Você está na página 1de 72

http://alvarocpestana.googlepages.

com

Exegese e Hermenêutica:
Resumos, roteiros de estudo e leitura.
2010
[1ª edição]

Álvaro César Pestana


alvarocpestana@gmail.com

(C) 2010 Álvaro César Pestana


Todos os direitos reservados
Campo Grande, MS
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

Copyright (C) 2010 de Álvaro César Pestana


Todos os direitos reservados

Este material pode ser usado e copiado (mecânica ou eletronicamente) desde que não seja
para fins comerciais. A distribuição deverá ser gratuita ou, no máximo, sob o custo da impressão.
Se forem necessárias mais que 100 cópias, deverá haver uma permissão por escrito deverá ser
obtida do autor. Abaixo deste número e nas condições acima, o material pode ser copiado e usado.
Pode ser usado para estudos individuais ou em Seminários, Escolas Dominicais, Grupos de Estudo
etc.

A integridade do texto e das idéias do autor deverão ser preservadas, de modo que qualquer
‘edição’ da presente obra, seja com acréscimos ou cortes de materiais, só poderá ser realizada com
permissão por escrito do autor.

Este material está à em http://alvarocpestana.googlepages.com . Se houver interesse de


disponibilizar o material em outro endereço eletrônico, o autor deverá ser contatado.

Para contatos com o autor ou pedidos de permissão de uso/divulgação:


alvarocpestana@gmail.com e (67) 3029-7960.

2
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

ÍNDICE

Dedicatória 04

Apresentação 05

LIVRO I – ROTEIRO E RESUMO DO LIVRO


“Do Texto à Paráfrase” – Bryan Jay Bost & Álvaro César Pestana 06
Roteiro de estudo em uma página 07
UNIDADE I – INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS BÍBLICOS 08
UNIDADE II – PANORAMA DA METODOLOGIA 08
UNIDADE III – O TEXTO 09
UNIDADE IV – O CONTEXTO 10
UNIDADE V – AS PALAVRAS 11
UNIDADE VI – AS IDÉIAS 12
UNIDADE VII – A PARÁFRASE 13

LIVRO II – HERMENÊUTICA NA PÓS-MODERNIDADE


Notas da leitura de “Há um significado neste texto?” de K. Vanhooser 14
BIBLIOGRAFIAS 15
O PÓS-MODERNISMO 16
HISTÓRIA DO PROBLEMA HERMENÊUTICO 18
DIFICULDADES PÓS-MODERNAS EM MATÉRIA DE HERMENÊUTICA 20
NOSSAS DIFICULDADES EM MATÉRIA DE HERMENÊUTICA 22
OS “4Ds” DA HERMENÊUTICA PRÁTICA 23

LIVRO III – PROVÉRBIOS DOS EXEGETAS


Uma coletânea de princípios de interpretação bíblica 24
PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO BÍBLICA 25
PRINCÍPIOS LÓGICOS DA LEITURA DA BÍBLIA 32
PRIMEIROS PRINCÍPIOS LÓGICOS PARA A LEITURA DA BÍBLIA 33
FRASES PROVERBIAIS DOS EXEGETAS BÍBLICOS 34
SETE REGRAS DA EXEGESE RABÍNICA 46
AS SETE REGRAS DE AGOSTINHO PARA A ALEGORIZAÇÃO 53
PROVÉRBIOS DA CRÍTICA TEXTUAL 54
PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO BÍBLICA [RESUMO] 56

Anexos: 58
Hermenêutica no Aconselhamento Pastoral – de Linda S. T. C. Pestana 59
Resumo do artigo – D. A. Carson – Devo eu aprender a interpretar a Bíblia? 60
Qual o papel do Espírito Santo na Interpretação Bíblica (K. Vanhooozer) 61
O papel das Escrituras na ética de Paulo (Richard B. Hays) 62
Exegese – resumo e adaptação de um artigo de A. J. Malherbe 63
Exegese – esboço do artigo de A. J. Malherbe 68

Descrição da disciplina: Exegese e Hermenêutica – SerCris – 2010 72

3
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

Dedicatória

Para Linda

4
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

APRESENTAÇÃO

É com prazer que disponibilizo a um amplo público esta apostila, originalmente destinada aos meus
alunos nas disciplinas de Exegese e Hermenêutica nos cursos livres para obtenção do grau de Bacharel em
Teologia. Ela é uma ferramenta auxiliar ao livro “Do Texto à Paráfrase: como estudar a Bíblia” que tenho
usado como manual de estudos para esta disciplina.
Esta apostila envolve 4 grandes blocos de material que poderiam ser publicados separadamente, mas
que tratam, todos, da mesma preocupação: a compreensão dos textos bíblicos por meio da exegese e da
hermenêutica.
Chamei de “Livro I” ao resumo em forma de esboço do meu livro em co-autoria com Bryan J. Bost.
“Do Texto à Paráfrase: como estudar a Bíblia” (São Paulo, Editora Vida Cristã, 1992). O formato de esboço
permitirá ao aluno perceber melhor a seqüência metodológica e, depois, reproduzi-la.
O “Livro II” é fruto de leitura e anotação na obra de Vanhoozer. Utilizei-me deste material ao
ensinar uma disciplina de Exegese na Pós-Modernidade no seminário teológico EBNESR em Boa Viagem,
Recife.
O “Livro III” é um projeto e uma “coleção” antiga. Provavelmente, ainda não está acabado e se Deus
assim quiser e permitir, darei a estes “ossos” um formato mais orgânico no futuro. Trata-se de uma
compilação de várias listas de “princípios de interpretação da Bíblia”. Não poderia haver muita originalidade
nisto, pois a formulação de “princípios e regras” para a exegese e hermenêutica é tão antigo como a própria
escrita. Contudo, acredito que o agrupamento destes princípios e o exercício de reflexão crítica sobre os
mesmos só enriquecerá os exegetas.
Os anexos finais são pequenas contribuições de vários autores que fiz questão de incluir, já que os
tinha a mão, ou por ter feito um resumo deles, ou por ter utilizado suas idéias. Espero que sejam úteis a
alguém de alguma forma.
O sílabo da disciplina, ao fim desta apostila, sugere uma bibliografia mínima. Para os que desejarem
mais informação bibliográfica consultem http://alvarocpestana.googlepages.com.
Acredito que muitas falhas devem ter passado sem correção nesta primeira edição. Agradeço a todo
aquele que puder me informar destes erros para uma futura correção do material.
Que este texto possa ajudar no estudo do mais sublime estudo que Deus nos deixou para fazer. A
Deus seja a glória e a honra, por meio dos méritos de seu Filho, nosso Senhor Jesus Cristo, no poder e
eficácia do Santo Espírito. Assim seja!
Álvaro César Pestana
SerCris – Escola de Treinamento para o Serviço Cristão
Campo Grande, MS
Fevereiro de 2010

5
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

UNIDADE I

ROTEIRO E RESUMO DO LIVRO


“Do Texto à Paráfrase”
de
Bryan Jay Bost & Álvaro César Pestana

6
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana
EXEGESE E HERMENÊUTICA: Como estudar a Bíblia
SerCris - 2010
1. TEXTO
TAREFA: Estabelecer o trecho a ser estudado.
1. Verificar variações textuais
2. Verificar variações de tradução
3. Verificar a natureza e estrutura do texto
4. Verificar o vocabulário do texto [se necessário]
FERRAMENTAS:
1. Textos originais
2. Versões bíblicas
3. [Dicionário português]
MÉTODO:
1. Leituras repetidas do texto
2. Consulta a versões
3. Consulta a dicionário [se necessário]
2. CONTEXTO
TAREFA: Entender o ambiente do texto bíblico.
1. A época
2. A Bíblia
3. O Testamento
4. O livro
5. O capítulo
6. O parágrafo
TAREFA: Responder as questões:
1. Quem?
2. Para quem?
3. Quando?
4. Onde?
5. Como?
6. Por que?
FERRAMENTAS:
1. Bíblia
2. Concordância bíblica
3. Livros de introdução, enciclopédias, dicionários, manuais, ...
3. PALAVRAS
TAREFA: Descobrir o sentido das palavras
1. Vocabulário bíblico
2. Maior compreensão
FERRAMENTAS:
1. Concordância bíblica
2. Léxicos das línguas originais
3. Dicionários bíblicos
MÉTODO:
1. Escolher as palavras a estudar
2. Usar estudos anteriores
3. Usar ferramentas na ordem acima
4. IDÉIAS
TAREFA: Explorar as idéias, temas, doutrinas do texto.
FERRAMENTAS:
1. Memória [conversas, meditação, etc]
2. Concordância bíblica
3. Referências em Bíblias
4. Sinopses e textos paralelos
5. Dicionários bíblicos
6. Comentários bíblicos
7. Monografias
MÉTODO:
1. Colecionar e relacionar referências
2. Coordenar o trabalho anterior
3. Ver e aproveitar idéias de outros
5. PARÁFRASE
TAREFA: Verificar o que entendeu do texto.
1. Esboço/anotações
2. Aula/sermão
3. Artigo/monografia
MÉTODO:
1. Resumir e organizar o material
2. Entender e explicar com suas palavras
3. Aplicar o texto

7
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

EXEGESE E HERMENÊUTICA BÍBLICAS


2010
UNIDADE I - INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS BÍBLICOS.
01 - O estudo bíblico no ministério de Jesus e da igreja. -------- Lc 4.14-22; 24.27,32,44
02 - O problema da "desnutrição" espiritual. --------------- Hb 5.11-6.3
03 - A importância de saber estudar a Bíblia:
3.1 - Para não absorver a "teologia" de outros. ----- O caso da doutrina do batismo nas "ADs".
3.2 - Para não depender de maus comentários e exegetas. ------- Parábola do fermento no CBMoody.
3.3 - Para ter a Bíblia como critério da verdade. ------------------- Tradição X Verdade Bíblica.
3.4 - Para abandonar o sentido "tradicional" dos textos. -------- O uso de "batismo" no meio religioso.
3.5 - Para não usar a Bíblia como "texto-prova". --- Texto sem base na intenção do texto - Am 6.5.
3.6 - Para não ser "eclético", dando vários sentidos ao texto. ------- E. G.: W. Barclay
3.7 - Para cumprir a vontade de Deus. ------------------- 2 Tm 3.14-17
04 - O método histórico-crítico.
HISTÓRICO --------------- CRITICO ---------------GRAMATICAL
05 - Exegese e hermenêutica.
GREGO: evxhge,omai = exegeomai << evk + h`ge,omai = ek + hegeomai Î EXEGESE
GREGO: e`rmhnei,a = hermeneia , e`rmhneu,w = hermeneuo Î HERMENÊUTICA
06 - Pressuposições no estudo bíblico.
O importante é ter as mesmas pressuposições dos autores originais. Isto se alcança por "aproximações
sucessivas".
07 - Os resultados de um bom estudo bíblico:
7.1 - Mais fé. Rm 10.7; Hb 11.1; Lc 1.4
7.2 - Mais o que dizer.
7.3 - Certeza de ensinar a sã doutrina.
7.4 - Mais condições de continuar.
7.5 - Mais influência do Espírito Santo. Ef 5.18//Cl 3.16
08 - Perigos envolvidos nos estudos: Ec 12.12-14
8.1 - Perder a fé.
8.2 - Ser inútil.
8.3 - Ficar orgulhoso.
8.4 - Querer ser original demais.
09 - A qualidade dos estudos bíblicos. 2 Tm 2.15
"APLICA-TE TOTALMENTE AO TEXTO;
APLICA-O TOTALMENTE A TI."
(J.A.Bengel-1734)
avnakri,nw = anakrino [At 17.11] evrauna,w = eraunao [Jo 5.39] evxerauna,w = exeraunao [1Pe 1.10]
10 - A palavra de Deus e a nossa palavra. ------- 2 Tm 3.16-17; Rm 15.4
11 - Incertezas e inescrutabilidade. ------- Dt 29.29
12 - A orientação divina no estudo. ------- Tg 1.5-6
13 - Nossa tarefa e compromisso. ------ At 8.30-35 #1 ler #2 compreender #3 explicar

UNIDADE II - PANORAMA DA METODOLOGIA.


PARÁFRASE
IDÉIAS
PALAVRAS
CONTEXTO
TEXTO
"Quem não tem método, sempre tem um método".
Já que sempre há um método, é melhor que ele seja consciente e analisado para ser eficaz e verdadeiro.

8
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

UNIDADE III - O TEXTO.


Introduzir falando da história do texto hebraico e grego, da Bíblia.
01 - Definição: Texto é a passagem ou texto bíblico que vai ser estudado.
Latim: TEXTERE = tecer; TEXTUS - o tecido, a trama.
02 - Etapas de trabalho:
2.1 - Verificar variações textuais Mt 21.28-32; 1 Jo 5.7-8; Cl 1.14; 3.6
2.2 - Verificar variações de tradução Cl 2.15; 4.5.
Estabelecer o texto certo, ou seja, o texto (em português) que melhor representa o conteúdo da mensagem
que o autor queria transmitir.
a. Consultar os textos originais (se possível), ou seja, o texto grego (NT) ou o texto hebraico (VT).
Certificar-se da melhor tradução e dos possíveis problemas textuais envolvidos (Variações e/ou diferenças
nos manuscritos originais).
b. Ler e comparar várias traduções da Bíblia verificando as possíveis variações devidas a problemas textuais
ou as diferentes formas de compreensão do texto pelos tradutores.
2.3 - Verificar a natureza ou estrutura do texto.
Estabelecer a natureza ou estrutura do texto, ou seja, compreender que tipo de material temos em mãos, qual
a forma de sua apresentação, relações gramaticais e sintáticas, recursos literários usados pelo autor.
a. Observe a divisão de parágrafos e frases. Cl 1.13-20; 4.1.
VT NT
CAPÍTULOS Mordecai Nathan (1445) Estevão Langton (1227)
VERSÍCULOS Athias (1661) Roberto Estevão (1551)
PARÁGRAFOS Editores da Bíblia de Genebra (séc. XVI-XVII).
VERSÍCULOS* SANTES PAGNINI** (1527) ROBERTO ETIENNE(1551)
*De acordo com W. Gruen (O tempo que se chama hoje) pág. 31.
**Frade dominicano que inspirou-se nos trabalhos dos massoretas, também fez divisão de versos para o NT,
mas por serem muito longos, prevaleceu a feita por Estevão.
b. Observe as partículas de conexão como: "pois", "portanto", "mas", etc.
Observe a forma: poesia, prosa, parábola, narração, discurso, profecia, alegoria, visão, figuras de linguagem,
simbolismo, comparações, contrastes, exortação, ensino doutrinário, ensino prático, epístola, provérbio,
salmo, citação, etc ... Observe a ligação do texto com o contexto, procurando ver qual a sua contribuição para
a estrutura.
2.4 - Verificar o vocabulário do texto (se necessário).
Consultar um dicionário da língua portuguesa, assegurando-se de ter uma compreensão inicial do texto. Esta
compreensão será corrigida por estudos posteriores.
2.5 - Leituras repetidas do texto bíblico são a melhor base para o conhecimento do texto.
2.6 - O uso de uma concordância bíblica pode ajudar a encontrar estruturas e construções gramaticais
semelhantes as do texto sob estudo.
03 - Ferramentas para o estudo do texto.
3.1 - Textos originais (edições críticas).
3.2 - Traduções da Bíblia.
3.3 - Gramáticas (línguas originais e portuguesa).
3.4 - Dicionários da língua portuguesa.
3.5 - Concordância bíblica.
CRITICA TEXTUAL:
Externa: #1 Idade do MSS; #2 Idade do texto: #3 Família do MSS/Texto (Geo/Hist).
Interna: #1 O modo do autor; #2 O escriba.

Princípios: #1 O que mais se adapta e que tem menos possibilidade de engano; #2 O mais difícil; #3 O mais
breve; #4 Oriental melhor que clássico; #5 Estilo, plano e contexto; 6 A que explica as outras; #7 A mais
feia; #8 A mais em desacordo (paralelos).

9
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

UNIDADE IV - O CONTEXTO.
01 - Manuseio honesto do texto no contexto.
02 - Definição: Contexto é ambiente da passagem bíblica. Ele é composto pelos versículos anteriores e
posteriores, no livro estudado. É o mundo que rodeia a passagem, sendo também o mundo dos escritores e
leitores do texto. O contexto contém elementos históricos, culturais, literários, lingüísticos, etc. Ele pode ter
vários níveis como: o contexto histórico (da narrativa), o contexto literário (do livro) e o contexto do autor e
dos leitores.
Nota: Os tipos de contexto para um mesmo texto:
Gn 12 - A chamada de Abraão.
O contexto histórico de Abraão (aprox. 2000 a.C.)
O contexto histórico de Moisés e Israel (aprox. 1400 a.C.)
O contexto literário em Gênesis e na Toráh (aprox. 1400 a.C.)
Mt 18 - A parábola do credor incompassivo.
O contexto histórico da estória
O contexto histórico de Jesus
O contexto histórico de Mateus e da igreja
O contexto literário do texto no Evangelho de Mateus.
Daniel 7 - A visão dos animais e do Filho do homem
O contexto historico-cultural de Daniel
O contexto literário do texto no livro
O contexto histórico do cumprimento da profecia
03 - Importância do contexto.
3.1 - Ajuda a não torcer a palavra de Deus. 2 Pe 3.16
3.2 - O sentido correto vem do contexto. Mt 3.11 e At 2.1-4
3.3 - O sentido correto das palavras vem do contexto. Tg 2.24 e Ef 2.8-9
3.4 - É a garantia da verdade.
3.5 - Textos ficam difíceis quando não sabemos o contexto. 2 Ts 2.3-8
04 - Etapas de trabalho.
4.1 - Época e o mundo do autor/leitores/fatos narrados. Ex 23.19; Dt 22.5
4.2 - A Bíblia como um todo. At 15.20-21
4.3 - O Testamento. Revelação progressiva Is 7.14
4.4 - O livro. Eclesiastes 1Ts 5.27 Cl 4.16; Metáfora do corpo Ef+Cl//Rm+Co
4.5 - O capítulo. 1 Co; Fp 3.2.
4.6 - O parágrafo. 1 Tm 5.20; 1 Tm 2.11-12; Lc 14.28-32
05 - Perguntas para determinar o contexto.
5.1 - Quem ? (escreveu, falou, é retratado)
5.2 - Para quem ? (foi escrito, dirigido)
5.3 - Quando ? (foi escrito, aconteceu)
5.4 - Onde ? (foi escrito, aconteceu)
5.5 - Como ? (foi escrito, falou)
5.6 - Por que ? (registrou, fez, sentiu, falou, etc)
06 - Ferramentas no estudo do contexto.
6.1 - Bíblia.
6.2 - Concordância bíblica.
6.3 - Introduções, manuais, enciclopédias, dicionários ...
NOTA: O uso da concordância bíblica:
1. Localizar textos; por uma palavra
2. Sistematizar idéias; uma palavra e correlatas
3. Contribuição lingüística; definir uso de termos
4. Uso gramatical; repetição de estruturas
5. Contribuição teológica; temas e expressões chave
6. Informações do contexto histórico; geografia, história, cultura
7. Informação biográfica. personagens

NOTA: A HISTÓRIA DOS DOIS LIVROS

10
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

UNIDADE V - AS PALAVRAS.
01 - Definição: O estudo das palavras é a atividade de descobrir, exemplificar e explicar o sentido de uma
palavra do texto bíblico.
02 - Importância do estudo das palavras.
2.1 - Diferenças de significado das palavras ...
... do sentido bíblico para o moderno.------------------------- santo
... de autor para autor.------------------------------------------- fé/obras
... de Testamento para Testamento.---------------------------- piedade
... do sentido original para o sentido religioso atual.-------- batismo
... do sentido da época da tradução para o atual.------------- caridade
... de contexto para contexto.----------------------------------- carne
2.2 - Compreensão completa e abrangente das palavras ...
... à luz da história.--------------------------------------------- amor, reino, sacerdócio, unção
... que tem significado técnico.------------------------------ Aba, sacrifício
... que possuem vários significados.------------------------- aliança-testamento
... que são quase intraduzíveis em uma palavra só.-------- At 15.3
... que são pictóricas.------------------------------------------- Fp 1.27
... que possuem sinônimos e antônimos.--------------------- neós x kainos
... que possuem etimologia importante ou instrutiva.------- qadosh
... que são aparentadas a outros vocábulos.------------------ charis // charisma
... que são transliterações.-------------------------------------- presbítero, diácono
03 - Ferramentas para o estudo e ordem de uso das mesmas.
[3.1 - Dicionário português.]
3.2 - Concordância bíblica. LIVRO/AUTOR/PRÓXIMOS/TESTAMENTO/BÍBLIA
3.3 - Léxicos das línguas originais.
[3.4 - Traduções bíblicas.]
3.5 - Dicionários bíblicos.
04 - Como fazer o estudo das palavras.
4.1 - Estudos preliminares: texto/contexto.
4.2 - Uso de ferramentas: na ordem acima, deixando o dicionário bíblico para o fim do estudo das
idéias.
4.3 - Observar qual o sentido melhor para o contexto.
05 - Que palavras escolher para estudar?
5.1 - Doutrinal ou teologicamente importantes.
5.2 - Eticamente importantes.
5.3 - Termos difíceis de entender.
5.4 - Temas chave ou principais para o livro/texto.
5.5 - Dependentes da forma literária.
5.6 - Dependentes de condicionamentos culturais.
5.7 - Palavras que podem ser melhor compreendidas.
5.8 - Tudo que o tempo permitir.
NOTA: Falácias no estudo de palavras (D. A. Carson, A Exegese e as suas Falácias, São Paulo, Ed. Vida Nova):
1-Falácia da raiz = forçando o sentido da raiz ou da origem da palavra.
2-Anacronismos semânticos = sentido do período errado.
3-Obsolescência semântica = sentido obsoleto.
4-Apelo ao desconhecido ou atípico = fuga para um sentido marginal.
5-Descuido ao pano de fundo.
6-"Paralelomania" = uso exagerado de literatura não bíblica.
7-Erro em associar mentalidade e linguagem (Hebr. vs. Gr.).
8-Falsas atribuições de sentido técnico.
9-Problemas com sinônimos e equivalentes em uma análise.
10-Uso preconceituoso e seletivo da evidência.
11-Disjunções e restrições semânticas descuidadas.
12-Restrições descuidadas de campo semântico.
13-Adoção descuidada de campo semântico expandido.
14-Problemas relativos ao pano de fundo semítico do NT grego.
15-Negligência em diferenciar "corpos de escritos".
16- Ligação descuidada entre sentido e referência.

11
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

UNIDADE VI - AS IDÉIAS.
01 - Definição: Idéias são assuntos, temas, doutrinas, expressões, ilustrações, referências, etc. que ocorrem
mo texto sob estudo e em outros lugares da Escritura. O estudo das idéias baseia-se no fato de que as
palavras e os conjuntos de palavras são um veículo da transmissão de idéias que estão além das próprias
palavras. Desta forma, pelo estudo das idéias busca-se a compreensão do pensamento do texto bíblico.
02 - Importância do estudo das idéias.
2.1 - Deixar a Bíblia interpretar a Bíblia.
2.2 - Dar flexibilidade ao estudo bíblico. ------ vocabulário não uniforme
2.3 - Dar importância aos temas centrais do texto.
2.4 - Perceber a interligação dos temas bíblicos. [estudo de batismo ou serviço; descrições de caráter]
2.5 - Trabalhar pressuposições teológicas dos escritores.
2.6 - Sistematizar o estudo bíblico sobre um assunto.
2.7 - Verificar a verdade de nossas conclusões. ------ não tirar conclusões desequilibradas
03 - Como fazer o estudo das idéias.
3.1 - Buscando referências bíblicas:
a. Na memória; ------ reflexão, meditação.
b. Na concordância bíblica;
c. Nas referências em Bíblias (ARA, ARC, BJ, Nestle);
d. Sinopses e textos paralelos.
3.2 - Consultando dicionários bíblicos.
3.3 - Consultando comentários bíblicos.
3.4 - Consultando monografias.
04 - Os resultados do estudo das idéias.
4.1 - Contribuição de novos dados para todos os estudos anteriores.
4.2 - Desenvolvimento das idéias propriamente ditas.
Nota: O texto de Nestle-Aland-27 [Margem externa e interna]:
1. Míni-concordância
2. Informação histórica
3. Sinopse em miniatura
4. Idéias correlatas
5. Ligações interessantes
6. Sinopse de Eusébio
7. Divisão em parágrafos [Ed. #25]
8. Comparação de edições críticas [apêndice]
9. Lista de manuscritos [apêndice]
10. Lista de citações/alusões [apêndice]

12
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

UNIDADE VII - A PARÁFRASE.


