Você está na página 1de 157

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
DOUTORADO EM EDUCAÇÃO
LINHA DE PESQUISA: FORMAÇÃO E PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE

JOSÉ FERREIRA DA SILVA JÚNIOR

ENSINAR A ENSINAR A HABILIDADE DE DESCREVER NO PROCESSO DE


APROPRIAÇÃO DA ATIVIDADE PRÁTICA EXPERIMENTAL NA
FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES DE FÍSICA SEGUNDO A TEORIA
DA ASSIMILAÇÃO POR ETAPAS DE P. YA. GALPERIN

Natal-RN

2015
JOSÉ FERREIRA DA SILVA JÚNIOR

ENSINAR A ENSINAR A HABILIDADE DE DESCREVER NO PROCESSO DE


APROPRIAÇÃO DA ATIVIDADE PRÁTICA EXPERIMENTAL NA
FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES DE FÍSICA SEGUNDO A TEORIA
DA ASSIMILAÇÃO POR ETAPAS DE P. YA. GALPERIN

Projeto de tese apresentada ao Programa de Pós-


graduação em Educação do Centro de Educação da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte como
requisito parcial para obtenção do título de Doutor
em Educação.

Orientador: Prof. Dr. Isauro Beltrán Núñez.

NATAL

2015
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 5
1.1. OBJETIVO GERAL ........................................................................................ 14
1.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS ........................................................................... 14
1.3 A TESE ............................................................................................................ 15
2 A PROBLEMÁTICA DA FORMAÇÃO INICIAL DO PROFESSOR DE
FÍSICA NO CONTEXTO DA FORMAÇÃO DA HABILIDADE DE
DESCREVER EM ATIVIDADES PRÁTICAS EXPERIMENTAIS ...................... 16
2.1 A CRISE NA EDUCAÇÃO CIENTÍFICA E A ESCOLA DO SÉCULO XXI 16
2.2 A IMPORTÂNCIA DA LINGUAGEM E DA COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA
NA APRENDIZAGEM DE CONTEÚDO PROCEDIMENTAL E FORMAÇÃO DE
HABILIDADES E COMPETÊNCIAS ....................................................................... 18
2.3 COMPETÊNCIAS, HABILIDADES E CONTEÚDO PROCEDIMENTAL NO
ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS ....................................................................... 26
2.4 A FORMAÇÃO DE HABILIDADES E APRENDIZAGEM DE CONTEÚDO
PROCEDIMENTAL EM ATIVIDADES EXPERIMENTAIS NO ENSINO DE
FÍSICA ........................................................................................................................ 35
2.5 AS HABILIDADES DE OBSERVAR E DESCREVER NO CONTEXTO DAS
ATIVIDADES EXPERIMENTAIS NO ENSINO DE FÍSICA .................................. 39
2.6 AS HABILIDADES DE OBSERVAR E DESCREVER NO CONTEXTO DA
FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES DE FÍSICA ........................................ 41
3 A FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES DE FÍSICA COMO
RECURSO ESTRATÉGICO PARA A PROSISSIONALIZAÇÃO DOCENTE ... 47
3.1 A FORMAÇÃO INICIAL DO PROFESSOR DE FÍSICA .............................. 47
3.2 SABERES DOCENTES .................................................................................. 52
4 ATIVIDADE E COMUNICAÇÃO NA APRENDIZAGEM E FORMAÇÃO
DAS HABILIDADES DE OBSERVAR E DESCREVER CONFORME A TEORIA
DA ASSIMILAÇÃO POR ETAPAS DE P. YA. GALPERIN.................................. 58
4.1 A APRENDIZAGEM SEGUNDO A ESCOLA HISTÓRICO-CULTURAL E A
TEORIA DA ATIVIDADE ........................................................................................ 60
4.2 ATIVIDADE E COMUNICAÇÃO NA APRENDIZAGEM .......................... 64
4.3 AS INTERAÇÕES COMUNICATIVAS NO PROCESSO DE
APRENDIZAGEM FOMENTADO PELA ATIVIDADE E PELA COMUNICAÇÃO
65
4.3.1 Funções da comunicação ........................................................................... 67
4.3.1.2 Função emotiva ..................................................................................... 68
4.3.1.3 Função reguladora................................................................................. 69
4.3.2 Níveis de comunicação ........................................................................... 70
4.3.2.1 Nível 1: transmissão e recepção ............................................................ 70
4.3.2.2 2º nível: compartilhamento de significados .......................................... 73
4.3.2.3 3º nível: Formação de significados conjuntos ...................................... 75
4.4 A TEORIA DA ASSIMILAÇÃO POR ETAPAS E SUA IMPORTÂNCIA NO
PROCESSO DE APRENDIZAGEM POR MEIO DA ATIVIDADE E DA
COMUNICAÇÃO ...................................................................................................... 82
4.5 A FORMAÇÃO DA HABILIDADE DE DESCREVER COMO EXPRESSÃO
DO PENSAMENTO TEÓRICO ................................................................................. 83
5. A TEORIA DA ASSIMILAÇÃO POR ETAPAS DE P. YA. GALPERIN NA
FORMAÇÃO DA HABILIDADE DE DESCREVER .............................................. 99
5.1 TIPOS DE INTERAÇÕES COMUNICATIVAS ............................................ 99
5.2 A IMPORTÂNCIA DAS INTERAÇÕES COMUNICATIVAS VERBAIS NA
APRENDIZAGEM ................................................................................................... 101
5.2.1 As interações comunicativas verbais no processo de motivação .......... 104
5.2.2 As interações comunicativas no processo de elaboração da base
orientadora da ação ............................................................................................. 114
5.2.3 As interações comunicativas na etapa de formação da ação no plano
material ou materializado ................................................................................... 121
5.2.4 As interações comunicativas e a etapa verbal da assimilação por etapas
124
5.2.5 As interações comunicativas e a etapa mental ....................................... 127
6 METODOLOGIA ............................................................................................... 130
6.1 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS E FILOSÓFICOS GERAIS ......................... 131
6.2 ESTRATÉGIA DE PESQUISA ..................................................................... 132
6.3 PRIMEIRO OBJETIVO ESPECÍFICO: ESTRUTURAÇÃO DO CONTEÚDO
INVARIANTE DA HABILIDADE DE DESCREVER............................................ 134
6.4 SEGUNDO OBJETIVO ESPECÍFICO: O DIAGNÓSTICO INICIAL ......... 136
6.5 TERCEIRO OBJETIVO ESPECÍFICO: O DESENVOLVIMENTO DO
SISTEMA DIDÁTICO ............................................................................................. 139
6.5.1 Critérios para a definição dos pressupostos teóricos e metodológicos 139
6.5.2 Critérios para a definição do objetivo .................................................... 139
6.5.3 Critérios para estruturação do sistema de tarefas de aprendizagem .. 140
Etapa mental – tarefas individuais. ........................................................ 141
6.5.4 Critérios para a estruturação das tarefas de controle .......................... 141
6.6 QUARTO OBJETIVO ESPECÍFICO: REALIZAÇÃO DO EXPERIMENTO
FORMATIVO ........................................................................................................... 142
6.6.1 Instrumentos de coleta de dados ............................................................. 143
6.6.1.1 O questionário ..................................................................................... 143
6.6.1.2 A entrevista ......................................................................................... 146
6.6.1.3 A observação ....................................................................................... 147
6.7 ORGANIZAÇÃO DOS DADOS ................................................................... 148
6.8 ANÁLISE DOS DADOS ............................................................................... 149
7 REFERÊNCIAS .................................................................................................. 151
1 INTRODUÇÃO

O início do século XXI marca uma nova era quando o assunto é relações
humanas. Os avanços na ciência e tecnologia permitiram uma revolução como nunca
antes observada em relação às formas de comunicação e o acesso à informação. Em
pouco mais de 100 anos após a descoberta das ondas eletromagnéticas, sinais de rádio
em FM e micro-ondas, produzidos por aparelhos criados pelo homem, atravessam nossa
atmosfera para garantir a globalização da informação, dos costumes e da cultura.
A relação entre a sociedade e o conhecimento, que historicamente se
desenvolveu em meio aos letrados e cultos, ou seja, numa pequena parcela da população
que na maioria das vezes detém o poder político, se torna cada dia mais acessível para
um número maior de pessoas, principalmente nas classes mais populares. Este
movimento foi possível devido à propagação do conteúdo histórico, através do livro,
posteriormente pela imprensa e a disseminação do ideal de educação para todos, em
meios acadêmicos (UNESCO, 2005, p. 17).
A velocidade com que esses eventos estão ocorrendo aumentou muito, nos
últimos anos, impulsionada pelo desenvolvimento de tecnologias mais avançadas de
comunicação e a manutenção de uma rede mundial de computadores pessoais que atinge
uma grande parcela da população e intervêm em seus hábitos, costumes e concepções,
constituindo-se como uma grande formadora de opinião.
Nesta perspectiva, é imprescindível que os indivíduos compreendam quais são as
finalidades da ciência e tecnologia em sua atividade cotidiana, de forma que este
conhecimento possa permitir a tomada de decisões consciente quanto à sua prática
social. Para participar plenamente desta sociedade, cada pessoa deve ter desenvolvido
conhecimentos e habilidades básicas ao fim de sua escolarização obrigatória (OCDE,
2008).
A escola está inserida neste contexto como uma instituição que deve oferecer
uma educação integral e universal que possa atingir todos os cidadãos, possibilitando a
valorização do indivíduo com o seu acesso ao mundo do conhecimento. Esta
valorização pode promover na sociedade uma maior possibilidade de crescimento
intelectual, desenvolvimento de iniciativas criativas e inovadoras para problemas
enfrentados diariamente.
O conhecimento que estamos nos referindo sofre constantes modificações e
obriga as instituições formadoras a atualizarem suas concepções e metodologias para
garantir aos indivíduos uma permanente atividade de formação e aprendizagem com o
objetivo de garantir as competências necessárias ao ingresso e a manutenção de
profissionais em sua função específica na sociedade e mais precisamente no mercado de
trabalho.
Com o professor não é diferente. Como esse profissional está em constante
contato com o conhecimento e a informação e, além disso, reproduz na escola uma
imagem de como esse conhecimento se desenvolve na sociedade, a sua atualização deve
ser constante, seja formalmente, na participação em iniciativas de formação inicial e
continuada, seja na possibilidade de continuar seus estudos informalmente com o acesso
aos meios de divulgação científica e educacional.
Diferenciaremos aqui, as noções de sociedade da informação baseada nos
progressos científicos e tecnológicos enquanto que a sociedade do conhecimento é
compreendida em dimensões sociais, éticas e políticas mais abrangentes, ou seja, a
informação é efetivamente um instrumento do conhecimento, mas não é o conhecimento
em si (UNESCO, 2005). Neste século, o maior desafio não será ter acesso à informação,
o desenvolvimento da internet e o acesso a esta rede por parcelas cada vez maiores da
população é um indicador deste fenômeno. Mais significativo para a escola e a
sociedade será selecionar e utilizar a informação de maneira apropriada (MONEREO e
POZO, 2001), ou seja, mobilizar o pensamento para desenvolver novas possibilidades
de desenvolvimento cognitivo dos estudantes diante das novas tecnologias.
O ambiente escolar está cada vez mais diversificado com uma multiplicidade
étnica, linguística, religiosa, cultural e social como nunca antes vista, representando um
desafio e ao mesmo tempo uma oportunidade para integrar a pluralidade do ensino e
tornar possível uma escola para todos (GARCÍA, 2012). Para Gadotti (2000), o século
XXI proclama uma crise de paradigmas, deslocando para a reflexão pedagógica
conceitos novos como sustentabilidade, cidadania planetária, dialogismo e
transculturalidade. Para este autor, neste começo de um novo milênio, a educação
apresenta-se numa dupla encruzilhada de forma que:
[...] de um lado o desempenho do sistema escolar não tem dado
conta da universalização da educação básica de qualidade; de
outro, as novas matrizes teóricas não apresentam ainda a
consistência global necessária para indicar caminhos realmente
seguros numa época de profundas e rápidas transformações.
A importância de repensar a escola para atender jovens e adolescentes com
características cada vez mais distintas das gerações anteriores, ou seja, que nasceram na
era digital, é um dos grandes desafios que enfrentamos enquanto educadores, entretanto
não é o único. O valor atribuído a este tema pode ser evidenciado no documento “Metas
Educativas para 2021” publicado pela Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI)
no ano de 2010, resultado de um estudo conjunto entre representantes e aprovado pela
cúpula dos chefes de estado dos países membros. Neste mesmo ano iniciou-se por parte
da OEI o conjunto de ações que conduzirão os países membros a atingirem as metas,
entre elas a criação do Instituto de Avaliação e Rastreamento das Metas Educativas
2021, completando o processo de implantação do projeto.
Neste contexto, organismos internacionais vinculados à educação elaboram
propostas que permitam uma melhor adaptação da escola para essa nova realidade
(DELORS, 1998; OEI, 2010, 2012; UNESCO; 2002 e 2005) na tentativa de estruturar
uma educação para todos com a universalização do ensino básico e uma maior inserção
de jovens no nível superior.
No Brasil, o Ministério da Educação e Cultura (MEC), juntamente com as
secretarias estaduais e municipais desenvolve, desde a década de 1990, propostas e
orientações curriculares que acompanhem esse movimento internacional de acesso à
escola e à educação. Órgãos como a Associação Brasileira de Ciências (ABC) e a
Sociedade Brasileira de Física (SBF) publicaram recentemente documentos que
evidenciam problemas, apresentando propostas de transformação para a educação
científica em nosso país (ABC, 2008; SBF, 2005).
Com o mesmo grau de relevância, existe um movimento em direção à
universalização da educação básica em regiões com economia em desenvolvimento
como a América Latina. Vejamos o que diz o relatório “¿Qué educación secundaria para
el siglo XXI?” (UNESCO, 2002, p. 9):
Nos anos noventa, a igualdade de oportunidades educativas teve
uma presença maior na política de educação, integrando ações
com qualidade e maior atenção para a diversidade de
necessidades educacionais. A igualdade de oportunidades não é
entendida apenas na área de acesso a educação, mas, acima de
tudo, a necessidade de oferecer uma educação igual de
qualidade para a população, especialmente para aqueles setores
que estão em uma situação mais vulnerável.
No prefácio: A educação ou a utopia necessária, constante no Relatório para a
UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI (DELORS,
1998), discute-se o caráter social que pode promover uma transformação no ensino:
Ante os múltiplos desafios do futuro, a educação surge como
um trunfo indispensável à humanidade na sua construção dos
ideais da paz, da liberdade e da justiça social [...] como uma
via que conduza a um desenvolvimento humano mais
harmonioso, mais autêntico, de modo a fazer recuar a pobreza,
a exclusão social, as incompreensões, as opressões, as guerras.

