Você está na página 1de 24

Hatha Yoga

Filosofia e prática para o cotidiano

Prof. Gustavo Silva Araújo

"Aquilo que permeia tudo, que nada o transcende, e o qual, como o espaço universal
à nossa volta, preenche completamente tudo, por dentro e por fora, esse Brahman
Supremo não-dual – isso és Tu."
Shankara

O que é Yoga

O Yoga é uma filosofia. Os primeiros textos desta filosofia foram escritos


na Índia, por volta de 4000 a.C. No entanto, ela é bem mais antiga. De acordo com
Pedro Kupfer (2007):

O Yoga é inerente ao ser humano e esteve sempre vivo na memória da


Humanidade. Sabemos que as crianças fazem espontaneamente técnicas de Yoga,
sempre de brincadeira, sempre de forma instintiva. Isto, porque ele faz parte da
nossa essência. O Yoga nasce a partir da compreensão das manifestações externas
da Natureza e suas influências subjetivas sobre a consciência humana.

Em outras palavras, não se pode definir com exatidão a origem do Yoga,


porque ele sempre existiu. A busca humana pela conexão com a fonte de tudo é tão
antiga quanto a própria humanidade, e há quem diga que essa busca é o que nos
torna, de fato, humanos.
Os yogis e yoginis são, portanto, filósofos e filósofas. Praticam a ​philos
sofia,​ o amor à sabedoria. Todo o seu caminho, suas buscas e suas vidas têm o
propósito de fazer a passagem da ignorância para a sabedoria, do sofrimento à
libertação. Para um yogi e uma yogini, este é o objetivo único da existência humana:
conhecer sua verdadeira natureza. Todas as tradições espirituais ao redor do
planeta e através dos tempos, compartilham do mesmo objetivo: “Conhece-te a ti
mesmo e conhecerás o Universo”; “Conhecereis a Verdade, e a Verdade vos
libertará”.
As tradições filosóficas ocidentais passeiam entre formas distintas de se
chegar à sabedoria, ao conhecimento sobre a realidade. Os empiristas, por exemplo,
valorizam mais a experiência dos sentidos, e os racionalistas afirmam que a razão é
o caminho para se chegar a tal conhecimento.
Os empiristas afirmam que a razão não pode chegar à verdade sobre as
coisas, pois acreditam que a experiência sensorial da realidade é imprescindível. Os
racionalistas, ao contrário, dizem que os sentidos enganam, e que só o pensamento
racional é capaz de chegar à essência da realidade. Muitos filósofos misturam esses
dois extremos de várias formas diferentes, criando conceitos e fórmulas que lhes
permitem refletir com mais acuidade sobre si mesmos e o mundo que os cerca.
Ao entrar em contato com filosofias de origem oriental, em especial o
Yoga, percebem-se muitas diferenças. O Yoga é uma filosofia experiencial. Isto quer
dizer que, ao contrário de filosofias que buscam refletir sobre a realidade através do
pensamento, ou contactá-la através dos sentidos, o Yoga propõe a experiência
direta da realidade, tal como ela é. Afirma que os sentidos e os pensamentos nos
mostram uma parte mínima da realidade, e que para ir mais fundo, é preciso
transcender ambos.
Os modos de filosofar ocidental e oriental estão bem simbolizados pelas
imagens das esculturas a seguir.

“O pensador”, de Auguste Rodin, na França; Estátua de Shiva na entrada de um templo na Índia


Para um yogi, o pensamento jamais poderia chegar ao conhecimento
último sobre existência, pois ele é limitado por seus próprios conceitos, ideias,
memórias e condicionamentos. Da mesma forma, a porção de realidade que nossos
sentidos nos permitem vislumbrar é muito pequena e limitada pelo nosso próprio
ponto de vista.
Como toda filosofia, o Yoga busca responder às questões básicas: “quem
sou eu?”, “de onde vim?”, “para onde vou?”, “qual o propósito da vida?”. Os yogis
não têm a pretensão de esmiuçar o funcionamento do cosmos a partir do estudo das
infinitas formas que o compõem. Eles perceberam que a única maneira de chegar à
experiência direta da realidade é através do conhecimento sobre si mesmos, e
chegaram a esta percepção ao observar que as leis que regem o funcionamento de
todo o universo são as mesmas que regem sua própria vida. Ou seja, o
autoconhecimento é a chave para desvendar todos os mistérios da criação.
Todas as tradições espirituais ao redor do planeta ensinam - cada qual à
sua maneira - que o ser humano é um microcosmo - réplica em miniatura do
Macrocosmo. Todas as informações contidas no Macrocosmo estão presentes em
estado germinal e simplificado no microcosmo humano, assim como cada célula
contém, em si, o código necessário para a construção do organismo inteiro pela
linguagem do DNA. Decifrar a linguagem do corpo, da mente e das emoções, é
chegar ao entendimento do funcionamento de tudo que existe.
Para chegar a conhecer os mistérios da criação dentro de si, foram
desenvolvidas tecnologias sofisticadas de exploração do universo interior, como por
exemplo: a entoação de sons de poder (mantra), técnicas respiratórias (pranayama),
gestos com o corpo e com as mãos (mudra), posturas e movimentos corporais
(asana), procedimentos de purificação (kriya) e a meditação, que é o principal
método de autoconhecimento, o mais direto e eficaz. Essas tecnologias têm como
principal objetivo retirar os véus de ilusão que encobrem nossa percepção da
realidade.
São muitos os véus que nos impedem de ver a essência por trás das
aparências, a Unidade por trás da multiplicidade. Há muitos “ruídos internos” que
limitam a forma como olhamos para o mundo. Para o Yoga, sem retirar esses ruídos
e cessar a confusão da mente, não se pode obter nem um mínimo vislumbre da
realidade, apenas sombras dela. Tudo que chamamos de “real” são apenas as
projeções de nossa própria maneira de olhar para o mundo. Vivendo assim
mergulhados numa ilusão autocriada, o sofrimento torna-se inevitável. A partir da
libertação dessas amarras internas, a vida muda de tom e passamos a enxergar o
que antes não conseguíamos. É por isto que o Yoga é, também, um caminho de
libertação do sofrimento, um caminho para a bem-aventurança.
Nossa cultura fez avanços incríveis em relação às tecnologias materiais.
Conseguimos criar aparelhos de uma sofisticação inimaginável, exploramos o
espaço sideral e criamos condições materiais suficientes para que todos no planeta
possam viver dignamente. Por que isso não acontece? Talvez porque o
desenvolvimento de virtudes como a sabedoria, a integridade, a fraternidade, a
vontade e o discernimento foram deixados de lado, como artigos de segunda
categoria.
O Yoga é uma tradição milenar, de pessoas que dedicaram suas vidas ao
desenvolvimento de tecnologias interiores que nos possibilitam, ainda hoje, cultivar
as virtudes necessárias para o pleno desabrochar de nosso potencial adormecido.
Funciona como um agente catalisador que acelera o processo de despertar da
consciência. Não é um atalho, pois não existem atalhos para o despertar. É, na
verdade, um farol que ilumina a trilha e aponta a direção correta.