Grego: parafra,zw = paraphrazo << para, + fra,zw = para+ phrazo
Vida nos ossos secos Ez 37.1-14
01 - Definição: Paráfrase é o resultado do estudo que fizemos. Parafrasear é traduzir e explicar o texto nas
suas próprias palavras. É também aplicar a passagem às necessidades atuais, com fidelidade à mensagem e
intenção originais. A paráfrase é muitas vezes apresentada na forma de uma aula, sermão ou estudo (oral ou
escrito). Paráfrase é fazer a EXEGESE passar pela HERMENÊUTICA.
02 - Importância da paráfrase.
2.1 - Verificar se realmente entendemos o texto.
2.2 - Organizar e resumir as idéias principais.
2.3 - Ser compreensível a todos.
2.4 - Ilustrar a verdade.
2.5 - Ser prático com respeito à verdade bíblica.
2.6 - Falar sobre coisas importantes e interessantes.
2.7 - Ser objetivo.
2.8 - Fazer uma síntese do estudo.
03 - Como fazer a paráfrase.
3.1 - O segredo de uma boa paráfrase é um bom estudo.
3.2 - Preservar as idéias originais.
3.3 - Traduzir, explicar, contextualizar.
3.4 - Dialogar com o texto.
3.5 - Corrigir a pré-compreensão do texto.
3.6 - Priorizar a mensagem, aproveitando o veículo, se possível.
3.7 - Aplicar o texto na atualidade.
3.8 - Resumir e organizar.

13
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

UNIDADE II

HERMENÊUTICA NA PÓS-MODERNIDADE
Notas da leitura de
“Há um significado neste texto?”
de
Kevin Vanhoozer

14
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

HERMENÊUTICA BÍBLICA
E O PÓS-MODERNISMO
BIBLIOGRAFIAS

Bibliografia em português:
VANHOOZER, Kevin, HÁ UM SIGNIFICADO NESTE TEXTO? INTERPRETAÇÃO BÍBLICA: OS
ENFOQUES CONTEMPORÂNEOS, São Paulo, Ed. Vida, 2005.
GRENZ, Stanley J., PÓS-MODERNISMO: UM GUIA PARA ENTENDER A FILOSOFIA DE NOSSO TEMPO,
São Paulo, Ed. Vida Nova, 1997.
SALINAS, Daniel & ESCOBAR, Samuel, PÓS-MODERNIDADE: NOVOS DESAFIOS À FÉ CRISTÃ, (2ª
edição), São Paulo, ABU Editora, 2002.

Bibliografia adicional:
BEEKMAN, John & CALLOW, John, A ARTE DE INTERPRETAR E COMUNICAR A PALAVRA ESCRITA:
TÉCNICAS DE TRADUÇÃO DA BÍBLIA, São Paulo, Edições Vida Nova, 1992.
BERGER, Klaus, AS FORMAS LITERÁRIAS DO NOVO TESTAMENTO, São Paulo, Loyola, 1998.
BERKHOF, Louis, PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO BÍBLICA, Rio de Janeiro, JUERP, 1981.
BOST, Bryan Jay & PESTANA, Álvaro César, DO TEXTO À PARÁFRASE: COMO ESTUDAR A BÍBLIA, São
Paulo, Editora Vida Cristã, 1992.
CARSON, D. A., A EXEGESE E SUAS FALÁCIAS, São Paulo, Edições Vida Nova, 1992.
FEE, Gordon D. & STUART, Douglas, ENTENDES O QUE LÊS? UM GUIA PARA ENTENDER A BÍBLIA
COM O AUXILIO DA EXEGESE E DA HERMENÊUTICA, São Paulo, Edições Vida Nova, 1984.
HENRICHSEN, Walter A., PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO DA BÍBLIA, São Paulo, Editora Mundo Cristão,
1980.
HENRICHSEN, Walter A., MÉTODOS DE ESTUDO BÍBLICO, São Paulo, Editora Mundo Cristão, 1980.
RICOEUR, Paul, ENSAIOS SOBRE A INTERPRETAÇÃO BÍBLICA, São Paulo, Novo Século, 2004.
TENNEY, Merril C., GÁLATAS, ESCRITURA DA LIBERDADE CRISTÃ, São Paulo, Edições Vida Nova, 1967.
VIRKLER, Henry A., HERMENÊUTICA, São Paulo, Editora Vida, 1973.
WEGNER, Uwe, EXEGESE DO NOVO TESTAMENTO: MANUAL DE METODOLOGIA, São Leopoldo & São
Paulo, Sinodal & Paulus, 1998.

15
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

O pós-modernismo1
Introdução:
O termo “pós-moderno” foi utilizado pela primeira vez em 1930, mas adquiriu importância em 1970. Primeiro
descrevia um novo estilo arquitetônico, depois para novas teorias de algumas das ciências humanas e, finalmente, para
descrever um movimento cultural mais amplo.
O pós-modernismo define-se tanto como “um deslocamento para além do modernismo” como também como “uma
rejeição da atitude mental moderna”.
Discussão:

I. O MODERNISMO
• é filho da Renascença e do Iluminismo.
• acredita na razão (“Penso, logo existo!”) – o homem é um ser pensante. A centralidade da mente humana
elevou e derrubou o homem.
• também crê que a razão consegue compreender o mundo e transformá-lo para o bem do homem.
• supõe que “o conhecimento é preciso, objetivo e bom” e também que ele é acessível à mente humana.
• para ele, liberdade e individualidade são valores importantes.
• O movimento evangélico aproveitou a ênfase no pensamento científico, na abordagem empírica e o senso
comum do modernismo. Precisa abandonar o modernismo para não afundar com ele.

II. A CRÍTICA PÓS-MODERNA AO MODERNISMO


Os primórdios:
ƒ Nietzsche (1844-1900) iniciou o processo de crítica ao modernismo que só chegará a ser generalizado nos
anos 70.
Epistemologia:
ƒ O pós-modernismo questiona as suposições centrais da epistemologia iluminista. O otimismo moderno
transformou-se em pessimismo corrosivo.
ƒ Não há mais crença no progresso inevitável.
ƒ A “desconstrução” trabalha sobre um preceito dos ‘estruturalistas’, que afirmavam que a linguagem é uma
construção social (oral/escrita) que ajuda a dar sentido e estrutura para a existência humana.
ƒ Rorty nega que verdade seja estabelecida por ‘correspondência’ com a realidade, mas apenas pela
coerência interna das afirmações. Não há verdade, mas apenas interpretações.
ƒ Não há uma ‘metanarrativa’, ou seja, uma narrativa que seja capaz de unir os seres humanos em um único
‘povo’.
ƒ “Genealogia” é um meio de descobrir como uma idéia se formou e, assim, demoli-la e relativizá-la.
[Foucault]
ƒ “Desconstrução” usar o texto de modo que discurse contra si mesmo [ou pelo menos contra as
interpretações tradicionais] [Derrida]
Cosmovisão:
ƒ Os desconstrutores dirão que “o significado não é inerente ao texto em si, dizem eles, emerge apenas à
medida que o intérprete dialoga com o texto”. Cada um lê o texto e a realidade como quer e como pode –
cada um tem sua perspectiva única. Há muitas leituras da sociedade. Pluralismo.
ƒ “Tudo se resume à diferença”. Não há universo (um todo unificado) – temos apenas ‘multi-versos’. Não
há ‘um mundo lá fora”, mas apenas interpretações.
ƒ O pós-modernismo marca o fim de uma cosmovisão única e universal em favor de um respeito pela
diferença e pela celebração do local e do particular à custa do universal.
ƒ Derrida propõem o abandono da ‘onteologia’ e da ‘metafísica da presença’ – não há verdadeira ontologia
e nem nada que a transceda a realidade: tudo é perspectiva de quem a observa.
ƒ Foucault diz que uma interpretação da realidade é uma declaração de poder. Conhecimento é ato de poder.
Crítica à razão somente:
ƒ Os pós-modernos crêem que as emoções e a intuição também são válidos para o conhecimento além da
razão.
ƒ Os pós-modernos são holísticos contra a suposição Iluminista que apenas o racional é verdadeiro.
Holismo:
ƒ O holismo pós-moderno tem implicações sociais e ecológicas
ƒ Rejeita-se o conceito de verdade objetiva – objetividade não existe. O conhecimento é sempre
condicionado histórica e culturalmente, e sempre incompleto.
ƒ Tudo é relativizado pela sociedade à qual pertencemos [contra o individualismo objetivo do racionalismo].

1
Cito parte da apostila da disciplina “Apologética Cristã” de minha autoria.

16
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

Ética:
ƒ O certo ou errado passa pelo crivo da convenção social.
ƒ A aldeia global foi formada pela informação: retribalização. Com tanta informação disponível, ‘pense
globalmente e aja localmente!” -
ƒ Não há mais centro: ‘heterotopia’ e ‘multiverso’

III. CRISTIANISMO E PÓS MODERNISMO


A. O QUE É VANTAGEM PARA NÓS
1. O fim da ditadura da razão e do cientificismo: não se confia mais na ciência e nem na razão. A
irracionalidade (nova física), o caos e mesmo as limitações da ciência ajudaram. Emoções, intuições e
revelações são fontes válidas da verdade.
2. O fim da ditadura do método científico como única medida da verdade: há limitações no método e
há outras fontes de verdade.
3. O fim do mito que o conhecimento é objetivo e desapaixonado: a fé ou a vontade precede o saber.
4. O fim do mito que o saber é bom e leva ao bem supremo: não é o conhecimento, mas a graça que
salva o homem.
5. O fim da promoção do individualismo e da autonomia humana: precisamos do mundo, dos homens,
da igreja e de Deus.
6. O fim da postura dualista: corpo vs. espírito ou razão vs. sentimentos. Busca-se um holismo: tudo o
que somos será ressurreto por Jesus.
B. O QUE É QUESTÃO A SER DISCUTIDA E COMBATIDA
1. Rejeição das Metanarrativas: não se pode rejeitar a metanarrativa Bíblica de obra de Deus em
Cristo.
2. Relativização e rejeição da verdade [não há verdade, só convenções e linguagem. Tudo que existe
é uma construção por palavras e por ponto de vista.]: temos que afirmar que a verdade pertence a
Deus e em sua revelação, temos o ponto de apoio necessário contra a ‘absoluta’ relativização.
3. Ceticismo e niilismo absolutos: o pós-modernismo veio para demolir e não pensa em nada para
construir. Jesus veio dar esperança.
Conclusão:
O mundo mudou. As perguntas estão mudando. Precisamos dar novas respostas às novas perguntas com base na
revelação bíblica que por sua origem divina, responde ao homem, incenvando-o a fazer as perguntas certas.

17
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

HISTÓRIA DO PROBLEMA HERMENÊUTICO


Mundo Antigo (Cristianismo nasce)
Alegoria e filologia antiga. Filosofia, retórica e gramática.
Antioquia X Alexandria... depois Roma X Constantinopla

Mundo Medieval
Os 4 sentidos da Bíblia:
(i) Sentido literal (ou histórico), que é o óbvio no texto;
(ii) Sentido alegórico, é obtido pela descoberta de um sentido espiritual no texto;
(iii) Sentido moral (tropológico) é o que diz respeito ao comportamento moral e prático;
(iv) Sentido anagógico (do verbo anagein), é o significado oculto, celestial.
Os teólogos pensam o mundo, por razões teológicas.
Anselmo = Creio para que possa entender

Mundo Renascentista (Séc. XIV-XV), Reformado (XVI), Iluminista (Séc. XVIII)


Avó da Modernidade = Renascimento: Volta aos clássicos. Retorno a Aristóteles [menos Platão, mais
Aristóteles].
Reforma: cada um tem direito de ler por si.
Pai da Modernidade = Iluminismo: Ciência é a deusa mãe!
O projeto da Enciclopédia.

Mundo Moderno
Mundo moderno = Creio no que posso entender.

Mundo Pós-Moderno
Mundo pós-moderno = Não creio...
Mundo moderno Mundo pós-moderno
Queda da Bastilha 15h32min de 15 de julho de 1972 – implosão do
Conj. Habitacional Pruitt-Igoe em St. Louis, Missouri
& 1988 – queda do muro de Berlim
Ciências objetivas e absolutas – otimismo!!! Não existe verdade – pessimismo!!! Não existe
O progresso é inevitável – otimismo!!! conhecimento objetivo. A verdade é relativa à
comunidade a que pertencemos
Sementes de Nietzsche (1844-1900)
Estruturalistas diziam que a linguagem é uma Os pós-estruturalistas, desconstrucionistas vão negar
construção social e que a literatura nos prepara e isto. O texto não tem significado, mas apenas é
equipa para compreender e dar sentido à nossa criado quando um intérprete dialoga com ele
realidade social
Homem autônomo, racional como Descarte, Jacques Derrida – abandonar onteologia e metafísica,
mecanicista como Newton, evolucionista como pois não há nada ali.
Darwin, sem alma como Freud Michael Foucault – interpretar a realidade é ato de
poder e violência.
Abandonaram o mundo orgânico Richard Rorty – a verdade é coerência interna e não
Abandonaram a autoridade eclesiástica correspondência com ‘algo’ (não existe ‘algo’).
Ciência e progresso
Razão comanda A razão não é a única fonte de verdades (existem
muitas fontes e muitas leituras)
Individualismo científico – grandes Ênfase na comunidade, ecologia, holismo, no local
(contra o universal).
Ontologia, metafísica e epistemologia Só epistemologia.
Era industrial Era da informação (Informática)
Globalização e internacionalização Globalização e ‘retribalização’
Verdade cientificamente provada Ecletismo e tolerância.
Uniformidade e padronização Diversidade e diversificação
Busca da utopia Aceitação da ‘heterotopia’
Universo Multiverso
“Visão objetivista” “Visão construcionista”
Ética racional Ataque ao moralismo [só convenção]
O mito do progresso, do sucesso, etc... Rejeição de Meta-Narrativas, ou seja, um roteiro ou
O conceito cristão de história (linear) história que dá legitimidade ao viver e agir humano.
“Será verdade?” “Para que serve?” = “Dá prá vender?” = “É

18
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

eficiente?”
Univocacidade Duplicidade (dois níveis)
Ficção X Realidade Ficção // Realidade [mistura]
Ética e onteologia = razão Ética e onteologia = TV
Vendem coisas Vendem experiências
Fim da cultura ocidental (individualismo, capitalismo
e cristianismo)
Colonialismo – superioridade do branco ocidental Pluralismo – “equilibrio ecológico” do pensamento

Características:
• Nova ontologia, epistemologia e hermenêutica
• Rejeição de meta-narrativas (grande relato) [mito] – Criação, Queda, Israel, Jesus, Igreja, Fim.
o Marxismo, Progresso, Democracia liberal, etc...
• Rejeição de verdade
• Rejeição de autoridade [faça como quer – verdade é violência]
• Aceitação da verdade social e pessoal [importância dos sentimentos e emoções]
• Desconstrução: analisar, quebrar em partes e manipular como quer (todos manipulam)
• Genealogia: arma de desconstrução
• Differance:
• Apreciação do narrativo, histórico, artístico, poético, símbolos, sinais, experiências, etc
• Diversidade é melhor que uniformidade

Friedrich Schleimacher (1768-1834)


Interpretação gramatical – as palavras e frases
Interpretação psicológica – o processo mental do autor
Compreender uma obra é entender o processo de sua criação. (romantismo)

Wilhelm Dilthey (1833-1911)


Cosmovisão (Weltanschauung) varia e não é universal.
Contexto determina significado. [Passar bem – depende do contexto]
Horizonte limita compreensão

Martin Heidegger (1884-1976)


Dasein – ser-aí, ser-em.
Verdade é a revelação ou desvelamento do Ser.

Hans-Georg Gadamer
Via média entre duas heresias: objetivismo e relativismo.
Usando Heidegger, Estar-no-mundo, buscar “fusão de horizontes”
A interpretação é uma síntese hegeliana.

NOSSA REAÇÃO
1. Existe uma meta-narrativa universal (existem várias na Bíblia)
2. Concordância em rejeitar a Epistemologia Iluminista
O método científico não é o único
O saber não é objetivo
Saber apenas não é a solução
3. Um evangelho pós-individualista, pós-racionalista, pós-dualista, pós-noeticentrico
4. Avaliar nossa intenção e nossos métodos
5. Viver em comunidade e métodos relacionais e holísticos.

19
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

DIFICULDADES PÓS-MODERNAS EM MATÉRIA DE HERMENÊUTICA


Parte 1 – o problema
A história da crítica literária tem seguido a seguinte ordem: autor, livro, leitor.
Há paralelo com a filosofia: metafísica, epistemologia, ética.
Há relação com a Trindade: Pai, Filho e Espírito.

O PROBLEMA MODERNO DA HERMENÊUTICA


A morte do AUTOR
• Deus morreu, logo, o Autor e os autores morreram!
• A pós-modernidade questiona o postulado que os signos são indicadores confiáveis da real maneira de ser das
coisas.
• Morte de Deus (Séc. XIX) ----> Morte do autor (Séc. XX)
• O autor não existe mais ou está ausente.
• Não se sabe a intenção do autor – só temos o texto.

A morte do LIVRO
• Do estruturalismo: a linguagem e o pensamento depende de oposições binárias (estas não são padronizadas e
iguais para todos)
• Différance – o signo nunca re(a)presenta a presença.
• O leitor faz o sentido. O texto se ajusta à interpretação.
• Contexto determina sentido.
• O texto não tem limites
• Metaforicidade e intertextualidade.
• “Não há nada fora do texto”.

A morte do LEITOR
• O leitor é o autor!
• O que sou dita como leio!
• O texto adapta-se à leitura – adivinhamos o significado
• O que quero determina como leio:
o intenção do autor? – crítica gramático-histórica
o história da composição? crítica das fontes, da tradição, das formas, da redação, etc
o estrutura e formato do texto? crítica literária ou estrutural
o como traduzir o texto? crítica filológica e semântica
o como o texto foi transmitido de forma manuscrita? crítica textual
o funcionamento do texto? crítica retórica
o como o texto se relaciona com seu tempo? crítica histórica
o como o texto mostra ou afeta as estrutruras sociais? crítica sociológica
o ensinos ou pressupostos teológicos do texto? crítica teológica
o modos do texto afetar o mundo? crítica exitêncialista, política, etc
o forma como o texto trata as mulheres? estudo de gênero ou crítica feminista
o como o texto ajuda/atrapalha a mudança social? crítica libertadora ou política
o como o texto pode ser lido de muitas formas? crítica desconstrucionista
• eisegese é o que se faz! não existe diferença entre texto e interpretação
• o leitor é ‘desumanizado’, pois não pode carregar nada, sob pretexto de isenção de leitura
• Resultado: negadores e usuários.
o Os negadores só vão ‘jogar’
o Os usuários vão buscar o que interessa = pragmatismo feroz!!!

20
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

DIFICULDADES PÓS-MODERNAS EM MATÉRIA DE HERMENÊUTICA


Parte 2 – a resposta
A história da crítica literária tem seguido a seguinte ordem: autor, livro, leitor.
Há paralelo com a filosofia: metafísica, epistemologia, ética.
Há relação com a Trindade: Pai, Filho e Espírito.

RESPOSTA: TRINITARISMO INTERPRETATIVO


Deus é aquele que se comunica. Deus é autor, mensagem e poder de recepção. Criação, Encarnação/revelação e
Santificação são possíveis!!! Deus fala e faz! Jesus comunica e leva comunicação. O Espírito transmite e dá capacidade
de compreender. Ele inspirou a redação e ajuda a apropriação da mensagem, seja pela força de sua obra, seja pela
transformação do leitor. A Encarnação mostra que é possível entrar na vida do outro a fim de comunicar e receber
comunicação. A própria Trindade é uma demonstração que não podemos ter conhecimento absoluto, mas que também
não caímos em ceticismo absoluto: podemos ter um certo conhecimento – um ‘fideísmo crítico’ – “creio para entender”.

Não somos deuses! Não somos absolutos. Por outro lado, somos filhos de Deus – há algo que podemos compreender.
Nosso conhecimento deve ser moderado pela nossa humildade e nosso ceticismo equilibrado pela nossa convicção.
Humildade e fé. Uma certa pluralidade interpretativa não precisa necessariamente estabelecer um conflito.

A ressurreição do AUTOR
• Não somos nem Senhores (modernismo) nem escravos (pós-modernismo) da linguagem. Somos ‘cidadãos’ da
linguagem.
• A distinção entre semiótica (signos) e semântica (sentenças) é a chave.
• Assim como uma sentença vai alem do sentido dos signos (palavras) que a compôem, também a comunicação
(parole) humana está livre da limitação da langue .
• O homem e também a linguagem são “particulares básicos” (P. F. Strawson) = conceitos primitivos que não se
explicam por nada mais básico.
• A linguagem é dádiva de Deus: horizontal e vertical (superior e inferior).
• A linguagem é elo entre os falantes e entre a linguagem e o mundo.
• Deus fala o que Deus é e faz. Deus se tornou Palavra.
• Obedecer a palavra (VT).
• Salvação pela palavra (NT) – loucura da cruz!
• Existe o significado – uma ação comunicativa intencionada – no texto.

A ressurreição do LIVRO
• O próprio texto dá o contexto para sua compreensão própria e adequada.
• Deus escreveu um livro – logo, é possível ler e entender.
• Contexto, contexto, contexto.
• Significados? Contextos como ideais reguladores.
• A encarnação de Cristo é a analogia e a metáfora orientadora.
• A diversidade de gêneros bíblicos testemunha a diversidade das respostas e a abrangência das pessoas
envolvidas nelas

A ressurreição do LEITOR
• Não é para usar ou criticar, mas receber!
• Deixar o texto ...falar, ...seguir a coisas a sua maneira, ...sugerir a obediência.
• Virtudes: honestidade, abertura, atenção, obediência.
• Um significado, muitas significâncias.
• Não jogar a Palavra contra o Espírito, mas ver a Palavra do Espírito.
o Palavra inspirada pelo Espírito
o Leitor transformado pelo Espírito

21
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

NOSSAS DIFICULDADES EM MATÉRIA DE HERMENÊUTICA

Antigos lemas:
• Somente as Escrituras: Sola Scriptura!
• Somente a graça: Sola gratia!
• Somente a fé: Sola fide!
• Somente o Cristo: Solo Christo!
Nossos lemas mais característicos:
• Voltar à Bíblia. [Arrependei-vos!] Ser o povo do Livro.
• Ser unicamente cristãos mas não os únicos cristãos.
• Nenhum livro, senão a Bíblia; nenhum credo, senão Cristo; nenhum nome, senão o de Deus.
• Nomes bíblicos para coisas bíblicas. Coisas bíblicas por meios bíblicos.
• Na doutrina, unidade; nas opiniões, liberdade; em tudo, amor.
• Padrão da sã doutrina.
• Falar onde a Bíblia fala, calar onde a Bíblia fala.
• Livro, capítulo, versículo.
• Mandamento direto, exemplo aprovado e inferência necessária. [padrão]
• O específico exclui o genérico.
Surgimento de problemas em nossa fraternidade
• Esforço transformado em ‘tradição’
• Tradição transformada em ‘lei’
• Lei transformada em ‘divisão’
• Divisão transformada em ‘rebelião’
O surgimento de novas hermenêuticas em nossa fraternidade:
• Relativizavam especialmente o exemplo e a inferência
• O elemento cultural foi magnificado
• A cultura geral e religiosa foi reassumida
• O pragmatismo tornou-se uma norma importante

22
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

OS 4 “Ds” DA HERMENÊUTICA PRÁTICA


Estudar bem a Escritura requer que nos aproximemos dela com um bom sistema de estudo que começa sempre com o
texto bíblico em seu contexto bíblico e histórico, entendendo as palavras e idéias bíblicas dentro dos sentidos que a
própria Bíblia lhes oferece, realizando assim, a transposição do sentido antigo do texto para o moderno entendendo bem
os 4 D da aplicação dos textos bíblicos: os Desígnios, as Determinações, as Descrições e as Deduções do texto
bíblico.2

Desígnios. Cada texto tem que ser entendido à luz dos propósitos ou desígnios para os quais foi escrito. Não é possível
falar onde a Bíblia fala se falarmos com intenção diferente da intenção manifesta nela. É preciso perguntar ao texto e
seu contexto o que ele quer ou tem intenção de dizer naquele momento, antes de analisar suas Determinações,
Descrições ou Deduções. O texto pode ter um propósito permanente ou passageiro, cultural ou teológico, instrutivo ou
descritivo. O próprio texto terá que nos dizer das suas intenções. Elas são as intenções de Deus, elas devem imperar.
Não podemos usar textos-prova, contra sua intenção original.