Monereo e Pozo (2001) especulam que perspectivas sociológicas e filosóficas


associadas à educação apresentam alguns desafios que se intensificaram no século XXI
a respeito de como a sociedade e a escola terão que lidar com a informação e
consequentemente convertê-la em conhecimento escolar. Para esses autores, o prazo de
validade e o caráter inacabável da informação são apenas uma parte dos problemas que
o educador do século XXI terá que enfrentar.
Em nosso país, muito se tem feito nos últimos anos, para ampliar a oferta de
formação inicial de professores principalmente por meio da criação ou reestruturação de
cursos de licenciatura nos Institutos Federais de Educação Superior (IFES),
principalmente nas universidades federais, e nos Institutos Federais de Educação,
Ciência e Tecnologia (IFET), entidades com reconhecida contribuição na inserção de
docentes na educação básica brasileira, nas mais diversas áreas do conhecimento.
Em consonância com a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (BRASIL,
1996), a qual estabelece as diretrizes e bases da educação nacional (LDBEN), a
formação de professores tem como finalidades a presença de sólida formação básica,
que propicie o conhecimento dos fundamentos científicos e sociais de suas
competências de trabalho, a associação entre teorias e práticas, mediante estágios
supervisionados e capacitação em serviço, e o aproveitamento da formação e
experiências anteriores, em instituições de ensino e em outras atividades.
O perfil estabelecido pela sociedade brasileira aos docentes formados para
ensinar as diversas disciplinas da educação básica inclui princípios norteadores que
devem estar presentes durante a etapa de formação, entre eles a competência como
concepção nuclear na orientação do curso, a coerência entre a formação oferecida e a
prática esperada do futuro professor e a pesquisa como foco no processo de ensino e
aprendizagem (BRASIL, 2002).
Além disso, o professor deve compreender que o ensino básico passa por um
período de transformações bastante significativas, orquestradas pelas exigências de uma
sociedade da informação e do conhecimento vinculadas às iniciativas para incrementar e
solidificar as concepções que envolvam uma escola para todos com a universalização da
educação básica.
A escola do século XXI precisa ser reinventada. Segundo Pérez Gomez (2007):
As recomendações de organismos internacionais como a
UNESCO e a OCDE protegem as iniciativas singulares que
tentam responder às urgentes exigências da sociedade. O
respeito e a valorização da diversidade, uma nova relação com o
conhecimento, a autonomia e a responsabilidade dos centros e
uma formação que ensine ao docente a olhar seu trabalho de
outra forma são pilares de uma necessária transformação.
Nesse contexto, os futuros docentes devem aprender a tomar decisões, de
natureza didático-pedagógica, questionar o pensamento didático tradicional, inovar e
desenvolver uma prática de ensino ética, pautada pela responsabilidade social de
garantir aos estudantes o direito constitucional de aprender e desenvolver-se como
cidadãos críticos (NÚÑEZ e RAMALHO, 2012).
A compreensão de que os processos de ensino e aprendizagem no contexto
escolar envolvem distintas abordagens psicopedagógicas exige um esforço, das
pesquisas em educação, para o desenvolvimento de iniciativas, na formação inicial de
professores, que integrem teorias específicas da aprendizagem como alternativa ao que,
em geral, é chamado modelo tradicional.
A escola do século XXI deve ser repensada como um espaço não apenas de
reprodução, mais principalmente de estruturação e assimilação da cultura, de forma que
seu conteúdo inicialmente social, ou seja, compartilhado pela sociedade, possa ser
formado como conhecimentos, habilidades e hábitos dos indivíduos, e estes, de forma
criativa, recriem os saberes de forma dialética, contribuindo para o desenvolvimento da
atividade humana.
Existe um questionamento atual sobre se a escola tradicional, transmissiva,
memorística, autoritária em que os valores são apresentados como universais, únicos e
indiscutíveis, em que o saber é sinônimo de acúmulo de informações sobre a maior
quantidade de temas possível, foi capaz de se articular com problemas e desafios
apresentados no século XX e quiçá fará frente às exigências da sociedade do século XXI
(MONEREO E POZO, 2001).
Essa preocupação interferiu, nas últimas décadas, numa maior intensificação, em
diversos países e por parte de organismos internacionais, na busca de referenciais
curriculares capazes de abarcar as novas exigências da sociedade. Outros fatores podem
ter motivado esse movimento, dentre eles, a impossibilidade de atingir, de forma
eficiente, os objetivos da universalização da educação básica com os currículos vigentes
e o advento de novos hábitos, costumes e comportamentos que muito evoluíram com as
atuais formas de se comunicar.
Uma parcela considerável destas “reformulações curriculares” destaca a
importância de se desenvolver nos alunos competências e habilidades, com uma maior
articulação entre conteúdos específicos e procedimentos que permitam o “saber fazer”
competente. No caso do Ensino de Ciências, percebemos uma maior aproximação entre
observação e experimentação dos estudos acerca da formação de habilidades
comunicativas, comuns na prática científica como descrever, explicar, justificar e
argumentar.
Apesar de pesquisadores e instituições educacionais estarem atingindo um
relativo consenso acerca da importância da investigação, interação e comunicação em
atividades práticas experimentais, permitindo aos alunos situações em que possam
participar de procedimentos de construção do conhecimento e de introdução ao trabalho
científico, ainda é dominante, na maioria das escolas, como prática de disciplinas de
ciências naturais, o ensino superficial de princípios, definições e fórmulas matemáticas,
tornando disciplinas como física e química enfadonhas, sem motivação e recordistas em
reprovação.
Além disso, ensina-se uma ciência construída por grandes heróis, personagens
históricos com poderes intelectuais superiores, como se a ciência não fosse uma prática
diária profissional de milhões de pessoas no mundo todo. De acordo com Lemke
(1997), é perigoso para a sociedade termos alunos que deixam a escola acreditando que
a ciência é um caminho perfeito para o absoluto, para as verdades objetivas, descobertas
por pessoas sobre-humanas.
Esse modelo de ensino e aprendizagem tem se mostrado ineficiente para a nova
realidade em que se encontra a sociedade do conhecimento. A escola tradicional foi útil
em um período em que a educação era objeto de manutenção de diferenças sociais e na
qual o foco estava na aprendizagem conceitual, como uma preparação pré-universitária,
entretanto não se adaptou as transformações sofridas pela sociedade e do próprio
ambiente escolar que convive com os princípios de inclusão, tolerância e diversidade
em todos os aspectos.
A preocupação em encontrar alternativas para essa realidade é compartilhada
pelo grupo que desenvolve o Projeto de pesquisa “Ensinar a ensinar habilidades
comunicativas como ferramenta na construção do conhecimento em Ciências Naturais:
Uma abordagem baseada na Teoria de Assimilação por Etapas de P. Ya. Galperin”,
vinculado à Pós-graduação em Educação e cadastrado no Departamento de Práticas
Educacionais e Currículo do Centro de educação da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte.
Em nosso grupo, “Aprendizagem, Formação e Profissionalização Docente”,
pretendemos atingir uma maior compreensão teórica e prática sobre a aprendizagem, na
realidade da formação inicial de professores das ciências naturais, ou seja, nas
licenciaturas em Física, Química e Biologia, associada ao desenvolvimento profissional
dos futuros formandos, integrando dimensões da psicologia da aprendizagem, da
didática e da profissionalização, assim como da educação permanente.
Este grupo vem, desde o final da década de 1990, estudando os processos de
aprendizagem e de formação de professores da Educação Básica sob a orientação da
profissionalização docente, por meio de projetos financiados pela CAPES, CNPq e pela
própria UFRN. Atualmente, temos como foco de nossas investigações de que forma os
professores aprendem a ensinar habilidades cognitivo-linguísticas na formação inicial,
utilizando como referências teóricas as contribuições L. S. Vygotsky, A. N. Leontiev e
P. Ya. Galperin da escola soviética de psicologia da aprendizagem, particularmente
elaborados pelos paradigmas histórico-cultural e da atividade.
Destacamos nesse contexto a importância de um dos conceitos chaves que fazem
parte do processo de formação, ensino e aprendizagem em Ciências Naturais e mais
precisamente na disciplina de Física: a investigação sobre as atividades experimentais
no ensino médio. Muitas questões a respeito dessa problemática são relevantes
atualmente e ainda constituem um grande referencial de estudo, mesmo que haja uma
extensa literatura sobre o tema no meio acadêmico e científico, apesar da grande
maioria dessas produções não atingirem boa parte das salas de aula.
As finalidades deste grupo foram associadas ao trabalho anterior do autor deste
trabalho que desenvolveu como dissertação de mestrado o trabalho intitulado “Uma
abordagem dialógica para a utilização de atividades experimentais em sala de aula”
(SILVA JÚNIOR, 2010) que trata da comunicação professor-aluno e aluno-aluno em
práticas experimentais didáticas no ensino médio.
Para associar práticas experimentais à formação de habilidades, pesquisadores
da área de educação científica, a chamada didática das ciências ou ensino de ciências,
argumentam que o ensino de disciplinas como Física, Química e Biologia no nível
médio devem utilizar atividades práticas experimentais como atividades que possam
desenvolver os procedimentos experimentais da ciência associadas às habilidades
cognitivas e cognitivo-linguísticas articuladas aos conhecimentos específicos da
matéria. Para Lemke (1998) existem inúmeras habilidades que devem ser exploradas
pelo ensino de ciências para que os alunos possam “falar cientificamente”. São
habilidades como observar, descrever, comparar, classificar, analisar, discutir, levantar
hipóteses, teorizar, questionar, desafiar, argumentar, projetar experimentos, executar
procedimentos, julgar, avaliar, decidir, concluir, generalizar, divulgar, escrever,
dissertar e ensinar através da linguagem da ciência.
Dentre as habilidades estudadas por Lemke (1997) e outros autores (JORBA ET
AL, 2000; NÚÑEZ, 2012; SANMARTÍ e IZQUIERDO, 2000) destacamos as que estão
diretamente associadas aos procedimentos científicos de coletar, identificar e classificar
dados como recursos para elaborar tipologias textuais específicas, entre elas a descrição.
Descrever em uma atividade prática experimental trata-se de um conhecimento
da ordem do “saber fazer” necessário à prática científica profissional e com a
decorrência de cada vez mais iniciativas, em que se utilizam estas práticas como
estratégias de ensino e aprendizagem da Física no ensino médio, é imprescindível que
professores e alunos realizem descrições com um elevado grau de generalização sobre o
que é, qual a importância e como se estrutura esses procedimentos em aulas que
envolvam atividades práticas experimentais didáticas.
O caráter descritivo da ciência pode em primeiro plano não ser tão importante,
por exemplo, como o explicativo ou argumentativo, já que a “ciência fenomenológica”,
que trata apenas de descrever os fatos tal como acontecem perdeu um pouco de sua
importância histórica, principalmente com os grandes modelos teóricos que envolvem
temas como física quântica, astrofísica, cosmologia e relatividade os quais envolvem
um grande esforço na explicação de “princípios físicos deduzidos de outros mais
fundamentais” (WEINBERG, 2001) ou que grande parte das observações não permitem
a visualização direta do fenômeno.
Esta ideia leva a crer, em princípio, que descrever uma observação experimental
parece ser muito fácil. A concepção empirista de que, como os processos orgânicos da
visão são iguais e, portanto, dois observadores, na análise de um objeto, verão a mesma
coisa (CHALMERS, 1993) pode ser questionada quando incluímos o que é visto com os
“olhos da mente”. Um bom texto descritivo deve conter características, dos fatos ou
fenômenos observados, devidamente hierarquizados e correlacionados. O rigor de textos
explicativos e argumentativos deve estar amparado em uma rica e ampla descrição do
que é observado.
Propomos uma investigação inovadora, no contexto da educação científica para
o século XXI, sobre os processos de apropriação e construção de saberes docentes
profissionais com futuros professores de Física, orientados para a formação de
habilidades de descrever e observar fenômenos físicos em atividades práticas
experimentais didáticas no ensino médio, sob os pressupostos teóricos gerais de L. S.
Vygotsky, A. N. Leontiev e, em particular, da teoria de assimilação por etapas de P. Ya.
Galperin e sobre o lugar da orientação na aprendizagem.
Muitas pesquisas avançam significativamente nos resultados de processos
formativos, utilizando a teoria da assimilação por etapas de P. Ya. Galperin, na área de
educação e, em particular, no Ensino de Ciências. Dentre esses trabalhos, é muito
significativa a tese doutoral de Núñez (1992), a qual apresenta resultados da utilização
de um sistema didático, baseado nesta teoria, para o ensino da disciplina de Química
Geral para alunos do primeiro ano de Engenharia Mecânica. Outros trabalhos deste
autor (NÚÑEZ E PACHECO, 1996 e 1998; Núñez, 1998 e 2013) apresentam resultados
e argumentos teóricos em favor da utilização de estratégias didáticas de formação de
habilidades para a disciplina específica de Química.
Arruda (2001, 2010) e Arruda e Marin (2003) apresentam uma proposta de
modelo didático para a disciplina de Física a partir de uma perspectiva histórico-
cultural, utilizando a Teoria da Atividade de A. N. Leontiev, a Teoria da Assimilação
por Etapas de P. Ya. Galperin e o método sistêmico estrutural-funcional na elaboração e
organização do conteúdo para o ensino superior. Para esses autores, a adoção deste
modelo didático permitiu desenvolver o pensamento teórico dos estudantes e,
consequentemente, a capacidade de generalização dos conhecimentos adquiridos
(ARRUDA, 2010).
Foram realizados, na última década, na Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, vários estudos, utilizando o referencial teórico metodológico de P. Ya. Galperin.
Estas pesquisas em nível de doutorado foram orientadas polo Prof. Dr. Isauro Beltrán
Núñez e são investigações relevantes, com diversos trabalhos publicados em anais de
eventos e periódicos especializados. A seguir, fazemos referência a alguns desses
trabalhos:
Faria (2004) pesquisou o sentido conferido por professoras do ensino
fundamental ao conceito de ajuda criança-criança na aprendizagem, a partir de uma
reflexão da zona de desenvolvimento proximal, adotando como fundamento a teoria da
Assimilação de P. Ya. Galperin.
Ribeiro (2008) investigou o processo de apropriação da habilidade de planejar
situações de ensino para a definição de conceitos a identificação de objetos em
professores das séries iniciais do ensino fundamental.
A tese de Oliveira (2011) apresentou um estudo sobre o pensamento teórico e
formação docente na apropriação de saberes da tradição lúdica, na perspectiva da teoria
da formação das ações mentais por etapas de P. Ya. Galperin. Este autor planejou uma
unidade didática para formar e desenvolver a habilidade de identificar jogos populares
tradicionais enquanto contribuição histórico-cultural e de desenvolvimento do indivíduo
na formação inicial do professor de educação física.
A partir da constatação de que as pesquisas sobre inciativas de formação,
utilizando a teoria de P. Ya Galperin possuem um grande potencial para melhoria da
aprendizagem de conceitos e habilidades e, considerando a importância dos
procedimentos de observar e descrever em atividades experimentais na disciplina de
Física para o Ensino Médio, propomos a investigação do seguinte objeto de estudo:
O processo de formação das habilidades de observar e descrever na utilização de
atividades práticas experimentais, na formação inicial de professores de física, tomando
como referencial teórico-metodológico a Teoria da formação por etapas das ações
mentais e dos conceitos de P. Ya. Galperin.

1.1. OBJETIVO GERAL

Estudar a assimilação da BOA tipo III e do desenvolvimento do pensamento


teórico na formação da habilidade geral de descrever em atividades práticas
experimentais com alto grau de generalização, na formação inicial de professores de
Física, utilizando pressupostos teóricos e metodológicos da teoria da assimilação por
etapas das ações e dos conceitos de P. Ya. Galperin.

1.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS

A partir de nosso objetivo geral, elaboramos os seguintes objetivos específicos:

 Realizar o diagnóstico inicial com os alunos da formação inicial de


professores de Física para estabelecer o grau de desenvolvimento quanto
à habilidade de descrever em atividades práticas experimentais.
 Estabelecer a invariante da habilidade de descrever em atividades
práticas experimentais utilizando o método teórico estrutural-funcional.
 Organizar um sistema didático como planejamento para a aprendizagem
da habilidade geral de descrever em atividades práticas experimentais a
partir da Teoria da assimilação por etapas das ações e dos conceitos.
 Desenvolver um experimento pedagógico para a formação da habilidade
de descrever em atividades experimentais, baseado no sistema didático,
em uma turma de formação inicial de professores de Física.
 Estudar os fatores que facilitam e dificultam a utilização da Teoria da
assimilação por etapas no processo de formação da habilidade de
descrever em atividades práticas experimentais.

1.3 A TESE

Apresentamos, no segundo capítulo, uma revisão da literatura para problematizar


o estudo de iniciativas que articulam o ensino de procedimentos experimentais à
formação de habilidades, em contextos como o ensino médio e a formação do professor.
Esta revisão possibilitou o desenvolvimento da seguinte tese:
A formação das habilidades de observar e descrever em atividades práticas
experimentais, como elementos do conhecimento profissional do licenciando em Física,
planejadas e orientadas por meio de um sistema didático que utiliza a teoria da formação
por etapas das ações mentais e dos conceitos de P. Ya. Galperin é uma alternativa de
formação que permite aquisição do sistema de operações que formam essas habilidades,
em nível mental, com elevado poder de transferência a situações novas e com alto grau
generalização.
2 A PROBLEMÁTICA DA FORMAÇÃO INICIAL DO PROFESSOR DE
FÍSICA NO CONTEXTO DA FORMAÇÃO DA HABILIDADE DE
DESCREVER EM ATIVIDADES PRÁTICAS EXPERIMENTAIS

Abordaremos neste capítulo o contexto problemático em que se inserem as


práticas experimentais no Ensino de Ciências Naturais, com ênfase no Ensino de Física,
especificamente na articulação destas atividades com a formação de habilidades ou
procedimentos da ciência como observar e descrever, no ensino médio e na formação
inicial do professor de Física. A finalidade desta demarcação consiste, a partir de uma
densa revisão em trabalhos sobre experimentação, contextualizar o que se tem
produzido como contribuição a alfabetização e enculturação científicas, necessárias para
educação básica em uma sociedade do conhecimento e no contexto da escola do século
XXI. Este levantamento procura esclarecer situações de pesquisa ainda em aberto, as
quais refletem dificuldades na aprendizagem para ensinar habilidades ou procedimentos
científicos necessários ao conhecimento profissional para o desenvolvimento da
docência no nível médio e na disciplina de Física.