A palavra Yoga vem do sânscrito e significa “união”. Mas o que está


separado, e que precisa ser unido? Para responder a esta questão, vamos observar
como o Yoga compreende o universo.

Além de tudo o que existe, do tempo e do espaço, existe o Tudo-Nada.


O Tudo-Nada, como o próprio nome já diz, é o Todo - a totalidade da
existência - e o Nada - o vazio absoluto, de onde tudo pode vir a ser - unidos em
perfeito equilíbrio.
O Tudo-Nada é Uno. Nele, não há dualidade, nem polaridade. Sem
dualidade ou polaridade, não há movimento, nem mudança, nem tempo, nem
espaço. Ele é absoluto, imóvel, imutável, indivisível, sem tamanho, sem forma, sem
nascimento e sem morte.
Da mente vazia do Tudo-Nada, surge a ideia do Todo - a totalidade da
existência.
O Tudo-Nada continua absoluto, imóvel, imutável, indivisível, sem
tamanho, sem forma, sem nascimento e sem morte. Apenas sua mente projeta a sua
ideia de perfeição. A ideia de perfeição na mente do Tudo-Nada é o Todo - a
totalidade da existência.
O Todo é tudo o que existe em todos os níveis da existência, do mais sutil
ao mais denso. Ele possui leis de funcionamento que expressam a ideia de perfeição
na mente do Tudo-Nada.
Assim como um personagem de um romance carrega, em si, a ideia de
seu autor, o Todo carrega em si a ideia de perfeição da mente do Tudo-Nada, e se
manifesta de acordo com suas leis.
O personagem, porém, jamais pode se igualar ao seu autor. O Todo, por
mais belo que seja, não passa de uma ideia na mente do Tudo-Nada.
O Todo é a Inteligência Suprema do Universo. Ele é a Consciência da
totalidade das coisas que existem no cosmos, da menor partícula à maior das
galáxias. O Todo é o Maestro que faz com que a orquestra universal toque sua
música com perfeição.
As leis que regem o funcionamento do universo são as mesmas em todos
os planos de existência, do mais sutil ao mais denso. Da mesma forma que o
Tudo-Nada projetou sua ideia de perfeição para formar o Todo, o Todo projetou a si
mesmo em cada uma de suas partes.
Cada uma das partes que compõem a totalidade da criação, da menor
partícula à maior das galáxias, foi criada contendo, em si, a semente do Todo.
Um autor, ao criar um personagem, não pode se esquivar de colocar a si
mesmo nele. O personagem é a impressão digital de um momento da vida do autor.
As formas da criação são as impressões digitais de momentos da vida do Todo.
Do movimento incessante do Todo, surgem as formas da criação, que são
sempre duais. Todo o universo manifestado é dual. Para que algo se manifeste, é
preciso haver dois pólos que gerem o movimento. O Universo manifestado, e tudo
dentro dele, é relativo, mutável, finito, possui forma, tamanho, nascimento e morte.
A dualidade básica, primordial, que surge do Uno e dá origem a todas as
outras polaridades, é Espírito e Natureza. A Natureza dá a forma e a matéria-prima;
o Espírito a molda e vivifica. Sem qualquer um dos dois, não pode haver
manifestação.
Todas as formas da criação têm uma consciência individual que lhes
confere uma visão fragmentada da realidade. A partir dessa visão fragmentada, os
personagens passam a acreditar que têm uma vida separada do autor da obra e dos
outros integrantes do enredo.
A Consciência do Todo é sistêmica, integrada, unificada, total. Ele sabe
que todas as formas da criação estão conectadas, pois são como as células de seu
próprio corpo. No entanto, elas não sabem disso, e se vêem como separadas umas
das outras e de seu Criador. A consciência fragmentada, de separação, nasce da
ignorância das partes sobre sua verdadeira natureza. Essa ignorância dá origem a
todo o sofrimento. O sofrimento contém, dentro de si mesmo, o anseio pela
unificação.
O personagem não tem a mesma consciência do autor, mas contém, em
si, a semente de sua herança. Esta semente é a chave para que ele se reconheça
como o personagem de um palco montado na mente do Tudo-Nada, para manifestar
sua ideia de perfeição.
Sendo a manifestação da ideia de perfeição na mente do Tudo-Nada, o
personagem se reconhece como uma réplica em miniatura do Universo, e que
dentro de si existem todas as ferramentas necessárias para se libertar da ilusão de
separação.
Dissolvendo sua pequena consciência individual na Consciência Universal
do Todo, o personagem passa a viver de acordo com as leis de funcionamento do
cosmos, e a ser um instrumento delas, para o benefício da libertação de todos os
outros personagens. A gota de água reconhece sua identidade como Oceano.
A ciência que ensina como realizar a dissolução - união - integração da
consciência individual na Consciência Universal chama-se Yoga.
Existem vários tipo de Yoga.
Bhakti Yoga, é o Yoga da devoção. Através da devoção, do amor e do
serviço desinteressado à Consciência Universal, presente em si mesmo e em todos