Determinações. Uma vez entendendo o Desígnio de um texto. podemos ver quais suas Determinações ou
mandamentos. Conforme o Desígnio, saberemos como obedecer aquela Determinação. Assim poderemos observar, por
exemplo, porque o mandamento de observar a Ceia do Senhor tem caráter duradouro, enquanto o mandamento de lavar
pés não tem a mesma durabilidade. A diferença é percebida não a nível de modo verbal, pois todos os textos tem verbos
no imperativo, mas o Desígnio dos textos, percebido nos contextos e confirmado nas Descrições. Devemos falar os
mandamentos que a Bíblia fala. Em muitas situações os mandamentos ou Determinações deverão ser melhor
considerados como princípios. Assim escapamos de uma visão legalísta do cristianismo e também de um estreitamento
desnecessário do mandamento. Nem todo imperativo será mandamento, pois os Desígnios irão mostrar o uso correto do
texto.

Descrições. Também as descrições de pessoas, doutrinas e trabalhos da igreja antiga tornar-se-ão uma fonte de
informação para saber quais descrições são normativas e quais são puramente descritivas. O Desígnio do texto e de
todo contexto bíblico ajudará a encontrar nas histórias e nas narrativas, não apenas uma descrição de como as coisas
eram, mas também ver nelas, em alguns casos, uma descrição de como as coisas devem ser. Devemos falar dos
exemplos que a Bíblia fala.

Deduções. Ocasionalmente a Bíblia falará por nos “forçar” ou nos “conduzir” a certas conclusões. O texto bíblico fala,
tanto pelo que afirma como pelo que pressupõem. Essas deduções devem ser usadas com todo cuidado porque muitas
vezes a lógica humana não corresponde à divina. Um exemplo de dedução pode ser visto no caso das reuniões
dominicais dos cristãos. Há um texto que fala que os cristãos se reuniam no primeiro dia da semana para participar da
Ceia (Atos 20.7). Há outro texto que afirma que os cristãos ofertavam a Deus no primeiro dia da semana (1 Coríntios
16.1-3). Há outro texto que afirma que os cristãos deram um nome especial a esse dia, por causa do seu Senhor,
chamando-o de dia do Senhor ou domingo (Apocalipse 1.10). Há uma série de textos que falam que Jesus ressurgiu dos
mortos a apareceu aos discípulos no domingo (Marcos 16.1 e paralelos). Embora os cristãos não tenham que guardar
dias especiais (Romanos 14.6. Gálatas 4.10), a conclusão é que o primeiro dia da semana é especial para os cristãos e
que eles, embora pudessem reunir-se todos os dias, usavam a reunião dominical de modo especial para a ceia, oferta e
uma comunhão habitual. Esta é uma dedução segura, embora trabalhosa como todas as deduções. Somente alguém com
algum preconceito ou teimosia não perceberia a insistência do uso do domingo pela igreja antiga. Devemos falar das
conclusões que a Bíblia nos leva a falar.

A tarefa do discípulo de Cristo que quer falar onde a Bíblia fala é a tarefa de um historiador honesto, cuidadoso e
humilde, que quer buscar na Bíblia, do melhor e mais preciso modo possível, o padrão das sãs palavras, da sã doutrina e
do evangelho conforme nosso Mestre assim desejou que todos os seus seguidores o praticassem. Humildade é
necessária pois a fraqueza humana nos adverte.

2
Para uma abordagem similar, mas não idêntica, veja F. LaGard Smith, The Cultural Church, Nashville, 20th
Century Christian, 1992, p. 149-169.

23
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

UNIDADE III

PROVÉRBIOS DOS EXEGETAS


Uma coletânea de princípios
de interpretação bíblica

24
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

OS PROVÉRBIOS DOS EXEGETAS


© 2010 Álvaro César Pestana
PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO BÍBLICA
em face do pós-modernismo.
Esta lista de princípios de interpretação bíblica não é e nem poderia ser original. Se houver algo de original
nela, será apenas a organização e a forma de tentar transmitir conceitos já consagrados pelas próprias Escrituras e
também pelo uso. De fato, as Escrituras são o juiz final de nossos métodos de interpretação da Escritura.
Tentamos partir do principal, do geral e do maior para o secundário, o particular e o menor.
Em alguns casos, os princípios são definidos por pura afirmação dos mesmoss. Em outros, um exemplo
ajudará a entendê-los melhor que uma definição proposicional.
O autor agradecerá contribuições, acréscimos e contradições aos princípios aqui apresentados, pois todos
somos estudantes vitalícios das Escrituras.
Que Deus o abençoe por meio da sua Palavra!

PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO BÍBLICA

#1 - PRINCÍPIOS ESPIRITUAIS.
1 – A Escritura tem razão (João 10.35).
• A Escritura não pode falhar, não pode ser anulada.
• A Escritura é Palavra inspirada por Deus.
• O pressuposto fundamental do pós-modernismo é que ninguém tem razão absoluta. [com isto
temos que concordar]. O problema surge quando eles concluem que “ninguém, absolutamente,
tem razão alguma”. Não existe verdade!
2 – A Escritura tem autoridade (Lucas 16.17).
• Estude com a pressuposição que a Bíblia tem autoridade.
• O pós-modernismo e todos os seus proponêntes vem da turma “do contra”. São avessos e
inimigos de qualquer autoridade. De fato, para eles, interpretação e sentido verdadeiro são
exercício violento de poder!
3 – A Escritura convida à fé (Rm 10.17).
• Tenha a mesma fé do autor bíblico para que possa compreendê-lo.
• Estude com as mesmas pressuposições do autor bíblico.
• Todos temos pressuposições, mas devemos amoldar as nossas às dos escritores, se quisermos
compreendê-los
• Simpatia é (e leva a) “sentir as mesmas coisas”.
• “Credo ut intelligam non intelligo ut credam”, ‘creio para compreender e não compreendo para
crer’.
• O pressuposto fundamental para o pós-modernismo é que devemos duvidar de tudo [Descartes é
o pai disto].
• O lema é do modernismo era“creio no que posso entender”. O lema do pós-modernismo é “creio
que não posso entender”.
4 – Ora e labora.
• Ora et labora.
• Orar bem é estudar bem.
• O lema pós-moderno:“Desconstroi e decodifica”.
5 – O alvo é obedecer e não apenas conhecer.
• Conhecimento sem prática é farisaísmo e rebelião.
• Prática sem conhecimento é fanatismo ou ativismo vazio.
• O alvo pós-moderno é apenas negar: não há nada a obedecer, apenas coisas a utilizar.
• O alvo pós-moderno é libertar: não há verdade, nem autoridade.
6 – O alvo tem que ser encontrar o sentido e não justificar uma posição.
• Temos que olhar o texto para ver como ele nos desafia.
• Ex-egese e não eis-egese!
• O pós-moderno acredita que não existe ex-egese. Toda leitura é eis-egese.
7 – Humildade é a chave.
• Deus resiste aos soberbos, mas concede sua graça aos humildes.

25
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

• Humildade resume os pontos 1-6.


• O pós-moderno diz que a dúvida e a desconfiança é a chave do saber, que, na verdade, é um
reconhecer o não saber.
• De fato, neste sentido, os pós-modernos nos ensinam que temos que ser humildes. Não somos
Deus – não somos infalíveis e nossa interpretação não é absoluta. Isto temos que agradecer a eles,
mas, na verdade, Deus já tinha nos ensinado isto antes, por meios mais verdadeiros.

#2- PRINCÍPIOS GERAIS.


8 – A Escritura explica a Escritura.
• A Bíblia interpreta a Bíblia.
• O melhor intérprete da Bíblia é a própria Bíblia.
• A antiga frase “analogia fidei”, ‘analogia da fé’, afirma justamente que os textos mais simples e
claros da Bíblia devem conduzir a interpretação dos textos mais difícieis e complicados e nunca o
contrário. [Para Agostinho “analogia fidei” era a fé da Igreja. Para Lutero “analogia fidei” é o
anúncio de Jesus. Para Calvino “analogia fidei” era a Bíblia e o Espírito Santo.]
• As Concordâncias Bíblicas são, depois da Bíblia, os livros mais úteis.
• Textos fáceis interpretam os difíceis e não o contrário.
• A Crítica Canônica, ou seja, o estudo da Bíblia dentro do corpo de materiais reconhecido como
padrão e inspirado pelo Espírito é a chave de nossa boa compreensão de temas que estão
espalhados por todos este corpo de literatura que cremos que é coerente por causa o único Autor
supremo.
• A descontrução e a genealogia, duas das principais ferramentas de demolição da pós-
modernidade tentam jogar texto contra texto, autor contra autor, e o texto e o seu autor contra si
mesmos, de forma a ressaltar as inconsistências, as possibilidades divergentes de significado e,
portanto, a ausência de significado.
9 – A Escritura tem um contexto que é mais importante que o nosso contexto.
• O exemplo é Dt 22.5 – em 1910, calça comprida era de homem, mas em 1440 a.C., nem era
questão! A questão era travestismo mágico-cultual dos cananeus.
• Não podemos impor o nosso contexto à Escritura.
10 – A Escritura tem uma lição original a ser descoberta.
• O alvo é descobrir o sentido original do autor da Escritura.
• O autor primeiro é Deus, que fala e age.
• O autor secundário é o homem, inspirado, que transmite a palavra de Deus.
• O alvo é descobrir o sentido original do texto da Escritura.
• O texto é, acima de tudo, a “encarnação” da Palavra divina em forma de comunicação
humana. Jesus é o arquétipo e o protótipo de toda a Escritura.
• O texto é o caminho para a verdade e a vida de Deus.
• O alvo é descobrir o sentido original para os leitores originais da Escritura.
• Os leitores originais são o povo de Deus, que viveu sob o poder do Espírito de Deus,
observando seu poder e sua intervenção.
• O sentido para eles governa o sentido para nós.
• A distinção entre ‘significado’ e ‘significância’, trabalhada pelos pós-modernos é útil
para ressaltar os aspectos antigos e atuais de um texto.
11 – A Escritura interpreta a experiência e não a experiência à Escritura.
• A Bíblia orienta/julga a nossa experiência e não a nossa experiência orienta/julga a Bíblia.
Certamente nossas experiências serão parte de nossas pressuposições e pré-concepções, mas temos
que tentar livrar-nos delas.
• Uma mulher com experiências negativas com o esposo pode olhar muito mal para os textos sobre
submissão da mulher, por julgar o texto pela sua experiência [negativa].
• Uma possível vitória ou esclarecimento pessoal não pode contrariar o que a Bíblia diz. Nossos
sentimentos e impressões não comandam a interpretação.
• O ceticismo pós-moderno da possibilidade de uma leitura sem pressuposições baseia-se num
ceticismo sobre a própria possibilidade da leitura.
12 – A Escritura interpreta a história e não a história à Escritura.
• O conhecimento da história do ambiente social e religioso do tempo dos escritores bíblicos e
posteriores ajuda a entender os textos, por outro lado, eles não podem ser usados para negar o
texto ou conduzir o texto para uma direção contrária às suas claras afirmações e intenções.
• Da mesma forma a história da igreja ajuda a ver a correta interpretação bíblica e também os
desvios desta interpretação em tempos posteriores, mas nunca pode ser usada para “determinar” os

26
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

sentido original dos textos bíblicos. Evidências históricas podem ser importantes mas não podem
ser o único fator decisivo.
• A intertextualidade muito utilizada no pós-modernismo, sem qualquer critério, faz com que uma
leitura seja ‘lida’ por outra. Não deixa de ser a prática de fazer uma ‘história’ conduzir nossa
leitura bíblica.
13 – A Escritura tem direito de não ser “harmonizada”.
• Textos paralelos são forçados a dizerem a mesma coisa ou a produzirem um quadro histórico
único. Esta não era a intenção dos escritores.
• Cada autor tem o direito de ser ouvido em suas próprias ênfases e preferências, sem ter que
“concordar” com outros. Cada um tem sua mensagem.
• É lógico que sempre há uma coerência global dos relatos e das doutrinas, mas esta não é,
geralmente, a intenção dos autores.
• Um exemplo de texto normalmente “harmonizado” é Mt 8.5-13 e Lc 7.1-10.
• Os textos de Mateus 18.10-14 e Lucas 15.3-7 trazem a mesma parábola com duas aplicações
distintas, embora semelhantes. A parábola é a mesma, mas cada uma tem um contexto diferente e
uma intenção diferente em sua aplicação.
• A pós-modernidade usa justamente as aparentes contradições do texto para des(cons)truí-lo. É
contudo, um ‘abuso de poder’, que eles mesmos tanto querem desmascarar.
14 – A Escritura tem direito de receber um manuseio honesto de seus textos em seus contextos.
• “Texto sem contexto é pretexto”
• “Um texto sem o contexto é um pretexto”
• Pergunte: o que? quem? quando? onde? como? porque? etc.
• A pós-modernidade dá ênfase ao contexto de modo que o contexto do leitor atrapalhe
completamente o do autor, e do texto. Contudo, são os próprios contextos que se tornam os ideais
reguladores, como os filósofos que estudam o discurso comum e cotidiano tem provado.
15 – A Escritura merece esforço e cuidado (Atos 17.11).
• Um estudo rápido e superficial pode ser grandemente danoso.
• Os temas e ensinos da Bíblia merecem o melhor de nosso esforço e atenção.
• O pós-modernismo tem gerado desânimo e preguiça.
16 – A Escritura pode ser compreendida (Efésios 3.4; Dt 29.29; Jo 20.30-31).
• Se Deus resolveu colocar sua vontade em um livro, então é possível conhecer esta vontade através
deste Livro.
• É possível uma revelação divina proposicional, ou seja, por meio de proposições. Deus pode falar
e escrever!
• Esta é a grande contradição com a pós-modernidade. Deus pode falar ou não?

#3- PRINCÍPIOS LINGÜÍSTICOS, LITERÁRIOS E GRAMATICAIS.


17 – A Escritura deve ser entendida conforme o gênero literário que usa
• Textos literais devem ser entendidos literalmente; textos simbólicos, simboicamente
• Textos poéticos devem ser analisados poeticamente
• Textos legais devem ser avalidos juridicamente
• Textos narrativos devem ser estudados como tal
• Textos histórico-proféticos devem ser estudados conforme sua natureza
• Textos apocalípticos, parabólicos, epistolares, etc, enfim, todos precisam ser estudados conforme
sua natureza.
18 – A Escritura deve ser entendida conforme as regras comuns da linguagem humana
• A lingüística moderna tem insistido neste ponto: palavras tem um uso mais simples do que o
sugerido por dicionários teológicos. Não devemos sobrecarregar o sentido de um termo se o
contexto não o exigir. As línguas da Bíblia não são “lingua de anjos”, mas de homens.
• Gramática aplica-se ao texto bíblico.
• A Bíblia pode ser estudada como literatura, embora ela seja mais do que literatura e embora
apenas o fenômeno literário não explique tudo que a Escritura é e faz.
• Parole e Langue não exaurem o sentido da linguagem – a semântica vai muito além da semiótica
– a linguagem e a comunicação é mais do que a justaposição dos símbolos. Assim como o homem
é mais que matéria, a comunicação é mais que seus símbolos e convenções.
19 – A Escritura deve ser entendida dentro de seu raciocínio ou de sua linha de persuasão retórica.
• Análise estrutural.
• Análise retórica.
• Análise espistolar.
• O raciocínio ou estrutura de um texto como 1Co 13 é decisivo para sua interpretação.

27
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

20 – A Escritura tem um sentido só.


• Esta é uma regra geral com exceções.
• A Escritura deve ser entendida sem apelo à alegoria, à moralização, à modernização, às
‘psicologizações’, à validação pessoal (subjetiva – ‘o que eu senti com este texto’). Muitas vezes,
tais leituras fogem do texto!
• Se o texto for “ambíguo”, deliberada ou acidentalmente, tal indício tem que vir do texto e não do
desejo do leitor.
• Orígenes, influênciado pelo Platonismo de seus dias, acreditava em três sentidos: literal, moral e
místico (alegórico).
• Agostinho falava de quatro: histórico, etiológico, analógico e alegórico.
• Na Idade Média falava-se de quatro sentidos: literal, moral (=tropológico), alegórico, analógico
(=anagógico).
• A pós-modernidade privilegia a multiplicidade de sentidos apenas para dizer, ao final, que não há
sentido algum. Contudo, a distição entre ‘significado’ e ‘significação’.
21 – A Escritura clara e simples interpreta a Escritura obscura e difícil e nunca o contrário.
• Textos simples e claros interpretam os obscuros.
• O que se aprende facilmente em um texto literal não pode ser contraditado por uma possível
interpretação de um texto difícil.
• O duvidoso não governa o seguro.
22 – A Escritura deve ser interpretada levando em conta a coerência interna da obra de cada autor humano.
• Devemos interpretar um autor humano, sempre em harmonia com ele mesmo. Assim, quanto mais
extensa for a obra de um escritor bíblico, mais do seu pensamento, vocabulário, maneirismos etc
poderemos apreciar
• Cada autor poderá usar idéias em coerência com seu pensamento, sem ter que, necessáriamente,
usar a mesma idéia de outros. Por exemplo, “leite” em Hb 5.13 é diferente de 1Pe 2.2.
23 – A Escritura deve ser interpretada respeitando a coerência interna de cada livro.
• Um livro bíblico é um todo coerente.
• A leitura de uma parte, prepara para a leitura posterior.
• A leitura posterior lança luz sobre a leitura anteriormente feita.
• Um livro bíblico seria lido várias vezes, em voz alta, e sua compreensão viria deste exercício.
• Assim, não é necessário e nem seguro, misturar livros para esclarecer textos.
24 – A Escritura precisa que suas palavras e frases sejam compreendidas em seu contexto.
• Palavras tem sentido no contexto.
• Frases e locuções podem ter sentido diferente do significado simples de cada termo que a
constitui.
• Contexto literário = dentro do livro/texto.
• Contexto histórico = do texto/acontecimento; do autor; dos leitores; etc. Vários níveis de contexto
em um mesmo texto.
• Contexto canônico = dentro do corpo de literatura e revelação bíblica, a compreensão de um texto
atinge sua magnitude correta.
25 – A Escritura pode aurir material de muitas fontes, mas o significado da Escritura é o do livro canônico e
não das fontes utilizadas
• Fontes orais.
• Critica das fontes.
• Crítica das formas.
• Crítica da redação.
• O uso destas ferramentas não precisa estar comprometido com uma postura descrente. A Bíblia é
verdadeira, históricamente precisa e fruto da inspiração do Espírito Santo, mesmo que possamos
analisar ou teorizar um pouco sobre as fontes dos escritores inspirados.

#4- PRINCÍPIOS HISTÓRICOS E DOCUMENTAIS.


26 – A Escritura é revelação progressiva.
• Não se trata de evolução, mas de progresso.
• Não se alteram as verdades, mas estas são aprofundadas e esclarecidas.
• Temas como a ressurreição só são plenamente reveladas em Jesus.
• O plano de Deus (mistério) só pode ser revelado no evangelho.
27 – A Escritura é revelação histórica e também supra-histórica.
• Histórica – Ela fala da história da ação de Deus entre os homens. Ela tem que ser entendida dentro
da sua história e dos momentos históricos a que se refere. Cuidado em verificar que as evidências
históricas apresentadas sejam verdadeiras (o mito da “porta da agulha”)

28
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

• Supra-histórica – Ela contém elementos com os quais a história não tem condições nem
ferramentas para lidar. A fé não pode ser 100% aquilatada pelo historiador.
28 – A Escritura muitas vezes é documento base para outra Escritura.
• A relação entre os documentos precisa ser analisada.
• As citações do VT no próprio VT e no NT é uma prova desta ‘germinação expontânea’ dentro da
própria Escritura.
• Existem correlações entre os livros proféticos e os históricos.
• O ensino e pessoa de Jesus são a base das antigas tradições orais, escritas e litúrgicas da igreja e
dos apóstolos.
• Existem muitas relações entre os Evangelhos e entre as cartas.
29 – A Escritura narra a história sem necessariamente sempre dar ordens através delas.
• Este é um ponto polêmico: o que é descritivo e o que é normativo nas narrativas históricas?
• A tarefa do intérprete é tentar acolher o texto em sua intenção original. Se a intenção da narrativa
era regulamentar a prática, então há razão para acolher a narrativa como norma. Se a intenção era
apenas ressaltar outra lição, a narrativa não pode se tornar “mandamento”.
• É bom andar com segurança, sem tornar-se legalista.
• Há narrativas que são ‘etiologias’ dos mandamentos e das práticas espirituais posteriores.
30 – A Escritura nos convida a reconstituirmos a situação original dos textos e dos mandamentos.
• É o caso do domingo: At 20.7; 1Co 16.1-2; Ap 1.10.
• Não há mandamento, há evidências.
• Com a melhor evidência que temos, é melhor usar o domingo.
31 – A Escritura apresenta as formas e as funções de vários mandamentos e práticas: ambos são importantes.
• Não basta entender o que é o mandamento, mas sim como ele funciona e porque funciona.
• Nos modelos de igreja bíblica, isto é muito importante.
• O tanto quanto for possível, é bom manter forma e função.
• Forma sem função é ritual vazio, é legalismo.
• Originalmente, formas devem reforçar e promover a função.
• Porém, formas podem subtituir a função.
• Eventualmente, formas impedem a função.
• Função sem forma é desvio, é relativização.
• Originalmente, uma função necessita de uma forma.
• Porém, a função ser realizada com outra forma diferente.
• Contudo, logo, a nova forma moldará uma nova função.
32 – A Escritura não necessita ter suas narrativas históricas espiritualizadas, mas entendidas dentro dos
objetivos espirituais do autor.
• O caso da narrativa do Tanque de Siloé.
• O caso das ironias e alusões ao significado espiritual das coisas narradas sobre a crucifixão de
Jesus.
• As narrativas de Crônicas, mostrando reis ideais.
#5- PRINCÍPIOS TEOLÓGICOS, CULTURAIS E LÓGICOS.
33 – A Escritura exige constante aprendizado.
• Não tenha posições definitivas e fechadas – nossa fé é definitiva e fechada, mas não o
esclarecimento e o conhecimento.
• Continue aprendendo e reavaliando.
34 – A Escritura exige que estudemos todo o assunto.
• Não podemos ter passagens prediletas.
• Não podemos isolar um tema de outros temas.
35 – A Escritura tem o direito de ensinar coisas “contraditórias”.
• Quando parecer que duas idéias opostas são ensinadas com clareza, aceite as duas.
• Não existem verdadeiras contradições na Bíblia, mas ensinos paradoxais para nossa capacidade
humana de entendimento.
• Devemos entender que temas que nos parecem em desarmonia podem encontrar perfeita harmonia
em níveis que não podemos compreender.
• Não podemos sistematizar tudo.
36 – A Escritura ensina por mandamento, exemplo e conclusões.
• Mandamentos são mais fáceis de perceber.
• Exemplos precisam ser apoiados em mandamentos e nas intenções do escritor.
• Conclusões só são válidas se ancoradas nas intenções, pressuposições dos autores e são de maior
relevância quando apoiam ou associam-se a mandamentos explícitos.