2.1 A CRISE NA EDUCAÇÃO CIENTÍFICA E A ESCOLA DO SÉCULO XXI

Observamos atualmente um grande desinteresse, por parte dos estudantes do


ensino médio, em relação às disciplinas da área das Ciências Naturais como a Biologia,
a Química e a Física. Este fenômeno, diretamente associado ao mau rendimento escolar,
reprovação e evasão, é um problema a ser enfrentado pelo Ministério da Educação,
secretarias estaduais e a sociedade civil como um todo, para que o Brasil possa alcançar
melhores índices educacionais e superar este momento de crise na educação científica.
É evidente que essa problemática envolve também as pesquisas em educação, que por
sua vez, devem estar a serviço do enfrentamento aos desafios apresentados pela escola
do século XXI.
De acordo com Ramalho e Núñez (2011) alguns dos fatores que produziram esta
crise referem-se à consequência de um ensino baseado na transmissão de conteúdos
prontos, descontextualizados e pouco desafiadores ao pensamento e à inteligência dos
estudantes bem como a não valorização de aspectos que revelam as ciências naturais
como parte da cultura universal, tornando-as mais atrativas para os jovens e
adolescentes atendidos pela escola atual.
No documento “O ensino de ciências e a educação básica: propostas para
superar a crise”, elaborado pela Academia Brasileira de Ciências (2008), atribui-se a
deterioração crescente do nível fundamental de ensino, etapa anterior ao ensino médio,
ao processo de universalização deste, atingida graças ao esforço de vários governos, e
que não foi acompanhada, em nosso país, de políticas paralelas como maior
investimento em educação, valorização dos profissionais em educação, aumento da
duração do turno escolar e a efetiva alfabetização infantil.
Os primeiros resultados dos alunos brasileiros em exames nacionais como o
ENEM e internacionais como o PISA, foram uma exposição quantitativa e estatística
dessa crise no ensino das ciências naturais, alimentando uma maior discussão sobre o
ensino e aprendizagem científicos principalmente no que diz respeito a áreas como
letramento, alfabetização ou enculturação científicas; ciência, tecnologia e sociedade
(CTS), utilização de novas tecnologias e formação de professores de ciências naturais.
Respostas a situações problemáticas como essas, parecem ter um grande fôlego
na área de ensino de ciências naturais. Historicamente, as reformas educacionais no
ensino de disciplinas desta área, sobretudo a física, estabelecidas em momentos de crise,
foram intensificadas desde os anos de 1950, com a divulgação de grandes projetos
internacionais como PSSC, Harvard, Nuffield, entre outros, que intensificaram as
preocupações por uma educação científica de qualidade, que até os dias atuais se
configura como uma das aspirações de professores e sistemas educacionais, mais ainda
não foi totalmente contemplada.
Os problemas enfrentados atualmente pela educação científica no Brasil podem
causar grandes dificuldades quanto ao desenvolvimento do país frente a toda essa
revolução científica e tecnológica que se intensificou muito nos últimos anos, sobretudo
neste século. Em resposta a esse fenômeno e outros que não estão no universo de nosso
trabalho, mais que são igualmente relevantes, tem sido feito um grande esforço em
nosso país, cujos marcos iniciais são a constituição de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (Lei Federal no 9394/96) e o Parecer no 15/98 da Câmara de
Educação Básica que instituiu as diretrizes curriculares nacionais para o ensino médio.
Estes documentos fomentaram uma grande reforma, ainda em curso, que seguiu
uma tendência internacional de produção de matrizes curriculares cuja orientação é a
formação de competências básicas em todos os âmbitos da educação obrigatória, dentre
elas, a competência científica. Mais recentemente foram realizados estudos que
culminaram com novas diretrizes (BRASIL, 2013) que tem como fundamento maior o
direito à educação, mantendo a proposta inicial de que as diretrizes formam um
conjunto de princípios axiológicos e pedagógicos na promoção de transformações do
sistema de ensino dos projetos educacionais de todas as escolas brasileiras,
principalmente as públicas.
Outras iniciativas legais e de orientação foram desenvolvidas para cercar o
problema. Nos dias atuais, o Novo ENEM, cuja metodologia se aproxima da utilizada
pelas diretrizes curriculares, já é utilizado como a principal forma de acesso ao ensino
superior público. A formação inicial de professores, principalmente das ciências
naturais da rede federal de educação sofreu diversas reformas, diretrizes curriculares
como a da licenciatura em Física acompanha a tendência assumida pelas reformas
ocorridas nos últimos anos.
Em apoio à formação inicial existe uma série de projetos e programas, alguns
gerenciados e fomentados pela CAPES, como Jovens(NOVOS?) Talentos, PIBID e Pró-
docência, os quais servem de referência para estimular alunos da licenciatura, em
articulação com a escola pública, a desenvolver, aplicar e avaliar iniciativas de ensino
que estejam em consonância com as novas diretrizes. Essas iniciativas, articuladas com
as diretrizes curriculares, podem promover a mudança de atitude de futuros professores,
os quais, historicamente foram meros reprodutores da forma como aprenderam no
ensino médio, face à fragilidade metodológica dos antigos e de muito dos atuais cursos
de licenciatura.
As diretrizes e as orientações constituídas na reforma educacional brasileira têm
como uma das finalidades reconduzir as atividades docentes e de aprendizagem dos
estudantes nos mais distintos contextos e condições de trabalho das escolas brasileiras,
como uma resposta às transformações sociais e culturais sofridas pela sociedade
contemporânea, situação passível de um grande grau de complexidade mais que não
pode ser prorrogada devido à sua urgência para introduzir a escola nas sociedades do
conhecimento atuais.

2.2 A IMPORTÂNCIA DA LINGUAGEM E DA COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA


NA APRENDIZAGEM DE CONTEÚDO PROCEDIMENTAL E FORMAÇÃO
DE HABILIDADES E COMPETÊNCIAS

Nos dias atuais, a linguagem e a comunicação se constituem como essenciais nos


processos de ensino e aprendizagem de Ciências Naturais, com amplo reconhecimento
entre pesquisadores em Educação e Didática das Ciências, numerosas instituições e
organismos internacionais. Esta situação pode ser explicada pela forma como a ciência e
a tecnologia influenciam a vida das pessoas e a necessidade sobre a importância de se
desenvolver competências comunicativas básicas para compreender a relevância das
ciências naturais em temas da atualidade como mercado de trabalho, meio ambiente,
engenharia genética, tecnologias da informação, entre outras.
Diversos autores (BORSESE e SANTOS, 2005; LEMKE, 1997 e 2006;
SANMARTÍ, IZQUIERDO e GARCÍA, 1999; SANMARTÍ, 2000; SUTTON, 2003;
DRIVER, NEWTON e OSBORNE, 2000; OGBORN et al, 1996; MARTINS et al,
1999; MORTIMER, 2000) tem enfatizado a importância da linguagem e da
comunicação no Ensino de Ciências Naturais, para uma melhor compreensão dos
processos de produção do conhecimento científico, da natureza da ciência e das
implicações didáticas que se formam para transferir este conhecimento para a educação
básica.
Para Borsese e Santos (2005), a escola deve proporcionar aos estudantes
condições para desenvolver e sofisticar capacidades lógicas e linguísticas, compreender
as regras que governam a linguagem e suas maneiras de se adaptar às exigências
comunicativas dos diversos setores e contextos, para evitar que a linguagem
especializada da ciência seja objeto de domínio apenas de especialistas e assim, se
constitua como um patrimônio de todos, como elemento transmissor de valores
culturais. Partindo da premissa de que todas as disciplinas curriculares utilizam, além da
linguagem natural, léxicos específicos da área do conhecimento que fazem parte, estes
autores afirmam que todos os profissionais de ensino devem ser conscientes de que:
 dirigem a comunicação que é realizada em sala de aula;

 são uma referência do ponto de vista linguístico para seus alunos;

 as modalidades linguísticas que utilizam são um dos fatores mais importantes


para a compreensão dos conceitos e das informações que introduzem;

 melhorar as capacidades linguísticas de seus alunos é um dos principais


objetivos de sua prática educativa.

Lemke (1997) busca dar uma reposta aos problemas que envolvem a
comunicação das ideias científicas em sala de aula. Para este autor, a ciência contém
uma forma específica de linguagem, portanto existe uma forma particular de “falar
ciência” que consiste em utilizar a linguagem científica especializada para dar sentido
ao mundo. De forma mais ampla, a ciência é vista como um processo social, ou seja,
“falar ciência” envolve atitudes, valores e interesses que superam o que é simplesmente
utilitário.
Sutton (2003) analisa a linguagem utilizada por um cientista para colocar a
prova suas ideias, para prever o que pode ou não acontecer em um fenômeno estudado
ou para interpretar situações específicas. Para este autor, cientistas utilizam a linguagem
da ciência no processo de criação, conectando entre si novas formas de observar,
comunicar e fazer, mantendo uma comunidade científica unida mediante
argumentações, baseadas em evidências, que se transformam conforme as formas de se
comunicar evoluem.
Perspectivas atuais para as aulas de Ciências Naturais no nível médio buscam a
superação da simples transmissão de informações, para ensinar como utilizá-la,
estabelecer relações entre informações aparentemente diferentes e para que os alunos
possam comunicar suas ideias e interpretar as que são expostas por outros indivíduos
(SANMARTÍ, IZQUIERDO e GARCÍA, 1999). Por meio deste processo, segundo
Driver, Newton e Osborne (2000), os estudantes podem desenvolver uma nova
linguagem para representar e descrever o mundo que o cerca, retratando-o de uma
maneira diferente, ao fazer uso de entidades como campos magnéticos, átomos, fótons,
entre outros.
Esta situação caracteriza a importância de se desenvolver a linguagem científica
com as características de um idioma, uma língua materna, no entanto, além dos padrões
linguísticos utilizados no idioma em que se discute a informação científica, aparece
também o que Lemke (1997) chama de padrões temáticos, ou seja, modelos particulares
de relações conceituais, que se repetem conforme a comunicação evolui.
Os trabalhos de Ogborn et al (1996) e Martins et al (1999) vinculam o
procedimento altamente especializado de explicar ideias científicas, classificado por
Sanmartí e Izquierdo (2000) como a habilidade mais importante para a comunicação
científica, com questões mais amplas de comunicação. Para aqueles autores, a
linguagem científica não é apenas sobre palavras, mas também sobre as coisas, que
envolvem ações, gestos e as relações pessoais como atos de comunicação.
Ao considerar que a aprendizagem pode ser desenvolvida de várias maneiras, no
entanto, a linguagem é um dos principais, Lemke (2006) apresenta propostas para um
ensino de ciências que propicie novas formas de aprender e novas formas de viver.
Dentre as finalidades desta proposta para a educação científica destacamos a seguir as
que estão relacionadas à linguagem e comunicação:

 Reconhecer a importância da linguagem como o principal meio para o raciocínio


e conceituação na ciência, mas também ajudar os alunos a raciocinar de forma
mais eficaz sobre assuntos científicos e tecnológicos de forma qualitativa,
usando ferramentas algébricas e gráficas como exemplos numéricos. Fazer tudo
isso de forma mais concreta e contextualizada possível e não como
procedimentos abstratos ou através da resolução de problemas artificiais.

 Apoiar os alunos para raciocinarem sobre os fenômenos naturais e tecnológicos,


por meio de combinações integradas de ferramentas linguísticas, matemáticas e
visuais, incluindo modelos computacionais, simulações e ambientes interativos,
mas sempre diretamente conectado com a experiência prática no mundo real,
aprofundando os temas, questões ou projetos específicos.

 Reconhecer a importância da narrativa como um meio de comunicação e


aprendizagem e restaurar o seu lugar de destaque na educação científica.

 Explorar o potencial de outras formas de linguagem, como o diálogo ou a


recitação poética, como um meio eficaz para a aprendizagem sobre o mundo
natural e tecnológico.

Mortimer (2000) lança uma discussão sobre a importância das interações verbais
entre docentes e estudantes e entre os próprios estudantes na interpretação das
evidências e na superação dos obstáculos para a aprendizagem de conceitos científicos.
Este autor enfatiza a perspectiva de que a finalidade das aulas de Ciências Naturais é
introduzir o estudante na cultura científica, a qual tem uma história métodos de trabalho
e estruturas conceituais complexas.
No último século, a importância da linguagem na aprendizagem foi reconhecida
por muitos autores como uma forma de garantir a associação entre processos mentais e
o contexto histórico, cultural e social (VYGOTSKY, 2010; LEONTIEV, 1979;
GALPERIN, 2001; TALÍZINA, 1988 e 2009; BRUNER; WERTSCH, 1991).
Vygotsky (2010) apresenta sob o ponto de vista psicológico, as complexas
relações entre pensamento e linguagem que permitem explicar a aprendizagem como
processo de aquisição de conteúdo inicialmente interpsicológico, ou seja, social, para
uma estrutura intrapsicológica ou mental. De acordo com este autor (p. 412):
Por sua estrutura, a linguagem não é um simples reflexo da estrutura
do pensamento, razão por que não pode esperar que o pensamento seja
uma veste pronta. A linguagem não serve como expressão de um
pensamento pronto. Ao transformar-se em linguagem, o pensamento
se reestrutura e se modifica. O pensamento não se expressa mas se
realiza na palavra. Por isto, os processos de desenvolvimento dos
aspectos semântico e sonoro da linguagem, de sentidos opostos,
constituem a autêntica unidade justamente por força do seu sentido
oposto.

Vygotsky aplicou de maneira criativa, na psicologia, a filosofia materialista


dialética histórica, desenvolvida por Karl Marx, formulando uma série de questões
sobre o desenvolvimento ontogenético histórico-social humano, em contraposição às
correntes biologistas e idealistas predominantes na psicologia de sua época, as quais
atribuem à vida humana como independente da história da sociedade a qual o indivíduo
faz parte. Este notável psicólogo considerava a psique uma característica humana, uma
propriedade material de nossa espécie, a qual é dotada de um cérebro, no entanto,
aquela foi determinada como um produto social, resultado do desenvolvimento histórico
da humanidade. A linguagem, nesta perspectiva, surge como elemento para dar suporte
a uma melhor apreensão dos procedimentos de produção do conhecimento científico e
da própria natureza das ciências naturais, assim como no reconhecimento de que a
aprendizagem ocorre por meio de diferentes linguagens (LEMKE, 1997) e das relações
da linguagem com o pensamento (VYGOTSKY, 2010).

