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Londrina
2006
2
RESUMO
MIYAJIMA, Atsushi. Educação cristã contextual hoje: uma proposta pedagógica para a
Igreja Metodista Livre – Concílio Nikkei. Londrina, 2006, 142 p. (Trabalho de Conclusão de
Curso de Doutorado em Ministério - Faculdade Teológica Sul Americana).
Este trabalho tem como objetivo elaborar uma proposta pedagógica para a Igreja Metodista
Livre – Concílio Nikkei, uma igreja étnica de origem japonesa fundada em 1936 no bairro da
Liberdade, São Paulo. Apesar de seus 70 anos de existência, apresenta um problema
sintomático em relação ao crescimento espiritual de seus membros. Parte-se do pressuposto
de que a falta de um projeto de educação cristã contextualizada tem sido um dos fatores
limitantes no processo da sua formação cristã (em termos de conhecimento e sabedoria) e
conseqüentemente baixo índice de crescimento quantitativo. Com o intuito de se obter um
referencial teórico para a educação cristã, iniciamos com uma pesquisa sobre a pedagogia de
Jesus e da igreja primitiva. Depois prosseguimos para o diálogo e a confrontação dos
elementos da educação cristã com os pensamentos da contemporaneidade a partir de vários
autores. Focalizamos as questões da imigração japonesa e o processo de nacionalização
ocorridos tanto no Japão como no Brasil, assim fazendo uma revisão política,
sócio-econômico e educacional da sociedade nikkei no Brasil, enfatizando que esse foi o
contexto em que surgiu a Igreja Metodista Livre no Brasil, a qual, por esta razão leva consigo
as marcas e feridas desse processo histórico. A revisão sobre Parâmetros Curriculares
Nacionais (Ensino Religioso) serviu como referência básica para estabelecer os critérios de
avaliação da nossa prática educacional. Para concluir, destacamos os treze itens que
direcionarão a nossa proposta pedagógica que estaremos apresentando à igreja local.
Finalmente, fazemos algumas recomendações para a introdução de uma política educacional
para que a presente proposta pedagógica seja colocada na prática educacional, assim causando,
de fato, uma transformação efetiva e profunda nas nossas igrejas.
273 palavras
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .........................................................................................................................4
CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES..............................................................................126
ANEXO ..................................................................................................................................134
INTRODUÇÃO
“No mundo existem muitos ensinamentos. Por que tem que ser o Cristão?”
perguntou um budista japonês. Diante desta pergunta gostaríamos de refletir sobre outra
“Esta é a retribuição dos males cometidos em sua vida anterior, resigne-se (morra)”,
falou Buda.
“Avalie-se a si mesmo e tenha cuidado para não cair outra vez” admoestou
Confúcio.
Mas ainda outro, que se identificou como Jesus, desceu até ao fundo do poço e
Cristã? De acordo com Sherron George (1993, p. 14), entende-se Educação Cristã “como um
processo deliberado e intencional pelo qual Cristo é formado nas pessoas, visando
idéia é a formação de pessoas com uma educação integral que visa todas as dimensões do ser
comunidade de fé, por meio de relacionamentos mútuos entre educador e educando, durante
todas as fases da vida do indivíduo (do nascimento até a morte). Ao mesmo tempo, a
Educação Cristã deve ser contextual, no sentido de que ela se desenvolve dentro do
compromisso com a Palavra e o Espírito Santo, com a Igreja e com a sociedade. Deve haver
uma interação e dialética entre as três partes (George, p. 141). É a partir desse contexto de
Cristã.
De acordo com Padilla (2005, p. 96), Deus se contextualizou em Jesus Cristo, pois
nele a Palavra de Deus se fez homem, ou seja aculturou-se, já que o homem é um ser cultural.
contexto de uma igreja étnica japonesa: a Igreja Metodista Livre – Concílio Nikkei. Para tanto,
consideramos que seria a via mais apropriada, é iniciar analisando e sintetizando a “pedagogia
1 É interessante mencionar aqui a avaliação desses três personagens sob a perspectiva de um filósofo e educador
francês Georges Gusdorf. Seguem as citações extraídas da sua obra intitulada “Professores para quê?”:
“Buda, Confúcio e Jesus afirmam-se nos limites da condição humana, mais exatamente além mesmo desses
limites. Personagens históricos cujo estatuto continua impreciso, encarnam através de milênios o sentido mais
elevada da maestria: a sua afirmação basta para invalidar todos os mestres humanos.” (...) “Confúcio, arquétipo
da sabedoria chinesa, pôde ser reconhecido como mestre para dez mil gerações. Buda e Jesus representam para
os seus fiéis o Santo por excelência, e a via de santidade resume-se na imitação de Jesus ou de Buda.” (Gusdorf,
2003, p. 85-86)
que ele traz consigo, assim como Jesus comunicou no evangelho encarnando uma existência
corporal no mundo.
propósitos ministeriais específicos. Nesse sentido, cremos que o diferencial está no elemento
missão (de Jesus, descendo ao fundo do poço) de salvar as pessoas. Dessa forma, seguindo o
paradigma de Jesus, a missão cristã é um ato educativo e ao mesmo tempo um ato solidário. O
Por fim, o termo “hoje”, do título do nosso trabalho, contém a idéia de uma tentativa
década de 70. Nós nos estabelecemos no interior do Estado do Pará, região norte do país. A
primeira geração dos imigrantes na sua grande maioria não pôde freqüentar a escola. Neste
sentido, fui muito privilegiado por poder receber instrução escolar e chegar a concluir o curso
Atualmente, sou pastor da Igreja Metodista Livre – Concílio Nikkei2, uma igreja de
origem étnica japonesa em um dos bairros da grande cidade de São Paulo. A membresia conta
2 O termo nikkei está sendo utilizado desde a Convenção Panamericana Nikkei realizada em 1985, em São
Paulo, que adotou a terminologia para todos os descendentes de japoneses nas Américas. Em termos mais
recentes, são (...) pessoas de origem japonesa e seus descendentes, que tenham emigrado para outros países e
criado comunidades e estilos de vida com características únicas dentro do contexto cultural das sociedades em
que vivem. São também considerados nikkeis aqueles que voltaram ao Japão, onde passaram a constituir
identidades distintas da população japonesa. (definição de identidade nikkei extraído do site do Projeto
Internacional de Pesquisa sobre os Nikkeis)
com pouco mais de 100 pessoas. A congregação é composta de três grupos: (1) os japoneses,
(2) os nikkeis (os descendentes de segunda e terceira geração) e (3) os brasileiros, em sua
maioria casados com os nikkeis, na proporção de um terço para cada grupo. O ministério
geração com idade média de 73 anos). Fui designado como pastor em 1998. No entanto, só
no entendimento da língua japonesa por parte dos membros da igreja. Foi constatado que esta
maioria dos imigrantes e sua segunda geração de japoneses mal tiveram acesso à suficiente
Ao longo dos sete anos, à medida em que fui conhecendo as pessoas da comunidade,
tenho me esforçado para simplificar o conteúdo das mensagens e dos estudos bíblicos.
Contudo, não tenho tido um resultado satisfatório. Na maior parte das vezes, a reação delas é
que o pastor (agora eu) deveria falar de modo mais simples para facilitar-lhes a compreensão.
Muitos japoneses da primeira e segunda geração que não tiveram acesso à instrução
escolar, sentem que é complicado entender certos conceitos ou princípios bíblicos. Em vista
disso, preciso adequar a linguagem para que eles possam captar os conteúdos. Preciso ter
certos cuidados tais como: usar a linguagem de nível escolar primário; evitar termos
nem do Brasil (e talvez nem da história bíblica), pois eles não se identificam nem com uma,
nem com outra. A “história” para eles é no máximo, a sua experiência pessoal de vida e da
sua família, que foi o “drama” dos imigrantes. Portanto sua aprendizagem acontece a partir do
pela igreja, participei de uma palestra sobre a metodologia do Paulo Freire na Universidade de
imigrantes tinham algo em comum: é necessário aprender a leitura do mundo antes da letra!
Nos termos do Paulo Freire, a leitura do mundo implica em compreender a realidade, e este
ato antecede a leitura do texto. O que devemos aprender a fazer é a leitura da realidade que
nos cerca antes de ler a Palavra de Deus. O que significa isto? Partindo do pressuposto de que
a Palavra de Deus é a verdade espiritual, e todos nós temos experiências no mundo que
(o ato de “ler o mundo”) proporcionaria uma possibilidade de releitura do texto (da Palavra de
Deus) que agora estaria em uma relação dinâmica com o contexto. Desse modo, o
possibilidade da pedagogia freireana como ferramenta para o desafio ministerial que eu estava
entre cada um de nós apenas a questão de ter maior ou menor grau de dificuldade. A partir
daquele dia, abriu-se para mim uma nova perspectiva para estar buscando respostas para
Esta é a nossa justificativa para a elaboração do presente trabalho. Temos tido uma
crise ministerial por não perceber sinais de crescimento espiritual nos membros da igreja.
verdade, ou seja, na falta de uma filosofia educacional consistente. Esta dificuldade em menor
ou maior grau pode ser um problema de todos nós que fomos instruídos na educação
tradicional brasileira. É necessário, então, elaborar uma proposta educacional para promover o
Assim, as perguntas da nossa pesquisa são as seguintes: Até que ponto é possível
articular de forma mais coerente possível a pedagogia freireana com as Escrituras para a
resultar em uma proposta pedagógica para a educação permanente mais viável? Quais são os
pontos fortes desse diálogo? Quais são suas restrições ou limites? Quais as diferenças e
A nossa tese é que a pedagogia de Jesus (e por extensão, da igreja primitiva) poderia
resultar numa nova proposta, adaptada à realidade atual, tendo a missiologia cristã como
termos:
cristã”- pretendemos analisar a hermenêutica da igreja primitiva, ou seja, como ela interpretou
medieval.
diálogo e confrontação com a educação cristã, verificando a sua relevância sob a perspectiva
pedagógica.
própria torna-se um fator primordial para a sobrevivência cultural daquela minoria étnica.
Assim sendo, é necessário desenvolver uma proposta educacional que contemple um contexto
específico e que proporcione as respostas bíblicas que sejam significativas e relevantes para
aquele grupo.
nasce dentro deste ambiente étnico-cultural. Enfim, tendo como base os Parâmetros
proposta pedagógica para a Igreja Metodista Livre – Concílio Nikkei, para em seguida, expôr
CAPÍTULO I
A PEDAGOGIA DE JESUS COMO PONTO DE PARTIDA PARA A EDUCAÇÃO
CRISTÃ
Esta primeira parte pretende ser uma revisão bibliográfica preliminar sobre a
tese de David J. Bosch) porque cremos que a educação e a pedagogia têm uma relação
intrínseca com a dimensão da missão cristã de “...ensinando-os a guardar todas as coisas que
vos tenho ordenado” (Mt 28:20). Segundo Orlando Costas, a educação é uma dimensão da
missão, pois esta pode e deve orientar a educação teológica. Nesse sentido, a missiologia pode
termos que os teólogos como Bultmann, Goppelt e Bosch, usam para designar a compreensão
adiante)
missão é aquela que através da sua atividade transforma a realidade, mas ao mesmo tempo a
própria missão se envolve num processo dinâmico e constante de transformação (Bosch, 2002,
para que se torne mais relevante para o nosso tempo (Bosch, 2002, p. 21).
Portanto, segundo Bosch, o que nós devemos que observar é que não podemos
definir a nossa prática missionária por meio da aplicação direta da Escritura. Compreender
a missão de Jesus e a igreja primitiva e o que nós devemos pensar sobre a missão em nossa
própria situação concreta e atual é muito diferente. (...) Nesse sentido, a autodefinição ou
alternativa importante para a teologia cristã explorar sua relevância para o presente está em
esquadrinhar seu próprio passado permitindo que suas “autodefinições” sejam questionadas
teológica que nos transforme antes que empreendamos a missão no mundo (Bosch, 2002, p.
237). Tendo idéia da sua auto-compreensão pode-se perceber melhor o ambiente no qual se
consequentemente da igreja primitiva, através do estudo dos ditos sobre Jesus, tendo
antigo, talvez a mais profunda que o mundo ocidental tenha conhecido na sua história. O
morreu e foi ressuscitado no ano 30 d.C. Teve sua formação dentro da tradição
influência na formação da pessoa. Não temos nenhuma evidência bíblica de que Jesus tenha
obtido alguma instrução formal. Este privilégio era reservado para as poucas pessoas da elite,
200 anos depois da época de Jesus, o Talmud estabeleceu as normas para a educação da
camada mais pobre da população. Segundo Crossan (1995, p. 41-42), entre 95 a 97% da
que pode produzir uma biografia, cujo resultado muitas vezes, é um produto de idealização, o
reinado de Deus em sua presença e através das parábolas e dos milagres. Nesse aspecto, Jesus
tinha a consciência de uma missão, a de ser um proclamador, o que precisa ser distinto do ato
da proclamação do reino de Deus, pois Jesus está afirmando que tem seu papel no reino.
Dentre os títulos concedidos, destacamos sua identificação como: o rabi, o profeta, o filho de
Davi, o Messias, etc. Assim sendo, Jesus o mestre, é um dos papéis que envolve o ato de
Segundo Goppelt (1976, p. 182), Jesus aceita a designação de rabi (em hebraico,
‘meu mestre’) e atua a princípio da mesma forma como os escribas. No entanto, na “prática de
Jesus” ele acrescenta um novo conteúdo. Em Mt 23:8, Jesus disse: “Vós não sereis chamados
13:13-14, ele reivindica ser mestre deles. O discípulo de Jesus jamais será um rabi. Deste fato
podemos deduzir que Jesus não pretendia constituir o modelo de rabinado no qual os seus
discípulos pudessem mais tarde tornar-se rabi como ele. No entanto, Jesus quer permanecer
sendo o único mestre em seu círculo de discípulos. Os “mestres”, que mais tarde surgiram no
cristianismo, não têm uma função que possa ser comparada ao rabinado (Goppelt, 1976,
p.182). Pelo fato de Jesus ter ensinado com autoridade e realizado milagres foi muitas vezes
intensificação da norma refere-se em Jesus a mandamentos éticos no sentido restrito (p. ex. a
3 Preferimos distinguir o uso do termo o reinado de Deus do reino de Deus. O reinado de Deus como dimensão
dinâmica da expansão do reino de Deus no mundo e o reino de Deus como manifestação escatológica do
governo de Deus na sua plenitude. Cf. cap. IV, p. 91.
lei do divórcio), e o abrandamento das normas cultuais e rituais (p. ex. a lei do sábado)
programa que objetiva a restauração social. Ela pretende conservar a identidade de Israel em
marginalizadas pela sociedade (Theissen, 2002, p. 399). Em suma, Jesus atuava na direção da
liberdade interna em relação à Torá. Conforme ele havia dito: “...e conhecereis a verdade e a
verdade vos libertará.” (Jo 8.32) Para Jesus, a Torá pode ser relativizada e transcendida à luz
das tradições sapienciais e escatológicas, que são as bases espirituais da liberdade de Jesus.
Na época das sociedades tribais o saber era difuso, informal e acessível a todos. A
educação se dava dentro da própria família. Desde os tempos remotos, a família é a base da
educação do povo judeu. Nesse período inicial, o povo não conhecia o conceito de ensino
Na Bíblia, a missão de educar tem origem nos profetas desde o período do Israel
antigo. Por sua vez, os profetas são substituídos pelos rabinos na missão de educar o povo no
período talmúdico (Pinto, 2003, p. 18). Contudo, sempre com o objetivo de garantir e
passa do núcleo familiar para as mãos da comunidade. E ainda, a educação judaica tem início
como uma reação ao helenismo, reação aos estabelecimentos de ensino que foram construídos
nas cidades gregas em Israel (Glick apud Pinto, p. 20). Esses fatos ocorreram no período de
povo, da vida dos patriarcas, profetas, reis e outros personagens, homens e mulheres que
serviram de exemplo, tanto como modelo a serem seguidos bem como de disciplina a serem
Josué e o rei Davi foram se tornando uma imagem do ideal para os judeus. Os respectivos
escritos, denominados de Profetas anteriores (do Livro de Josué ao Livro dos Reis), foram
elaborados como um modelo para a restauração após o exílio. Por outro lado, o profeta Balaão,
Acã, o rei Jeroboão e Manassés tornaram-se como exemplos corretivos ou disciplinares para o
povo de Israel.
momento foi a de detectar a causa do Exílio. Concluíram que a sua causa era a infração da lei
de Moisés. Assim sendo, Esdras reuniu os escribas que tinham retornado da Babilônia a
lei de Moisés e ensinar ao povo a aplicação da lei na vida cotidiana. A partir daí começa a
surgir o problema da interpretação da lei que fora dada mil anos atrás. Esdras, o escriba, foi
parte mais sagrada da Bíblia Hebraica. Na época de Esdras já existia a idéia de que na Lei de
Moisés existem 613 preceitos. Sendo 603 preceitos escritos pelas mãos de Moisés e os demais
dez preceitos, escritos pelo próprio dedo de Deus. Cabe aqui apresentar uma transcrição
Esdras-Neemias. Esta escola existiu desde o século 5 a.C. até o ano 30 a.C. Ao iniciar as suas
4
Moisés Maimônides (1135-1204) conhecido como o Rambam, foi médico, filósofo e teólogo judeu, nasceu em
Córdoba, e atuou como médico da corte no Cairo. Sua obra mais conhecida foi o Guia dos perplexos (Moré
Nevuchim), Mishné Torá.
seguinte regra: Entre os escribas pode-se discutir ou debater, mas não se pode discutir nem
Sofrim começou a levantar uma “cerca de proteção” ao redor dessas leis. Seriam as novas
normas formuladas a partir da lei de Moisés. Essas novas normas são chamadas de Lei
rabínica. A teoria usada pelos rabinos é Pilpul, o princípio de “levantar uma cerca em torno da
lei” com a finalidade de evitar sua transgressão. A teoria se evoluía com o passar do tempo. A
Tanaim significa mestres. Atuaram no período entre 30 a.C. à 220 d.C. Estes
mestres foram os Fariseus da época de Jesus. Eles determinaram uma nova regra: Entre os
Tanaim pode-se discutir ou debater, mas não se pode discutir ou debater a lei de Sofrim.
