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GALVÃO DE SOUSA
DIRETORIA DO ICT
CAPITALISMO,
Diretor Primeiro Secretário: Olavo Previatti
Diretor Segundo Secretário: Dra. Augusta B. de Carvalho Ribeiro
SOCIALISMO E
CONSELHO CONSULTIVO
ADMINISTRAÇÃO
\
CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISMO
13
12 J. P. GALVÃO DE SOUSA
o "Capitalismo, So cia
n arem mestres eram ao mesmo tempo pa trões e operários. socialismo. J ustifica-se, porém, o títul
último um produto
Quando o empresário, dono dos meios d e produção, passou a lismo e C omunismo", destacando-se, neste
IX e o desagu,adou-
contratar operários retribuindo -lhes o trabalho com um salá d,:> capitalismo privado liberal do secul� �
0 verter as correntes socialis
tas de nossa e poca.
r io, então s urgia o sistema capitalista. r o em que va- · -
. unis na sua rea1·a i ade
Além d isso, importa considerar o com . , .
mo
.
Trata-se aqui do capiglismo=P!.-i�do, mas cumpre obser l c10n ana ai q uma
histórica atu al, como dinâmica revo
u m s u e
var que a mesma característica - separação entre capital e tr;i
balho - vale para o capitalismo de Estado. Neste caso, o Es concepção dogmática. _ , _ , .
utr s is e a ec no m 1c os tem_ coexis-
t ado é o único em presário , o único pro prietá ri o, o único pa trão.
C om O capitaJismo o o s t m s o
- r que estepm por
Diante dêle todos os homens são reduzidos à mesma condição ti.do, e na0 desapareceram nem d.evemos pensa . . , .
de ec on omia dom est ica,
desaparecer. Formas não. capitalistas
de trabalhadores . O ct;t��:!:.Jis_?JJ:.2-k..§st(J;_!Jo é o sistema econô
de economia coo perativa, de
. ,
ec o_nomia agrana vao resis tmd o
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ª?
mico do regime comunista, ou seja, do socialismo mais ava n
em asp1-
çado, razão pela qual se fala também em S2Efl{iS1TJ&...iiJL§JJ.EJo. impacto do capitalismo industrial, emb o,:a sem poder _
rar à primazia nos domínios da produça o . E m c : s p a1ses ,
rt o
Nas atuais condições da humanidade, com o desenvolvi mpuls�. Po:i.· is� o . �esmo,
0 artesanato floresce e recebe nôvo i .
mento econômico e o progresso técnico que at ingimos, o capi
apesar do capitalismo ter sido d 1:1�ª
e � o rr e nci a da tecmc: mo
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talismo veio a se generalizar. Ao lado do capi talis mo da e� , ena errad o reduzir to �a a
der na e das transformações sociai s s
prêsa particular, fundado no direito de propriedade, vemos dispu
vida econômica de hoje e as perspectivas do futur _ u�a
o a
surgir o capjtalismo�deEs.tado, mediant e a s ocialização estatal , n re s quais aliás há um
ta entre O capitalismo e o sociali smo e t o
de todos os bens de produção . bé u paren te c .
antagonismo, mas há tam m m s o
q_u com,ll;;lli!l.2.. é, pois, �iEfu.mg,� isto é, uma das formas
do sistema econômico capitalist a, baseado na dissociação entre
o capital e o trabalh o. Nem se diga que, sendo o comunismo
a expressão de uma sociedade em que todos são trabalhadores,
desaparece o proprietário capitalista, uma vez que não mais se
reconhece o direito de. propriedade na ordem privada, e tudo
passa a ser de todos. Com efeito , a propried ade, no regime
comunista, passa para a coletividade, mas deixa de ser de cada
um dos trabalhado res, e essa co.Jetividade se corporifica no Es
tado, que a representa e a organiza, e até mesmo a dirige tota
litàriamente. 1 0 Estado, portanto, fica sendo o proprietário e
patrão, o grande capitalista, que fornece o trabalho e dá os
meios de vida necessários a cada um dos homens, os quais pres
t am seus serviço s à coletivid ade estatal..
Na economia moderna, aos dois primeiros elementos men Jho, sem preocupação de auferir grandes lucros e de acumular
cionados acima - a natureza transformada e o trabalho trans riquezas.
formador - acrescenta-se o capital com um papel de direção Na ordem econômica instaurada pelo capitalismo moder
cada vez mais acentuado. no, uns contribuem com os instrumentos de produção, e outros
A economia medieval pode considerar-se pré-capitalista. O com o seu trabal�o pessoal para fazer com que tais instrumentos
papel primacial cabia ao trabalho, e a produção ficava restrita produzam. Daí a separação entre capital e trabalho, provocan
às necessidades do consumo. A atividade econômica de cada do a formação de classes que, pelos motivos indicados mais
um se dirigia simplesmente à obtenção do necessário para asse adiante, se tornaram antagônicas e hostis.
gurar a própria subsistência. Os artífices especializad�s eram Como nota Nell-Breuning, essa dualidade Capital-Traba
conhecedores do seu ofício e o dominavam com verdadeira arte, lho "só poderá ser inteiramente evitada na emprêsa individual
sem os excessos de especialização da indústria moderna, em que ou na familiar. Quanto maior o emprêgo de "meios artificiais
por vêzes os operários não sabem senão fazer funcionar deter de produção" (não mais simples ferramentas e aparelhos, mas
minada peça de uma grande máquina, repetindo a mesma ope gigantescas instalações de maquinaria), tanto mais sobrepujam
ração durante horas e horas, monótona e automàticamente. as indústrias as possibilidades do trabalho de um só homem ou
Estavam organizados em corporações, que regulamentavam a de uma família, exigindo a cooperação de um grande número
produção e o comércio.. Os próprios trabalhadores tinham, de fôrças de trabalho, sem as quais êsses poderosos estabeleci
mentos não poderiam de forma alguma funcionar. É preciso,
pois, a direção da vida econômica e possuíam os seus instrumen
tos de trabalho, não havendo oposição entre capital e trabalho, pois, que muitos trabalhadores trabalhem com os mesmos meios
de produção; nos mesmos altos fornos, nas mesmas esteiras e
ou entre "empregadores" e "empregados" como classes distintas.
nas mesmas linhas de montagem. Pretender- que o operário
Isso pelo que diz respeito ao trabalho nas pequenas cida industrial trabalhe com seus próprios meios de produção, como
des, que precederam os grandes centros urbanos da época do fazia e faz ainda hoje o artesão, é simplesmente impossível.1
capitalismo. Era o artesanato livre, sob o regime corporativo. Isto quer dizer que o capitalismo moderno, com a grande
Quanto ao trabalho dos campos, nas terr�s pertencentes �os �enho indústria, veio também separar a família da oficina do trabalho.
res feudais, estava ainda em regime servil. Com a suavizaçao dos Esta foi substituída pela fábrica, na qual se dá uma concentra
costumes, graças à influência da Igreja, deixara-se a escravidão ção de operários que vêem reduzida ao mínimo a convivência no
dos tempos do paganismo antigo, e a condição dos trabalhador,:s lar doméstico. No artesanato há o trabalho em família, mas na
em tôda parte melhorara sensivelmente. O servo da gleba nao grande indústria isto se torna impossível. Desta forma, a família
era um pária, como o escravo antigo; estava ligado à terra e não deixou de ser unidade de produção para continuar apenas como
ao senhor, razão pela qual não podia deixar a gleba em que tra unidade de consumo. A família do agricultor ou do artesão é
balhava, adquirindo assim uma situação de estabilidade. reforçada na sua coesão pelo fato de ser uma comunidade de
Mas o que importa aqui considerar, num paral�lo entre a
_ .
economia medieval pré-capitalista e a economia capitalista mo
derna, é aquela ausência da dualidade de classes entre os q�e I. Oswald Von Nell-Breuning, CA]:>ITALISMO E SALÁRIO
se entregavam à produção no regime da incipiente indústria J{JSTO (Tradução portuguêsa), São Paulo: Editôra Herder, 1964,
manufatureira da época. Outro traço característico de funda p. 23.. O fundamento jurídico-social do capitalismo, segundo a ca
racterização dêste sistema feita por Getzeny, repousa em três pon
mental importância na economia medieval é_ o fato de que esta
tos: l) propriedade privada; 2) separação entre capital e trabalho;
se achava tôda voltada para atender às necessidades do consumo. 3) preponderância do capital. Cf. H. Getzeny, CAPITALISMO E
Os artífices produziam para viver com o produto do seu traba- SOCIALISMO, Pôrto Alegre: Livraria do Globo, 1939, p. 29.
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trabalho reunindo o marido, a mulher e os filhos em tôrno da não tanto o fruto de seus esforços, e talvez de seu espírito de em
mesma tarefa e das mesma preocupações, ao passo que a famí preendedora iniciativa, antes produto do patrimônio empregado
lia do operário fabril, no industrialismo absorvente, fica mais para fins de lucro. O emprêgo acertado do patrimônio (no pe
exposta à desagregação. ríodo de reconstrução, em emprêsas de reequipamento; na fase
Quanto à produção, que antes se destinava à cobertura do de escassez, na armazenagem dos bens que faltam, etc.) é que
consumo, passou a ser ordenada ao lucro. Neste sentido é que decide do êxito".
se diz que a economia medieval era uma economia de consumo "3) Patrimônio expresso em uma cifra monetária: o lucro
e a ecõriorriia capitalista moderna é de produção, pois ela tende visado é posto em relação com a cifra de dinheiro que o repre
ao lucro do empreendedor e ao aumento da produção, cami senta, e calculado pela percentagem dela. Não importará tanto
nhando para a superprodução e utilizando-se da propaganda, que acrescentar a êsse patrimônio sempre mais parcelas constituti
muitas vêzes faz surgir necessidades artificiais para dar vazão às vas, como seriam a ampliação dos locais de uma emprêsa ou a
mercadorias. Vemos, no capitalismo, como ponto de partida, anexação de novos setores, mas antes o aumento da cifra mone
uma soma de capital a ser empregada com fito de lucro. tária do patrimônio. Será secundário saber quais as coisas cujo
A ordem social da Idade Média não estava orientada tão valor vem adicionar-se a essa cifra monetária; o de que se trata
fortemente para as atividades econômicas. 'Produzia-se para vi em última análise é a cifra monetária, como tal. Os capitalis
tas típicos dessa espécie interessam-se, por conseguinte, mais
ver, não se vivia para produzir. ·o objetivo de lucro introduzido
pelo trabalho de escrituração (contabilidade, balanço), na qual
pelo capitalismo foi criando a mentalidade do "homem econô
aparecerá demonstrada a decisiva cifra monetária, do que pelas
mico" moderno, e trouxe desde logo os g·ermes do comunismo. emprêsas em que são produzidos os valores que aparecerão
Na sociedade comunista, prevalece a idéia de uma ordem social afinal nessa cifra, podendo acontecer até que êles jamais tenham
em função das fôrças econômicas, e o homem é considerado pri visto suas emprêsas". 2
mordialmente um agente produtor. Essa análise torna patente a verdadeira revolução operada
Ainda no 4izer do autor citado, o capitalismo moderno pode pelo capitalismo na vida econômica dos povos: a economia es
ser entendido como processo econômico para aumentar um pa sencialmente ordenada à produção, a produção para o lucro e
trimônio lucrativo expresso em cifra monetária. Nesta concei o lucro como fim em si mesmo. As ativi_dades econômicas e
tuação, encontramos os seguintes elementos: financeiras passaram à ser orientadas no sentido da formação e
"l) Patrimônio, lucrativo: uma pessoa possui um patrimô do reinvestimento do capital.
nio e deseja servir-se dêle para lucrar; em outras palavras: para Na economia pré-capitalista tínhamos o seguinte esquema:
aumentar êsse patrimônio". Por aí se pode perceber a dinâmica
da produção capitalista, impulsionando para a supeTprodução do
hipercapitalismo. Para que o aumento do patrimônio? Res MERCADORIA - DINHEIRO - MERCADORIA
ponde o mesmo autor: "para tornar a aumentar, e ainda em
maior escala, o patrimônio aumentado". Um trabalhador produzia alguma coisa a fim de, com o di
nheiro alcançado pela venda dêsse produto, comprar outra
''2) O lucro deverá obter-se jJelo patrimônio. Isso não
coisa de que precisasse para o seu uso.
significa que o possuidor do patrimônio lucrativo (o "capitalis
Com o sistema capitalista os têrmos se inverteram:
ta") não queira trabalhar também. Muitos e mesmo a maioria
dêsses proprietários trabalham até o limite de suas fôrças ... até
esgotá-las prematuramente. Mas o lucro é, . no parecer dêles, 2. Breuning, obr. cit. P'.P· 14-15.
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22 J. P. GALVÃO DE SOUSA CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISMO 23
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ftste espírito de lucro fàcilmente se transforma em desme
dida gananciosidade, pela avidez de enriquecer indefinidamente,
daí resultando o exercício da atividade econômica não mais su
bordinada à lei moral.
Se a dissociação entre o capital e o trabalho caracteriza o
sistema capitalista, esta separação entre a economia e a moral
gerou o espírito individualista dominante no capitalismo libe
ral-burguês dos séculos XIX e XX.
Daí a distinção feita pelo grande economista Toniolo entre
dois sentidos da expressão "economia capitalista": "um primeiro
e correto, i�to é, de um sistema de relações econômicas, em que
prevalecem pela importância comparativa as classes superiores
possuidoras do capital. Neste sentido a palavra denota uma
fase normal da economia dos povos, afirmação de uma certa ma
turidade e medida de um crescente poder do homem" .3
O segundo sentido corresponde ao sistema capitalista vi
ciado por aquêle espírito individualista, oriundo do naturalis
mo econômico moderno. Então, "economia capitalista" ou "ca
pitalismo" são expressões comparáveis a egoismo, parlamenta
rismo, socialismo, que significam a perversão de um conceito
normal. O egoismo é o amor próprio desordenado, o parla
mentarismo é a perversão do sistema representativo parlamen
tar e o socialismo é uma concepção que exagera o predomínio
que de fato deve reconhecer-se ao interêsse social sôbre o inte-
para as potências européias de além-Pireneus, ao mesmo tempo mo os homens começavam a se sentir livres de tais restrições de
em que os proveitos do comércio do Nôvo Mundo iam escapan ordem moral. Essa influência foi muito bem estudada por
do àquelas duas nações para cair nas mãos da Inglaterra, da Ho i Max Weber e outros autores, entre os quais o próprio Sombart. 12
landa e da Franca. 9 A teologia calvinista favorecia a criação da nova mentalidade
Foi nesse mundo europeu, transformado pelo naturalisml) capitalista com a teoria da predestinação, segundo a qual todos
renascentista e pelo protestantismo, que se formou o moderno os homens são desde a eternidade destinados por Deus ao céu
espírito capitalista, sendo de notar um fato de importância ca ou ao inferno, independentemente do seu procedimento nesta
pital: a influência dos judeus, expulsos da Espanha por Fernan vida, sendo o bom êxito nos negócios um sinal da futura sal
do e Isabel, e passando a exercer uma atuação decisiva nos ne vação.
gócios e na política de outros povos.10 Com as monarquias absolutas o sistema capitalista encon
trava sua primeira fundamentação doutrinária, entre os adeptos
O capitalismo financeiro, oriundo do capitalismo comer
do mercantilismo. Cumpre lembrar que as monarquias medie
cial, fomentava a circulação das riquezas e dava origem à acumu
vais haviam sido tipos de govêrno limitado, não só em virtude
lação dos capitais. As bolsas suplantavam as grandes feiras, e
dos grandes poderes reconhecidos aos senhores feudais, mas ainda
eis bancos iam ganhando uma preponderância cada vez maior,
pela atividade da Igreja na vida pública e pelo regime das liber
resultante do desenvolvimento do crédito.
dades locais, de comunas ou cidades e regiões, regime tão flores
O empréstimo a juros muito contribuiu para êsse nôvo es cente, por exemplo, entre os reinos da península ibérica (fueros) .
tado de coisas. Durante a Idade Média, a Igreja condenara, Depois da Renascença, e ainda aqui por influência do protes
combatendo a especulação e os excessos do comércio do dinhei tantismo, o poder real foi-se fortalecendo cada vez mais, em de
ro.11 Nos países em que era maior a influência do protestantis- trimento daquelas unidades autônomas que antes o limitavam.