os seres, o bhakti yogi alcança a unificação.
Karma Yoga, é o Yoga da ação. Através da renúncia aos frutos de suas
atividades, livre do desejo de recompensas e do receio de críticas, abrindo mão do
apego e da aversão, o karma yogi desenvolve a perfeita equanimidade e atinge a
unificação.
Jnana Yoga, é o Yoga da sabedoria. Através do autoestudo, da leitura
dos textos sagrados, da meditação e da contemplação naquilo que é Real, o jnana
yogi se liberta da ilusão de separatividade e reconhece sua verdadeira natureza.
Existem muitos outros meios, todos com o mesmo fim. Depois de unificar
a consciência individual com a Consciência Universal, o ser continua seu trabalho de
auxiliar os outros seres no caminho da libertação, pois enquanto houver uma única
consciência fragmentada, ele mesmo estará fragmentado.
Ninguém se liberta sozinho. O sofrimento de um é o sofrimento de todos.
A bem-aventurança de um é a bem-aventurança de todos. É por isso que tantos
seres iluminados continuaram sua jornada pela Terra, mesmo depois de sua
iluminação, ensinando à humanidade o caminho da unidade através da maior força
unificadora que existe: o amor. O amor é a perfeita expressão da unidade universal,
e por isso foi ensinado por todos os avatares.
Após a completa unificação das consciências individuais na Consciência
Universal do Todo, ele volta a se multiplicar e reinicia o ciclo. Este movimento é
chamado de “a respiração do Todo”. Na exalação, ele cria o universo manifestado,
com suas consciências individuais fragmentadas. Na inspiração, ele recolhe as
consciências fragmentadas de volta para o seu seio.
É por isso que se dá tanta importância à respiração nas práticas de
autoconhecimento. A respiração humana repete o movimento universal de expansão
e recolhimento, de forma simplificada.
O que motiva a Consciência Universal a fazer este movimento acontecer?
Por que isto acontece?
A esta pergunta, até o mais sábio dos sábios se cala.
O Yoga que trabalha com posturas corporais, exercícios de respiração e
outras técnicas psicofísicas, é chamado de Hatha Yoga. Os primeiros tratados
específicos desta tradição surgiram na Idade Média da Índia. No entanto, os hatha
yogis não inventaram nada de novo, e sim redescobriram o uso de técnicas que já
existiam há milênios, adaptando-as à cultura de seu tempo.
Hatha é uma palavra composta de duas sílabas: Ha e Tha.
Ha é a polaridade ativa presente em todo ser humano. Ela é solar,
racional, quente, expansiva.
Tha é a polaridade receptiva. Ela é lunar, emocional, fria, introspectiva.
Segundo os textos clássicos, o Hatha Yoga é uma preparação para o
Raja Yoga, o “Yoga Real”, que é a ciência da integração do eu individual ao Eu
Universal através da meditação.
O Raja Yoga foi descrito num texto clássico chamado “Yoga Sutras de
Patañjali”, que é o texto mais estudado sobre o assunto, até hoje.

Os Yoga Sutras de Patañjali

Quase nada se sabe sobre a vida de Patañjali. Algumas escolas


acreditam que ele é um personagem fictício, e que suas obras são produto do
trabalho de várias pessoas ao longo dos séculos. Da mesma forma que Vyasa, o
“autor” dos Vedas, na verdade é um título que em sânscrito significa “compilador” ou
“organizador”, tendo sido atribuído a todas as pessoas que, ao longo de muitos
séculos, se dedicaram a colocar no papel a sabedoria até então transmitida apenas
oralmente numa tradição de mestre a discípulo.
Tendo ou não existido, sendo uma pessoa ou um título concedido a várias
pessoas, Patañjali deve ter vivido em algum período entre 200 a. C. e 400 d. C. É
considerado o autor dos Yoga Sutras, compilados provavelmente em 150 d. C.
Sutra é uma palavra em sânscrito que significa literalmente “corda” ou
“fio”. É um modo de transmissão de ensinamentos cujo conteúdo não pode ser
diretamente compreendido através de palavras. Assim, os sutras são pequenos
aforismos que contém em si um ensinamento muito mais profundo do que aquele
imediatamente expresso. São muito concisos e apresentam o assunto de forma
linear, facilitando a memorização. Pela dificuldade na interpretação, ganharam
extensos comentários ao longo das gerações, que visam facilitar o entendimento do
texto original sob vários pontos de vista.
Alguns trechos são importantes para se compreender o Yoga e como ele
pretende alcançar seu objetivo.
O segundo sutra do primeiro capítulo (I, 2) nos oferece uma preciosa
definição geral:

Yoga: Integração; união; dissolução da consciência individual na Consciência


Universal.
Citta: Substância mental; consciência.
Vrtti: Flutuação, vórtice, processo, modificação, onda, padrão, movimento,
turbulência.
Nirodhah: Domínio, restrição, regulação, cessação, aquietação, canalização,
repouso, recolhimento.

