura pode ser utilizada para definir espaços, criar
unidades, articular circulações, sugerir movimentos ou desenvolver
composições e modulações. Assim sendo, ela se torna intrinsecamente
ligada aos variados elementos que criam a arquitetura, sua qualidade e
excitamento (Charleson, citando Clark, 2005 p.1).
160
CHARLESON (2005) identifica três categorias de relação entre as formas
arquitetônica e estrutural, com identificação dos respectivos sistemas
estruturais que as exemplificam, de acordo com o exposto na Tabela 17:
161
A estrutura não é um elemento neutro da arquitetura. Influencia o
espaço à sua volta e sua presença intensa convida à leitura e análise
arquitetônicas. Os arquitetos deveriam permitir que suas idéias de
desenho pudessem “conduzir” o design estrutural. Deveriam considerar
as estruturas como elementos arquitetônicos, começando com sua
forma e layout para depois avivarem o seu design através do
detalhamento estrutural. O “êxito” arquitetural de qualquer estrutura
deveria ser mensurado pelo quanto que ela realiza como um conceito
de design, ou em outras palavras, como ela enriquece o design. (...) A
percepção da estrutura cria mais oportunidades do que restrições. Esta
atitude positiva destaca a estrutura da prática convencional e dos
pilares da exeqüibilidade e economia, liberando-a para desempenhar
papéis funcionais e estéticos mais substanciais na arquitetura
(Charleson, 2005 p.208).
162
Ao contrário do projeto em alvenaria e concreto, onde o peso da concepção
estrutural pode ser diluído na sua própria materialidade, ou seja, a arquitetura
“camufla” a estrutura, no projeto em madeira ocorre o inverso. Na grande
maioria das técnicas construtivas observadas, a exposição da madeira
enquanto elemento estrutural é intensa, impondo ao projetista a resolução da
relação entre a arquitetura e a estrutura.
Um exemplo clássico desta relação está estampado na obra do Clube
Naval de Brasília, onde o arquiteto Sérgio Bernardes, um dos mais ilustres
representantes da arquitetura moderna brasileira, propôs uma concepção
inovadora com estrutura de madeira ainda no início dos anos de 1970.
Ao se analisar esta obra, pode-se identificar claramente como esta foi
delineada a partir de uma proposição estrutural que se integrou à intenção
plástica do arquiteto. Desde a representação gráfica do projeto de arquitetura
que informa modulação estrutural, vãos e bitolas de peças, até o desenho da
estrutura que expressa o conceito de horizontalidade pretendido pelo arquiteto
para integrar o edifício à paisagem, observa-se uma grande simbiose que
caracteriza as obras referenciais em madeira (Figura 130).
Figura 130 – Vistas interna e externa do Clube Naval de Brasília, onde a estrutura de
madeira define espaços, confere imponência e contribui para integrar a obra
arquitetônica à paisagem do lago. Fonte: MELLO (2005).
163
5.4. Estudo comparativo entre duas edificações de madeira
SANITÁRIO
MASCULINO
projeção mezanino
AUDITÓRIO
SANITÁRIO
FEMININO
PLANTA BAIXA
0 1 2 5m
164
OBRA 2 – Centro Nacional de Apoio ao Manejo Florestal (CENAFLOR)
Local: Brasília – DF
Data de construção: 2006
Área construída: 446,96m2
Sistema estrutural / construtivo: pilar-viga em madeira roliça, vedações em
alvenaria e madeira; modulação estrutural de 3,50 x 3,50m
Estrutura: pilares e vigas de ∅ 25 a 30cm em eucalipto roliço autoclavado
Plantas baixas: dois blocos com comprimento de 10,50m e 14,00m, em quatro
níveis de pavimentos, sendo dois pavimentos em alvenaria e dois em madeira,
todos apoiados sobre estrutura em vigas-duplas e pilares inclinados
P5
WC MASC.