O aumento do erário público, com o ouro e a prata da América,
as novas armas de guerra, resultantes do uso da pólvora e tor
9. Henri Sée, LES ORIGINES DU CAPITALISME MODER nando obsoletos os sistemas de defesa dos castelos senhoriais,
NE, Paris: Lib. Arrnand Colin, 1930, págs. 49 e 67.
favoreciam o crescimento do poder do rei, cuja interferência na
10. São bem conhecidos os trabalhos do grande historiador do
capitalismo moderno, Werner Sombart, em tôrno do assunto, nos vida das corporações econômicas e da própria Igreja preludiava
livros sôbre OS JUDEUS E A VIDA ECONÔMICA e O BURGUÊS, a enorme centralização do Estado moderno.
além da obra fundamental já citada. Assim como o direito romano vinha dar ao absolutismo
11. Até meados· do século XVIII tanto a lei eclesiástica como suas bases jurídicas - com o princípio "o que agrada ao prín
as leis civis proibiam o empréstimo a juros. Esta prática tornou-se cipe tem fôrça de lei" - da mesma forma o mercantilismo for
hoje corrente e passou a ser admitida pelo direito canônico e peln necia aos monarcas uma justificação para a tarefa de direção da
direito civil. O princípio de justiça em que se fundamentava a vida econômica, que começavam a assumir.
proibição de outrora e a permissão de hoje é sempre o mesmo. O
que mudaram foram as circunstâncias. Com a significação que a
moeda passou a ter em nossos dias, o empréstimo sem juros é que conseqüentemente a agiotagem. Cf. Valere Fallon, PRINCIPES
poderia redundar em injustiça. Tenha-se em conta o fenômeno da D'ÊCONOMIE SOCIALE, 5.ª ed., Museum Lessianum, L'Êdition
desvalorização e os surtos inflacionários. As seguintes circunstân Universelle (Maison d'édition A. Wesmael - Charlier), 1935, págs.
cias ou títulos acidentais podem justificar a percepção de juros: 323-331.
dano emergente, lucro cessante, risco do capital, perigos do atraso ou 12. Max Weber, DIE PROTESTANTISCHE ETHIK UND
da mora. Tudo isto faz com que no regime econômico atual um DER GEIST DES KAPITALISMUS, publicado pela primeira vez
juro razoável seja exigido nos empréstimos. O que é sempre con no ARCHIV FüR SOZIALWISSENSCHAFT UND SOZIALPOLI
denável e imoral é a usura - juros não: devidos ou exagerados - e TIK, volumes XX e XX (1904-1905).
30 J. P. GALVÃO DE Sous.&
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talistas, nem no artesanato ou na economia pública. Mas nas Alguns anos antes da segunda guerra mundial, uma revista
\
unidades de produção industrial, em que se realiza plenamente 1 francesa, publicando interessante reportagem sôbre o assunto,
a idéia da forma capitalista como economia de emprêsa, recaem trazia na sua capa a enorme roda dentada de uma fábrica tri
sôbre o empresário tôdas as responsabilidades e tôdas as possi turando um operário, com esta legenda: "fim de uma civili
bilidades de ganhar ou perder. A fôrça propulsara da economia zação?"
capitalista moderna é, assim, o empresário capitalista. Sem êle Depois das duas conflagrações que sacudiram a humanida
nada se faz, dêle dependem o capital e o trabalho, e mediante a de e das crises econômicas gerando o desemprêgo em massa, des
sua iniciativa ou o seu apoio' são realizados os inventos téc faziam-se as ilusões da era vitoriana inglêsa, dos tempos da jJros
nicos.14 perity, e a linguagem dura dos fatos vinha desmentir o otimis
Quantq,,à emprêsa capitalista, unidade de produção, tem mo dos que afirmavam a evolução dos povos na linha de um
por fim o)ucro'do empreendedor. Este objetivo determina uma progresso indefinido.
atividade cada vez mais intensa, da qual resulta o aceleramento Mas consideremos agora o capitalismo naquela fase, início
do ritmo da vida, valorizando-se de um modo equivalente o di do seu auge, coincidindo com a introdução da máquina e o de
nheiro e o tempo (time is rnoney). Na economia artesanal tra senvolvimento da grande indústria. É importante levar em
balha-se mais vagarosa e despreocupadamente, e há mais lugar conta um elemento de natureza ideológica sem o qual a evolu
para a preocupação artística. Os trabalhos em sêda no Oriente, ção do capitalismo não teria sido o que foi: o liberalismo eco
os bordados e tapeçarias se executam lentamente. Como na nômico.
Europa medieval, entre os povos orientais de hoje ainda se es Ao mercantilismo controlador e protecionista, protegendo
creve e fala sem pressa e com muitas cerimônias. Tudo isto vai especialmente as manufaturas e o comércio, veio opor-se a dou
aos poucos desaparecendo com a racionalização da vida econô trina dos fisiocratas, entre os quais se destaca o economista
mica pelo capitalismo, racionalização esta em que o homem vai Quesnay, autor do TABLEAU ÉCONOMIQUE.1 5 Preco
sendo anulado pelo predomínio da máquina e, em nossos dias, nizavam o domínio da natureza nas relações econômicas,
pela automação. donde o nome de "fisiocracia": Partiam da hipótese difun
A aplicação da máquina a vapor às indústrias foi o acon dida no século XVIII de um "estado de natureza" anterior à
tecimento histórico de maior importância na história do capita vida social, em que o homem seria bom e feliz. As condições
lismo. Transformou inteiramente as condições de trabalho, deu dêsse estado primitivo deveriam, segundo os fisiocratas, ser res
novas e imensas possibilidades à produção, preparou a era tec tabelecidas mediante um regime de ampla liberdade individual
nológica. A técnica, em si mesma, deveria favorecer o homem e no respeito às leis naturais que governam a atividade econô
no domínio da natureza e na extensão a tôda a sociedade mica, leis estas às quais o Estado não deve opor-se com suas
de condições de vida mais favoráveis, Os benefícios do progres interferências e regulamentações. Daí a famosa fórmula: laisscz
so técnico, na ordem do bem-estar material, fizeram-se sentir, faire, laissez passer. Ou como diriam os italianos: il mondo 11a
mas nuvens sombrias vieram toldar um panorama luminoso: o da se. Limitando-se a garantir a segurança das pessoas e dos
modo pelo qual foi utilizada a máquina suscitou gravíssimos bens, o Estado tornar-se-ia um mero mantenedor da ordem, pro-
problemas sociais, provocando um desajustamento entre as clas
ses e uma crise que acabou por atingir o sistema capitalista,
pondo-o em cheque. 15. Quesnay era médico de Luís XV. A exemplo de Colbe1t,
na época do mercantilismo, teve também a "fisiocracia" um minis
tro de Estado a defender e aplicar os seus princípios: Turgot, no
14. Sombart, DER MODERNE KAPITALISMUS, volume ci tempo de Luís XVI. Outros nomes da mesma corrente: Mirabett,
tado, capítulos I e II. Mei-cier de la Riviere,, Dupont de Nemours, Gournay.
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porcionando aos indivíduos uma ampla �ib�rdade_ de produçã?, além das necessidades do consumo interno. Por outro lado, nada
de trabalho, de concorrência e de comercio. Disso resultaria tinha aquêle país a temer da importação, pois os outros países
espontâneamente o equilíbrio e a prosperidade geral. não estavam em condições de se lhe avantajar na concorrência.
Tais idéias foram também as do liberalismo econômico, em Tal era o estado da política econômica exterior, ao fim das
bora mais mitigadas em alguns autores. O título de um livro guerras napoleónicas. O liberalismo dominou durante todo o
de Bastiat é bem significativo: "As harmonias econômicas". século XIX. Houve, entretanto, nas últimas décadas dêsse sé
Estas harmonias resultariam, a seu ver, do livre jôgo dos inte culo uma volta à orientação dos tempos do mercantilismo. A
rêsses e da conformidade com a ordem natural. Adam Smith economia liberal, na concepção de Smith, correspondente ao .
exerceu grande influência no liberalismo inglês, e depois dêle capitalismo em expansão, admitia um aumento indefinido· da
Ricardo, enquanto na França]. B. Say dava uma coloração mais produtividade e conseqüentemente uma prosperidade geral, sem
forte às idéias de Smith dentro do quadro geral criado pelo que as riquezas das nações mais favorecidas acarretassem o em
liberalismo político da Revolução de 1789. A Escola de Man pobrecimento de outras. Segundo o mercantilismo, pelo con
chester pregava um liberalismo intransigente, e na mesma linha trário, as nações tôdas participavam de uma riqueza comum e
do pensamento economista liberal se destava Stuart /11.ill, dou em princípio limitada, de tal maneira que o enriquecimento de
trinador político e filósofo. cada uma só poderia verificar-se com o sacrifício das demais. Isto
Na obra fundamental de Adam Smith? sôbre a riqueza das porque o mercantilismo considerava a riqueza tendo por fontes
nações, editada pela primeira vez em Londres em 1776 e tradu o ouro e a prata, ao passo que o liberalismo concebia-a em fun
zida em várias línguas, o autor sustenta a tese de que os homens ção da produção industrial no crescendo indefinido resultante
são sempre impulsionados pelo interêsse pessoal, daí resultando da técnica e dos novos processos de trabalho. Mas êste mesmo
também um benefício para a coletividade, pois procurando cada liberalismo, assegurando campo aberto para a expansão das fôr
um satisfazer ao seu próprio interêsse serve melhor à sociedade ças produtoras, fazia com que tais fôrças começassem a cuidar
do que se se propusesse fazê-lo. Vemos nisto o utilitarismo da fi dos seus interêsses e de vencer na concorrência, chegando a um
losofia inglêsa na tradição procedente sobretudo de Bentham, e ponto em que precisavam servir-se do Estado para a sua defesa.
daí o individualismo e o sensualismo econômicos passam tam A necessidade de proteger os interêsses capitalistas e fortalecer a
bém para outros autores, como o de Say. economia interna fêz surgir o chamado neo-mercantilismo, ex
Smith dava grande importância à divisão do trabalho, para pressão econômica do imperialismo.
o aumento da produtividade. Tornou-se êste princípio uma ._ Na época do mercantilismo, o Estado dirigia a economia.
das molas propulsaras do sistema capitalista. Argumentava-se Depois, com o liberalismo, passou a desinteressar-se dela. Fi
com fatos bastante convincentes, como êste: pela divisão do tra nalmente, as fôrças econômicas começaram a controlar o poder
balho dez operários conseguiriam fazer 48.000 alfinetes por dia, político, e assim a economia a dirigir o Estado. Ao afã de lucro,
ao passo que cada um trabalhando isolado não faria mais do que característico do capitalismo, acrescentava-se o afã do poder,
vinte. estendendo-se para além das fronteiras, na busca de mercados ·
Com o maquinismo e a divisão do trabalho a economia capi e de matéria prima e na política de colonização .is
talista ia se expandindo mais e mais, ao mesmo tempo em que
o livre câmbio permitia o alastramento, pelo mundo afora, das
riquezas e dos bens produzidos, bem como a conquista de mer 16. W. Sombart, volume citado, capítulo VI; H. Hauser, ].
cados para dar vazão à produção crescente. Maurain e P. P. Benaerts, DU LIBÉRALISME À L'IMPÉRIALISME
(vol. XVII da coleção PEUPLES ET CIVILISATIONS), P. U. F.;
O movimento livre-cambista era sobretudo do interêsse da M. Baumont,. L'ESSOR INDUSTRIEL ET L'IMPÉRIALISME CO
Inglaterra, saturada de produtos industriais, que iam muito LONIAL ( vol. XVIII da mesma coleção).
36 J. P. GALVÃO DE SOUSA
cer a função de ordenar a liberdade para o bem, limitando-se gas corporações de ofício, com as suas regulamentações, traziam
a conciliar as liberdades de uns e outros no desempenho de um uma série de restrições a que era preciso por fim, uma vez aceita
papel de amortecedor dos choques ou conflitos sociais. aquela idéia otimista do liberalismo econômico no sentido de
que a "ordem natural" imperasse sem sofrer limitações da parte
Tanto a economia como a política eram separadas da moral,
da autoridade do Estado ou de autoridades corporativas.
e a religião não mais era reconhecida como algo que deve infor
mar tôda a nossa vida, mas ficava confinada ao interior das igre Além disso, a nova ordem política partia de uma concep
jas e da consciência privada de cada um. Operava-se uma es ção individualista da sociedade. Rousseau, no "Contrato so
cial", ensinava que a sociedad-e se fundan;ienta · numa conven
tranha cisão entre a consciência privada e a consciência públi-
ção entre indivíduos cujo estado ideal é o "estado de natureza",
ca dos empresários ou dos cidadãos: quando o indivíduo entra-
devendo a liberdade ampla dêste estado primitivo ser a meta su
va na sua fábrica, no seu escritório, numa repartição pública ou
prema visada pelas organizações políticas. Dizia também que
no parlamento deixava do lado de fora os princípios em que
não deve haver sociedades parciais no Estado, e desta forma ·a
fôra educado num lar cristão. A isto se chama a secularização
_ comunidade política perdia o caráter orgânico que histàrica
da vida, e o Estado liberal laicista, em nome de uma falsa liber
mente sempre teve, constituída por um conjunto de famílias e
d�de de consciência, foi mais longe: suprimiu o ensino de reli
outros grupos, para se transformar numa poeira de indivíduos
gião nas escolas oficiais, violando assim a liberdade de educa
em face do poder do Estado.
ção religiosa.19
Alguns países, como a Inglaterra, mantinham a tradição
Da mesma forma, o liberalismo, de cunho nitidamente indi
associativa, sem por isso conseguirem escapar aos efeitos da re
vidualista, negou a liberdade de associação. Isto ocorreu nos volução industrial no desequilíbrio que esta provocava entre as
seus primeiros tempos, produzindo conseqüências das mais de classes, pois de qualquer modo o liberalismo inspirava as leis
sastrosas 1�0 campo social e econômico. Depois do édito de e a orie�1tação dos governos. · Maior se tornava a devastação in
Turgot dissolvendo as corporações, em 1776, a famosa lei C ha _ .
dividualista entre os povos que adotavam, em suas constituições
p_elier, �-e 1791, abol�a totalmente na França o regime corpora políticas, os princípios da Revolução de 1789 levados ao extre
tivo, ahas de há mmto em decadência, e o Código Penal che mo e proclamados "imortais".
gava a punir a coligação de patrões ou de operários.20 Tudo
Assim surgiu a chamada "questão social", ponto de interse
isto em nome da liberdade de trabalho, por se achar que as anti- ção e de conflito entre o capitalismo e o socialismo. Tormen
tosa questão, manifestando um flagrante contraste entre as con
dições aflitivas da população, operária e o bem-estar da classe
19. �eja-se, em_ nota_ suplementar, a penetrante síntese de
Sombart sobre o capltahsmo, a secularização da sociedade e O Es burguesa, beneficiada pelo lideralismo e em plena euforia de
tado moderno. um otimismo progressista.
drásticas do C6digo Penal francês contra o A expressão "questão social" pode ser empregada em duplo
. _20. A;, dis��i�?es_
? Jreito � e _ coahza� _vier �m a ser mais tarde revogadas. Quanto sentido. Primeiramente, para significar o problema da vida do
a� assocraçoe� prof1ss1ona1s, na França, puderam novamente orga homem em sociedade, e como o homem é um ser naturalmente
m�ar-se depms �e 1884 (lei Waldeck-Rousseau). Veja-se a res s�ci�l êste prob�e�a se conh�nde com o da sua própria exi.s
:peit�, com
_ brevidade e clareza, a exposição sôbre o conteúdo, as . _
tenc1�. Num sigmficado mais restrito, ela se cinge ao campo
1mphcaçoes e as conseqüências práticas da doutrina individualis .
econo m1co, decorrendo das relações suscitadas pelo trabalho
ta e liberal feita por Diva Benevides Pinho em SINDICALISMO E
COOPERATIVISMO: EVOLUÇÃO DOUTRINARIA E PROBLE humano. Quando muitos falam em "questão social" aplicam
�t6� ATUAIS, São Paulo: Instituto Cultural do Trabalho:, pp. 13 êste têrmo às relações entre o capital e o trabalho, tendo em vista
sobretudo a produção dos bens e a remuneração do trabalhador.
40 J. P. GALVÃO DE SOUSA CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISMO 41
Na sua compreensão total, esta questão abrange os problemas emprêgo. Concorrência· entre empresários no afã de lucros
concernentes à produção, à repartição e à distribuição dos bens ilimitados, perecendo as pequenas emprêsas e concentrando-se o
materiais na sociedade, não se devendo, pois, esquecer o consu capital nas mãos de poucos privilegiados.
mo e os interêsses do consumidor. f A burguesia fizera a revolução liberal, em nome da "liber
Foi entretanto no tocante ao binômio capital-trabalho, ou !dade, igualdade e fraternidade". Por isso extinguira as corpo
mais precisamente, "empresário capitalista-trabalhadores indus rações, proclamando ampla liberdade de trabalho, e abolira os
triais", que o problema se constituiu em tôda a sua acuidade, ge privilégios da nobreza, invocando o princípio da "i_gu<!-ldade_de
rando as crises econômicas e abrindo o caminho para a revolu tQclQ_Lperant�". Mas os excessos da liberdade econômica
ção social. provocaram uma desigualdade entre os homens maior que a
Vimos que antigamente os trabalhadores tinham no lar a existente na Idade Média e no regime anterior à democracia
própria oficina, e depois do aparecimento da máquina foram liberal. Cavava-se um abismo entre as classes - a burguesia e o
forçados a se dirigir para as grandes fábricas. Os capitalistas proletariado - e a classe burguesa, amparada por uma leg i sla
construiam seus estabelecimentos, compravam o maquinário, ad ção individualista que a favorecia, era beneficiada pelo privilé
quiriam matéria prima e faziam produzir mercadorias em gran gio do dinheiro. Assim, em lugar da aristocracia constituia-se a
de escala. O que o trabalhador em sua casa levava um dia para plutocracia. 21
fazer, na fábrica podia ser feito numa hora. O produto assim Plutocracia e proletariado eram os dois polos da vida social.
fabricado, com rapidez cada vez maior, graças aos novos pro A concentração do capital processava-se ao mesmo tempo em que·
cessos técnicos, começava a ser vendido por um preço muito a classe operária ia sendo proletarizada, isto é, ficando numa de
abaixo do que custaria idêntica mercadoria produzida na ofici pendência servil e num estad9 de condições precárias de vida.
na doméstica. Os trabalhadores que ainda produziam em suas Generalizava-se o pauperismo, que não deve ser confundido.
casas não podiam suportar a concorrência e tinham que bater às com a pobreza.
portas das fábricas, tornando-se operários assalariados. "Pobres sempre os tereis convosco", foi a palavra de Cristo.
