HISTÓRIA DA OCUPAÇÃO DA AMAZÔNIA amazônicas de horticultores de floresta
A longa história do povoamento humano na tropical, baseadas principalmente no cultivo
Amazônia começa praticamente junto com da mandioca e do milho.
a formação da floresta que conhecemos
hoje. Apesar de ainda não terem sido encontrados vestígios concretos da presença humana na Amazônia durante o período compreendido entre 20.000 e 12.000 a.p. (antes do presente) foi, provavelmente, neste período que os primeiros grupos Gruta do Gavião, Carajás - Pa humanos provenientes da Ásia chegaram de sua longa migração até a América do Sul. Eram grupos nômades de caçadores- coletores que perseguiam as grandes manadas de animais.
PRIMEIROS HABITANTES
A Bacia Amazônica ocupa mais da metade
do Continente Sul-americano, e está distribuída entre vários países dos quais o território maior corresponde ao Brasil. Gruta do Pequiá, Carajás - Pa Apesar de já existirem, desde 1970, dados esparsos que levaram a se levantar hipóteses sobre a ocupação da Amazônia por bandos de caçadores arcaicos, foi somente a partir da década de 1990 que maiores evidências o demonstraram. Os achados, no Pará, da grutas do Gavião e de Pequiá, em Carajás, descobertas em 1985 e estudadas por arqueólogos do Museu Paraense Emílio Goeldi, e da Caverna da Pedra Pintada, em Monte Alegre, também descoberta por Caverna da Pedra Pintada em Monte Alegre - Pa pesquisadores do mesmo Museu e posteriormente escavada pela arqueóloga A Amazônia era então uma ampla extensão estadunidense Anna Roosevelt, de savanas, com apenas algumas manchas de demonstraram, sem dúvida, a existência de floresta ao longo dos rios. Nesse ambiente ocupações pré-históricas muito anteriores proliferavam grandes animais como o ao estabelecimento das culturas tradicionais mastodonte, a preguiça gigante, o toxodonte, o tigre-dentes-de-sabre e Estudos Amazônicos 6º Ano diversos outros exemplares de megafauna, com recursos alimentares mais diversificados os quais se supõe, serviam de base alimentar e novas formas de organização social para os bandos de caçadores gregários e surgiram. Essas novas práticas cujos fósseis podem ser encontrados nos socioculturais, por volta de 5.000 anos barrancos de muitos dos rios amazônicos, atrás, deram origem à chamada Cultura de especialmente no Acre. Floresta Tropical, caracterizada por grupos que praticavam uma agricultura ainda incipiente, complementada pela caça, pesca e coleta de frutos e sementes da floresta. A partir dessa nova organização social, os grupos pré-históricos amazônicos passaram também a fabricar cerâmica e a ocupar alguns locais por períodos mais prolongados. Com isso, deixaram grandes sítios arqueológicos que testemunham seu florescimento por toda a Amazônia. A Preguiça gigante, um dos exemplares da megafauna partir do surgimento da Cultura de Floresta que habitavam a Amazônia pré-histórica. Tropical, a ocupação humana da Amazônia alcançou o estágio de alta diversificação que os europeus encontraram ao começar a exploração da grande floresta. Para entender as estratégias de sobrevivência dos grupos pré-históricos amazônicos há que distinguir dois ecossistemas diferenciados: a várzea e a terra firme. A várzea corresponde às planícies inundáveis pelos rios que nascem nos Andes e que são ricos em nutrientes; O estranho Toxodonte, semelhante a um já na terra firme predominam solos pobres hipopótamo e rios com poucos nutrientes, conhecidos na A CULTURA DE FLORESTA TROPICAL região como “rios da fome”, provenientes dos escudos da Guiana e do Brasil dos quais Mudanças climáticas e ambientais, ocorridas o mais significativo é o Rio Negro. As áreas entre 7.000 e 6.000 anos, levaram ao de várzea contam com maiores recursos aumento da temperatura e da umidade do alimentares embora dependam de níveis planeta, fazendo com que as florestas se inseguros de inundação. Entretanto, a terra expandissem. Começava então uma segunda firme, que apresenta solos menos férteis, é fase do povoamento humano da Amazônia, também menos vulnerável a mudanças na qual as populações passaram a contar Estudos Amazônicos 6º Ano climáticas. Um complexo sistema de constantes imigrações, comuns nessa fase da adaptação ecológica e de relações história da humanidade já que as populações intertribais levou os homens das várzeas e eram nômades. das terras firmes amazônicas a criar SÉCULO X A.C. mecanismos de subsistência que permitiram Os registros de pesquisas nas áreas da o desenvolvimento de culturas inéditas e Antropologia, Arqueologia e Etno-História originais como as de Marajó, de Santarém desenvolvidas desde o século XIX, na ou do Amapá, para citar algumas das mais América