COPA
proj. pergolado
sobe
9 10
SALA DE SITUAÇÃO HALL
banco
P2
PRAÇA COBERTA
sobe
8 7 6 5 4 3 2 1
WC DEF. ELEVADOR
WC FEM.
proj. cobertura
banco
PLANTA BAIXA
0 1 2 5m
proj. cobertura
proj. cobertura
proj. cobertura
J2 J2
proj. mirante
divisória
PERGOLADO
SECRETARIA 30x30cm
desce
sobe
25 26 11 12 13 14 15 16 TÉCNICOS/APOIO
SALÃO MULTIUSO
CIRCUL. P2
sobe
divisória
24 23 22 21 20 19 18 17
CIRCULAÇÃO
ELEVADOR
COORDENAÇÃO
divisória
PLANTA BAIXA
0 1 2 5m
165
O primeiro princípio relativo à concepção e execução da obra em madeira,
de dissociação entre as partes do edifício (estrutura e vedações), é observado
nas duas edificações, ainda que com abordagens diferenciadas.
No Centro de Visitantes do Jardim Botânico, as fachadas apresentam o
sistema construtivo conhecido como gaiola de madeira, onde a estrutura se
articula em várias direções e as vedações completam o vazio entre as peças
estruturais, numa clara derivação do sistema enxaimel (Figura 131).
166
Em relação ao segundo princípio avaliado, da técnica flexível e evolutiva,
as duas edificações apresentam diferentes abordagens, que não
necessariamente atendem a este preceito.
No Centro de Visitantes, o sistema da gaiola de madeira limita as
possibilidades de expansão e mesmo de adaptação do edifício a novas
necessidades. Trata-se de uma solução compartimentada, portanto definida
pela modulação rígida expressa na fachada, com pilares a cada 3,00m em
todas as direções, não atendendo a necessidade de se vencer vãos maiores.
Como exemplo, no bloco destinado ao salão de exposições, o vão livre é
vencido por estruturas treliçadas metálicas, que sugerem uma adaptação ao
sistema estrutural em madeira (Figura 133).
167
A edificação do CENAFLOR apresenta algumas vantagens com relação à
sua flexibilidade e evolução. A presença da modulação estrutural em uma
direção orienta o crescimento do edifício, num raciocínio semelhante à
estrutura em pórticos (Figura 134).
168
O terceiro princípio avaliado, sobre o rigor construtivo, é parcialmente
atendido nas edificações, tendo em vista que a falta de tradição na construção
em madeira cria dificuldades de execução da obra, que acabam sendo
minimizadas com adaptações nem sempre feitas com qualidade.
O Centro de Visitantes do Jardim Botânico tem em seu sistema construtivo
predominante, a gaiola de madeira, uma exigência de rigor muito grande
devida aos numerosos encaixes entre pilares e vigas (Figura 136). De modo
geral, foi uma obra relativamente bem executada, embora apresentando
situações de falta de precisão nos encontros de peças de madeira.
169
Figura 137 – O rigor da execução em madeira determinou esta alteração: o trecho
de vedação, inicialmente projetado em madeira, foi executado em alvenaria, que não
exige tanta precisão e se “molda” no espaço disponível. Fonte: MELLO (2006).
170
Figura 138 – Falta de detalhamento para soluções de amarração entre estrutura e
vedações e de passagem de tubulações compromete e desvaloriza a edificação de
madeira; no Centro de Visitantes as frestas permitem que a poeira e a água das
chuvas invada os ambientes internos causando transtornos. Fonte: MELLO (2007).
171
O último princípio avaliado no estudo comparativo das duas edificações de
madeira diz respeito à relação entre as concepções arquitetônica e estrutural e
o seu resultado nas obras construídas.
Os dois edifícios trazem estampadas em suas fachadas as soluções
estruturais adotadas, embora com graus diferentes de fidelidade a este
princípio. Internamente, também se observa a presença da estrutura, sendo
que no caso do Centro de Visitantes, esta sofre adaptações que alteram o
conceito original e resultam em uma solução estrutural mista.
A edificação do Centro de Visitantes expõe com grande vitalidade a
estrutura de madeira maciça tropical e esteticamente remete à nossa
arquitetura colonial, que ainda hoje causa grande repercussão nas cidades
históricas de Minas Gerais e Goiás, mesmo sendo reproduzida como fachada.
