Você está na página 1de 32

Arte grega em Bizâncio

Obras-primas da escultura grega (e romana) na antiga


Constantinopla
Constantinopla (Κωνσταντινούπολις; lit. "cidade de Constantino" - atual
Istambul, foi a capital do Império Romano (330–395), do Império
Bizantino (ou Império Romano do Oriente) (395–1204 e 1261–1453), do
Império Latino (1204–1261) e do Império Otomano, após a tomada pelos
turcos (1453–1922).
- Dedicada em 324 d.C., só em 330 a cidade foi oficialmente
transformada na capital do Império Romano.
- Constantino I converteu-se ao Cristianismo na sequência da sua vitória
sobre Magêncio na Batalha da Ponte Mílvia, em 28 de outubro de 312, a
qual mais tarde atribuiu ao Deus cristão. Segundo a tradição, na noite
anterior à batalha sonhou com uma cruz na qual estava escrito “In hoc
signo vinces”.
- De 324 d.C. ao saque de 1204, Constantinopla albergou uma coleção
única de esculturas antigas (gregas, romanas e helenísticas), recolhidas
por todo o Império Romano.
- Um esforço consciente e politicamente programado, centralizado na
figura do Imperador e dos seus colaboradores mais diretos.
- “Dedicatur Constantinopolis omnium paene urbium nuditate”
Jerónimo de Estridão (Chron. 324) - sobre a política artística de
Constantino.
- O duplo sentido de nuditate - o desnudar das demais cidades
(espoliação) e a nudez (tradicional) da arte clássica, mais tarde motivo
da ira cristã mais ortodoxa.
- De 324 d.C. ao saque de 1204, Constantinopla albergou uma coleção
única de esculturas antigas (gregas, romanas e helenísticas), recolhidas
por todo o Império Romano.
- Um esforço consciente e politicamente programado, centralizado na
figura do Imperador e dos seus colaboradores mais diretos.
- “Dedicatur Constantinopolis omnium paene urbium nuditate”
Jerónimo de Estridão (Chron. 324) - sobre a política artística de
Constantino.
- O duplo sentido de nuditate - o desnudar das demais cidades
(espoliação) e a nudez (tradicional) da arte clássica, mais tarde motivo
da ira cristã mais ortodoxa.
Constantinopla, um museu de identidade nacional
[vd. Bassett, S. (2004), The urban image of late antique Constantinople.
Cambridge.]

- Se Roma era uma autêntica galeria de arte ao ar livre, Constantinopla


teve que se transformar nisso mesmo em não mais que seis anos (324-
330 d.C.).
- Um plano global de natureza arquitetónica e museológica de
reconfiguração da velha Bizâncio.
- Dependendo da sua natureza (e mesmo intenção ideológica), as
estátuas antigas foram exibidas no exterior ou no interior de edifícios já
existentes, em muitos casos remodelados para o efeito.
- Constantino e a sua equipa tiveram que identificar (localizar), recolher,
transportar e exibir estas esculturas - as fases da museologia em embrião.
- Sozomen (II.3), no séc. V d.C., diz mesmo que Constantino teve que
“impôr impostos para cobrir as despesas de reconstrução e
embelezamento da cidade.”
Três “galerias” de
escultura antiga

- Hipódromo
- Balneários de Zêuxipo
- Palácio de Lausus
Balneários (Termas) de Caracalla - Roma
Proposta de reconstituição
Balneários (Termas) de Caracalla - Roma
Proposta de reconstituição

O Touro de Farnese e
o Héracles de Farnese
Duas cópias romanas de
originais gregos (séc. IV-III a.C.)
que adornavam os Balneários.
Balneários de Zêuxipo
Balneários de Zêuxipo
Balneários de Zêuxipo

Cristodoro, ᾽Έκφραϲιϲ τῶν  ἀγαλμάτων τῶν εἰϲ


τὸ δημόϲιον γυμνάϲιον τοῦ ἐπικαλουμένου Ζευξίππου (Écfrase das estátuas que adornavam
o interior do ginásio chamado Zêuxipo) - início do séc. VI d.C.,

- Descreve
80 estátuas ou grupos escultóricos da muito mais vasta coleção
que se poderia admirar nos Balneários. Datável dos primeiros anos do século VI d.C:,
durante o governo de Anastásio
(491-5181).

- Não necessariamente a mesma coleção que compusera Constantino e a sua equipa, c. 150
aos antes.