Por outro lado, o regime de ampla liberdade econômica das E a igualdade plena -entre os homens nunca passou de miragem
democracias modernas permitia ao patrão fixar à vontade o sa enganadora. Quando se tenta alcançá-la mais se agravam os de
' lário dos operários. A concorrência entre a máquina e o traba sequilíbrios sociais. Mas aquela desproporção enorme entre as
·lho humano começava a ser fatal para êste. Máquinas mais condições de vida das classes e o pauperismo - miséria genera
aperfeiçoadas lançavam no mercado o que antes, no mesmo pe lizada numa camada da população - resultava da falta de jus
ríodo de tempo, só poderia ser feito com 20, 50 ou 100 operá tiça e caridade nas relações entre os homens.
rios. Resultado: o desemprêgo. E resultado do desemprêgo: os , � deixava de ser respeitado na dignidade de_ uma.
salários baixos, que capitalistas sem consciência impunham aos \ ação humana, tornando-se simples mercadoria sujeita à lei da
trabalhadores para auferir lucros fabulosos. Um desempregado ,\ oferta e da procura. "Quebrava-se uma máquina?" pergunta
preferia aceitar o trabalho por um salário ínfimo a ter que mor � Olgiati, o eminente pensador e mestre da Universidade Cató-
rer de fome. Ou melhor ia morrendo lentamente, sem ter se lica de Milão. "Trovões, relâmpagos e raios. Arruinava-se um
quer o necessário para sustentar a família. E daí vinham outros
abusos: o trabalho das mulheres e das crianças, o trabalho no
turno, o regime de 10, 12, 14 ou até 16 horas de trabalho por 21. No direito civil, o individualismo encontrava sua expres
são máxima no Código Napoleão, a exemplo do qual outros códigns
dia, sem férias e sem respeito aos domingos e dias santificados. iam sendo elaborados, da mesma forma pela qual a Declaração dos
Concorrência entre a máquina e o trabalho humano. Con Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 e as constituições fran
corrência dos trabalhadores entre si na busca desesperada de um cesas eram imitadas alhures.
43
42 J. P. GALVÃO DE SOUSA CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISMO
h omem? A co isa era ou tra : a carne humana custava tão O mesmo autor transcr-evia êste trecho de Sismondi, apon
p ouco ..."22 tando uma das chagas da so ciedade moderna, a centra lização
exager*da, qu e em nossos dias acabou por levar ao totalitaris
E po ndera o mesmo auto r que o sucesso logrado pelo livro
mo: "O fim da sociedade, humana deve ser o progress o dos
���ital" de Marx foi devido não tanto às teorias acêrca do homens e não o das c,o isas. i A centra lização aperfeiç oa ludo nas
tra balho� do valor aí contidas, mas principalmente à documen
t ação que reproduzia dos inquéritos ofici ais ingleses denuncian coisa s, é verdade; ao revés.( destrói tudo nos homens._/ A inde
do ignomínias e monstruosidades das mais clamorosas no mundo pendência dos pequenos povos foi abso rvida pela cehtra lização
industrial. po lítica ; os direitos provinciais, absorvidos pela centralização
legislativa; os direitos municipais, pela centralizaç ão a dministrati
.EI? 1891, pela Encíclica Rerum novarum, o Papa Leão
va; os direitos dos ofícios, pela grande indústria ; os direitos do
XIII tmha palavras fortes para verberar a cobiça de uma con
comércio, pelos grandes magazines ; os direitos dos pequenos
co rrên_ c_!a desenfrea�a: a usura voraz e o pesado jugo impos to à agricultores pelos latifúndios ".2�/
mult1dao de proletan os por u m pequeno número de ricos e
o pulentos.23
A democracia moderna, vendo na so ciedade uma simples
soma de indivíduos, reunidos para constituir o poder do Esta
Dois anos a ntes da Rerum novarum, o Marquês de La Tour
do pelo sufrágio universal, s ó ao Estado atribuia funções de
du Pi':} desc:evia a situ�ç�o de contras te entre uma parte da po- ·
organizar a vida social. Deixava de reconhecer os direitos dos
p ulaçao nac10na l q':1e v1v1a de rendas ou especu lações , economi
agru pamentos intermediários existentes entre a família e o Es
zando cada vez ma is, e ou tra que não podia economizar nada .
tado. D aí a centralizaç ão político-administrativa, correndo pa
Ao mara vilhoso desenvolvimento do maquinismo e ao aperfei
r alelamente com a centralizaç ão econômica e a concentração
çoamento dos processos de produ ção não corres pondia, de forma
financeira do capitalismo industrial e bancário, decorrentes da
algu ma, um acréscimo proporcional do bem-estar dos o perários, aplicação de critérios individualistas pelo liberalis mo .
dos lavradores, dos pequenos produto res que não podiam exer
cer a usura antes l?e sofriam a s deletérias conseqüênci as . La A questão social era o caldo de cu ltu ra para a germinação
: . do sociali smo e do co munismo. A classe bu rguesa, depois de
Tour du Pzn qualificava a usu ra de "g��!'º da econo mia social
-�ode,rna.". E preconizava uma reforma do regime ec-;;;;6�ico ter feito a revoluç ão liberal, tornara- se a classe co nservadora e
do seu tempo, bem co mo do regime p olítico que o sustentava, diante dela se agitava o proletariado industrial urbano dirigido
sob pena de s erem destruidos por u ma revo luç ão sociaJ.24 pelas novas minorias revolucionárias.
da economia, leva à conquista do p oder político, cuj os recursos sem anal, ao trab alho das mulheres e dos menores, às condições
e influências sã o explorad os na luta econômica . Além de dis de higi·ene nas fábr icas, ao salário mínimo, a férias remunera
putar a direção do Estado, ou pelo menos exercer uma pressão das, à aposentadoria, à instituição de abonos e de seguros, etc.
sôbre os govern os, as fôrças econômicas são arrasta das, na defesa Por sua vez, os sindicatos organizavam a classe operária para
de seus interêsses ou n a dinâmica do seu expansionismo, ao ter a defesa dos seus dir eitos. Surgindo em alguns países como
ren o internacional. Por vêzes os Estados põem o seu poder a re ação contra o individualismo do direito liberal-burguês, f r e
serviço dos grupos econômicos, out ras vêzes prevalecem-se dêstes qüentemente os sindic�t o_s tcirnava;11_-se inst�umentos da luta �e
p ara resolver litígios políticos. 26
classes pregada por socialistas de van os. matizes e pelos an arq ms
o,
Lenin via no imperialismo a "última etapa do capitalismo". t as. Enquadrados na estrutura legal e reconheci_dos pelo Estad
entre_ as
Entretanto, não nos devemos esquecer de que h ouve imperialis em muitos país es contribui am para o entend1men _to
mais eficaz plicaç ã d s n rmas leg ais . �ob ms
mo em p aíses de capitalismo incipiente, como o J apão e a Rússia classes e para a o a o
.
eiçao , ten
antes da primeira guerra mundi al, e por outro lad o· o sistema piração da Igreja, o sindica�is �o assumia . u�na nova f
��pitalig� alcançou g rande desenvolvimento n a Suíça se�- ma� dendo a completar-se p ela 1de1a corporativ ista.
nifestação de n enhuma tendência imperialista. · -�-- O sindicat o, por definição, é uma associaçã� _de classe, ao
_ como _os
De qualquer f orma, o capitalismo continuou a sua marcha, passo que a corporação abrange tanto os empres anos
pr duçã mdust nal
em nosso século, c om a propagação d o crédito, o aumento das trabalhadores de um determinado ramo da o o
dução e das condições de trabalho, bem como a fiscalização do Houve patrões que tomaram a iniciativa de distribuir aos
comércio, para reprimir os possíveis abusos. Grande parte desta operários benefícios acrescidos ao salário, prestando:lhes uma
tarefa é o que se encontra hoje disciplinada pelas legisla assistência social reparadora da iniquidade de um sistema sem
ções trabalhistas. E o fascismo, em vez de reconhecer a autono entranhas. Desta forma procuraram enfrentar os argumentos de
mia das corporações com um poder normativo e disciplinar pró injustiça dirigidos contra o regime capitalista, amenizando a
prio - correspondente ao poder legislativo do Estado e à atual sorte dos trabalhadores dêles dependentes e melhorando-lhes as
Justiça do Trabalho - o que fêz foi instituir a corporação como condições de vida. A isto se denominou o capitalismo· paterna
um órgão do Estado, sujeita ao contrôle político do partido lista, expressão atualizada do conservadorismo burguês.
único. Dêste tipo de capitalismo e daquele capitalismo retrógrado,
Além do sindicalismo e do corporativismo, deve-se levar em que mantém os vícios do individualismo liberal, distingue-se o
conta o desenvolvimento do cooperativismo, com amplas possi capitalismo orgânico, abrindo possibilidades para o trabalho ser
bilidades de restaurar a união entre capital e trabalho outrora regulamentado em têrmos de igualdade com o capital.
existente. As cooperativas mais numerosas são as de consumo,
Assim, no caso dos contratos coletivos de trabalho, vemos
tendo sido feitas algumas experiências de cooperativismo de pro
o patrão ou os representantes de uma associação patronal dis
dução no âmbito d1.s pequenas indústrias.
cutindo com os membros do sindicato de trabalhadores sôbre
A cooperativa corresponde, pois, à organização da emprêsa, as cláusulas a serem concluídas no acôrdo que se procura esta
o sindicato à organização da classe e a corporação à da jJro belecer. O contrato coletivo fixa as normas a vigorarem daí
fissão.21 por diante para tôda uma categoria profissional, normas estas
O ideal de harmonia e entendimento entre as classes en elaboradas sem interferência go·vernamental pelos interessados
controu, nestes últimos tempos, uma forma bastante expressi diretos, isto é, patrões e operários.
va no domínio dos contratos de trabalho: a contratação coletiva.
A experiência dessa modalidade contratual, notadamente
Na época do liberalismo manchesteriano, tais contratos eram nos Estados Unidos e na Alemanha, tem produzido os melhores
equiparados aos de locação, se não mesmo aos de compra e ven resultados. Salários, férias, condições de trabalho, greve e
da, uma vez que o trabalho entrava no rol das mercadorias re lockout, soluções de conflito e outras várias matérias constituem
gidas mecânica e inflexívelmente pela lei da oferta e da pro�ura.
o seu conteúdo, daí resultando um verdadeiro "traço de União"
O salário media-se simplesmente pelo valor dos bens produzidos, ou de compreensão entre o capital e o trabalho.29 Nos Estados
sendo dado a título de ingrediente do preço de custo do produ
to. Com a formação do direito do trabalho distanciado cada
vez mais do individualismo jurídico, a devida atenção começou balho convenci onado, se não procuram um ao outro, na medida em
a ser dada às condições pessoais do operário e de sua família.28 que isto depende dêles, o que cada um precisa para levar uma vida
honesta segundo o seu estado. E para o homem de qualquer estado
as exigências de uma vida honesta são: a posse de um lar, meios
27. J. P. Gailvão de Sousa, SOCIALISMO E CORPORATIVIS de aí educar sua famíla segundo sua condição e a possibilidade de
MO EM FACE DA ENC1CLICA "MATER ET MAGISTRA", São poupar ( épargner) tendo em vista os seus últimos dias, quando
Paulo: Edição Saraiva, 2.ª parte, capítulos V a X; Editôra Vozes, não puder mais trabalhar" (La Tour du Pin, obr. ci,t., pág. 12).
Petrópolis·, principalmente à pág. 46. Do mesmo autor, POLÍTICA
29. J. V. Freitas Marcondes, "O CONTRATO COLETIVO DE
E TEORIA DO ESTADO. TRABALHO COMO BASE DO DIREITO SOCIAL NORTE-AME
28. Em 1882, quando campeava o liberalismo, escrevia La RICANO, publicado na Re�ista de UCBEU, São Paulo, n. 3, De
Tour du Pin: "O empresário e o operário não fica11;1 quites em boa zembro 1957, e A SOLUÇAO IDEAL DAS "GRIEVANCES" NA
justiça quando trocam unicamente o preço convenc10nado pelo tra- CONTRATAÇÃO COLETIVA DE TRABALHO, em PROBLEMAS
50 J. P. GALVÃO DE SOUSA CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISMO 51
Unidos há atualmente mais de cem mil contratos coletivos em lorização do trabalho, na realização daquela fórr_nula: a natureza
vigor. Na Alemanha tendem a desaparecer os contratos indi cada vez mais dominada, o trabalho cada vez mais dominante
viduais de trabalho. Noutros países, como a Inglaterra, a Fran e o capital cada vez mais proporcionado.
ça, a Itália, o México, o Canadá e o Japão, a contratação cole Entretanto, êsse ideal encontra pela frente as duras realida
tiva é também uma realidade. Entre nós, já existe o instituto des do mundo econômico de nossos dias. O capitalismo liberal,
de longa data, mas tão sàmente no papel, esboçando-se timida baseado na livre concorrência e iniciado com as pequenas uni
mente alguns ensaios. dades de produção, já foi ultrapassado. Em seu lugar, não obs
O grande valor do sistema de contratação. coletiva, coma tante as restrições legislativas, o incremento à pequena proprie
meio de solucionar os problemas das relações enti:e o _çªpit<:11� dade e a multiplicação das riquezas, prevalecem hoje o capita
,.o_tt.aba}ho, está na oportunidade oferecida a estas duas catego lismo dos monopólios e dos oligopólios e o capitalismo de Es
rias para resolverem as questões que lhes dizem respeito com tado, deixando o terreno preparado para a máxima concentra
plena autonomia em face dos poderes públicos. O Estado ção do capital, nos regimes socialistas.
não deve imiscuir-se, e a Justiça do Trabalho, tal como a temos
presentemente no Brasil, pode assim ser substituída por um ins
trumento muito mais eficaz para a solução dos dissídios.
O bom resultado do sistema depende de um sindicalismo
bem constituído e de líderes sindicais devidamente capacitados.
Mas o que sobretudo importa é que reine, entre patrões e ope
rários, aquela mútua e sincera compreensão cuja fonte só pode
ser a prática da justiça e da caridade decorrentes da doutrina
cristã bem conhecida e vivida. Do contrário, em vez de ser ex
pressão de um legítimo solidarismo entre as classes, torna-se o
sistema de contratos coletivos uma espécie de institucionaliza
ção da luta de classes.
Sindicatos, cooperativas, organizações corporativas e final
mente o instituto do contrato coletivo vêm contribuir para a va-
;�
., -
"b) Cada um vai atrás de seus "interêsses" de forma a deve acrescentar-se o monopólio dos contratos de trabalho e dos
romper os laços de ligação de "comunidade" solidária que re papéis de crédito, que se tornaram o quinhão de um pequeno
pousavam sôbre o princípio "todos para todos", laços que só número de ricos e opulentos, impondo um jugo quase servil à
na família continuam a ter uma existência lânguida, a se ex imensa multidão de proletários".
tinguir lenta e indeclinàvelmente. Relações sociais contratuais Aí vemos apontadas quatro causas, que se reduzem tôdas
unem uns aos outros, e todos se inclinam ao princípio "cada ao liberalismo, causa destas causas. Assim, temos:
um para si". O que significa que os homens não mais estão 1) abolição das corporações de ofício (em nome da liber
ligados por sentimentos, simpatias, mas por "interêsses" de qual dade de trabalho, no sentido individualista);
quer espécie. 2) laicismo ou secularização das leis e das instituições po
"c) O Estado se m.ostra "fraco" diante desta luta de in lítica, com a separação da Igreja e do Estado;
terêsses. Prevalece a tendência de inclinar-se ante os mais fortes 3) usura (atividade econômica separada da moral);
grupos de interêsses e pôr nas mãos de seus· representantes a 4) concentr ação do capital nas mãos de poucos e prole
direção do Estado, a influência decisiva na direção do mesmo. tarização crescente.
O mais alto interêsse da política interior do Estado parece ser, Patenteia-se assim que a questão social, mesmo no senti
em todo caso, o "equilíbrio" dos vários interêsses privados ou do econôm ico, isto é, no concernente às relações entre o capital
interêsses de grupos ou a prosperidade de cada um dos cidadãos. e O trabalho, é fundamentalmente uma questão moral e religio
Isto significa precisamente que a posição do Estado, no con sa, e tem ainda os seus aspectos políticos importantíssimos de
cernente ao seu procedimento na política interna, é pronuncia que não se deve descurar.
damente individualista-nominalista" (págs. 49-50) . Reduzí-la, com critérios marxistas, a uma questão meramen
te econômica é falseá-la numa visão incompleta, unilateral e
superficialíssima, impossibilitando qualquer solução.