29
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

• É muito importante notar que Jesus exigia que seus contemporêneos tirassem conclusões
da Bíblia? Em Mc 12.26-27; 12.35-37;
37 – A Escritura ordena pelo silêncio.
• Jesus pensava assim ao falar contra a tradição judaica (Mc 7.1-13).
• O específico exclui o genérico: uma ordem específica exclui outras mais genéricas.
• Se o Novo Testamento pede apenas orações, não precisa proibir a queima de incenso.
• Se pede o pão e o cálice na Ceia do Senhor, não precisa proibir a pizza e a cerveja na Ceia
do Senhor.
• Um mandamento específico pode incluir outros elementos genéricos para o seu cumprimento.
• O Novo Testamento ordena que a igreja se reúna (Hb 10.25) – este é uma mandamento
específico. Não podemos cumpri-lo sem participar da reunião. Não podemos apenas
participar de um “chat” na Internet, não podemos participar via televisão ou por telefone.
Todas estas coisas não estão proibidas explicitamente, mas o ordem de “reunir-se” proíbe
o uso de qualquer uma destas coisas em substituição ao mandamento. O específico
“reunir-se” exclui outras formas: “chat”, telefonema, televisão, etc.
• O Novo Testamento não especifica, contudo, que tipo de local devemos usar para nossas
reuniões. Uma vez obedecendo o mandamento específico de reunir-se, podemos usar um
prédio, uma praça, uma casa, uma escola, etc. Agora, neste nível, o mandamento é
genérico.
• Assim, um mandamento pode ser específico em um nível de sua enunciação e obediência,
mas genérico em outros que não firam aquilo que já foi especificamente declarado
obrigatório nele.
• O grande exemplo, e o mais polêmico desta questão é o caso da música instrumental no culto de
louvor a Deus. O silêncio do Novo Testamento sobre a questão e a ordem específica de cantar, faz
com que o uso de instrumentos musicais seja proibido.
38 – A Escritura dá normas para todas as ‘culturas’ mas não obriga todos a ter a mesma ‘cultura’.
• A distinção entre o que é cultural e o que é eterno deve ser observada com cuidado.
• Nossa cultura não pode ser usada para relativizar os textos bíblicos.
• Para nós, o que nossa cultura acredita parece ser sempre definitivo e objetivo.
• Contudo, isto é apenas um engano de nossa impressão pessoal.
• Com o passar dos anos, nossa cultura também mudará e a verdade das declarações
bíblicas não pode ficar a mercê destas mudanças.
• Ocasionalmente, uma norma cultural é apenas a forma antiga de realizar uma certa função. Em
outros casos a forma e a função estão indissolúvelmente ligados.
• Não precisamos seguir a cultura dos escritores bíblicos, apenas seus mandamentos e as formas que
porventura sejam indissociáveis destes mandamentos.
• Por outro lado não devemos impor nossa cultura aos textos.
• Por exemplo, é muito comum atribuir razões sanitárias às leis alimentares do Velho
Testamento. Isto é um erro. O mundo antigo não compartilhava deste saber. As razões
tinham fundamento anti-idolátrico.
• Outros atribuem aos textos que pedem o silêncio da mulher nas assembléias cristãs à
cultura dos antigos. Isto é um erro, pois as razões da antiga (e moderna) desvalorização
da mulher não são a razão do mandamento da submissão e silêncio femininos.
• Se o texto bíblico usa um expediente cultural de seu tempo na forma de mandamento, precisamos
entender se o mandamento inclui a forma cultural do mandamento ou nos deixa livres na forma,
desde que obedecida a função do mandamento.
• Se o texto afirmar uma prática cultural como meio de cumprir um mandamento, devemos
examinar se o mandamento precisa ser realizado daquela forma, para a obediência completa do
mandamento.
• Exemplos:
• O uso de ósculo santo é mandamento. O objetivo do mandamento não era o ‘beijo’, mas a
expressão de amor com santidade – não há apoio em outros lugares para uma ‘teologia da
necessidade de beijos públicos’. Assim, o costume pode ser obedecido com outras formas
que performizem a mesma função.
• O ‘lavar-pés’ era uma prática de hospitalidade antiga. Os mandamentos e exemplos da
prática podem ser praticados hoje em dia com outras formas de expressão de
hospitalidade.
• O uso de véu pelas mulheres era um meio de mostrar que as mulheres eram submissas a
seus maridos ou pais. Hoje em dia as mulheres continuam obrigadas à submissão, pois

30
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

esta se baseia na Criação e na Queda (Gênesis), mas a forma de expressar esta submissão
não é mais o uso do véu, pelo menos no mundo ocidental.
• O uso de pão e vinho na ceia não é apenas cultural, pois simbolizam corpo e sangue.
Assim, não podemos lembrar Jesus com outras coisas, quando em nossa cultura, temos
um equivalente tão próximo ao costume original.
• O batismo é imersão não apenas por causa de costume, mas pela necessidade teológica de
encenar uma morte e uma ressurreição com Jesus.
• Mulheres não pregam ou ensinam na igreja, não por causa do costume antigo, mas por
causa que Paulo disse que elas deveriam manter silêncio para mostras submissão,
conforme a Criação e a Queda (Gênesis) afirmam. Logo, não se trata de uma questão
cultural, mas universal.
• Na dúvida, sobre o que é cultural e o que é permanente, devemos optar pelo que é mais seguro,
sem legalismo e com amor.
#6- PRINCÍPIOS PRÁTICOS.
39 – A Escritura precisa ser lidas.
• Leia o texto a ser estudado em várias versões e várias vezes.
• Leia o texto na língua original (se possível).
• Parece absurdo, mas muitas vezes, o texto a ser interpretado não é lido.
40 – A Escritura tem um contexto a ser observado
• Leia o contexto literário da passagem.
• Estude e descubra o contexto histórico da passagem.
• Muitas vezes, é interessante ler várias vezes o livro onde nosso texto está.
• O estudo dos ambientes históricos, culturais e sociais antigos são uma ferramenta importante no
estudo bíblico.
• Bons livros de introdução ao texto bíblico são úteis, embora não sejam infalíveis e nem sempre
consigam abranger todos os aspectos dos livros bíblicos.
41 – A Escritura fica mais clara com o uso de uma concordância bíblica.
• O uso de concordâncias bíblicas ampliam em muito nossa compreensão da Bíblia.
• A pesquisa de palavras, idéias, dados históricos, culturais, geográficos, biográficos, gramaticais,
etc, podem ser realizados com concordâncias.
• A concordância é quase uma fonte primária, na qual a interferência do autor humano é menor que
em outras obras de referência.
42 – A Escritura lucra com os chamados ‘textos paralelos’.
• Textos que tratam do mesmo assunto em outros lugares da Escritura são muito úteis.
• Textos paralelos ensinam, tanto por semelhança como por contraste.
• Comparar texto com texto não deve ser feito para anular o sentido de cada um deles, mas para
ampliar o sentido particular de cada um.
• O ensino de um texto sempre estará em harmonia com o ensino global da Bíblia.
43 – A Escritura pode ser estudada com o uso de léxicos, dicionários e enciclopédias bíblicas.
• O dicionário da língua portuguesa não é uma boa ferramenta de estudo bíblico.
• Dicionários e léxicos bíblicos são fundamentais para o estudo.
• Enciclopédias e manuais bíblicos costumam dar informação mais abragente sobre vários aspectos
importantes do texto.
44 – A Escritura ilumina muitos comentários e bons livros cristãos.
• A frase acima não está invertida.
• Os comentários nos ajudam muito a entender o texto da Bíblia, mas a verdadeira luz vem da
Bíblia, na medida que o texto do comentário consegue mostrar a força do texto inspirado.
• Os livros são brilhantes na medida que deixam a Bíblia brilhar.
• Há comentários (e livros) que não merecem ser lidos em conjunto com a Bíblia.
45 – A Escritura precisa estar em nosso coração e em nossa boca.
• Se não podemos explicar ( = boca), não entendemos com o coração ( = mente).
• A boca fala do que está cheio o coração.
• Logo, precisamos ter condições de explicar e falar da mensagem bíblica com nossas próprias
palavras para ter certeza que a compreendemos.
• Faça sempre um resumo, uma aplicação, uma reflexão, etc daquilo que aprendeu das Escrituras.

31
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

OS PROVÉRBIOS DOS EXEGETAS


© 2010 Álvaro César Pestana

Princípios lógicos da leitura da Bíblia.


Lógica não funciona do mesmo modo para todos os povos. Hoje há pesquisas
de todo tipo de ‘lógica’ nos centros de pesquisa acadêmica. Por exemplo, o
comportamento das partículas subatômicas, aos olhos do homem comum não parece
nada lógico, contudo, dentro da chamada mecânica quântica, é perfeitamente
explicável. A ‘lógica’ de nosso mundo não é válida ali. Contudo, em nossa tradição
bíblica, temos o privilégio de ler o livro bíblico escrito num sistema lógico similar ao
nosso. São estes princípios que iremos notar abaixo.

§01 – A lei da identidade ou da afirmação.

§02 – A lei da contradição ou da negação.

§03 – A lei da exclusão do termo médio.

§04 – A lei da continuidade do pensamento,

§05 – A lei [especial] da não contradição das contradições.


Esta lei só vale para a “lógica bíblica”.
• Trindade & Monoteísmo;
• Livre-arbítrio & soberania divina;
• Divindade & humanidade de Jesus;

32
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

OS PROVÉRBIOS DOS EXEGETAS


© 2010 Álvaro César Pestana

Primeiros princípios lógicos para a leitura da Bíblia.


Aproveito muito da obra de Luiz Feracine para os próximos princípios3.

§01 – Princípio da identidade


O que é, é; o que não é, não é.

§02 – Princípio da não-contradição


Nada pode ser e não ser ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto.

§03 – Princípio do terceiro excluído


Não há meio termo entre o ser e o não ser; ou é ou não é.

§04 – Princípio da razão suficiente


O que existe tem sua explicação pela qual é o que; tudo que existe tem razão de
ser.

§05 – Princípio da causalidade


Tudo que move é movido por outrem; o que começa a ser tem causa; o que é
contingente tem causa; todo composto implica causalidade.

§06 – Princípio do finalismo


Todo agente opera em vista de alguma finalidade. Omnis agens agit propter
finem.

3
Luiz Feracine, Os primeiros princípios do saber, Campo Grande, Solivros, 1999.

33
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

OS PROVÉRBIOS DOS EXEGETAS


© 2010 Álvaro César Pestana

Frases proverbiais dos exegetas bíblicos.


Esta coletânea de provérbios ligados à exegese bíblica nasceu de uma lista de
doze máximas de exegetas, agrupados em um apêndice de uma obra de Frederic W.
Farrar4. Ampliei a lista e adicionei outros provérbios, lemas e frases de efeito, de
modo que, agora, a coleção é mais ampla e eclética, em termos da natureza e origem
das citações.
Cada provérbio é apresentado em português. Quando houver um original em
outra língua, especialmente grego, hebraico ou latim, tentaremos apresentar este
original. Se o autor for conhecido, ele será citado entre colchetes, depois da citação na
língua original. Uma ou mais fontes do provérbio ou das informações sobre ele
estarão nas notas de rodapé. Em alguns casos, citaremos também, outras versões do
provérbio e frases relacionadas. Depois disto, em um pequeno parágrafo,
apresentaremos breves comentários sobre o significado do provérbio para os estudos
bíblicos.
Nem todos estes provérbios são verdadeiros. Alguns são úteis em algumas
situações. Outros, como os que recomendam o uso da alegoria, são notoriamente
incorretos, mas ajudam a entender a história da interpretação e alguns dos erros
modernos, que repetem os antigos. Caberá ao leitor separar a carne dos ossos.
Acredito que o estilo proverbial destes lemas ajuda a memorização dos
princípios envolvidos e faz com que o intérprete os tenha em mente a todo instante.
Só iremos interpretar a Bíblia com o que está em nossa mente. Se bons princípios e
métodos forem incorporados em nossa mente, teremos mais chances de lembrar o
melhor caminho da compreensão do texto.

PROVÉRBIOS DOS EXEGETAS

§01 - A Escritura não pode falhar & A Escritura não pode ser anulada.
Kai. ouv du,natai luqh/nai h` grafh, [Jesus de Nazaré5]
Jesus manifesta completa confiança na Bíblia. No contexto ele está citando um
texto do Velho Testamento que, se entendido como correto, daria condições de
entenderem as afirmações dele sobre si mesmo. O importante é entender que
Jesus tinha a veracidade e a firmeza das Escrituras como premissa inicial de
trabalho. A inspiração, veracidade e infalibilidade da Bíblia é a primeira
premissa de qualquer discípulo de Jesus.

4
Frederic W. Farrar, History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886] p.473-476.
5
João 10.35

34
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

§02 - O temor do Senhor é o princípio da sabedoria.


vArch. sofi,aj fo,boj kuri,ou [LXX – Rei Salomão6]
t[;D' tyviare hw"hy> ta;r>yI [TM – Rei Salomão]
Qualquer estudiosos que aproximar-se da Bíblia sem ‘tirar as sandálias dos pés’
terá pouca chance de compreender o Livro. A Bíblia fala de Deus, mas se nos
julgamos ‘deuses’, sábios e ilustres, nosso desrespeito ao verdadeiro Deus nos
cegará e não entenderemos sua mensagem.

§03 - À lei e ao testemunho.


hd'W[t.liw> hr'Atl. - [TM – Profeta Isaías7]
A exortação do profeta é para que o povo volte à revelação divina da Toráh.
Sem este retorno obediente, quaisquer tentivas humanas de obter revelação
pelo espiritismo da época resultaria em ficar sob a ira divina. O princípio
aplica-se aos exegetas na medida que é necessário ficar fixo no texto e não em
outras supostas ‘revelações’.

§04 - Não ultrapasseis o que está escrito.


Mh. u`pe.r a] ge,graptai [Apóstolo Paulo8]
Este é um dos lemas mais evidentes, em Paulo, com respeito ao seu modo de
entender a Bíblia.9 Seu objetivo é ensinar que não se pode abandonar o ensino
bíblico para ir atrás de homens. Quaisquer outros parâmentros de controle de
nossa conduta devem ser rejeitados como fruto do orgulho. Somente a Bíblia
pode ordenar e conduzir nossa vida. Se ficarmos com a Bíblia, não haverá erro.

§05 - Creio para compreender e não compreendo para crer.


Credo ut intelligam, nom intelligo ut credam [Anselmo da Cantuária10]
Tenta transmitir a idéia que a Revelação divina guia a mente humana. Outros
autores iriam afirmar a mesma idéia usando Is 7.9 (LXX), um texto mal
interpretado pelos exegetas alexandrinos, que acabou contribuindo para a idéia
de crer para ter compreensão – eva.n mh. pisteu,shte ouvde. mh. sunh/te – “se não credes,
não podeis nem entender”. Agostinho disse algo semelhante: credimus enim ut
cognoscamus, nom cognoscimus ut credamos – “cremos para conhecer e não
conhecemos para crer”. Na exegese bíblica, esta máxima tem o valor de
mostrar que o intérprete só poderá entender plenamente a Bíblia se assumir as
pressuposições e a fé dos autores originais. “Sem fé é impossível entender
Deus...” (inspirado em Hb 11.6).11
6
Provérbios 1.7
7
Isaías 8.20
8
1Coríntios 4.6
9
Para maior discussão deste provérbio veja: Álvaro César Pestana, Provérbios Coríntios e Provérbios Paulinos,
Campo Grande, SerCris, 2006.
10
Citado em R. Tosi, Dicionário de Sentenças Latinas e Gregas, São Paulo, Martins Fontes, 2000 (2ª ed.), p. 669,
#1468.
11
Sobre a necessidade de assumir as pressuposições ou a fé dos autores originais, veja B.J.Bost e A.C.Pestana, Do
Texto à Paráfrase: como estudar a Bíblia, São Paulo, Ed. Vida Cristã, 1990, pág. 9-10.

35
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

§06 - Leio para compreender.


Lego ut intelligam [Agostinho12]
Em Efésios 3.4, Paulo diz que os irmãos poderiam ler e compreender: o]
du,nasqe avnaginw,skontej noh/sai – o objeto deste conhecimento é o que Paulo
compreendia das revelações de Cristo. O ponto de vista dos escritores bíblicos,
diversamente dos atuais pensadores pós-modernos, é que o texto transmitirá
compreensão e conhecimento. Ler a Bíblia é o primeiro passo óbvio, mas
pouco praticado, para ter compreensão dela.

§07 - Creio porque é absurdo.


Credo quia absurdum13
A frase é atribuída a Agostinho, mas não se pode provar. Tertuliano, contudo
disse: credibile quia ineptum est – “crível porque é ilógico”. Para o exegeta, a
frase mostra que nossa aproximação da Bíblia será sempre baseada em fé, pois
muito dos seus relatos, como por exemplo dos milagres, vão contra nossa atual
cosmovisão. Se cremos, é porque o relato exige fé. Se não houver fé, não
haverá compreensão. A frase não é desculpa para a superstição, mas para a
possibilidade de Deus ser maior que a nossa lógica humana.

§08 - Adicione respeitosa curiosidade ao respeito curioso.


Adsit quidem pia curiositas et curiosa pietas. [Erasmo de Rotherdan14]
Ajunte curiosidade piedosa à curiosa piedade. Não é para negar o valor os
estudos e da curiosidade dos estudantes, mas também é para ter respeito pelas
coisas mais importantes. O estudo não precisa ser blasfemo e nem
obscurantista.

§09 - Todo o conhecimento correto acerca de Deus nasce da obediência.


Omnis recta Dei cognitio ab obedientia nascitur [Calvino15].
Exegese não é só técnica e arte, é também espírito e Espírito. Só se consegue
entender a Bíblia, se o coração for obediente. O coração desobediente tentará
torcer e turvar o sentido bíblico para que não haja compreensão. Não é que as
pessoas não conseguem compreender, mas não querem compreender. Só o
obediente quer compreender.

§10 - Nenhum homem entende as Escrituras, a menos que tenha familiaridade com a
cruz.
A frase é de Lutero.16 O sentido é óbvio. Sem uma visão cristológica e
cristocêntrica, a leitura bíblica será sem ‘lógica’ e sem ‘centro’. Cristo é a

12
K. Vanhoozer, Há um significado neste texto: Interpretação bíblica: os enfoques contemporâneos, São Paulo,
Vida, 2005, p. 42
13
R. Tosi, Dicionário de Sentenças Latinas e Gregas, São Paulo, Martins Fontes, 2000 (2ª ed.), p.670,# 1470
14
Frederic W. Farrar, History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886]. p.475.
15
Calvino, citado em NDITNT, vol 2, p. 7.

36
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

chave da compreensão do Antigo Testamento e a razão da existência do Novo


Testamento.

§11 - Um verdadeiro leitor é quase sempre um amigo.


Le vrai lecteur est presque toujour un ami. [Pagnol17]
Esta frase, embora não se aplique somente aos livros da Bíblia, tem grande
relevância também para a compreensão das verdades inspiradas. Os antigos já
diziam que “uma carta é uma comunicação entre amigos”. Assim, a começar
das cartas neotestamentárias, até mesmo todos os outros livros da Bíblia, se o
leitor não for amistoso, não haverá verdadeira comunicação.

§12- Interprete num espírito de piedade e humildade.


Scriptura sacra nom temerarios et superbos accusatores sed diligentes et pios
requirit lectores [Agostinho18]
Num excelente tratado de exegese e hermenêutica para o mundo pós-moderno,
o escritor Kevin Vanhoozer, no fim de seu esforço hercúleo de dissecar e
responder as propostas dos pós-modernistas, propôem uma “hermenêutica da
humildade e da convicção”. Mistura deveras oximórica e verdadeira. Sem
humildade, não se chega à presença de Deus. Ouvi de um dos maiores eruditos
da história e da interpretação bíblica a seguinte frase: “Nós também temos os
pés de barro!” [E. Ferguson, 2004]. A idéia é que nós também, como a estátua
de Nabucodonosor, somos fracos e falíveis – falhos no fundamento. Humildade
sempre é necessária.

§13 - Douta ignorância.


Docta ignorantia19
O autor da frase não é sabido, mas uma obra de Nicolau de Cusa usou-a como
título. Significa que, mesmo depois de fazer todos os estudos, o máximo a que
chegaremos é a uma douta ignorância, pois as coisas mais profundas e
misteriosas de Deus não serão possíveis ao homem. Na Bíblia, depois de
estudar tudo, digamos, somos estudiosos ignorantes, pois não podemos saber
tudo que é possível saber.

§14 - Santa simplicidade!


Sancta simplicitas [Jerônimo20]
A frase originalmente celebrava a santidade das palavras simples e diretas de
Jesus, em sua pregação e ensino. Depois tornou-se um modo de recriminar a fé
ingênua. O ponto, útil para os exegetas, é que a Bíblia fala e exige ‘santa
16
Lutero, citado por K. Vanhoozer, Há um significado neste texto: Interpretação bíblica: os enfoques
contemporâneos, São Paulo, Vida, 2005, p. 521.
17
Pagnol, citado por K. Vanhoozer, Há um significado neste texto: Interpretação bíblica: os enfoques
contemporâneos, São Paulo, Vida, 2005, p. 536
18
Frederic W. Farrar, History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886]. p. 476.
19
R. Tosi, Dicionário de Sentenças Latinas e Gregas, São Paulo, Martins Fontes, 2000 (2ª ed.), p. 163, #348
20
R. Tosi, Dicionário de Sentenças Latinas e Gregas, São Paulo, Martins Fontes, 2000 (2ª ed.), p. 670, #1472

37
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

simplicidade’ em sua compreensão e em sua pregação. Sofisticação é o que é


necessário para a mentira.

§15 - Conhece-te a ti mesmo.


Gnw/qi seauto,n [Provérbio Délfico21]
Este provérbio pagão tem utilidade para o exegeta, na medida que ele precisa,
com humildade, reconhecer sua mortalidade, sua humanidade, sua condição
fraca e pecadora, para ter o cuidado necessário ao estudar e interpretar a Bíblia.
Os exegetas que criticam, corrigem e julgam a Bíblia “não conhecem a si
mesmos” – acham que são deuses, mas são mortais!

§16 - Aplica-te totalmente ao texto; aplica-o totalmente a ti.


Te totum applica ad textum: rem totam aplica ad te [J. A. Bengel22]
Nada melhor do que grande esforço interpretativo associado a grande esforço
para obedecer e cumprir o que o texto diz. O modelo é Jesus que diz: “Hoje se
cumpriu esta passagem que acabais de ouvir!” Certamente ele cumpre a
passagem como Messias, nós cumpriremos as passagens como servos
obediêntes a Deus.

§17 - A ignorância do sentido certo de muitas passagens deve ser admitido.


[dwy yKnya rmal ^nwfl dMl [Talmude23]
ou
24
[dwy aol yKnoa rmal ^nwfl dMl
Ensine a tua minha língua dizer: ‘Eu não sei!’
Melius est dubitare de rebus occultis quam litigare de incertis, - “é melhor ter
dúvidas das coisas ocultas do que discutir o incerto.” [Agostinho].
A idéia é que não sabemos tudo (Dt 29.29), e em alguns casos, temos
dificuldades para compreender o texto (2Pe 3.16). É melhor dizer ‘não sei’ do
que inventar respostas.

