Portanto, se alguém nos acometer com palavras desta natureza: Por que Deus no início
predestinou alguns à morte, os quais, como ainda não existissem, não podiam ainda ser
1 Membro da Primeira Igreja Batista de Dourados. Mestrando em Teologia – Miami International Seminary.
merecedores de juízo de morte, à guisa de resposta lhes indaguemos, por nossa vez, se
pensam que Deus deve algo ao homem, caso o queira estimar por sua própria natureza?
Como estamos todos infeccionados pelo pecado, não podemos deixar ser odiosos a Deus, e
isso não por crueldade tirânica, mas por razão de justiça mui eqüitativa. Porque, se todos
são passíveis de juízo de morte, por condição natural, os que o Senhor predestina à morte,
pergunto de que iniqüidade sua para consigo, se hajam de queixar-se?2
Continua o reformador:
Ora, se nós não estamos realmente envergonhados do Evangelho, precisamos
necessariamente reconhecer o que está nele abertamente declarado: que Deus, por sua
eterna bondade (para a qual não houve nenhuma causa senão seu próprio propósito),
nomeou aqueles que quis para a salvação, rejeitando todos os demais; e que aqueles a quem
ele abençoou com essa livre adoção para serem seus filhos ele ilumina pelo seu Santo
Espírito, para que possam receber a vida que lhes é oferecida em Cristo; enquanto que
outros, continuando de vontade própria em descrença, são deixados destituídos da luz da
fé, em escuridão total. 3
Dr Sproul emite o parecer:
A teologia reformada clássica rejeita a doutrina de ultimação igual4. Embora alguns tenham
rotulado essa doutrina de "hipercalvinismo", eu prefiro chamá-la de "subcalvinismo", ou, até
mais precisamente, "anticalvinismo”. Ainda que o calvinismo certamente mantenha uma
espécie de predestinação dupla, ela não abraça a ultimação igual. A visão reformada faz
uma distinção crucial entre os decretos positivos e negativos. Deus decreta positivamente a
eleição de alguns e negativamente decreta a reprovação de outros. A diferença entre positivo
e negativo não se refere ao final (conquanto o resultado de fato seja ou positivo ou negativo),
mas à maneira pela qual Deus faz acontecer seus decretos na História. 5
Francis Turretin diz:
Segundo essa ordem, o primeiro decreto relativo a nos diz respeito a criação do homem. O
segundo diz respeito a permissão de sua queda, pela qual ele arrastou consigo a ruína e
destruição toda sua posteridade. O terceiro diz respeito à eleição para a salvação de alguns
dentre a raca humana caída e ao abandono dos demais a sua corrupção e miséria naturais.
O quarto diz respeito ao envio de Cristo ao mundo como Mediador e fiador dos eleitos.
Havendo apaziguado a justiça de Deus por sua perfeitíssima obediência, Cristo obteve
somente para eles a plena salvação. O quinto diz respeito a sua vocação eficaz pela
pregação do evangelho e pela graça do Espirito Santo, dando-lhes fé, justificação,
santificação e, por fim, glorificação6
Assim também está nos Cânones de Dort:
7. Esta eleição é o imutável propósito de Deus, pelo qual Ele, antes da fundação do mundo,
escolheu um número grande e definido de pessoas para a salvação, por graça pura. Estas
são escolhidas de acordo com o soberano bom propósito de sua vontade, dentre todo o
gênero humano, decaído pela sua própria culpa de sua integridade original para o pecado
e a perdição. Os eleitos não são melhores ou mais dignos que os outros, porém envolvidos na
Portanto, como já observado por Francis Turrentin, a ordem correta dos decretos é essa:
4 – O envio de Cristo.
1 – Deus cria.
2 – Deus elege uns para serem salvos e outros para serem condenados.
3 – Decreta a queda.