Algumas traduções possíveis:


Yoga é o recolhimento das flutuações da mente.
Yoga é o controle dos movimentos da mente.
Yoga é a aquietação das modificações da mente.
No terceiro sutra, está o resultado: “Então, o sujeito está estabelecido em
sua própria natureza”. Ou seja: aquietando a agitação mental, enxergamos nossa
própria natureza.
A agitação mental é como as ondas que nos impedem de ver o fundo do
oceano. Quando elas se acalmam, percebemos que são passageiras e mutáveis,
enquanto o fundo do oceano é duradouro e imutável. Na aparência da superfície,
estamos todos separados, como as ondas, ou como as árvores de uma floresta. Na
profundidade, entretanto, estamos todos conectados, como o oceano, ou como as
raízes entrelaçadas das árvores.
Alguns sintomas do turbilhão mental são: cansaço, fadiga, insônia,
ansiedade, agitação, tristeza, dificuldade de concentração, pânico. Sintomas muito
comuns numa era de grande agitação como a nossa.
Para Patañjali, os cinco principais obstáculos para a aquietação da
confusão mental são: orgulho, medo da morte, apego, aversão e ignorância.
A ignorância a respeito da realidade e de si mesmo é a “causa-mãe” de
todos os outros obstáculos.
Ela gera o orgulho, o medo da morte, o apego e a aversão, que geram
todos os turbilhões de confusão da mente, que são a causa de todo o sofrimento
humano.
O remédio para a ignorância (Avidya) é o conhecimento (Vidya) obtido
através da percepção da realidade tal como ela é de fato. Isso só é possível
acalmando, reduzindo, recolhendo o turbilhão mental. Quando ele se acalma, a
realidade se mostra tal como é: a Unidade por trás da aparência de multiplicidade.
Acaba-se assim o medo da morte, o orgulho, a aversão e o apego, com a
consciência de que o Todo está contido nas partes, de que nada se perde e nada se
ganha, e que a plenitude está presente o tempo inteiro. A consciência dessa verdade
dissipa todo o sofrimento.
Nas palavras de B. K. S. Iyengar:

Yoga é o método pelo qual a agitação da mente é acalmada e a energia é dirigida


para canais construtivos. Como um rio caudaloso que, propriamente contido por
represas e canais, cria um vasto reservatório de água, previne a fome e provê
energia abundante para a indústria, assim também é a mente: quando controlada,
fornece um reservatório de paz e gera energia abundante para a elevação humana.

Pela prática constante dos meios apropriados, pode uma pessoa


canalizar toda a energia dispersa da atividade mental, recolhendo os sentidos de
objetivos egoísticos e alargando os horizontes de sua individualidade até abranger a
consciência da Unidade intrínseca a tudo que existe no Universo.
Quais são os meios apropriados para se atingir este estado?
Patañjali descreve os oito membros (Ashtanga) que levam a pessoa a
uma maior compreensão de sua natureza real.

O Ashtanga (Oito Passos)


de Patañjali

Yama

Os Yama são cinco princípios éticos que orientam nosso relacionamento


com o mundo e com nós mesmos. Eles servem para que possamos refinar o nosso
nível de consciência sobre a realidade, na medida em que passamos a ter uma visão
mais integrada e abrangente, percebendo que os nossos atos - por menores que
sejam - influenciam todos os seres ao nosso redor. Essa influência é positiva quando
os auxiliamos em seu processo de desenvolvimento, e negativa quando
prejudicamos ou atrasamos sua caminhada evolutiva.
Funciona como um norte e um farol que clareia o caminho da ação, para
não reagirmos de modo prejudicial diante dos desafios da vida. Antes, passamos a
enxergá-los como oportunidades de crescimento, na medida em que empenhamos
toda a nossa sabedoria na escolha da atitude que tenha o máximo benefício para
nós e para os demais.
I. Ahimsa (não-violência)

A violência é a ação de causar dano ou prejudicar a si mesmo ou aos


outros. É o sinal mais claro de que a consciência está fragmentada. A pessoa
violenta não consegue perceber a unidade entre ela e o ser agredido, e que,
prejudicando a outrem, prejudica-se também a si mesma.
A não-violência não é apenas abster-se de prejudicar outros seres.
Ahimsa é uma postura ativa de realizar ações benignas, auxiliando no caminho
evolutivo de todos.
Se possuo capacidades que podem contribuir para o processo evolutivo
de outras pessoas e não as utilizo, isto é uma forma de egoísmo que fere o princípio
de Ahimsa. A vida pede ação, movimento e renúncia aos resultados.
A palavra violência vem do latim ​violentia,​ que significa veemência,
impetuosidade. Todos temos um ímpeto de agir com agressividade e “descontar” ou
“descarregar” nossas frustrações sobre os demais. Ahimsa é o canal que direciona
toda a energia agressiva, como uma mola propulsora, na direção construtiva do
amor.
A lei de causa e efeito é implacável no universo; portanto, buscar fazer
justiça com as próprias mãos é tolice. É acreditar que se pode fazer melhor do que o
funcionamento perfeito das leis universais. Defender-se de um ataque físico é
impedir que o atacante faça mal a si mesmo; se feito com essa consciência, é um
ato de grande compaixão. No entanto, qualquer ação realizada com espírito de
vingança é contrária à direção de Ahimsa.
Busca-se eliminar a maldade, e não os malfeitores. A história mostra que
todo ser humano tem a capacidade de se transformar. Prejudicar significa “emitir
julgamento antecipadamente”. Não cabe a nós dar a outrem a colheita pelas suas
ações, mas sim, ser a luz do discernimento que o fará descobrir em si mesmo a
benignidade que é sua verdadeira natureza.