- Cristodoro fala de estátuas em bronze, mas outras fontes mencionam também o mármore.
Ou seja, Cristodoro deveu centrar-se numa só galeria (uma sala do complexo), onde as
estátuas poderiam ser todas de bronze.
Balneários de Zêuxipo
Uma galeria com 80 estátuas / grupos escultóricos

1. Deífobo (1-12); 2. Ésquines (13-16); 3. Aristóteles (16-22);


4. Demóstenes (23-31); 5. Eurípides (32-35); 6. Paléfato (36-
37); 7. Hesíodo (38-40); 8. Polieido (40-44); 9. Simónides
(44-49); 10. Anaxímenes (50-51); 11. Calcas (52-55); 12. Pirro
I (56-60); 13. Amímone (61-64); 14. Poséidon (65-68); 15.
Safo (69-71); 16. Apolo I (72-77); 17. Afrodite I (78-81); 18.
Alcibíades (82-85); 19. Crises (86-91); 20. Júlio César (92-96);
21. Platão (97-98); 22. Afrodite II (99-101); 23. Hermafrodito (102-107); 24. Erina (108-110); 25.
Terpandro (111-116); 26.
Péricles (117-120); 27. Pitágoras (120-124); 28. Estesícoro
(125-130); 29. Demócrito (131-135); 30. Héracles (136-138);
31. Auge (138-143); 32. Eneias (143-147); 33. Creúsa (148-
154); 34. Heleno (155-159); 35. Andrómaca (160-164); 36.
Menelau (165-167); 37. Helena (168-170); 38. Ulisses (171-
175); 39. Hécuba (175-188); 40. Cassandra (189-191); 41.
Pirro II (192-196); 42. Políxena (197-208); 43. Ájax, filho de
Oileu (209-214); 44. Enone (215-218); 45. Páris (219-221);
46. Dares (222-224); 47. Entelo (225-227); 48. Fílon/ Fílamon/
Mílon (228-240); 49. Caridemo (241-242); 50. Melampo
(243-245); 51. Panto (246-247); 52. Timetes (248-250);
53. Lâmpon (251-253); 54. Clítio (254-255); 55. Isócrates
Bases de três estátuas, recuperadas em 1928
“Hécuba” + “´Ésquines”
(Casson et alii 1929; Bassett 1996)
Fragmento de uma cabeça colossa (não indentif.) do Zêuxipo
Mármore. Ática. Séc. V-IV a.C.

(Casson et alii 1929: 40)


Safo (vv. 69-71)

A abelha da Piéria também lá


estava, Safo de clara voz, /

a de Lesbos, em repouso, e
parecia urdir uma canção
adorável,
Moeda de Mytilene
LESBOS, Mytilene. Julia Procula. Circa AD 139-161. Apollonius, /
strategus. Sappho the poet. Inscr.: ΕΠΙ ΣΤΠΑ ΑΠΟΛΛΩΝΙ / às Musas que velam pelo
ΜΥΤΙ
silêncio devotando a sua alma.

A.G. 2.69-71
A seu lado refulgia Cípris,
vertendo sobre o bronze
brilhante /
gotas da sua beleza; embora
mostrasse descoberto o busto,
/ prendia contudo o vestido
pelas pontas em torno das
coxas,
/ e tinha presas as suas tranças
por um véu todo em ouro.

A.G. 2.78-81

Vénus d’Arles (restaurada)


Musée du Louvre, N. inv. Ma 439
Altura: 1.94 metres
Cópia romana (séc. I d.C.) de um original de
Praxíteles, de c. 360 a.C. (a Afrodite de Téspias).
Três “galerias” de
escultura antiga

- Hipódromo
- Balneários de Zêuxipo
- Palácio de Lausus
Cedreno, Comp. Hist. 1.564 [Kedrenos A] [séc. XI d.C.]

Note that in the quarter of Lausos there used to be various buildings and certain
hostels at the place where the [cistern of] Philoxenus provided its water, whence its
name. There stood there also a statue of Lindian Athena, four cubits high, of emerald
stone, the work of the sculptors Skyllis and Dipoinos, which Sesostris, tyrant of Egypt,
once sent as a gift to Kleoboulos, tyrant of Lindos. Likewise the Knidian Aphrodite of
white stone, naked, shielding with her hand only her pudenda, a work of Praxiteles
of Knidos. Also the Samian Hera, a work of Lysippos and the Chian Bupalos; a winged
Eros holding a bow, brought from Myndos; the ivory Zeus by Pheidias, whom
Perikles dedicated at the temple of the Olympians; the statue representing Chronos, a
work of Lysippos, bald at the back and having hair in front; unicorns, tigresses,
vultures, giraffes, an ox-elephant, centaurs and pans.

[Transl. Mango et alii 1992]


Cedreno, Comp. Hist. 1.616 [Kedrenos B]

When he [Basiliskos] had been proclaimed, there occurred a conflagration in the City
which destroyed its most flourishing part. For it started in the middle of the
Chalkoprateia [Copper Market] and consumed both porticoes and everything adjacent
to them and the so-called Basilica, in which there was a library that had 120,000
books. Among these books was a dragon's gut 120 feet long upon which Homer's
poems, namely the Iliad and the Odyssey, were written in gold letters together with
the story of the heroes' deeds. [The fire] also destroyed the porticoes on either side
of the street Mese and the excellent offerings of Lausos: for many ancient statues
were set up there, namely, the famous one of the Aphrodite of Knidos, that of the
Samian Hera, that of Lindian Athena made of a different material which Amasis, king
of Egypt, had sent to the wise Kleobolus, and countless others. The fire extended as
far as the Forum of the great Constantine, as it is called.