Dessa forma, para Tanaim, a lei de Moisés e escritos de Sofrim começam ter o mesmo grau de
autoridade, por vezes mais do que a própria Torá. Para sustentar essa teoria diziam que Javé
dera a Moisés dois tipos de leis, a saber, (1) as leis escritas (Pentateuco de Moisés) e (2) as
leis de tradição oral (tradição de Sofrim) Esta tradição oral não tomou a forma escrita desde
Amoraim se refere a professores, do termo hebraico more. Atuaram desde o ano 220
d.C. até 500 d.C. Seguindo a tradição anterior de Tanaim, para os Amoraim, os escritos de
Tanaim tinha o mesmo grau de autoridade da Lei de Moisés. Eles juntaram os escritos de
Sofrim e Tanaim e elaboraram uma obra denominada Mishná5 que no hebraico tem 1500
páginas. Jesus se referiu a esta tradição chamando-a de “o que foi dito aos antepassados”, isto
Guemará6 em vinte volumes. O conjunto formado pela Mishná mais o Guemará é o Talmud
(ou Talmude)7.
Moisés para o período pós-exílico, os preceitos doutrinários tornavam-se cada vez mais
complexos e minuciosos. Isto por causa do método Pilpul (idéia de se levantar as cercas de
proteção ao redor das leis de Moisés). Por exemplo, de cada preceito criaram de cem a mil
novos preceitos. Por este método rabínico, cada vez mais se acrescentavam preceitos humanos.
Na época de Jesus estes adendos ainda se encontravam na forma de tradição oral (mais tarde
tomam a forma escrita e é denominado Mishná). Quando Jesus disse “ouviste o que foi dito
aos antigos...” no sermão do monte, estava se referindo à tradição oral da Mishná. Na época
registraram a ação de Deus na história, através da qual Deus se revela ao ser humano, não
5
Mishná significa “ensino por meio da repetição”. São as pesquisas de referencial jurídico da lei de Moisés.
(aramaico) (200 d.C.) É a coleção geral da interpretação da lei e lei oral durante o período de 5 a.C. até 2 d.C.
Baseado principalmente na interpretação dos Tanaim do primeiro século: pelos Hilel e Shammai. Compilado por
Juda Ha Nashi no segundo século d.C.
6
Guemará é o comentário sobre Mishná. Significa “completo” em aramaico. Guemará palestiniano foi
compilado na Tibéria no ano 390 e Guemará babiloniano foi compilado no ano 500 por Rabi Ash e seu discípulo
Rabi Jossef.
7
Talmud é a coleção geral da interpretação da lei que foram discutidos durante 1200 anos desde 5 a.C. Mishná é
a base de tudo. Acrescentado por Guemará e os comentários rabínicos da Idade Média e posterior. Existem
Talmud de Jerusalém (5º séc.) e Talmud de Babilônia (6º séc.). Este está escrito em aramaico e hebraico e tem
um volume de 3 vezes mais que aquele. Normalmente, o Talmud se refere a este Talmud Babilônico.
Nesta mesma linha segue a “prática de Jesus”, que nas últimas décadas passou a ocupar o
4.1. Galiléia
reconhecida por muitos estudiosos da Bíblia. Sean Freyne escreve no epílogo do seu livro:
chave hermenêutica do próprio livro. Ched Myers (1992, p. 149-158) identifica a estrutura do
evangelho de Marcos em dois livros: Livro I (1:1-8:21) e Livro II (8:27-16:8), nos quais os
Jerusalém. A narração de Marcos começa no rio Jordão, onde Jesus é batizado, depois ele
segue para a Galiléia, região de Tiro-Sidom, sempre rumo ao norte e alcança Cesaréia de
Filipe (o ponto mais alto da narrativa: o centro do livro), e a partir desse ponto de retorno
toma o rumo sul indo para Jericó, Jerusalém e seus arredores, completando a idéia de se fazer
uma caminhada junto com Jesus (Carlos Mesters, 1997). É interessante que, no final do
evangelho de Marcos (16:7) aparece pela última vez, a referência ao nome Galiléia como
lugar de encontro dos discípulos com Jesus. Um outro aspecto no evangelho de Marcos, é a
utilização da topografia. Sempre que Jesus ministrava à multidão ele o fazia na beira do mar
da Galiléia (Cf. Mc 3:7-12; Mc 6:34-44). Porém, quando Jesus queria passar um tempo com
os seus discípulos ele subia para o monte (Cf. Mc 3:13-15; Mc 9:2-8). Portanto, podemos
sobre a Galiléia, tais como: o foco do zelotismo, uma província efervescente com distúrbios
corrigidas e reavaliadas (Freyne, 1996, p. 15). O que pode ter acontecido são os conflitos de
camponeses conservadores, os guardiões dos valores judaicos. Por sua vez, os da Galiléia são
desprezados pelos fariseus de Jerusalém por serem de uma região distante do centro judaico
(Templo) e também sob o forte influência do helenismo da época (Freyne, 1996, p. 222; Cf.
Jo 7:45-52).
Para efeito de estratégia, o passo seguinte de Jesus foi escolher o local para fixar a
base para a sua atividade. E Jesus não escolheu as cidades como Séforis ou Tiberíades, ambas
as póleis helenísticas construídas por Herodes Antipas para ser a sede do seu governo, mas
4.2. Cafarnaum
ocidental do mar da Galiléia. Na época de Jesus, presume-se, pelo tamanho da localidade que
deveria ser uma “vila”. No entanto, a designação de “cidade” (polis) era devido à importância
estratégica de sua localização. Era um entroncamento de caminho do mar (via maris) que
servia como corredor que liga os continentes asiático e africano. Possuía sua Sinagoga própria,
a qual foi construída por um centurião romano (Lc 7:1; Mt 8:8). Havia também um posto
alfandegário (Mt 9:9; Lc 5:7), lugar onde Jesus residia como a ‘sua’ cidade (Mt 9:1) e onde
existia a ‘sua’ casa (Mt 9:7). Ainda que Jesus tenha sido criado em Nazaré, a partir da fase
inicial da sua atividade, escolheu conscientemente Cafarnaum como a sua base para o
ministério público na região da Galiléia. Foi o local onde Mateus, o Levi, foi comissionado
como um dos discípulos (Mt 9:9) e possivelmente outros discípulos como Pedro e André (Mc
1:16,17). A casa de Pedro ficava nas proximidades da Sinagoga, onde ocorreu a cura da sua
sogra (Mt 8:14). Foi um lugar freqüentemente mencionado em conexão com a vida de Jesus
outras localidades devido ao fluxo intenso de pessoas por esta cidade. Desta forma, podemos
observar que Jesus tinha uma visão estratégica para ser a luz do mundo a partir de Cafarnaum
(Is 9:1,2; Mt 4:15,16). Nesse sentido, Cafarnaum é o próprio cerne da ordem provincial. Isto
demonstra o compromisso com o mundo e não de fuga do mundo. A missão de Jesus era vir
primeiramente para Israel porém ele possivelmente já estava projetando a missão cristã como
importância para o educador. Cafarnaum fora escolhida para ser o centro da atividade pública
de Jesus.
Segundo Mayer (1973, p. 171) Jesus é um idealista porque acredita que o homem é
filho de Deus e tem dentro de si uma riqueza de possibilidades ilimitadas. Acreditamos que
esta concepção acerca do ser humano possibilitou o surgimento da idéia da educação popular
Do ponto de vista de Mayer, Jesus era guiado pelo conhecimento intuitivo e não
sabedoria (da intuição). Tal sabedoria vai ao âmago das coisas, à essência, estabelece
saber, o nosso relacionamento correto (1) com as pessoas, (2) com o mundo material e (3)
com Deus. No relacionamento com as pessoas, o fator essencial é a nossa motivação, a pureza
do coração, enquanto que no relacionamento com o mundo material seria imprescindível o ato
de confiar na providência divina e compartilhar os bens, a fama e a honra uns com os outros.
Em linhas gerais, podemos dizer que Jesus adotava a pedagogia rabínica daquele
como: (1) o uso de perguntas, (2) o uso das parábolas (3) exemplo de vida e discipulado.
O uso de perguntas é um dos métodos mais antigos e mais empregados. Serve para
chamar e prender a atenção, bem como para provocar pensamentos. Sócrates sistematizou o
método de buscar a verdade através de perguntas. Nos quatro evangelhos encontramos mais
de cem perguntas diferentes de Jesus. Nesse sentido, Jesus está seguindo a tradição do método
Dentre as perguntas de Jesus, citemos a mais representativa: “Quem o povo diz que
eu sou?” (Mc 8:27) Os discípulos responderam: “Alguns dizem que é João Batista; outros,
Elias; e ainda outros, um dos profetas”. O motivo de Jesus perguntar aos seus discípulos não
foi porque ele estivesse preocupado com a opinião pública a seu respeito. O objetivo
verdadeiro estava na próxima pergunta: “E vocês? Quem vocês dizem que eu sou?” (Mc 8:29)
“Eu sou o Messias”, ele pergunta: “O que vocês acham?” Esta era a forma para os discípulos
chegarem à resposta correta por eles mesmos. Jesus dialogava tanto com os seus discípulos
como também com os seus oponentes, fazendo perguntas como forma de conduzir as pessoas
para a verdade. Posteriormente, este método pedagógico foi desenvolvido na igreja primitiva
“mashal” (parabole nos sinóticos e paroimia no evangelho de João) abrange uma ampla gama
Ou melhor, à parábola, no sentido mais amplo, pertencia toda sorte de linguagem figurada8.
Jesus utilizava os temas já conhecidos do povo como por exemplo rei, servo, vinha, figo e
outros. No entanto, ele nunca tomou as parábolas emprestados dos rabinos (Kinoshita, 1971, p.
889). A maioria das que contou provinha de sua própria experiência de vida. Portanto, as suas
parábolas refletem a dinâmica da sociedade palestinense do seu tempo. Muitas das parábolas
de Jesus têm como tema o reinado de Deus (ou o império de Deus) que confronta o sistema
dominante da época ou seja, o império romano. A Galiléia foi considerada como região de
rebelião popular principalmente dos camponeses. Assim sendo desde o início, o ensino de
Jesus tratava-se de uma educação realizada a partir das margens da sociedade. O ensino com a
temática do império de Deus neste contexto, tornou-se ameaça para o sistema vigente da
época. Como expressa Danilo Streck: Na simplicidade das parábolas está contida a
254).
de Mateus, o método do ensino de Jesus muda radicalmente entre a primeira parte (capítulos 1
8
Para discussão detalhada sobre parábola de Jesus vide artigo de Gabriele Greggersen “A prática pedagógica do
educador cristão: reflexões a partir da parábola do semeador” Fides Reformata v.7, nº1, p. 105-123.
9
Arnold G. Fruchtenbaum. Fundador de Ariel Ministries (Tustin, CA), é judeu messiânico (aceitou a Jesus
como Messias), estudou Hebraico e Antigo Testamento em Dallas Theological Seminary e obteve seu doutorado
em New York University (1989).
a 12) e a segunda parte (capítulos 13 a 28) tendo como divisor de águas uma palavra chave
“naquele mesmo dia” (Mt 13:1). Que dia é esse? Fruchtenbaum observa e responde a essa
pergunta: foi exatamente o dia em que os judeus como nação rejeitou a Jesus como Messias.
Até aquele momento Jesus ensinava falando claramente à multidão. A partir daquele incidente,
passou a falar com a multidão apenas por parábolas e as explicava somente para os discípulos
(Mt 13:34).
Portanto, a parábola tem estas duas dimensões: para os discípulos ilustra a verdade
porém, para a multidão, acoberta a verdade. “Pois ao que tem se lhe dará, e terá em
abundância; mas ao que não tem, até o que tem lhe será tirado.” (Mt 13:12)
Jesus ensinava através do exemplo. Disse ele: “Aprendei de mim” (Mt 11:29).
Assim sendo, sua tarefa não consistia apenas em comunicar conhecimento (informação) mas
criar padrões de comportamento (formação). Sua lição começa a partir do referencial ético (da
ação) do próprio educando, conforme a frase: “como quereis que os homens vos façam, assim
fazei-o vós também a eles.” (Lc 6:31) A lição educacional de Jesus indica que o educador
deve trabalhar e investir na pessoa a partir do seu contexto de vida. No contexto eclesiástico,
o ensino através do modelo de vida foi sistematizado como diversos e variados métodos de
discipulado cristão.
e discípulo. É somente nesta dimensão relacional que se torna possível cultivar no indivíduo a
capacidade de dar seguimento aos passos do discipulador de acordo com o exemplo de sua
vida.
com ele (...)” (Mc 3:14). A idéia do chamado se distingue do discipulado dos rabinos da época
de Jesus no qual, o talmid (discípulo) tinha a prerrogativa de escolher seu próprio mestre e
ligar-se a ele (Bosch, 2002, p. 59). No entanto, na ordem de Jesus “segue-me” denota-se que a
escolha é Jesus quem faz, não os discípulos. Esta parte inicial do discipulado consiste no
Isso significa que os discípulos caminham com ele, comem e bebem com
ele, ouvem o que ele diz e vêem o que ele faz, são convidados junto com
ele a entrarem em casas e choupanas, ou são rejeitados junto com ele. Não
são chamados para as grandes realizações, religiosas ou de outra natureza.
Como companheiros, são convidados a partilhar do que ocorre em torno
de Jesus. São, portanto, chamados a não atribuir muita importância a si
mesmos e ao que realizam ou deixam de realizar, mas a atribuir grande
importância ao que ocorre através de Jesus e com ele. São convidados a
delegar suas preocupações e ansiedades (Schweizer, 1971, p.41 apud
Bosch).
pregar (...)” O chamamento para o discipulado não é um fim em si mesmo; ele arregimenta os
discípulos para o serviço do reinado de Deus. Portanto, seguir a Jesus não significa passar
adiante seus ensinamentos ou tornar-se depositários fieis de suas percepções, mas ser suas
primordial não é formar discípulos que se tornem mantenedores da sua tradição, mas de
participantes da obra de Jesus. Jesus disse que “aquele que crê em mim fará também as obras
que eu faço e outras maiores fará (...)” (Jo 14:12). Assim sendo, podemos deduzir que para
Jesus, a reprodução da tradição pelos seus seguidores não é o bastante, porém o que importa é
a extensão criativa e contextualizada da obra de Jesus que seja relevante e significativa para
cada geração.
autoridade de expelir demônios.” Mateus elucida um pouco mais descrevendo: “(...) deu-lhes
Jesus autoridade sobre os espíritos imundos para os expelir e para curar toda sorte de doenças
e enfermidades” (Mt 10:1) Segundo a perspectiva de Bosch, o que podemos perceber a partir
dessas comissões é que Jesus confere autoridade aos seus discípulos para fazer a sua obra. Os
discípulos de Jesus são aquelas pessoas que estão sendo treinadas para viver na dimensão do
todo o tempo das palavras de Jesus que disse: “toda a autoridade me foi dada no céu e na
terra”.