II. Satya (veracidade);


A veracidade é o alinhamento entre pensamento, sentimento, palavra e
ação. Quando os quatro estão apontados em direções diferentes, a pessoa perde o
senso de equilíbrio interior que lhe daria a possibilidade de conhecer-se com
profundidade. Quando iludimos a nós mesmos ou aos outros, nos afastamos da
verdade e nos enveredamos ainda mais na teia de ilusão que gera o sofrimento.
Uma pessoa que pratica Satya procura observar seus pensamentos,
sentimentos, palavras e ações, e busca de colocá-las todas apontadas para uma
mesma direção: aquela que trará benefícios para si mesmo e para os demais, sem
prejudicar ninguém. Satya, portanto, está diretamente relacionada com Ahimsa, pois
sabe-se que

a verdade deve ser dita... mas com mel nos lábios.

Todo yogi e yogini se comprometem, ao iniciar a senda, a serem


verdadeiros consigo mesmos e com os demais. Qualquer ato em que o eu precisa
se fragmentar é contrário a Satya, gera vrttis e afasta do objetivo do Yoga. A
integridade do ser torna-o límpido cristal, através do qual a Centelha Divina em nós
pode brilhar e agir sem obstáculos.

III. Asteya (não roubar);

Não roubar significa não apropriar-se de algo que não lhe é devido. O
roubo, nesse caso, não é apenas tomar algo de outra pessoa. Nós roubamos muito
de nós mesmos; roubamos o tempo, a energia, os sonhos, a atenção, o poder, os
talentos, a autoconfiança.

“Não há maior crime que matar um sonho,


nem maior virtude que realizá-lo”
Jorge Angel Livraga
Um outro sentido de roubo é atribuído a ter algo de que não necessito no
momento. Roubamos de nós mesmos, da Terra, da natureza, quando compramos
em demasia produtos feitos da matéria extraída de seu ventre, que ficam parados
em nossas casas, sem utilidade, esperando uma ocasião para sua serventia - que
geralmente nunca chega - enquanto há tantas pessoas em situação de extrema
miséria no planeta.

É vã e vergonhosa a vida do homem que, vivendo neste mundo de ação, tenta


abster-se da ação; quem, gozando o fruto da ação do mundo ativo, não coopera,
mas vive em ociosidade. Aquele que, aproveitando a volta da roda, em cada instante
de sua vida, não quer pôr a mão à roda para ajudar a movê-la, é um parasita e um
ladrão que toma, sem dar coisa alguma em troca.
Bhagavad Gita, 3:16.

Todos os recursos que nos são oferecidos como resultado de nossas


ações, são temporariamente entregues para que os utilizemos a serviço do
despertar da Centelha Divina - a Consciência Universal - presente no coração de
todos os seres.
Steya significa roubo: a utilização indevida de bens que chamamos de
“meus”, apesar de serem volúveis como pó. Pode-se traduzir Asteya como
“responsabilidade” ou, ainda, “honestidade”.

IV. Aparigraha (desapego);

O desapego é um aspecto fundamental no Yoga. Parigraha é


possessividade, ganância, avidez, cobiça, apego. Mas apego em relação a quê? A
tudo aquilo que é transitório, perecível, passageiro, evanescente.
Pessoas, situações, objetos materiais, ideias, crenças, conceitos, hábitos,
pensamentos, sofrimento, doença, sensações, prazer, dor… tudo está em constante
mudança, com um início, uma duração e um fim. Estamos conscientes disto?
Estamos dispostos a aceitar a mudança, a morte do corpo físico, a transformação e
o devir como aspectos inerentes da natureza e da vida? Ou estamos tão apegados a
ponto de não aceitar o inevitável?
Lutar contra o inevitável é causar a si mesmo um grande sofrimento.
A existência flui continuamente, como um rio. O apego acontece quando
tentamos interromper este fluxo. Águas novas estão brotando constantemente no rio
da vida. Prender-se a águas passadas é como construir uma grande barragem em
torno daquilo que nos é conhecido, familiar. No início, nos sentimos confortáveis e
protegidos, mas logo a represa torna-se pútrida, fétida, lamacenta. O único remédio
possível para este estado de estagnação é Aparigraha: soltar. Deixar fluir. Abrir-se
para o presente sempre novo do momento Agora e seguir a correnteza.
Viver o momento presente significa também abrir mão de toda expectativa
em relação ao futuro. Aparigraha é tirar um grande peso dos ombros, na medida em
que damos total importância àquilo que está diante de nós, neste momento. A
pessoa mais importante de nossa vida é aquela que está diante de nós agora
mesmo. Pode ser que amanhã ela não esteja mais presente em seu corpo físico.
Muitas vezes, choramos os mortos por nos sentirmos culpados pelo que não nos
dispusemos a fazer por eles enquanto estavam vivos na matéria. Não percamos
uma única oportunidade de expressar o amor da Divindade por toda a criação.
Quando compreendemos que somos peregrinos vivendo uma jornada de
aprendizado através do universo, vamos querer nos livrar da bagagem extra e seguir
a viagem com mais leveza. Tudo aquilo que não nos serve neste momento da
viagem, é bagagem extra que pesa e atrasa a caminhada. Ao nos livrarmos deste
peso excessivo, ganhamos mais energia, disposição, criatividade, clareza e
sabedoria. E abrimos espaço interno para receber aquilo que é mais necessário,
com a consciência de que também será transitório e passageiro.
Aparigraha é saber que somos a Centelha Divina, que ela é eterna, e que
tudo o mais são apenas acessórios que nos auxiliam a despertar.