[Transl. Mango et alii 1992]


Zonaras III.231 [séc. XII d.C.]

A great, consuming conflagration broke out in Constantinople, beginning in the


Chalkoprateia and spreading to all the nearby areas and reducing the public portico
and adjacent buildings to ashes, including the so-called Basilica where there was a
library that housed 120,000 books. Among these books was a dragon gut measuring
120 feet with the poetry of Homer, the Iliad and the Odyssey, written in golden
letters, which Malchos mentioned in writing of the emperors. The fire utterly
destroyed this object and both the splendor in the city's Lausos quarter and the
statues set up there, the Samian Hera, the Lindian Athena and the Knidian
Aphrodite, famous works of art.

[Transl. Guberti Bassett 2000]


“the Samian Hera, a work of Lysippos and the Chian Bupalos” ???

“a winged Eros holding a bow, brought from Myndos” - de Lisipo

Eros. Cópia romana (séc. II d.C.) de um


original de Lisipo, de c. 360 a.C.
“the Knidian Aphrodite of white stone, naked, shielding with her hand only her
pudenda, a work of Praxiteles of Knidos.”

(1) Afrodite (ou Vénus) Ludovisi, a partir


do original de Praxíteles, c. 350 a.C.
Restauro de uma cópia romana do
séc. II d.C., por Ippolito Buzzi. Roma,
Museu Nacional, Inv. 8619.
(2) Outra cópia romana da Afrodite de
Cnidos de Praxíteles. Museus do
Vaticano.

A.G. 16. 159. Anónimo

Sobre a estátua de Afrodite de Cnidos

Quem dotou a pedra de alma? Quem viu


Cípris na terra?
/
Um tamanho desejo no mármore, quem
o plasmou?
/
É obra da mão de Praxíteles, a menos
“the ivory Zeus by
Pheidias”

Zeus Criselefantino de Olímpia,


de Fídias. C. 435 a.C. Proposta
de reconstituição (e escala) de
Quatremère de Quincy (1815).
Sugestão “museológica” de C. Mango et alii 1992.
“the statue representing Chronos, a work of Lysippos”

Relevo romano, a partir do


Kairos (”ocasião”) de Lisipo,
de c. 350-330 a.C. Turim,
Museu de Antiguidades.
A.G. 16.57. De Paulo Silenciário [séc. VI d.C.]

Sobre uma bacante em Bizâncio

Esta bacante em fúria, não foi a natureza, antes a arte

que a construiu, misturando o frenesim e a pedra.

A.G. 16.58. Anónimo


Parai essa bacante! Não vá ela, mesmo de mármore,

transpor o portal e escapar-se do templo.

A.G. 16. 59. De Agátias, o Escolasta [séc. VI d.C.]


A Ménade de
Ekopas

Staatliche
Kunstsammlungen,
Dresden
Cópia romana do séc.
I a.C. de um original
de c.
340 a.C.
A Ménade de
Ekopas

Staatliche
Kunstsammlungen,
Dresden
Cópia romana do séc.
I a.C. de um original
de c.
340 a.C.
A.G. 16. 203. De Juliano, Prefeito do Egito [séc. V-VI d.C.]

Sobre o Eros de Praxíteles

Reclinando o pescoço orgulhoso à altura das minhas sandálias,

com as suas mãos cativas Praxíteles me modelou.

A mim, o Amor, deu-me todo o amor que escondia dentro

trabalhando o bronze, presente do seu afeto para Frine.

E agora ela de novo me devolve ao Amor – é de justiça:


Eros Centocelle
Cópia romana (e reconstituição) do séc. II
d.C. de um original de Praxíteles.
Nápoles, Museu Arqueológico Nacional,
Inv. No. 6353.
Será a “Atena de Lindos” de Cedreno a Atena Promachos de
Fídias

Estátua romana arcaizante de Atena da


família Promachos, procedente da Vila
dos Papiros em Herculano. Nápoles.
Museo Archeologico Nazionale.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Bassett, S. (2004), The urban image of late antique Constantinople. Cambridge.

Kaldellis, A. (2007), “Christodorus on the Statues of the Zeuxippos Baths: a new reading
of the Ekphrasis”, GRBS 47: 361-383.

Mango, C. (1963), “Antique statuary and the Byzantine beholder”, DOP 17: 53+55-75.

Jesus, C. A. M. (2014), “The statuary collection held at the Baths of Zeuxippus (AP 2) and
the search for Constantine’s museological intentions”, Synthesis 21: 15-30.

Jesus, C. A. M. (2019), “The nude Constantinople. Masterpieces of Greek sculpture at


Byzantium according to the Greek Anthology”. In Morais, R. (et alii, eds.) There and Back
Again: Greek art in Motion. Studies in honour of Sir John Boardman on the occasion of
his 90th birthday. Oxford, Archaeopress: 78-84.

Você também pode gostar