2. As causas da quetão socíal segundo a Rerum novarum.
i
1
A gênese da questão social, no sentido estrito, isto é, da \
crise oriunda do conflito entre o capital e o trabalho no século 3. Liberalismo, socialismo e concepção cristã do trabalho.
passado, foi indicada por Leão, XIII, na Encíclica Rerum nova
"Há três escolas irredutíveis em economia social:
rum nestas poucas palavras que elucidam o assunto melhor do
que muitos e muitos volumes escritos acêrca do apaixonante te "aquela em que se considera o homem como uma coisa;
ma: "O século passado destruiu, sem as substituir por coisa al "aquela em que êle é conceituado como um animal;
gu�a, as antigas corporações de ofício, que eram para os ope "aquela em que êle é estimado como um irmão.
rários uma proteção. Os princípios religiosos desapareceram das "Eis alguns exemplos ao vivo:
leis e das instituições públicas. Assim, aos poucos, os trabalha "Seja o problema da justa remuneração do trabalho: para a
dores, isolados e sem defesa, viram-se, com o correr do tempo, primeira escola, a medida dessa remuneração está numa fração
entregues a mercê de senhores desumanos é a cobiça de uma con arbitrária do valor venal acrescentado pela mão de obra à ma
corrência desenfreada. A usura voraz veio agravar ainda mais o téria prima; ela é determinada pela "lei da oferta e da procura";
mal. Condenada muitas vêzes pelo juízo da Igreja, não tem dei "Para a segunda, ela está no valor social, isto é, no esfôr
xado de ser praticada, sob uma ou outra forma, por homens ço feito pelo trabalhador em vista de uma relação à coletivida
ávidos de ganância e de uma insaciável ambição, A tudo isto de da qual êle faz parte; ela é determinada pelo Estado;
J. P. GALVÃO DE SOUSA
que poderíamos chamar de Nação e Estado, há socialismo sem sucção das sociedades menores pela coletividade t�tal: E de tudo
_
pre que uma sociedade maior ou menor, completa ou incom isto resulta: igualitarismo na sooedade e totalitarismo no Es-
pleta, pública ou privada, usurpa os direitos de seus membros tado.
ou os de outra comunidade inferior, retendo-os e exercendo-os O socialismo implica uma espécie de mística igua�itária. A
em nome da coletividade injustamente detentora" 2 Donde o "
desigualdade na repartição �os bens, acarre_ta__,ndo_ mmtas vezes
concluir o autor que houve socialismo na primitiva família ro a miséria de pessoas que vivem em cond1çoes mfra-hu�anas,
mana tanto quanto no Estado federal da Civitas, nas repúblicas desperta naturalmente nos corações :�mpassi_v�s �m dese10 de
gregas e nos impérios asiáticos. Em Roma, a família absorvia melhorar a sorte do próximo e corrigir as m3ust1ças. · Nao se
os direitos dos seus membros, subordinados exageradamente ao · deve, porém, confundir socialismo com justiça social. O bom
poder despótico do chefe, o qual a princípio tinha até mesmo uso dos bens materiais e mesmo, em alguns casos, uma reform,a
o direito de vida e de morte sôbre os que lhe estavam sujeitos; profunda das estruturas sociais, quando estas s: tornam ob��a
e a Cidade usurpava os direitos das famílias, pelo confisco dos . _
culos ao bem estar de tôdas classes, são 1mperauvos de J_ustrça.
bens e a imposição do culto público. Mas disto não se conclui que a propriedade privada de tais bens
Com a transformação do mundo antigo pelo Cristianismo, deva ser abolida, nem que a constituição das sociedades deva
o socialismo nêle exisi:ente desapareceu. A Idade Média foi de ser alterada ao ponto de estabelecer uma igualdade absoluta
nominada a "idade de ouro das comunidades". Valorizou-se em entre os homens.
primeiro lugar a família, e segundo o modêlo da família foi Ora, o socialismo parte da supressão da propriedade privada
estruturado o Estado. Outras comunidades de diversas naturezas do bens de produção para chegar a uma sociedade �!!1 classes,
- as comunas ou cidades (que, em Portugal, eram os "conce em que todos sejam iguais.
lhos") , as agremiações corporativas de artes e ofícios, as comu . .
· Nesses dois pontos fundamentais, o pensamento sooalrsta
nidades religiosas - floresceram num regime de ampla autono
vai contra a natureza humana e contra a realidade atestada pela
mia em face do poder real, que se identificava com o Estado
experiência histórica dos. p·ovos. A �ivisão _entre os bens, daí
e tinha atribuições restritas, mínimas se as compararmos com as .
resultando a propriedade particular, e o me10 mais na_tural, <le
funções do poder político na antiguidade e nos Estados modernos.
realizar o efetivo domínio da natureza pelo homem, isto e, a
Tais comunidades, longe de sufocarem os indivíduos que utilização das coisas materiais necessárias para a vi�a. E?tretan
delas faziam parte, contribuiam para que êles se expandissem to, cumpre ter presente que a todos os home�s _ e preoso as�e
livremente no cumprimento da sua vocação pessoal. O grupa- .-,,1"
·1
gurar esta utilização, donde as limitações ao d1re1to de propne
)ismo medieval nada tinha de coletivista, e o que caracteriza o d ade, cuja função social deve ser r:speitada, impedindo-o de_ se
socialismo é exatamente o coletivismo, isto é, o enquadr�mento ton1ar um direito absoluto e egoístico de usar e abusar da corsa,
. dos indivíduos numa coletividade planificada pelo Estado de exercido por alguns privilegiados em proveito próprio e. co�n
um modo compulsório, tendo em vista estabelecer uma padroni prejuízo de muitos. Quanto à desigualdade e à d1fere_nc1açao
zação da vida para realizar o ideal da plena igualdade entre os
de classes são de tal maneira inerentes à organização social, q ue
homens. A aspiração igualitária é a mola do socialismo moder
sempre �ue se quer alterar êste estado de coisas com vistas �
no. Daí decorre a atribuição à coletividade, representada pelo um nivelamento completo entre os homens, surgem nov_os cri
Estado, de amplos poderes de regulamentação social, a ponto d e térios de diferenciação e a igualdade plena jamais é atingida.
fazê-la absorver direitos dos indivíduos e das famílias. Há uma
Vimos que o liberalismo, extinguindo os privilégios da no
breza, não conseguiu evitar que se constituísse uma out:a clas
2. E. Gil Robles, TRATADO DE DERECHO POLíTICO, se privilegiada, a burguesia, com a sua superioridade sooal fun
Salamanca: tomo II, 1902, pág. 209. ,j- dada na posse das riquezas. Por sua vez, o socialismo, querendo
.::rr : -
::'.
64 J. P. GALVÃO DE SOUSA CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISMO 65
nivelar econômicamente a todos, não pôde evitar, na Rússia so Crescem os poderes e as atribuições do Estado, mas a igual·
viética, onde foi pela primeira vez pôsto em prática, o apareci dade sonhada pelos socialistas continua sendo uma enganadora
mento de uma "nova classe" de militares, altos funcionários, téc miragem. Por isso tôda a história_ do socia\ismo tei:n sido uma
nicos e dirigentes do partido. É bem sig·nificativo o fato de, na oscilação perpétua entre_ êsses dois polos: a utopia da pl:na
_
quele país, em certos meios de transporte coletivo existir uma io-ualdade numa sociedade sem classes e a realidade do totalita
"segunda classe" a preços mais módicos do que a primeira. rismo, realidade que foi a do mundo antigo e está sendo hoje
a dos países comunistas.
É certo que os homens, considerados na sua natureza racio
nal, na sua origem e no seu fim, cg_mo criaturas de D�s, aJ)e.us J No dizer do conheódo escritor socialista Paul Sweezy, pro-
fessor universitário e homem de administração pública, a pala
�_iguais. Mas n�o é �enos �erto· que não �á _u�n vra socialismo tem assumido dois significados distintos: por um
homem igual a outro quanto as part1culandades da constitmçao
}ado, desio-na um nôvo tipo de sociedade; por outro, o movimen
orgânica, do temperamento, da inteligência, dos talentos e ap
to que se° empenha em substituir a ordem social reinante por
tidões de cada um. Estas diferenças não podem deixar de se re
êsse nôvo tipo. Ambos os significados se r�lacionam. Quand?
fletir nas relações sociais. Os filhos dependem dos pais, aos quais
alguém alude ao socialismo ame�ic�no, tem em vista º movi
devem naturalmente submissão e obediência. A autoridade, sem .
mento visando à realização do soe1ahsmo nos Estados Umdos; e
cujo princípio é impossível a vida social, requer uma diferença
quando trata do socialis�o so�iético, a referê�cia fei�� �oncerne
entre governantes e governados. A hierarquia militar, outro
ao sistema social e político vigente na Umao Sovietica. Na
, princípio indispensável para manter a ordem e a paz numa socie Rússia, antes de 1917, "socialismo" exprimia um movimento, ao
l
\ dade, acarreta legítimas desigualdades. Da mesma forma na or
dem econômica, se a todos devem ser abertas oportunidades de
1 melhorar suas condições, não é justo que aos mais capazes e de
passo que hoje a mesma palavra vem enunciar um sistema
social. 3 1
O movimento socialista, impulsionado por uma aspiração
r
:, maior iniciativa se impeça de granjear uma situação mais fa
1
vorável, da qual poderão advir benefícios para muitos outros.
Transferindo a propriedade dos bens de produção para a
de justiça, que em alguns pode ser muito sincera, mas é sempre
viciada pelo falso critério do igualitarismo, torna-se, por isto
mesmo, sempre utópico. O sistema socialista, que_ acaba por pre
coletividade, isto é, para o Estado, que representa a coletividade e valecer na realidade, é o de um Estado com ma10r ou menor
deve tomar a seu cargo a administração dêsses bens, o socialismo, intensidade eivado de totalitarismo.
por uma dinâmica incoercível, conduz a uma grande centraliza Enquanto movimento de idéias, aspiraçã� reforn:ista e pr��
ção político-administrativa. Além disto, a igualdad: absoluta gação revolucionária, o socialismo tem revestido vánas modah
almejada pelos socialistas só pode ser realizada mediante uma dades, mas os seus adeptos estão sempre de acôrdo em condenar
imposição do poder público, ao qual cabe reprimir as inevitáveis a propriedade privada na sua utilização lucrativa e na sua trans
tendências dos homens para se sobreporem uns aos outros e rom missão pela herança.
perem o círculo dessa igualdade. .A..s democracias liberais, ado
A partir de Karl Marx, tôdas as correntes socialistas recebem
tando o lema de 1789 - "Liberdade, igualdade, fraternidade" -
a sua influência, mais sensível numas do que noutras. 1viarx e
acabaram por sacrificar a igualdade em virtude da liberdade de Engels, autores do Manifesto Comunista, contribuíram, mais do
sordenada que admitiam, provocando, pelos excessos da livre que quaisquer outros, para que o socialismo passasse a ser uma
iniciativa e da livre concorrência, a concentração do capital e a ex
ploração da classe proletária. O socialismo, para corrigir tais
abusos e implantar a igualdade entre todos, imola a liberdade 3. Paul M. Sweezy, SOCIALISMO, ( tradução portuguêsa)
nas aras do Estado totalitário. Rio de Janeiro: Zahar Editôres, pág. 27-28.
66 J. P. GALVÃO DE SOUSA CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISMO. 67
nova concepção da sociedade e da vida humana, na linha do natu possível extirpá-lo por meio de instituições adequadas. Assim,
ralismo e do cientificismo dominantes em certas esferas intelec pois, considera que a reforma social não supõe nem requer a
tuais no século passado. São bem significativas estas palavras de reforma interior do homem, mas, ao contrário, a nova socieda
Engels, .R-m!!ridas nos funerais de l\Jarx: 1 "Como Darwin des de é que reformará o homem, trazendo-lhe um estado de bem
cobriu a lei da evolução na natureza orgânica, assim Marx des -aventurança. Finalmente, atribui à classe proletária, através
cobriu a lei da evolução na história humana".J da revolução, o cumprimento dessa missão redentora.
-i,,Segundo 1\,1.arx e Engels, a sociedade moderna, que tem por Marx atribuiu ao fator econômico uma primazia entre todos
uma das bases o re&peito à propriedade, há de se transformar os mais nas relações humanas. Nisto consiste o "materialismo
fatalmente sob a pressão das leis econômicas. Na sociedade do histórico", segundo o qual a ordem econômica é uma estrutura
futuro a propriedade privada será substituída pela propriedade fundamental, determinando o sentido das instituições políticas
coletiva, ao mesmo tempo em que desaparecerá a exploração do e da cultura, as ideologias e até mesmo as crenças religiosas. Aí
homem pelo homem. Donde uma espécie de paraíso na terra,
está a consagração máxima do "homem econômico" produzido
que se tornou o mito do socialismo, ao mesmo tempo em que
pelo capitalismo ao fazer a vida girar em tôrno do dinheiro e dos
êste se corporificava nas organizações revolucionárias interna
cionais. Dêste caráter mítico vem a fôrça expansiva do socialis lucros.
mo nas massas da civilização industrializada. 4 Vemos assim como o capitalismo traz em suas entranhas o
A transformação assim anunciada trará, segundo os socialis socialismo. O próprio Marx ensinava que o regime comunista,
tas, a felicidade completa entre os homens. lvlarx atribuia às estru inaugurando uma nova fase na vida da h�manidade, deveria
turas do mundo capitalista as causas do mal estar social, da mi resultar de um amadurecimento das condições criadas pela so
séria, da corrupção. Através de novas e melhores estruturas, o ciedade capitalista industrial.5 Acontece, pois, neste caso, 0 in
próprio homem seria melhorado. Com a sua visão naturalista, verso do ocorrido no mito de Saturno: enquanto Saturno devo
chegando mesmo a um materialismo radical, não foi capaz de rava os próprios filhos, o socialismo vem tragar o capitalismo
entender o sentido destas duas realidades, incompreensíveis fora que o gerou.
dos ensinamentos da Revelação: o pecado e a morte. Se não --.:i;/ O socialismo é um fenômeno típico das democracias de
era otimista como Rousseau, que defendia a tese do "homem na massas do nosso tempo. Vimos que o liberalismo, dissolvendo
turalmente bom", há entretanto no fundo do seu pensamento os agrupamentos corporativos, deixou os indivíduos à mercê de
algo de semelhante. Para Rousseau, o homem no estado de na si mesmos, em face do Estado. Dêste mesmo esquema, falsean
tureza é bom e a sociedade o corrompe. Para l\1arx o mal te111 do a realidade histórica, parte o socialismo: vê na sociedade po-
origem sobretudo numa organização social defeituosa, sendo
4. A concepção marxista dá ao socialismo, por fundamento, 5. Precisamente por isso - escreve Sornbart - Marx teve uma
uma filosofia materialista. A natureza material, independente do seu atitude pasitiva e de afirmação para tudo o que há de essencial no
Criador, passa a ser considerada uma fôrça absoluta, determinante mundo capitalista, e as noções essenciais' da sua teoria econômica
de tudo o mais. Daí uma nova concepção da moral e uma religião foram, como veremos adiante, tiradas da economia liberal clássica.
secularizada. Para o líder socialista francês Léon Blum o socialis "Como teria podido, para empregar sua própria imagem, desprezar
mo "é uma doutrina, um sistema de moral e quase uma religião", e odiar a mãe que já trazia em seu seio o filho ardentemente dese
confirmando-o Jules Moch ao qualificar o socialismo "uma religião jado, o mundo nôvo e melhor? Marx foi, pois, inteiramente otimis
leiga". Vejam-se POUR ."ÊTRE SOCIALISTE de Léon Blum e S0- ta quanto ao futuro da civilização" (W. Sornbart, DER MODERNE
CIALISTE VIVANT de J. Moch. KAPITALISMUS, volume citado, prefácio, pág. 20).