V. Brahmacharya
“Char” significa mover-se e “Brahma” é o nome dado à energia ativa de
criação do universo. Brahmacharya significa literalmente, “andar com Brahma”, ou
seja, condução apropriada da energia criativa.
Mover-se em direção a Brahma é utilizar sua energia criativa de forma
sábia e prudente. Muitos autores traduzem este Yama como “castidade”, pois uma
das maiores formas de desperdício da energia criativa se dá através do uso da
sexualidade de forma banal e despropositada. Muitas vezes, a sexualidade é
utilizada inclusive de forma abusiva e violenta. Isto é mover-se na direção oposta de
Brahma.
A prática de Brahmacharya se dá quando transformamos o impulso
inconsciente de fazer uso da energia criativa com egoísmo, e passamos a utilizá-la
segundo propósitos mais elevados, como a harmonia, a beleza, a verdade e o amor.
Para tornar a nossa vida - e a de todos os seres que compartilham dessa existência
conosco - mais bela, harmoniosa, amorosa e verdadeira, servimos como uma ponte
para concretizar aquilo que o mundo precisa, a partir da inspiração dos planos mais
sutis da existência. Se nossa energia criativa estiver sendo desperdiçada através de
excessos, unicamente para o nosso próprio prazer pessoal, não teremos o suficiente
para construir essa ponte.
A esposa de Brahma, na mitologia hindu, é Saraswati, deusa da
sabedoria, das artes e da música. Isto nos dá uma ideia de como utilizar nossa
energia criativa com propósitos elevados.
Isto não significa que o sexo ou outras formas de prazer devem ser
deixadas de lado. Pelo contrário. A sexualidade é uma forma insubstituível de se
alcançar níveis mais profundos de consciência. A condição para isto é o desejo
sincero dos praticantes para realizar de forma sublime, bela, harmônica, amorosa e
verdadeira, até mesmo aquilo que há de mais básico, animal e instintivo em nossa
natureza. Se fizermos da sexualidade uma obra de arte, haveremos colocado toda
nossa estrutura física a serviço de nossa estrutura espiritual. É assim que podemos
caminhar na direção de Brahma.

2. Niyama
Os Niyamas são observâncias que nos auxiliam no nosso dia-a-dia.
Desprezá-los torna-nos displicentes e inaptos à prática da unificação. Praticá-los
constantemente é uma condição para que o yogi e a yogini sejam banhados nas
águas da sabedoria interior.
Algumas escolas não-dualistas afirmam que nenhuma observância é
necessária, pois já estamos desde sempre unificados à Consciência Universal,
restando apenas a pura contemplação da realidade como ela é. O Yoga, no entanto,
é um caminho constante de autopurificação e aperfeiçoamento. Um yogi e uma
yogini sabem que sua consciência individual é apenas um instrumento de
manifestação da Centelha Divina. Para que o brilho desta Centelha não seja
ofuscado pelo véu do egoísmo, o yogi e a yogini se mantém eternamente atentos ao
equilíbrio de seus corpos físico, energético, emocional e mental, a fim de colocá-los
sempre a serviço do Amor, da Compaixão e da Fraternidade.

I. Saucha (pureza);

A pureza se manifesta através de uma atenção constante aos quatro


veículos inferiores - físico, etérico, astral, mental - que compõem nossa existência
terrena. Esta atenção se traduz numa atitude de manter sua integridade em meio ao
caos. Não é uma assepsia moral que nos afasta do mundo, isolando-nos numa
bolha cor-de-rosa onde tudo é perfeito e brilhantino. Trata-se, sobretudo, da pureza
interior daqueles que sabem o que são, e não se deixam contaminar pelas
intempéries a que são submetidos.
A limpeza do corpo físico, por dentro e por fora, é parte integrante da
prática de Saucha. Os banhos, os kriyas - processos de purificação -, os asanas e
pranayamas, a meditação, a alimentação e o contato com a natureza tornam o corpo
livre de toxinas. As toxinas físicas são causa e consequência do estado pegajoso
que