§18 - Tudo que é essencial está claramente revelado na Escritura.


pa,nta ta. avnagkai/a dh/la [Cristóstomo25, comentário de 2Ts].
Literalmente, a frase diz: “Todas as coisas necessárias são evidentes”. Como o
contexto da afirmação é a Bíblia, a frase significa: “Todas as coisas necessárias
estão claramente reveladas na Bíblia”. Ou seja, “A Escritura nos basta!” Num
sentido, é isto que João 20.30-31 quer dizer. Se a revelação divina não nos

21
Atribuido a vários dos “Sete Sábios”. R. Tosi, Dicionário de Sentenças Latinas e Gregas, São Paulo, Martins
Fontes, 2000 (2ª ed.), p. 163, # 347
22
Citado no prefácio de Nestle-Aland, NOVUM TESTAMENTUM GRAECE, 25a edição, também K. Vanhoozer, Há
um significado neste texto: Interpretação bíblica: os enfoques contemporâneos, São Paulo, Vida, 2005, p. 476; Ver
também Enio Muller in G. D. Fee & D. Stuart, Entendes o que lês?, São Paulo, Ed. Vida Nova, 1984, p. 244.
23
Frederic W. Farrar, History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886]. p. 474.
24
Devo esta outra versão ou correção ao irmão Bio Gomes.
25
Frederic W. Farrar, History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886]. p. 473.

38
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

orientasse nos pontos essenciais, não seria uma revelação suficiente (e nem
necessária).

§19 - Às fontes!
Ad fontes.
Este foi o lema do Renascimento. O alvo era ir aos originais do pensamento
humano e não ficar lendo comentários dos comentários dos comentários de
uma obra ilustre. Ir diretamente “às fontes” acabou por gerar a Reforma
Protestante, que abandonou séculos de tradições interpretativas sobre a Bíblia
para ler a própria Bíblia, de novo, nas línguas originais. O professor E.
Ferguson parodiou Paulo ao dizer: “Prefiro ler 5 palavras em uma fonte
original do que 10.000 em uma fonte secundária.”26

§20 - O verdadeiro sentido só pode ser decidido pelo original.


Impossibile est quod proprietas unius linguae servetur in alia [R. Bacon,
citando Jerônimo: si ad verbum interpretor, absurdum est.]27
As traduções errar. “Tradutor, traidor!” é uma máxima comum para descrever
todo trabalho de traduzir e de passar uma tradição. Portanto, sempre há a
necessidade de ir ao original, para pesquisar o sentido do texto e também é
necessário ser humilde, pois outros também estiveram trabalhando com o
original e seu esforço, se equivocado ou ultrapassado, é um aviso sobre a
possibilidade de nós também estarmos trilhando pelo mesmo caminho que
criticamos em outro.

§21 - O verdadeiro sentido da Escritura é Escritura.


Omnis Scriptura sacra eo spiritu debet legi quo scripta est [Tomas a Kempis28]
Isto é verdadeiro e falso. O provérbio é verdadeiro no sentido de obrigar-nos a
praticar o que compreendemos. Assim, uma compreensão do sentido de um
texto é “Bíblia” para nós. Por outro lado pode ser falso no sentido de
transfomar em canônica cada interpretação do texto. O caso do Judaísmo com
sua linha de ‘crescimento’ da Torá, é um triste exemplo: Toráh Escrita →
Toráh Oral → Mishnah → Tosetfa → Talmude. Hoje, o judeu tem como
“Bíblia” toda uma série de interpretações. Neste sentido, o provérbio é falso.

§22 - A Escritura deve ser interpretada de acordo com as regras ordinárias da


linguagem humana.
A lei fala na língua dos filhos dos homens.29 Os antropomorfismos,
antropopatismos e todas as formas de expressão humanas da palavra de Deus
são uma concessão, condescendência [sugkata,basij] divina ao gênero humano.
26
E. Ferguson, Backgrounds of Early Christianity, Grand Rapids, Eerdmans,1987, p. ix: “Five words in an original
source are worth a thousant words in a secondary source”.
27
Frederic W. Farrar, History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886]. p. 473.
28
Frederic W. Farrar, History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886]. p. 474.
29
Frederic W. Farrar, History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886]. p. 475.

39
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

O fenômeno da Encarnação do Verbo, no homem Jesus, é similar ao fenômeno


da “encarnação” das palavras divinas no livro Escrituras.

§23 - Texto sem contexto é pretexto.


Esta é uma máxima popular, cuja origem não posso verificar, mas que tem
muito peso na interpretação bíblica. O sentido das palavras, das idéias e de
todos os livros bíblicos só são passíveis de compreensão correta quando
entendemos o contexto dos antigos e o nosso. O uso de textos fora do contexto,
como textos prova ou como ‘oráculos’ isolados faz os maiores absurdos da
‘cristandade’ em todos os tempos.

§24 - Distingue tempos e concorda com as Escrituras.


Distingue tempora et concordabis Scripturas. [Agostinho30]
Este provérbio incentiva o intérprete a distinguir o temporal do permanente. A
tarefa do intérprete é perceber a diferença entre o texto e a situação passada e
ao mesmo tempo ver como aplicar e concordar com o sentido da Escritura no
presente. Esta luta para conseguir obedecer as Escrituras apesar da distância
cultural e histórica entre o texto e o atual leitor é a grande tarefa do intérprete.

§25 - Buscai o significado original, e todas essas relevantes aplicações serão


adicionadas a você.31
O sentido original deve ser o primeiro a ser descoberto. Somente sob a
iluminação do sentido original que podemos encontrar aplicações modernas e
particulares para o texto.

§26 - Interprete literalmente e gramaticalmente.32


A interpretação dos textos precisa levar em conta o sentido literal, histórico e
gramatical. Qualquer interpretação que fuja do significado claro do texto
precisa ser rejeitada. É necessário ilustrar o sentido bíblico, onde possível, com
referências da história, da topografia e das antiguidades. A interpretação
precisa fazer constante referência ao contexto histórico, cultural e literário.

§27 - A Escritura é intérprete da Escritura.


Scriptura Scripturae interpres33
Esta é uma regra de ouro para os estudos bíblicos. Pode ser abusada quando
usa-se textos inapropriados para interpretar outros. Por outro lado, quando a
comparação de Escritura com Escritura é feita do jeito certo, uma compreensão
ampla da vontade de Deus será atingida. Este princípio leva em conta o fato da
Bíblia ser produto de uma única Mente, apesar dos quase quarenta autores.
30
Frederic W. Farrar, History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886]. p. 475.
31
Clark Pinnock, The Scripture Principle, citado por Kevin Vanhoozer, Há um significado neste texto: Interpretação
bíblica: os enfoques contemporâneos, São Paulo, Vida, 2005, p. 471.
32
Frederic W. Farrar, History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886]. p. 476.
33
Citada por Louis Berkhof, Princípios de Interpretação Bíblica, Rio de Janeiro, JUERP, 1981, p. 29, 31

40
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

Entendendo-se cada texto no seu contexto e depois fazendo a comparação e


coordenação de textos, a unidade e coerência da Escritura fazem com que um
texto ilustre e interprete outro.

§28 - Interpretar a Bíblia “segundo a proporção da fé” ou “segundo a Escritura”.


Kata. th.n avnalogi,an th/j pi,stewj [Paulo34]
Analogia fidei – Analogia Scripturae.35
Omnis intellectusac espositio Scripturae sit analgia fidei36 - Toda compreensão
e exposição da Escritura tem que estar de acorco com a analogia da fé”.
Interprete de acordo com a analogia da Escritura e de acordo com a analogia da
fé significa quase a mesma coisa que o princípio anterior (§27). Isto quer dizer
que a análise de um texto deve ser feita de acordo com a fé e com a Escritura.
Fé, aqui, tomada no sentido da doutrina e da revelação total da Bíblia. Estes
princípios também já foram mau usados, tirando textos do contexto e
aplicando-os de modo contrário aos sentidos originais. O uso de ‘textos-prova’
infelizmente se justificam, geralmente, neste princípio.37 Apesar do mau uso, o
princípio é importante e válido.

§29 - “Prefiro errar com Platão a ter razão com estes”.


Errare malo cum Platone quam cum istis vera sentire.38
O sentido é, para os exegetas bíblicos, o seguinte: é melhor errar aos olhos de
outros e permanecer fiel às Escrituras do que ter razão com os supostamente
certos: preferimos ficar com a Bíblia.

§ 30 - “Platão é amigo, mas a verdade é mais amiga”.


Amicus Plato, sed magis amica veritas.39
O sentido é, para os exegetas bíblicos, o seguinte: podemos apreciar um ou
outro teólogo ou intérprete, mas no fim das contas, a Bíblia sempre terá
preferência no momento de seguir uma orientação: preferimos ficar com a
Bíblia.

§31 - Cada doutrina e inferência da Escritura deve provir do sentido literal.


Omnes sensus fundantur supre unum, scilicet literalem40
Mais um provérbio contra os excessos das interpretações alegóricas da igreja
medieval.

34
Romanos 12.6
35
Frederic W. Farrar, History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886], p. 332-3.
36
Citada por Louis Berkhof, Princípios de Interpretação Bíblica, Rio de Janeiro, JUERP, 1981, p. 29
37
Frederic W. Farrar, History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886], p. 365.
38
R. Tosi, Dicionário de Sentenças Latinas e Gregas, São Paulo, Martins Fontes, 2000 (2ª ed.), p. 177 # 382 o
contrário é # 299.
39
R. Tosi, Dicionário de Sentenças Latinas e Gregas, São Paulo, Martins Fontes, 2000 (2ª ed.), p. 140 # 299 o
contrário é # 382.
40
Frederic W. Farrar, History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886]. p. 474.

41
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

§32 - Conclusões teológicas não podem vir de passagens simbólicas.


Theologica parabolica non est demonstrativa41
Este provérbio tem razão quando impede a criação de doutrinas sobre
Escrituras interpretadas alegoricamente. Por outro lado, é um exagero quando
não se pode usar os textos figurados da Escritura (parábolas, metáforas,
símiles, linguagem simbólica, etc) para entender doutrinas. Os textos figurados
e simbólicos também transmitem doutrina.

§33 - A letra ensina os acontecimentos;


O que você crê é ensinado pela alegoria;
O ensinamento moral é o que você faz;
O seu destino é ensinado pela anagogia.
“Littera gesta docet,
Quid credas allegoria,
Moralis quid agas,
Quo tendas anagogia”42
Outra tradução é:
Os feitos de Deus e de nossos pais, a letra conta;
Os fundamentos da nossa fé, a alegoria aponta;
As regras do dia-a-dia, o sentido moral desvela;
Onde termina nossa porfia, a anagogia revela.
Este “versinho” medieval assinala os 4 sentidos atribuídos às Escrituras. Os
sentidos são: (i) Sentido literal (ou histórico), que é o óbvio no texto; (ii)
Sentido alegórico, é obtido pela descoberta de um sentido espiritual no texto;
(iii) Sentido moral (tropológico) é o que diz respeito ao comportamento moral
e prático; (iv) Sentido anagogico (do verbo anagein), é o significado oculto,
celestial.
Estes provérbios tiveram muita influência, mas são totalmente equivocados
para o estudo bíblico.

§34 - Espírito tendencioso e partidarista é fonte fatal de erro exegético.43


Chamada “teologia de reação”, ou seja, a teologia formulada apenas para reagir
e contraditar um adversário não é um guia adequado para a verdade. Segundo
Tiago (3.13-18) a sabedoria divina é pacífica. Ódio e ressentimento não são
bons guias exegéticos.

§35 - Aprende-se mais com a concordância do que com muitos comentários.


O uso de uma concordância bíblica para estudar palavras, idéias, doutrinas,
personagens, estruturas gramaticais, informações históricas, topográficas, etc

41
Frederic W. Farrar, History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886]. p. 329 e 474.
42
Roy B. Zuck, A Interpretação Bíblica, São Paulo, Ed. Vida Nova, 1994, p. 46-47.
43
Frederic W. Farrar, History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886]. p.473-476.

42
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

são uma das mais poderosas ferramentas do exegeta.44 O chamado usus


loquendi45 de uma palavra, ou seja, o sentido da palavra no contexto é o único
importante para a exegese.

36 - Enterre-se num dicionário para subir à presença de Deus46


Este provérbio faz muito sentido, quando lembramos que a revelação divina
exige de nós o trabalho de entender o significado das palavras, tanto no texto
antigo, como na comunicação moderna.

§37 - A filologia é o fundo da agulha através do qual todo camelo teológico deve
passar para entrar nos céus da teologia47
O teólogo que não for filólogo não é “teófilo” (=amigo de Deus). Numa época,
Platão proibia que adentrasse em sua Academia, quem não fosse geômetra.
Também poderíamos parafrase-á-lo dizendo: “Não entre quem não for
filólogo”. O estudo das palavras e da linguagem é essencial para os estudos
bíblicos. “Temo as definições baseadas apenas na etimologia e não na
khestologia.” Ou, falando de modo mais popular: “O significado é determinado
pelo uso e não pela etimologia.”48

§38 - Ora e labora


Ora et labora.49
No estudo bíblico, orar antes de estudar é necessário. A oração não substitui o
estudo, mas o estudo não prescinde da oração.

§39 - Os pecados do intérprete são dois: orgulho e preguiça.50


Esta frase, pouco proverbial é muito verdadeira. Não existe combinação mais
letal para um estudioso da Bíblia (e para qualquer um) do que esta. Orgulho faz
o intérprete achar que sabe tudo e a preguiça faz com que não trabalhe o
suficiente para buscar a verdade. Na verdade a preguiça-orgulhosa tenderá
desvalorizar o estudo dizendo que ele não tem valor. Ao mesmo tempo, o
orgulho-preguiçoso tenderá a não querer aprender mais nada. Trata-se de um
caso sério.

44
Sobre o uso da concordância, veja B.J.Bost & A.C.Pestana, Do Texto à Paráfrase: como estudar a Bíblia, São
Paulo, Ed. Vida Cristã, 1990, em todo o livro, o uso da concordância é recomendado e incentivado.
45
Louis Berkhof, Princípios de Interpretação Bíblica, Rio de Janeiro, JUERP, 1981, p.78.
46
Sir Edwyn Hoskyns, citado no NDITNT, vol 1, p. 7
47
Nathan Söderblom, citado por A. Malherbe, Through the Eye of the Needle: Simplicity or Singleness, in Restauration
Quarterly 56, (1971), p. 119
48
D. Carson, A exegese e as suas falácias, São Paulo, Edições Vida Nova, p. 29, nota 13.
49
R. Tosi, Dicionário de Sentenças Latinas e Gregas, São Paulo, Martins Fontes, 2000 (2ª ed.), p. 430,#913.
50
K. Vanhoozer, Há um significado neste texto: Interpretação bíblica: os enfoques contemporâneos, São Paulo,
Vida, 2005, p. 538.

43
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

§ 40 - A compreensão do “Sitz-im-Leben” original depende do “Sitz-im-Glauben” do


exegeta.51
“Sitz-im-Leben”, literalmente, ‘assento-da-vida’ é um termo alemão para falar
da ‘situação existencial geradora’ do autor e da igreja antiga, que influenciou a
confecção dos textos bíblicos para resolver suas questões. O “Sitz-im-Glauben”
significa ‘assento-da-fé’, ou seja, o posicionamento do estudioso em relação a
fé. Se o “Sitz-im-Glauben” for negativo, a compreensão do “Sitz-im-Leben”
será igualmente negativo. Isto apenas enfatiza o fato que a fé dos escritores
originais só será compreendida se tiver reflexo na fé do intérprete.

§41 - A Historie gera a Geschichte e a Geschichte faz entender a Historie.


Os fatos históricos geram a fé e a fé é confirmada pela história. Ou seja, temos
uma fé baseada nas intervenções (ações e palavras) de Deus na história
humana.
Estes termos alemães são usados para distinguir os fatos reais ocorridos,
chamado de Historie, das interpretações e significados posteriores destes fatos,
chamada de Geschichte. O que se costuma dizer é que os fatos (Histórie) não
precisam ser verdadeiros para causar uma boa impressão ou interpretação
(Geschichte). Assim, eles tentam afirmar que se a ressurreição de Jesus ocorreu
ou não, não importa, o que importa é a fé da igreja no Cristo ressurreto.

§42 - Textos fáceis intepretam textos difíceis e não o contrário.


Este é um princípio de lógica e do processo educativo. Vamos do conhecido
para o desconhecido. Assim, os textos simples, claros e literais da Bíblia devem
guiar o sentido dos textos complicados, obscuros e simbólicos. Qualquer
inversão deste princípio pode significar a tranferência da ignorância ou da
dificuldade de um texto para outros.

§43 - Os leitores originais são os que melhor entenderam os textos bíblicos.


Isto pode ter umas poucas exceções, mas, em geral, atribuir a um texto, um
sentido que os leitores originais não poderiam alcançar, é o caminho certo para
uma exegese arbitrária. O livro de Daniel é designado como um livro ‘fechado’
para o seu tempo e que seria aberto no futuro (Dn 12.4). Por outro lado, a maior
parte dos livros bíblicos eram mensagem para sua época. A compreensão dos
leitores originais deve guiar e limitar a nossa.

§44 - A Bíblia julga o homem, mas o homem não julga a Bíblia.


Isto pode ser usado de várias formas. O ponto a ressaltar é que não podemos
usar nossa experiência ou modo de ver as coisas para julgar e avaliar a Bíblia.
É a Bíblia que deve julgar a avaliar nossa experiência e modo de ver as coisas.

51
Enio Müller, in G. Fee & D Stuart, Entendes o que Lês?, São Paulo, Ed. Vida Nova, 1984, p. 279.

44
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

§45 - Se Deus escreveu, temos que ler!


O estudo da Bíblia, no fim das contas, não é opção, é obrigação. Sendo a
Bíblia, a escrita de Deus, não há outro meio de respeitar a ação divina a não ser
aprender a ler corretamente e do melhor modo possível.

45
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

AS SETE REGRAS DA EXEGESE RABÍNICA


© 2010 Álvaro César Pestana
52
As Sete Regras de Hillel existiram por longo tempo antes do próprio Hillel. Muitas deles
revelam influência da erudição grega e são regras oriundas da filosofia grega. Elas acabaram
recebendo o nome dele por ter sido Hillel o primeiro a colocar por escrito estas regras. Para os
estudantes do Novo Testamento, o nome de Hillel ocasionalmente é citado ao lado, ou melhor em
oposição, do nome de Shammai, pois estas duas ‘escolas’ disputavam os motivos lícitos para o
divórcio.
Hillel ficou conhecido por buscar e ensinar o ‘espírito da lei’ enquanto Shammai foi acusado
de ensinar a ‘letra da lei’. Apesar das posturas de Hillel terem sido mais leves ou ‘liberais’, eram as
posições de Shammai que tinham maior aceitação pública, devido ao seu caráter mais conservador.
[Muitos intérpretes inferem erroneamente a situação contrária, mas para confirmação, veja
J.Jeremias, Jerusalém, p. XX]. Depois da destruição do templo, a escola de Hillel foi se tornando
mais popular de modo a tornar-se predominante no judaísmo posterior.
Estes eruditos judaicos, anteriores ou quase contemporâneos53 a Jesus, tem idéias similares e
contrastantes com Jesus em vários de seus ensinamentos. Embora seja mais comum ver
proximidade entre Jesus e Hillel, há alguns momentos em que Shammai parece mais próximo a
Jesus. Por outro lado, em várias ocasiões, ambos são rejeitados – por exemplo, no caso do divórcio,
Jesus fica mais semelhante aos essênios em sua proibição absoluta do divórcio. Na verdade, o
pensamento de Jesus era independente das escolas rabínicas de seu tempo, de modo que os seus
ouvintes compreendia que ensinava com autoridade e não como os escribas (Marcos 1.22).
Uma aproximação e ao mesmo tempo um distanciamento entre Jesus e Hillel pode ser visto
na chamada “Regra de ouro”: Jesus disse, “Tudo quanto quereis que os homens vos façam, fazei-o
vós a eles. Esta é a Lei e os Profetas” (Mt 7.12).
Hillel formulou uma declaração similar, mas negativa: “O que é odioso para você, não faça
para o seu próximo – isto é toda a Lei” (b.Shabbat 31a).
Embora alguns acreditem que estas são a mesma regra em duas versões, a formulação
positiva de Jesus é muito mais abrangente e ativa. A postura de Hillel é negativa e passiva – não
fazer nenhum mal. A postura de Jesus e positiva e ativa – leva a fazer todo o bem! A diferença não
poderia ser maior.
Depois da morte de Hillel, a direção da ‘escola’ passou para seu filho Simeão. Depois dele,
o principal ‘mestre’ foi Gamaliel, [Gamliel] neto de Hillel. Este é o Gamaliel conhecido dos leitores
do livro de Atos, que defendeu os apóstolos com uma proposta que, quando analisada friamente, é
covarde e equivocada (At 5.34-39). Sua proposta era que os judeus deixassem os discípulos em paz,

52
Julio Trebolle Barrera, A Bíblia Judaica e a Bíblia Cristã, Petrópolis, Vozes, 1996, p. 576; H. L. Strack & G.
Stemberger, Introduction to the Talmud and Midrash, Edinburgh, T&T Clark, 1991, p. 21-23; Richard
Longenecker, Biblical Exegesis in the Apostolic Period, Grand Rapids, Eerdmans, 1975, p. 34-35; Frederic W. Farrar,
History of Interpretation, Grand Rapids, Baker, 1979 [1886]. p. 18-19. W. C. Kaiser Jr & M. Silva, Introudução à
Hermenêutica Bíblica, São Paulo, Ed. Cultura Cristã, 2002, p. 205-6. Neste texto, dependo bastante de um trabalho do
Dr. James Trimm, disponibilizado na Internet. Contudo, a atual redação é de minha responsabilidade e discorda do Dr.
Trimm em alguns aspectos, além de enriquecer a discussão com outras fontes, exemplos e posicionamentos. Algumas
idéias foram retiradas de Jewish Encyclopedia article on Talmud Hermeneutics, by Wilhelm Bacher and Jacob Zallel
Lauterbach. Disponível em "http://en.wikipedia.org/wiki/Talmudical_Hermeneutics"
53
Hillel morreu em 8 A.D.. Jesus nasceu entre 4 a 6 a.C.. Assim, a visita do menino Jesus a Jerusalém podia ter
ocorrido entre os anos 6 a 8 A.D. – Jesus e Hillel poderiam ter se encontrado e Hillel podia ter ficado admirado com as
posturas deste pequeno menino (Lc 2.46-47).

46
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

pois se seu ensino fosse divino não poderia ser detido e se fosse humano fracassaria. Isto não é
verdade na prática, pois muitas mentiras prosperam e muitos justos são injustiçados. Ele como
sinedrista tinha que examinar a questão. Certamente, sua postura era melhor que a dos seus colegas
que queriam matar, sem julgamento, aos apóstolos. Mas foi uma postura errada por não examinar a
questão a fundo. Eles eram os mestres da religião – deviam saber se a ressurreição de Jesus era fato
ou fantasia. Sua omissão foi covarde, embora salvasse os discípulos. Gamaliel também é conhecido
por ter sido o professor de Saul, ou seja, de Paulo (At 22.3). O discípulo, neste caso, suplantou o
mestre por ter tomado uma postura decisiva em face do que julgava ser uma heresia. Se Jesus
morreu na cruz, o VT dizia que era maldito. Se era maldito, seus seguidores eram mais malditos
ainda. Embora ele não tivesse conseguido provar isto para Estevão, e nem mesmo vencê-lo no
debate, ele organizou sua execução, mais baseada no zelo do que nas provas concretas. No fim, este
zelo que tinha, do qual Gamaliel não compartilhava, levou-o a ir até Damasco perseguindo os
seguidores do Nazareno. Seu zelo foi recompensado com a graça de uma visão de Jesus. Isto mudou
sua vida, de modo que Gamaliel, em sua neutralidade, não pode ser mudado. O erro de Gamaliel fez
com que seu neto, Gamaliel II, já endurecido contra os cristãos, promovesse a ‘maldição aos
cristãos’ na oração de abertura do culto da sinagoga, chamada “As Dezoito Bênçãos” – à partir de
então, os cristãos não puderam mais frequentar as sinagogas, aprofundando o abismo entre o
judaísmo e o cristianismo, que deveriam ser uma religião só, levando todos a Deus, por meio do
Messias Jesus.
Em 2Tm 2.15 Paulo fala de “dividir corretamente a palavra da verdade” O que ele estaria
dizendo com esta expressão: Certamente significa que há modos certos e errados de interpretar a
Bíblia. Certamente as regras de Hillel deveriam ter sido ensinadas a ele e, ocasionalmente, ele as
utilizou em sua interpretação do Velho Testamento. Vários exemplos mostrarão o alcance desta
influência.