Jesus com os fariseus, seguem as etapas do método de investigação que fora adotado pelas
autoridades judaicas para identificar um suposto Messias. Para isto, o Sinédrio enviava uma
todo o Israel, de acordo com o texto de Lucas 5:17 “(...) fariseus e mestres da lei, vindos de
(Mc 2:1-12; Mt 9:1-8; Lc 5:17-26) na qual os escribas e fariseus não podiam refutar, mas
10 Cf. supra
que a investigação é significativa, ela poderá prosseguir. Do contrário, dá-se como caso
encerrado. A etapa do interrogatório que vem logo em seguida é a segunda fase (Mc 2:13-17;
discípulos de Jesus. A terceira etapa é a que inicia a discussão propriamente dita, sobre a lei
oral, sobre a interpretação da lei de Moisés e sobre a lei do Sábado. Na etapa seguinte começa
a acusação da parte dos fariseus, aparecendo também os escribas que vieram de Jerusalém
(Mc 3:22). A etapa final é a do julgamento do acusado diante do Sinédrio (Mc 14:53-65; Mt
escritos dos evangelhos surgiam do contexto no qual o judaísmo estava se tornando cada vez
mais hostil e resistente à igreja cristã, é de se esperar que os autores dos evangelhos
observar que as discussões com os fariseus ou escribas tem profunda relação com a
Jesus fora muito contundente em criticar as atitudes desses líderes do povo proferindo o
julgamento mais severo da parte de Deus sobre eles. Não é por acaso que o povo tinha a
imagem de Jesus como de um dos profetas do antigo Israel como Elias, Jeremias e outros,
pois esses foram os que protestaram perante as autoridades e os poderosos sobre a questão da
justiça social para defender os mais fracos e pobres da sociedade. Quanto aos detalhes sobre a
próximo capítulo.
Cristianismo.
épocas mais importantes da história do Cristianismo pois foi o período em que a doutrina de
cristãs.
(dignidade do trabalho) e na política, o desafio passa a ser uma sociedade baseada em relações
de igualdade, fraternidade e civilidade. O evangelho foi a semente que mais tarde provocou
A igreja, como comunidade, torna-se um lugar de formação do cristão que vive com
os outros, amando e servindo. O amor é a chave mestra de toda a educação cristã, o amor a
Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. O amor ágape, como unidade
narrações das Escrituras, contando-se histórias de personagens bíblicos. Mais tarde, à medida
O método didático que começaram a pôr em prática foi a catequese, isto é, ensino
moldar-se”. O apóstolo Paulo usa a expressão: “...até ser Cristo formado em vós...” (Gl 4:19),
numa metamorphosis, numa radical mudança interior do homem caído, cada vez mais
conforme o modelo divino ou “...à medida da estatura da plenitude de Cristo” (Ef 4:13). A
idéia de morphosis da educação cristã completa-se com a de graça divina (De Barros, 1975).
Cristo. O apóstolo Pedro propõe a imitação de Cristo que corresponde, de algum modo, ao
santos como eu sou santo” (Lv 11:44,45) é herdado nos escritos de Paulo: “sede, pois,
imitadores de Deus...” (Ef 5:1). Da mesma forma, Jesus propõe o Pai como exemplo (Mt
5:44,45). Esta imagem-ideal da tradição judaico-cristã passa a influenciar boa parte das idéias
11 Sobre a educação no lar na igreja primitiva: Green, M. Evangelização na Igreja Primitiva 1989, p. 263-264.
doutrina e depois moldar o cristão segundo aquele modelo, indicando-lhe recursos éticos e
práticas religiosas capazes de levá-lo até aquele objetivo. Dessa maneira, a partir da época
no processo educativo.
Nesse sentido, segundo Werner Jaeger citado por Gilda de Barros, Gregório de Nisa
divina), num processo de elevação espiritual que reintegra no divino o homem da queda,
criado à imagem e semelhança de Deus. A partir dali os pais da igreja grega desenvolvem a
teoria mística de theognosis ou conhecimento de Deus. Houve então uma tradução da idéia
a helenização da igreja cristã com a adoção da filosofia grega como sistema de pensamento.
Para os gregos o conceito chave era o conhecimento (gnosis ou sophia). Em grande parte da
tentar contextualizar sua mensagem com o objetivo de dialogar com o mundo pagão, acabou
reinterpretando sua teologia nos moldes da filosofia grega. Assim sendo, a ontologia (o ser de
Deus) tornou-se mais importante que a história (as ações de Deus). (Bosch, 2002, p.243) Esse
tipo de desvio tem acontecido freqüentemente na história da igreja. Nesse sentido, vale a pena
idêntica no seu conteúdo pois o Jesus dos evangelhos adveio das interpretações feitas pela
própria igreja primitiva. E esta lógica é prolongada e mantida até antes da época da igreja
5. Conclusão
Jesus de Nazaré e a igreja primitiva, sem dúvida, nos deixaram uma grande
classes sociais, difundidas através dos diversos movimentos educacionais ao redor do mundo.
No entanto, durante muito tempo, a maioria das igrejas cristãs parece que não tem
acordo com o missiólogo David Bosch, por causa da crise identitária da igreja, nos
muito mais na tradição protestante, que adotou o lema da missão baseado em Mt 28:18-20 no
muito mais do que uma comunicação verbal do evangelho, ou seja a de informação. Do ponto
de vista da filosofia da educação existe a idéia de formação do ser humano conforme uma
sua ética. E assim, cremos que, de forma criativa e responsável, podemos prolongar a lógica
do ministério do ensino de Jesus e da igreja primitiva para o nosso próprio tempo e contexto.
CAPÍTULO II
A HERMENÊUTICA DA IGREJA PRIMITIVA E SUA IMPLICAÇÃO NA
EDUCAÇÃO CRISTÃ
precisamente, a lei oral que nessa época (de Jesus) ainda se encontrava em forma de tradição
12 Mishná significa “ensino por meio da repetição”. São as pesquisas de referencial jurídico da lei de Moisés.
(aramaico) (200 d.C.) É a coleção geral da interpretação da lei e lei oral durante o período de 5 a.C. até 2 d.C.
Baseado principalmente na interpretação dos Tanaim do primeiro século: por Hilel e Shammai. Compilado por
Juda Ha Nashi no segundo século d.C.
13 Midrash, significa pesquisa, é ao mesmo tempo, um método de interpretação das Escrituras e uma coletânea
de escritos de conteúdo legal (Midrash Halachá) e não legal (Midrash Hagadá). O Midrash Halachá consiste nos
comentários exegéticos de conteúdo legal, presentes no Êxodo (Mechilta), Levítico (Sifra), Números (Sifri) e
Deuteronômio (Sifri). O Midrash Hagádico originou-se das explicações dadas às porções da Torá lidas nas
sinagogas semanalmente (Giglio, 2000, p. 84).
14
Em meus estudos sobre a Mishná tenho privilegiado as palestras do Dr. Arnold G. Fruchtenbaum. Fundador
de Ariel Ministries (Tustin, CA), é judeu messiânico (aceitou a Jesus como Messias), estudou Hebraico e Antigo
Testamento em Dallas Theological Seminary e obteve seu doutorado em New York University (1989).
oral. A sua compilação só se completou no 2º século da era cristã, passando a ser denominada
Mishná. Conforme referido anteriormente, a lei oral nos textos dos evangelhos é indicada com
a expressão “o dito aos antigos”, principalmente na discussão sobre a lei oral na qual
constatamos os pontos divergentes entre Jesus e os fariseus. Podemos observar nos incidentes
das discussões relatados nos evangelhos que as autoridades judaicas se escandalizaram não
somente rejeitando a Jesus como Messias, mas também forjando os motivos que o levaram à
condenação. Como não existe nenhuma prova contra Jesus de ter participado da revolução
judaica contra o Império Romano, podemos deduzir que a rejeição como Messias da parte dos
fariseus teve como motivo o fato de que Jesus não estava de acordo com os preceitos da lei
oral. Segundo a doutrina dos fariseus, o Messias tinha que ser obediente à lei de Moisés e aos
preceitos da lei oral, o que contribuiu para levantar ainda mais a cerca de proteção ao redor
Abaixo são os casos nos evangelhos em que Jesus entrou em discussão com a lei oral:
Sobre o lavar das mãos antes da refeição (Mc 7:1-23; Mt 15:1-20; Jo 7:1)
Os fariseus, seguindo a tradição oral, praticavam o jejum duas vezes por semana nas
observavam este preceito pelo que houve acusação da parte dos fariseus. Podemos deduzir
que a prática do jejum no círculo de Jesus e dos seus discípulos não eram bem evidentes.
Contra esta acusação Jesus apresentou as seguintes refutações: (1) Enfatizou a idéia da
presença do noivo no casamento (Lc 5:34, 35). Segundo os relatos dos evangelhos, depois de
ter iniciado o ministério público, Jesus não menciona nenhuma vez que praticara jejum. (2)
Acrescentou a idéia de não colocar o remendo de pano novo em uma veste velha (Lc 5:36). O
novo ensino de Jesus não tinha a intenção de tapar os buracos da cerca de proteção da lei,
conforme a preocupação dos fariseus. (3) Paralela à anterior, a idéia de não colocar vinho
novo em odres velhos (Lc 5:37, 38). O novo ensino de Jesus não tem como ser enquadrado no
velho sistema dos fariseus. (4) Também pode ser atribuído como uma profecia de Jesus sobre
os fariseus, a idéia de que os fariseus que preferem o vinho velho não degustarão o vinho
Dentre os vários preceitos, o mais polêmico foi a discussão sobre o sábado. O fato
Contra esta acusação dos fariseus, Jesus citou um incidente que aconteceu com
Davi, escrito no livro de Samuel (I Sm 21:1-6). A doutrina dos fariseus tinha acrescentado
preceitos que nem estavam previstos na lei de Moisés. A lei de Moisés não proíbe aos levitas
dar o pão da consagração às pessoas que não são levitas. De acordo com Fruchtenbaum, a
doutrina dos fariseus dizia que era proibido aos levitas dar de comer do pão aos não levitas.
São quatro as respostas de Jesus aos fariseus (Mt 12:1-8) (1) Assim como os fariseus nunca
acusaram a Davi como infrator da lei, Jesus que veio como filho de Davi não devia acusá-los
(Mt 12:3,4). (2) A lei do sábado não é aplicada a todas as pessoas. Não é aplicada aos
sacerdotes que trabalhavam no Templo, pois eles tinham que trabalhar duas vezes mais do
que nos outros dias. Assim sendo, não poderiam usar de generalização quanto à lei do sábado
(Mt 12:5). (3) O ensinamento de que o Messias era maior que a lei do sábado e tinha a
autoridade para dar a sua interpretação (Mt 12:6-8). (4) A doutrina dos fariseus dizia que
Deus criou Israel para o Sábado. Mas, na realidade, era exatamente o contrário. O sábado foi
Desde a época da Antiga Aliança, para que o reino messiânico se tornasse uma
realidade, os judeus tinham que viver uma vida justa. Assim sendo, o judaísmo sempre
proporcionava um caminho largo para entrar no reino. Bastava nascer judeu para fazer parte
do “ser justo”. No entanto, a proposta de Jesus é que seria necessário entrar pela porta estreita,
A questão primordial, para os judeus daquela época, era se Jesus tinha consideração
ou não pelo caminho de justiça dos fariseus. No Sermão do Monte, Jesus declara que não
aceita a justiça dos escribas e dos fariseus por dois motivos (Mt 5:20): (1) A justiça dos
fariseus não era suficiente para entrar no reinado de Deus. 15 (2) O farisaísmo estava
O episódio do Sermão do Monte ocorre logo após a discussão sobre a lei oral,
também logo após a declaração da sua messianidade e a escolha dos Doze discípulos.
Segundo Fruchtenbaum, o Sermão do Monte como um todo (1) não é a constituição legal do
reino messiânico, (2) também não é o método que proporciona a salvação. Então, o que é o
do seu nascimento. Somente Jesus conseguiu cumprir todos os 613 preceitos da lei de Moisés,
e carregou sobre si a maldição da lei, anulando a exigência da lei sobre toda a humanidade.
No Sermão do Monte, por seis vezes introduz um novo tópico com esta antítese:
“Ouvistes que foi dito aos antigos... Eu porém vos digo...” (Mt 5:21; 27; 31; 33, 38; 43).
lei oral. A expressão “ouvistes que foi dito aos antigos...” refere-se a tradição oral. Pois se
estivesse se referindo a lei de Moisés, o texto utilizaria a expressão “está escrito...”. “Eu
porém vos digo...” por esta forma Jesus vai apresentar a sua interpretação, ou seja, a maneira
como deveria ser feita a hermenêutica sobre a Torá. Relacionamos abaixo os textos
coração, isto é, desde o momento em que a mesma se aloja no pensamento e antes mesmo de
ser praticada, advertindo da nossa potencialidade para cometer pecados, assim, a obediência
perfeita não é puramente exterior mas sim a prática da lei por aqueles que vivem uma nova
realidade espiritual.
rabi (comparado como aquele que constrói em cima da areia). Jesus, entretanto, interpretava
sua autoridade sem paralelo. Este é o significado da rocha. É necessário construir sobre a
1.4 Sobre o lavar das mãos antes das refeições (Mc 7:1-23; Mt 15:1-20; Jo 7:1)
Desde a época de Jesus, a tradição oral já estava sendo mais enfatizada do que a da
própria Torá. A expressão “a tradição dos anciãos” em Mt 15:2 se refere a lei oral.
refeições na época posterior a Mishná, delineia as seguintes quatro advertências: (1) É melhor
caminhar sete kilômetros do que pecar, comendo sem lavar as mãos. (2) Aquele que não lava
as mãos antes das refeições é semelhante ao que comete o pecado do homicídio. (3) Também
é semelhante a cometer o pecado da prostituição. (4) Quem não quiser morrer pobre deve
lavar as mãos.
mãos antes da refeição. São três as contestações de Jesus: (1) Os fariseus estão preocupados
pela hipocrisia da formalidade religiosa (Mc 7:6,7) (2) Entre o preceito humano e o preceito
divino a qual devemos dar prioridade? A preferência de um pode desprezar o outro entrando
em contradição. (Mc 7:8), (3) Os fariseus estavam invalidando o mandamento de Deus (Mc
7:9).
Jesus acrescenta uma interpretação sobre os fariseus. Estes são arrancados por não
terem sido plantados por Deus, são os guias cegos que cairão no barranco junto com os seus
conduzidos (Mt 15:14,15). A impureza que contamina não vem de fora mas de dentro do ser
humano. Este incidente demonstra que a lei oral já se tornara mais importante do que a
própria Escritura. O lavar das mãos ordenado na Torá refere-se a um ato cerimonial no
dois tipos de Midrash: Halachá e Hagadá. O Midrash Halachá são prescrições legais para
serem compreendidas e colocadas em prática (217 itens). O Midrash Hagadá são constituídas
principalmente das narrativas do episódio das festas de Israel (65 itens). Hagadá é todo
material presente no Talmud e fora dele, portanto os textos agáticos são encontrados também
16
Midrash, significa pesquisa, é ao mesmo tempo, um método de interpretação das Escrituras e uma coletânea
de escritos de conteúdo legal (Midrash Halachá) e não legal (Midrash Hagadá). O Midrash Halachá consiste nos
comentários exegéticos de conteúdo legal, presentes no Êxodo (Mechilta), Levítico (Sifra), Números (Sifri) e
Deuteronômio (Sifri). O Midrash Hagádico originou-se das explicações dadas às porções da Torá lida nas
sinagogas semanalmente (Giglio, 2000, p. 84).
período dos Tanaítas se iniciou com os rabinos Hilel e Shamai (30 a.C.-20 d.C.). Continuando
com Gamliel (II) Ha-Zaken (20-40 d.C.) sucessor de Hilel que era, possivelmente, mestre de
Paulo de Tarso (Bruce, 2003 p. 44). Mais tarde com o rabino Akiva (110-135 d.C.) iniciou-se
Ha-Nassi (170-200 d.C.) realizou a redação final do material que resultou na Mishná.