A obra de L. S. Vygotsky, como representante da primeira fase da psicologia


histórico-cultural, desenvolvida na antiga União Soviética, é considerada como uma
“sinfonia incompleta” na explicação do processo de apropriação dos objetos externos,
de conteúdo social, permitindo a conversão destes em objetos refletidos mentalmente. O
trabalho de Leontiev (1979) permite um maior aprofundamento, na compreensão deste
processo, quando associa a sua realização ao entendimento de que o objeto deve
aparecer ao indivíduo sendo reproduzido como conteúdo psíquico da atividade, ou seja,
em sua forma ideal. Para este autor, no processo de comunicação, é produzida também a
linguagem, para denominar objetos, os meios e os processos que envolvem a atividade,
como atos de demarcação da faceta ideal destes.
Os estudos de L. S. Vygotsky apresentam resultados acerca da tese de que a
linguagem interna, ou seja, aquela que tem lugar para si, se forma a partir da linguagem
externa, compartilhada socialmente, por meio de mudanças na estrutura, tornando-se
mais abreviada e descontínua (GALPERIN, 2001, p.57). Pesquisas realizadas por P. Ya.
Galperin e seus colaboradores, a partir da década de 1950, aprimoraram o entendimento
de que uma ação mental1 constitui-se como um tipo especial de linguagem, denominado
de linguagem interna. Na perspectiva de Galperin (2001, pp. 60 e 61) a formação da
ação mental ocorre em etapas, de forma que a linguagem está presente em todas elas de
maneiras distintas, incialmente como indicadora da realidade material e aos poucos se
tornam parte da consciência do indivíduo, realizada silenciosamente e sem a presença
dos objetos.
Nesta mesma perspectiva teórica, Wertsch (1991) ressalta que as realizações
tipicamente humanas utilizam a linguagem como instrumento mediador, que por sua
vez, juntamente com outras ferramentas, dão forma, de maneira essencial a estas ações.
Para este autor, a análise de um objeto que envolva uma ação humana deve levar em
consideração o indivíduo em uma situação concreta e os instrumentos mediadores
envolvidos.
Para Talízina (1988, 2009) a linguagem se desenvolveu como um modo
específico que a raça humana utiliza para se relacionar socialmente. Para esta autora, as
peculiaridades específicas da psique humana são produzidas, não pela repetição de sua
prática, mas pelas novas relações sociais entre os indivíduos que surgem a partir desta
prática, nas quais a fala é um instrumento mediador importante como produto da
cultura.
Bruner (2002) argumenta que na essência de toda transformação social existe
mudanças nas concepções de conhecimento, pensamento e aprendizagem cuja
realização pode ser dificultada ou distorcida pela forma em que utilizamos a linguagem
para falar acerca do mundo. Neste aspecto, a verbalização, como ferramenta da
cognição, é fundamental para o desenvolvimento e compreensão nos processos
comunicativos associados à atividade mental dos seres humanos.
No campo específico do Ensino das Ciências Naturais, o interesse da
comunidade científica não tem se restringido as situações de prática de ensino dos
conteúdos particulares em diversos níveis. Na superação dos conteúdos específicos de
Física, Química e Biologia, a educação científica investiga indicadores léxicos,
linguísticos, lógicos e experimentais, as chamadas habilidades cognitivas como
componentes que possibilitam uma abordagem mais eficiente e correta do estudo dos
fenômenos naturais (BANDIERA ET AL, 1995). Estas habilidades estão na base das

1
operações cognitivas, produzidas constantemente nas atividades de aprendizagem, são
processos básicos, ricos e variados utilizados para tratamento e processamento da
informação, como por exemplo, analisar, comparar, classificar, interpretar e observar
(JORBA, 2000).
Para Borsese e Santos (2005) o investimento na comunicação e na linguagem no
ensino de cada disciplina não deve ser apenas para entender o vocabulário específico da
ciência, mas também, e principalmente, para compreender como os discursos são
construídos e quais são seus objetivos, interconexões com o trabalho da ciência e os
problemas de comunicação na sociedade contemporânea.
Machado (2000) percebe a sala de aula de ciências como um lugar que
possibilita a construção do conhecimento científico, bem como de (re) elaboração de
visões acerca do mundo. Para essa autora, esse é um espaço de participação em um
diálogo, onde o aluno interroga, escuta, responde, concorda, enfim deve participar todo
e com toda a sua vida.
Este contexto propiciou o desenvolvimento de trabalhos sobre a formação de
habilidades cognitivo-linguísticas (JORBA, PRATS e GÓMEZ, 1998; JORBA ET AL,
2000; SANMARTÍ e IZQUIERDO, 2000; NÚÑEZ, 2012) para a leitura, interpretação e
produção de textos de diversas naturezas (descritivo, explicativo, argumentativo) com a
finalidade de ativar habilidades cognitivas. Esses autores classificam como cognitivo-
linguísticas as habilidades de descrever, explicar, argumentar e justificar.
Para Núñez (2012), os processos de formação de habilidades cognitivo-
linguísticas como descrever, explicar e argumentar são complexos, demandam muito
tempo para ser implementados, e por esse motivo não têm sido desenvolvidos de forma
eficiente nas aulas de ciências. A maioria das pesquisas sobre o tema ainda se concentra
no reconhecimento da necessidade de investigar tal problemática, sendo ainda em
pequeno número os trabalhos que apresentam uma estrutura que direcione o ensino
dessas habilidades.
A linguagem permite que o estudante ou o cientista ao obter determinadas
informações, mediante a observação, experimentação, leitura ou análise matemática,
possa pensar sobre estes, discutir e difundir o resultado, contribuindo de forma
importante para a construção do conhecimento (SANMARTÍ ET AL, 1999).
A ciência precisa ser vista como parte do patrimônio cultural da humanidade
(NÚÑEZ, 2012), como uma atividade de domínio autêntico e, portanto, sua
aprendizagem deve ser associada à cultura desse domínio (BROWN; COLLINS e
DUGUID, 1988). Para evitar que os alunos adquiram visões distorcidas da ciência deve-
se prestar atenção como esta evolui, permitindo a estes, o acesso às “vozes autênticas”
dos cientistas na produção de novas ideias (SUTTON, 2003).
As Ciências Naturais requerem além do domínio do vocabulário e da semântica
que acompanha a linguagem desta área do conhecimento, a noção sobre como ocorre o
processo de desenvolvimento do pensamento científico. De acordo com Oliveira e
Carvalho (2005):

Atividades de ensino de Ciências que propiciem o trabalho prático


para os alunos nas aulas muito se assemelham ao processo dos
cientistas em construir e divulgar novos conceitos e conhecimentos. O
fazer nas aulas de Ciências possibilita que os alunos construam suas
hipóteses, possam testá-las e comprovar suas evidências. Todo esse
processo de investigação é vivido pelo cientista no seu trabalho.

A formação do discurso científico vai além de apropriar-se dos padrões


científicos e, além disso, não significa apenas dar voz aos alunos. Deve-se também
contemplar as vozes da linguagem cotidiana e dos contextos sociais e tecnológicos
(MORTIMER 1998, P. 117) bem como introduzir o jovem numa forma diferente de
pensar sobre o mundo natural e de explica-lo (DRIVER ET AL 1994).
Mortimer (2000) investiga a importância da linguagem e de sua utilização por
professores e alunos na elaboração de conceitos em sala de aula investigando estados
físicos e a relação destes com modelos atomistas em uma sequência de aulas
classificadas pelo próprio autor como construtivistas. O trabalho destaca a função
preponderante das interações verbais entre professores e alunos e entre os próprios
estudantes na interpretação das evidências e na superação dos obstáculos à
aprendizagem de conceitos científicos. É utilizada nesse trabalho a noção de perfil
conceitual que permite a convivência pacífica de mais de um conceito seja ele científico
ou espontâneo, tentando recuperar o senso comum como parte integrante da cultura, não
necessariamente eliminado pelo racionalismo científico (MORTIMER 2000, p. 353).
Alguns trabalhos (DRIVER ET AL, 1998; ARRUDA E LABURÚ, 1998,
CHALMERS, 1993; PRAIA ET AL, 2000) criticam a situação atual da educação da
educação em ciência de como ela reflete a “visão positivista” dessa área do
conhecimento de forma que o “livro da natureza é lido por observação e
experimentação” (DRIVER 1998) e que não somente alunos mais professores e a
comunidade em geral são muito influenciadas pela “imagem popular (ingênua) da
ciência” (ARRUDA e LABURÚ, 1998). Para Driver et al (1998), é necessário
reconceituar as práticas de ensino de ciências, de modo a retratar o conhecimento
científico como socialmente construído. Mudanças como estas envolvem grandes
esforços com implicações importantes para a pedagogia e exigem a substituição de um
ensino estanque e memorístico por atividades discursisvas, com uma participação mais
efetiva dos alunos.
No trabalho de Driver et al (1998), são sugeridos elementos além dos conceitos
da ciência para serem incluídos na educação científica:

Portanto, na aprendizagem das ciências, os alunos devem ter a


oportunidade de aprender sobre os conceitos de ciência, também deve
ser dada alguma introspecção em sua epistemologia, as práticas e
métodos da ciência, e sua natureza como uma prática social por meio
de estudos da ciência na prática, seja histórica ou na prática
contemporânea.

Nesse contexto incluem-se atividades experimentais:

Se a ciência deve ser ensinada a partir da perspectiva da construção


social do conhecimento, então não são importantes processos
discursivos que também precisam ser incorporadas ao trabalho prático
e experimental (p. 298).

Uma atividade escolar de aprendizagem que envolva habilidades como observar,


descrever e explicar, deve ser planejada como uma série de ações de acordo com os
padrões culturais da ciência, sob a orientação do professor, envolvendo a
implementação e desenvolvimento de habilidades cognitivas e sociais dos alunos,
enquanto a assimilação do conteúdo cultural deve ser definida pelo currículo (GOMEZ,
2000).
2.3 COMPETÊNCIAS, HABILIDADES E CONTEÚDO PROCEDIMENTAL NO
ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS
Existe na literatura certa polissemia a respeito de como os processos que
envolvem a observação e descrição podem ser classificados enquanto conteúdo de
aprendizagem. Esta polissemia é refletida nos referenciais curriculares recentes,
exigindo do professor um domínio de um currículo cada vez mais complexo.
Para Sanmartí, Izquierdo e García (1999) este currículo de Ciências não mais
deve dar conta apenas de transmitir a informação que já está à disposição de todos nas
mais diversas formas. Para as autoras, o foco do processo deve estar em ensinar a
utilizar a informação, estabelecer relações entre informações aparentemente díspares e,
especialmente, comunicar nossas ideias e interpretar as dos outros.
A importância atribuída à linguagem, comunicação e formação de habilidades
cognitivo-linguísticas no Ensino de Ciências pode ser percebida como uma associação
entre as competências linguística e científica (SANMARTÍ, 2007). O importante
Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA2) define a competência científica
como (OCDE, 2006):

[...] a capacidade para utilizar o conhecimento científico para


identificar perguntas e obter conclusões a partir de evidências, com a
finalidade de tomar decisões sobre o mundo atual e as transformações
que a atividade humana produz nele.

Apesar de possuir uma gama de significados, podemos admitir em geral que


competência tem as mesmas características de uma habilidade, no entanto, possui um
aspecto mais generalizante, ou seja, “a competência é uma habilidade de ordem geral,
enquanto a habilidade é uma competência de ordem particular, especifica” (BRASIL,
2005). As habilidades referem-se ao plano objetivo e prático do saber fazer e decorrem,
diretamente, das competências adquiridas que se transformam em habilidades
(BRASIL, 2008). No PISA, o termo competência é utilizado para condensar uma
concepção mais ampla sobre conhecimentos e habilidades (OCDE, 2006, p. 9).
Aspectos linguísticos da competência científica, avaliados pelo PISA,
comportam a compreensão das características da ciência e da investigação humana, a
percepção do modo como a ciência faz parte de nosso entorno material, cultural e
intelectual, e a disposição de implicar-se em assuntos relacionados com as ideias da
ciência. Para Sanmartí (2007) reconhecer o significado das diferenças entre formas
verbais envolve não apenas a utilização da linguagem científica como competência, mas
também e principalmente, a tomada de consciência e a interiorização da competência
linguística. Para a OCDE (2006), o conceito de competência científica é:

A capacidade de empregar o conhecimento científico para identificar


perguntas e extrais conclusões baseadas em fatos, com a finalidade de
compreender e tomar decisões sobreo mundo natural e as
transformações produzidas pela atividade humana.
Neste contexto, o conceito de competência supera os conhecimentos e
habilidades, por exemplo, se comunicar de maneira eficaz é uma competência que pode

2
Este programa é realizado a cada três anos com estudantes de 15 anos em países membros da OCDE e
um grupo de países associados que juntos compreendem 90 % da economia mundial. Busca-se avaliar, a
partir das competências em ciências, leitura e matemática, se os alunos estão suficientemente preparados
para enfrentar os desafios do futuro, se estão capacitados para analisar suas ideias, pensar sobre elas e
comunicá-las de forma eficaz e se tem interesses que podem perseguir ao longo da vida como membros
produtivos da economia e da sociedade (OCDE, 2006, p. 18).
assistir o conhecimento sobre a linguagem de um indivíduo, desenvolvendo neste,
habilidades para tal situação a partir da contextualização dos fenômenos científicos e
um agir consciente por meio de atitudes. Esta articulação entre conhecimentos,
habilidade e atitudes é apresentada na figura 2.
O PISA abarca quatro aspectos que podem ser assim inter-relacionados (OCDE,
2006) que formam a competência científica.

a) Contexto: reconhecer as situações da vida dotadas de conhecimento científico e


tecnológico.
b) Conhecimentos: compreender o mundo natural por meio do conhecimento
científico a partir do das dimensões da ciência e sobre a ciência.
c) Habilidades: identificar questões científicas, explicar fenômenos
cientificamente e tirar conclusões baseadas em provas.
d) Atitudes: mostrar interesse pela ciência, respaldar a investigação científica e
contar com motivação necessária para atuar de forma responsável em relação,
por exemplo, com os recursos naturais e o meio ambiente.

Figura 2 – articulação entre competências, conhecimentos e atitudes (OCDE, 2006)

Os tradicionais conteúdos, também chamados de conteúdos conceituais ou


simplesmente conhecimento científico tem lugar neste programa a partir de duas
categorias: o conhecimento sobre ciências e das ciências. A figura 3 apresenta a
pontuação média dos alunos de um grupo de países participantes do PISA 2006 sobre os
indicadores de conhecimento destas duas categorias.

Figura 3 – Indicadores gráficos sobre a pontuação média das escalas conhecimento sobre as
ciências e conhecimento das ciências (OCDE, 2006)
Percebemos na figura 3 que o resultado do Brasil nestes dois indicadores é muito
inferior ao bloco de países mais bem avaliados, assim como sua pontuação se assemelha
a de países como Indonésia e Tunísia e nossos vizinhos Argentina e Colômbia,
superando expressivamente somente o Quirquistão e o Qatar nos dois indicadores e o
Azerbaijão em apenas um, dentre os países que participaram da prova.
Esse é um quadro preocupante para a educação científica em nosso país, já que
este programa não está centrado em apenas investigar o domínio dos alunos sobre os
conteúdos específicos das disciplinas científicas, mas que principalmente avalia os
conteúdos procedimentais como a capacidade dos alunos para identificar questões
científicas, explicar fenômenos cientificamente e utilizar evidências científicas para
encontrar, interpretar e resolver problemas e tomar decisões em situações da vida real
que têm a ver com a ciência e tecnologia (OCDE, 2006, p. 37).
Nos aspectos associados aos conteúdos procedimentais o Brasil também não
obteve bons resultados, por exemplo, no indicador “explicar questões cientificamente” a
posição do país foi 53º lugar de 57 participantes, como é mostrado na figura 4.

Figura 3 – Porcentagem de alunos em cada nível de aptidão no indicador explicar


fenômenos cientificamente (OCDE, 2006)

Apesar de muito ter avançado em relação em orientações curriculares assim


como no PISA, os estudos relativos à formação de procedimentos não ocupam
historicamente um lugar central nas pesquisas sobre o ensino das Ciências Naturais.
Seguindo concepções tradicionais, o ensino de disciplinas como Química Física e
Biologia, é baseado na transmissão de um corpus conceitual das disciplinas, dos
principais modelos e técnicas, ou seja, durante muitos anos, o conhecimento científico
escolar tem sido um conhecimento verbal (NÚÑEZ e RAMALHO, 2011, POZO, 2009).
Seguindo a tendência atual dos sistemas de ensino em adotar matrizes
curriculares embasadas em competências básicas, o Ministério da Educação do Brasil
(MEC) desenvolveu, nas últimas décadas, orientações curriculares para o ensino básico.
O Novo Ensino Médio, instituído pelos PCN e PCN+ em 2000, apresentam um modelo
de aprendizagem centrada nas competências e habilidades onde a formação do aluno de
ensino médio deve ter como foco a aquisição de conhecimentos básicos, a preparação
científica e a capacidade de utilizar as diferentes tecnologias relativas às áreas de
atuação. De acordo com as bases legais do PCN (Brasil, 2000, p. 5):
Propõe-se, no nível do Ensino Médio, a formação geral, em oposição à
formação específica; o desenvolvimento de capacidades de pesquisar,
buscar informações, analisá-las e selecioná-las; a capacidade de
aprender, criar, formular, ao invés do simples exercício de
memorização.

