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Estudos Bíblicos:

Cristologia
Material Teórico
Cristologias do Futuro

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Me. Reuberson Rodrigues Ferreira

Revisão Textual:
Prof.ª Esp. Kelciane da Rocha Campos
Cristologias do Futuro

• Introdução;
• Falar de Cristo Hoje;
• A Questão do Pluralismo Religioso e a Cristologia;
• Cristologia e Libertação;
• Conclusão.

OBJETIVO DE APRENDIZADO
• Compreender que cristologia é uma reflexão aberta, que, embora partindo de
princípios definidos, pode ser interpretada à luz das realidades futuras.
Orientações de estudo
Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem
aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua
formação acadêmica e atuação profissional, siga
algumas recomendações básicas:
Conserve seu
material e local de
estudos sempre
organizados.
Aproveite as
Procure manter indicações
contato com seus de Material
colegas e tutores Complementar.
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para estudar.

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as redes sociais.

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trabalhos.

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Assim: e de se manter
Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte hidratado.
da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e
horário fixos como seu “momento do estudo”;

Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma


alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo;

No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos e
sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você tam-
bém encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão
sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados;

Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus-
são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o
contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e
de aprendizagem.
UNIDADE Cristologias do Futuro

Introdução
O amplo e dilatado percurso trilhado até esta posição em nosso estudo tem como
único objetivo enriquecer e dilatar os horizontes de nossa compreensão sobre a figura
de Jesus Cristo, mormente no estudo teológico sistemático sobre a sua figura.

Partindo da inicial daquele que a teologia e história reconhecem como Kyrios,


Senhor (cf. At 2:36), partindo da já refletida e teológica pergunta dos discípulos
(Mc 8, 27; Mt 16, 13; Lc 9,18), inserimo-nos no universo da reflexão teológica
sobre o Cristo. Iluminados por esse questionamento, o trabalho acadêmico que
empreendemos mostrou-nos os elementos metodológicos da reflexão sobre Jesus
Cristo, Cristologia, bem como apontou ciências correlatas a essa elucubração
teológica e caminhos possíveis do estudo cristológico no futuro.

Não menos salutar neste processo de descoberta, foi possível à luz dos textos sagrados
entender as cristologias – modo de compreender o Cristo – alojadas nas entrelinhas
dos evangelhos (sinóticos e João) e de outros escritos neotestamentários (Paulo).

Um passo mais adiante daquilo que fora refletido nos anos logo imediatos à
morte de Cristo, fomos imersos na sistematização dessa reflexão nos vários concílios
chamados ecumênicos, sete comuns a toda Igreja. Eles que foram assumidos por
muitas tradições cristãs, facultaram ao(à) atento(a) estudante perceber como verdades
sobre a figura de Jesus Cristo foram sendo sistematizas e abalizadas dentro de certos
padrões que correspondiam à fé professa e àquilo que os Evangelhos testemunhavam.

Séculos à frente, sobretudo contemplando a assim chamada modernidade, foi


possível vislumbrar o entendimento que os paladinos da Reforma - Lutero, Calvino
e Zuinglio - aventaram como constitutivos de uma cristologia para sua época. Eles
sob hipótese alguma negaram a tradição conciliar anterior, contudo reafirmaram
aspectos que para o sistema filo-teológico por eles encampado se coadunavam com
o conceito de Cristo. De outro lado, dentro da perspectiva cristã-católica, refletimos
sobre um evento que marcou a fisionomia dessa tradição religiosa. Ele não foi um
evento de definições teológicas. Inclusive, definia-se como eminentemente pastoral.
Contudo, ele não deixou de apresentar marcas de uma cristologia que privilegia a
noção de redentor e a historicidade de Cristo.

Empoderados desse vasto conhecimento apresentado ao longo das sessões


anteriores, este último capítulo de nosso trabalho tem o objetivo de oferecer ao(à)
estudante a possibilidade de pensar a cristologia como um horizonte que, mesmo tendo
conceitos seguramente estabelecidos, pode ser dilatado. A proposta é apresentar,
munidos de tudo que foi apreendido, nichos em que a reflexão cristológica pode
aportar novas formas de refletir o mistério do Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro
homem. Um modo de fazer pertinente e atual a reflexão cristológica. Como dito
alhures neste trabalho, nãos se trata de formular uma nova doutrina sobre Cristo,

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muito pelo contrário, trata-se de apresentá-la de uma maneira nova, sintetizada na
expressão: “Non novum, sed nove”1.