Escritura. Os Midrashes da época dos Tanaím são os que contém principalmente o Halachá,
que são comentários sobre o livro de Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio. O Midrash é
no sentido de incluir múltiplas interpretações desse mesmo texto. Baseado no texto da Torá a
adotar uma conduta pessoal mais próxima do ideal judaico que consiste no cumprimento dos
mandamentos (Giglio, 2003, p. 58). Nesse sentido, o método Midráshico é a chave para se
e Paulo. Para os cristãos da igreja primitiva, a Escritura vinha esclarecer o evento que tinham
renovada compreensão (Ketterer, p. 116). Assim, pensamos que seu traço essencial é o
processo de atualização (...) da mesma maneira como sempre foi compreendido em Israel e,
Jesus, então ele próprio já havia adotado na sua pedagogia o que Ketterer chama de Midrash
cristão.
familiaridade com princípios hermenêuticos de sua época, que foram mais tarde
sistematizados por rabinos (no assim chamado Midót) (Theissen, 2002, p. 384). De fato, o
rabino Hilel elaborou sete regras de interpretação (ou derivação) conhecidas também por sete
Midót que compõe a literatura midráshica jurídica, conhecida como Midrash Halachá. Nesse
missão cristã. No final do seu livro, Ketterer conclui: “Assim, pois, deve ela (Palavra)
todas as adaptações legítimas, a todas as situações novas. Tais são o fundamento e a razão de
ser do midrash”.
pedagogia judaica do tempo de Jesus. Entendendo a pedagogia judaica podemos analisar com
específicas estabelecidas pelos sábios, a Torá pode ser interpretada também com o intuito de
dela se derivarem novas leis. Tais métodos permitem abstrair, portanto, do próprio texto da
17 Quanto a comparação entre os ditos de rabinos e os de Jesus vide na obra intitulada Jesus, de Bultmann (2005,
p. 71-72), na qual alista dez textos dos rabinos que tem relação de semelhança com os ditos de Jesus nos
evangelhos de Mateus e Lucas.
Torá uma série de novos elementos com conteúdo legal. E este constitui o Midrash Halachá
Escritura é característico da época dos Tanaím (Ketterer. 1996, p.21), os fariseus da época de
Jesus.
Escritura: trata-se de abrir a liturgia da Palavra ou abrir o espírito dos ouvintes, abrir o sentido
do texto. (cf. Jesus, abrindo as Escrituras, διηνοιγεν em Lc 24:32) “Então, lhes abriu o
destes aos Escritos (Ketuvim). Consiste em resgatar a unidade e a coerência das Escrituras. É
exatamente o que Jesus fez em Lc 24:27. “E, começando por Moisés, discorrendo por todos
interpretação do texto bíblico cuja autoria se atribui ao Rabi Hilel. Na seqüência, Rabi
Ishmael, contemporâneo de Rabi Akiva (primeira metade do século 2º d.C.), propôs 13 regras
hermenêuticas. E mais tarde, rabino Eliezer ben Iossi, o Galileu, apresentou como sua
proposta um conjunto de 32 regras (Midót). Neste trabalho nos detemos apenas em identificar
rabinos é Cal Vachômer: a inferência do menor (Cal) para o maior (Chômer) em importância,
e vice-versa. Esta regra é usada por Jesus no seu ensinamento: “se o próprio Deus nutre os
“raciocínio por analogia” é a uma das práticas mais usadas no Midrash, em outros termos é a
apresentam pontos comuns no seu conteúdo e a partir dali fazer surgir novos significados.
(Ketterer, 1996, 53) A expressão utilizada por Jesus no contexto de julgamento: “com a
medida com que medirdes, sereis medidos” (Cf. Mt 7:2; Mc 4:24; Lc 6:38), o adágio “medida
por medida” significa, primeiramente, que Deus concede ou retribui a cada um, segundo as
suas obras.
rabínicos e também adotada por Jesus: “Ora, se vós, que sois maus, sabeis dar boas dádivas
aos vossos filhos, quanto mais vosso Pai, que está nos céus, dará boas cousas aos que lhe
Escritura pode ser destituída de sentido. Assim, através dos séculos vem sendo exploradas
partículas de difícil compreensão são vistas pelos rabinos como objeto ou até mesmo como
oportunidades para tecer comentários (que muitas vezes vão além da sua função gramatical).
Até quando o texto se cala (o silêncio) era objeto da exegese. Em geral, no Midrash a exegese
do texto servia para resolução de uma aparente contradição entre determinados dados da
Escritura. Nesse sentido, para os rabinos, o método Midráshico tem sido uma oportunidade
para se fazer uma nova interpretação, ou um caminho que conduz para um novo sentido do
texto.
Nos evangelhos sinóticos existem alguns textos que podem ser descritos como
(15:3-6), no qual os discípulos de Jesus eram acusados pelos fariseus porque comiam com as
mãos impuras, isto é, por não observar o ritual de purificação das mãos segundo a tradição
contradição entre um dos mandamentos do Decálogo, “Honra a teu pai e a tua mãe” com uma
interpretação da lei oral que diz respeito a um voto pelo qual uma soma de dinheiro é
Vós, porém, dizeis: Se um homem disser a seu pai ou a sua mãe: Aquilo
que poderias aproveitar de mim é corban, isto é, oferta para o Senhor,
então dispensais de fazer qualquer coisa em favor de seu pai ou sua mãe,
invalidando a palavra de Deus pela própria tradição, que vós mesmos
transmitistes; e fazeis muitas outras cousas semelhantes. (Mc 7:11-13)
multidão, utilizando-se de uma parábola: “Nada há fora do homem que, entrando nele, o
possa contaminar; mas o que sai do homem é o que o contamina.” Concluindo o seu
do divórcio de Dt 24, colocando-o contra Gn 1:27; 2:24. Nesse incidente, os fariseus vieram
para Jesus perguntando se é lícito a um marido despedir sua mulher escrevendo uma carta de
resulta de uma tolerância divina (ou mosaica), que não seria ou não deveria ser um ideal
divino, mas uma exceção nos casos extremos a fim de se evitar um mal maior. O ideal divino
que não acreditavam na vida após a morte, vieram a Jesus trazendo o caso de uma família em
que houve uma sucessão de falecimentos dos irmãos que se casaram com uma mulher,
cumprindo a lei do levirato de Israel. A pergunta era nos seguintes termos: “Na ressurreição,
quando eles ressuscitarem, de qual deles será ela esposa? Porque os sete a desposaram.”
Jesus responde, citando o texto de Êxodo 3:6, “Quanto à ressurreição dos mortos,
não tendes lido no livro de Moisés, no trecho referente à sarça, como Deus lhe falou: Eu sou o
Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó? Ora, ele não é Deus de mortos, e sim de
Assim, considerando esses casos, podemos deduzir que Jesus desenvolvia seu
ensinamento utilizando-se dos próprios elementos culturais da sua época, tendo criatividade
na escolha dos argumentos bíblicos dentro do contexto social no qual ele estava inserido.
O termo Midrash deriva do radical (דרשbuscar) que aparece 164 vezes nas
Escrituras. A forma no substantivo aparece somente duas vezes (2 Cr 13:22; 24:27) e com
como “a busca amorosa do Senhor, do sentido de Sua Palavra, para colocá-la em prática”
Segundo o rabino Samy Pinto, o estudo da Torá tem como objetivo principal não o
saber por saber, mas sobretudo, o saber para fazer. Shimon, filho de Gamliel disse: “Não é a
teoria o principal mas a prática”. Rabi Ishmael também disse: “aquele que estuda visando a
ensinar, ser-lhe-á dado aprender e ensinar, e aquele que estuda visando o praticar, ser-lhe-á
dado aprender e ensinar, observar e praticar”. (Pinto, p. 25) Como diz o salmista: “O temor
111:10)
Esta é a diferença entre a visão judaica e a visão grega no que tange à sabedoria.
Para Aristóteles, a função do ser humano, sua virtude mais elevada e seu propósito final, é a
Em Mt 5:17, Jesus disse “Não penseis que vim revogar a lei ou os profetas; não vim
para revogar, vim para cumprir”. É interessante observar que o termo לקיםcumprir é o
(1) Cumprir no sentido de dar sentido. No primeiro nível, o Midrash descobre, na Escritura,
qual deve ser nossa a fé (teologia) em vista da nossa ação (prática). É o chamado
“cumprimento exegético”.
(2) Cumprir no sentido de agir. No segundo nível, o Midrash apresenta alguém que age
(3) Cumprir no sentido de realização das promessas. Cabe agora a YHWH cumprir as
contexto, Cipriani conclui o seu artigo com a seguinte citação de A. A. Pérez (1985)18:
“Por tudo isso, não nos deve surpreender que estejamos assistindo a uma
lendária, algum fruto da capacidade imaginativa, definitivamente não histórico, mas como a
relação à pedagogia judaica, cabe agora delinear mais objetivamente as filosofias e idéias
pedagógicas cristãs. Quanto à sua importância e relevância para a atualidade, Moacir Gadotti
destaca em relação às idéias pedagógicas: “A história das idéias é descontínua. Não existe
educacionais antigas deixem de ser válidas e sejam superadas pelas modernas. As idéias dos
18
PÉREZ, A. A. El método midrásico y la exégesis del Nuevo Testamento. Valencia: Institución S. Jerônimo
para la Investigación Bíblica, 1985. pp. 31-79.
pedagogia judaica. Com a finalidade de tecer um diálogo com a educação cristã, escolhi a
figura de Maimônides19, o rabi Moisés, filho de Maimon, talmudista, codificador das leis
identificados pelo rabino Samy Pinto (2003), por sua vez inspirados na obra intitulada
descrito no evangelho de Lucas (2:52) como uma pessoa que se desenvolveu no aspecto
mental, físico e social. “E crescia Jesus em sabedoria, estatura e graça, diante de Deus e dos
é bastante reprimida e até considerada algo pecaminoso, sob a influência do dualismo grego.
19
Cf. capítulo um, supra.
20
Cf. ARANHA, M. L. A. Filosofia da Educação. São Paulo: Moderna. 1996.
sua alma ao pensamento, tendo em vista uma única finalidade - a percepção de Deus, seja Ele
exaltado, quero dizer, conhecê-lo na medida em que isto se encontre dentro das possibilidades
do homem”. (Pinto, 2003, p. 58) Segundo os ditos de Jesus, conhecer a verdade implica em
primeiro que originou a existência de tudo” (Pinto, 2003, p. 58). Na visão antropológica de
processo educativo que tem por finalidade a imitação do próprio Cristo, imitação que leva o
educando a se aproximar da perfeição divina (Giles, 1983, p. 69). No entanto essa perspectiva
é demais ocidentalizada porque tem o seu foco predominante na sua individualidade e não
Este homem de fé tem como objetivo principal de sua vida, cumprir o duplo
considerado o resumo da lei ou, como diz Paulo, “o amor representa o cumprimento da lei”,
(Rm 13:8-10). Aprender a amar como ensina Jesus, é tornar-se verdadeiramente educado. No
entanto, o amar a Deus e o amar ao próximo são coisas distintas, pois o amar ao próximo não
substitui o amar a Deus. Mas entre eles, há uma relação de centro-periferia. De prioridade e
No entanto, não se diz exatamente o que é preciso fazer (no sentido concreto) para
que resume a norma de conduta para todas as situações. A chave do entendimento deve estar
nos ensinos de Hilel e de Jesus. Um está em forma de preceito negativo e o outro em preceito
positivo.
O que não queres que os outros façam a ti não faças aos outros. (Hilel,
30 a.C. a 20 d.C. extraído do livro: Pirke Avot – Ética dos Pais)21
Tudo quanto, pois, quereis que os homens vos façam, assim fazei-o vós
também a eles; porque esta é a lei e os profetas (Mt 7:12).
diz se que, se o homem colocar o princípio do conhecimento de Deus como sua meta principal,
não perderá tempo com coisas supérfluas. (Pinto, 2003, p. 60) Para Jesus, o homem tem
necessidade de poucos bens para ser feliz e encontrar um significado na vida (Mayer, 1973, p.
172).
a) O educador
político com o que se faz (Pinto, 2003, p. 60). Assim sendo, a escolha do educador deve ser
algumas das características mais importantes da sua personalidade (Pinto, 2003, p. 61).
A boa relação pessoal com quem aprende é fundamental para a pessoa do educador.
Jesus é o exemplo de como relacionar-se com o Deus Pai. A comunicação entre eles era de tal
nível que as suas palavras não eram propriamente suas mas tinham origem divina: “As
palavras que eu digo não as digo por mim mesmo; mas o Pai, que permanece em mim, faz as
b) O educando
judaica. Segundo Maimônides: “A Torá deve ser ensinada a um aluno digno, cuja conduta
seja agradável no meio social …” (MT IV:1; Pinto, 2003, p. 64). Caso a conduta do aluno não
convenha, este é retirado para fim disciplinar e depois reconduzido a receber instrução.
orienta a seu discípulo Timóteo: “E o que de minha parte ouviste através de muitas
testemunhas, isso mesmo transmite a homens fiéis e idôneos para instruir a outros.” (2 Tm
2:2) Em Jesus, a escolha dos doze discípulos, que são também designados apóstolos,
E os professores devem ter paciência e persistência para esclarecer a dúvida dos alunos.
professor seja percebido, o aluno deverá lhe dizer com todo o respeito: “nosso mestre, tu nos
aprendem uns com os outros. (Pinto, 2003, p. 64) Esta é a marca da pedagogia judaica de
humildade, na qual o professor aprende com seu colega, o aluno com seu colega, e ainda o
apenas razão. Para definir os objetivos educacionais deve se privilegiar a dimensão moral
homem (Cf. p. ex. o Prólogo da parte II da Suma Teológica), doutrina sobre o que o homem é
e está chamado a ser. E ainda, para Aquino a moral é entendida como um "processo de
sobre o nível mais fundamental, o do ser-homem: "Quando porém se trata da moral, a ação
humana é vista como afetando, não um aspecto particular, mas a totalidade do ser do homem;
ela diz respeito ao que se é enquanto homem" (op. cit. I-II,21,2 ad 2).
Quando Jesus disse: “Portanto, sede vós perfeitos como perfeito é o vosso Pai
celeste.” (Mt 5:48) estava se referindo a nossa meta educacional enquanto ser humano na sua
Rafel há uma diferença entre educar a pessoa para os valores morais e transmitir à pessoa os
potencialmente alcançar a perfeição moral. No entanto, não ocorre do mesmo modo no campo
intelectual, no qual cada um atinge o que está ao seu alcance (Rafel, 1998, p. 38 apud Pinto,
p.66).
conhecimento e inteligência de Moisés, mas ainda assim, “...todo ser humano pode se tornar
virtuoso como Moisés nosso mestre ou mal como Jeroboão (...)” (MT cap. V, apud Pinto, p.
66). Maimônides quer nos ensinar que toda ação pedagógica pode conduzir o aluno a
tornar-se um Moisés sob os aspectos morais e éticos, apesar de, nunca sob aspectos
cognitivos.
recusa, livre e conscientemente. O homem não nasce moral, mas torna-se moral (Pinto, 2003,
p. 67). Na pedagogia judaica a conduta certa é o meio-termo e a marca das boas ações é o
socialização (Pinto, 2003. p. 68) Segundo os secularistas, a moral tem sua origem em usos e
costumes de uma comunidade. No pensamento judaico, o regulador da lei moral não deve ser
religiosas e morais, para que quando adultas, já tenham dentro de si todos os mandamentos e
Testamento, o indivíduo humano é visto como uma unidade. No Novo Testamento aparece a
terminologia “corpo / alma”, mas ela não pode ser associada à idéia de existência encarnada e
vez que somos seres unitários, nossa condição espiritual não pode ser tratada
231-232).
A afirmação de Jesus em Mt 10:28 “Não temais os que matam o corpo e não podem matar a
alma; temei, antes, aquele que pode fazer perecer no inferno, tanto a alma como o corpo”, o
conceito de corpo e alma não está distinto de maneira clara. No entanto, no evangelho de
Marcos, a cura física e a salvação (da alma) pertencem ao mesmo campo semântico da
palavra soteria. Para Jesus, o indivíduo humano é um ser unitário. Portanto, as faculdades do
ser humano ligadas à educação seriam não somente parte da alma, mas também parte do
corpo. Nesse sentido, o corpo juntamente com a alma são entendidos como espaço da
deve envolver tanto a alma como o corpo, objetivando essencialmente a formação de pessoas,
capacidade de conhecer e entender a existência de Deus. Foi então, relacionada uma série de
mandamentos que leva à prática, de acordo com a tradição da Halachá. Para Maimônides, os
modelos máximos alcançáveis são Moisés e Jeroboão. Porém, ressalva que cada professor é
modelo de seu aluno. Ainda dentro da educação moral, existe o modelo inatingível, colocado
Jesus quer formar um ser humano irrepreensível, íntegro, capaz de amar a Deus
sobre todas as coisas e amar ao seu semelhante. Ele adotava um método simples, as matérias
não apresentavam uma organização nos moldes do paradigma científico da idade média como
seja, um habitus de vida e estudo, concebida como conhecimento de Deus, construída por
meio das disciplinas da oração, estudo e participação litúrgica (Zabatiero, 2005a, p. 20). Eram
teologias habituais provenientes das interpretações de Moisés (Torá), dos profetas (Neviím) e
dos Salmos (Ketuvim) (Lc 24.44). Os ensinamentos foram inspirados pelos fenômenos da
vida diária, da sociedade do seu tempo e eram contados pelas inúmeras parábolas.