II. Santosha (contentamento);


Prazer e dor são sensações corporais. Elas são inevitáveis, e
experimentamos ambas em vários momentos da vida. O apego em relação ao
prazer e a aversão em relação à dor causam sofrimento, pois estaríamos lutando
contra o inevitável. A observação do prazer e da dor de forma equânime gera
felicidade, pois assim estamos sempre abertos ao fluxo de emoções, sensações e
sentimentos que surgem a cada instante, e o rio da vida pode correr sem obstáculos.
Assim, prazer e dor não são escolhas, são sensações inevitáveis.
Felicidade e sofrimento são formas de lidar com os acontecimentos e dependem
inteiramente de nossa escolha. Nada de fora pode nos trazer felicidade, se não
estivermos abertos a recebê-la. Nada de fora pode nos trazer sofrimento, se vemos
tudo o que acontece conosco como uma oportunidade de aprendizado e bebemos
da fonte infinita de sabedoria.
Para além do sofrimento e da felicidade, existe o contentamento.
Santosha é a suprema bem-aventurança de um espírito que se manifesta no mundo
da matéria para experienciar a existência dual e retornar à casa da Unidade, eterna
morada de tudo que existe. Assim, independente do sofrimento, da felicidade, da dor
e do prazer, Santosha nos lembra a todo instante o ensinamento dos textos
sagrados sobre a plenitude do ser:

Oṁ. Isto é Plenitude, aquilo é Plenitude.


A Plenitude que surge da Plenitude
é realmente plena.
Tirando-se a Plenitude da Plenitude,
somente Plenitude permanece.
Que haja paz, paz, paz. Hariḥ Oṁ.
III. Tapas (fogo interior; força de vontade; disciplina);

Disciplina não é a obediência a uma autoridade externa, como nos foi


ensinado. Antes, a única e verdadeira disciplina é a obediência à voz interna da
intuição, que nos orienta a todo instante sobre o melhor caminho, a melhor palavra,
a melhor ação. A melhor ação é sempre aquela que conduz à integração.
A voz da intuição nem sempre é distinguida no meio do turbilhão de vozes
que ressoam pelo diálogo interno incessante no interior da consciência. Na
realidade, o burburinho mental é a parte externa da mente. O que há de mais
profundo nela é uma voz, ao mesmo tempo sutil e poderosa, que nem sempre se
manifesta em palavras, mas também em sentimentos, clarezas, certezas
inconfundíveis, que nos apontam a direção a seguir.
Se há dificuldade em ouvi-la, é porque o farol da intuição está
obscurecido pelas nuvens das vrttis. O único modo possível de ouvir sua sutil e
poderosa orientação é abaixar o volume dos ruídos da mente e focalizar a atenção
no silêncio que subjaz por trás de toda a aparente confusão. Isto só se consegue
através da meditação.
Ao discernir a voz do silêncio, pode-se então praticar Tapas: o fogo da
disciplina, a obediência às instruções interiores. Os adeptos que praticam este
princípio sentem o calor da devoção consumir toda iniquidade e displicência de suas
vidas. Qualquer propósito que almejem com sinceridade é facilmente alcançado.
Não desperdiçam um único segundo: quando descansam, repousam
profundamente; quando trabalham, dedicam-se ao máximo a suas atividades.
Com ritmo, presença de espírito e o amor como propósito inabalável,
estão constantemente abastecidos de energia vital, e realizam tudo com alegria e
leveza.

IV. Svadhyaya (autoestudo);

Svadhyaya se consegue através de uma sincera auto-observação.


Primeiro é necessário desfazer-se de toda autoimagem idealizada: descartar tudo
que nos contaram sobre nós, tanto críticas quanto elogios, e a imagem que criamos
sobre quem somos. A partir da percepção de nossas ações atuais, sem nos
vangloriar de atos passados nem nos culpar por erros já cometidos, passamos a
realizar o autoestudo a partir de cada mínimo detalhe de nossa vida, se - e como -
estamos aproveitando - ou não - esta experiência humana.
Como utilizo minhas capacidades e talentos? Eu conheço minhas
capacidades e talentos? Como lido com minhas limitações? Eu sei quais são minhas
limitações? E meus padrões de pensamento? Quais são minhas crenças mais
arraigadas, e como elas influenciam minha vida? Como lido com minhas emoções,
meu humor, meu relacionamento com outros seres? Por que ajo da forma como ajo?
Sou espontâneo, criativo e natural, ou tenho gestos automatizados, rígidos e
padronizados? Como observo as situações com as quais me deparo diariamente?
Como está o equilíbrio de meus chakras (que estudaremos mais
adiante)? Essas e outras questões são de fundamental importância. O autoestudo
anda de mãos dadas com o estudo da filosofia, dos textos sagrados e da experiência
de pessoas que já estão neste caminho a mais tempo que nós. Porém, nada disso
substitui o ingrediente essencial de Svadhyaya: a auto-observação sincera e
constante.

V. Isvara Pranidhana (autoentrega à Inteligência Divina;


aceitação à vida; renunciar aos frutos da ação).

Isvara é a Inteligência Suprema que rege o funcionamento das leis


cósmicas neste Universo em que vivemos. É o regente da orquestra dentro do sonho
do Tudo-Nada. Isvara Pranidhana é a confiança de que esta Inteligência sabe o que
é melhor para nós, e coloca em nosso caminho as exatas situações que precisamos
para evoluir.
Nunca a Inteligência Suprema colocaria em nossas mãos um fardo tão
pesado que fôssemos incapazes de carregar. Atravessar as dificuldades que
enfrentamos com sabedoria exige paciência e perseverança, mas antes de tudo,
saber que aquilo é um recado do Universo, dizendo que chegou o momento de
aprender mais uma lição. Sem esta consciência, acharemos que tudo é obra do
acaso, que somos desafortunados ou que existe alguém “por trás da cortina” sendo
injusto conosco.
Não existe acaso no Universo. A toda ação corresponde um efeito, e todo
efeito é consequência de uma ação que o originou. Não há preferidos nem
preteridos, azarados ou sortudos. As coincidências não são fruto do acaso: são
co-incidências, a incidência de vários fatores que desembocam num determinado
acontecimento. Nada é casual. Tudo é causal: possui uma causa, e gera uma
consequência. Se assim não fosse, o Universo seria um caos completo, e o caminho
do Yoga de nada nos serviria.
Pranidhana, a entrega, é um ato consciente de rendição à Suprema
Sabedoria - e somente a ela. A pessoa que pratica Isvara Pranidhana não se rende
diante de mais nada, pois adquiriu plena confiança no desenrolar da vida, e recebe
tudo como uma oportunidade de crescimento e aprendizado.