Desse modo, subscrevemos esta sessão em dois fragmentos. Num primeiro,


uma vez mais, refletiremos sobre a relação entre Cristo e a história. Num segundo,
apontaremos lugares onde a realidade exige um olhar à luz da fé cristológica.

Falar de Cristo Hoje


Para começar a falar sobre a questão de Cristo na atualidade, pode-se recorrer
ao impasse vivido na literatura, descrito por Goethe (1749– 1832) na tragédia
teutônica intitulada Fausto. O personagem central, cujo nome dá título à obra,
é um homem, embora muito descontente com isso, imensamente ilustrado.
Insatisfeito com a formação intelectual e com os saberes adquiridos, ele põe-se a
reclamar das ciências conquistadas outrora, mas que agora causam-lhe dissabores
(non sense), entre elas a teologia, ensinada nas universidades medievais, ao lado
de outras ciências liberais que formavam os doutores no medievo (Filosofia, Artes,
Direito e Medicina).

Sobre a teologia (pode-se parafrasear e dizer cristologia), afirma Mefistófeles,


travestido com o barrete e a capa do Doutor Fausto, ao jovem em busca de saber:
nela “[..] há mil caminhos falsos difíceis de evitar; há mil peçonhas tão ruins, que
extraí-las o remédio é [...] foro impossível [...]. Nessa ciência, o mais seguro é não
pensar por si, mas jurar pelo mestre” (GOETHE, 2012, p. 105). Como alternativa
à sua postura, o protagonista da tragédia alemã põe em xeque sua alma, numa
aposta com o demônio, Mefistófeles, em troca de um saber que faça sentido, na
verdade um amor – o que ele não alcança.

A despeito das interpretações literárias do texto, depreende-se desse ponto que


em Fausto, qualquer ciência deve, antes de tudo, dotar a realidade de sentido, de
razões para viver, em última instância de um amor, de uma paixão. Entendido,
aqui, como capacidade de apresentar razões à sua própria existência. Nesse
espírito, na busca por dar razões acadêmicas para que a cristologia seja uma ciência
pertinente, convém ao teólogo - aquele que estuda cristologia – apresentar razões
que imprimam um sempre novo sentido à teologia, capaz de falar a todas as épocas
aquilo que Jesus Cristo era e viveu.

Servindo-nos não mais da literatura, mas sim da teologia, para fazer de maneira
mais específica o mesmo questionamento, podemos recorrer à indagação feita pelo
italiano Bruno Forte, nas primeiras páginas de sua obra sobre cristologia, já aludida em
sessões anteriores, intitulada Jesus de Nazaré, história de Deus, Deus da história:
“Que sentido tem falar de Jesus Cristo hoje?” (FORTE, 1985, p. 9). Diluídos nessa
pergunta e a partir dela, encontram-se elementos para buscar refletir a cristologia
numa perspectiva capaz de ser plausível ao homem na sociedade contemporânea.

1 Não coisas novas, mas (apresentadas) de (modo) novo.

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Deve-se apresentar novos questionamentos de ordem contextual para enriquecer


a reflexão teológica como um todo e a cristologia em particular. Na linha de Bruno
Forte e de tantos outros teólogos contemporâneos, é a busca por uma teologia/
cristologia que consiga vislumbrar a sua realidade contextual, sua história imediata
com os olhos da fé em Cristo (cf. Machado, 2010, p. 15ss). Somente assim a
Cristologia, por consequência a teologia, se torna relevante para o mundo hodierno,
capaz de falar de maneira objetiva a ele.

De fato, qualquer assunto que pretenda influir e/ou ter relevância na história
concreta dos seus interlocutores, mesmo partindo de princípios concretos, deve ser
lido à luz de sua história contextual. Caso contrário, corre risco de ser dito, mas não
ter sentido. A natureza humana e a prática humana ensinam de forma clara essa
verdade. Algo comunicado, mas dito de maneira que não atinja o interlocutor, pode
até ser ouvido, mas sua mensagem nada vai influenciar na vida do destinatário, pois
não o atingiu, não teve significado para os ouvintes.