Utilizava-se de objetos ou coisas que estavam em sua volta (ex. as aves do céu e os lírios do
campo). Usou de metáforas (objetos simbólicos como pão e vinho) e de situações reais. O seu
ambiente didático acontecia nas casas, nos espaços públicos, nos trajetos e nos circuitos da
vida cotidiana. A educação se realizava nos eventos concretos da vida e não numa teoria
especulativa.
métodos, oferecendo elementos e bases para a avaliação bem como se os mesmos são
Segundo Luckesi (1994, p. 152) existem três tipos de métodos: (1) Método
expositivo, mais comum na educação tradicional, a idéia de expor os assuntos para que os
alunos possam assimilar o conteúdo da matéria. (2) Método reprodutivo, aprender exercitando
passar por todos esses métodos para que o nosso aprendizado na vida e no ministério cristão
da idéia de imitação. A criança se educa à medida que imita a forma de vida dos adultos
(Pinto, 2003, p. 72). Jesus disse: “Aprendei de mim”. E posteriormente Paulo escreve: “sede
imitadores meus, e observai os que andam segundo o modelo que tendes em nós” (Fp 3:17).
seguir um modelo.
Segundo Maimônides, um homem deve ensinar a seus discípulos sempre com frases
curtas. Ou seja, deve falar poucas palavras a fins de manter a objetividade e a clareza no seu
ensino. Jesus era capaz de exprimir em poucas palavras aquilo que os filósofos diriam em
muitas palavras. Quanto mais exemplos de vida o educador puder oferecer ao seu aluno,
menos palavras serão necessárias ao aprendizado. Essa, parece ser a estratégia pedagógica de
Jesus.
(caminho). Jesus disse: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai senão por
mim” (Jo 14.6). No entanto, o caminho não é o fim, mas sim o meio. O método seria o
refere a Deus. O caminho tem ainda um conceito relativo. O meio não é o fim. O nosso papel
O que nos interessa aqui é a dimensão do caminho como método. O caminho para
João, tem a idéia de “conduzir para” a verdade e sobretudo à vida. Dos três termos com os
quais se identifica Jesus, o único conceito absoluto é a vida. A meta do caminho é chegar à
vida, o que também deveria ser o objetivo final da educação. Na perspectiva bíblica, isto
significa que nós alcançaremos a vida não pelos nossos métodos humanos, mas quando nós
4. Conclusão
dialogando e confrontando com uma parte da lei oral principalmente no que concerne ao
denominada de Mishná).
da época. Método este que tornou-se conhecido no círculo judaico pelo nome de Midrash
(buscar).
corporeidade.
CAPÍTULO III
A EDUCAÇÃO CRISTÃ E O PENSAMENTO DA CONTEMPORANEIDADE
A questão do Personalismo
A questão da Intuição
A questão da Universalidade
A questão da Corporeidade
“posição do sujeito”. Nesse contexto, o homem e a mulher pós-modernos, que sentem suas
próprias identidades ameaçadas, parecem não sentir afeição ou simpatia por indivíduos que
de Moisés. Para Jesus, a autoridade da Escritura era óbvia assim como era para os rabinos.
Jesus não atacou a lei. A sua atividade consistia em explicar a Escritura ensinando a
de Jesus.
último concebe a idéia de obediência do modo mais radical possível, não a eliminando.
humano. (...) significa que o ser humano se encontra inteiro diante da decisão; como não há
neutralidade, ele tem de decidir-se entre as duas únicas possibilidades que são oferecidas ao
quem age. Nesse sentido podemos dizer que a pedagogia de Jesus ensina as pessoas a se
colocarem na situação de decisão, mais precisamente da decisão entre o bem e o mal, como a
decisão em favor da vontade de Deus ou em favor da sua própria vontade (Bultmann, 2005).
decisão é essencialmente novo. Nesta perspectiva, para Jesus, o ser humano é visualizado no
momento absoluto da decisão porque para ele, os conceitos “bem” e “mal” são orientados
cognitivo dos dogmas e das culturas cristãs mas também de conduzir o indivíduo na direção
no processo da ação. O educando começa a refletir mais antes de agir. No entanto, a prática
educativa pode também conduzir o indivíduo até que adquira a dimensão da espontaneidade,
consciência adquirida” (Junges, 2001, p. 73). Assim sendo, quem decide obedecer a Jesus
conscientemente, aos poucos vai adquirindo o hábito de se tornar discípulo dele, e com o
passar do tempo, a práxis cristã começa a brotar espontaneamente. Não é isto que a faz
intuitiva.
caracteriza-se por caminhar passo a passo detendo-se nos detalhes, e o segundo sendo algo
que não progride a não ser por passos cuidadosos e bem definidos. A intuição é algo que se
se expor o assunto pelos métodos tradicionais e formais de dedução e prova, pode ser de
situação, sem dependência explícita do aparato analítico. Parece que os indivíduos que
possuem extensa familiaridade com certo assunto chegam, com mais freqüência,
intuitivamente, a uma decisão ou à solução do problema (Bruner, 1975, p.57). Quanto mais a
pessoa estiver concentrada num determinado assunto, pode vir a descobrir o meio mais
acertado para a sua resolução. Nossa suspeita é que parece ter muito a ver com a apropriação
do conhecimento pelo indivíduo acerca da estrutura básica de determinado assunto, pois quem
está a pensar sabe quais as coisas que se relacionam estruturalmente com as outras coisas.
da coragem do aluno.
Ainda que o método intuitivo leve muitas vezes à respostas erradas, este é o método
educando (no caso da criança) da maneira mais simples e sem complicações. No prólogo da
por um lado, internamente, o indivíduo por si só, adquire o conhecimento por meio de um
processo imediato (Bruner). Por outro, externamente, o educador deve se dedicar no sentido
mente ativa do educando. A mente se apropria da realidade de uma forma criativa e a recria
ou reconstrói de acordo com a base existente da pessoa e de suas estruturas cognitivas (ou
mentais, as quais para Piaget têm base biológica evolutiva de desenvolvimento. Por isso, em
pessoas de mesma faixa etária, independente do contexto cultural, juntas formam o que ele
por se tratar de uma proposta metodológica aberta a diferentes aportes, pode proporcionar a
ditando a regra da política sócio-econômica às nações mais pobres é uma das formas de
expressão da metanarrativa. É o que acontece também nos outros campos dos conhecimentos
educação moderna que era a hegemonia, universalização de uma visão de mundo. Hoje, o
tornou-se tão totalitária e monopolizante, essa autonomia pretende manter o equilíbrio entre a
Doug Kellner (1988) citado por Giroux (p. 53-54) argumenta o favor da distinção
Isso nos leva a crer que precisamos mudar o nosso paradigma. Até então,
ensinávamos como se existisse uma metanarrativa que seria uma verdade que continha as
pequenas causas, com metas pessoais de curto prazo. Assim, dedica-se a afirmação como
indivíduo, face à globalização. De que maneira o educador cristão lida com esses indivíduos?
que conseguem adentrar no mundo e nos assuntos do educando. Entretanto, como educador
não se deve esquecer o seu papel concernente à sua dimensão pública da educação,
solidariedade e interesse, tanto no nível pessoal como no social, seguindo assim os passos de
estabelecendo a autonomia do ser humano, autonomia esta possível pelo emprego da razão.
A educação na contemporaneidade pretende resgatar a unidade entre história e sujeito que foi
É o sujeito da modernidade tardia e o sujeito que sofreu sua desagregação e também o seu
deslocamento. O sujeito não é o centro da ação social. Ele não pensa, fala e produz: ele é
A distinção radical entre fatos e valores e entre sujeito e objeto que eram
fundamentais para o paradigma iluminista começou a ruir. A partir daí, a humanidade tem
outro, porque não adotar uma “estrutura fiduciária” que é expressada na palavra de
Agostinho: nisi credideritis, non intellligitis (se não creres, não entenderás) ou melhor, “creio
para entender”, pois o cristão continua a ater-se a crenças não-provadas, no entanto, ele tem
esta relação de confiança no que foi revelado e reconhecendo a incerteza de suas próprias
relacionados com a razão. O primeiro domínio é a própria construção da razão, pois para a
esforço que o sujeito faz para pensar seu próprio pensar ou agir. Podemos até dizer que o
desenvolvimento da razão encontra-se no próprio sujeito. Isto não significa dizer que o sujeito
é independente do meio social em que vive. No entanto, sem dúvida, a autonomia é marcada
convicções que este tem. É a autonomia em relação ao seu ponto de vista crítico apesar da
opinião da sociedade ou pressão da tradição. O indivíduo, tal como concebido por Piaget, é
capaz, graças à razão por ele mesmo construída de se opor à autoridade, seja ela dos pais, das
Assim, a autonomia do sujeito proposto por Piaget é muito mais do que um método
pedagógico, é uma atitude ética e política. Esta é uma das dimensões que a educação cristã
precisa resgatar nos seus currículos e desenvolver nos educandos para que a igreja evangélica
brasileira seja mais militante em propagar seus ideais do reinado de Deus na sociedade.
1999, 319).
“Quem pensa certo está cansado de saber que as palavras a que falta a corporeidade
do exemplo pouco ou quase nada valem. Pensar certo é fazer certo.” Assim escreveu Paulo
buscar uma nova compreensão para o corpo. As ações de Jesus quando curou uma doença ou
complementar de critérios educacionais, mas seu foco irradiante primeiro e principal. (itálico
é do autor, Assmann, 1993, p. 77). No entanto, o mesmo autor escreve: na era da imagem,
imagens corporais seqüestraram a substância dos corpos reais (Assmann, 1993, p. 75).
constituem a instância básica de critérios para qualquer discurso pertinente sobre o sujeito e a
consciência histórica. Nessa mesma linha, Streck (2005, p. 133) afirma que “o corpo é
construído através da interação com o mundo em que a pessoa vive”. Estamos numa época em
educacional.
instância fundamental e básica para articular conceitos centrais para uma teoria pedagógica.
agir. Em qualquer das três alternativas parece que tem dificuldade com o corpo que pensa,
que sente e que age (Streck, 2005, p. 130). A tradição tomista, que marcou grande parte da
As linguagens que predominam nas nossas igrejas são as linguagens descritivas que
formulam os conceitos e os dogmas. Por vezes nós somos influenciados e manipulados pela
linguagem motivacional. Sentimos a necessidade de educar e sermos educados por outro tipo
de linguagem (como a linguagem afetiva) que é capaz de contar as histórias que dão sentido à
das possibilidades. Rubem Alves conta histórias para grandes e pequenos. Sua pedagogia está
humana. Ela nasce da ausência, da saudade, enfim, daquilo que falta ao corpo. “Fala o corpo
porque falta algo ao corpo”. Ela é o meio através do qual o corpo é construído e pelo qual o
corpo se estende, se completa. Educar é ensinar e aprender uma determinada linguagem, uma
uma determinada visão mentalista, que é tão comum nas pedagogias tradicionais e modernas
aprendizagem.
antropologia, que busca compreender e trabalhar a pessoa não apenas a partir da mente, mas
de uma compreensão do todo. Neste sentido, a pedagogia não pode perder de vista esta
superior ao corpo; até a educação física trata, nesta ótica, o corpo como uma máquina que
deve ser exercitada (Maria, 2002, p.52). Nesse aspecto, a categoria corporeidade articula a
bem, enquanto a cosmovisão hebraica assume o corpo como o modo de existência no mundo.
Nesse sentido, a vida é a realização da própria pessoa que caminha neste mundo.
sempre são insuficientes para expressar a complexidade humana. Para se compreender de fato
a mensagem do outro, mais importante que atentar às palavras é compreender as ações. Nesse
sentido, Jesus não apenas agiu, mas ensinou que a vontade do Pai era a de que todos agissem
como ele. Assim sendo, a pedagogia de Jesus se processa nesta seqüência circular de (1)
palavra proferida, (2) demonstração pela sua ação e pelo relacionamento pessoal e (3) ensino
reprodutivo do seu agir pedagógico. Portanto, Jesus não somente fala mas age; não se
restringe a sua atividade única e individual, porém ensina para reproduzir outras pessoas que
ressurreição, (o ritmo do tempo: forte – fraco – forte) todos estão diretamente relacionados
com o seu corpo. Na encarnação, Jesus toma o corpo e a sua existência e suas ações ganham
visibilidade. Na sua morte, o seu corpo foi ocultado, Jesus se tornou ausente. Na ressurreição,
voltou a aparecer, agora, com o seu corpo glorificado, através da qual a sua igreja é
inaugurada. Jesus foi assunto ao céu, para uma dimensão invisível aos olhos humanos. No
entanto, deixou sua igreja, posteriormente chamado também por Paulo, de Corpo de Cristo.
Por meio desse ajuntamento de cristãos, a mensagem e a obra de Deus tem tomado sua
corporeidade e visibilidade. Mas até que ponto no que se refere à profundidade e reflexão? A
nossa sugestão é que a educação cristã em diálogo com os estudos sobre os elementos da
práxis consciente.
2. Conclusão
tarefa, sugerimos a continuidade através das pesquisas futuras. Enquanto isso, limitamo-nos a
de propor uma reflexão e revisão sobre a prática pedagógica das nossas igrejas.
historicidade. Diante dessa crise, a educação cristã tem a missão de buscar o paradigma da
exercício da fé cidadã (Castro, 2000, p. 124). Este é o maior desafio da pedagogia cristã:
Pastoral da Cidadania22, a qual consiste no pastorado dentro e fora do âmbito de uma igreja,
22 Pastoral da Cidadania é o termo utilizado por Clovis Pinto de Castro (2000). Em meus estudos sobre esse
tema tenho privilegiado textos desse autor. A expressão pastoral não é tão popular no segmento das igrejas
evangélicas. O seu uso é mais comum nos setores progressistas e ecumênicos das igrejas cristãs, especialmente
entre aquelas que optaram por fazer teologia na perspectiva da libertação. Talvez o termo que mais se aproxima
do sentido da palavra pastoral para a maioria dos evangélicos seja Ministério.
comunitários. Ao contrário da maioria das igrejas cristãs, que têm uma forte tendência à
sujeito cidadão para que possa atuar diretamente em várias questões da pluralidade e zelar
CAPÍTULO IV
IDENTIDADE CRISTÃ E IDENTIDADE NIKKEI: A QUESTÃO DA IDENTIDADE
CULTURAL
dentro de si uma bagagem cultural que é a sua identidade pessoal. A educação cristã busca a
relação entre a identidade cristã com a identidade do indivíduo? De que maneira esta nova
identidade social vai articular com a identidade pessoal? Sobre esta questão e outros assuntos
Segundo Gadotti (2004, p. 310), o grande tema da teoria da educação nos dias de
pedagógico.
O teólogo Jürgen Moltmann já em 1974 percebe que (...) quanto mais a teologia e a
Igreja procuram tornar-se relevantes para os problemas atuais, tanto mais são lançadas na
crise de sua própria identidade. Quanto mais elas buscam sustentar sua identidade nos dogmas
tradicionais, nas morais corretas, tanto mais irrelevantes e desacreditadas elas se tornam
(Moltmann, apud Zabatiero, 2005b). Assim sendo, a fé tradicional protestante está deixando
final do século XX, as paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça e
sólidas localizações para os indivíduos sociais. Nossas identidades pessoais estão mudando
para sujeitos não integrados. O fenômeno pode ser descrito como perda de um “sentido de si”
deslocamento – descentração dos indivíduos tanto de seu lugar no mundo social e cultural
quanto de si mesmo – constitui uma “crise de identidade” para o indivíduo (Hall, 2005, p. 9).
identidade venha ocorrendo a partir da queda da humanidade, na pessoa de Adão. Desde então,
todos nós nos empenhamos nesta busca pelo que sentimos, por este algo que está faltando:
esta é a identidade.
pela diferença, esta por sua vez é sustentada pela exclusão do outro. A construção da
identidade é tanto simbólica quanto social (p. 10). No caso de grupos étnicos, as diferenças de
(identidade) são vistas como mais importantes que as outras (p.11). A redescoberta do
Assim, (...) a identidade marca o encontro do nosso passado com as relações sociais,
culturais e econômicas nas quais vivemos agora (...) a identidade é a intersecção de nossas
atualmente e parecem ser vistas por sociólogos e teóricos como características das sociedades
quais, por sua vez, produzem identidades novas e globalizadas (Woodward in Silva, 2000, p.