68 J. P. GALVÃO DE $OUSA.
cooperativista. Nos ú ltimos anos de sua vida, anunciava a vin tecipa a Marx, e como êste considerava que não p odem haver mo
da do reino de Deus sôbre a terra, numa era de virtude e feli dificações na ordem social sem se modificar o regime da pro
cidade. "Os tempos estão próximos" - proclamava Owen - e priedade. Engels, no seu ANTI-DüRING, louvou a "genial
assim, partindo de um paternalismo patronal acabava numa es amplidão de vistas" de Saint-Simon.
pécie de messianism o social ou mi lenarismo leigo.7 Quanto a Proudhon, foi um escritor cheio de p osições con
No seu pensamento encontramos a idéia de que a sociedade traditórias. Po r vêzes, parece colocar-se numa linha de pensa
P?de ser reformada mediante a constituição de pequenas comu mento tradicionalista, é apologista entusiasta das pequenas uni
dades sociais contra o estatismo, preco niza o federalismo e o
mdades exemplares. É a mesma idéia de Fourier e Cabet no
mutualismo . Mas um dos p ontos centrais do seu pensamento
socialismo francês da primeira metade do século XIX. Fo�rier
foi a revolta contra a própria idéia de Estado, fazendo- o chegar
preconizava as "falansterias", sociedades fechadas de cêrca de
à concepção de uma sociedade em que o p oder p olítico fôsse
l .600
_ pessoas, que deviam assumir tôdas as funções e exercer
extinto e substituído por livres acordos entre os trabalhadores.
diversos ofícios, revezando-se e substituindo-se umas às outras
Criticava a concepção democrática de Rousseau, por conduzir
para evitar o s males de uma exagerada especialização. Fourier
ao despotismo da "vontade geral", e opunha-se a tôda autorida
�ão era _comunista, confiava na reorganização da s�ciedade pela
livre -ª�ª? dos seus �1embros, opunha-se a um regime político de, tanto a da Igreja como a do Estado. Sua doutrina era vis
autontano e centralizad or. Em sentido contrário, Cabet, autor ceralmente anti-re ligiosa e foi inspiradora do anarquismo. No
seu livro QU'EST-CE QUE LA PROPRIÉTE? afirmava que
da VOYAGE E� I��RIE, colocav�-se na linha radical do pen
a pro priedade é um roub o.
samento revoluc10nano de 89 e considerava que a verdadeira de
mo cracia está no comunismo. Ambos suscitaram algumas ex Ao contrário de Louis Blanc, adepto de um so cialismo go
periências de organizações sociais, inc lusive nos Estados Unidos, vernamental e da revolução pelo poder, Proudlzon batia-se por
experiências que fracassaram totalmente após uma existência um socialismo estritamente democrático com a revolução feita
efemera. pelo povo. Rompeu com Marx, que o chamava de charlatãt),
mas a sua idéia de uma sociedade sem Estado passou para o
Mais importantes, na primeira fase do so cia lismo moderno
marxismo. Marx escreveu a MISÉRIA DA FILOSOFIA con
são os nomes de Saint-Simon e Proudhon.
tra a FILOSOFIA DA MISÉRIA de Proudhon; alguns anos
Saint-Simon, de �amília aristocrática, propunha a criação antes, comentando o l ivro de Proudhon sôbre a propriedade,
_
de um Estad o mdustnal fundado na explo ração das riquezas do dissera tratar-se de uma obra fundamental que vinha tornar
globo e em _ , q�e o govêrn _
o co ubesse à classe ocupada no s traba possível a revolução da eco nomia política.8
l �o s mais �teis, e�p�cia lme�1 �e os sábio s e o s técnicos. Apolo Costuma-se dizer que com Marx e Engels tem início o so
1s
? � a das elites � ocia1s, admitia a desigualdade e o principa l o b
cialismo científico, terminando -a fase dó socialismo utópico.
J�tivo do seu sistema era a o rganizaçã o da ec o nomia e do cré Isto porque o marxismo pretendeu estabelecer leis de validade
_
dito, situand o os banqueiros no ponto mais alto da hierarquia universal explicando cientificamente o desenvolvimento das so-
social.
P or alguns aspectos da sua obra, Saint-Simon afasta-se das
soluções socialistas, mas na sua crítica à economia liberal se an- 8. F. Olgiati, CARLO MARX, Milão: Vita e Pensiero, 6.ª edi
ção, cap. VIII, págs·. 235 a 249. Não obstante suas críticas a Rous
seau, Proudhon é, como nota êste autor, "um filho da Revolução
7. /. Touchard, HISTOIRE DES POLITIQUES' Paris: cole- francesa, da qual quer ser um continuador, respirando numa atmos
ção "Thémis", P . U . F., II, pág. 555. . fera ilurninística" ( pág. 241).
CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISMO
72 J. P. GALVÃO DE SOUSA 73
ciedades. Os autores do Manifesto Comunista repeliam o que futuro deve dar-se_ pela ditadura revolucionária do proletariado,
denominavam o socialismo feudal e o socialismo pequeno bur idéia que será mais tarde posta em prática por Lenin.lo
guês - formas do socialismo reacionário - bem como o socialis Depois do congresso de Gotha foi organizado o Partido So
mo sentimental e literário. Julgavam ter descoberto o verda cial Democrático da Alemanha, vindo êste a ser O partido so
deiro socialismo, alicerçado numa nova filosofia e na crítica cialista mais considerável antes da primeira guerra mundial. Os
científica do capitalismo. A filosofia era o materialismo histó social-demo�ratas alemães exercerai_n grande influência na Segun
rico e a crítica ao sistema capitalista levava à teoria econômica da Internac10nal, fundada em Pans em 1889, durante comemo
da mais-valía.9 rações do centenário da Revolução francesa e reunindo dele
O Manifesto Comunista terminava com aquêle apêlo: "Pro gados de 16 países europeus e dos Estados Unidos. A Seo-unda
letários de todos os países, uni-vos". Esta conclamação era reno Internacional, com a cooperação de partidos socialistas, durou
vada anos mais tarde em Londres, pelo próprio Marx, no dis até o início daquela guerra, em 1914. Nela se refletiram as
curso de abertura de um congresso operário no qual se consti três tendências da social-democracia germânica: esquerda, direi
tuía a Associação Internacional de Trabalhadores, mais conhe ta e centro. Na Alemanha os líderes dessas tendências foram
respectivamente Rosa de Luxemburgo, Kautsky e Bernstein.
cida como Primeira Internacional.
Rosa de Luxemburgo e Kautsky mantinham-se mais adstritos ao
l
Daí por diante foi a Alemanha o país em que o socialismo
marxismo ortodoxo, ao passo que Bernstein proclamava a neces
alcançou maior expansão, atuando politicamente e tendo que sidade de rever o marxismo em face dos acontecimentos ocor
enfrentar o govêrno de Bismarck. Formaram-se duas alas no ridos após a publicação das obras de Marx. Assim nasceu 0
socialismo alemão, destacando-se à frente de uma delas Lassalle chamado socialisníÕ�revisfofüsta;ll
e da Outra Wilhelm Liebknecht e August Bebel. Deu-se a fusão Os elementos radicais da esquerda, diante da marcha do
destas correntes num congresso realizado na cidade de Gotha, capitalismo para um período de crises e guerras, que julgavam
em 1875. Daí resultou o Programa de Gotha, recebido com res
trições por Afarx, que criticou alguns de seus itens mais impor
tantes. A Crítica do Programa de Gotha tornou-se um dos do 10. P. Sweezy, ob. cit., pág. 31 e H. Chambre DE MARX A
cumentos clássicos do pensamento marxista e aí Niarx faz ver MAO-TSE-TUNG, tradução portugu�sa, PUAS CIDÁDES, pág. 191.
que a transição do capitalismo para a sociedade sem classes do No ano de 1870, a Comuna de Pans fora uma tentativa da classe
operária para se .apossar do poder e instituir uma ditadura revolucio
nária. Do malôgro d�ssa experiê _ _ncia, não dirigida por marxistas,
decorrera uma repressao pre1udicial ao movimento socialista na
9. Um dos principais livros de autoria de Enger!s é o ANTI França.
-DüHRING, do qual foram extraídos alguns capítulos para formar, A social-democi:_acia f�� ini_c�lme�te uma expressão do soe
. 11.
em edição à parte, a brochura SOCIALISMO UTÓPICO E SOCIA ciah. smo. Quanto aos termos socialismo e "comunismo" vêmo··
LISMO CIENTíFICO. Aí escreve o companheiro de Karl Marx: -los usados por vêzes indistintamente. Na década de· 1340 Marx
"Estas duas grandes descobertas - a concepção materialista da his e Engels preferiram evitar as expressões· "socialismo" e "socialista''
tória e a revelação do mistério da produção capitalista por meio para evitar confusões com socialistas que não- consideravam autên
da mais-v.alía - nós as devemos a Marx. Graças a elas o socialismo ticos·. Escolhera m então a palavra "comunista". N.a Rússia há 0
se tornou uma ciência, que cumpre agora elaborar em todos os seus Partido C?munis�, centro d� t�da a o�ganização política, e o país
pormenores" (em ÉCRITS SUR LE SOCIALISME, Paris: Seghers, se denomma Umao das Republicas Socialistas· Soviéticas. Os teóri
1963, pág. 119). cos comunistas daquele país entendem que o siistema socialista evo
luirá para o comunismo integral ( cf. P. Sweezy, obra citada, pág. 33).
E COMUNISMO 75
P. ,CAPITALISMO, SOCIALISMO
74 J. GALVÃO DE SOUSA
O extre�o do individ alismo é representado pelo anarquis tusiasmo dos franceses, mesmo de socialistas, ante a mobilização.
1:1
mo �e Bakunm e. Kropotkm, corrente de idéias que em muitos Arrastadas pela fôrça emocional do patriotismo, as masas
mo�11?-entos revolu�ionários marcha paralelamente -com grupos operárias desmentiam o marxismo. Na Alemanha socialis
socialistas e comunistas. Sua influência se fêz sentir particu tas irredutíveis em seu internacionalismo se revoltavam contra a
larmente em alguns países, como a França, desde Proudhon a social-democracia empenhada no esfôrço de guerra.
Rú�s�a, a Itáli� e a Espanha, onde alcançou grande significa�ão Depois da conflagração, muitos socialistas voltaram à atitu
poht1ca, especialmente na República de 1931 a 1936, na forma de anterior, Tecusando-se a colaborar com os respectivos gover
do anarco-sindicalismo. 15 nos, como o haviam feito duTante a guerra para manter a união
O sindica�ismo :.evolucionário teve em Georges Sorel, autor nacional. Por sua vez, a nova Internacional, isto é, a Terceira,
das REFLEXoES SOBRE A VIOLÊNCIA, um dos teóricos de triunfava com a implantação do comunismo na Rússia sob o pul
mai�r i?fluência. Na Itália, Antonio Labriola verificou que a so férreo de Lenin. Trotski, separando-se da orientação oficial
. soviética, fundava a Quarta Internacional.
sens1b1hdade popular não acolhia favoràvelmente o marxismo
p�r êle adm�tid�. _ A seu_ ver, as massas, tendo intuição das situa: Mas outro fenômeno surgia então: o despertar do naciona
çoe: revoluc10nanas, deviam atuar através dos sindicatos, organi lismo alemão, como conseqüência do descontentamento provo
zaçoe_s que lhes eram adequadas e correspondiam à psicologia cado no povo pelas humilhações impostas com o tratado de Ver-
coletiva. salhes.
O_ socialismo depois de Marx tomot: uma coloração interna Antes dêsse movimento, que levou Hitler ao poder, já na
. Itália um antigo militante socialista, Benito Mussolini, implan-.
c10nal�sta ?astante_ �centuada. Não só pela organização das In
ternac10na1s, mobilizando os trabalhadores do mundo inteiro tava um nôvo regime com larga margem de intervenção do Es
para atender ao apêlo final do Manifesto Comunista, mas ainda tado na vida social. A expressão "Estado totalitário" era empre
por causa da própria ideologia que ensinava. Com efeito, se gada pela primeira vez pelo chefe do govêrno italiano, o Duce,
gundo l\1arx os operários de países diferentes tinham mais afini que empolgava as massas. Mais do que o fascismo italiano, o
dades entre si do que co�n- os respectivos compatriotas perten nacional-socialismo, como o próprio nome está dizendo, apre
centes a outras classes sooa1s. A Classe era uma realidade que sentou característicos de um regime socialista, não obstante er
s� s?brepunha_ à Nação. E o ideal i?ualitário sonhado pelos so guer-se para livrar a Alemanha do comunismo.
oahstas devena trazer para a humanidade não só a extinção das Surgiu assim outra modalidade de socialismo, diferente das
classes e o desaparecimento das diferenças entre governantes e examinadas até aqui e fora da linha marxista. Contrapunha-se
governados - segundo a concepção anarquista da sociedade sem ao internacionalismo. Era o socialismo nacional ou totalitarismo
Estado - mas também a abolição das fronteiras entre as nações. da direita, dando ao Estado poderes absolutos para controlar a
Ao deflagrar da guerra de 1914, desaparecia a Seo-uhda Inter vida econômica, o ensino, a cultura e a formação das novas ge
nacional, e o pacifismo de ]aures era impotente para° deter O en- i-ações. Apesar de se defrontarem como inimigos, nazismo e co
munismo, por tais pontos de seus programas e pela orientação
coletivista em regime de massas, cabiam num mesmo contexto
]. Touchard, ?b:a ,�itada, vol._ I�, pág. 742 ). O pensamento de Jaures socialista. É o que se pode deduzir dos dois memoráveis e im
corresponde a ideia do socialismo como express·ão do direito dos pressionantes documentos com que o Papa Pio XI condenou um
indivíduos à felicidade completa neste mundo. e outro dêsses regimes, escritos no mesmo ano e publicados com
, 15. _Agitaçõ
_ �s oper�rias ocorri_das en?"e_ nós, no comêço dêste uma diferença de poucos dias: a Encíclica DIVINI REDEMPTO
seculo, hvernm msp�raçao anarqmsta. E mteressante lembrar 0 RIS, de 1. 0 de março de 1937, corn:ra o comunismo ateu, e a MIT
nome do agitador Rossoni, prêso pela polícia de São Paulo e ex BRENNENDER SORGE, de 14 de março, sôbre a situação da
pulso do �rasil. Voltando _ . para a Itália, seu país de origem, lá Igreja em face do nacional-socialismo germânico.
chegou mais tarde a ser mmistro de Estado, nos tempos· do fascismo.
CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISMO
79
78 J. P. GALVÃO DE SOUSA
países escandina
Na _França, º ii:iternacionalismo parecia utópico a Marcel guildista, na Inglaterra, e do socialismo dos
vo·, bem como do
, .
�eat,_cu30 neo-sociahsmo levava em conta as particularidades na vos, admitindo organizações de tipo. corporati
do que socialismo
c10na1s para a estruturação de uma nova ordem. socialismo cooperativista. Êste último, mais
_ com matiz:� s�ci�lis
Aquêle mesmo Pontífice, Pio XI, na Encíclica QUADRA propriamente dito, é um coope_rativismo
Pelo que p for dito,
GE_Sl�O ANNO, fêz ver a incompatibilidade radical entre ó listas. Tal a posição do economista Gzde.
, também pode ser
sooahsmo e a doutrina social católica, ainda em se tratando de Proudhon, por alguns aspectos de sua obra
lismo associonista.
classificado entre os representantes do socia
�ocialis :71� em suas formas mais moderadas. São palavras suas: resulta podermos
?
.
so�ialismo, quer se considere como doutrina, quer como fato De tudo isto, sem esgotarmos o assunto,
lism o moderno, numa
h�stónco, se é verdadeir� socialismo, mesmo depois de se apro- · indicar as seo-uintes modalidades do socia
_ leta e inclui o anar-
xrma_r da verdade e da )ust1ça nos pontos sobreditos, não pode enumeração que não pretende ser comp
. qwsmo:
conoliar-se com a doutrina católica, pois concebe a sociedade de
modo completamente avêsso à doutrina cristã". E conclui· l. socialismo dos precursores (antes de Marx);
"Socialismo religioso, socialismo católico são têrmos contradi� 2. anarquismo (Proudhon e outros);
tórios; ninguém pode ser ao mesmo tempo bom católico e ve; 3. coletivismo integral (Marx e Engels);
dadeiro socialista". 4. coletivismo agrário (H. George);
anha) ;
.
Vi1:1os, de início, que, com a ordem social decorrente dos 5. social-democracia (principalmente na Alem
p_rn:cíp10s ?º Cristianismo, desapareceram os elementos de so 6. socialismo de cátedra;
oahs�o existente� nas civilizações antigas. Isto se deu porque 7. socialismo fabiano;
);
se de1xou ?e considerar o homem _ como devendo existir apenas 8. socialismo associonista (guildista, cooperativista
para a sooedade. Tendo a criatura humana um fim transcen 9. socialismo revisionista;
dente_ e superior ao fim da sociedade em que vive, não pode 10. socialismo ético;
a sooedade absorver os indivíduos, mas deve reconhecer-lhes socialismo religioso;
11.
certos direitos naturais, entre os quais o direito à vida à com- neo-socialismo francês;
tituição de uma família, à propriedade e à herança. 12.
13. nacional-socialismo;
A primazia absoluta da sociedade sôbre os indivíduos ensi alismo;
nad 14. sindicalismo revolucionário e anarco-sindic
_ � pelo socialismo, é incompatível com tais princípios. Ó "so ou bolche
cialismo :º� �iberdade" não se opõe a que o Estado imponha 15. marxismo-leninismo (comunismo soviético
tas das cha
um padrao umco de educação, e quando exalta o valor do indi vismo, variante chinesa, regimes coletivis
e Tito na Iu
víduo, o socialismo não o faz senão para o libertar da submis madas "democracias populares", cisão d.
no mundo
são às leis de Deus, como ocorre com a concepção de ]aures. goslávia, socialismo cubano, repercussões
afro-asiático) ;
Apesar de tudo isso, tem-se falado em "socialismo cristão"
o que deve ser entendido para designar o socialismo religios� 16. trotskismo.
de alguns protestantes, especialmente na Alemanha e Suíça, e de
certos adeptos da democracia cristã. Socialismo de fundo re
ligioso-humanitário foi o de Tolstoi e outros intelectuais russos
antes do bolchevismo.