A justificativa apresentada pelos criadores deste “Novo Ensino Médio” indicava


que as transformações estruturais ocorridas na sociedade do século XXI, intituladas de
“revolução do conhecimento”, haviam modificado a organização do trabalho e as
relações sociais e por isso era necessário investir na expansão crescente da rede pública
de ensino, com fins de atender a padrões de qualidade que se coadunem com as
exigências desta sociedade.
As orientações para esse novo Ensino Médio, que não é mais tão novo, já que
atualmente estão em desenvolvimento novas orientações curriculares que dão forma,
por exemplo, ao que o Governo Federal chama de “Ensino Médio Inovador”, prestava
atenção especial às rápidas transformações e difíceis contradições do final do século
passado e início deste. O caráter dinâmico do conhecimento exige uma formação para a
vida que vai além da simples reprodução de dados, denominar classificações ou
identificar símbolos. Esta formação demanda (BRASIL, 2002):
a) Saber se informar, comunicar-se, argumentar, compreender e agir;

b) Enfrentar problemas de diferentes naturezas;

c) Participar socialmente, de forma prática e solidária;

d) Ser capaz de elaborar críticas ou propostas; e,

e) Especialmente, adquirir uma atitude de permanente aprendizado.


Uma formação com tal pretensão estabelece metodologias de ensino e
aprendizagem compatíveis, ou seja, condições eficazes para que os alunos possam
(BRASIL, 2002):
a) Comunicar-se e argumentar;

b) Defrontar-se com problemas, compreendê-los e enfrentá-los;

c) Participar de um convívio social que lhes dê oportunidades de se realizarem


como cidadãos;

d) Fazer escolhas e proposições;

e) Tomar gosto pelo conhecimento, aprender a aprender.

A formação de habilidades comunicativas em ciências naturais, assim como em


outras disciplinas, faz parte da construção da competência de representação e
comunicação (BRASIL, 2006). Esta competência geral foi, no ensino de ciências
naturais, subdividida em cinco competências específicas, a saber: símbolos, códigos e
nomenclaturas de ciência e tecnologia, articulação dos símbolos e códigos de ciência e
tecnologia, análise e interpretação de textos e outras comunicações de ciência e
tecnologia, elaboração de comunicações e discussão e argumentação de temas de
interesse de ciência e tecnologia. Um resumo do que consistem essas competências é
exposto na tabela 1.

Tabela 1 - Competências e habilidades de representação e comunicação dos PCNs

REPRESENTAÇÃO E COMUNICAÇÃO

Símbolos, códigos e nomenclaturas Reconhecer e utilizar adequadamente, na forma oral e escrita,


de ciência e tecnologia símbolos, códigos e nomenclatura da linguagem científica.

Articulação dos símbolos e códigos Ler, articular e interpretar símbolos e códigos em diferentes
de ciência e tecnologia linguagens e representações: sentenças, equações, esquemas,
diagramas, tabelas, gráficos e representações geométricas.

Análise e interpretação de textos e Consultar, analisar e interpretar textos e comunicações de


outras comunicações de ciência e ciência e tecnologia veiculados por diferentes meios.
tecnologia

Elaboração de comunicações Elaborar comunicações orais ou escritas para relatar, analisar e


sistematizar eventos, fenômenos, experimentos, questões,
entrevistas, visitas, correspondências.

Discussão e argumentação de temas Analisar, argumentar e posicionar-se criticamente em relação a


de interesse de ciência e tecnologia temas de ciência e tecnologia.
Podemos perceber também a importância atribuída à formação de competências
e habilidades linguísticas no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Instituído em
1998, pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
(INEP), do Ministério da Educação, constitui uma prova, que inicialmente foi utilizada
para programas governamentais de avaliação, crédito educativo e como critério de
seleção parcial para o ingresso em poucas universidades e que nos dias atuais caminha
para ser a principal forma de acesso ao ensino superior no Brasil.
Para este exame (BRASIL, 2005), a formação de competências e habilidades,
mostradas na tabela 2, em uma escola para todos, é a finalidade principal, enquanto as
matérias e as atividades escolares são os meios que possibilitam sua realização.
Encontramos também associação entre os conceitos de habilidade e competência na
Prova Brasil (BRASIL, 2008, p.18), na qual afirma que “habilidades referem-se ao
plano objetivo e prático do saber fazer e decorrem, diretamente, das competências
adquiridas que se transformam em habilidades”.

Tabela 2 - Competências e habilidades segundo o ENEM

COMPETÊNCIAS AVALIADAS PELO ENEM (BRASIL, 2005)

I Dominar a norma culta da Língua Portuguesa e fazer uso das linguagens


matemática, artística e científica.

II Construir e aplicar conceitos das várias áreas do conhecimento para a compreensão


de fenômenos naturais, de processos histórico-geográficos, da produção tecnológica
e das manifestações artística.

III Selecionar, organizar, relacionar, interpretar dados e informações, representados de


diferentes formas, para tomar decisões e enfrentar situações-problema.

IV Relacionar informações, representadas de diferentes formas, e conhecimentos


disponíveis em situações concretas, para construir argumentação consistente.

V Recorrer aos conhecimentos desenvolvidos na escola para elaboração de propostas


de intervenção solidária na realidade, respeitando os valores humanos e
considerando a diversidade sociocultural.

Percebemos na literatura da área de educação e ensino de ciências vários estudos


associados ao ensino de procedimentos que coadunam com as concepções de uma
escola para enfrentar os desafios deste século. Estas pesquisas (DUSCHL, 1997; PRO-
BUENO, 1998; MONEREO 1999; BANET 2001; SANMARTÍ 2002; GIL-PÉREZ ET
AL 2005; TALÍZINA, 2009; DE CUDMANI ET AL, 2000; ZABALA E ARNAU,
2007 e 2010; NÚÑEZ 2009; NÚÑEZ E RAMALHO, 2011) revelam orientações sobre
temas como o ensino de conteúdo procedimental em articulação com a formação de
habilidades e competências. Apesar de diferenças léxicas e referenciadas em vários
pressupostos filosóficos, epistemológicos e pedagógicos, em geral, são pesquisas “sobre
o saber como fazer” em articulação com a mobilização dos conteúdos conceituais e
atitudinais.
Os procedimentos são o conjunto de roteiros e pautas empregados para a
obtenção de um resultado ou meios que nos auxiliam a alcançar uma meta. Abarcam
estratégias e métodos utilizados para coletar, organizar a informação e estabelecer novas
relações facilitando assim o processo de metacognição. Utiliza-se, no meio educativo, o
termo conteúdo procedimental como objeto do “saber fazer” que envolve tomada de
decisões e realização de uma série de ações, de forma ordenada e não aleatória (PRO-
BUENO, 1998; COLL e VALLS, 2000).
Não se trata de separar os conteúdos, ou seja, em alguns momentos ensinar
apenas conceitos em outros apenas procedimentos, para Talízina (2009), no lugar de
dois problemas, ou seja, transmitir os conhecimentos e formar as habilidades para sua
aplicação, o professor tem agora um só: formar os tipos de atividade que inclui desde o
inicio o mesmo sistema dado de conhecimentos e garantir sua aplicação dentro de
limites determinados. Zabala e Arnau (2010, p. 48) compartilham dessa opinião quando
afirmam que:

Sem conteúdos conceituais sobre os quais aplicar procedimentos é


impossível que eles sejam aprendidos de modo significativo,
entendendo por isso a capacidade de serem utilizados em qualquer
situação. No entanto, o mais substancial é que essas atividades são
importantes não somente pelo fato de que com elas se aprendem
técnicas e estratégias educativamente relevantes, mas também porque
são o principal meio para que o aluno posa realizar a atividade mental
necessária, com a finalidade de compreender diferentes conteúdos
conceituais imprescindíveis para entender o mundo no qual vivemos e
os fenômenos que nele ocorrem.

Duschl (1997) esclarece que não se aprende os conteúdos procedimentais de


maneira natural ou espontânea pela simples participação nas aulas teóricas ou práticas.
Núñez e Ramalho (2011) analisam os procedimentos como tipos de atividades nas quais
o planejamento é indispensável para serem ensinados de forma explícita e consciente.
Pro-Bueno (1998), Banet (2001), Sanmartí (2002), Núñez (2009) e Gil-Pérez et al
(2005) apontam que atividades de ensino devem integrar conteúdos atitudinais,
procedimentais e conceituais, enquanto Monereo (1999) ressalta a importância da
igualdade destas dimensões do conteúdo.
Para Hodson (1992) os estudantes desenvolvem melhor a compreensão
conceitual e aprendem mais sobre a natureza da ciência quando participam de
investigações científicas desde que haja apoio e oportunidades suficientes para a
reflexão. Vilches e Gil-Pérez (2001) defendem que o ensino baseado nos aspectos
conceituais dificulta a própria aprendizagem conceitual, proporcionando uma visão
empobrecida da ciência. Para estes autores, para superar o reducionismo conceitual
deve-se apresentar o ensino de ciências como uma atividade, próxima da investigação
científica, integrando os aspectos conceituais, procedimentais e axiológicos.
Toda problemática que associa a formação de habilidades e competências à
aprendizagem de conteúdo procedimental pode ser estudada de uma forma mais celular.
Para o caso de nosso trabalho, escolhemos investigar a formação das habilidades de
observar e descrever com foco nas atividades práticas experimentais no Ensino de Física
para o nível médio, na formação inicial do professor de Física. Na próxima secção,
discutiremos a problemática dos trabalhos experimentais associados ao ensino de
procedimentos, focalizando nos procedimentos ou habilidades de observar em
atividades experimentais didáticas.

2.4 A FORMAÇÃO DE HABILIDADES E APRENDIZAGEM DE CONTEÚDO


PROCEDIMENTAL EM ATIVIDADES EXPERIMENTAIS NO ENSINO DE
FÍSICA

O final da década de 1990 e início do século XXI foram marcados por


transformações significativas na estrutura curricular da educação brasileira. As
primeiras orientações curriculares nacionais conhecidas como PCNs trouxeram para a
escola o debate acerca de ensinar sob uma matriz curricular baseada em competências e
habilidades.

A época se desenvolvia em nosso país, uma extensa literatura sobre as práticas


experimentais (ARAÚJO e ABIB, 2001; REZENDE, OSTERMANN e FERRAZ, 2009)
como recurso didático para ensinar ciências e particularmente física. Esses trabalhos de
revisão desenvolveram categorias que apresentam as diversas tipologias do trabalho
experimental, evidenciando as principais linhas de ação quanto o assunto é o laboratório
didático.
De acordo com Araújo e Abib (2001), independente da modalidade dos
trabalhos investigados, em geral, a produção das principais revistas brasileiras de ensino
de Física sobre práticas experimentais recomenda a sua utilização em aulas do ensino
médio, destacando dois aspectos fundamentais para a eficiência dessas atividades:
 Capacidade de estimular a participação ativa dos estudantes, despertando
sua curiosidade e interesse, favorecendo um efetivo envolvimento com
sua aprendizagem.
 Tendência em propiciar a construção de um ambiente motivador,
agradável, estimulante e rico em situações novas e desafiadoras que,
quando bem empregadas, aumentam a probabilidade de que sejam
elaborados conhecimentos e sejam desenvolvidas habilidades, atitudes e
competências relacionadas ao fazer e entender a Ciência.
O trabalho de Araújo e Abib (2002) promove uma discussão sobre as
demonstrações no ensino de Física de forma que estas podem potencializar a formação
de habilidades associadas ao espírito científico quando superam a simples ilustração e
exploram o máximo das observações. Também para esses autores as atividades
experimentais de verificação permitem Permite a formação de competências como a
capacidade de reflexão, de efetuar generalizações de realização de atividades em
equipe, bem como o aprendizado de alguns aspectos envolvidos com o tratamento
estatístico de dados e a possibilidade de questionamento dos limites de validade dos
modelos físicos.
Rezende, Ostermann e Ferraz (2009) entendem que grande parte das
publicações brasileiras sobre as práticas experimentais neste início de século se
dedica à descrição de experimentos e na maioria das vezes não expõe a sua
relação com o processo de ensino e aprendizagem, limitando-se ao conteúdo
específico envolvido na experiência. Para as autoras:
A ênfase nos aspectos experimentais da física dentro da temática
ensino-aprendizagem esconde concepções que deveriam ser
problematizadas, como por exemplo, a visão da física como uma
ciência exclusivamente experimental, a visão empirista da ciência e da
aprendizagem, na medida em que os trabalhos apostam muitas vezes
na demonstração do fenômeno físico como meio suficiente para a
construção do conhecimento, caracterizando-o como um processo
passivo.
Em um trabalho produzido no início dos anos 90, Hodson (1990) já
alertava para a forma como práticas experimentais eram realizadas em aulas de
ciências. Para este autor, o trabalho experimental muitas vezes é desenvolvido
de maneira muito confusa e pouco produtiva e os estudantes aprendem pouco
sobre a ciência e seus processos, apontando algumas características que causam
tal dificuldade:
 Inexistência de uma base teórica;
 O conteúdo é previamente escolhido pelo professor, limitando a
criatividade dos alunos.
 O aluno é visto como um mero consumidor da atividade.
 Os alunos não se apropriam da teoria adequada para interpretar e explicar
o que observam.
Esta preocupação tem permitido nos últimos anos um aumento de trabalhos que
propõe novas abordagens para atividades experimentais envolvendo a formação de
habilidades ou de conteúdo procedimental (BORGES, 2004; MONTEIRO e GASPAR,
2005; BONADIMAN e NONENMACHER, 2007; MION, 2002; GOMES, 2008;
ALMEIDA, 2008; TENREIRO-VEIRA e VIEIRA, 2006).
Borges (2004) apresenta críticas ao modelo de atividades experimentais de
cunho indutivista, considerando que o laboratório didático é útil para determinadas
situações em que o aluno precisa medir, coletar dados, dentre outros procedimentos
típicos de um laboratório de pesquisa.
Monteiro e Gaspar (2005) apresentam uma proposta para realização de
demonstrações utilizando momentos de comunicação entre os alunos e professores
baseada na teoria de Vygotsky. Neste trabalho leva-se em consideração conceitos como
definição de situação, intersubjetividade e mediação semiótica como elementos de
aprendizagem dos conteúdos a partir do desenvolvimento gradual das explicações dos
estudantes.
Gomes et al (2008) apresenta uma revisão da literatura sobre os processos e
conhecimentos envolvidos na realização de uma atividade de investigação. Em seu
trabalho, é feita uma análise conceitual segundo a perspectiva do modelo SDDS que
propõe que uma investigação pode ser considerada como um processo de resolução de
problemas, subdividido em três processos: formulação de hipóteses, experimentação e
análise de evidências. É feita também uma discussão acerca da relação e a natureza dos
conhecimentos conceituais e procedimentais que estão envolvidos na execução de
atividades práticas, considerando as implicações metodológicas para a pesquisa na área
de ensino de ciências.
As atividades investigativas pesquisadas por Gomes et al (2008), compreendem
o resultado da interação de dois tipos de conhecimento: o conceitual e o procedimental.
O primeiro está relacionado à compreensão das imagens da Ciência fundamentadas em
eventos, leis e princípios físicos. O conhecimento procedimental consiste nas
habilidades necessárias para fazer ciência que compreendem as estratégias,
procedimentos e métodos necessários ao desenvolvimento e resolução de um problema.
Saraiva-Neves, Caballero e Moreira (2006) apresentam o resultado de um estudo
exploratório sobre a promoção de aprendizagem em Física, situada no trabalho
experimental em casos de aprendizagem planejada, interagindo com materiais para
observar e compreender fenômenos. Reconhecendo a diversidade e a variedade das
concepções acerca de atividades experimentais esses autores procuraram condensar os
objetivos gerais dessas atividades levando em consideração as diferenças entre:
 Aprender ciência – adquirir e desenvolver conhecimento conceitual e teórico;
 Aprender acerca da ciência – desenvolver uma compreensão sobre a natureza
e métodos da ciência e uma percepção das complexas interações entre
ciência, tecnologia, sociedade e ambiente;
 Fazer ciência – empenhar-se e desenvolver competências em investigação
científica e resolução de problemas.