e na Amazônia, permitem-nos significativas. afirmar que as civilizações complexas mais antigas, da Pré-História, surgiram entre os séculos XXV a.C. e X a.C. nas regiões Andinas e Mesoamericanas. Com relação à Amazônia, as civilizações complexas só surgiram por volta do século X a.C. Era comum, ainda, afirmar que, devido ao surgimento tardio das civilizações complexas na Amazônia, a sua ocupação pré-histórica ocorreu do Oeste para o Leste Amazônico, e o desenvolvimento dos cacicados complexos teriam sido originados nos Andes. Mas, graças às pesquisas feitas por Ossada encontrada em sítio arqueológico na Amazônia Domingos Ferreira Pena, João Barbosa Rodrigues, Charles Hart, Eduardo Góes VISÃO NEGATIVA Neves, Betty Megers, Anna Roosevelt, Até pouco tempo, havia uma visão negativa André Prous, Pedro Ignácio Schmits, a sobre o meio ambiente amazônico, orientação leva-nos para outra direção: a principalmente por falta de pesquisas ocupação pré-histórica da Amazônia científicas. Acreditava-se que, durante a originou-se do Leste para o Oeste, e os Pré-História, a Amazônia não foi capaz de cacicados complexos surgiram nas antigas desenvolver uma cultura complexa, a sociedades ceramistas do Oriente Amazônico exemplo dos Andes e da Mesoamérica. (ou marajoara). Divulgava-se a ideia de que a Região era um vazio demográfico devido à enorme acidez II – A OCUPAÇÃO PRÉ-HISTÓRICA DA do solo que, por sua vez, não permitia uma AMAZÔNIA BRASILEIRA grande produtividade agrícola. Acreditava- Não existe um quadro consensual, entre os se, ainda, que todos os artefatos de pesquisadores antropólogos e arqueólogos, civilizações pré-históricas encontrados eram sobre a periodização da ocupação pré- oriundos de outras regiões em função das histórica da Amazônia. Isso em função das Estudos Amazônicos 6º Ano poucas pesquisas realizadas nessas primeiras indicam uma especialização na caça desse fases de ocupação humana da Região. Por tipo, mas sim na caça e coleta generalizada. isso, os cientistas fizeram uma periodização provisória, assim organizada:
a) Primeira fase: Paleoindígena.
b) Segunda fase: Arcaica. c) Terceira fase: Pré-história Tardia.
A pré-história da Amazônia vai desde uma
ocupação paleoindígena, ocorrida acerca de 11.200 anos A.P. (antes do presente: expressão usada para datação de períodos arqueológicos; o ano de 1950 é a data inicial do Presente), até a extinção dos cacicados Pontas de lanças encontradas nas proximidades de complexos, a partir da primeira metade do cavernas amazônicas no período paleoindígena 2º milênio da Era Cristã. FASE ARCAICA FASE PALEOINDÍGENA O homem do período arcaico buscava novos A população era pouco numerosa, dispersa, recursos alimentares nas savanas, nas nômade e organizada socialmente em bandos estepes, no litoral e nos lagos. A caça é frouxos. Os bandos paleoindígenas da diversificada; amplia-se a coleta animal e América do Sul davam importância à coleta vegetal; a experimentação e o conhecimento de moluscos, de plantas e a caça de animais acumulado levam à domesticação das plantas de pequeno porte. e de animais. Acredita-se que a ocupação paleoindígena da Por volta de 6000 a. C., as populações Amazônia, que teria acontecido por volta estabelecidas em áreas produtivas ao longo de 9.200 a.C., era baseada na coleta de do rio Amazonas começam a fabricar frutas, na caça e na pesca; que se cerâmica. Entre 2000 e 1000 a.C., desenvolveu para uma cultura de pescadores desenvolveu-se uma ocupação estável de e coletores de moluscos. Isso pode ser horticultores de raízes (mandioca etc.), comprovado através dos restos alimentares produtores de cerâmica com decoração incisa que foram encontrados na caverna da Pedra e com apêndices zoomorfos modelados, às Pintada, em Monte Alegre, no Estado do vezes com pintura geométrica vermelha e Pará. branca. Apesar das pontas de lanças, encontradas Foram descobertos e identificados diversos na caverna da Pedra Pintada, que sugerem sambaquis (depósitos artificiais de conchas) os seus usos em caça de grandes animais, do delta em região do baixo Amazonas, especialmente de grandes peixes, não costa da Guiana e foz do Orinoco, através dos quais foi possível inferir-se uma Estudos Amazônicos 6º Ano transição da subsistência baseada na caça e construtores de tesos (aterros artificiais coleta para uma agricultura incipiente, e do construídos em áreas inundáveis), as quais estágio pré-cerâmico inicial ao cerâmico. foram sucedidas por sociedades complexas e hierarquizadas, associadas a uma indústria de cerâmica muito refinada. Tais sociedades seriam exemplificadas pela Marajoara, na ilha do Marajó, e pela Tapajônica, na região de Santarém.