3. Asana:

Da raiz “as”, que significa assento, um Asana é uma postura corporal


através da qual pode-se assentar a mente e acalmar os vrttis.
Os sutras de Patañjali que mencionam Asana são apenas dois. O
primeiro diz ​sthira sukham asanam​: o Asana é estável (sthira) e confortável (sukha).
Do equilíbrio entre conforto e estabilidade, leveza e firmeza, força e flexibilidade,
surge uma postura onde a mente pode se assentar.
Existem milhares de Asanas - na verdade, eles são infinitos. Cada um
representa uma força da natureza ou um ensinamento.

4. Pranayama:

Prana pode ser descrito por palavras como vitalidade, energia, força,
alento. Ayama quer dizer algo como extensão, expansão, alongamento, retenção,
controle. Assim, Pranayama é a extensão e o controle da energia vital através da
respiração.
Citta - a mente - é como um veículo movido por duas poderosas forças:
prana e vasana.
Vasana pode ser descrito como uma impressão passada que gera
tendências de comportamento no presente.
Citta move-se na direção da força que for mais poderosa num dado
momento.
Se prevalece vasana, a respiração torna-se irregular, a mente fica
agitada, os sentidos dominam a consciência e as impressões passadas determinam
a direção da ação. Assim a pessoa se torna escrava dos velhos hábitos de
comportamento.
Se prevalece o fluxo de prana, as impressões passadas não geram um
impulso irrefreável de realização, a respiração torna-se calma e profunda, a mente e
os sentidos ficam sob controle.Assim o yogi e a yogini se libertam dos velhos hábitos
de comportamento, e geram novos hábitos, nascidos com a discriminação e o
autoconhecimento.
A respiração disciplinada ajuda a mente a se concentrar e habilita o
praticante a alcançar saúde robusta e longevidade. Mudanças químicas sutis
acontecem no corpo pela entrada abundante de oxigênio. Os pensamentos
tornam-se claros e límpidos, e a força de vontade predomina sobre a displicência.

4.1. Pranayama, sistema respiratório e sistema nervoso

Na inspiração normal, uma pessoa toma em média 500cm³ de ar; durante


a inspiração profunda, a entrada é 6 vezes maior, chegando a 3000cm³.
A causa primordial de qualquer doença ou desequilíbrio é a estagnação
de energia vital. O livre fluxo de prana gera saúde em todos os níveis.. Pranayama
ajuda a limpar os nadis, que órgãos tubulares do corpo sutil por onde a energia flui, e
assim melhora a saúde geral do praticante.
Quando os músculos do pescoço relaxam, os músculos da face também
se soltam e assim distensionam os órgãos dos sentidos, tornando a percepção da
realidade clara e limpa. Isto diminui a tensão no sistema nervoso, o que proporciona
maior capacidade de concentração, equanimidade e serenidade.

5. Pratyahara: domínio ou abstenção dos sentidos

A prática de Pratyahara consiste em abster-se dos sentidos externos e


voltar o olhar integralmente para o mundo interno, a fim de mergulhar na percepção
de quem eu sou.
A percepção de quem eu sou não depende de nenhum fator externo. Para
além da soma de minhas experiências transitórias, há um núcleo que permanece
imutável e independente delas. A prática de Pratyahara auxilia o yogi e a yogini a
abrir mão de tudo que lhes foi dito sobre si mesmo: louvores, críticas, elogios,
calúnias, glórias e censuras.

6. Dharana: Concentração.

A partir de Pratyahara, os três passos seguinte são interiores. Com os


sentidos recolhidos, chega o momento de unifocalizar a mente sobre um objeto, com
a finalidade de cumprir o objetivo do Yoga.
Neste estágio, ainda existe uma separação entre o sujeito que observa e
o objeto observado. Muitas distrações se interpõem no caminho, e a concentração
consiste em trazer a mente de volta para o objeto, sempre que ela se dispersar.
Este exercício faz com que aos poucos vá se descolando a identificação
com a personalidade transitória e revelando a conexão intrínseca do sujeito com o
objeto.
Alguns dos objetos de concentração mais utilizados são a chama de uma
vela, os olhos de outra pessoa, a sensação do ar na entrada das narinas, um
mantra, uma sílaba, o som de um sino ou tigela.

7. Dhyana: Meditação.
Dhyana significa literalmente meditação, a absorção do sujeito no objeto
de contemplação. Ao contrário de Dharana, em que há muitas distrações e o
reconhecimento de separação entre o sujeito e o objeto, em Dhyana a atenção é
mantida unifocalizada por um longo período de tempo e temporariamente cessa a
divisão entre o contemplador e a contemplação.

8. Samadhi

Estado de completa bem-aventurança. O êxtase da dissolução do eu -


fonte de todo sofrimento - na Fonte da Suprema Felicidade.

Você também pode gostar