Reconhecemos semelhanças entre os pontos elencados neste trabalho com a


natureza do conhecimento e suas diversas faces. Enquanto o aprender ciências está
centrado no conteúdo científico específico, o aprender acerca da ciência está voltado
para os procedimentos e o fazer ciência para as atitudes. A separação entre esses
conteúdos é apenas didática, como percebemos Almeida (2008):

A aprendizagem da ciência não pode, assim, ser caracterizada nem


pela aprendizagem dos conteúdos, nem pela aprendizagem dos
processos, mas pela sua interação dinâmica em situações de
aprendizagem que possibilitem aos alunos mobilizar os seus saberes
conceituais e processuais no desenvolvimento de processos
investigativos e, deste modo, construírem e reconstruírem contínua e
progressivamente a sua compreensão do mundo.

Em seu trabalho, Bonadiman e Nonenmacher (2007) valorizam a concepção de


ciência como produção humana e baseiam-se nas atividades experimentais para realizar
o processo de ensino e aprendizagem, articulando o conhecimento científico formal com
os saberes do aluno. De acordo com os autores, o que se propõe é um ensino mais
atraente para os alunos, com ênfase na compreensão dos conceitos físicos e na relação
destes com coisas e fatos do dia a dia.
As atividades experimentais, desenvolvidas por Bonadiman e Nonenmacher
(2007), segundo os próprios autores, pode produzir nos alunos uma condição de “gostar
de aprender ciência”, a partir que se deem oportunidades desses estudantes:

 Produzir, a partir das informações do contexto da experimentação, ideias que


auxiliem na explicação de um determinado fenômeno físico.
 Vivenciar em sala de aula, mesmo que de forma bastante simplificada, alguns
dos procedimentos da ciência.
 Desenvolver habilidades no manuseio e na montagem de experimentos.

As atividades experimentais prospostas por Tenreiro-Vieira e Vieira (2006)


podem ser do tipo prever – observar – explicar - refletir como forma de proporcionar
oportunidades para que os alunos utilizem as habilidades de pensamento, chamadas de
pensamento crítico. Segundo os autores, esse tipo de atividade tem como principal
objetivo promover a reconstrução do conhecimento dos alunos, começando a enfrentar uma
situação de dúvida ou problema que lhes permite tomar consciência de suas idéias prévias que
depois serão confrontadas com dados empíricos.

2.5 AS HABILIDADES DE OBSERVAR E DESCREVER NO CONTEXTO


DAS ATIVIDADES EXPERIMENTAIS NO ENSINO DE FÍSICA

Trabalhos relevantes na área de Didática das Ciências, bem como novas


contribuições curriculares, caracterizam os procedimentos de observação e
experimentação como importantes recursos para integrar conceitos científicos e
procedimentos. A relevância desses conteúdos procedimentais pode ser percebida em
atividades práticas, como indicado no PCNs (BRASIL, 1997, P. 37):
Ao realizarem procedimentos de observação e experimentação, os
alunos buscam informações e estabelecem relações entre elementos
dos ambientes, subsidiados por informações complementares
oferecidas por outras fontes ou pelo professor.

Neste contexto, o procedimento de observar é um processo que vai além dos


limites da percepção, ela pode refletir também as ligações e dependências entre os
objetos estudados, suas regularidades gerais e relações internas. De acordo com os
PCNs (BRASIL, 1997, p.79):
A capacidade de observar já existe em cada pessoa, à medida que,
olhando para objetos determinados, pode relatar o que vê. Deve-se
considerar que só são conhecidas as observações dos alunos quando
eles comunicam o que veem, seja por meio de registros escritos,
desenhos ou verbalizações. Mas observar não significa apenas ver, e
sim buscar ver melhor, encontrar detalhes no objeto observado, buscar
aquilo que se pretende encontrar. Sem essa intenção, aquilo que já foi
visto antes — caso dos ambientes do entorno, do céu, do corpo
humano, das máquinas utilizadas habitualmente, etc. — será
reconhecido dentro do patamar estável dos conhecimentos prévios. De
certo modo, observar é olhar o “velho” com um “novo olho”.

Considerar que observar supera a percepção, ou seja, o conhecimento sensorial


envolve habilidades que associam o pensamento à linguagem e, portanto à produção
textual e à comunicação. Para Lemke (1997), as observações são sempre descrições
aplicadas à linguagem de alguma teoria. Santos e Praia (1992) consideram que uma
observação somente é considerada como uma informação científica quando se
caracteriza por uma construção da razão, inserido numa rede de razões, ou seja, tem que
ser vista com os olhos da mente.
Guerra (2011) considera a observação como uma habilidade intelectual geral
fundamental para a independência cognitiva do estudante. Além disso, determina a
qualidade da atividade docente, favorece o desenvolvimento das operações lógicas do
pensamento e constituem uma premissa básica para o desenvolvimento de outras
habilidades.
Para a Academia Brasileira de Ciências, os alunos devem aprender a observar,
bem como tirar conclusões, formular hipóteses e experimentar desde o ensino
fundamental. Para esta entidade (ABC, 2005):
Se os alunos têm boa expressão oral e escrita e se já realizaram
observações da natureza e experimentos na escola, a situação é mais
favorável, permitindo começar desde a 1ª série do ensino médio a
realização de experimentos de laboratório, medições e observações, e
mesmo pequenos projetos experimentais.

Para Lemke (1997, p. 187), os alunos devem entender que existe uma
interdependência entre observação e teoria, a serem críticos com quem defende o os
fatos como absolutos e as evidências como conclusivas e, além disso, reconhecer que
podem coexistir teorias alternativas, já que são utilizadas com diferentes propósitos e
por diferentes pessoas.
A associação entre observação e teoria, representa uma necessidade de se
investir na pesquisa em habilidades cognitivo-linguísticas como descrever (BANDIERA
ET AL, 1995; LEMKE, 1997 e 2006; JORBA ET AL, 1998; PRAIA ET AL, 2002;
EDER e ADURIZ-BRAVO, 2008; GONZÁLEZ e GATICA, 2008; LEVIN ET AL,
2008; NUNEZ e RAMALHO, 2011).
Para Gomes (2009), as habilidades e competências que devem ser estimuladas e
trabalhadas, destacam-se obter informações científicas por meio de atividades de
laboratório; fazer perguntas científicas apropriadas e reconhecer o que está envolvido ao
respondê-las no laboratório através de experimentos e observações; organizar,
comunicar, interpretar e analisar os dados e observações, obtidos através da
experimentação; obter conclusões ou realizar inferências a partir dos dados, observações
e experimentação; reconhecer o papel e as limitações dos experimentos e das
observações no desenvolvimento da ciência.
Bandiera et al (1995) investigaram as habilidades que professores universitários
esperam que os alunos recém ingressantes em cursos de Física e Biologia possuam e
compararam com as capacidade reais de um grupo de alunos ao final do ensino médio,
sendo avaliadas a capacidade de transposição das linguagens matemática, verbal e
gráfica, bem como leituras não elementares de gráficos e utilização de dados empíricos.
Os resultados desse trabalho demonstraram que ao final do ensino secundário, os alunos
estão, em geral, despreparados para lidar com o conhecimento científico.
Lemke (1997) busca dar uma reposta aos problemas que envolvem a
comunicação das ideias científicas em sala de aula. Para este autor, a ciência contém
uma forma específica de linguagem, portanto existe uma forma particular de “falar
ciência” que consiste em utilizar a linguagem científica especializada para dar sentido
ao mundo. De forma mais ampla, a ciência é vista como um processo social, ou seja,
“falar ciência” envolve atitudes, valores e interesses que superam o que é simplesmente
utilitário.
2.6 AS HABILIDADES DE OBSERVAR E DESCREVER NO CONTEXTO
DA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES DE FÍSICA
Atualmente podemos perceber uma grande variedade no conhecimento
pedagógico do professor, quanto as suas concepções acerca do ato de ensinar bem como
sobre a natureza da ciência e o processo que permite seu desenvolvimento. Muitos
trabalhos (DARLING-HAMMOND, 2000; TARDIFF, 2002, GARCÍA, 1992, 2006,
2009, 2012; FURIÓ, 1994; BOLÍVAR e RUANO, 2005; RAMALHO, NÚÑEZ e
GALTHIER, 2004; NÚÑEZ e RAMALHO, 2005, 2008, 2009, 2011; BONAFÉ, 2005;
IMBERNON, 2006, 2009 e 2012; VILCHES e GIL-PÉREZ, 2007; BRICEÑO, 2008;
CARRASCOSA ET AL, 2008; ZEICHNER, 2009; LANGHI e NARDI, 2011)
identificam essa variedade e assumem propostas que buscam uma melhor
conceitualização do que seja a profissionalização da docência, formação da identidade
profissional e o desenvolvimento de saberes docentes profissionais adequados à nova
realidade da escola e da educação.
Para García (2009), existe um grande senso comum pedagógico, que deve ser
mobilizado, com o objetivo de esclarecer e ensinar ao futuro professor a ter uma
reflexão crítica sobre tais crenças, já que estas podem influenciar na metodologia
empregada para aprender a ensinar e na interpretação e valorização que estes farão de
suas experiências na formação.
Carrascosa et al (2008), entendem que a formação inicial do professor em
Ciências Naturais deve ser concebida para colaborar com a transformação do
“pensamento espontâneo” dos licenciandos sobre as questões pedagógicas, concepções
estas que foram construídas durante os anos que foram estudantes na educação básica e
a não existência de iniciativas concretas, acabam levando à reprodução de práticas
inadequadas, vivenciadas por eles mesmos, durante a formação escolar, de forma
acrítica.
Investigar o conhecimento de licenciandos constitui uma estratégia importante
para tomar decisões futuras sobre a formação inicial. Para Daling-Hammond (2000) a
aprendizagem dos estudantes depende, sobretudo, do que os professores conhecem e
podem fazer. Segundo esse autor, para que os estudantes assimilem e desenvolvam
novos conhecimentos, habilidades e atitudes, é necessário que os professores já tenham
desenvolvido essas dimensões do conhecimento para poder ensinar.
Segundo Tardif (2002) não existe iniciativas que promovam uma melhor
preparação e mobilização, na formação inicial da maioria dos professores em áreas
específicas, para desenvolver uma formação inicial adequada à execução do trabalho
docente profissional, como processo embasado em um conjunto de conhecimentos
especializados conectados à área de Educação.

Para acompanhar os desafios que a escola enfrenta neste século, pesquisadores


na área de educação tem proposto mudanças nos formatos de formação inicial e
continuada como uma nova agenda para a pesquisa para a formação docente
(ZEICHNER, 2009) para que seja possível formar o professor e profissionalizar o
ensino (GALTHIER ET AL, 2004) de forma que crianças e adolescentes possam
aprender formal ou informalmente, para atender as novas realidades sociais impostas
pela sociedade do conhecimento (GARCÍA, 2006).

Garcia (2006) aponta uma transformação fundamental no perfil do professor que


deve ser formado nesta sociedade:

O papel do professor deveria mudar de uma autoridade que distribui


conhecimento para um indivíduo que cria e coordena ambientes de
aprendizagem complexos, envolvendo os alunos em atividades
adequadas, de forma que eles possam construir sua própria
compreensão do material de estudo e sejam parceiros no processo de
aprendizagem.

A formação desse profissional converge para as teorias da aprendizagem, as


transformações curriculares, os processos de avaliação e toda a cultura escolar que
envolve a didática de disciplinas específicas como a Física. Apesar disso, ainda é muito
comum vermos críticas ao que no meio acadêmico é chamado de modelo tradicional de
ensino, assim como não é raro encontrar profissionais que pouco se utilizam do
conteúdo didático-pedagógico disseminado nos cursos de licenciatura. Esse fenômeno
demonstra a fragilidade com que as inovações educacionais são transferidas para os
cursos de licenciaturas, em geral, o professor reproduz nas suas aulas o que aprendeu
com seus professores, reflexo de uma formação que valoriza os conteúdos conceituais.

Não defendemos que o professor em formação não deva aprender os conteúdos


escolares tradicionais que vai ensinar, no entanto, ter o domínio deste conteúdo, apesar
de necessário, não é suficiente para se produzir um processo eficiente que envolva
ensino e aprendizagem. Carrascosa et al (2008) enfatiza esse problema afirmando que:

A falta de conhecimentos científicos constitui o principal problema


para que os professores possam desenvolver um ensino de qualidade.
O professor que não possui conhecimentos com certa profundidade da
matéria que ensina, é inseguro, excessivamente dócil em relação ao
livro didático e, consequentemente, com sérias dificuldades para
introduzir qualquer inovação em suas aulas.

A reprodução em sala de aula de uma “física da lousa” com o excesso de


fórmulas e exercícios repetitivos que em nada se parece com o desenvolvimento
histórico e social desta ciência ainda é a realidade de grande parte das escolas brasileiras
de nível médio e representa um dos fatores que torna essa disciplina uma vilã da
reprovação, evasão e falta de motivação dos alunos. Profissionais que têm esse
expediente em seu trato pedagógico utiliza essa estratégia por ser o formato em que têm
mais segurança para fazê-lo, está na sua zona de conforto e por isso, têm dificuldades
para se arriscar em outras iniciativas didáticas.

Núñez e Ramalho (2010) defendem que os professores que ensinam ciências


devem ter uma sólida formação no conhecimento das disciplinas científicas, na didática
das ciências naturais, na sociologia e na história das ciências, que lhes possibilite aplicar
variadas estratégias de ensino, que contribuam para a educação científica dos alunos.

Ensinar Ciências não é apresentar o que a última geração de cientistas


“descobriu” sobre esta área do conhecimento, nem ao menos mostrar as provas
experimentais destas descobertas. É preciso que a ciência seja percebida pelo aluno
como uma atividade humana, permeada por preconceitos, competitividade,
impulsionada por egos e preconceitos e muitas vezes venal (Lemke, 1999).

Os elementos que devem configurar a formação de um profissional em ciência


são requisitos totalmente diferentes dos que devem reunir um profissional que se
dedique a investigação científica, um pesquisador profissional, portanto para se
estruturar o ensino baseado em conhecimentos científicos, é necessário organizar um
plano novo para a preparação dos professores (Talízina, 1986).

Reflexões como estas contemplam a necessidade de se investir na formação e na


profissionalização de um professor de Física que esteja preparado para as exigências de
uma educação em uma sociedade da informação e do conhecimento e para as
necessidades sociais da formação de um indivíduo que não está se preparando apenas
para o acesso ao ensino superior, mas que precisa compreender e se comunicar
utilizando as linguagens da ciência a fim de ocupar o seu lugar neste mundo que está em
constante transformação e cobra das pessoas um maior conhecimento sobre ciência e
tecnologia.

É evidente que o último parágrafo não esgota as necessidades e as expectativas


que a escola tem em relação ao papel do professor. Pretendemos nesse capítulo
explorar, de maneira introdutória quais são algumas dessas necessidades e como elas
podem estar relacionadas às complexas iniciativas de formação e profissionalização do
professor de Física para o ensino médio.

Entendemos a relevância dessa problemática a partir da fala de Oliva (2004):


Do ponto de vista da formação de professores, tem-se investigado
bastante sobre as ideias do professor a respeito do conteúdo
científico, da natureza da ciência e das suas crenças pedagógicas sobre
o ensino de ciência. No entanto, menos esforço tem sido dedicado a
discutir o conteúdo que deve ser tratado na formação de professores
de ciências, que estratégias devem ser utilizadas durante todo o
processo e como se deve avaliar neste contexto.

Esta realidade pode promover um desequilíbrio entre o que e como o professor


deve ensinar e aprender. O importante nessa discussão não é apenas aumentar as
possibilidades de formação, ampliar a quantidade de vagas em cursos de licenciatura e
formação continuada e sim realizar um salto qualitativo a respeito da formação do
professor e como este profissional, egresso de uma licenciatura pode transformar sua
prática pedagógica para se adaptar a uma nova realidade de educação e sociedade.