No mesmo espírito, reafirmando o que já foi dito, a cristologia, para que


verdadeiramente possa realizar seu objetivo, que é o anúncio da pessoa de Jesus
Cristo, deve ter em conta o contexto e os anseios profundos do seu interlocutor,
para assim conseguir atingir o ouvinte, possibilitando-lhe a experiência com Jesus
Cristo. Deve-se dizer que a mensagem sobre o Cristo não está atrelada a vicissitudes
interiores ou disposições pessoais, tampouco que adquira sentido apenas à luz da
compreensão do interlocutor. Antes quer-se dizer que ela, com sua força, expressa
numa linguagem objetiva pode se fazer ouvida com mais intrepidez.

Deve-se, por fim, associando-se à necessidade de uma reflexão cristológica que fale
ao homem de hoje, recordar que a fé em Cristo cobra necessariamente uma prática
cristã, denominada por alguns teóricos de cristopráxis (MOLTMAM, 2009, p. 77):
a profissão de fé em Jesus como Deus vivo e encarnado, bem como o seguimento
dele, inevitavelmente conduz a uma ação ao estilo do Senhor. Conhecer Jesus é
uma ação em sentido positivo pragmática, conjuga a pixtis (fé em grego) e a práxis
(ação em grego). Desse modo, conhecer e professar fé em Jesus Cristo, tal como
se apresenta nas escrituras, na tradição conciliar e dentro de diversa denominações,
implica naturalmente uma prática. Não se trata de uma reflexão que conduz a uma
prática, mas de uma síntese que implica que ao passo que conhecemos Jesus, seus
mistérios, sua história e estamos envolvidos na comunidade, praticamos aquilo que
Ele fez e viveu (cf. MANZATO, 1997, 14-15), assumindo seu lugar entre os pobres,
doentes, socialmente excluídos e oprimidos (cf. Mt 10, 7-8).
A insuficiência de uma pura teoria de Cristo surge da impropriedade do
conhecer a Cristo apenas teoricamente; por isso a teoria Cristológica
tem que apontar para além de si mesma e, de modo paradoxo, deixar
para trás de si própria e apontar para o cumprimento da vontade de
Deus na qual o “conhecer Jesus” como senhor alcança sua totalidade.
(MOLTMAM,2009, p.80)

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Ante essa abertura e concretude da cristologia, podem-se apontar inúmeras
searas que mereceriam, à luz da fé em Jesus Cristo, uma reflexão sistemática e,
portanto, cristológica da realidade. Seria uma cristologia que implicasse Libertação,
outro aspecto, no ambiente plurirreligioso, qual a reflexão possível sobre Jesus
Cristo e a salvação por ele apresentada com as outras religiões. Seria uma cristologia
que considerasse o pluralismo religioso.

Esses dois caminhos são ambientes relativamente novos, que precisam ser
aprofundados para que o mistério redentor apresentado por Jesus Cristo, como
projeto do Pai, possa ainda hoje ressoar de maneira mais límpida no ouvido de
homens e mulheres que seguem um certo galileu, o messias da fé, o Kyrios-
senhor. Não obstante sejam propostos esses dois temas como lugares de reflexão
que colaboram com uma cristologia do futuro, deve-se dizer que eles serão
apenas panoramicamente apresentados nesta sessão e posteriormente mais bem
aprofundados numa das últimas unidades deste livro.

A Questão do Pluralismo
Religioso e a Cristologia
Na imensa seara de uma cristologia contextual e incidente na história concreta
da humanidade, um tema que salta aos olhos é a reflexão sobre o Cristo e o
pluralismo religioso. O background dessa questão decorria da noção de que sendo
Cristo o salvador universal da humanidade, em que espectro residiria a salvação
daqueles que não creem em Jesus como filho de Deus e seu Salvador? Não se
trata, deve-se afirmar, de uma questão inédita no universo cristológico. Do ponto
de vista do marco formal da teologia tradicional cristã, ela já se apresenta e tem um
espectro determinado em várias latitudes.

Numa perspectiva histórica, em se tratando de pluralismo religioso, mormente no


universo dominante da teologia católica, atestava-se a exclusividade da salvação nos
umbrais da Igreja. Essa ideia era sintetizada na expressão latina “Extra Ecclesiam
nulla salus”, Fora da Igreja não há salvação. Uma perspectiva que poderia ser
definida como exclusivismo. O exclusivismo cristológico postula Jesus Cristo como
o único meio pelo qual é possível obter a salvação. O exclusivismo eclesial parte do
princípio de que a religião cristã se expressa numa Igreja que se entende como a
única Igreja verdadeira. Esse modelo exclusivista afirma que a salvação só pode ser
alcançada através da profissão de fé em Jesus Cristo.