Finalmente, às correntes mencionadas acrescenta-se o socia
lismo associonista, �ue diminui os poderes do Estado e reforça
os das pequenas unidades de produção. É o caso do socialismo
f:,
3. O MARXISMO
lho - tenhamos presentes êsses pontos fundamentais, um de l\1arx acentuou a importância da prática como meio de conhe
carater filosófico e outro econômico. cimento. Aí está um dos traços mais característicos do marxis
Segundo Hegel a realidade das coisas está num perpétuo mo. Para Marx só a prática - a j1raxis - leva a um conheci
vir-a-ser, submetida ao processo de evolução dialética, no qual mento verdadeiro, e a missão do filósofo, mais do que em ex
há três fases: tese, antítese, síntese. Na primeira fase o ser pa plicar o mundo, deve consistir em modificá-lo.
rece em repouso. É a tese. Mas a contradição que nêle existe A dialética de Hegel com o materialismo e o humanismo
se opõe a êsse estado anterior, e daí vem a antítese. Finalmente, ateu de Feuerbach fazem l\tf.arx chegar ao materialismo histórico.
depois dêsse antagonismo surge um nôvo estado, que parece de Segundo tal concepção, as relações econômicas determinam 0
finitivo: a síntese. Entretanto, como tudo é feito de contras conteúdo da consciência social (ciência, arte, religião, política,
tes, torna a aparecer uma negação. A síntese é uma nova tese, etc.) , consciência esta que é um reflexo ou "superestrutura" das
contra a qual se levanta mais uma antítese, seguindo-se outra circunstâncias econômicas da vida. O que há de mais impor
síntese, e assim por diante. Esta série de conflitos vai condu tante e fundamental na vida humana, para Marx, são as reali
zindo o universo a um aperfeiçoamento incessante mas sempre dades concernentes à produção dos bens materiais. Os meios e
relativo e instável. as técnicas da produção determinam ou condicionam as relações
O sistema de Hegel é o idealismo absoluto. Para êle a Idéia sociais e jurídicas, a ordem moral e as próprias crenças religio.
é a única realidade, entendendo-se pelo têrmo "idéia" não uma sas. Daí o caráter relativo atribuído a tôdas as ideologias. Não
representação intelectual - fenômeno da consciência - mas a há uma verdade absoluta, como não há um critério objetivo de
totalidade do ser. Identifica o "real" ao "racional" e o "racio moralidade e justiça.
nal" ao "real". Dêsse idealismo há um passo para o materialis Um exemplo daquela influência decisiva da infra-estrutura
mo, ou melhor, em certo sentido, idealismo e materialismo se econômica nas relações humanas e nos sistemas sociais está nas
equivalem. O que é a Idéia para Hegel será a Matéria para, transformações do regime de trabalho. Ao moinho movido a
Marx. Assim, a história, na concepção hegeliana, é o desenvol braço humano corresponde a escravidão. Ao moinho de água,
vimento do Espírito universal no tempo; para l\1arx tornar-se-á a servidão. E ao moinho- a vapor, o capitalismo. '
o desenvolvimento da Matéria universal. O materialismo histórico e econômico aplicado ao estudo
Depois da morte de Hegel, seus discípulos dividiram-se em da formação social dos povos faz com que esta · seja explicada
dois grupos. De um lado, a "direita", interpretando a doutrina pela idéia da luta de classes. As classes oprimidas levantam-se
sôbre a racionalidade do real e as concepções religiosas de Hegel contra as opressoras, e isto dá a Marx a chave para explicar tôda
num sentido conservador. De outro, a "esquerda", com uma in a história.
terpretação revolucionária. Para os primeiros, se o real é racio Assim, no caso da escravidão antiga víamos a classe dos se
nal., deve ser conservado; para os segundos, se o racional é real, nhores constituindo a "tese" e contra êles a classe dos escravos,
cumpre tornar racional a realidade, transformando-a. que era a ''antítese". A luta terminou pela "síntese" do feuda
Feuerbach foi um dos principais partidários da esquerda lismo.
hegeliana. A seu ver a realidade em evolução não é o espírito, Com o feudalismo, aos barões (tese), se opõem os servos
mas a matéria. Assim estabeleceu uma ligação da filosofia de e também os moradores das cidades em luta pela sua autonomia
Hegel com o materialismo científico do seu tempo, lançando as (antítese), daí resultando uma nova síntese: o capitalismo.
bases do materialismo dialético. Opondo-se ao Cristianismo e À classe dos capitalistas burgueses, proprietários dos meios
à idéia de Deus, caiu num humanismo radical ensinando que "o de produção, se contrapõem os proletários, isto é, trabalhado
humano é o divino". Nas suas famosas teses sôbre Feuerbach> res explorados e alienados, que não têm mais do que a fôrça de
84 J. P. GALVÃO DE SOUSA CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISMO
85
trabalho. Esta fase corresponde a uma situação criada pela má pérfluo podem desfigurar a vida espirit .
ua
quina a vapor, surgindo a síntese final da sociedade comunista. mem, mas nem as podem gerar n em d-et l e_ Intelectual do ho-
. · de l'\llarx vem d erm1nar " 1s
Há, pois, consoante essa teoria, uma evolução regular e ne Se a filosofia . o ide a 1.isn10 · . ·
.
germânicos, a sua doutnna econôm i e do matena 1ismo
cessária da sociedade, conduzindo, através da luta de classe, até ro
ao comunismo. O comunismo libertará o homem da escravidão sica inglesa, derivando de noções e,ta�:l� _ c�de da escola clás
odas por Adam Smith
e de tôdas as alienações, cabendo ao proletariado, no desempe e Ricardo. O Capital traz por sub•' cI tu 1o·
Política. Tanto nessa obra como F>m · Cr't·z zca da Economia
nho da sua missão messiânica, realizar essa suprema libertação. - outrns escnt · os de sua au-
toria, Marx, ao examinar o sistema cap . �-
Mas - é o caso de se perguntar desde logo - por que a so por êl e m es itah sta , o faz tendo em
vista sobretudo a situação, - mo presenc1a . .
ciedade comunista será síntese derradeira? Por que o processo . .
mdustnal na Ing1aterra em meados do s , da, da v1 d,J
da evolução dialética na vida dos povos não há de continuar? eculo XIX
Dominava então incontrastàvelment - ·
Perguntas que nos fazem atingir uma contradição do mar e O liberalismo econô
xismo destruidora do próprio sistema.
mico. Não se encontrara e nem rres º :11
se
para as tensões oriundas do antag�nismo procurava uma saída
Se tôdas as ideologias são reflexos da ordem econômica, e operariado. Acelerava-se a concer:.tração entre � patronato e o
por isso mesmo transitórias, entãô o marxismo é um reflexo das vimos, teve prosseguimento nas décadas s do_ cap!tal, que, como
. .. - da proprie da eOo-ui
. ntes, mas M arx nao -
relações econômicas da sociedade industrial européia no século prevJ.u nem a d 1v1sao de corng·
. m d o a acu mulaçao -
XIX e não poderá prevalecer. Se, pelo contrário, o materialismo das riquezas, nem o melhor amento das .
co
histórico pretende ter um valor em si mesmo, determinando o nem o desenvo1v1mento · do sindinlism o ndiçoes - do tra balho,
e dos contratos coleti-
sentido da sociedade do futuro, então neste caso nem tôda ideo vos na Inglaterra e em outros países.
logia é mero reflexo da estrutura econômica. Há teses marxistas que não resiste
m ao exame dos fatos
Marx parte do fato de que as necessidades fundamentais, ocorridos depois de Marx, razão pda _
· al m u1•-
na vida humana, sãci comer, vestir-se_, obter os meios de assegu gumdo Marx em muitos · pontos aba qu ,os soCia · 11stas,
- se-
' nd°naram aque 1as teses, ao
rar a própria subsistência, proteger-se contra as intempéries, en mesmo tempo em que as bases filoso'f· c
i as
fim coisas diretamente ligadas à matéria. Aí entram o clima, criticadas por, quantos queriam ir "para do , seu sistema eram
. econômica da m . al e m d0 marxism . o"
a saúde, a produção, o consumo, os t::-ansportes. São os aspectos Quanto a teona
econômicos da vida, que, na visão do materialismo histórico, que só o trabalho dá valor às coisas_ª 7
1 alía,
parte
mesma opmião havia
?ª. idéia de
determinam tudo o mais.
A verdade é que não só de pão vive o homem. Sem dúvi 18. Nicolas Berdiaeff, LE MARXISM
da, a necessidade da alimentação é mais imperiosa do que, por Paris: ed. "Je Sers", 1931, págs. 13-lL1 p E ET LA RELIGION,
exemplo, a aquisição de conhecimentos científicos ou a produ que o "o marxismo é uma patologia e··n- ou<ler.a o mesmo autor.
ção de uma obra de arte. Mas daí não se pode deduzir que o dade humana, cujas doenças êle reflete- �' uma fisiologia da socie
p ensamento, a criação artística, a vida moral e espiritual sejam suas considerações, mas as funções sã�
n
ª
uma certa verdade nas
social lhe escaparam" ( pág. 29 ). Refere-s: ormais do organismo
e Sombart (cf. supra, i.a Parte, n. II) e . ªº� �rabalhos de Weber
resultados de um processo de nutrição ou de causas materiais.
Como escreve Berdiaeff, "a sociedade humana não pode existir a
a economia e a vida religiosa "foi �uit�� �ahse da relação entre
sem economia, sem a satisfação de suas necessidades vitais, sem o Marx e corresponde melhor aos co::i.heci e ais P:ofunda que a de
que poderia chamar-se a fisiologia da sociedade. Mas daí não é ficas modernos·. Está cientificamente pro � n�s científicos e filosó
v
possível concluir que a economia da sociedade faça nascer sua vida determinada pela vida religiosa, poi:i não � 0 que a economia é
espiritual e intelectual, que a fisiologia da sociedade determine o homem, como ser integral, sem a part·P? e 3aver economia sem
rcrpaçao de tôdas as suas
a sua psicologia. Os processos de nutrição, a miséria ou o su- fôrças no trabalho" ( pág. 16).
CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISMO 87
86 J. P. GALVÃO DE SOUSA
i a
sido sustentada por Ricardo e outros economistas clássicos, em Note-se que êle não condena, segundo �m critér o de avali
de explo r ç o d e um cl sse p
ção moral, as diferentes formas a a a a or
bora chegando a conclusões diferentes. _
outra, a começar pela escra
vidão. Coloca-se diante delas como
Tôdas as mercadorias, segund o Marx, não passam de traba da evolução humana.
-I?o humano cristalizado. O valor deve se r medido pela quan fatos históricos, correspondentes a fases
r ç que impede� o_ desen
tidade de trabalho, e esta pela dura ção do tra balho, isto é, o Repele, isto sim, as formas de expl o a ão
mesm o a atnbmr uma
tempo necessário a um operário de ha bilidade e atividade nor volvimento das fôrças produtivas. Cheg a
memos o exemplo de um operário que tra balha dez horas por materiais produtivas e da grand� indústria, _
s�m qual não teria
a
r a aurora do so-
dia : em seis horas êle produz o que lhe dá em resultado o ne surgido o proletariado nem tena podido raia
cessário para a sua subsistência ; nas quatro horas resta ntes, pro cialismo.
ns
duz um excesso de valor chamado a mais-valía, que vai ao pa No momento histórico oportuno, o proletariado, com a co
fôrç dialét ic que se lev nta em
ciência de classe, torna -se
a
trão e f orma o capital. A operação se repete em relação a cada a a a
burgu�s- A conce1 tração do
operári o, dia por dia. A ma is-valia, por sua vez, é utilizada para oposição violenta ao capitalismo , !
f rm mbie nt ;. � pr pic10 para o
um a nova produção e dá origem a uma nova mais-valía , de ma capital levada ao máximo o a o a
só qu nd pe ano fic sendo pro
comunismo marxista. E
a
neira que o capital, nascido de uma primeira espoliação, irá sen a o o o r
umen t p despe tar d quela
letário êle pode ser inst r a
do acumulad o cada vez mais, servindo a outras tantas espo r o ara o
valor de uma �oisa nã o p�ovém unicamente do trabalho, pois de transição para a sociedade comumst a , sem cl a sse e sem Estado.
depende da raridade da coISa, da necessidade que se tenha dela, Recapitulando, temos:
da sua utilidade, etc. Quant o à noção de mais-valí a, sem nos
a) fundamentação dialética;
determ os n:1m exame m�is_ prolongado, basta lembrar que, no
exemplo acima , se o operano produz o que é necessário para sua b) evolucionismo ;
manutenção em seis horas, isto se dá graças ao concurso do ca c) materialismo histórico;
pit al e do trabalho intelectual de di reção. Reduzido a suas pró d) lut a de classes;
prias fôrças, o trabalhador precisaria de muito mais tempo. e) teoria do valor-trabalho;
J\,1arx analisa a concentra ção das indústrias e dos capitais nas f) teoria da mais-valí a;
nte;
mã?s de poucos, à qual corresponde, da parte da população ope g) concentração do capital e proletarização cresce
rári a, uma proletarização crescente e o empobrecimento das h) tese catastrófica (desab amen to d a o r dem soci al funda
massas. Trata-se de um fato histórico já indicado na primeira da no capitalismo priv a d o ) ;
p arte dêste tra balho. O capitalismo gera, assim, essa imensa i) visão messiânica da socied ade comunista.
multidão de proletarios cada dia mais numerosa , mais miserá
vel e mais exasperada em vista do pequeno número de ricos. Pe
rante uma tal situação diz Marx que a luta de classes, exacerban
do-se, produzirá o cataclismo em que a atual ordem de coisas
soçobrará para ceder lugar ao coletivism o . 19
-:.lk.
4. A TÁTICA FABIANA E O TRABALHISMO.
b consi�te na teoria
necessidade dos planej amentos, para fazer face às crises e ao de O p onto de p artida � a � outrina f� � ana
oCiahsmo, de Sidney Webb.
senvolvim ento econômico, l evou o Estado a uma interferência da continuidade entre capi tal ismo e s
cio nário u ma conseqüên
cada vez maior em di versos setores da vida social. Com a Marx considerava o socialismo revol u
erária e do fraca sso do cap i
m ult�p�icação das. f unções do Estado e a centralização p olítico cia da crescente miséria da classe op
er o p rob le�a da distr �
-� dmmist rativa_ foi sendo paulatinamente restringida a esfera da t alismo p el a sua incap acidade _em resolv _
gar do capitah�o da �1-
liberdade individua l e das liberdades associativas.20 buição. M as começava a surgir, �m lu
levando o padrao de �ida
sen a, o capitalismo da ab undância, e
Diante dêsse estado de coisas, o ambiente tornou-se favorá
da s classes menos favor
ecidas . Em face de tais persp ectivas,
vel à expansão de um nôvo tipo de socia lismo, hoj e dominante t e a situa�ão dos tra
Webb esperava o me lhoramento crescer:i- _ d
em certo_s países europeus, ao p asso que o comunismo, na linha at wa d as riquezas, gr a
balhadores e uma distribuição mais eqmt
do marxismo -leninismo, aí vem p erdendo terreno, vo ltando suas de trab alho ? u
ç as à legisla ção sôbre sa lários, horas e con ções
di
esperanças para os p aíses latino-americanos e o mundo afro -asiá a s, c o mo nas naCio
impôsto progressivo . Via nestas reform bem
tico: _Por outro lado, a própria Rú ssia que pratica o marxismo-'
nalizações e na admi nistra
çã o pública de indús ias e serviços, tr
-lenmismo es tá adota ndo técnicas e métodos capi talistas . a lismo.2
i
etapas para chegar ao so ci
revol ucionário
Assim vão se ndo disseminadas a mentalidade e a tática dos Dissentiram os primeiros fabianos do método
fabianos, cuj as origens se encontram na Inglaterra. Em 1883 era - agrup ament o
da Federa ção Socia l De mocrátic a de Hyn dman
fundada neste p a ís da M ancha a Sociedade Fabiana, à qual deram ídi t inári s prim e iro p ara
marxis ta - e fornecera m sub s os dou r o
té. d e
s ua adesão Bernard Shaw e Sidney Webb. Pro cede a sua deno (1893 ), d ep oi s p a r a o Comi
o IndefJendent Labour Par�y
fin l nt p ra � l P ar tido
Representação Traba lhista
a o tua
minação do r�man� Fábio M1ximoj ..,o Contemporizador (Cunc e a � e e
, , p ur d 191 8, f � i n do enca
Trabalhista , cuj o pro gram e se
ta:or) . A ta uca deste cabo d e guerra consistia em esgotar O ini a a a � _ _ ey
diretrizes de Sidn
�i�o J:>ºr meio de retiradas estratégicas, escaramuças e u ma re minhado decididamente no sentido das
em vo lumes de
sisteno a prolongada, até consegui r o almej ado tri unfo . N a luta Webb e seus companheiros. Além de publicar
r m t r f rm ação da opinião
com os cartagineses, fazia-os seguir p asso a passo, impedindo-os Ensaios, os fabianos começ a a a a ua na o
l ntes peq n e critos de vu lga -
de receber os necessários víveres e e vitando os comba tes reo-u pública através de fôlhas v o a e ue os s
3.°) estática da sociedade futura qu e, alcançand o a perfeição, A ssim, entre os teorizadores do trabalhismo inglês há uma
atingirá um imobili smo e uma uniformiza ção t otal da vida, an dualidade de concepções sôbre a natureza humana. Distin guem
Epoch of Rest no dizer de Morris.25 -se n itidamen te os que têm do hom em uma visão de certo modo
Os f�nd amentos dou tri nários do so cialismo, onde quer que ingênua e otimista daqueles p ara os quais a realidade não apre
_
os pesqmsemos, são de natureza filosófica e mesmo re ligiosa. senta um asp ecto tão risonho, mas antes u ma perspectiva som
Is to porque as questões soci ai s, no seu sentido mais pro fundo, bria, à cuj a luz bruxoleante mal se pode conceber um estado
são ques tões morais e religiosas , excedendo de m uito o domínio d e f e licidade social neste mu ndo . �stes últimos partem da idéia
restrito da economia, em cuj os limites Marx quis confinar a sua de ser o homem uma criatura decaída, devendo lutar contra as
gênese.26 suas más inclinações, a prevalecerem frequen temente nos indi
Não admira, p oi s , que em tôdas as questões políticas a cabe víduos de maior influência social. Por isso m esmo, o homem
mos sempre por ch egar a questõ es teológicas, como notava Prou n unca pode alcançar a sua perfeição neste mundo . É a conse
dhon no século passado. Em resposta a Proudhon Danoso qüência do pecado original, admitido como fato histórico, pelo
Cortés escrevia o ENSAYO SOBRE EL CATOLICISMO, EL menos de u m modo muito va go, por membros da Igrej a da I n
LIBERALISMO Y EL SOCIALISMO, no qual, submetendo ao glaterra p ertencentes ao Partido Trabalhista . Digo de um m o
esca lpelo de uma análise penetrante ê sse s doi s sistemas sociais,
do vago, e por vêzes "metafórico-", segundo observa H.acker,
que começavam a se defrontar na march a para a conquista das p orque o protestantis mo não mantém a idéia do pecado original
massas , confrontava-os com as verdades f undamentais da R eve
co m a mesma clareza e o m esmo rigor do dogma católico. De
l a ção cristã, sobretudo no concernen te à nat ureza humana .