Não se trata de fazer mais do mesmo, de reproduzir discussões que foram


realizadas no último século e que quase nunca representaram uma transformação efetiva
da escola e de seus professores. É necessário pensar em um planejamento que promova
uma melhor associação entre a pesquisa em ensino de Física e a formação docente com
a própria práxis da formação e com a busca do professor por uma identidade
profissional em um mundo globalizado.

É necessário buscar alternativas sérias que não relativizem os conhecimentos


específicos e que permita a formação de um profissional capaz de inovar, transformar e
selecionar os conteúdos bem como simplificar sem gerar ou transmitir erros graves para
os alunos e não ser um simples repetidor mecânico dos livros didáticos
(CARRASCOSA ET AL, 2008).

Os cursos de formação inicial devem preparar o futuro professor para "saber


ensinar ciência" e para o nosso caso específico “ensinar física”, ou seja, a formação
deve abarcar o desenvolvimento, condução e avaliação de estratégias de ensino que
promovam o aprendizado. Saber ensinar, em nosso entendimento, implica ter o domínio
de conceitos básicos, procedimentos e atitudes que compõe os documentos curriculares
que gerenciam a escola, bem como os conhecimentos específicos que integram sua área
de conhecimento.

García (2009) faz uma análise crítica de relatórios internacionais sobre ensino e
políticas educacionais destacando pontos negativos na implantação de reformas
curriculares. Neste trabalho, procura-se de uma maneira sutil mostrar, entre outras
coisas, o contrassenso que é apresentar ao professor o que ele deve fazer em pacotes
prontos ao mesmo tempo em que se prega a criatividade e autonomia deste profissional.
Segundo este autor:

[...] as evidências dos relatórios internacionais mostram que as


políticas de reforma educacional executadas em muitos países
deterioraram as condições de trabalho dos docentes, causando
desmoralização, abandono da profissão e absentismo, tendo, tudo isso,
um impacto negativo na qualidade da educação que se oferece aos
alunos.

Em relação à formação de professores entendemos que o desenvolvimento profissional


e consequentemente a formação de uma identidade, ocorre em várias dimensões.
Aprender sobre inovações curriculares implica que o profissional associe o novo
conhecimento a essas dimensões a partir do fenômeno da contradição dialética e,
portanto o conhecimento construído por este pode sofrer alterações mantendo as
características de sua identidade que não entraram em contradição com as novas
informações.

Diante do quadro problemático que apresentamos concluímos que, de acordo


com a revisão apresentada, a formação inicial do professor de Física para o nível médio
não ensina o professor a formar às habilidades de observar e descrever em atividades
práticas experimentais como habilidades articuladas na produção de textos descritivos.
Esta situação contribui com o fato de que o professor ensina, depois de formado, como
aprendeu na educação básica, reproduzindo práticas muito criticadas pelas concepções
atuais de ensino e aprendizagem.
3 A FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES DE FÍSICA COMO
RECURSO ESTRATÉGICO PARA A PROSISSIONALIZAÇÃO DOCENTE

Nos dias atuais, cresce o interesse pela busca de uma formação inicial para o
professor de Física do ensino médio que seja capaz de mobilizar, nesses estudantes, a
apropriação de competências e habilidades referenciadas nas bases teóricas que
fundamentam a Didática das Ciências. Esta formação possui um papel de destaque
como primeira etapa de sensibilização e preparação do futuro profissional de educação,
na assimilação de habilidades e competências necessárias não apenas para sua
aprendizagem, como para desenvolver estratégias didáticas que propiciem o ensino
desta disciplina no nível médio de ensino.

3.1 A FORMAÇÃO INICIAL DO PROFESSOR DE FÍSICA

A evolução do Ensino de Ciências como comunidade científica permitiu o


desenvolvimento de uma extensa literatura que inclui as concepções dos professores de
Física sobre o ensino dessa disciplina no ensino médio, incluído temas como quais
conteúdos ensinar, a natureza da ciência, aprendizagem dos alunos, embora haja uma
menor iniciativa sobre o que ensinar nos curso de formação inicial de professores de
ciências, que estratégias são mais convenientes nesse processo e como avaliar esse
contexto (OLIVA, 2005).
Numa perspectiva mais geral, Marcelo (1992) faz uma análise da formação
inicial do professor para o ensino médio articulada com o modelo de profissional que
detém determinados conhecimentos, habilidades, atitudes e disposições próprias para
atuar neste nível de ensino. Para esse autor algumas premissas devem ser satisfeitas para
que este intento seja possível:

a) Qualquer reforma na formação inicial de professores tem de considerar que


modelo de profissional da educação deseja-se formar.
b) Este modelo de profissional tem que ser especificado em relação aos
conhecimentos, habilidades e atitudes que deve possuir nas diferentes áreas
disciplinares.
c) O conhecimento do professor é construído na interação com o ambiente de
aprendizagem que proporciona a formação de professores.
d) Existem diferentes níveis de análise do conhecimento profissional dos
professores que é necessário saber para desenvolver no professor em
formação.
e) As diferentes disciplinas ou especialidades incorporam estruturas de
conhecimento específicas que devem ser conhecidos pelos professores.
f) O conhecimento sobre o conteúdo de uma disciplina é insuficiente para um
ensino que procura ensinar os alunos a compreender, assimilar e desenvolver-
se.
g) É importante prestar mais atenção, conceitualmente e empiricamente, à
maneira que os professores "transformam" o conhecimento que possuem da
matéria em conhecimento "ensinável" e compreensível para os alunos.

No Brasil, a última reforma curricular associada aos cursos de licenciatura em


Física é legalmente conduzida pela Resolução CNE/CES 9, de 11 de março de 2002 que
regulamenta as Diretrizes Nacionais Curriculares para os cursos de Física (BRASIL,
2001) e institui ao egresso dos cursos de Física, independente da área de atuação, o
seguinte perfil geral:

O físico, seja qual for sua área de atuação, deve ser um profissional
que, apoiado em conhecimentos sólidos e atualizados em Física, deve
ser capaz de abordar e tratar problemas novos e tradicionais e deve
estar sempre preocupado em buscar novas formas do saber e do fazer
científico ou tecnológico. Em todas as suas atividades a atitude de
investigação deve estar sempre presente, embora associada a
diferentes formas e objetivos de trabalho.

As diretrizes supracitadas denomina o profissional físico oriundo de um curso de


licenciatura como físico-educador cujo perfil específico deve superar o perfil das
antigas licenciaturas, que estavam apenas orientadas para o Ensino Médio Formal. De
acordo com o parecer (BRASIL, 2001), o físico-educador:

[...] dedica-se preferencialmente à formação e à disseminação do


saber científico em diferentes instâncias sociais, seja através da
atuação no ensino escolar formal, seja através de novas formas
de educação científica, como vídeos, “software”, ou outros
meios de comunicação.

O profissional egresso de uma licenciatura em Física deve desenvolver algumas


competências essenciais durante sua formação inicial para atender a diversidade de
atividades que pode desenvolver como profissional de educação. As Diretrizes
Nacionais Curriculares para os Cursos de Física (BRASIL, 2001) definem essas
competências como:

i. Dominar princípios gerais e fundamentos da Física, estando familiarizado


com suas áreas clássicas e modernas.
ii. Descrever e explicar fenômenos naturais, processos e equipamentos
tecnológicos em termos de conceitos, teorias e princípios físicos gerais.
iii. Diagnosticar, formular e encaminhar a solução de problemas físicos,
experimentais ou teóricos, práticos ou abstratos, fazendo uso dos
instrumentos laboratoriais ou matemáticos apropriados.
iv. Manter atualizada sua cultura científica geral e sua cultura técnica
profissional específica.
v. Desenvolver uma ética de atuação profissional e a consequente
responsabilidade social, compreendendo a Ciência como conhecimento
histórico, desenvolvido em diferentes contextos sócio-políticos, culturais
e econômicos.

No estabelecimento de conhecimentos, habilidades e atitudes, estas


competências essenciais, que não são apresentadas apenas como características para o
físico-educador, mas também para as outras modalidades profissionais da área
(pesquisador, tecnólogo e interdisciplinar), expõem de maneira mais específica,
conhecimentos de natureza conceitual (i) específico da área do conhecimento,
procedimental (ii e iii) associados às habilidades que devem ser formadas e atitudinal
(iv e v) com um foco maior na forma como o profissional deve reagir na vivência do seu
ser com o mundo que o rodeia.

Para haver uma razoável articulação entre essas dimensões do conteúdo,


pesquisadores em ensino de ciências atingiram, há algum tempo, um elevado consenso
sobre a necessidade de modificar as estratégias de ensino fundamentadas na simples
metodologia da transmissão e recepção dos conhecimentos conceituais por outras em
que a orientação da aprendizagem seja feita por uma investigação dirigida, favorecendo
a participação ativa dos estudantes na reconstrução destes conhecimentos (VILCHES e
GIL-PÉREZ, 2008).

Uma formação científica séria permite que o professor seja inovador, supere a
condição de mero repetidor mecânico dos conteúdos do livro didático, e modifique sua
prática pedagógica, selecionando acertadamente os conteúdos que serão abordados,
simplificando-os sem produzir e transmitir erros graves aos estudantes (CARRASCOSA
ET AL, 2008).
As diretrizes nacionais curriculares para os cursos de Física estabelecem também
habilidades específicas que devem necessariamente estar incluídas nas estratégias de
formação inicial que compõem os cursos de licenciatura. São elas (BRASIL, 2002):

 Planejar e desenvolver diferentes experiências didáticas em Física,


reconhecendo os elementos relevantes às estratégias adequadas.
 Elaborar ou adaptar materiais didáticos de diferentes naturezas, identificando
seus objetivos formativos, de aprendizagem e educacionais.

De acordo com a resolução discutida aqui (BRASIL, 2001) as demais


habilidades e competências específicas devem ser elaboradas pelas próprias Instituições
de Ensino Superior (IES), conferindo a estas últimas toda a autonomia para, a partir das
diretrizes, construir o conteúdo curricular levando em consideração as exigências dos
mercados nacionais e locais. Apesar desta autonomia, estas diretrizes apontam também
vivências essenciais para que o processo de formação possa acontecer de maneira mais
integrada, como por exemplo, ao final da formação, o egresso deve ter realizado
experimentos em laboratórios; tido experiência com o uso de equipamento de
informática; feito pesquisas bibliográficas para identificar e localizar fontes de
informação relevantes; entrado em contato com ideias e conceitos fundamentais da
Física e das Ciências através da leitura de textos básicos; tido a oportunidade de
sistematizar seus conhecimentos e seus resultados em um dado assunto através de, pelo
menos, a elaboração de um artigo, comunicação ou monografia e; participado da
elaboração e desenvolvimento de atividades de ensino.

A realidade da formação de professores que se prepara para as demandas sociais


e educacionais do século XXI tem que está atenta para que o professor aprenda a
ensinar para uma sociedade do conhecimento (MARCELO, 2009). Esta situação requer
uma maior articulação entre as pesquisas em Educação e Ensino de Ciências com a
prática profissional em sala de aula. Para ZEICHNER (2009):

Há ampla concordância de que a pesquisa sobre formação


docente tem tido muito pouca influência na definição de
políticas e na prática em cursos de formação de professores.
Tanto os formadores de professores quanto os gestores
empreendem seu trabalho de delinear e aperfeiçoar políticas e
cursos sem muita consideração [...] a outras instituições ou à
literatura de pesquisa.
Zeichner (2009) apresenta uma revisão sobre a necessidade de pesquisa
educacional na área de formação docente nos Estados Unidos, cujo objetivo
fundamental é aproximar a comunidade científica dos professores formadores e gestores
das instituições para que haja maior comunicação no trato das preocupações mais
profundas sobre a formação de professores para as escolas daquele país. Este autor
propõe uma nova agenda de pesquisa para a área de forma que atendam os seguintes
critérios:

a) Definição clara e consistente de termos;


b) Descrição completa da coleta de dados e métodos de análise e dos contextos
onde a pesquisa é realizada;
c) Pesquisas situadas em relação a relevantes referenciais teóricos;
d) Desenvolvimento de mais programas de pesquisa;
e) Maior atenção ao impacto da formação docente sobre a aprendizagem e práticas
dos professores;
f) Pesquisas que liguem a formação docente ao aprendizado do aluno;
g) Portfólio completo dos estudos, que inclui abordagens multidisciplinares e
multimetodológicas para investigar as complexidades da formação docente;
h) Desenvolvimento de melhores medidas do conhecimento e desempenho do
professor;
i) Pesquisas que examinem a preparação do professor em diferentes conteúdos
além de Matemática e Ciências e, ao levarem em conta os assuntos ensinados,
investiguem os efeitos dos cursos de formação docente e de seus componentes;
j) Análise mais sistemática das alternativas claramente identificáveis na formação
docente, usando controles compatíveis ou testes aleatórios como estudos
distintos ou em associação com estudos de caso em profundidade;
k) Mais estudos de caso minuciosos sobre cursos de formação docente e seus
componentes.

A proposta de uma nova agenda para a pesquisa na formação de professores


proposta por Zeichner (2009) demonstra uma preocupação crescente em investir na
melhoria da qualidade das investigações desta área. Nessa perspectiva, Carrascosa et al
(2008) atribui ao professor de ciências, além de um profundo conhecimento do
conteúdo, possuir conhecimentos que fazem parte do corpo teórico da Didática das
Ciências, se aproximando das principais linhas de investigação desde o início de sua
formação. Esses conteúdos científicos são:

• Saber dirigir o trabalho com os alunos e como conseguir manter um clima


adequado em sala de aula.

• Saber como avaliar não apenas os alunos mas também o trabalho e o


comportamento do professor em sala de aula, analisando os resultados com o propósito
de melhorar os processos de ensino e aprendizagem.

• Saber selecionar os conteúdos mais adequados e dominar critérios para


justifica-los e sequenciá-los.

• Saber que é possível aumentar o interesse dos alunos pela ciência.

A Física, assim como outras áreas possui uma estrutura própria para desenvolver
o conhecimento. O primeiro desafio para um licenciado em Física poder desenvolver
sua atividade docente está no domínio do conhecimento específico desta área do
conhecimento que deve ser percebido como condição necessária mas não suficiente para
compor o conhecimento profissional.

3.2 SABERES DOCENTES

Conhecer profundamente o conteúdo específico a ensinar é complexo e envolve


diversos conhecimentos profissionais como os listados a seguir, segundo Carrascosa et
al (2008):

 Ter conhecimentos sobre a história das ideias científicas, úteis para contribuir
com uma melhor abordagem do assunto e os problemas que produziram a
construção do conhecimento científico, como esses conhecimentos se articulam
e quais são os obstáculos epistemológicos para a compreensão por parte dos
alunos.
 Conhecer as estratégias metodológicas empregadas na construção dos
conhecimentos, ou seja, a forma como os cientistas abordam os problemas, as
características de maior destaque na atividade científica, os critérios de aceitação
e validação das teorias científicas, dentre outros procedimentos.
 Conhecer as interações existentes entre ciência, tecnologia, sociedade e meio
ambiente, associadas à construção do conhecimento científico, sem ignorar o
papel social da ciência e a complexidade que envolve tomada de decisões sobre
o tema.
 Ter algum conhecimento do desenvolvimento científico e tecnológico recente
assim como de perspectivas futuras, para poder transmitir uma visão dinâmica e
aberta da ciência.
 Adquirir conhecimentos de áreas relacionadas com a disciplina específica, não
completamente, mas para garantir a abordagem de problemas que envolvem
mais de uma disciplina curricular e relacionar esses conteúdos.
 Saber selecionar conteúdos adequados, para dar uma visão correta da ciência,
acessíveis aos alunos e direcionados e capazes de despertar interesse.
 Estar preparado para aprofundar e adquirir novos conhecimentos, em particular
compreender o significado físico dos conceitos que serão ensinados e ser capas
de em primeiro lugar explica-los qualitativamente.