No decorrer dos anos e abertura na reflexão teológica, sobretudo no século XX,


postulou da reflexão cristólogica uma postura que, embora ainda ressentida de um certo
exclusivismo, tergiversava na sua postura unilateral outrora definida de exclusividade
salvífica e abria precedentes para uma salvação inclusivista. Ela, sumariamente,
assegura que, mesmo em outras religiões (ou em nenhuma religião), Deus serve-se

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UNIDADE Cristologias do Futuro

delas para salvar a todos. Nesse modo de pensar, são mantidas as teses fundamentais
do cristianismo, especialmente o caráter único da mediação de Jesus. A intuição bíblica
é reafirmada: “não há sob o céu outro nome dado aos homens pelo qual devamos
ser salvos” (At 4,12). Trata-se de uma afirmação constante no Novo Testamento, que
mostra a universalidade da vontade salvífica de Deus vinculada à obra redentora de
Jesus Cristo, o único mediador.
Nesse espírito, todos estariam incluídos no projeto salvador de Deus. Eles seriam,
na expressão do proeminente teólogo do século passado, Karl Ranher, “cristãos
anônimos”, salvos em Jesus Cristo mesmo sem o reconhecer e na sua própria
religião. Agregar-se-ia aqui à reflexão cristológica uma capacidade, numa perspectiva
cósmica, de salvação de todos.
Com o termo inclusivismo refiro-me à crença que prontamente concede
que Deus Salva pessoas de outras religiões e usa as religiões delas para fazer
isso; porém, no esquema fundamental das coisas, Jesus Cristo permanece
a causa última da salvação dessas pessoas. A explicação de Karl Ranher a
respeito do que ele chama de ‘cristianismo anônimo’ oferece um exemplo
claro dessa posição. Termos gerais, representa a posição presente da
Igreja Católica Romana, provavelmente da maioria dos membros das
Igrejas tradicionais e da maior parte dos teólogos Cristãos. (HAIGTH,
2008, p. 163.)

Para aprofundar esta questão sobre a salvação e Cristologia em Roger Haigth, pode-se ler:
Explor

MARINHO, Tiago da Silva. Salvação e pluralismo religioso: uma discussão do tema a partir da
cristologia de Roger Haigh. DISCERNINDO - Revista Teológica Discente da Metodista, v. 1, n. 1,
p. 93-106, jan. / dez. 2013. Disponível em: https://goo.gl/KgibBN. Acesso em: 18.01.2019

Nos últimos anos, teólogos como o norte-americano Roger Haigth, autor de obras
como Jesus, símbolo de Deus e o Futuro da Cristologia; o seu conterrâneo
Paul Knitter, autor de One eart, many religions (Uma terra, muitas religiões -
tradução livre); e o francês Claude Gefré, pai da clássica obra Crer, interpretar: a
virada hermenêutica na teologia, advogam uma postura mais dialética da reflexão
cristológica, situada numa perspectiva para além do exclusivismo ou do inclusivismo.
Tal posição assumida por esses teólogos convencionou-se chamar de posição
pluralista. Esses teólogos relacionam Jesus Cristo e as outras religiões. Cristo, princípio
normativo da salvação para os que nele creem, segue sendo afirmado. De igual modo,
atesta-se que outras mediações religiosas também são normativas e fontes de salvação.
Não se trata de minimizar a salvação ofertada por Jesus, tampouco amalgamar a
salvação ofertada por outras tradições dentro do prisma inclusivista, mas antes dizer
que o universo plural contempla formas plurais de salvação. Jesus Cristo, desse
modo, é verdadeiro salvador, mas não o único. O paradigma reflexivo não seria o da
sobreposição de uma religião sobre outra, mas da complementariedade entre ambas.

Para aprofundar esta questão sobre o Cristo e o Pluralismo religioso, consultar: RIBEIRO,
Explor

Cláudio. Princípio pluralista. Cadernos Teologia Pública. São Leopoldo: Unisinos. Ano XIV,
V. 14, n. 128, 2017. Disponível em: https://goo.gl/gNpvAj. Acesso em: 15 jul. 2018.

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Justamente essa “relatividade histórica leva o cristão a definir mais exatamente
o conteúdo de sua fé em Jesus” (RIBEIRO, 2014, p. 94), seu salvador, revelador
de Deus.