Classificação das Regras Judaicas de Interpretação Bíblica


A tradição tannaítica (dos Tannaim) reconhecia 3 grupos de regras de interpretação:
1. As sete regras de Hillel; 2. As treze regras de R. Ismael [que são apenas uma amplificação
das anteriores]; 3. As trinta e duas regras de R. Eliezer b. Jose há-Gelili [Trata mais da interpretação
da Hagadah, mas inclui as duas listas anteriores].
As Eras rabínicas são sete: Zugot, Tannaim [10 – 220 d.C.], Amoraim, Savoraim, Geonim,
Rishonim, Acharonim.54 Hillel é o último Rabi da Zugot e esta classificação é o período dos
Tannaim. Estas 7, 13 e 32 regras não foram assim enumeradas por Hillel, Ismael ou Eliezer, mas
foram compiladas de seus escritos.

54
Zugot = pares [Desde Jose b. Joezer até Hillel].
Tannaim = de “tanna” << tani ou tena = ensinar.[10-220 d.C]
Amoraim = plural de “amora” = preletor, portanto, intérprete. [219-500 d.C.]
Savoraim = [c. de 500 -540 d. C.]
Geonim = [c. de 540 – 1034/8 d.C.]
Rishonim
Acharonim

47
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

twdym ], de Hillel, que serão alvo de nossa atenção, são :


As sete regras, midoth [ 55

1. qal wahomer = rmwxw lq = a minori ad maius = a fortiori = po,sw| ma/llon =


“leve e pesado”
[Lê-se “kal v’khomer”]
“O que se aplica a um caso de menor importância tem validez em outro
de maior peso ou importância”
Qal wahomer é a primeira das sete regras para o entendimento das Escrituras, conforme compilou
Hillel. De fato, ele não inventou as regras, mas elas são usadas pelo próprio Velho Testamento.
Também é a primeira regra do R. Ismael. Ela é também chamada de “din”, ou seja, “conclusão”.
Trata-se do argumento “a maiori ad majus” ou “a majori ad minus”. O nome completo da regra
seria “qal wahomer, homer weqal” [= simples e complexo, complexo e simples]. A regra caminha
nos dois sentidos lógicos, conforme a necessidade e a indicação do texto.

A premissa maior na qual se baseia o argumento era chamada “nadon” e mais tarde “melammed”
[= o que isto ensina]. A conclusão resultante do argumento era chamada de ‫בא מן הדין‬, ou,
posteriormente, “lamed” [= o que se aprende].
No qal wahomer, a regra limitadora diz que a conclusão deveria conter nada mais do que o que foi
encontrado na premissa. Esta regra, chamada, dayyo (= suficiente, bastante), que muitos mestres
ignoraram, era enunciada da seguinte forma: “A conclusão de um argumento é atingida quando ele
é como a premissa maior” [ ‫] דיו לבא מן הדין להיות כנדון‬. A conclusão de um argumento é satisfeita
quando ele é igual à a premissa maior. Ou, em outras palavras, a conclusão é equalizada à premissa
e não se pode tomar uma postura nem mais estrita e nem mais leve (m.BK 2.5).
A descoberta em uma falácia no processo de dedução era chamada de “teshubah” (= objeção) ou na
linguagem dos Amoraim, “pirka”. Esta possibilidade de impugnação do argumento não era
incomum, que fazia com que o argumento tivesse certas limitações de uso. O rabi Tarfon rejeitou o
princípio dayyo em certos casos (b.BK 25a).
O qal wahomer rigorosamente é usado para fazer um argumento do menor para o maior, ou seja, o
que vale em um caso menor e mais leve aplica-se ao maior e mais pesado. A formulação é:
Se X é verdadeiro no assunto Y, então será muito mais verdadeiro no assunto Z. (Onde o assunto Z
maior do que Y).
O argumento qal wahomer é frequentemente, embora não sempre, assinalado com frases tais como
“quanto mais”.
Os escritores rabínicos, como Eliezer b.-Jose há-Gelili, reconheciam duas formas do argumento qal
wahomer:
qal wahomer meforash – Quando a forma do argumento qal wahomer aparece explicitamente.
qal wahomer satum – Quando o argumento qal wahomer está apenas implícito.
Há vários exemplos destes argumentos qal wahomer no Velho Testamento:
Por exemplo:

55
Veja Tosefta Sinhedrin, c.7. Veja também “Rules of Hillel, The Seven” em.The Jewish Enciclopedia.

48
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

Se os justos recebem na terra a punição que merecem,


quanto mais o ímpio e o pecador! (Pv 11.31)
E veja duas vezes o mesmo argumento em:
Se você correu com homens e eles o cansaram,
como poderá competir com cavalos?
Se você tropeça em terreno seguro,
o que fará nos matagais junto ao Jordão? (Jr 12.5)
Outros exemplos do VT são: Dt 31.27; 1Sm 23.3; Jr 12.5b; Ez 15.5; Et 9.12
Há também textos trabalhados pelos rabinos através do argumento:
Nm 12.14 & b.BK 25a;
Dt. 21:23 & m.San. 6:5;
Lev. 21:16-21 & Num. 8:24-25 & b.Hul. 24a
Existem vários casos de qal wahomer no Novo Testamento. Jesus usou o argumento com
frequencia. Por exemplo:
Ora, se um menino pode ser circuncidado no sábado para que a Lei de Moisés não seja quebrada,
por que vocês ficam cheios de ira contra mim por ter curado completamente um homem no sábado?
(Jo 7.23)
E também:
Qual de vocês se tiver uma ovelha e ela cair num buraco no sábado, não irá pegá-la e tirá-la de lá?
Quanto mais vale um homem do que uma ovelha? (Mt. 12:11-12a)
Outros exemplos de uso do qal wahomer no ensino de Jesus: Mt 6.26, 30 = Lc 12.24, 28; Mt 7.11 =
Lc 11.13; Mt 10.25 & Jo 15.18-20; Mt 12.12 & Jo 7.23.
Usos do qal wahomer por Paulo: Rm 5.8-9, 10, 15, 17; 11.12, 24; 1Co 9.11-12; 12.22; 2Co 3.7-9,
11; Fp 1.16; 2.12; Hb 2.2-3; 9.13-14; 10.28-29; 12.9, 25 (Supondo Hebreus ser Paulina).

2. gezerah shawah = hwv hryzg


= sunkrisij pro.j ison = “equivalência” =
equivalência de expressões = para textos da Toráh que usam a mesma expressão =
argumento da analogia = “leis similares, vereditos similares”.
[Lê-se “g’zerah shavah”]
“Expressões e palavra idênticas, em diferentes textos, têm a mesma
aplicação”.
Esta é a segunda regra de Hillel e de Ismael, mas a sétima de Eliezer. Originalmente, a regra
gezerah shawah incluía tanto similaridades de palavras ou de assuntos ou fatos. Depois ficou
restrita apenas à semelhança de leis que continham as mesmas palavras, sendo que a semelhança de
fatos/assuntos foi chamada de “hekkesh”.
Uma analogia é feita entre dois textos separados em função da similaridade de uma frase, palavra
ou raiz. Exemplos do Velho Testamento:
Comparando 1Sm 1.10 com Jz 13.5 que usam a frase “não passará navalha sobre a sua cabeça”,
podemos concluir que Samuel, como Sansão, era nazireu.

49
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

Exemplo do Novo Testamento:


Hb 3.6-4.13:
o autor compara Sl 95.7-11 = Hb 3.7-11 com Gen. 2:2 = Hb 4.4, baseando-se nas palavras “obras” e
“dia” ou “hoje” (“hoje” em hebraico é literalmente “o dia”). O autor usa esta comparação para dizer
que o verdadeiro sábado de descanso ainda está por vir.

A regra gezerah shawah, originalmente era restrita às di.j lego,menon, ou seja, palavras que
ocorriam apenas em duas passagens, o que fazia com que uma analogia de sentido fosse buscada
entre elas. Supunha-se que, se as palavras não ocorrem em outro lugar, não há razão para interpretá-
las diferentemente nos textos em que ocorrem. As idéias de um texto são trazidas para o outro.

Um exemplo irá mostrar como a regra funciona. A frase hebraica Avaro-ta ql;m' , ocorre duas
vezes no Pentateuco (Lv 1.15 e 5.8). Na última citação, contudo, o sentido da frase é definida como
sendo APr>[' lWMmi , ou seja, “do pescoço”. Assim, conclui-se que a definição “do pescoço” de Lv
5.8 faz parte do conceito da palavra ql;m' , que ocorre em Lv 1.15.

3. binyan ab mikathub ’ehad = dxa bwtk-ym ba !ynb = fazendo um pai


para um texto = dedução do particular para o geral” = Construindo uma família de um
único texto.
[Lê-se “binyan ab mikathub ekhad”]
“Se uma mesma frase se encontra em vários textos, a consideração feita
sobre uma delas se aplica em todas”
Uma passagem explícita serve como fundação ou ponto de partida de forma a constituir-se como
uma norma (pai) para todas as passagens e casos similares. Forma-se “um padrão” à partir de um
texto da Escritura, e com este “padrão” outros textos são elucidados e a decisão usada na
interpretação daquele texto vale para os outros.
Hb 9.11-22 aplica “sangue” de Êx 24.8=Hb 9.20 em Jr 31.31-34

4. binyan ab mishene kethubim = ~ybwtk ynv-ym ba !ynb = inferência de


várias passagens = Construindo uma família de dois ou mais textos.
[Lê-se “binyan ab mishene kethuvim”]
“Formação de um princípio através da relação estabelecida entre dois
textos que poderá ser aplicado a outros textos”
Dois textos ou provisões de um texto servem como fundamento para uma conclusão geral. Agora, o
“padrão” emerge de dois textos que têm uma característica em comum. O R. Ismael uniu a regra 2 e
4 na sua terceira regra. R. Eliezer fez a mesma coisa para redigir sua oitava regra.
Exemplo do Velho Testamento: Êx 21.26-27 fala somente de olhos e dentes, entretanto pelo uso da
quarta regra de Hillel, podemos reconhecer que esta provisão se aplica igualmente a outras partes
do corpo.
Exemplo do Novo Testamento: Hb 1.5-14 o autor estabelece uma sucessão de textos:

50
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

Sl 2.7 = Hb 1.5
2Sm 7.14 = Hb 1.5
Dt 32.43/Sl 97.7/(Ne 9.6) = Hb 1.6
Sl 104.4 = Hb 1.7
Sl 45.6-7 = Hb 1.8-9
Sl 102.25-27 = Hb 1.10-12
Sl 110.1 = Hb 1.13
Assim ele estabeleceu o princípio que o Messias é superior aos anjos.

5. kelal upherat = jrpw llk = [também llkw jrp ] = geral e particular,


particular e geral = lei geral e lei particular = inferência do geral para o particular =
isto é, a qualificação do geral pelo particular e do particular pelo geral.
[Lê-se “kelal uferat”]
“Uma generalização pode ser particularizada em um texto e uma
particularização pode ser generalizada”
Uma declaração geral é feita em primeiro lugar e depois é particularizada, por meio de uma
declaração mais simples e específica. Rabi Ismael alistou oito aplicações especiais deste princípio e
assim incluiu oito regras em seus princípios enumerados de 4 a 11.
O Velho Testamento: Gn 1.27 faz uma declaração geral que Gn 2.7, 21 particulariza.

6. keyoze bo mi-makom ’aher = rxa ~wqm-ym wb acwyk = sunbai,nein =


analogia de outra passagem = similaridade com outra passagem.
[Lê-se “keyotse bo mimaom akher”]
A dificuldade de um texto pode ser resolvida pela comparação com outro
texto similar.
Duas passagens podem ser vistas em conflito até que uma terceira resolve o conflito.
Exemplos do Velho Testamento:
Lv 1.1 “fora da tenda da congregação” e Êx 25.22 “de cima do propiciatório, do meio do sois
querubins” parecem estar em contradição até que examinanos Nm 7.89 que nos faz saber que
Moisés entrava na tenda da congregação para ouvir Yahweh falar de entre os querubins.
1Cr 27.1 explica o desacordo numérico entre 2Sm 24.9 e 1Cr 21.5.
Êx. 19.20 “Yahweh desceu sobre o monte Sinai” parece discordar com Dt 4.36 “a partir dos céus
vocês ouviram sua voz”. Êx 20.19 (20.22 em algumas edições) resolve a questão dizenso que Deus
veio dos céus e depois veio ao monte e falou (m.Sifra 1:7).
Exemplos do Novo Testamento:
Paulo mostra que as seguintes passagens do Velho Testamento podiam parecer estar em
contradição:
“O justo viverá pela fé” (Rm 1.17 = Hc 2.4) estaria em contradição com “Não há justo, nem um
sequer” (Rm 3.10 = Sl 14.1-3 = Sl 53.1-3; Ec 7.20)

51
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

e
“[Deus] irá recompensar cada um de acordo com seus feitos.” (Rm 2.6 = Sl 62.12; Pv 24.12) parece
se contrapor com “Bem-aventurado aquele a quem as iniquidades são perdoadas e a quem os
pecados são cobertos. Bem-aventurado é o homem a quem Yahweh não imputa pecado” (Rm 4.7-8
= Sl 32.1-2)
Paulo resolve o conflito citando Gn 15.6 (em Rm 4.3, 22): “Abraão creu em Deus e isto lhe foi
imputado para justiça.”
Paulo resolve o aparente conflito mostrando que pela obra de Cristo, fé-crença-confiança (a mesma
palavra em hebraico) são substitutos para justiça-ser justo (a mesma palavra em hebraico).

7. dabar halamed me‘inyano = wnyyn[m dmlh rbd = inferência do contexto =


explidação obtida pelo contexto = argumento do contexto.
[Lê-se “davar halamed me[r]inyano]
Determinação do sentido pelo contexto.
O contexto total, não apenas uma frase isolada, precisa ser considerada para uma exegese acurada.

Conclusão:
Paulo certamente poderia ter aprendido as regras de Hillel nos seus estudos sob Gamaliel,
neto de Hillel.
Jesus também estaria familiarizado com estas regras, já que elas eram amplamente
divulgadas pelos discípulos daquela escola e também de outras. O grau de helenização e de
instrução na família humana de Jesus pode ser percebido ao lermos o grego das epístolas
neotestamentárias de Tiago e Judas, filhos de José e Maria. O grego utilizado é excelente, polido e
belo. Os autores, sem serem pedantes e sem imitarem os modos ‘aticos’ de alguns autores do
período, escrevem muito bem em grego. Uma vez vendo isto em Tiago e Judas, não devemos supor
que o grau de familiaridade de Jesus com o grego e também com leis de exegese judaica (que no
fim das contas também tinham origem nos gregos) fosse pequeno.
Provavelmente, todos os escritores do Novo Testamento teriam um certo conhecimento
destas regras, ou, pelo menos, podiam fazer algum uso intuitivo delas. Uma vez que elas vieram do
contexto grego, também por meio deste pano de fundo cultural, eles poderiam ter praticado alguns
destes princípios.
Assim, elas não são absolutas para nós, embora também as utilizemos hoje, sem saber.
Contudo, o mais importante era entender o uso delas pelos autores do Novo Testamento. Assim,
poderemos entender seus pensamentos e sua exposição das Escrituras.

52
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

AS SETE REGRAS DE AGOSTINHO PARA A ALEGORIZAÇÃO


© 2010 Álvaro César Pestana

Estas normas de alegorização mostram como textos podem ser alegorizados de


forma não caótica, e de acordo com princípios ‘bíblicos’, ou seja, já referendados na
Bíblia. A norma maior, para a alegorização é o amor e a verdade do evangelho.

1. O Senhor e seu corpo


O que se refere a Jesus, refere-se à igreja, seu corpo.
Com esta norma, abre-se caminho para aplicar à igreja tudo o que se refere a
Jesus. Isto vem de Efésios 5 e torna-se uma chave alegórica para todo o Novo
Testamento.

2. A divisão em dois feita pelo Senhor ou a mistura que existe na igreja


O que se refere à igreja pode tratar tanto de fiéis como de infiéis.
Mais uma observação feita nas parábolas de Jesus que servem para todas as
análises posteriores do grupo ali referido. Se nas parábolas do joio e do trigo e
da rede Jesus encontrou dois grupos, pode-se encontrar sempre dois grupos em
outras situações onde a igreja é tratada.

3. Promessas e a lei
Algumas passagens relacionam-se com a graça, ao Espírito e à fé; outras são
ligadas à lei, à letra e às obras.
O contraste neotestamentário entre os princípios da Velha Aliança e da Nova
Aliança podem ser encontrados em textos que aparentemente não estão
tratando deste assunto. A alegoria de Paulo entre Sara e Hagar autorizam isto.
Normalmente, os bons serão a turma da graça e os ruins, da turma das obras.

4. Espécie e gênero
Espécie é uma parte; gênero é o todo. Um texto pode falar de apenas uma parte
(espécie) e outros podem falar do todo (gênero). Os cristãos israelitas são uma
espécie dentro do gênero igreja, que é o Israel espiritual.

5. Tempos

6. Recapitulação
Explicar passagens como recapitulação de passagens anteriores.

7. O diabo e seu corpo


O que a Bíblia fala do diabo pode ser aplicado aos seus.

53
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

PROVÉRBIOS DA CRÍTICA TEXTUAL


© 2010 Álvaro César Pestana

#1 - [Manuscritos] não devem ser contados, mas pesados.


Non numerantur, sed ponderantur56
Crítica textual não é democracia. Não vale ter a maioria dos manuscritos
dizendo algo, pois a maioria é recente. Os mais antigos são poucos e raros, mas
têm mais peso, em suas afirmações, que qualquer outros.

#2 - A leitura mais curta é preferível [à mais longa].


Brevior lectio potior57 ou lectio brevior lectio potior58
Brevior lectio probabilior (a leitura menor é mais provável)
A tendência natural dos copistas é ampliar textos, explicando-os ou anexando
informações vindas da tradição. Raramente um escriba quer tirar coisas de um
texto, pois escribas são conservadores. A vontade de acrescentrar nasce do
medo de ter perdido algo, ou do desejo de harmonizar frases quase parecidas.
Assim, a lição mais curta, geralmente é melhor.

#3 - A leitura mais longa é preferível [à mais curta].


Longior lectio potior59
A tendência natural dos copistas é ampliar textos, explicando-os ou anexando
informações vindas da tradição. Raramente um escriba quer tirar coisas de um
texto, pois escribas são conservadores. A vontade de acrescentrar nasce do
medo de ter perdido algo, ou do desejo de harmonizar frases quase parecidas.
Assim, a lição mais curta, geralmente é melhor.

#4 - O texto mais difícil é preferível [ao mais fácil].


Proclivi scriptioni praestat ardua60
Difficilior lectio potior61
Os copistas tenderão a ‘melhorar’ ou simplificar um texto e não complicá-lo.
Assim, o texto mais complicado, mais difícil e mais suscetível de má
compreensão deve ser o original.

#5 – A leitura que melhor explique as outras é preferível.


A leitura que deve ser a original é aquela que pode explicar melhor a origem
das outras variantes. Ou por ser mais curta, ou por ser mais complicada, ou por

56
Roberto Alves, Exegese, Rio de Janeiro, ALFALIT, 2000, pág. 67
57
Mathew S. DeMoss, Dicionário Gramatical do Grego do Novo Testamento, São Paulo, Ed. Vida, 2004, pág. 36
58
ibidem, pág.
59
Roberto Alves, Exegese, Rio de Janeiro, ALFALIT, 2000, pág. 66
60
Roberto Alves, Exegese, Rio de Janeiro, ALFALIT, 2000, pág. 67
61
Roberto Alves, Exegese, Rio de Janeiro, ALFALIT, 2000, pág. 65

54
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

ser mais antiga. A melhor opção é aquela que pode ser melhor encaixada como
‘geradora’ das outras.

55
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

Princípios de Interpretação Bíblica - RESUMO


01-Princípios espirituais
1. Estude com a pressuposição de que a Bíblia tem razão: a Escritura não pode falhar (Jo
10.35).
2. Estude com a pressuposição de que a Bíblia tem autoridade.
3. Ter a mesma fé do escritor bíblico ajuda muita a interpretação.
4. Orar bem é estudar bem: “ora et labora”
5. O alvo deve ser obedecer, e não somente conhecer mais.
6. O alvo deve ser encontrar o sentido,e não justificar uma posição.
7. Humildade é a chave.(não brigar)

02-Princípios gerais
1. A Bíblia é o melhor intérprete da Bíblia (concordância): Escritura explica Escritura.
2. O contexto bíblico é mais importante que o nosso (Dt 22.5).
3. O alvo é descobrir a intenção de comunicação do autor. (Lc 15.3-7; Mt 18.10-14)
4. O texto tem de fazer sentido para os primeiros leitores (Apocalipse).
5. A Bíblia julga nossa experiência, e não ao contrário.(O caso da mulher na família)
6. O texto deve ser estudado no seu contexto, com honestidade.(quem? a quem? como?
quando? onde ? por que?).
7. A história da igreja é importante, mas não decisiva na interpretação (música, batismo,
bispos, amor, serviço militar, símbolos, tumbas)
8. Deixe cada escritor dizer o que quer:não harmonize demais. (Mt, Mc, Lc, Jo.),(Mt 8.5-13 e
Lc 7.1-10).

03-Princípios gramaticais e literários


1. As diversas formas literárias da Bíblia merecem estudo diferenciado.(figurado e literal)
LEI SALMO PROFECIA EVANGELHO EPÍSTOLA
2. A Bíblia deve ser entendida gramaticalmente.(Mc 12.26-27)
3. O sentido das palavras e frases é aquele do tempo do autor. (Ro.16.10)
4. Palavras e frases devem ser gramaticalmente entendidas em seu contexto.(Jo 3.16 X 1Jo
2.15).
5. A escrita tem um sentido só.(Idade Média, 4 sentidos Literal/Alegórico/Moral/Analógico)
6. O pensamento mais claro e evidente geralmente é o certo. (Lc 14.28-33)
7. Devemos interpretar um autor em harmonia consigo mesmo.(Hb 5.13 X 1Pe 2.2).
8. Devemos interpretar um texto em harmonia com o “livro” em que está. (Anticristo)
9. Busque a estrutura ou raciocínio da passagem. 1Co 13

04-Princípios históricos e documentais.


1. A revelação é progressiva, do VT para o NT. (Ressurreição).
2. A Bíblia deve ser compreendida à luz de sua história. (V.T/ N.T)
3. A Bíblia deve ser compreendida à luz da história antiga (Daniel 2,7,8)
4. A relação entre documentos deve ser estudada e analisada.(At 2.16-21);(Citações VT-NT,
Evangelhos)
5. Narrativas históricas são evidências da prática antiga, e não ordens.
6. A tarefa do intérprete é a de um historiador que quer reconstituir uma situação original.
(Domingo At 20.7; 1Co 16 1-2; Ap 1.10)
7. Narrativas históricas não devem ser espiritualizadas,mas entendidas a luz dos interesses
teológicos do escritor. (Siloé em Jo 9).
8. A história não tem toda condição de lidar com a revelação, é necessário ficar com fé na
revelação.(2Pe 3.4-7)
9. Evidências históricas apresentadas devem ser verdadeiras.(O caso da porta da agulha em Mc
10.25).