Quando falamos desses decretos, estamos falando de uma ordem lógica, não cronológica,
dos decretos divinos que refletem a intenção de Deus e posteriormente a execução ou não dessa
primeira vontade. Essa ordem lógica é estabelecida na eternidade. Visto que na eternidade não há
tempo, então não se pode ter antes e depois, logo, embora todos estejam em um mesmo ato,
logicamente podem se distinguir em uma ordem, assim como são os números, que existem todos em
um só ato, mas logicamente obedece uma ordem, pois o numeral 1 vem antes do numeral 2, que é
antes do numeral 3 e assim sucessivamente. Todos estamos de acordo que deve-se existir uma
ordem lógica, e uma vontade antecedente com relação aos fins da vontade de Deus, e uma vontade
consequente na providência dos meios para alcançá-la. No calvinismo, a vontade antecedente é a
intenção de Deus, e a vontade consequente é a providência dos meios para alcançar tal intenção. Os
meios são garantidos pelos decretos, onde está a vontade absoluta de Deus, chamada vontade
consequente. Assim, se Deus queria como fim a salvação dos eleitos (vontade antecedente), ele
então decreta os meios para que isso se execute e por isso, com uma vontade consequente ele
decreta uma graça irresistível sobre os eleitos, assim infalivelmente se alcança o fim.
Normalmente não há discordâncias sobre o primeiro decreto, que seria o de criar. Mas há
uma discordância entre o 2 e 3 decreto. Deus elege e reprova antes da queda ou depois da queda na
ordem lógica dos decretos? A Escritura é clara quanto a isso, pois nunca apresenta os eleitos como
pessoas não caídas. Como São Paulo afirma: Ele vos vivificou, estando vós mortos nos vossos
delitos e pecados, nos quais outrora andastes, segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe
das potestades do ar, do espírito que agora opera nos filhos de desobediência, entre os quais todos
nós também antes andávamos nos desejos da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos
pensamentos; e éramos por natureza filhos da ira, como também os demais.
Mas Deus, sendo rico em misericórdia, pelo seu muito amor com que nos amou,
estando nós ainda mortos em nossos delitos, nos vivificou juntamente com Cristo {pela graça sois
salvos}, (Ef 2.1-5). Nós éramos filhos da ira, mas se fomos amados eletivamente antes da queda,
então é impossível que tenhamos sido filhos da ira algum dia. Deus jamais levaria em consideração
qualquer pecado, pois teríamos sido amados independente de nossos pecados. Mas esse não é o
ensino cristão. O ensino cristão diz que somos amados apesar de nossos pecados, não independente
deles, pois São Paulo afirma: Porque Cristo, estando nós ainda fracos, morreu a seu tempo pelos
ímpios.Porque apenas alguém morrerá por um justo; pois poderá ser que pelo bom alguém ouse
morrer. Mas Deus prova o seu amor para conosco, em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda
pecadores. (Rm 5.6-8), ou seja, a prova do amor de Deus para conosco é que APESAR de
pecadores, Cristo nos amou, mas o texto diz mais, ele diz que essa é a prova de que Deus nos amou,
portanto, uma eleição sem precisão de queda, é uma eleição sem misericórdia e sem amor e também
sem justiça, visto que, os reprovados, são reprovados sem pecado, eles simplesmente seriam criados
para serem destruídos. A Escritura continua a afirmar que fomos escolhidos dentre a massa caída:
Se fosseis do mundo, o mundo amaria o que era seu; como, todavia, não sois do mundo, pelo
contrário, dele vos escolhi, por isso o mundo vos odeia (Jo 15.19). Turretin explica que a eleição
dos homens e feita em Cristo (Ef 1.4). Por isso ela considera o homem já caído, porque ele não pode
ser eleito em Cristo exceto para ser redimido e santificado por ele. Portanto, são escolhidos
pecadores e miseráveis.
Eleger e reprovar só faz sentido se for depois da queda, pois, somos eleitos para sermos
salvos, e seremos salvos de que se ainda não há queda? E seremos reprovados pelo que se ainda não
há pecado?