20).
algum lugar no passado e no presente. Muitas vezes trata-se de uma “identidade imaginária”
As identidades são fabricadas por meio das marcas da diferença. (...) A identidade,
2000, p. 40). De acordo com Silva (2000, p. 76), a identidade e a diferença têm que ser
transcendental, mas do mundo cultural e social. Na linguagem do Paulo Freire, elas não
pertencem ao campo da natureza mas sim da cultura, são fabricadas no contexto de relações
culturais e sociais (1979, p. 116). Cabe também notar que na perspectiva bíblica, a identidade
cultural “existente” da maneira como está representada não pode ser considerada como dom
uma sociedade permeada pela diferença, forçosamente interagem com o outro no próprio
e da diferença.
da diferença parecem girar em torno de como resolver a tensão social entre os diferentes que
bons sentimentos e a boa vontade para com a chamada “diversidade” cultural, ou, tratando
Respeitar a diferença não pode significar “deixar que o outro seja como
eu sou” ou “ deixar que o outro seja diferente de mim tal como eu sou
diferente (do outro)”, mas deixar que o outro seja como eu não sou,
deixar que ele seja esse outro que não pode ser eu, que eu não posso ser,
que não pode ser um (outro) eu; significa deixar que o outro seja diferente,
deixar ser uma diferença que não seja, em absoluto, diferença entre duas
identidades, mas diferença da identidade, deixar ser uma outridade que
não é outra “relativamente a mim” ou “relativamente ao mesmo”, mas que
é absolutamente diferente, sem relação alguma com a identidade ou com a
mesmidade (Pardo apud Silva, 2000, p.101).
em direção da formação da identidade. A lei mosaica serviu como sistema classificatório para
separar o povo de Israel das demais nações. O código da lei ditava as normas de procedimento
em todas as dimensões da vida. Os preceitos negativos e positivos, de “não pode fazer e pode
rituais proibiam certos costumes rituais e cúlticos da religião cananita para que não houvesse
povo, constituindo uma diferença em relação aos demais povos ao redor. Dessa forma, para o
santificação tem seu significado original de “separação”, dedicar uma parte do todo para uma
função específica. Portanto, para ser completo, a santificação encerra em si a idéia de destino
das coisas separadas. Por exemplo: quando tomamos um alimento e uma parte é queimada no
fogo e outra parte é usada como refeição. Assim também, quando houve a separação dos
levitas das demais tribos para o serviço no tabernáculo. Em outras palavras, algo neutro é
separado para uma determinada finalidade: uma parte é destinada ao sacrifício e outra parte
É diferente da idéia de purificação. Para trazer uma oferta, o indivíduo tem que estar
num estado de purificação, no sentido de não estar sujo, não estar contaminado. Portanto, a
purificação é uma atitude passiva enquanto que a santificação é uma atitude ativa.
organizavam a vida diária dos israelitas. Essas leis mantinham no povo a consciência do santo.
A polaridade entre a vida e a morte coincide com a polaridade entre o puro e o impuro. A
morte era, acima de tudo, uma contaminação. A morte é o oposto da santidade. O santo, desse
o que não se pode comer a partir do critério de animais puros e animais impuros. Aquilo que
comemos pode dizer muito sobre quem somos e sobre a cultura na qual vivemos.
classificação com o objetivo de criação da ordem. Este é um dos conceitos muito fortes
É nesse sentido que a identidade cristã deve ser desenvolvida, isto é, a partir da
Israel. O que observamos é que a maior parte do ensino bíblico nos círculos pentecostais
brasileiros é feita com base nas narrativas dos livros do Tanach 23 , a saber do Antigo
do século XVI pois a reforma protestante buscou sua identidade própria resgatando a tradição
bíblica. A tradição bíblica, por sua vez, é proveniente da cosmovisão hebraica (AT) e o
hebraísmo helenizado (NT). No entanto, do nosso ponto de vista, o resgate da tradição bíblica
foi incompleto porque o movimento da reforma fez uma leitura ocidental da tradição bíblica.
E na busca da sua identidade teve uma preocupação maior em definir as diferenças em relação
a Igreja Católica romana e o Judaísmo. O que chama a nossa atenção é o formato da Escritura
que foi passado (não propriamente o seu conteúdo). Se realmente a preocupação era a de
resgatar a tradição bíblica, deveria ter sido adotada a estrutura da Bíblia Hebraica e não a da
O cânon hebraico que é a forma original da Escritura, tem sua designação tripartida,
Torá (Pentateuco):
Neviím (Profetas):
Ketuvim (Escrituras):
Dn (Apocalíptico)
No cânon cristão, há uma divisão mais claramente delineada em três partes, que
corresponde à distinção dos tempos: passado (obras históricas), presente (Salmos, Provérbios)
grega) e depois por meio da Vulgata (versão latina) e mais tarde, o movimento da reforma
Cânon Cristão
Gn, Ex, Lv, Nm, Dt, Js, Jz, Rt, Sm, Rs, Cr, Ed, Ne, Et (Livros Históricos) - PASSADO
Is, Jr, Lm, Ez, Dn, Os, Jl, Am, Ob, Jn, Mq, Na, Hc, Sf, Ag, Zc, Ml (Livros Proféticos) -
FUTURO
Os ocidentais representam o tempo em uma linha reta que segue para a frente e para
trás. Consideramos à nossa frente, a existência do Futuro e atrás de nós, o Passado. O Presente
é onde nos encontramos. Entre o Presente e o Futuro está o Futuro do Pretérito. Atrás de nós
está o Perfeito, e mais atrás está o Imperfeito, e além deste está o Pretérito-Mais-que-Perfeito
(Boman, 1958, p. 199)24. Isso implica que nós os protestantes, temos a tendência de classificar
esses livros ainda contenham as promessas do futuro para Israel. Os livros dos Profetas
posteriores são vistos como abordando assuntos do futuro escatológico, no entanto, de acordo
com o propósito original desses escritos não se restringem apenas a esse tema escatológico.
Por sua vez, a representação do tempo dos semitas está ligada intimamente ao seu
conteúdo. Portanto, sem o conteúdo do tempo, nunca poderá existir o referido tempo. O
24 tradução pessoal
dentro do ritmo. E esse ritmo é de contraste. “Há tempo de nascer e tempo de morrer (...)” (Ec
3.2-8). Os dois extremos abrangem a etapa intermediária (Boman, 1958, p. 226)25. O aspecto
do tempo é abordado na língua semítica a partir da perspectiva de que uma ação foi completa
hebreus com a sua religião da história e os gregos com a sua ciência da história, ambos
contribuíram para a humanidade (Boman, 1958, p. 6)27. O cristianismo histórico tem sido um
Deus que invadiu o presente (passado para nós) da história e o preencheu de um novo sentido
configura, nem a partir do passado, nem a partir do presente – mas do futuro que se fez
história em Jesus. Não se configura nem a partir do tendo-sido, nem do sendo, mas do
identidade então não se resgata (fixação do passado), nem se perde (temor do presente), mas
25 tradução pessoal
26 tradução pessoal
27 tradução pessoal
se constrói. Sustentando nesse sentido que a identidade nunca é fixa, mas é fluida. A
relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que
Este consiste em substituir a nossa velha identidade cultural (construída a partir de uma
já vivesse no tempo do cumprimento escatológico. Isto exige que vivamos pela fé porque
civilização.
identidade, devemos ter em mente esses três conceitos, ressonantes daquilo que constitui uma
cultura nacional como uma “comunidade imaginada”: as memórias do passado; o desejo por
viver em conjunto; a perpetuação da herança (Hall, 2005, p. 58) Pois, as nações modernas são,
todas culturalmente híbridas. Também a raça é uma categoria discursiva e não uma categoria
biológica. Ultimamente as teorias da raça vem sendo substituídas por definições culturais
Nesse sentido, estamos confirmando a tese de que, o que define ser nikkei28 não é
28 Definição da identidade nikkei extraído do site do Projeto Internacional de Pesquisa sobre os Nikkeis: São
(...) pessoas de origem japonesa e seus descendentes, que tenham imigrado para outros países e criado
comunidades e estilos de vida com características únicas dentro do contexto das sociedades em que vivem. São
considerados nikkeis aqueles que voltaram ao Japão, onde passaram a constituir identidades distintas da
população japonesa.
Pode se concluir que a questão da identidade cultural é decisiva para delimitar tanto
locais ou a produção de novas identidades (Hall, 2005 p. 84). A primeira pode ser vista na
reação defensiva daquelas pessoas que se sentem ameaçadas pela presença de outras culturas:
identidades defendendo o interesse dos seus grupos étnicos, políticos, preferências sexuais e
outros.
quando se tenta recuperar a pureza anterior e recobrir as unidades e certezas que são sentidas
como tendo sido perdidas. “Tradução” é a aceitação de que as identidades estão sujeitas ao
anteriormente, embora existam estas duas tendências, consideramos mais razoável pensar em
Como define Hall (2005, p. 89): as culturas híbridas constituem um dos diversos
dessa linha, podemos entender que os apegos irracionais ao local e ao particular, à tradição e
substituídos por identidades mais racionais e universalistas (Hall, 2005, p. 97). A educação
contemporaneidade.
Quanto ao hibridismo também não está isenta de críticas. De acordo com Silva
(2000, p. 87) o hibridismo (...) tem sido analisado, sobretudo, em relação com o processo de
divididas, segregadas. (...) As identidades que se formam por meio do hibridismo não são
mais integralmente nenhuma das identidades originais, embora guarde traços delas.
destruição. Na história bíblica podemos citar o caso dos Samaritanos, que são resultados de
uma miscigenação entre os israelitas e outros povos que foram deslocados à Palestina em
época. Assim sendo, a maioria dos casos, a hibridização é forçada e são originadas de relações
conflituosas entre diferentes grupos étnicos. Por exemplo, cada povo do continente europeu é
ocorridos no passado.
Citamos anteriormente que a idéia do reinado de Deus tem uma relação intrínseca
com o processo de formação da identidade do povo de Deus. Nos evangelhos, Jesus inicia o
nossa identidade cristã deve ser construída a partir do futuro. O reinado de Deus é a dimensão
humanidade pecadora. Nesse sentido, o reinado é um dom divino oferecido aos seres
humanos. No entanto, apesar de ser um dom gratuito, existe espaço para a participação
reinado de Deus. Deus nos convida a fazermos parte deste reino. Nós o acolhemos com
gratidão, em conseqüência, o reino é expandido por meio do agir do seu povo, junto com o
Nós cristãos, buscamos a ética de Jesus tendo o reinado de Deus como horizonte da nossa
compreensão. A ética de Jesus deveria ser nosso princípio de ação no viver cristão, e na
prática da justiça.
normas e leis aplicáveis num determinado contexto cultural. O problema surge exatamente
nesta transição da forma ética para a moral, conforme aponta o teólogo católico José Roque
Junges:
Nesse sentido, seria interessante distinguir entre a ética e a moral. A ética explicita
área da religiosidade, além da tendência muito grande de cair no legalismo intolerante cuja
essência é a auto-satisfação. Nesse aspecto, as religiões e seitas que dão ênfase na questão
moral estão oferecendo os produtos (as normas de cumprimento) que atendem a satisfação
dos seus adeptos. Pois nesse caso, o seu desempenho com relação ao cumprimento das
dimensão da ética e não da moral. A ética de Jesus não consiste num “pacote” de normas, mas
seu seguimento numa vida de discipulado. A ética de Jesus se manifesta na ação e na práxis.
definindo o contorno da identidade cristã e então o seu agir começa a se configurar como uma
agir cristão. Sem esse referencial ético corre-se o perigo de absolutizar determinada moral,
identificada com certa cultura ou de esvaziar a fé cristã da sua radicalidade ética (Junges, p.
236). Não seria isso que ocorre em nossas igrejas, inclusive mais explicitamente nas igrejas
étnicas?
Jesus não é aquele que apresenta normas morais, mas sim, aquele que propõe os
princípios e valores do reino de Deus para que os educandos pensem e apliquem o que foi
aprendido nos seus respectivos contextos. Esta é a maneira de Jesus ensinar. Esta é a sua
pedagogia.
presença da teologia narrativa. Citamos anteriormente que o currículo tem relação direta com
a formação da identidade. Nesse sentido, a formação da comunidade tem muito a ver com as
narrativas que são formuladas dentro daquele povo que compartilha os mesmos destinos e
identidade.
Segundo Bryant L. Myers (2002, p. 21), a importância de uma narrativa (um relato)
está no fato de que através desta, uma comunidade possa refletir sobre sua identidade e
propósito, achar espaço no mundo e no universo, encontrar o sentido da vida, saber o que se
compreensão do mundo em que vivemos. Em seguida, Myers faz uma confrontação entre o
Libertação e demais elementos que vão convergindo até o centro do relato que é Jesus Cristo,
continuando com os relatos dos temas da igreja, Espírito Santo e a própria Bíblia. No final,
Myers nos convida a refletir sobre cada uma das etapas do processo de conscientização acima
instância engloba toda a história humana, e dentro desta, inclui o relato do povo no qual está
inserido também o nosso relato. Quando não temos a visão do todo, estamos desarraigados da
confrontada com a totalidade da narrativa bíblica pois se trata do relato que dá sentido e
direção a todos os demais relatos tanto o das comunidades quanto os nossos próprios. Desse
modo, o relato de Deus como narrador, é a fonte da nossa motivação, nossa visão e nossos
(2002, p.32) faz a seguinte afirmação: “Bastou um dia para tirar a Israel de Egito, mas foram
Talvez esta seja uma pergunta que tem surgido no pensamento de líderes eclesiais enquanto
cultural tem sido um desafio constante no contexto atual da comunidade eclesial e nos ressalta
narração transcendente que dê resposta às perguntas de sentido e nos provê de uma direção
Como ser humano que somos é provável que tenhamos uma necessidade muito
Segundo Myers (2002, p. 21), deve haver a etapa seguinte: a convergência de relatos, ou seja
compartilhar juntamente um novo relato durante algum tempo. Identificamos que esta etapa
teoria da educação pós-moderna proposto pelo educador Paulo Ghiraldelli Junior. (2002 p.
59), na qual as novas alternativas de ação cultural, social e política são criadas com a marca
do contexto onde se encontra inserido, mas sim uma proposta carregada de propósito e
sentido que pode ser uma solução “encarnada” do próprio contexto local. É desse tipo de
mantém uma maneira muito prática e interessante de “viver” a Bíblia. A objetividade (a busca
De acordo com Bernardo de Campos citado por Bonino (2002, p. 71-72), o crente
pentecostal quando lê (...) “sente-se parte do texto, ‘renarra’ a Bíblia, sente uma
congenialidade com o texto” que lhe permite atualizá-lo, revivê-lo em sua situação,
No parágrafo que aborda a leitura bíblica como “insumo” básico da reflexão dos
pentecostais (Bonino, 2002, p.72), o autor alista três dimensões fundamentais da experiência
da Bíblia: a Bíblia como relato, a Bíblia como instrumento e a Bíblia como linguagem
expressiva das vivências da fé. É motivo para nos admirarmos como os pentecostais há muitas
décadas atrás já tenham conseguido desenvolver o seu próprio método pedagógico tão
A partir do que analisamos, podemos deduzir que, para que seja formada a
identidade é preciso contar-se a história. No contexto eclesial, podemos propor esta idéia no
sentido de situar a história de uma pessoa ou de uma coletividade dentro da história bíblica.
como essa pode ser uma via para reconstituir sua identidade muitas vezes renegada e perdida,
pelo fato de, no processo da imigração sujeitarem-se a uma vida muito restritiva, sobretudo
pela proibição do uso da língua japonesa durante a 2ª Guerra Mundial ao mesmo tempo
sofrendo discriminação por serem súditos dos países do eixo. Esses nos parecem terem sido
os motivos que ocasionaram uma ruptura e a fragmentação da sua história como um grupo
étnico cultural. Os vários depoimentos pessoais nos levam a deduzir que isso pode ser uma
das razões que fizeram a comunidade nikkei perder o orgulho de ser herdeiro da identidade
japonesa.
2. Conclusão
a identidade da comunidade.
narrativa bíblica do povo de Israel. Porém, ao mesmo tempo, a identidade cristã pertence
mas ao mesmo tempo vem marcar a sua presença intervindo no tempo presente. Portanto,
entanto, o caráter absoluto da ética cristã não pode ser perdida, ficando restrita a leis e normas
no contexto de uma determinada cultura, mas sim mantendo seu discernimento crítico entre a
tradição e a tradução da identidade, formando sempre uma identidade cristã totalmente nova
identidade cristã, neste contexto, significa a criação de uma nova identidade cujo resultado
não deve ser a tradição da identidade japonesa, nem a tradução da brasileira e tampouco da
nikkei, porém uma identidade jamais conhecida ou experimentada anteriormente. Isso porque
esta nova identidade pertence à dimensão escatológica bíblica que expressa os valores do
reinado de Deus. Somente a partir deste futuro é que se torna possível a construção de uma
CAPÍTULO V
DESAFIO EDUCACIONAL PARA A IGREJA METODISTA LIVRE –
CONCÍLIO NIKKEI
1. Contexto histórico
imigrantes a bordo do navio Kasato-maru chegaram ao porto de Santos. A partir dali vieram
um total de 234 mil imigrantes. Atualmente, estima-se que existam, com seus descendentes,
japonesa ao Brasil pode ser dividida em três grandes períodos, a saber: (1) de 1908 a 1923, (2)
japoneses veio para trabalhar nas fazendas que cultivavam o café, no entanto pensando em
retornar para o seu país de origem, com a idéia de “voltar rico para a terra natal” dentro do
menor prazo possível. No entanto, com o passar do tempo, os imigrantes japoneses passaram
a assimilar aos poucos a sua realidade, adaptando-se ao ambiente no qual estavam inseridos.