56
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

05-Princípios teológicos e culturais


1. Não tenha posições definitivas e fechadas:continue aprendendo e reavaliando. (divórcio,
liderança, culto)
2. Estude tudo sobre o assunto antes de formular sua conclusão.(O problema de passagens
prediletas).
3. Se parecer, depois de estudar tudo,que a Bíblia ensina duas coisas aparentemente
contraditórias, aceite as duas e espere uma unificação das mesmas num nível mais elevado.
(Jesus é Deus/Deus é um só).
4. Pressuposições teológicas dos autores são válidas para nós (1Co 15.51-52; 1Ts 4.15,17).
5. Exemplos apoiados por mandamentos são mandamentos, se o contexto assim o indicar.(At
2.41 ? 2.38).
6. Exemplos não apoiados por mandamentos são apenas evidências para um trabalho de
reconstituição da situação original. (A oferta de Barnabé).
7. O argumento do silêncio deve ser utilizado (não proibição; não permissão).
8. Nossa cultura não pode relativizar princípios bíblicos. (a mulher na igreja).
9. Não confundir a cultura dos escritores com mensagem divina. (ósculo santos; lavar os pés;
sandálias; etc.).
10. Não introduzir nossa cultura no texto bíblico.(razões sanitárias).
11. Na dúvida, optar pelo mais seguro, sem legalismo e com amor.

06- Conselhos práticos


1. Ler o texto várias vezes, em várias versões bem feitas.
2. Ler o contexto da mesma forma acima.
3. Ler o livro onde está nosso texto muitas vezes.
4. Usar uma concordância bíblica todas as vezes que estudar.
5. Comparar os textos paralelos e com idéias parecidas.
6. Consultar dicionário e enciclopédias (bíblicos e outras).
7. Consultar bons livros cristãos.Muito cuidado!
8. Faça um resumo do que aprendeu: escreva.(aplicação na vida).

57
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

ANEXOS

58
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

HERMENÊUTICA NO ACONSELHAMENTO PASTORAL62


Linda S T C Pestana - 2010

Hermenêutica é a arte de interpretar o outro, seja ele, um texto ou uma pessoa.


No processo de aconselhamento pastoral, é fundamental o diálogo onde ouvimos com profunda abertura o
aconselhado e os textos bíblicos, enquanto, à luz das Escrituras, buscamos uma vida sábia.
No caso da Palavra de Deus, poderosa em si mesma, a fé vem pelo ouvir. Portanto, é preciso dizer a mensagem
do evangelho, e não simplesmente ler ou memorizar versículos bíblicos, pois, a palavra falada tem um poder sobre o
ouvinte, que a palavra escrita não tem. Junto com a palavra falada, há uma comunicação proveniente de entonação e
sentimentos que fazem parte da linguagem no diálogo e que transcendem o que está escrito.
Ao dizermos palavras da Bíblia, elas despertam, ganham vida e podem encarnar em nós de modo a transformar
a nós e a outros. Conforme a interpretação de quem fala, as palavras podem marcar profundamente a vida do ouvinte.
É permitindo que a palavra perpasse por nós, que ela terá vida e poderá alcançar a vida do outro de forma
poderosa. Para isso, primeiro as palavras tem que ter significado pro me (para mim), então, num processo de
transmutação, vamos transmiti-la no contexto e na linguagem do outro.
Além de dizer, é preciso explicar as palavras ditas. Afinal, no aconselhamento, o objetivo é ajudar as pessoas a
se entenderem e encontrarem na Bíblia, significado e respostas para suas questões vitais. O conselheiro se esforça em
falar e explicar as Escrituras, estudando-as com seriedade e levando em conta as melhores formas de comunicá-las ao
consulente.
É preciso traduzir o que a Bíblia diz para o contexto e para a linguagem do outro. Tal como Hermes, portador
da palavra dos deuses na mitologia grega, o conselheiro atua como mediador e tradutor entre dois mundos diferentes: o
mundo das palavras da Bíblia e o mundo estranho do outro que interrogamos e que nos interroga.
Dessa forma, praticando essa hermenêutica, ouvindo e dialogando com os textos bíblicos, conosco mesmos e
com o aconselhado, há chance de ajudar pessoas a se voltarem para Deus e encontrarem a verdade absoluta e um
sentido para a vida que só existe no colo do Pai.
Essa hermenêutica nos ajuda a olhar para os outros e respeitá-los como seres únicos e diferentes de nós. Ao
dizer, explicar e traduzir, não usamos a nós como referência, mas, “esvaziando-nos”, buscamos nos encarnar no outro,
na realidade de seus dramas e tentamos levar a mensagem de Deus, também encarnada em nós, com fidelidade para o
contexto do outro.
Esse processo exige humildade, já que nossos paradigmas e perspectivas serão sempre reavaliados e
reformulados por nós, pelos textos bíblicos e pelos outros. Isso nos leva a correr riscos que ameaçam nossa “zona de
conforto” baseada em tradições, legalismo e egocentrismo, mas que nos conduzem a uma maturidade e crescimento
espiritual que ajuda no relacionamento com os outros.
O nosso exemplo maior de hermenêutica e aconselhamento pastoral é Jesus Cristo, que sendo Deus glorioso,
se esvaziou, “balbuciou” como homem e sofreu para que pudéssemos compreender em nossa linguagem de ser humano
a mensagem divina e salvadora de amor e graça.

Texto elaborado a partir da leitura de PALMER, Richard E., Hermenêutica. RJ: ed 70, 1969, p 15-41.

62
Este artigo está disponível em http://alvarocpestana.googlepages.com/lindastcpestana

59
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

Resumo do artigo
Devo eu aprender a interpretar a Bíblia?
D. A. Carson.
[Modern Reformation Magazine, May-June Issue, Vol. 5.3]

1. Tão conscientemente quanto for possível, procure olhar o “balanço da Escritura” evitando sucumbir a disjunções e
drásticas distinções teológicas e históricas.

2. Reconheça que a natureza antitética de certas partes da Bíblia, não apenas no ensino de Jesus, é de natureza retórica e
não uma declaração absoluta. O contexto deve decidir o que ocorre em cada caso.

3. Seja cuidadoso em absolutizar algo que é dito ou ordenado apenas uma vez.

4. Examine cuidadosamente a razão bíblica para qualquer dito ou mandamento.

5. Observe cuidadosamente que a universalidade formal dos provérbios e dos ditos proverbiais raramente é
absolutamente universal. Se provérbios forem tratados como estatutos ou caso legais, os maiores erros interpretativos e
pastorais virão inevitavelmente.

6. A aplicação de certos temas e assuntos deve ser feita com cuidado especial, não somente por causa de sua
complexidade intrínseca, mas também por causa das diferenças entre as estruturas sociais e tempos bíblicos e os nossos.

7. Determine não somente como os símbolos, costumes, metáforas e modelos funcionam na Escritura, mas também a
que eles estão conectados e presos.

8. Limite rigorosamente as comparações a analogias observando os contextos próximos e distantes.

9. Muitos mandamentos são limitados pastoralmente à ocasião ou ao povo que os recebeu.

10. Sempre seja cuidadoso sobre como aplicar narrativas.

11. Lembre-se que você também é cultural e teologicamente condicionado e limitado.

12. Admita, francamente, que muitas decisões interpretativas ficam alojadas em um sistema teológico maior, sendo que
este sistema, em princípio, deve ser deliberada e desideratamente, modificado para que a Bíblia tenha uma palavra final
no assunto.

60
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

QUAL É O PAPEL DO ESPÍRITO SANTO NA INTERPRETAÇÃO DA BÍBLIA?


K. Vanhoozer
Em primeiro lugar, eu creio que o Espírito testemunha a respeito de nada menos que sua própria voz: o sentido
textual, ou para ser preciso, o sentido inerente (sentido próprio, ou seja, a mensagem que intentava transmitir o autor) e
o sentido aplicado (a significância). O Espírito não abole a letra, mas ministra-a. O sentido espiritual é simplesmente o
sentido literal, entendido em toda a sua plenitude. Longe de criar um novo sentido, ou sugerir que o sentido original é
defectivo, a tarefa do Espírito é fazer com que a intenção do autor seja efetivamente transmitida. Em suma, o Espírito é
a presença potencializadora da Palavra.
Em segundo lugar, o Espírito santifica o leitor, removendo dele o orgulho e os preconceitos rebeldes, criando
uma mente e coração humildes que ficam preparados para receber algo que não é de sua própria natureza. Ou seja, o
Espírito nos transforma para deixarmos de ser não-realistas apegados às suas próprias mentiras, levando-nos a ser
realistas que desejam ouvir a Palavra de Deus. Ler no Espírito, então, significa deixar a mensagem atingir o propósito
para o qual foi mandada (Is 55.11). O Espírito Santo guia a igreja, em toda sua variedade - e catolicidade – cultural e
racial, a uma mais profunda apreciação da única verdadeira interpretação das Escrituras. Isto não deve nos causar
surpresa, pois o evento de Cristo Jesus mesmo requereu que quatro evangelhos (além das cartas e do Apocalipse) para
ser plenamente articulado. Eu afirmo que uma pluralidade similar – uma ‘Pluralidade Pentecostal’ – como a que existe
ali, irá melhor assegurar a realidade do sentido bíblico pela diversidade de contextos e comunidades de leitura.
A interpretação teológica da Escritura chega ao seu fim e alvo quando os leitores adentram no mundo dos
textos bíblicos com fé, esperança e amor. Quando fizermos dos pensamentos de Deus, os nossos pensamentos e das
palavras de Deus as nossas palavras, então começamos a participar do mundo do texto e do grande drama da divina
redenção. Isto talvez seja o alvo final da interpretação teológica da Escritura: conhecer o Deus Trino e participar de sua
vida Triuna na sua triuna missão para com a criação. Ler a Palavra de Deus sobre a orientação do Espírito é ser
conduzido na economia da salvação, no trabalho triuno de trazer cabalmente, a imagem de Cristo para nossa vida.

61
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

Anotações sobre Richard B. Hays, The Conversion of the Imagination: Paul as Interpreter of Israel’s Scripture,
Grand Rapids, Eerdmans, 2005, p. 143-162.

O PAPEL DAS ESCRITURAS NA ÉTICA DE PAULO


[THE ROLE OF SCRITURE IN PAUL’S ETHICS]
Seleção de idéias:
• Rm 15.4 O ensino (didaskalia) e a exortação (paraklesis) vem das Escrituras. A questão proposta é: como ele usa
as Escrituras, sobretudo na ética. Para nós, o interesse seria mais amplo, mas o uso exortatório (paraklesis) ajudará
também na compreensão do uso de Paulo para a doutrina (didache).
1. Paulo usa a Escritura como “Roteiro narrativo que dá a identidade para a igreja”.
As meta-narrativas da Escritura são aplicadas ou consumadas na igreja!
2Co 5.17-6.2 – Que tempo? Que Deus faz? Que devemos fazer?
2. Paulo usa a Escritura como “Chamamento para a Fidelidade Aliançal e o Amor”
Busca os termos do VT e os coloca no nível da fidelidade e do amor e não do ritual apenas.
Rm 2.26-29
3. Paulo usa a Escritura como “Fonte Implícita de Normas Particulares”
Os termos éticos do VT são transferidos para o NT sem necessárias adições ou explicações.
1Co 6.9-11
4. Paulo usa a Escritura como “Narrativa paradigmática”
Sua leitura eclesiástica do VT não o faz contar e aplicar, mas re-contar.
1Co 10.1ss
5. Paulo usa a Escritura como “Palavra destinada especificamente para a comunidade”.
Cita para a igreja.
Rm 12.19-21

Observações pessoais:
Será que nossas leituras da Escritura, nossa hermenêutica não pode orientar-se pela de Paulo? Não penso em
voltar à metodologia rabínica que ocasionalmente ele usa, mas sua visão da Escritura, como apóstolo de Jesus deve nos
ajudar a entender a Bíblia hoje.
O VT, para Paulo, desempenha o papel da Bíblia toda, e especialmente do NT, para nós hoje em dia. O VT era
o que ele tinha escrito e nós temos especialmente o NT.
Assim, como ler o NT?
• (1) As grandes “meta-narrativas” do NT devem ser aplicadas à igreja: Jesus, Reino de Deus, Escatologia.
• (2) A elevação da fidelidade aliançal ao nível do amor e da interiorização e não da ritualização.
• (3) O uso das normas e palavras do texto como normas para a igreja.
• (4) Contar a história da igreja e de Cristo como nosso roteiro.
• (5) Citar, corajosamente, o NT como palavra de Deus para a igreja.

62
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

EXEGESE
Resumo e adaptação sobre um artigo de
Abraham J. Malherbe,
[Restoration Quarterly, Vol. 5/No. 4 (1961), 169-78]
por Álvaro C. Pestana
Introdução
Exegese é uma disciplina básica, não só de estudos do Novo Testamento, mas para a teologia. Idealmente, a
teologia deveria ser, sempre, o resultado da exegese da Escritura. A exegese deve reger a teologia, e não o contrário. Se
este último caso ocorrer, a exegese perde seu caráter e torna-se eisegesis.
Este artigo tratará de oferecer uma perspectiva clara da tarefa da exegese e oferecer direção na sua
metodologia para estudos do Novo Testamento.
A tarefa da exegese
A tarefa do exegeta é, em primeiro lugar, histórica. “Exegese é pensada como um procedimento para o
estabelecimento do significado original de um texto literário com o uso de ferramentas filológicas e históricas.” O
exegeta é, portanto, um historiador e não um teólogo.
A dificuldade ocorre logo que percebemos que todos têm certos pressupostos teológicos. A tarefa do exegeta é
a de ler o texto e explicá-lo, uma tarefa que é tão difícil de descrever como é difícil de executar. Exegese enfrenta os
problemas que todo tipo de escrito impõe, pois está separado de nós por séculos e nos é transmitida em outro idioma.
Por outro lado, o Novo Testamento é diferente de outros escritos da antiguidade, pois, embora dirigida ao povo do
primeiro século, também é dirigido a pessoas de todos os tempos.
É precisamente devido a esta compreensão das Escrituras, que tanto o método como os resultados da exegese,
às vezes sofrem dificuldades. Os escritores da Bíblia foram cronistas não simples. Os eventos registrados tinham o
significado de revelação para eles e, por essa foram deixados para nós.
Portanto, para entender a intenção e o significado dos autores bíblicos, devemos ter empatia com eles. Logo,
não é possível fazer isto com uma pretensa “análise impessoal” de documentos literários.
A hermenêutica é, portanto, um corolário necessário para da exegese. Deve-se reconhecer que a divisão de
interpretação bíblica em que a exegese e hermenêutica recebem diferentes tratamentos é realmente artificial.
Hermenêutica significa, literalmente, a disciplina de interpretação. Ninguém vem ao NT sem qualquer
pressuposição, não existe a “tabula rasa”, ninguém chega aos estudos com um “papel em branco” em que os dados
objetivos mensuráveis pudessem ser anotados e trabalhados.
A tarefa de hermenêutica é fazer uma síntese dos resultados da exegese, e torná-la relevante para o leitor.
Torná-la relevante implica em um elemento pessoal, com todas as suas pressuposições, e isso significa que iremos
interpretar o material. A questão a decidir é se a interpretação proposta faz justiça ou não ao processo exegético
realizado. O que deve ser decidido é se uma determinada interpretação é válida ou não.
A admissão de que os pressupostos estão presentes, não significa que estamos à deriva num mar de
subjetividade. "Pressuposto" tornou-se um “palavrão” pois "a exegese científica", na sua oposição à "exegese
teológica", denunciou que esta última permitiu que seu exercício fosse dominado pelos dogmas (pressuposições).
Reagindo a esta crítica, os exegetas tentaram negar que existissem quaisquer pressupostos na exegese. Uma
resposta mais legítima teria sido afirmar que os pressupostos, de fato, existem, pois é impossível não ter pressupostos.
O que deve ser avaliado não é a existência de pressupostos, e sim verificar a sua validade. Este fato tem sido
reconhecido na batalha entre Barth e Bultmann sobre a natureza da hermenêutica. Ambos concordam que os
pressupostos são uma parte da hermenêutica.
Estas questões são importantes para nós por causa da influência da chamada “Escola da História das
Religiões”, Religionsgeschichtliche Schule, que surgiu na Alemanha no final do século XIX, e os início do século XX,
e que ainda exerce grande influência sobre a pesquisa do Novo Testamento. Os “pais” do método histórico-crítico
erraram ao supor que a rejeição dos pressupostos dogmáticos ortodoxos abriria o caminho para uma exegese adequada.
Na verdade, no lugar desses pressupostos dogmáticos ortodoxos, apareceu um novo dogmatismo, uma teologia
determinada pelo Iluminismo, romantismo e idealismo. Ou seja, trocaram um grupo de pressupostos por outro!
Ao atacar o método teológico exegético a arma da crítica histórica foi, claro, história. A ênfase estava no fato
de que o texto bíblico era uma parte da história, e que tinha uma história própria. Foi, portanto, para ser colocada no
contexto relativo e condicionado da história. O texto foi, assim, deveria ser estudado cientificamente da mesma forma
que qualquer outro texto antigo é estudado.
O que é realmente discutível nesta abordagem é a concepção da própria história. Embora eles entendam que a
Escritura deve ser encarada dentro da categoria do “histórico”, aplicou-se a ela uma categoria de “histórico” que foi
produzida em ambiente externo à Escritura. Assim, esta abordagem já nasceu esquisofrênica.
O questionamento histórico não é suficiente, na interpretação, meramente pelo fato do material pertence à
história. É preciso também formar uma noção de história adequada para o material de modo que, uma real interpretação
seja possível. Esta conceituação de história nunca foi feita com sucesso até nossos dias. O resultado foi que o processo
de exegese termina em uma fragmentação do texto em que os fragmentos literários, documentos históricos, elementos

63
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

fenomenológicos e lingüísticos atravancando o texto a tal ponto que sua mensagem fica obscurecida e a verdadeira
interpretação é impossível. Estes são os frutos de um pressuposto errado.
Desde que a categoria "histórico" é inerente à própria Escritura, e uma vez que tem que ser admitido que todos
temos pressupostos, uma interpretação válida seria aquela em que os dois são congruentes. Este método é um que
procede de uma base cristológica. O pressuposto do Novo Testamento que, como exegetas, temos que compartilhar, é
que Cristo revela um novo sentido da história, tanto para a sua época, no primeiro século, como para a nossa e para
todos os tempos. Este foi o pressuposto dos escritores do Novo Testamento. Ao assumirmos a mesma pressuposição,
não existirá nenhuma tensão entre a nossa visão da história e a do Novo Testamento. O resultado é que poderemos
abordar estes escritos como um objeto na história que não só pode ser interpretado hoje, mas deve ser interpretado,
porque dá sentido à nossa existência histórica.
Duas questões podem ser levantadas, uma vez que assumimos os pressupostos dos autores do Novo
Testamento: (1) Será que isto anularia o valor do método histórico-crítico? (2) Será que ao assumirmos o pressuposto
dos autores do Novo Testamento estaremos retornando a uma exegese governada pela dogmática?
Para ambas as perguntas, a resposta deveria ser um enfático "não". O Novo Testamento, que é a explicação da
mensagem cristológica, nosso pressuposto, é um fenômeno na história, que não só dá sentido à história, mas participa
dela. O Cristo da fé é o mesmo que o Cristo da história. Portanto, para a revelação bíblica ser entendida corretamente,
ela deve ser submetida ao método da crítica histórica. "Exegese histórica e filológica deve definir e descrever o cenário
humano e ocasional dentro do qual a revelação bíblica ocorreu em um determinado ponto da história".
Visto desta forma, o pressuposto cristológico cria o ambiente, a moldura, em que o texto será estudado. Cristo
será, de uma maneira muito real, o sentido espiritual da interpretação. "Isso nos proporciona tanto um cânone de
interpretação e um princípio de unidade".
A grande contribuição da crítica histórica, portanto, não precisa ser deixada de lado. Na verdade, ela não pode
ser abandonada. Se o pressuposto subjacente a crítica é válido, este método de exegese contribui para uma teologia
mais articulada com o real, pois ajuda a entender o Novo Testamento no seu contexto.
O método de exegese
Vamos agora listar algumas considerações que devem estar presentes na exegese de um texto do Novo
Testamento. O grande perigo de delinear um procedimento a ser seguido na exegese é passar a impressão de que o texto
é um composto sintético de elementos do texto, a linguagem, o contexto de fundo, etc, que pode ser descascado como
as camadas de uma cebola. O texto, entretanto, não é uma mera justaposição de elementos, sem qualquer interrelação
mútua. Ele é muito mais um amálgama de elementos diferentes que produzem uma nova liga.
Qualquer análise textual deve ser consciente de dois aspectos que envolvem qualquer dos elementos do texto:
(1) cada elemento isolado contribui com sua significação para o significado do todo, e (2) o significado do todo
contribui e condiciona o significado de cada parte isolada. Esta interpenetração de sentido entre cada parte e o todo faz
com que não caiamos no erro da supersimplificação na exegese.
Portanto, embora os passos metodológicos alistados neste método estão numa ordem razoável e lógica, o
estudo de um deles nem sempre consegue evitar o avanço do estudo de um outro. Também, ocasionalmente, a ordem
poderá e deverá ser alterada.
Duas outras observações preliminares devem ser feitas. Primeiro, neste artigo, não será possível discutir todas
as ferramentas para a exegese. O leitor é encorajado a adquirir o excelente livro de Frederick W. Danker, “Ferramentas
multiuso para estudo da Bíblia” (St. Louis: Concordia Publishing House, 1960), que dá uma descrição minuciosa e
avaliação das ferramentas, e ilustra como usá-las. Este livro será de grande valor para o perito, bem como para os não-
especialistas.
Em segundo lugar, é evidente que o leitor do Novo Testamento que não tem um conhecimento prático do
grego tem uma desvantagem significativa em relação ao que trabalha com a língua original. Essa discussão vai enfatizar
um método que pressupõe o conhecimento do grego, embora sugestões sejam feitas para aqueles que não têm este
conhecimento. Estes últimos são incentivados a adquirir pelo menos um conhecimento rudimentar de grego, na medida
em que eles podem usar um Novo Testamento Grego Interlinear (Grego e Português) com muita cautela e também usar
comentários críticos e léxicos gregos. Tal conhecimento pode ser adquirido com o auxílio de um livro como John
Dobson, Aprenda o Grego do Novo Testamento, (Rio de Janeiro, CPAD, 1994). Deve-se salientar que o estudante de
grego logo descobre que o recato com relação à sua habilidade aumenta em proporção ao número de anos dedicados ao
estudo da língua.
Texto
Qualquer exegese tem de começar com um estudo das variantes textuais, e uma sólida base textual tem
estabelecida através da aplicação dos cânones aceitos da crítica textual. Isto significa, é claro, que uma boa edição
crítica do Novo Testamento grego deve ser usada. Estas edições contém um aparato crítico no rodapé que mostra as
variantes textuais.
Os melhores textos deste tipo de texto são: (a) Nestle-Aland (Editores), Novum Testamentum Graece (27ª
Edição), Deutsche Bibelgesllschaft Stuttgart, Stuttgart, 1984 [este é o melhor dos melhores]; e (b) O NOVO
TESTAMENTO GREGO, Stuttgart & São Paulo, Deutsche Bibelgesellschaft & Sociedade Bíblica do Brasil, 2009
(Este último tem várias boas vantagens: (i) prefácio em português; (ii) dicionário grego-português no final; (iii) preço
muito mais acessível por ser feito no Brasil). O capítulo denominado "O Texto de Nestle" no livro do professor Danker
pode ser lido com grande proveito de todos os que desejam retirar as riquezas deste enorme volume pequeno. Também