A contemplação de sua arquitetura é também a observação de sua
estrutura, demonstrando a inerência destes dois aspectos no edifício concebido
e construído em madeira (Figura 140).
172
No edifício destinado ao CENAFLOR a sua concepção traduz a estreita
relação entre arquitetura e estrutura, de forma que se torna difícil definir onde
começa uma e acaba a outra. Representa uma simbiose que resulta da
necessidade de se expor a solução estrutural e buscar a sua contribuição para
a composição arquitetônica.
As soluções ali encontradas são fruto de inúmeras experiências com
sistemas estruturais em eucalipto roliço e de um desafio: conceber a desejada
obra em alvenaria, que vai de encontro ao senso comum avesso à obra em
madeira, mas suportada por uma estrutura de madeira. Coroando o conjunto, a
parte do edifício totalmente em madeira, onde se pode perceber a qualidade do
ambiente e verificar a sua exeqüibilidade (Figura 141).
Com a sua realização, buscou-se a atender aos conceitos que norteiam a
obra em madeira, numa composição arrojada que pretende unir arquitetura e
estrutura com, dentre outras finalidades, a de expor e promover as
potencialidades da madeira enquanto material construtivo.
173
CONSIDERAÇÕES FINAIS
174
Este trabalho está direcionado aos profissionais de projeto, englobando
arquitetos e projetistas, embora também possa ser avaliado por outros
profissionais da construção. Este foco se justifica pela convicção do poder de
transformação que o projeto de arquitetura possui em relação à obra
construída, ou seja, uma vez que o tema do projeto e da obra em madeira seja
debatido e estudado por estes profissionais, maiores as chances de
contribuição para o uso racional e arrojado da madeira na construção civil.
Partindo do princípio da existência de especificidades referentes à
concepção e execução da obra em madeira, se procurou identificar e analisar
as conseqüências da sua adoção, e qual a sua contribuição positiva para o
aprimoramento do projeto de arquitetura em madeira.
De modo sintético estes princípios podem colocados como diretrizes
para se projetar em madeira atendendo aos aspectos que diferenciam a obra
de madeira das obras executadas com outros materiais, e estão assim
definidos:
• Dissociação entre estrutura, fechamentos (vedações) e
paramentos (acabamentos) – princípio técnico básico de abordagem
obrigatória na concepção arquitetônica, demandando a concepção e o
detalhamento de fechamentos e paramentos, o que exige maior
conhecimento sobre o material;
• Técnica flexível e evolutiva – a concepção arquitetônica não
necessariamente deverá resultar em obra com “aspecto de madeira”:
com um “sistema aberto”, a edificação em madeira permite diferentes
composições com diferentes materiais que resultam no desenvolvimento
de novas tecnologias; quanto à evolução a concepção arquitetônica
deverá ponderar sobre a capacidade de expansão da proposta;
• Rigor construtivo – aspecto característico da construção em
peças, deve ser considerado nas tomadas de decisões sobre soluções
estruturais e construtivas que compõem a proposta arquitetônica;
• Detalhe – componente essencial da obra em madeira que
interfere na solução de arquitetura na forma de detalhe estrutural ou
175
construtivo, sua abordagem inicial resulta em ganhos para a estética
arquitetônica e para o processo construtivo;
• Interface entre arquitetura e estrutura - aspecto determinante e
característico da obra em madeira, obriga a abordagem simultânea da
solução estrutural com o projeto de arquitetura e exige conhecimento
prévio do comportamento dos sistemas estruturais em geral; pode e
deve ser atendido em trabalho conjunto com profissionais de cálculo de
estruturas e da construção em madeira.
Este trabalho oferece subsídios para o estabelecimento de
procedimentos de projeto por parte dos profissionais interessados no
aprofundamento no rico tema da construção em madeira, que assim estarão
aptos a contribuir para uma maior divulgação de suas potencialidades e para
um maior aprimoramento deste setor em nosso país.
176
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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