Nesse sentido, numa cristologia que se pretende atinente ao futuro, torna-se um


imperativo pôr em evidência em toda a consciência uma noção que açambarque
a pluralidade. Como diria Cláudio Ribeiro (2018), trata-se de viver não apenas
como ética ou catequética um “Princípio pluralista” dentro do método teológico,
consequentemente cristológico. Não se trata de mitigar a importância de Cristo no
processo de salvação ou de atenuar verdades sobre ele consolidadas, mas antes
de explicitar sobre uma nova perspectiva, plural, respeitosa e ecumênica, dados
já consolidados, extraindo, como um necessário corolário, implicações éticas para
viver a fé no Cristo na atualidade.

Em Síntese Importante!

Uma cristologia que se propõe contextual e relevante à humanidade contemporânea


não pode prescindir em seu arcabouço acadêmico de uma reflexão a partir de um pon-
to de vista plural. Ou como afirmou Roger Haight em sua obra Cristologias do futuro
sobre desenvolvimento da questão cristológica face ao pluralismo religioso, essa opção
nos “Levará rumo a uma concepção de Jesus como real e eficaz portador da Salvação
da parte de Deus, mas não necessariamente de uma forma superior e competitiva”.
A reflexão cristológica, considerando o atual pluralismo religioso, levará a uma vivência
menos beligerante em relação aos que professam uma fé distinta daqueles que creem
em Cristo (HAIGTH, 2008, p. 163).

Cristologia e Libertação
Num mundo plural, polissêmico e complexo, a reflexão sobre o Cristo ou
um cristologia com veio pluralista é eminentemente necessária como apontada
anteriormente. Ela não nega o princípio basilar de que Cristo é o redentor e
revelador de Deus. Contudo, posta ao lado de outras religiões deve-se entender
que elas não competem entre si, do ponto de vista de quem salva mais, antes elas
se concorrem para a plena revelação de Deus, para o encontro profícuo com o
criador, Deus infinito, Deus absconditus.

Ladeando uma reflexão pluralista sobre a CristoIogia e inserido no universo de


questões que podem ampliar o horizonte da reflexão teológica, mormente no que
tange à questão da Cristologia, um elemento que pode e deve ser considerado no
universo da reflexão é a dimensão da dor, do sofrimento. De modo mais específico,
a questão da vulnerabilidade, da escravidão e do sofrimento ao qual uma parcela
significativa daqueles que seguem ou não o Cristo está submetida. Resumido numa
palavra: os pobres.

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Convém recordar que essa temática apresenta-se como pertinente, mormente


porque a mensagem anunciada por Jesus, em princípio, dirigia-se aos pobres de
todas a matizes (Lc 4: 16-21Mt 11: 5-6). No espírito do que afirma Moltmann,
a cristologia elaborada de maneira teórica, desde os umbrais da academia, dever
reverberar na vida concreta de homens e mulheres, deve conduzir a comunidade
cristã inevitavelmente, como uma verdade que deriva de outra verdade – corolário
- a uma prática nos mesmos moldes de Cristo, uma cristoprática (cf. MOLTMANN,
2009, p 77-81).

Nesse espírito, tal como a questão da pluralidade religiosa, a dimensão libertadora


da fé em Cristo foi delineada nos umbrais da tradição teológica, mormente na
América Latina. Embora localizada geograficamente, uma cristologia de matiz
libertadora tem suas raízes fundamentas na própria pessoa de Jesus Cristo e na
sua ação. Por isso, de maneira contundente, um teólogo católico testificou que a
“opção preferencial pelos pobres está implícita na fé cristológica naquele Deus que
se fez pobre por nós, para enriquecer-nos com a sua pobreza” (Bento XVI, 2015).

No lastro histórico, inspirados pela fé em Jesus Cristo, que naturalmente incide


num compromisso com aqueles que sofrem, teólogos que se consagram por sua
acuidade acadêmica estabeleceram de forma ordenada uma profícua articulação entre
a fé e libertação, fé cristológica e compromisso com os frágeis, pobres. No universo
cristão-católico, nomes como Gustavo Gutierrez e Leonardo Boff estão atrelados à
gênese desse processo teológico.