Assim sendo, ao invés de enviar dinheiro para o Japão, começaram a investir em seus
(...) o período entre 1908 até a Segunda Guerra Mundial tem um peso
cultural e histórica tão diferente, poderiam vir a fazer parte do tecido so-
cial sem entrar em conflito com a sociedade que os recebia. (..) Ela se
econômico da agricultura.
japoneses não contratados pelas fazendas de café, mas de imigrantes espontâneos. São as
famílias que vieram trabalhar nas terras adquiridas pelas agências do governo japonês para
Também este período coincide com a fase de transição para a produção de algodão
por lavradores japoneses no Estado de São Paulo. Segundo Sakurai (...) pois o ano de 1932 é
produção (1999, p. 235). Foi em 1936 que as Companhias de colonização como a K.K.K.K.
Também, no mesmo ano, foi fundada a Brazcot, Sociedade Algodoeira Brasil-Japão Ltda.,
exportados para o Japão e o restante vendido para as fiações nacionais). Desse modo, criando
uma cadeia de forma a dar aos imigrantes condições de se desenvolver em direção a uma
O segundo período, entre 1924 e 1941, foi quando houve o maior número de
entrada com 137.572 (67.1%) imigrantes japoneses no Brasil. Foi neste período que ocorreu a
imigração tutelada. Assim denominada porque é amparada, desde o início, por meio de
29 Em 1917, as companhias de emigração japonesas que antes tinham atuado separadamente são todas fundidas
na Companhia Ultramarina de Empreendimentos, a Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha (K.K.K.K.).
30 A BRATAC (Sociedade Colonizadora do Brasil Ltda.) foi fundada em 1928 com capital japonês. A colônia
empreendimento da imigração foi garantida por iniciativa do governo japonês, como parte da
Houve inúmeras restrições durante a guerra, dentre elas, a proibição da compra e venda de
impacto profundo sobre o processo de ascensão social e econômica dos imigrantes japoneses.
Desmoronou-se quase tudo o que os japoneses haviam construído até aquele momento. A
social dos japoneses em São Paulo, agora não mais restrita à agricultura.
2. Contexto educacional
Desde o século XIX, período conhecido como Era Meiji, o Império japonês investia
na educação orientada por uma política nacional-militarista para criar uma identidade
japonês, preparando o espírito do povo para as necessidades da guerra. Em grande parte, isso
história mítica do Japão e propalava a sua imbatividade (Yamato Damashii) em mais de 2600
anos. Estas são reinterpretações dos valores éticos tradicionais e religiosos do Xintoísmo
partir da década de 30.33 Desse modo, a instrução escolar tinha um papel fundamental para a
desenvolvendo a idéia de que era necessário se empenhar ao máximo, pois, o importante era
ser o melhor de todos. Com essa mentalidade implantado em cada súdito, o país se
discricionário chamado Estado Novo (1937-1945). Foi em seu governo que se criou a polícia
32 “o sistema educacional do Japão, implantado na Era Meiji (1868-1912), enfatizava o caráter único da história
do Japão, com uma única dinastia – de origem divina – reinando desde o começo de sua existência. As correntes
ultranacionalistas, militaristas e expansionistas reforçaram essa ideologia, sustentando que o Japão era um país
invencível por causa das características singulares de sua história. E que tinha a missão de construir a Esfera de
Co-prosperidade da Ásia Oriental e até do ‘Mundo sob um teto’” COMISSÃO DE ELABORAÇÃO DA
HISTÓRIA DOS 80 ANOS DA IMIGRAÇÃO JAPONESA NO BRASIL, Op.cit., p. 375
33 O início dos anos 30 no Japão marcou uma radical mudança de rumos na politica japonesa que se orientou, a
partir de então para uma escalada militar no continente asiático. Dentro e fora do exército japonês pregavam uma
“mobilização espiritual de todo o japonês cuja doutrina era baseada no: Kodô (caminho imperial), Yamato
Damashii (espírito imbatível) e Hakkô-ichiu (todo o mundo sob um só teto).
política responsável por vigiar, perseguir e punir todos os que fossem considerados “inimigos
1942, o Brasil declarou o rompimento de suas relações diplomáticas com o Japão. Com a
O governo do Estado de São Paulo baixou uma lei estadual em abril de 1933,
crianças de menos de dez anos de idade; 2) o professor de língua estrangeira deveria ser
livros didáticos prejudiciais à formação do espírito nacional brasileiro. Essas medidas são
todas as escolas de língua estrangeira (na maioria japonesas, alemãs e italianas) são fechadas
Assim, a partir de 1938, foram promulgadas as Leis Nacionais35, dentre elas, como o
decreto-lei que autorizava vigiar os estrangeiros por onde transitavam; determinavam onde
apreendidas publicações: livros, jornais, cartazes, panfletos, cartas e tudo o que estava escrito
34 Logo depois, em março de 1942, o governo brasileiro determinou o confisco de bens dos “súditos do Eixo”.
35 Entre elas, o decreto-lei nº 9.893-B de 31 de dezembro de 1938, mudou o nome de DEOPS (Delegacia de
Ordem Política e Social) para DOPS (Delegacia de Ordem Política e Social), ficando extinto o respectivo cargo
de Delegado Especializado.
em idioma japonês. A polícia política estava autorizada a fazer incursões e apreender tudo, em
todos os lugares que fossem considerados suspeitos. Era proibido falar em público outro
idioma que não fosse a língua portuguesa. Os japoneses eram vigiados com maior rigor que os
demais súditos do Eixo (alemães e italianos), porque propagava-se que, o japonês, além de ser
fanático, era traiçoeiro e inassimilável, querendo dominar o Brasil, iniciando sua conquista
pelo Estado de São Paulo com o objetivo de construir aqui o “Império do Sol Poente” (Dezem,
2000, p.39). Provavelmente nessa época pairava a atmosfera de medo de um domínio sobre o
Brasil, sejam pelos comunistas, sejam pelos anarquistas, ou ainda quaisquer outros grupos.
No caso do povo japonês constituía-se a ameaça do Perigo Amarelo, pois, acreditavam que o
império japonês tinha planos de dominar o mundo e o Brasil era o ponto estratégico para se
dominar a América.
para a colônia japonesa até hoje. Assim sendo, o fechamento de associações e escolas
descendentes japoneses para o Japão à procura de melhor condição de vida, tem ocasionado
uma mudança sobre a questão da etnicidade e identidade dos imigrantes e seus descendentes.
Os dekassegui, no entanto, trazem à luz uma questão fundamental para aqueles cujo
tendência de criarem fronteiras para com os não-membros, ao mesmo tempo que criam a sua
Segundo Sakurai (1998, p. 94), aquilo que marca a etnicidade dos japoneses no
Com referencia a esta questão, Brito desenvolve em seu trabalho, no artigo “De
Campo Grande” (1998, p. 51-68) como ocorreu a construção da etnicidade dos nikkeis em
cinco momentos da história. Dessa forma, os dois pólos: nós (japoneses) e eles (brasileiros),
foram mudando de uma relação de diferença para uma relação de semelhança, passando por
Podemos dizer que nem todos passam por esses cinco momentos. Alguns podem
A Igreja Metodista Livre no Brasil foi fundada pelo rev. Daniel Masayoshi
36
Nishizumi, missionário que veio do Japão em 1928 e iniciou uma escola dominical na
descendentes. Sua fundação foi oficializado no dia 1| de novembro de 1936, com o culto
implantação das escolas dominicais iniciando na região de Mairiporã (Juqueri) e Vila Mariana
(Rua Luís Góes e Rua Onze de Junho), que se tornaram pontos de apoio para a evangelização
na cidade de São Paulo. A seguir foi fundada uma escola dominical na Rua São Joaquim n|
trabalho voltado para os brasileiros. Em 1946, logo após o falecimento do pastor Nishizumi,
Assim sendo, o trabalho dos nikkeis foi denominado de Seção Japonesa de São
36Fundação de outras igrejas étnicas japonesas no Brasil daquela época: Anglicana (1923), Igreja Evangélica
Holiness (1925), Exército de Salvação- Corpo Nikkei (1929).
Paulo, posteriormente chamado de Concílio Nikkei. Desde então, foram realizados trabalhos
evangelísticos na grande São Paulo e no interior do Estado de São Paulo e Paraná. Foram
fundadas as igrejas nos seguintes locais: São Paulo (1936), Itapevi (1938), Embura (1939),
Campos do Jordão (1947), Marília (1949), Barretos (1949), Lins (1950), Apucarana (1955),
Indaiatuba (1957), São Paulo-Norte (1962), Pinheiros (1963), São José dos Campos (1963),
São Paulo-Leste (1963), Diadema (1964), Londrina (1968), Campinas (1970), Liberdade
(1979), Mogi das Cruzes (1986), Sorocaba (1991), Jordanópolis (1990) e Jardim Planalto
(1997).
acelerado (1948-1959) em que a igreja cresceu de 136 para 1091 membros em onze anos,
obtendo o índice de crescimento médio de 20 % ao ano. Posteriormente este índice foi caindo
Mizuki (1978, p. 82) aponta vários fatores para este crescimento vertiginoso nesse
período: (1) Ajuda financeira da Junta de Missões Americana para os pastores japoneses. (2)
Avivamento espiritual que teve início em 1947. (3) O uso da língua japonesa na Escola
37
Dominical . (4) O fenômeno de urbanização e industrialização do país. (5) O envolvimento
pela Igreja Metodista Livre de não comentar sobre “a vitória ou a derrota do Japão”. Em
1945, a segunda guerra mundial teve seu fim com a rendição incondicional do Japão ou seja,
37 Fator esse, que mais tarde torna-se prejudicial para o crescimento da igreja na fase em que as crianças e
jovens foram sendo assimilados pela cultura brasileira.
Isso fez com que se espalhasse o boato de que o Japão não teria sido derrotado. Este
assunto sobre a vitória ou a derrota do Japão dividiu a sociedade japonesa em duas facções.38
era a comunicação do evangelho tanto para o katigumi (vitoristas) quanto para o makegumi
(derrotistas). Numa tentativa de ser amigável para ambos, supondo que, se fossem salvos, o
que é essencial, eles viriam a conhecer a verdade, mais cedo ou mais tarde. Essa postura
ajudou a Igreja Metodista Livre a alcançar as pessoas de ambas as facções (Mizuki, 1978, p.
87).
No entanto, essa postura foi, em certo sentido, uma atitude ingênua, pois não
estavam considerando que a conversão é um processo contínuo, que se estende pela vida toda
(Loffler apud Bosch, 2002, p. 494), pois, a redenção jamais é salvação para fora deste mundo
(salus e mundo) mas sempre salvação deste mundo (salus mundi) (Aagaard apud Bosch, 2002,
p. 477). É provável que na Igreja Metodista Livre, a ênfase estava na decisão pessoal por
Cristo, na conversão dos pecados pessoais, ao invés da concordância intelectual com certos
38 A única distinção que surgiu no seio da jovem colônia, apos o fim da 2ª Guerra e a derrota do Japão, foi a de
dois grupos: os chamados “vitoristas” (katigumi ou kioko) que, devido à falta de fontes de informação e pelo fato
de a maioria viver quase que isolada no interior do Estado de São Paulo, acreditavam na vitória do Japão na
Guerra, e os “esclarecidos” ou “derrotistas” (makegumi ou háissen), grupo formado pelos que tinham acesso aos
meios de comunicação em língua portuguesa, possibilitando assim a formação de uma consciência da verdade e
que, por esses motivos propagavam que o Japão havia perdido a Guerra. A maioria dos imigrantes,
aproximadamente 70%, acreditava que o Japão não havia perdido a guerra (Dezem, 2000, p. 50).
exacerbado que não aceitava a verdade da derrota na guerra. À semelhança dos protestantes
uma melhora moral (Bosch, 2002, p. 384). Assim sendo, esperavam que uma vez que as
Porém, ao médio e longo prazo, essa postura apolítica da igreja ao contrário do que se
esperava, não produziu bons resultados. Isso porque “passar por cima” desse assunto sem ter
uma posição definida, portanto sem refletir pastoralmente, fez com que mais tarde o fato
resultado disso foi o decréscimo do número de membros ocorrido nas décadas seguintes
menciona que na época, como advogado, participava ativamente das reuniões do “movimento
de conscientização” na colônia japonesa. Nessa ocasião, ele foi evangelizado pelo pastor
Nishizumi que também participava nessas reuniões (Takiya, 1976, p.96). Apesar dessa
postura do fundador Nishizumi, a igreja Metodista Livre como um todo, não seguiu este
pessoas.
Quanto à escola dominical, Takiya (1976, p.57) relata que o fato da missão da
Igreja Metodista Livre ter sido iniciada com a evangelização de crianças, caracterizou a
singularidade deste rebanho. O ensino religioso das crianças na escola dominical não era
apenas um atrativo para as mães (ou pais), mas sim considerar os pequeninos como símbolos
dominical eram realizadas com tal convicção que a maioria das igrejas repetiram e têm
que pode ter sido conseqüência do declínio da freqüência da escola dominical. O que teria
acontecido? De acordo com Mizuki (1978, p. 89), uma das respostas pode ser o prolongado
uso da língua japonesa. A língua japonesa foi o fator de atração no período pós-guerra. Porém,
no decorrer do tempo, a língua japonesa foi se tornando cada vez mais difícil para as crianças.
Na medida em que houve a ascensão social das famílias japonesas, podemos presumir que os
próprios pais das crianças não mais se interessavam pela língua japonesa.
39
segunda geração iniciaram o culto próprio (em português) à parte da igreja.
ala em português. O conflito entre as gerações deve ter sido causada não apenas pela barreira
39 A formação da ala em português geralmente ocorria com a designação de mais um pastor que recebia uma
responsabilidade pastoral daquele grupo (em português), este fato ocorreu nas seguintes datas: Igreja da Saúde
(1982), Igreja de Campinas (1983), Igreja São Paulo-Norte (1984), Igreja de Pinheiros (1985), Igreja da
Liberdade (1986).
da língua, mas também pelo conflito de duas cosmovisões distintas: de um lado oriental e do
outro ocidental. De um lado a identidade forte dos imigrantes e de outra a identidade dos
descendentes que se encontrava em crise. Esse conflito de civilização que havia entre eles
igreja.40 É provável a ocorrência deste fato ocorreu mais intensamente no Concílio Nikkei do
que nas outras denominações devido ao número reduzido de nisseis (segunda geração) que
permaneceram nas igrejas. A segunda geração (os nisseis) é que poderia ter exercido o papel
suspeita com relação às pessoas que apresentavam diferentes modos de expressão da fé. Um
teoricamente distintas pelo uso de línguas: a ala em japonês e a ala em português. A ala em
40 Em 1985 com a Convenção Panamericana Nikkei, em São Paulo, passou-se a adotar o termo nikkei para todos
os descendentes de japoneses nas Américas. Parece que o fato da criação desta convenção já demonstrava a
existência da forte crise de identidade entre os nikkeis.
japonês, composta de pessoas de fala japonesa está diminuindo a cada dia porque os
imigrantes estão se tornando cada vez mais idosos. Restam pequenos grupos constituídos de
“Passar o bastão” seria a expressão chave que ilustra bem essa relação entre as duas
alas de uma igreja. A função da ala japonesa é passar a herança espiritual às mãos da
liderança da nova geração. Porém, não basta apenas passar a tradição da igreja para que a ala
em português somente se reproduza o que foi feito até agora pela primeira geração. É
necessário resgatar aquilo que se perdeu no decorrer do tempo. Percebe se que, à medida que
houve a diminuição das primeiras gerações de japoneses na igreja por falecimentos e outros
colônia japonesa local. É essa perda da “dimensão pública” da igreja que precisa ser
resgatada.
etnicidade e identidade dos descendentes japoneses. Não basta repetir o que no passado foi
um sucesso, mas devemos sim, resgatar e atualizar a nossa expressão de fé para que a nossa
41
religiosas , enquanto educadores, no qual conseguiram juntos encontrar o que há de comum
41 Por tradições religiosas aqui se compreende a sistematização do fenômeno religioso a partir das suas raízes
numa proposta educacional, que têm como objeto o transcendente. A proposta original dos
Ainda que haja uma diferença quanto a sua natureza e conteúdo entre o ensino
religioso nas escolas públicas e a educação cristã nas instituições eclesiásticas, achamos
interessante aproveitar os insights dos PCN para a reflexão da nossa proposta pedagógica.