64
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

a obra do professor Uwe Wegner, Exegese do Novo Testamento: Manual de Metodologia (São Leopoldo & São
Paulo, Sinodal & Paulus, 1998) será imprescindível para os leitores brasileiros.
Embora a pessoa que usa uma tradução em português não será capaz de perceber a complexidade do estudo de
texto, ela pode perceber as variantes mais importantes usando as versões bíblicas que fazem anotações sobre variantes
textuais. Nas notas de algumas versões, as variantes mais importantes são indicadas. Se uma leitura variante é indicada
em uma passagem em particular, aquele que não trabalha com um texto grego pode comparar aquele texto com outras
versões modernas. Se todas as traduções não têm todas a mesma “leitura” (ou seja, a mesma opção de tradução), então,
a questão exigirá mais estudo. Um bom comentário vai discutir o problema e mostrar as questões envolvidas. Claro que
esta forma de agir não é o melhor método para avaliar as variantes, mas pelo menos indicará ao estudante a necessidade
de estudar mais.
Linguagem
Depois que o texto tenha sido estabelecido, o exegeta pode começar o processo de tradução. Tradução envolve
mais do que a substituição de palavras gregas por portuguesas equivalentes. É necessário usar abordagens de estudo da
língua (filologia, gramática, etc) e também o contexto e o pano de fundo do texto. O estudo da linguagem do texto é,
portanto, apenas o primeiro passo no processo de tradução. Aqui apenas algumas sugestões são feitas no interesse de
traçar procedimento exegético.
1. A primeira tarefa no estudo da língua é a de determinar os possíveis significados de cada palavra importante
do texto sob consideração. Os léxicos gregos padrão deverão ser consultados63, mas o leitor deve ir além disto. Os
significados diferentes encontrados em um léxico não devem ser considerados, intrinsecamente diferentes uns dos
outros. As diferenças representam a intenção do lexicógrafo de mostrar todos os usos possíveis e todos os sentidos
possíveis do uso daquela palavra. Ao consultar todas as referências bíblicas (ou de outra natureza) no verbete de uma
certa palavra no léxico, o leitor começará a perceber a razão pela qual o lexicógrafo fez sua divisões e classificações
dos sentidos daquela palavra. Só quando o estudante vê a razão para esta divisão ele vai estar no caminho para
realmente compreender o significado da palavra.
2. A concordância64 é indispensável no estudo filológico. Uma palavra especifica deve, primeiro, ser estudada
quanto à sua utilização pelo autor do texto considerado. A concordância é necessária para isso. Um olhar sobre a
concordância, por vezes, mostram que uma palavra tem o hábito de aparecer em conjunto ou na companhia de outras.
Esta constatação permite descobrir padrões de uso de conjuntos de termos que lançam muita luz sobre o significado de
uma passagem em particular.
3. Depois de fazer o estudo de uma palavra em passagens pelo mesmo autor, avance para os outros lugares
onde ela ocorre no Novo Testamento Então vá para a Septuaginta, tendo em mente que era a Bíblia para a maioria dos
escritores do Novo Testamento. Então vá para os lugares na literatura cristã primitiva, onde a palavra ocorre para ver
como ela era entendida, em seguida, para os escritores judeus existentes em grego, e, finalmente, para os escritores
pagãos gregos.
4. A palavra ou frase mais importante de um texto pode ser estudada em trabalhos como Kittel-Friedrich,
Theologisches Wörterbuch zum Neuen Testament, que já tem tradução em inglês65. Uma edição equivalente em
português é a obra de C. Brown (ed)¸ Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento66. Velho,
mas ainda útil, é Hermann Cremer's Biblico-Theological Lexicon of New Testament Greek. Para os que não lêem grego
uma obra excelente é J.-J. von Allmen, Vocabulário da Bíblia (São Paulo, ASTE). Mais popular, mas útil é o
dicionário VINE, agora disponível em português.
5. Após os significados possíveis e prováveis das palavras tenham sido verificados, devemos estudar a
gramatica e a sintaxe do texto. Um meio de fazê-lo é por meio dos índices de textos bíblicos constantes nas gramáticas
avançadas. Desta forma, o estudante pode ver se o texto que ele está estudando é discutido em alguma gramática. A
melhor gramática para o Novo Testamento Grego é Blass-Debrunner, Grammatik des neutestamentlichen Griechisch,
(nona edição), traduzida para o inglês por Robert Funk.67

63
Em português: F. W. Gingrich, & F. W. Danker, Léxico do Novo Testamento Grego-Português, Edições Vida
Nova, São Paulo, 1984. Carlo Rusconi, Dicionário do Grego do Novo Testamento, São Paulo, Paulus, 2007.
64
Para o Novo Testamento grego, temos no Brasil a excelente Concordância Fiel do Novo Testamento, (dois
volumes), Editora Fiel, São José dos Campos, 1995-8.
65
Gerhard Kittel & Gerhard Friedrich (ed.s), Theological Dictionary of The New Testament, (Theologisches
Wörterbuch zum Neuen Testament, Stuttgart, W. Kohlhammer Verlag, 1933-73, Trad. Geoffrey W. Bromiley), Grand
Rapids (MI), Wm. B. Eerdmans Publishing Company, 1964-76
66
Colin Brown (ed.), Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento (The New International
Dictionary of New Testament Theology [traduzido, revisado e ampliado do original alemão Theologisches
Begriffslexikon zum Neuen Testament, Wuppertal, Theologischer Verlag Rolf Brockhaus, 1967-71], Grand Rapids,
Zondervan, 1975-78, traduzido por Gordon Chown e revisado por Júlio Paulo Tavares Zabatiero), São Paulo, Edições
Vida Nova, 1981-83.
67
F. Blass, A. Debrunner & Robert Funk, A Greek Grammar of the New Testament and Other Early Christian
Literature, Cambridge & Chicago, Cambridge University Press & The University of Chicago Press, 1961.

65
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

Em português, temos várias gramáticas para a exegese. Citarei apenas as de LaSor68, Osvaldo Pinto69,
Chamberlain70 e Luz71.
Contexto
O contexto da passagem vai ajudar a criar a perspectiva na qual o texto deve ser lido e entendido. As seguintes
considerações são importantes para determinar a situação em que o texto tem sentido.
1. O contexto mais amplo. Aqui todas as matérias introdutórias devem ser consideradas, tais como autoria,
data, destino, finalidade, etc Estas questões são discutidas as apresentações padrão para o Novo Testamento Entre as
mais úteis são as de McNeile, Moffatt, e Zahn. No Brasil, as introduções de Carson, Höster, etc.
2. O contexto imediato. Observar o texto em questão vendo sua contribuição no argumento da obra escrita
como um todo. Como este texto se encaixa no contexto imediato em que aparece?
3. As passagens paralelas. Como o mesmo autor e como outros escritores no Novo Testamento tratam o
mesmo problema ou o mesmo assunto em outros lugares?
a. Observe bem as palavras importantes envolvidas com o auxílio de uma concordância bíblica ou tópica.
Assim, as passagens paralelas podem ser localizada.
b. As referências na margem de fora do texto da Nestle, que estão marcadas com um ponto de exclamação
(!) são especialmente úteis. Isto significa que, após aquela referência, outras referências serão indicados tratando do
mesmo assunto. Por exemplo, na margem externa de 1Coríntios. 16:1, onde se discute sobra a oferta, há a seguinte
anotação: Atos 11:29! Quando nos voltarmos para Atos 11:29, encontraremos ali, nas referências margem exterior,
mais referências bíblicas onde o assunto da oferta a Deus é discutido. Naturalmente, isso às vezes envolve o julgamento
do editor, mas é um dispositivo útil.
c. Ao estudar os evangelhos sinóticos72, uma sinopse como essa de Lietzmann Huck, Synopse der drei
ersten Evangelien para o texto grego, ou uma Harmonia dos Evangelhos em português.73, Verifique o contexto do
evento ou mesmo discurso nos outros evangelhos para ver como ele foi usado.
Pano de fundo
Estudo do pano de fundo é, de fato, uma parte da tentativa de determinar o contexto em que o texto aparece e
para traduzir a linguagem que seria significativa neste contexto. O contexto em que o Novo Testamento foi escrito era
tanto judeus como pagão. Estudos de pano de fundo são sempre difíceis, porque a matéria é extremamente complexa.
Portanto, não é surpreendente que é nesta área da disciplina exegética que a tentação é maior para fazer generalizações.
Ao estudar o pano de fundo de modo a obter informação relevante para o material abordado devemos
perguntar:
1. Existe qualquer informação de pano de fundo daquela época e lugar, relevantes para o texto em estudo?
2. O material de pano de fundo é mais relevante para o autor do texto ou para seus leitores?
3. Qual a relevância desta informação do pano de fundo para o texto em estudo: é forte o suficiente para ser
considerada uma causa influente na questão ou, simplesmente, um “ponto de contato”?
4. A relevância do material de pano de fundo foi julgada pela probabilidade histórica, ou apenas por um
julgamento subjetivo?
“Pano de Frente”74
Uma parte importante do esforço de conhecer o contexto de uma passagem é tentar entender como os novos
cristãos, mais próximos de nós dos documentos do Novo Testamento, entenderam aquele texto. É mais uma parte do
esforço para obter uma perspectiva histórica adequada.
1. O tratamento recebido por um texto específico pela igreja primitiva é instrutivo tanto para a compreensão
possível da passagem pelos destinatários originais, como também para captar mais elementos do pano de fundo que são,
muitas vezes, constantes dos antigos escritores cristãos, chamados Pais ou Padres. O uso de uma passagem em
particular na igreja primitiva pode ser facilmente localizado, verificando o índice de passagens das Escrituras, volume
IX do Ante-Nicene Fathers (Win. B. Eerdmans reprint). Especial atenção deve ser dada aos primeiros comentadores
como Orígenes e Hipólito. Para estudos de um período um pouco posterior mas excelente sobre as epístolas de Paulo,
ver Teodoro de Mopsuéstia.
2. O uso primitivo de palavras gregas entre os primeiros cristãos pode ser feito com o uso da obra de E. J.
Goodspeed, Index Patristicus e Index Apologeticus. Para os autores posteriores, alguns volumes da série Griechischen

68
William Sanford Lasor, Gramática Sintática do Grego do N.T., Edições Vida Nova, São Paulo, 1986
69
Carlos Osvaldo Cardoso Pinto, Fundamentos para a exegese do Novo Testamento: manual de sintaxe grega, São
Paulo, Edições Vida Nova, 2002
70
W.A. Chamberlain, Gramática Exegética do Grego Neotestamentário, Casa Editora Presbiteriana, São Paulo,
1989
71
Waldyr Carvalho Luz, Manual de língua Grega, São Paulo, Casa Editora Presbiteriana, 1991
72
Mateus, Marcos e Lucas são chamados Sinóticos por apresentarem a narrativa do evangelho de uma ótica
aproximadamente comum.
73
Há harmonias dos evangelhos usando as versões de Almeida, da NVI e da Bíblia de Jerusalém.
74
A metáfora continua com a figura de um teatro onde o cenário é o “pano de fundo” e as cortinas e a parte frontal é o
“pano de frente”.

66
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

christlichen Schriftsteller der erste drei Jahrhunderten tem índices úteis. O dicionário do grego patrístico editado por
G. W. H. Lampe (Patristic Greek Lexicon, Oxford, Oxford Univesity Press) é de grande valia neste tipo de estudo.
3. Algumas palavras (em inglês) podem ser localizados através do índice de volume da série Ante-Nicene
Fathers.
4. Alguns comentários Inglês século XIX, como os de Westcott, Lightfoot na série Macmillan, e a série de
Ellicott sobre o texto grego geralmente se referem a passagens patrísticas e pode ser usado com lucro.
Estudos exegéticos
Certas passagens já receberam estudos detalhados por estudiosos modernos. Estes estudos devem ser
consultados. Esses artigos aparecem em revistas acadêmicas e livros onde eles poderiam ser perdidos se não fosse por
algumas excelentes ferramentas que nos tornam conscientes de sua existência. Estas obras de referência do estudo de
toda a literatura que aparece no campo bíblico procuram registrar o importante trabalho que foi feito em qualquer
passagem, palavra, conceito ou problema de estudos NT. A seguir estão os mais importantes destes periódicos que
ajudam a buscar estes estudos.
1. New Testament Abstracts, uma publicação católica, dá os resumos dos artigos mais importantes que
aparecem em revistas acadêmicas do Novo Tesamento. Todos os resumos estão em inglês, embora os artigos podem
estar em qualquer língua.
2. Internationale Zeitschriftenschau für Bibelwissenschcaft und Grenzgebiete, é mais abrangente mas os
resumos estão todos em alemão.
3. Biblica é publicada pelo Instituto Pontifício de Roma, e cobre toda a Bíblia. É o mais completo, e contém
levantamentos dos artigos mais importantes em todas as línguas modernas e importantes em latim.
Comentários
Os comentários, assim como os estudos exegéticos, provavelmente serão consultados pelo estudante no início
do processo de exegese. Isto, contudo, não é uma boa prática. O exegeta aspirante, no entanto, deve colocar sua ênfase
no estudo do material primário, em vez de estas ajudas secundárias. Comentários e estudos de curto prazo, entretanto,
apontam os problemas em qualquer texto e ajudam a resolver estas questões referindo-se a documentação de apoio
relevante. Os seguintes tipos de comentários podem ser utilizados com bons resultados.
1. Comentários críticos como a série International Critical Commentary e a nova série Meyer, em alemão são
excelentes para detalhes em exegese. A série Cambridge Greek Testament também é digna de honra mais do que
normalmente é concedida a ela. Seu valor reside na sua prática de oferecer várias possibilidades de resolver um
problema com a justiça imparcial e deixar a decisão para o leitor. Comentários como estes devem ser usados antes de
fazer a síntese dos estudos.
2. Comentários que enfatizam a continuidade do pensamento do autor devem ser utilizados. As séries Moffatt e
a Harpers se enquadram nesta categoria. A série The New International Commentary provavelmente deve também ser
incluída aqui, apesar dos volumes individuais terem ênfases diferentes. Séries populares como The Interpreter's Bible
são de pouco valor para a exegese da série, contudo, seu principal valor reside nos excelentes Artigos Gerais nos
volumes I, VII e XII da série.
Em Português, a melhor série de comentários continua sendo a “Série Cultura Bíblica” publicada pela Edições
Vida Nova e que cobre todo a Bíblia. Contudo, o estudante não precisa comprar a série toda, pois outras séries e
comentários isolados tem sido traduzidos e publicados, alguns de altíssima qualidade. O melhor é comprar apenas os
melhores disponíveis e não apenas “completar uma coleção”.
Síntese e Paráfrase
Depois de feita a pesquisa em todas essas áreas, uma síntese deve ser produzida. Ela deve conter todos os
elementos relevantes que tenham sido percebidos. O sopro de vida para esses ossos secos é realizado ao retornar ao
texto e parafraseá-lo com base na análise dos diferentes elementos. Esta disciplina irá unir elementos díspares, e
mostrará uma nova dimensão do próprio texto.
Aqui termina a tarefa de exegese e da hermenêutica, que assume o lugar do texto e da sua mensagem no
contexto total da teologia e da sua relevância para o homem dos dias atuais.

67
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

ESBOÇO DO ARTIGO de Abraham J. Malherbe,


[Restoration Quarterly, Vol. 5/No. 4 (1961), 169-78]
por Álvaro C. Pestana
EXEGESE Î básica para os estudos no NT e da teologia. A teologia deve ser
governada pela exegese. O exegeta é sempre um historiador e não um teólogo.
Exegese é histórica.
EXEGESE Î é ler e explicar em empatia (e simpatia) com os escritores bíblicos.
Temos que ir além da análise impessoal dos documentos: é necessário assumir a fé do
escritor para entender seus escritos. É um trabalhos histórico-espiritual.
HERMENÊUTICA Î é necessária para a exegese. Na exegese entramos [eivj] no
texto e ficamos nele [evn] e então podemos tirar [evk] lições dele para nós.
Hermenêutica é a síntese dos resultados da exegese, fazendo-a relevante para o leitor
ou o auditório.
Pressuposições:
1. Elas existem e sempre existirão. 2. O que importa não é a sua existência, mas sim a
sua validade. 3. A validade de uma pressuposição é a sua base cristológica. 4. Ler o
texto com a mesma pressuposição de que Jesus é o Senhor, a origem, o ponto
relevante e o alvo da história.
Devemos ler a história e a literatura do Novo Testamento com a pressuposição
cristológica revelada no primeiro século, isto é, Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, o
Salvador e Senhor. Essa pressuposição é válida para sempre. Quando ocorrer a
equação abaixo, estamos bem:
Nossas pressuposições = As pressuposições dos autores do NT

Temos algo muito bom acontecendo quando “vemos o texto como o autor viu”. Desta
forma não há tensão no modo de ver a história. Cristo é o princípio de unidade na
interpretação da Bíblia. Assim, fizeram os apóstolos, instruídos por Jesus e pelo
Espírito.

68
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

Discussão:
O MÉTODO
O grande perigo de esboçar um método é pensar-se que cada item é independente. Na
verdade, todos os itens são interdependentes: o conjunto é inseparável.
O objetivo será ver o texto como o autor viu:
1. Significado como texto isolado.
2. Condicionamento do contexto.
Itens do processo:
1. TEXTO
2. LINGUAGEM
3. CONTEXTO
4. “PANO DE FUNDO” = cenário
5. “PANO DE FRENTE”= cortinas
6. ESTUDOS EXEGÉTICOS
7. COMENTÁRIOS
8. SÍNTESE E PARÁFRASE
1 . TEXTO
1.1 – Variações textuais Î princípios da Crítica Textual
1.2 – Variações que ocorrem nas traduções precisam ser investigadas
2. LINGUAGEM
O processo de tradução.
Determinar os sentidos possíveis das palavras significantes:
a) Léxicos
b) Concordância
- verificar o uso daquele autor (Paulo é o mais fácil de ver)
- verificar frases feitas
Buscar o uso próprio do autor e qualquer padrão de uso.
c) LXX
d) Pais da igreja

69
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

e) Kittel & Friedrich


f) J. J. von Allmen
g) Vine
h) Gramáticas: A. T. Robertson; Blass-Debruner.
3. CONTEXTO
Ver o texto da perspectiva correta.
3 contextos.
1. Contexto maior
É o da “Introdução ao Novo Testamento”
A visão do livro como um todo
2. Contexto imediato
O local que o texto ocupa no argumento do texto (livro) inteiro
3. Passagens paralelas
• Autor
• Assunto
• Palavras
• Frases
• Idéias
• Circustâncias
As ferramentas neste estudo são:
i. Concordância grega
ii. Texto de Nestlé-Aland
iii. Sinopses
4. “PANO DE FUNDO”
Uma tentativa de alcançar o contexto histórico/social, tanto judeu como pagão.
Qual a intensidade de relevância do material de pano de fundo? Esta é a questão que
exige equilíbrio.
5. “PANO DE FRENTE”
1. Especialmente, o tratamento do texto na igreja primitiva.

70
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

2. O entendimento pelos primeiros leitores.


3. O pano de fundo retratado pelos “Pais da igreja”.
6. ESTUDOS EXEGÉTICOS
1. Artigos
2. Monografias
Neste caso, é necessário o acesso a bibliotecas especializadas.
7. COMENTÁRIOS
1. Comentários críticos.
2. Comentários que mostram a continuidade da mensagem do livro.
8. SÍNTESE E PARÁFRASE
A síntese reúne os elementos relevantes na base daquilo que foi estudado. Resumir
tudo.
A paráfrase coloca vida nos ossos secos, Ilustrando tudo com paralelos.

71
Exegese e Hermenêutica 2010 Álvaro César Pestana

SerCris
EXEGESE E HERMENÊUTICA
Sílabo da Disciplina - 2010
Objetivos gerais da disciplina:
Capacitar os alunos para estudarem a Bíblia por si mesmos, de forma espiritual, profunda e independente.
Descrição extraída do Catálogo do SBN:
Como estudar a Bíblia; Exegese e hermenêutica bíblicas. Esta disciplina fornecerá uma metodologia de estudo bíblico mediante a
qual o sentido dos textos bíblicos possa ser descoberto e aplicado. Tratará das regras e princípios a serem obedecidos durante o
processo de interpretação. Introduzirá o aluno no uso das ferramentas necessárias para a realização do estudo, tais como: textos nas
línguas originais, concordâncias, léxicos, dicionários, gramáticas, comentários, etc. Abordará a exegese e a hermenêutica bíblicas de
modo espiritual, de forma a incutir respeito para com o texto bíblico, responsabilidade na obtenção de conclusões e disposição para
ensinar a outros de modo prático e entendível. Tarefa para os alunos: fazer exegese de textos bíblicos.
Baseando-se em um método simples e fácil de reproduzir, esta disciplina ajudará o estudante a ler, entender e explicar passagens da
Escritura, mediante a realização dos passos metodológicos que serão ensinados e demonstrados em classe. Os alunos aprenderão a
utilizar as "ferramentas" de estudo bíblico e tomarão contato com os princípios de interpretação da Bíblia.
Bibliografia obrigatória:
BOST, Bryan Jay & PESTANA, Álvaro César, DO TEXTO À PARÁFRASE: COMO ESTUDAR A BÍBLIA, São Paulo, Editora
Vida Cristã, 1992.
Álvaro César Pestana, EXEGESE E HERMENÊUTICA: RESUMOS, ROTEIROS DE ESTUDO E LEITURA, Campo Grande,
SerCris, 2010.
Há materiais disponíveis em http://alvarocpestana.googlepages.com
Bibliografia adicional:
VANHOOZER, Kevin, HÁ UM SIGNIFICADO NESTE TEXTO? São Paulo, Ed. Vida, 2005.
FEE, Gordon D. & STUART, Douglas, ENTENDES O QUE LÊS? UM GUIA PARA ENTENDER A BÍBLIA COM O AUXILIO
DA EXEGESE E DA HERMENÊUTICA, São Paulo, Edições Vida Nova, 1984.
BERKHOF, Louis, PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO BÍBLICA, Rio de Janeiro, JUERP, 1981
HENRICHSEN, Walter A., PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO DA BÍBLIA, São Paulo, Editora Mundo Cristão, 1980.
HENRICHSEN, Walter A., MÉTODOS DE ESTUDO BÍBLICO, São Paulo, Editora Mundo Cristão, 1980.
TENNEY, Merril C., GÁLATAS, ESCRITURA DA LIBERDADE CRISTÃ, São Paulo, Edições Vida Nova, 1967.
VIRKLER, Henry A., HERMENÊUTICA, São Paulo, Editora Vida, 1973.
CARSON, D. A., A EXEGESE E SUAS FALÁCIAS, São Paulo, Edições Vida Nova, 1992.
BERGER, Klaus, AS FORMAS LITERÁRIAS DO NOVO TESTAMENTO, São Paulo, Loyola, 1998.
WEGNER, Uwe, EXEGESE DO NOVO TESTAMENTO: MANUAL DE METODOLOGIA, São Leopoldo & São Paulo, Sinodal &
Paulus, 1998.
BEEKMAN, John & CALLOW, John, A ARTE DE INTERPRETAR E COMUNICAR A PALAVRA ESCRITA: TÉCNICAS DE
TRADUÇÃO DA BÍBLIA, São Paulo, Edições Vida Nova, 1992.
SCHLEIERMACHER, Friedrich D. E., HERMENÊUTICA E CRÍTICA: VOLUME I, Ijuí (RS), Editora UNIJUÍ, 2005.
Planejamento geral:
# Data Tema Livro Texto
1 11/fev Importância dos estudos Bíblicos & Panorama do Método 4-20
2 18 Texto 21-30
3 25 Contexto [1] 31-46
4 04/mar Contexto [2] 47-59
5 11 Palavras 60-73
6 18 Idéias 74-96
7 25 Paráfrase 96-107
8 01/abr Provérbios dos Exegetas
9 15 Provérbios dos Exegetas Prova Final
Tarefas:
1. Anotar em caderno os conceitos e idéias do curso.
2. Prova final. [70% da nota final]
3. Realização das tarefas com um texto escolhido. [30% da nota final]
4. Leitura do livro texto: Bryan Jay Bost & Álvaro César Pestana, DO TEXTO À PARÁFRASE: COMO ESTUDAR A BÍBLIA,
São Paulo, Editora Vida Cristã, 1992.
Materiais & Recursos Necessários em Classe:
1. Várias versões da Bíblia em português. 5. Textos bíblicos e concordâncias nas línguas originais.
2. Concordância Bíblica da SBB. 6. Léxicos das línguas bíblicas.
3. Dicionários bíblicos e da língua portuguesa. 7. Dicionários teológicos.
4. Caderno de anotações e exercícios. 8. Comentários bíblicos (Colossenses).

72

Você também pode gostar