Gustavo Gutierrez é considerado o pai da teologia que leva em consideração, a


partir de Cristo, a realidade concreta do homem empobrecido, sofrido e injustiçado.
Sua obra mais significativa, chamada Teologia da libertação, deu origem a uma
corrente teológica homônima da qual também é possível abalizar uma Cristologia
da Libertação.
A libertação da qual Gustavo Gutiérrez fala não é um programa político.
Ela se situa em três níveis que se cruzam. O nível econômico: é preciso
combater as causas das situações injustas. O nível do ser humano: não
basta mudar as estruturas, é preciso mudar o ser humano. O nível mais
profundo, teologal: é preciso se libertar do pecado, que é a recusa de
amar a Deus e ao próximo. (SAUTO, 2016.)

Leonardo Boff, ainda dentro do universo católico, articulou de maneira sistemática


categorias que facultavam pensar a teologia e a cristologia desde uma opção
preferencial pelos pobres. Sua reflexão, nos últimos tempos, dentro da mesma
linha, dilatou-se para categorias mais abrangentes e também sofredoras, dentre
elas a preocupação com a Terra, casa comum, que é vilipendiada diuturnamente.

Para aprofundar esta questão de uma cristologia atinente ao futuro, pode-se ler: MANZATTO,
Explor

Antônio. Notas para uma cristologia para o terceiro milênio. Revista de Cultura Teológica, n. 31.
p. 79 – 106. Disponível em: https://goo.gl/EEtH6U. Acesso em: 9 jan. 2019.

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No universo protestante, mesmo com uma variação de nomenclatura, há teólogos
que, em sua reflexão cristológica, articulam um compromisso com o universo dos
empobrecidos. Normalmente, esse tipo de teologia que não prescinde de uma
sistemática Cristologia adentrou a história com o nome de Teologia da Missão
Integral. Figuram como exponenciais dessa forma sistemática de reflexão nomes
como Elza Tamez, Samuel Escobar, Richard Shaul, Milton Schwantes. Eles estão
intrinsecamente atrelados ao pensamento teológico/cristológico dentro desse campo
particular que é a realidade dos pobres.

Mais a rigor, uma cristologia que se pretende aberta ao futuro levando em


consideração o que lhe constitui. Largos traços, o objetivo, um dos pilares objetivos
da cristologia da libertação, é servir-se da força intrínseca do Jesus histórico para tê-
lo como critério de discernimento da prática cristã. Entendo que o Cristo histórico
é o Cristo da fé, uma prática comprometida e transformadora da realidade é uma
opção de fé.

A ação concreta, localizada e histórica de Jesus torna-se, desse modo, o tema


privilegiado da cristologia da libertação: suas ações, sua mensagem, suas atitudes,
suas escolhas e opções, seu compromisso com os frágeis, seus discursos, morte
e ressurreição pautam uma cristologia com acento libertador. A cristologia da
libertação, portanto, busca na história humana de Jesus um projeto de uma
libertação humana integral realizada por Deus nele.

Sobre a Cristologia da Libertação, embora não fale da inspiração da fé, sumariamente


define BERTOLIN (2003, p. 18.):
O objetivo da cristologia da libertação é servir-se da força intrínseca do
Jesus histórico para tê-lo como critério de discernimento da prática cristã.
Desta forma, a prática histórica de Jesus torna-se o tema privilegiado da
cristologia da libertação: suas ações, sua mensagem, suas atitudes, suas
escolhas e opções, seu compromisso social, as implicações políticas e
sociais e sua vida e morte. A cristologia da libertação busca na história
humana de Jesus um projeto de uma libertação humana integral realizada
por Deus nele. (BERTOLIN, 2003, p. 18.)

Para aprofundar esta questão da Teologia da Libertação, é salutar ler AQUINO Jr., Francisco.
Explor

Questões fundamentais de teologia da Libertação. Perspectiva Teológica, v. 4, n. 2, maio/


agosto de 2016. Disponível em: https://goo.gl/EKJfL9. Acesso em: 11 jan. 2019.

Característica, portanto, de uma cristologia com acentos de Libertação é,


partindo da fé em Jesus Cristo e divisando a revelação que ele apresentou de Deus,
comprometer-se na libertação dos que sofrem, daqueles que padecem na carne a
insensatez humana que renega o irmão, degrada o próximo.

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Desse modo, haja vista a situação de muitos seguidores de Cristo que enfrentam
vicissitudes – pobrezas morais e físicas – em níveis superlativos, urge, numa cristologia
que se pretende pertinente ao futuro e ao homem hodierno, colocar no bojo de sua
reflexão o aspecto intrínseco da fé no Messias, no Cristo ressuscitado, ou seja, na
libertação/salvação integral da humanidade.