Fragmentos de cerâmicas encontrados em Parintins,
Amazonas, da fase arcaica
FASE DA PRÉ-HISTÓRIA TARDIA
A Fase pré-história Tardia (1000 a.C. a
1000 d.C.) pode ser caracterizada pelo surgimento, ao longo dos principais braços e deltas dos rios, de sociedades indígenas Tesos – elevações construídas na ilha de Marajó, de com grau de complexidade bastante grande significativo na sua economia, na demografia e nas organizações políticas e sociais. Tinham domínios culturais tão grandes ou até mesmo maiores que os de muitos Estados pré-industriais do Velho Mundo, tais como as civilizações minoica e micênica e os Estados africanos como Ashanti e Benim, ou as do vale do Indo, na Índia. Essas sociedades indígenas são denominadas pelos antropólogos de cacicados complexos. Dados arqueológicos e etno-históricos revelam indícios da presença dessas sociedades indígenas complexas ao longo das Corte transversal de um teso funerário na ilha do várzeas dos rios Amazonas e Orinoco; nos Marajó contrafortes orientais dos Andes; e na EXTINÇÃO DOS CACICADOS região costeira do Caribe. Especificamente na Amazônia, por volta de Por cerca de dois mil anos, o meio ambiente
1000 a.C., desenvolvem-se as culturas dos forneceu a sustentação das sociedades
Estudos Amazônicos 6º Ano complexas, no entanto, com a chegada dos Resumindo, e no estado atual do europeus, tudo retrocedeu. Começaram as conhecimento, é possível o estabelecimento fases da conquista e da colonização; em de sequências sobre a ocupação humana na nome de uma civilização cristã e de uma Amazônia que abranjam desde as primeiras incessante busca de poder e riqueza levas de caçadores-coletores nômades material, os europeus destruíram os presentes nas várzeas e na terra firme cacicados – diretamente com as guerras e a desde o fim do Pleistoceno. escravidão; indiretamente, através do Posteriormente, já no Holoceno, aparecem contágio por doenças até então ocupações sedentárias ou semi-sedentárias desconhecidas – fazendo suas populações de horticultores de raízes e conhecedores da desaparecerem completamente da maior manufatura de uma cerâmica simples, parte das várzeas. assentados principalmente nas terras baixas Os índios sobreviventes internaram-se na de várzea. A esse período pertencem os floresta, formando sociedades tribais abundantes e extensos sambaquis fluviais independentes, provavelmente retornando que se encontram desde Manaus à costa do aos padrões que antecederam ao surgimento Pará e que apresentam estágios diversos de dos cacicados: subsistência baseada em ocupação, a partir do quinto milênio a.C. plantas amidoadas e proteína animal e os com intensivo aproveitamento dos recursos estilos artísticos principalmente marinhos. Num terceiro período que pode zoomórficos. ter começado em torno do século 5 d.C. e Nas atuais sociedades indígenas da chega até o contato europeu, formaram-se Amazônia, em geral, não se pode encontrar sociedades mais complexas e hierarquizadas nada que lembre as sociedades complexas do com chefias ou cacicados; construíram-se Período da Pré-história Tardia, a não ser grandes aterros onde situam-se as aldeias alguns vestígios materiais, e o registro na tanto para proteger-se das enchentes como memória das crônicas dos conquistadores por medida defensiva e onde também dos séculos XVI e XVII. enterravam os mortos. As cerâmicas cerimoniais e funerárias dessas sociedades são policromas e profusamente decoradas com relevos e apliques antropomorfos e zoomorfos de grande complexidade. Seu estágio cultural pode se situar no chamado período “formativo” das altas culturas andinas.