O ser humano constitui-se num ser de relação. Assim sendo, ele desenvolve os
Outro fato que devemos considerar é que, todo ser humano faz perguntas, e cada
pergunta requer uma resposta. Em algumas pessoas, a concepção de mundo se apresenta com
muita rigidez e inflexibilidade, noutras, mais aberta e sem critérios de julgamento. Uns têm
orientais, ocidentais e africanas, que exige para seu ministério (ou mister) um profissional de educação sensível à
pluralidade, consciente da complexidade sócio-cultural da questão religiosa e que garanta a liberdade do
educando sem proselitismo. ver PCN, Apresentação, Op. cit. p. 5.
dessas respostas organiza-se num sistema de pensamento próprio, obedecendo uma estrutura
comum. E é dessa estrutura comum que são tirados os critérios para a organização e seleção
A seguir os PCN delineiam cada um dos itens do conteúdo. No entanto, como não é
nosso objetivo aprofundar nestes detalhes, cabe aqui traçar, em linhas gerais, a sua proposta.
das ciências que se ocupam do mesmo objeto. O bloco “Escrituras Sagradas e /ou Tradições
Orais” estuda os textos que transmitem, conforme a fé dos seguidores, uma mensagem do
apresentam na forma escrita e outros somente na forma de tradição oral, exigindo assim, as
bloco “Ritos” consiste em conhecer uma série de práticas celebrativas das tradições religiosas
42 O texto dos PCN prossegue: “Assim, na pluralidade da Escola brasileira, esses critérios para os blocos de
conteúdos são: Culturas e Religiões, Escrituras Sagradas, Teologias, Ritos e Ethos.”
Esses conteúdos têm como objetivo, conhecer outras tradições religiosas para
superar os preconceitos, pois estes têm sido um dos grandes desafios da Educação. O que
importa aqui é conhecer e valorizar a trajetória particular dos grupos que compõem a
Desse modo, o educando vai construindo, por exemplo, o significado dos símbolos religiosos
seu significado nas várias tradições religiosas (PCN, 1997, p. 40). Dessa forma, objetiva
Portanto, a questão da avaliação no Ensino Religioso não deve ser de natureza definitiva, mas
sim processual.
do primeiro ciclo é que o educando exercite o silêncio interior como forma de ir aprendendo a
ouvir, respeitar, valorizar e comungar com o outro (...) assim, o desafia para os pontos de
43 itálico é nosso.
pessoas ou grupos, evitando juízos, atitudes e preconceitos pelo diálogo (PCN, 1997, p. 50)
44
.
religiosas que sustentam o sentido do idealismo generoso dos educandos pela vida e também
pluralismo sócio-político cultural (...) bem como, a prática de valores na superação de limites
do eu pessoal, abrindo para a alteridade e para a responsabilidade na vida social (PCN, 1997,
p. 55)45.
É nesse quarto ciclo que se explicita a busca pelo sentido da vida além-morte.
Conhecendo as possíveis respostas dadas perante o fato morte, orientadoras das verdades da
transcendente, consigo mesmo, com o outro e com o mundo (PCN, 1997, p. 53).
vida são: a ressurreição, a reencarnação, o ancestral e o nada. Não é nosso objetivo nem dos
PCN rotular qual tradição religiosa adota cada uma das respostas acima citadas. Porém, a
44 idem.
45 itálico é nosso.
6. Proposta pedagógica
do Ensino Religioso, detemo-nos agora em formular a nossa proposta pedagógica. Para isso,
destacamos alguns pontos dos PCN que sejam de relevância para a nossa análise. São as
Ambiente de Pluralidade
Historicamente, o que ocorre, muitas vezes, é que a igreja cristã não tolera outros
exigiria também para nós mesmos, uma perspectiva crítica para com a nossa própria posição
doutrinária.
O que, muitas vezes, nós pensamos é que as nossas igrejas não estão ainda em um
nível de maturidade suficiente para o diálogo inter-religioso. Porém percebemos que não
alcançaremos tal nível de maturidade se evitarmos esse diálogo e confrontação com outras
tradições religiosas.
A mentalidade conservadora das Igrejas Metodistas Livres nos leva a pensar que
precisamos proteger os nossos membros das influências de outras tradições religiosas. Essa
conseguem dialogar com eficiência com as pessoas de fora do próprio círculo religioso e por
isso não são capazes de comunicar e alcançar as pessoas com o evangelho contextualizado.
com as pessoas ou grupos que pertencem a outros tipos de respostas norteadoras acima, a
além-morte pode se tornar um diálogo ponte, pois o assunto da morte é uma questão
pastoral deve começar com o educar para a morte. Preparando cada pessoa para o último
trabalho da sua vida, a morte. Desse modo a orientação dos PCN está dentro das perspectivas
educacionais eclesiásticas.
em consideração as linhas básicas dos PCN. Por exemplo, na escola dominical, não se estuda
com as doutrinas das outras tradições como a reencarnação, o ancestral e o nada, desse modo,
aplicar este padrão de pensamento estendendo aos demais assuntos do nosso programa
De acordo com os PCN, cada tradição religiosa possui uma das respostas possíveis
como norteadoras do sentido da vida além-morte, por sua vez cada uma dessas respostas
organiza-se num sistema de pensamento próprio, obedecendo uma estrutura comum. A partir
dessa estrutura comum são retirados os critérios para a organização e a seleção dos conteúdos
e objetivos do Ensino Religioso (PCN, 1997, p. 32). Assim, no ambiente de pluralidade social,
seguindo a orientação dos PCN, os critérios para os blocos de conteúdos podem sugerir: (1)
Culturas e Tradições Religiosas, (2) Escrituras Sagradas e / ou Tradições Orais, (3) Teologias,
programáticos da escola dominical da Igreja Metodista Livre – Concílio Nikkei. Pelo menos,
quanto à escola dominical, até agora não se verificou se existe algum programa
denominacional. Há indicação de que cada igreja tem elaborado seu programa distinto e
Baseado nestes quatro blocos acima, podemos propor que a nossa educação cristã
contemporâneo que resulte da interação entre uma das disciplinas de ciências sociais e de
religião / teologia; (2) Exegese Bíblica: promover uma leitura bíblica aplicando alguns
das Religiões: informar sobre outras tradições religiosas observando os pontos comuns e
estudo de casos para analisar as questões de relacionamento com o outro, dos valores culturais
Os PCN sugerem um total de quatro ciclos para o ensino religioso. Cada ciclo
proposta educacional, tomaremos como exemplo, uma das modalidades esportivas, o futebol
de salão (futsal), para ilustrar nossa idéia pedagógica em termos mais práticos.
De acordo com Santana (2004, p. 6), a pedagogia do esporte tem duas fases
salão (futsal), a primeira fase trabalha com as crianças de 9 a 12 anos e a segunda fase acima
ensinar futsal a todos, ensinar bem futsal, ensinar mais que futsal e educar a criança para ter
prazer e gostar de esporte (Santana, 2004, p. 12-13). Nessa fase, ela deve se precaver do
criança está passando pela fase de socialização por meio da prática esportiva. E somente
depois que passar dessa fase em que estará completando mais de 12 anos de idade, é que
iniciação que o futsal não basta praticarmos, mas é preciso saber pensar direito. É preciso
incentivar a reflexão sobre a prática, o que no campo da teologia designamos com o termo
“práxis”. Por exemplo, o professor que leva a criança a refletir sobre a prática (ação) que fez
e que fará, contribui para que ela tenha êxito porque consciente disso, poderá ponderar a fazer
melhor. Desta forma, a estratégia de ensino que leve as crianças à reflexão pode ser aplicada
através de três momentos: perguntas, sugestões e explicações que implicam nos seguintes
precavendo-se de modo a evitar que caia numa busca de modelos, de se fazer isso e aquilo e
O que podemos aprender através dessas ilustrações é que há fases distintas para
muito provável que no período inicial da denominação, muitos membros metodistas livres,
pelo fato da morte precoce do pastor fundador Nishizumi, não tiveram uma fase de
preparação adequada na sua iniciação e sim uma especialização precoce (principalmente dos
seguirem seus exemplos. Dessa forma, incorreram no equívoco da busca de um modelo que
adequada e diferenciada para determinados ciclos é muito importante para que o educando
CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
assim sendo, no capítulo um tentamos reconstituir a prática pedagógica de Jesus, por meio de
textos selecionados nos evangelhos. Dentre outros elementos, destacamos que as palavras de
de vida e o discipulado. Sua lição sempre começa a partir do referencial ético (da ação) do
próprio educando.
Mencionamos que o método midráshico que foi adotado também por Jesus consiste na busca
da Corporeidade. Destacamos esta última onde se observou que Jesus não somente fala,
porém age, e não se restringe à sua atividade única e individual, mas ensina para reproduzir
pessoas que participem desse processo. Em outros termos, primeiro vem a palavra proferida,
em seguida a demonstração desta pela ação e através do relacionamento e por último, o ensino
mas sim fluida. A identidade cultural é uma criação social e cultural. Assim sendo, o que
imaginária”. A educação cristã objetiva a formação de uma identidade cristã. Ela é baseada,
No capítulo cinco, fizemos uma descrição sobre a história da Igreja Metodista Livre
da identidade de uma igreja nikkei junto com o pensamento pedagógico nele desenvolvido.
conteúdo. Descrevemos a contribuição dos PCN, tentando construir uma ponte de ligação
A proposta dos PCN ressalta a dimensão do diálogo com outras tradições religiosas.
Desta forma podemos deduzir que, ao adotarmos a linha dos Parâmetros Curriculares
nossa própria identidade. Isto porque, quando conhecemos outras tradições, provavelmente
provoca-se uma auto-conscientização, através da descoberta daquilo que não temos na nossa
tradição. Isso contribui para a construção da nossa própria identidade. Nesse mesmo
pensamento, o educador luterano Danilo Streck escreve, referindo-se a uma das questões do
importante do que ter uma identidade é estar disposto a construir uma identidade no diálogo
Dessa forma, o que define a nossa identidade não é aquilo que temos, mas sim,
exatamente aquilo que não temos e sentimos falta. Por exemplo, nós, descendentes de
japoneses (nikkeis), não somos brasileiros nem somos japoneses, ou seja, nem isso nem
aquilo, mas algo novo que surge desse processo de “reação química” ou síntese dialética entre
Considerações finais
(p. 18).
Educar de modo que o próprio Jesus seja o método (caminho) para nos
59).
70).
atuar diretamente em várias frentes do espaço público da nossa cidade (p. 72).
conforto próprio, mas aprender a conviver com outras culturas diferentes, sem
Recomendações
Para elaborar uma proposta pedagógica para a Igreja Metodista Livre – Concílio
Nikkei convém que haja uma vivência e envolvimento de todas as pessoas que participam do
ideologia da própria Igreja Metodista Livre como um todo. A proposta pedagógica deve
(Anexo) e o próprio ensino dos seus conteúdos às igrejas. A proposta pedagógica da igreja
poderá ser uma proposta política e posicionada, pois deve expressar o compromisso com a
formação de cristãos (membros) para a sociedade à qual são enviados como agentes do reino
46 A Declaração da Missão e Visão da Igreja Metodista Livre – Concílio Nikkei teve seu processo de
elaboração que se iniciado em 1992 e teve seu texto final em 1997. Em 1998 vem ocorrendo o processo de
implantação da missão e visão nas igrejas locais. O texto foi revisado e atualizado em 2003, sendo publicado no
Relatório ao XL Concílio Anual (19.11 a 21.11.2004). Somente em 2004 foi lançada a proposta de
funcionamento da estrutura da denominação, priorizando ações conjuntas das igrejas como dimensão prioritária.
Missão Integral pois visa a capacitação do povo de Deus para o serviço do reino de Deus
“Ação Cultural Para a Liberdade” (Scocuglia, 1997, p. 98). No entanto, durante a sua
ato pedagógico/educativo.
Paulo Freire, no ano da fundação do Partido dos Trabalhadores (1981) escreveu nos
seguintes termos: “é tão impossível negar a natureza política do processo educativo quanto
negar o caráter educativo do ato político” (Freire in Damasceno, 1988, p. 16). Em 1989, oito
anos depois, foi convidado a assumir o cargo de Secretário Municipal da Educação na gestão
da prefeita Luiza Erundina48. Infelizmente, Freire permaneceu no cargo somente por dois anos.
No entanto, foi o momento singular em que pode colocar em prática aquilo que o educador
Concílio Nikkei (expressa nas seis dimensões) seja de fato apropriada pelas igrejas, seria
47 Paulo Freire foi exilado pelo golpe militar de 1964. Para sair do seu país pediu asilo político para a Bolívia,
de onde foi para o Chile e atuou na reforma política, social e educacional daquela nação durante os anos de 64 a
69, depois passou quase um ano na Universidade de Harvard (1970) de onde foi para Genebra. Na década de 70
assessorou vários países da África, recém libertada da colonização européia, auxiliando-os na implantação de
seus sistemas de educação. Completou assim os 16 anos de exílio, retornando definitivamente ao Brasil em
1980.
48 Nas eleições municipais de 1988 o Partido dos Trabalhadores ganhou a maioria dos votos na cidade de São
Paulo. A nova Prefeita, Luiza Erundina de Sousa, nomeou Paulo Freire Secretário Municipal da Educação, em 1º
de janeiro de 1989. Paulo renunciou dois anos mais tarde, em 27 de maio de 1991, para reassumir atividades
acadêmicas, lecionar e escrever. (...) Diferentes ideologias no interior do PT dificultaram o trabalho de
relacionamento entre os setores públicos e os movimentos sociais. E a insolúvel relação entre uma superestrutura
cristalizada, a reforma educacional e a necessária “reinvenção do poder” foram os problemas com os quais
tinham de lidar. Outros educadores progressistas terão de continuar de onde Freire e sua equipe pararam em São
Paulo. (Gerhardt in Gadotti, 1996, p. 168). Op. cit.
Esperamos tê-lo alcançado dentro dos limites possíveis a um trabalho reflexivo e teórico.
pesquisa? Sobre a pedagogia freireana não pudemos aprofundar como havíamos planejado,
porém nos detivemos apenas em aproveitar alguns insights do autor para confirmar as nossas
Daniel S. Schipani (2002, p. 5), a pessoa do Paulo Freire é considerada um educador cristão
que contribuiu para o serviço da educação pública e do bem comum. No entanto, até que
ponto é possível articular da forma mais coerente possível a pedagogia freireana com as
Escrituras para a missão cristã? Não procuramos seguir exatamente por esse eixo.
podemos dizer que a interação de ambas poderá resultar numa proposta pedagógica para uma
49 conforme o pensamento da Missão Integral (Escobar e Padilla) o termo “contextualizada” aqui se entende
como busca do modelo da educação teológica e eclesial a partir da realidade ou do contexto onde estamos
inseridos e não de um modelo importado do primeiro mundo. (Escobar, 1996, p. 72)
ANEXO
MISSÃO
Missão Global
Como agentes do Reino, pela fé, cooperar com Deus na reconciliação de todas as coisas
em Cristo Jesus, a partir da realidade contextual, contando com a capacitação do Espírito
Santo, e com os recursos das Escrituras e na nossa herança histórica, até a volta de Cristo.
1. Celebração
Entendendo a adoração como estilo de vida, celebramos o encontro com o Deus Vivo, por
meio de Jesus Cristo. Este encontro produz como resposta o serviço e o evangelismo, a
gratidão, a consagração e a ética.
2. Comunidade
Nossa comunidade é acolhedora, formada por relações pessoais significativas. Contribuímos
para o desenvolvimento saudável de cada membro (emocional, físico e espiritual), em direção
3. Serviço à Sociedade
Somos uma igreja sensível e capacitada por Deus a responder com a relevância às
necessidades da sociedade na qual está inserida, a fim de promover a sua transformação, com
base nos valores do Reino de Deus.
4. Proclamação
Proclamamos o Evangelho de Cristo Jesus a todas as pessoas, tanto individual como
comunitariamente, visando a implantação de novas igrejas que sejam agentes do Reino de
Deus e expressem seus valores.
5. Capacitação
Buscamos formar uma mente cristã, apta a pensar e a agir sobre todas as áreas da vida a partir
dos princípios bíblicos, e equipar cada pessoa a exercer seu ministério, com base nos seus
dons e vocação.
6. Estrutura
Nossas estruturas são flexíveis e participativas, potencializando ao máximo todos os recursos
do corpo para facilitar o cumprimento da nossa Missão.
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