q ualquer forma, radica-se nest� i_déia uma visão do homem,
Entre tais verdades está o fat o d o pecado original conside- . quiçá mesmo pessimista , que foi aliás na Inglaterra a de Hobbes,
;,a d o por Andrew Hacker em seu cit ado artigo, onde nos diz: quando dizia ser o homem "u m lobo para outro homem".
um exame dos pressupostos referentes à nat ureza do homem é
Os representantes da outra tendência, pelo contrário, lon ge
vita l para a compreensão d e qua lquer t eoria p olítica , e mes mo
de qua lquer programa prático de ação".27 d e p ertencerem à linha hobbesiana de pensamento, filiam-se _ à
tradicão vinda de São Tomas Morus, o autor da famosa Utopia
dos t�mpos renascentistas. Morus, católico e mártir, canonizado
25. Andrew Hacker, ORIGINAL SIN VS. UTOPIA IN BRI pela Igrej a, selou com � san?ue a fideli�a?e aos dogmas_ �a s ua
TISH SOCIALISM, in THE REVIEW OF POLITICS, Indiana: No Fé, e com o tal não podia deixar de admitir o pecado ongmal e
tre Dame University, volume 18, n. 2, abril 1956. a corrupção da natureza h umana . M as o seu livro UtojJia,
u ma obra de fantasia política, c ujo, sentido não cumpr e a qui
, :26. Mesmo o materi�l�smo histórico, apesar de repudiar a mc
taf1S1ca, tem a sua metafisica, procedente do idealismo de Hegel. analisar, era uma verdadeira antecipação da EPOCH OF REST
Por outro lado, A!�rx apresenta a sua doutrina como portadora da de Morris e de u m modo geral das visões da sociedade futura de
men�agem_ de felicidade para o mundo de amanhã, e deifica O pro ce rtos teóricos e líd_eres so cialistas, empolgados pela miragem do
letariado, Julgando-o capaz de criar uma ordem social de valor abso
luto e não meramente rela �i�o �s condições econômicas do tempo, "paraíso na terra".
como foram as_ oi_?'ens s ociais mstauradas pela aristocracia feudal Em oposição à postura mental dos que pressupõe m a natu
e pela burguesia liberal. Isto já foi dito acima, e vem daí afoma reza humana debilitada pela queda, êstes acreditam no ap erfei-
rem Berdia�ft e ou�ros. autores que o marxismo é uma religião.
�7. Cita o articulista estas palavras muito significativas do tra
balhista C. E. M. Joad, da Universidade de Londres: "O pecado que ficamos constantemente desapontados. Caí1:1 ºs. vítimas _d� um
original _ expressa uma visão profunda da natureza humana. É por .
obscuro otimismo, a nos fazer pensar que o mile1110 de fehc;dade
,
que mmtos de nos, educados n a esquerda intelectual, o rejeitamos, está às portas".
'9 6 J. P. GALVÃO DE SOUSA CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISMO 97
ç o�mento incess�nte do homem. A mesma posição f oi a do libe- Partido permaneceu no govêrno. O refôrço da autoridade e a
_ ·
ralism
. o na era vitonana, a era da prosperity , qu ando o evo1 uoo- dilatação da esfera de ação do Estado, também r ecomendados
.
nismo spencenano formula va a lei do progresso i ndefinido in- p or Laski, desviam-se do anarquismo e m esmo do igualitarismo
terpretação sociológica da histó ria da humanidade corres�on inerentes à linha de p ensamento da Utopia.
d�nte ao estado �e espírito oriundo do dese nvolvimento indus Trata-se do mesmo problema q ue surgiu na Rússia após a
tnal e das conqu istas da ciência naquele t empo . implantação do regime c omunista. Dia a dia foi sendo forta
Ness': estado de espírito situa-se o novelista H. G. w ells, lecido o poder do Estado e acentuado seu caráter totalitário, ao
q ue ?:'eve u�a 1:ª'? de super-home ns, vivendo numa sociedade mesmo tempo em que se formava uma categoria bem difere n
planificada cientificamente· A dose de utopi·a nos 1i· vros ele ciada de cidadãos, c onstituída pelos dirig entes do Partido, os
Wel'.s :,, bem s ensível, tan to mais qu e se trata de uma literatu'fa altos funcionários, os chefes militares e os técnicos de indústria ,
d e ficçao. Bas:a lembrar os t emas de suas novelas, como, por em contradição com o igualitarismo preconizado na doutrina.
exemplo, A MAQUINA DE EXP,LORAR O TEMPO, para ter
· do, que sej. a essa men talidade de crença nas possibili- Na Ingla terra, necessidades práticas do govêrno e da admi
uma i· de, ia
nistração não permitiram que o prog rama delineado por alguns
�ades do ser human�, uma ve z c�ntrolado pela ciência plani teóricos de grand e influência no Par tido Trabalhista fôsse cum
Lcadora. Bem sugesnvo, n ess e sentido, o tí tulo de um dos livros
prido integralmente, sem falar das conseqüências decepcionan
d o mesmo Wells: ME N LIKE GODS. No fundo' o que o sooa-
ris1:°o pr etende e' sempre essa deificação do homem, numa ten- te s que as nacionalizações por vêzes trouxeram.
O Times de 15 de maio de 1951 observava o seguinte: "os
ta tiva que faz pens �r n� tentação dos nossos primeiros pais p ela
boca da s erpente : , s ereis c om o deuses". homens e as mulher es que, em 1945, acreditaram com tanta con
fiança que tinham a chave do futur o, descobrem ag ora, após cin
TiVells é, no socialismo britânico, o mestre- escola da classe
_ co anos e meio de cruel exp eriência e desilusão, que o Par tido
me, dia, e a classe operária t em também o seu doutrinador' Robert
Trabalhista não abri u nenhuma porta para a terra prometida".
Blatchford. Hostil ao Cristianismo, Blatchford nega expressa-
. . E o trabalhista Paul Hend erson c onfessava: "Era magnífico nos
mente o �ecado ongmal e no seu livro GOD AND MY NEIGH-
primeiros tempos. Nós nos deixávamos ficar nas esquinas para
BOUR, citado por Hacker, diz que o pecado não existe . dizer aos trabalh ad ores q ue a nacionalização lhes traria uma no
D e Owen a Wells a linha da Utopia acompanha O desenv ,,,- oJ -
· · . va justiça, responsabilidades n ovas, um mundo nôvo. Eu amei
v ime nto do sac10hsmo britânico, rem on ando mais longmqua-
t
cada ins tante daquela época. Mas o desgôsto está em que nós
m ente a Morus e chegando em n ossos dias até Harold LaskZ.· LS " _ t ivemos desde então o poder durante s eis anos e me i o, e desco
'1 · mo, profess or uni ersitári o e oráculo da ala esq uerda do
te u _u _ � brimos que a nacionalizaç ão dos meios de produção e de comér
Partido Traballusta, deixou vários livros de ciência pol'itica . e, cio n ão traz a resposta a todos os problemas, como acre ditáva
.
· ei· to c onsti· uc1onal. D epois da últim a guerra, escreveu as RE-
dir 1:_ m os antes".28
_
F�EXoES SOBRE A_ REVOLUÇAO DO NOSSO TEMPO.
, É o que explica também o recuo da política de centraliza
nao escondendo sua simpatia pela experiência sovi· e' tic " a e pre-
· . . � · ção planificadora em outras exp eriências socialistas. Um caso
comzando uma plamficaçao de tipo col etivista.
frisante, para exemplificar, está no fato de haver o govêrno da
Note-�e: a respeito, uma par ticularidade imp ortante : a socie-
Tchecoslováquia, dian te do fracasso do dirigismo econômico,
dade plamfica d a do f uturo, como a concebem Os s oo• a1ist · as, r e-
.
que� ur�a forte centralização po lítico-administrativa. o Estado
pre�i�a ra contro _Iar tôd a a vida s ocial, idéia esta inspiradora da 28. Marcel Merle, LE BEVANI.SME, OU LA CRISE DU
poht _1ca das nacio nalizações de�endida no Parlamento pel os tra PARTI TRAVAILLISTE, in REVUE FRANÇAISE DE SCIENCE
balhistas e p osta em prática nos seis anos durante os quais 0 POLITIQUE, vol. IV, n. 1, janei�o-março, 1954, pág. 110.
98 J. P. GALVÃO DE SOUSA
c
�n�eder, a tít l o experimenta l, liberdade a empresários indus
u
c c
pequenas areas Será o socialismo inevitável? Estará nele o futuro. dos povos?
para s erem por eles cu l t1vadas .29
A •
!�
100 J. P. GALVÃO DE SOUSA CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISMO 101
Se o socialismo representa uma tendência que a muitos pode crise econômica muito grave, o Estado ass ume alguma: fu°;çõ�s
parecer irreprimível, isto se dá em vi rtud e d os próprios princí extraordinárias para o desempenho d e tarefas de sal�açao publi
pios cont idos no liberalismo e de condições criadas pelo sistema ca, mas depois, passadas aquelas situa�ões, êle �on�mua a ex er
capitalista , conforme vimos acima . Daí o impulso do socialis cê-las. A tendência é, pois, para um mtervenc10msmo p_rogres
mo em países como a Inglaterra e a generalização de certa m en sivo, com sacr ifício da iniciativa privad� e riscos para a hber�a
t alidade sociali st a entre os membros de partidos democráticos d e . Ou sej a : quando o Estado põe o pe em algum terren o, nao
não socialistas. o retir a mais.30
Por isso mesmo, o socialismo, onde tem prevalecido e poderá N ão devemos, porém, pensar que se trat_e de um� tendên
vir ainda a prevalecer, deve ser visto não como expressão de um cia inelutável à qual n ão seja possível fugir. Efetivamente,
mundo nôvo, tal qual o pretendem seus adeptos, mas como liqu i DENTRO DOS POSTULADOS DO INDIVIDUALISMO L!
dação do mundo capita lista liberal. BERAL E DO SOCIALISMO NÃO HA NENHUM CRITE
A certas pessoas se afigura corresponder o socialismo a uma RIO EFICAZ PARA LIMITAR A �ÇÃO_ DO E:'!'AD�, resul
necessidade dos nossos temp os, dada a contingência em que se t ando, de tais postul ados uma or:;entaçao pohuc�-sooal em
encontram os governos de hoje , de não poderem fugir ao plane antagonismo com a or dem natural e histórica das sociedades hu-
j amento econômico e soci al, p ara atenderem aos problemas da manas . 3i Mas desde que esta ordem venha a ser r estaurada,
·
corrigindo-se a desorganização ori�1:1�ª do libe1:a�i�mo e con du
hora presente. É o que se verifica particularmente nos países
q ue não atingiram ainda um desenvolvimento normal e naque cente, através do socialismo, ao dirigismo t�tahtano, o �st�d�
les onde há uma disparidade muito grande entre o grau de de p oderá exercer as suas funções sem que a liberdade dos md1v1-
senvolvimento de umas e outra s regiões. duos e dos grup os chegue a sofrer danos fatai. s.
Além disso, os Estados vêm-se h oje freqüentemente impeli Vimos que o individualism? e º, s?cialisn:_10 :e?uzem a so
dos a p romover a n acionalização de certos bens ou de atividades ciedade polí tica a um agreg ado mo:-gamco de mdiv1duos. Para
econômicas, p or razõ es imperiosas de ordem pública. 0 liber alismo, no seu extremo, que nunca chegou a ser plena-
____.......__._....,........,......,___L· �
O 103
102 J. P. GALVÃO DE SOUSA CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISM
J,,1,
COMUNISMO
104 J. P. GALVÃO DE Sous� CAPITALISMO, SOCIALISMO E
1
"conseqüência lógica da de
natureza d a obra a realizar ; de hoje é a ditadura burocrática,
io , a passagem de funções do
2:º) de_ficiênc i as motivadas por co ndições extrínsecas e aci mocracia moderna ". Pelo contrár
rativo significará um cercea
denta is, em epocas de crise · E stado a organizações de tipo corpo
Estado, que começa a tomar
3.0� rest rições impostas à liv re ação dos particulares por mento à máquina administrativa do
• A v a forma de administ� aç ã�,
exigencias do bem c omum nacional, para atender a razões de proporções gigantescas. Uma �o
ura e serve de . contrapeso as
segur�nça ou para manter a independência efetiva de um povo. independente, nacional, se config
nas democracias contempo-
E certo que o Estado, na missã o de promover o bem comum, tendências para a burocratização
. râneas.33
vai exercendo, e� nossos dias, atribuições cada vez mais a mplas,
por serem tambem cada vez mais numerosas as necessidades in-
. ,)
3.ª PARTE
_____________..._ .J
�
·' ; �Ir.
;"-, ,.
. ·� ':/,
110
J. P. GALVÃO DE SOUSA CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISMO III
tintos, reivi nd! cand� cad a qual para si
O nome d o Par tido Socia
-DeT?ocrata, vmdo finalmente os bolc l executar o pr imeiro plano quinquenal, para reerguimento eco..
hevistas a se denominare'n nômico do pa ís, construindo-se as grandes usinas dos Urais, do
Partido C:omun i sta. Assim davam mai
. or ênfase à sua se ara �o
do tradicw n�l soci alismo moderado ou
Donetz e da Sibéria. Promoveu também a liquidação dos kulaks,
p arlamentar, qu� erZ 0 ou camponeses proprietários, que foram expropr iados, como os
dos menchevi:iu:s _ e �e ou tros grupos
socialistas. Trotski, per
tence_nte a prinop10 a _ala radical dos c apitalistas o haviam sido em 19 I 8. Foi esta uma das tr ansfor
mencheviques, tornou-se
dep�is, ao lado de Lenin e Lunatcharsk mações revolucionárias mais profundas, equivalendo, pelos seus
i, um dos chefes dos bol
chevi stas. efeitos, à revoluçã o de 1917. Ao milhão e meio de vítimas do
O� mencheviques admitiam chegar ao terror e da fome nos primeiros tempos do regime, acrescentava
socialismo por uma -se agora o grande número de prisioneiros dos campos de con
ev�luçao �a�ural, ao p�sso que os bolche
vistas queriam a imedia
ta � nsurreiçao_ pr�letana e a conquist centração e mortos nos violentos expurgos, a abra11gerem chefes
a d o p oder político como
m,e10� de rea h_zaçao do socialismo, militares, dirigentes do Partid o e funcionários graduados caí
com a posse da terra, d
�ustnas, _das_ riquezas naturais e das n as in
i stituições financeir as. Foi dos na desgraça.
este o cnténo que prevaleceu na revol A União Soviética tran sformara-se num poderoso Estado
ução de o utubro sob
slogans: "Todo o poder nªos soviets" ' os
. e ,:paz, terra e pão " Os totalitário, aliado ao totalitarismo nazista para a partilha da Po
soviets eram conselhos de operários lôn ia, e depois em guerra contra o nazismo ao lado das democra
·, . e camponese , "• dai, 1esu
- I tan-
do as repu, bli' c as soviet icas agregadas na U . R . s. s.'1 cias ocidentais. Desta guerra a Rússia comunista foi a gr ande
_O primeiro período_ do bolchevismo beneficiada, estendendo suas conquistas e passa ndo a dominar,
foi assinalado pelo ter
ror implantado por me10 da políci com o seu imperialismo, a Europa cen tral e imensas regiões
a pol ític a a Tcheca mais
tarde GPU, depois NKVD e atualme ' asiáticas. Isto era o resultado da famosa conferência de Yalta, e
nte n �1-v' D. e onst.1tu1u · -se
0 _exe , , roto
· .ve�melho como um dos sustent da política alí seguida pelo Presidente Roosevelt.