No mundo pós-moderno, a realidade líquida e plural ensina que, mesmo à luz da


fé, os processos de libertação são complexos. De igual modo, o clamor dos pobres
ganha contornos planetários, também tem vozes diversas. Assim, a pobreza e a
miséria assolam tanto o organismo que habitamos – Terra - quanto aqueles que
nela habitam. Assim, uma reflexão cristológica que se apresenta como pertinente
ao homem moderno deve aprofundar em seu arcabouço teórico da reflexão ação
de fé, em nome de Cristo, em favor dos empobrecidos que habitam a face da terra,
bem como o compromisso com essa terra.

Em Síntese Importante!

Caro(a) estudante, à guisa de conclusão e revisão desta unidade final, destacamos:


1. A Cristologia deve ser contextual. Na atualidade, uma Cristologia que se pretende
pertinente ao homem moderno deve levar em consideração o pluralismo reli-
gioso. De igual maneira, não pode em absoluto desconsiderar aqueles a quem a
mensagem de Jesus Cristo primeiramente foi endereçada, os pobres.
2. A Cristologia, enquanto reflexão sistemática sobre o Cristo, não pode considerar-
-se uma ciência hermética, alijada das questões atuais. Deve sempre imprimir a
si mesma a pergunta sobre qual o sentido e/ou a necessidade concreta de falar
sobre o Cristo.

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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Livros
Dicionário do Concílio Vaticano II
PASSOS, João Décio. Processo conciliar. In: PASSOS, João Décio e SANCHEZ,
Wagner Lopes (org). Dicionário do Concílio Vaticano II. São Paulo: Paulinas/
Paulus. 2015 p. 784-788.

Leitura
Discernindo - Revista Teológica Discente da Metodista
MARINHO, Tiago da Silva. Salvação e pluralismo religioso: uma discussão do tema
a partir da cristologia de Roger Haigh. Discernindo - Revista Teológica Discente da
Metodista. V. 1, n. 1, p. 93-106, jan. dez. 2013.
https://goo.gl/KgibBN
Cadernos Teologia Pública
RIBEIRO, Cláudio. Princípio pluralista. Cadernos Teologia Pública. São Leopoldo:
Unisinos. Ano XIV, V. 14. n. 128, 2017.
https://goo.gl/gNpvAj
Revista de Cultura Teológica
MANZATTO, Antônio. Notas para uma cristologia para o terceiro milênio. Revista de
Cultura Teológica, n. 31, p. 79 – 106.
https://goo.gl/EEtH6U
Perspectiva Teológica
AQUINO Jr., Francisco. Questões fundamentais de teologia da libertação. Perspectiva
Teológica, v. 4 n. 2, maio/agosto de 2016
https://goo.gl/EKJfL9

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Referências
BENTO XVI, Sessão Inaugural dos Trabalhos da V Conferência Geral
Do Episcopado da América Latina e do Caribe. Disponível em: <http://
w2.vatican.va/content/benedict-xvi/pt/speeches/2007/may/documents/hf_ben-
xvi_spe_20070513_conference-aparecida.html>. Acesso em: 16 jul. 2018.

BERTOLIN, José Antonio. Jesus, um Deus ocultado na pele de um carpinteiro:


condensação de estudos sobre a Cristologia. Curitiba, 2003, p. 18. Disponível em:
<http://www.osj.org.br/wp-content/uploads/2016/01/CRISTOLOGIA-PE.-
BERTOLIN.pdf>. Acesso em: 16 nov. 2018.

DUPUIS, J. Introdução à cristologia. São Paulo: Loyola, 1999.

FORTE, Bruno. Jesus de Nazaré, história de Deus, Deus da história: ensaio de


uma cristologia como história. São Paulo: Paulinas, 1985.

HAIGTH, Roger. Cristologias do futuro. São Paulo: Paulinas, 2008.

MACHADO, Renato Silva. Cristologia como história: um estudo sistemático-


pastoral da Cristologia de Bruno Forte. Disponível em: <http://livros01.livrosgratis.
com.br/cp129835.pdf>. Acesso em: 15 jul. 2018.

MATIAS, Calmeiro. Evolução dogmática da cristologia. Disponível em: <http://


calmeiro-matias.blogspot.com/2009/02/evolucao-dogmatica-da-cristologia.
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