áculos do reaime. A
cns
: e�onom ica e .ª fome foram os espectros desta fas�, à qual Depois da guerra de 1914 e uma vez triunfante na Rússia,
s: scgmu a nova one ntaçã o da p olítica econ
ômica (NEP)' a ar
tn_ de 1_921, sendo dada alguma libe o comunismo esteve a pique de obter novos tr iunfo s na Alema
rdade aos ar tesãos equ!10s
comerciantes, camponeses (kulaks) e n ha e na Itália, chegando a do minar por alguns meses na Hun
. . cooperativas ope�fr-iãs, sem gr ia, com Bela K.un. Pou cos anos antes da segunda guerra mun
falar no cham_ am�n ,, t? de capitais e técnicos estrangeir
os. Foi o dial, a Espanha, sob o govêr no da Frente Popular, encaminha
p on�o de partida d� mdustnalização
da Rússia, intensificada com
:::;n, e des?� e�tao se dizia _que o comunismo eram os soviets va-se decisivamen te para a bolchevização, tendo sido ali desenca
a eI etnfic a�ao . O Partido Comunista controlava a deada uma das maiores perseguições religiosas da história em to
- situa-
çao : �ra o �artid o único, ao mes dos os tempos, mas o alçamento de I 936 libertava a quêle país,
mo tempo em que o Estad;>
supnmida a liberdade de i mpren"a preservava a Europa e punha a salvo o Ocidente da dominação
. . . < , manti nha os 3orna1s
oficiais
• • •
ding i a o �en samento e a formaç
• • '
Foi então extraordinàriamente aprimorada a técnica revo cumpre remontar às origens do pensament� modem�, isto_ é: ao
lucionária. A ocupação do poder era obra de minorias organiza humanismo naturalista da Renascença e a revoluçao religiosa
das atuando sôbre as populações mediante a intimidação, as su do protestantismo. A corrente de idéias daí pr�ce_dente gerou a
gestões e as infiltrações até que chegasse o momento do assalto Revolução de 1789 na França e a de 1917 na Russia.
aos parlamentos e aos governos. Quando o último canhão dei O lider comunista Thorez, em discurso de 28 de outubro
xava de ressoar, nos campos de batalha da Europa, tinha início de 1937, publicado pelas Edições do Comité popular de p�opa
a guerra fria, que, na modalidade de guerra psicológica, foi aper gandé, reconhece aquela filiação, dizendo: . "Nós, co?1urnstas,
feiçoada por Mao-Tse-Tung, chefe do comunismo chinês.2 somos os discípulos de Niarx e Engels, de Lenin, de Stalm ... dos
Era a guerra revolucionária, estendendo-se por todos os con partidários convictos do materi_alis�-º dialético, teoria de van-
tinentes e tendo como centro de irradiação o Kominform, que guarda do proletariado. revoluc10nano. .
em 1947 vinha substituir o antigo Komintern, suprimido nos Somos os herdeiros autênticos e os continuadores do pensa
anos da guerra por razões de estratégia política. mento revolucionário dos materialistas franceses do século XVIII,
O comunismo é, assim, uma grande fôrça revolucionária em dos grandes Enciclopedistas, êles por sua vez filhos espirituais
andamento. Sua implantação na Rússia deve-se em grande par daquele outro grande filósofo francês, J?escartes".
te à política alemã do tempo de Guilherme II e sua expansão Sob tais inspirações é que os comurnstas pretendem dar uma
pelo mundo à política norte-americana de Roosevelt, nos fins, explicacão racional e científica do mundo e de sua evolução.
respectivamente, da primeira e da segunda guerra mundial. Para êl�s, a Revolução é redentora, gera o "homem nôvo" e dá
Não nos esqueçamos também de que o bolchevismo do tem sentido à vida. Não a revolução como simples derrubada de um
po de Lenin foi financiado por banqueiros ocidentais, e tudo isto govêrno pela fôrça, alteração violenta de um regime político on
nos faz compreender as razões que levaram Fulton Sheen a res subyersão da ordem social, rrias com R maiúsculo: a Revolução
ponsabilizar a consciência do Ocidente pelo comunismo russo. tota�, com repúdio de Deu,; e do sobrenatural, de Cristo _ e da
Isto é verdade quer se considere o aspecto político do comunis Igreja, ou seja a Cidade terrena de que fala�a Santo Agostmho,
mo, quer a sua filosofia. Quanto a esta última, resulta da mis em ::>posição à Cidade de Deus, pretendendo instaurar uma nova
tura de idéias deísticas e ateísticas vindas do iluminismo do sé ordem baseada no naturalismo cientificista e no ateísmo.
culo XVIII e também de correntes de pensamento do século O comunismo é a Revolução total, avançando hoje de duas
XIX. As idéias do comunismo são de origem ocidental e bur maneiras que se completam, na penetrante observa�ão de um
guesa. O próprio Lenin assinalava que o marxismo procede· da autor argentino: "Avança porque um centro mundial trabalh�
filosofia alemã, da economia inglêsa e do socialismo francês. 3 para. fazê-lo avançar. Avança, �lém �isso, p�rqu� os povo� debi
Neste sentido, para uma compreensão perfeita do comunis litados pelo naturalismo e o hberahsmo, nao somente nao ofe
mo, como princípio revolucionário e revolução permanente, recem resistência mas ainda se sentem dispostos a lhe dar aco-
lhida".4
2. Tôdas as revoluções· modernas têm sido feitas por minorias
intelectuais e não pelas massas, sempre dirigidas e controladas. É TICA COMUNISTA, Buenos· Aires: Ediciones Tneoría, pág. 9. Na
o que vem ocorrendo desde a Revolução de 1789. Ver especialmen Rússia o marxismo foi adaptado à mentalidade do povo, conjugan
te Augustin Cochin, LES SOCIÉTÉS DE PENSÉE ET LA DEMO do-se com O niilismo, o populismo e o anarquismo ( cf. N. Berdiaeff,
CRATIE MODERNE, Paris: Plon e George Uscatescu, REBELióN LES SOURCES ET LE SENS DU COMMUNISME RUSSE, trad.
DE LAS MINORIAS, Madrid: Editora Nacional, 1955. francesa Gallimard e S. R. Tornkins, THE RUSSIAN INTELLI
3. Cf. supra, 2.ª parte, n. III. Fulton Sheen, COMMUNISM GENTSIA MAKERS OF THE REVOLUTIONARY STATE, Nor
AND THE CONSCIENCE OF THE WEST, Brownan and Nolan man: University of Oklahona Press.
Limited, Dublin: The Ri:echview Press, especialmente págs. 7 e 55. 4. Julio Meinvíelle, EL COMUNISMO EN LA REVOLUCióN
Julio Meínviellle, EL PODER DESTRUCTIVO DE LA DIALÉG- ANTICRISTIANA, Buenos· Aires: Ediciones Theoría, 1961, pág. 62.
------------. ..
114 J. P. GALVÃO DE SOUSA
. a dialé
nsível como de envolvimento
r
pos, i to t do é compree
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é p erfeita
ém, para m comu nista
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de um fim' que e, ma oCiedade melhor e uráve l. Ta1 nao er ao s
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evi e ntem ente a concepç ão do m a x1. ta, pa_ra quem _n ão há bem
guerr a com a Alemanh a naz
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de plenitu e r volucionária
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do p r leta iado, um fim para o marxi ta, co mo se c:e• gera1 mente, táculo à ma cha a Revol ç
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e d ao o
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e uma perpétua e
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Temos assim a revol ç ão pela r vº 1uç ao: ?u aç ao Tal o esultado do movim nto
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à civilizaç ão do tra alho, que
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ia léti ca tal como e Hegel passo a Marx. . , P ara o materiali mo d ialético anto
s
ue permanece, m a enq
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.
d d u s
Hegel acome te uma tarefa ev l uc10�a:ia no omínios do rém a matéria enquanto reali ade q
s u
d a.
perpetuamente transfo ma or
d
u r o s d
pen amento, elab oran o- uma nova metafi�i " ca· sua m · fl,u • nCi· a expres são e fôrç a num a aç ão
r
em x ste
, - na aç ão material, e o hom
s d s
.
e d
e manifesta na i alética marxista . para a qual_ nª� tem sentido N ão h á existência enão
e i
aquela expr E
" o vang
" essão - elho . Sim, im; nao, nao". O " im" t ansfo man o-se continua
ria a ão
onde o
s
po e e nao
r
ofi ç
e
t ue o marxi m é a filo
d s r s s d s
e
, as im
o
litar i mo da aç ã mat
s s d r d s
s
, P la
o
- a .
litari mo da xpan ão vit
o s o s d d e s
de
e s
. . st
mem faz a hi stória, endo
d ss d s
Quando, por exemplo, na R,u ia sov1. e, t1ca se fiz ram con- sua atividade material, o ho
e a o s
. e cla s ,
explic ada pela lut
ss e
stór ia tô a
a q d
. Diz Marx e hi
s s b d d s r u
ras
r
n atureza humana.
s q o
ao movimento do
s
e
mem.
s
ta o para o céreb ro do ho
s
ent e a verda e e o êr o, o
s
NAITRE LE COMuUNTSME - I
da e, ma as exigência da
r b
d
volucionária.
objetividade e lucidez.
=-�-------------..:. .J
123
122
O E. COMUNISMO
J. P. GALVÃO DE SOUSA CAPITALISMO, SOCIALISM
. a de igua is
à
, com u ma valide z e dignid
FAZER?" e pub lica do em 1902: "Sem teoria r evo lu cio nária não manecer inde pe nde ntes
wa .13 . . o tr m . n f· o
pode ha ve r mo vime nto re vo lucionár io". . . es b e1 c d em 1917' co m
"
do pro funda me nte r evolu cio nár io , nu ma co nce pção da vida hu m pr o
a
qü ê cia d
f e l1eb aa r às' últ imas conse
u niverso e às cre nças tra dicio na is do po vo russ o. -lhe f aolitada a tai e a de
n s o
T a l é a fôrça da ideo logia que s er ve de base a o co munismo e seu i� á:��i;���:�t \ ��� _ política ost e tão em t
i
: s da � ,1: r! �:r��:�
ta l o s eu a lca nce n a sub versão da pr ópria me nta lida de hu man a de qu
. Sta lm sobre i· u do a ide ia
p
c n n-
te nde nd o destru ir o s fu nda men tos trans cendentes da vida hu ma 0 ao tit smo e mais r
gências su rgidas , do trotsl.._1� . so viét ica e aC hina verme lha.
e e e
. p
·nd us tr ia l so b a di
1
ur
é c
s
ciênci a verda de ira e o briga tória da vida hu mana e de seus fin s. 3 j ulh_o 1950 .
177-185, n. , STALIN in .THE RE-
S ão into le ra ntes . P ro põe m-s e a extir par tôdas as ou tras dou tr i 14 . W . Gurian, FROMLENIN TO
. 12.
na s e filoso fias . N ã o to lera m ne nhuma limita ção aos s eus desíg VIEW OF POLITICS, vol �uest-o foi a mplamente divulgado pel a
15. O doc m to e_m
nios e ao seu poder . Os movime ntos to talitários não co ncebem a o or�g inal no PRA
VDA de 30 de ju lho
imprens a m undial. P ubhca � n o s:rn.ana, no
u en
a duç a o,
· RE LAZIONI INTER-
ne nhu m do mínio da vida fora do s eu co ntrôle ; não po de m a ce i de 196 1. Um bo tr
26 de agosto claquele ano.
a
NAZIONALl deMilão de
a
ta r que haja o utras dou trinas ou ins titu ições ten do direito a pe r-
124
J. P. GALVÃO
DE SOUSA
Alé�' de _se referir a tem CAPITALISMO, SOCIALISMO E COMUNISMO 125
mente o nacionalismo" as estratég icos e tat , rco
. s - notada
. , expIora do como a rm .
nos 1:11ov1mentos de lib a de prop aganda chega a usar a expressão "moral comunista", procurando codifi
ertação nacional e
relacronadas com a "co numer osas que car-lhe os princípios. É dada uma grande ênfase às obrigações
· existência pao'fº' " stões
ica - ·
Comumsta focaliza êstes
. dois temas essenc1a . . o nôvo Mamfesto para com a ideologia que o Partido representa. Neste sentido,
oentI'f'ico e a marcha da 1s.· 0 na turahsm . entre os mencionados princípios do nôv o código moral, está, em
i-evolucão. o
primeiro lugar, "a fidelidade à causa do comunismo, o amor pela
. NA T� RALISMO CIE.NTfFICO
- A soci. eda de
a)
msta, na expenencia sov prátria do socialismo e pelos países socialistas", sendo outro prin
iética' é uma imen . comu.
lho r, uma tecno-burocrac sa tecnocracr· a, cípio "a intransigência para com os inimigos do comunismo, da
ia materiai'ista. ou me-
- A tarefa da sua edific paz e da liberdade do s povos" (sic) .
acão, pelo Estado total . , .
nao apenas a estruturacã . rtano, si ifica b) A MARCHA DA REVOLUÇÃO - As nov,.as diretri
, o ela - ordem socra I em novas b a gn zes assim dadas não nos devem iludir quanto à substância da sig
a te, mesmo a reconstruç ses, mas
ão do homem.
O �a� ifesto expõe os nificação ideológica da revolução russa. Esta continua sendo
. objetivos do , Partido no co
ª. base tecmco-material da
sociedade' a d'rreç�- o d n cernente
sempre a mesma, na aplicação do marxismo-leninismo e da dia
lética da ação. Enganam-se os que pretendem ver nas conces
cronal e à planificação . a ec o n omia na.
' ao desenv.o1v1me nto industn· a1 e sões feitas desde o tempo de Stalin um recuo do comunismo no
1 a, ao bem-estar mater - agríco -
ial do povo' as que diz respeito, por exemplo, à propriedade, à família, à pátria
m ocraci. a s ocra . .
hsta' aos p··1 oblemas das
. funçoes do Esta d
. o n a de-
1 mg .
, trc nacronah.dades e e à religião. Da mesma forma, a adaptação da ideologia comu
· u1s as, a, educação instrucão . • .
' ' crencra e cultu ra que stões nista à conjuntura atual do mundo, objetivada pelo programa
dos parse , . . , '
s socralrs tas en'tre si. as re1 ações de 1961, representa uma nova linha estratégica sem alterar a
Pormenores sôbre organ . . ideologia. O que se deve notar é a preocupação com a eficiência
izacã 1 d.
letras e artes, além de ou tras m;t�/;: i_cal,_ vida _r�ral, espo rtes, da estratégia de penetração e de infiltração, deixando-se para um
d1versas, ar figura
. Mas .º. que cumpre sobretudo destacar é m segundo plano a pregação ideológica.
na dos dingentes comun a plena
istas de estarem despe consciên- A propaganda comunista tem procurado envolver os povo s
maneir · a de conceb ' rtando uma nova ocidentais pela publicidade dada às realizações da Rússia sovié
Irm er o mu 11d o e a v1 da entre o s I
· 1ar · da era tec iomens. No tica nos domíni os da técnica industrial, do progresso científico
nolóo-t:>ica ' aprese11tam-se
grandes vanguardeiros, os comun·rst�s c e das atividades culturais. Viagens maravilhosas são proporcio
- reivindicando para s1. o.mo os
na renovaça o da humanid . um pione1n . nadas gratuitamente aos estudantes. A conquista do espaço é
ade · O messianismo sob . smo
Marx e Engels redigiram - �UJ· o sig. alardeada pela imprensa dos mais variado s países, firmando o
o primeiro Mamfesto . no
ga ao seu auge. E ao Comunista che prestígio dos cientistas russos. A viagem de um astronauta so
. . mesmo tempo se compro -
msmo esta, muito . va que o comu- viético em visita a povos estrangeir os, depois de realizada a sua
lona-e de ser mero sis
suª f.orça dessa espécie tema econômic_o, .
t:,
de "mística" oen pois tira proeza, e a recepção que lhe é prop orcionada em meio a mani
versão já realizada no - t1'f1 co-n atu r hsta. A in-
maten.a1·ismo de Feuerb
a festações de júbilo, vale mais, para a propaganda bolchevista,
1ouca tentativa de divini , ac h , com a sua do que a pregação doutrinária dos princípios marxistas ou a crí
zacão do bomem, e apli.
de tecnocráti ca do com cada na socied.:i- tica à estrutura político-econômica do capitalismo.
'
uni;mo.
Daí a importância dada Com reconhecida habilidade vão os comunistas promovendo
elo pro_gr ma �. "fo r
1
c�ncepção científica do
mun� o "' cu a � ase rde ��ção de uma a "guerra psicológica" e dominando os veículos de formação da
o � og rca é
x1smo-1eninismo e da qual se faz 1 o ma r- opinião pública pelo mundo todo. Muitas vêzes utiliza-se de
de é(rca com caráter ace decorrer um s••tema slogans que servem para iludir espíritos incautos: "legalidade",
ntuadamente coletrv1st . . •U
p eculiar
a. O Manifesto "democracia", "respeito à Constituição", "nacionalização'',
"autodeterminação dos povos", "coexistência pacífica".
126 J. P. GALVÃO DE SOUSA
. ma
of1c . ae - x Lim.onad,
- Ma
d. _ s. Paulo
16. THE DECISIVE DANGER OF THE URSS IS NOT �·· e impresso na
Êste livro foi. compo-,LO
rua s. Domingos, 15
.
CONSTITUTED BY THE USSR ITSELF, BUT BY THE SHORT �
COMINGS AND WEAKNESSES OF HER ADVERSARIES
1
( W. Gurian, artigo citado na REVIEW OF POLITICS, vol. 12,
julho de 1950, n. 3, págs. 387-388). No mesmo sentido, Fulto 11
Sheen, na obra citada, e Walter Lippmann em THE PUBLIC PHI
1
LOSOPHY.