Segundo Mellado, Blanco e Ruiz e (1999) professores em formação iniciam seus


estudos universitários dotados de conhecimentos, concepções, atitudes e roles sobre
ciência e o processo de ensino e aprendizagem que precisam ser refletidas durante a
formação inicial. Esta reflexão se faz necessária, mas não suficiente no processo de
apender a ensinar ciência já que a prática deste futuro professor pode não corresponder
aos saberes desenvolvidos. Esses autores associam a componente acadêmica estática
dos cursos de formação com a componente dinâmica do desenvolvimento profissional.
As competências descritas anteriormente, como componentes do conhecimento
profissional, demonstram uma semelhança com as dimensões do conteúdo, que deve ser
dominado pelo professor, propostas por Shulman (1986), que corresponde às categorias
conhecimento específico do conteúdo, conhecimento pedagógico do conteúdo e
conhecimento curricular. Numa ampliação deste trabalho, Shulman (1987) indica que o
profissional de educação que se dedica à docência, desenvolve pelo menos sete
categorias de conhecimento profissional. Fazendo uma leitura crítica dessas categorias,
adaptando à realidade do ensino de Física, podemos resumi-las da seguinte maneira:

 Conhecimento do conteúdo: tradicionalmente, esse é o conhecimento mais


explorado, trata-se do conhecimento disciplinar específico, disseminado nos
tradicionais manuais didáticos. Para superar os aspectos mais tradicionais do
desenvolvimento desse conhecimento que, grosso modo, se caracterizam
pelas estratégias de transmissão e recepção, a formação inicial pode contribuir
a partir de métodos que permitam a atualização dos conteúdos escolares a
partir de uma transposição adequada não dos conteúdos de Física clássica
mais das novas descobertas científicas que transformaram nossa sociedade no
último século.
 Conhecimento pedagógico geral: são referências teóricas utilizadas para
justificar, planejar, executar e avaliar a prática pedagógica. Orientam a
complexidade da aprendizagem de conteúdos científicos a partir de
pressupostos gerais da didática e da psicologia e consiste em um forte aliado
para direcionar os objetivos e as finalidades do ato de ensinar Física no
ensino médio.
 Conhecimento curricular: estruturado pelo domínio de como o conteúdo
disciplinar é orientado pelo projeto pedagógico escolar e as diversas
instâncias institucionais que gerem a educação. No Brasil, existem
orientações curriculares nacionais que representam cujo estudo deve fazer
parte dos programas das licenciaturas como ferramenta essencial para o
trabalho docente.
 Conhecimento dos estudantes e suas características: O nível de
heterogeneidade e diversidade presente na escola do século XXI exige do
professor uma maior atenção para administrar necessidades, interesses e
aspirações individuais com as dimensões coletivas que se apresentam em sala
de aula. Em disciplinas como a física, a pouca articulação entre teoria e
prática e a dificuldade de se adaptar a linguagem específica da disciplina pode
afastar os estudantes que não sintam “aptidão” para esse conteúdo,
demandando do professor estratégias de ensino e aprendizagem a partir destra
realidade.
 Conhecimento dos contextos: conhecimento da escola, da comunidade e das
questões sociais que envolve a realidade dos alunos, suas perspectivas e todas
as dimensões que podem ou não se associar ao ensino da disciplina.
 Conhecimento dos fundamentos, objetivos, fins e valores educacionais: Estra
dimensão presta atenção especial à especificidade do nível de ensino em que
o profissional está inserido, para o nosso caso em particular, o ensino de
Física no ensino médio como parte integrante da educação básica.
 Conhecimento pedagógico do conteúdo: corresponde ao conteúdo científico
corretamente transformado em objetos de ensino. São incluídos, nessa
dimensão do conhecimento, estratégias específicas de ensino como, por
exemplo, a experimentação, demonstrações, alfabetização científica, entre
outros. Para Núñez (2012), essa categoria de saber é considerada como um
elemento essencial que distingue um especialista do professor de Física.

Esse conhecimento profissional é, em geral, produzido como resultado da


justaposição de quatro tipos distintos de saberes desenvolvidos pelo profissional, em
situações nem sempre coincidentes e por isso, estão isoladas uma das outras na memória
dos sujeitos e são expressos em diferentes tipos de situações profissionais ou de
formação profissional (PORLÁN, RIVERO e MATÍN DEL POZO, 1997). As
dimensões do conhecimento para esses autores são:

 Saberes acadêmicos – conjunto de concepções disciplinares e


metadisciplinares desenvolvidas pelos professores a partir dos conteúdos
escolares tradicionais, do conhecimento psicopedagógico e didático e
saberes epistemológicos (conhecimento e suas relações com a realidade).
 Saberes baseados na experiência - conjunto de ideias conscientes
desenvolvidas pelos professores durante o exercício profissional sobre os
diferentes aspectos dos processos de ensino e aprendizagem tais como a
aprendizagem dos alunos, a metodologia, a natureza dos conteúdos, o
papel do planejamento, as finalidades e objetivos desejáveis, entre
outros.
 Rotinas e scripts de ação – referem-se ao conjunto de esquemas tácitos
que predizem o curso imediato dos acontecimentos na sala de aula e da
forma padrão de lidar com eles.
 As teorias implícitas - um conjunto de supostos implícitos, de ordem
epistemológica, ontológica e conceitual, que podem explicar o porque
das crenças e atitudes profissionais, associadas à categorias teóricas
externas, embora os professores, em geral, não tenham consciência das
relações entre sua prática e estas teorias.

Estes conhecimentos, cuja articulação é mostrada no esquema da figura ???, são


dependentes de uma relação dialética entre níveis racional e empírico, bem como entre
os níveis explícito e tácito.
As diversas dimensões do conhecimento profissional nos leva à reflexão de que
formação de um professor de ciências no geral e de Física em particular, supera a
expectativa de que o futuro docente “aprenda a ensinar” apenas o corpo conceitual da
disciplina.
Para Tardif (2000) o saber docente é um conhecimento plural, constituído de
diferentes saberes advindos das escolas de formação profissional, dos currículos e da
prática cotidiana. No contexto da formação inicial do professor de Física, é possível
incluir essas três fontes de saberes, principalmente em disciplinas que envolvem o
conhecimento pedagógico específico como Instrumentação para o Ensino de Física,
Prática de Ensino de Física ou nos Estágios Supervisionados.
Os conhecimentos docentes como saberes da atividade profissional, associados à
formação, segundo Tardif (2000) são:
 Saberes da formação profissional: científicos e eruditos, estes são transmitidos
durante o processo de formação, incluindo conhecimentos pedagógicos e os
métodos de ensino específicos da disciplina.
 Saberes disciplinares: relativos a cada área específica, produzidos historicamente
pela comunidade científica.
 Saberes curriculares: são associados à maneira como os conhecimentos
construídos socialmente serão trabalhados na escola. Esta categoria é geralmente
administrada pelas instituições educacionais e são convertidos em documentos
orientadores como projeto pedagógico e orientações curriculares
 Saberes experienciais: resultado do exercício da atividade profissional, é a
experiência do docente em sua vivência cotidiana.

A utilização de práticas experimentais no Ensino de Física e o investimento na


formação de habilidades cognitivo-linguísticas de observar, descrever e explicar devem
ser articulados às concepções atuais de saberes docentes necessários à atuação
profissional do docente nessa disciplina. As competências e habilidades necessárias para
o desenvolvimento desse conhecimento na formação inicial do professor devem ser
identificadas e planejadas como recursos formativos dessa formação, permitindo ao
licenciando o contato com os diversos saberes profissionais ainda no período de
aprendizagem.
4 ATIVIDADE E COMUNICAÇÃO NA APRENDIZAGEM E FORMAÇÃO
DAS HABILIDADES DE OBSERVAR E DESCREVER CONFORME A
TEORIA DA ASSIMILAÇÃO POR ETAPAS DE P. YA. GALPERIN

As dificuldades apresentadas pelo Ensino das Ciências Naturais, na escola atual,


principalmente as que estão associadas aos problemas com a aprendizagem, bem como
na lida com aspectos emocionais e comportamentais dos alunos são assuntos correntes
para os gestores, professores e pesquisadores em educação. Nos últimos anos, essa
preocupação tem ultrapassado os limites do ensino fundamental, sinalizando sobre a
importância de estudos acerca da aprendizagem científica de adolescentes, jovens e
adultos que cursam o nível médio de ensino ou mesmo a formação inicial de
professores.
Em resposta a esse problema, as soluções propostas por ministérios, secretarias e
instituições educacionais em geral, são muito genéricas e, por esse motivo, não estão
configuradas para avançar em opções de ensino que permitam resolver tais problemas e
reavaliar os atuais programas e metodologias de ensino. Apesar de um relativo
progresso nas últimas décadas, encontramos uma quantidade reduzida de propostas
realmente inovadoras e criativas, na esfera da Didática das Ciências Naturais que
integrem ensino, aprendizagem e desenvolvimento integral.
As críticas aos modelos tradicionais e, mais recentemente, às ideias
construtivistas que envolvem aprendizagem por mudança conceitual levaram-nos a uma
investigação do paradigma histórico-cultural da aprendizagem, como ramo da
psicologia que teve como primeiras contribuições as pesquisas de L. S. Vygotsky
realizadas na primeira metade do século XX. Os trabalhos de Vygotsky representaram
uma referência para o entendimento do ensino e aprendizagem integrados como um
processo único em que o conhecimento científico, incialmente social, é assimilado ou
apropriado pelo aluno em um processo de internalização. Neste aspecto presta-se uma
grande atenção à comunicação como intercâmbio de pensamentos, sentimentos e
emoções.
Muitos pesquisadores tais como A. N. Leontiev, P. Ya. Galperin, N. F. Talízina
e V. V. Davidov desenvolveram bases teóricas capazes de estruturar uma proposta
psicopedagógica para o processo de ensino e aprendizagem integrado a partir da Teoria
da Atividade. Em especial, a Teoria da Assimilação por Etapas, de P. Ya. Galperin
caracteriza-se pela importância que tem a orientação no processo educativo, a partir do
entendimento que as possibilidades cognitivas dos alunos não são inatas, se formam
durante a atividade escolar e, portanto, devemos identificar as condições que garantam a
formação de capacidades cognitivas (TALÍZINA, 2009; p. 24).
O trabalho de P. Ya. Galperin e seus colaboradores representa uma contribuição
muito significativa para os estudos psicológicos e pedagógicos realizados no contexto
educacional da economia planificada soviética, com base nos pressupostos teóricos do
materialismo histórico-dialético, escola filosófica que caracterizou o marxismo-
leninismo. Além disso, suas pesquisas estiveram em consonância com a teoria da
atividade desenvolvida por A. N. Leontiev e o conceito de internalização dos conceitos
científicos introduzidos por L. S. Vygotsky, as quais possuem uma grande influência,
não apenas na psicologia soviética mais também no desenvolvimento de uma teoria
histórico-cultural da aprendizagem, com muita inserção na área educacional.
O ponto central das investigações deste notável psicólogo da Escola de Jarkov3
consiste no desenvolvimento de uma teoria capaz de explicar os processos de
aprendizagem como internalização da atividade social externa em ações mentais do
indivíduo, ou seja, na capacidade de realizar mentalmente uma ação. Esse processo,
estudado inicialmente por Vygotsky, foi ampliado por Galperin e seus colaboradores, na
investigação experimental das etapas sucessivas e das condições para uma
aprendizagem dirigida e orientada para uma finalidade, de forma não espontânea, das
ações externas em ações mentais (LEONTIEV, 1978, p. 77).
Galperin avançou de maneira significativa no aspecto executor da aprendizagem,
com ênfase na formação de habilidades intelectuais, no entanto, estabeleceu poucas
conexões com o aspecto indutor, o qual sofre interferências dos componentes
emocionais e afetivos da atividade humana e se constitui como forte aliado na formação
da personalidade.
Neste capítulo, apresentamos, desde a teoria da assimilação por etapas de P. Ya.
Galperin, os construtos fundamentais no processo de formação e desenvolvimento de
habilidades a partir das categorias psicológicas atividade e comunicação e sua
importância na aprendizagem, com as devidas considerações sobre a habilidade
cognitivo-linguística de descrever em atividades práticas experimentais no processo de
formação inicial de professores de Física para o Ensino Médio.

3
Cidade ucraniana que originou notáveis psicólogos marxistas como Vygotsky, Luria, Leontiev e
Galperin cujos trabalhos na área de psicologia tiveram grande influência na União Soviética e no
desenvolvimento do paradigma histórico cultural e na teoria da atividade.
4.1 A APRENDIZAGEM SEGUNDO A ESCOLA HISTÓRICO-CULTURAL E A
TEORIA DA ATIVIDADE
As teorias da aprendizagem são atualmente uma contribuição significativa de
notáveis pensadores, em grande parte, psicólogos, os quais viveram principalmente no
século XX e tiveram sua obra reconstruída por pesquisadores em Didática e Educação
para o contexto da aprendizagem na escola. Fazemos aqui uma breve discussão de parte
dessas teorias confrontando com os pressupostos histórico-culturais aprimorados pela
Teoria da Assimilação por Etapas de P. Ya Galperin e seus colaboradores.
A aprendizagem é uma categoria teórica que vem sendo estudada e desenvolvida
por várias áreas do conhecimento como a psicologia, a sociologia, a neurociência e a
pedagogia. Apesar de existir certa diversidade de significados, as distintas áreas do
conhecimento que tratam desse assunto assumem que “o ato de aprender” acontece no
estabelecimento de novas relações entre o ser e o meio ambiente, seja ele físico ou
social. Para a neurociência, por exemplo, uma das definições de aprendizagem envolve
a integração de toda a informação percebida e processada, produzindo modificações
estruturais biológicas no interior do cérebro, causadas por transformações microscópicas
que deixam uma “presença” física de sua passagem (OCDE, 2005).
Na primeira metade do século XX, a psicologia se desenvolvia na busca de um
objeto específico de estudo que a caracterizasse como área específica do conhecimento
científico. Galperin (1979) identifica inconsistências dos modelos biologistas, os quais
estabelecem a conduta como objeto da psicologia e assume suas ideias a partir da
reflexão crítica de uma grande quantidade de trabalhos empíricos realizados com
animais, principalmente nos Estados Unidos, que tiveram como foco a descrição da
observação das respostas dadas por estes quando eram submetidos a estímulos externos
controlados. Segundo Galperin (1979):
[...] passaram a uma descrição sistemática do comportamento
dos animais em situações experimentais, nas quais estes deviam
resolver diferentes tarefas, como por exemplo: aprender a abrir
janelas, encontrar o caminho em um labirinto para a comida ou a
saída, vencer obstáculos utilizando diferentes meios, etc.
Nestes experimentos as tarefas mudavam conforme a complexidade do
comportamento desejado, provocando nos animais variadas atividades e necessidades,
sendo possível, por exemplo, estimular ou não o desenvolvimento de um órgão dos
sentidos. Quanto a isso, Galperin (1979) complementa:
A dependência da conduta animal das diferentes condições de
aprendizagem podia ser descrita objetivamente sem a
necessidade de conjecturas e especulações sobre o que pensa,
quer ou sente o animal. O material era numeroso, variado e
interessante e parecia que se havia encontrado o caminho
objetivo de estudo que era indiscutivelmente psicológico e
essencial para a psicologia.
A aprendizagem, na perspectiva criticada por Galperin e a teoria da atividade,
torna-se um tema fundamental para a psicologia condutista ou behaviorista, o que lhe
confere o status de uma teoria psicopedagógica. Ela se processa em virtude das diversas
experiências que abarcam fundamentalmente inter-relações com o contexto, em suas
unidades mais elementares e fundamentais, produzindo novas respostas ou modificando
as que já existem.
Todo processo de aprendizagem, para essa teoria, tem suas bases e é sintetizado
no tripé estímulo-resposta-reforço, ou seja, a preocupação está centrada em prever a
resposta quando se conhece o estímulo e identificar o estímulo quando se conhece a
resposta (NÚÑEZ E FARIA, 2004). Nesta perspectiva, o maior expoente do
behaviorismo, B. F. Skinner (1974) escreve sobre o objetivo da educação:
[...] o objetivo da educação pode ser expresso em termos
comportamentais: um professor planeja contingências nas quais
o aluno adquirirá comportamento que lhe será útil mais tarde,
em outras contingências. As contingências instrutivas devem ser
planejadas; não há outra solução. O professor não pode trazer
para a sala de aula o bastante da vida real do aluno para
construir um comportamento apropriado às contingências que
ele encontrará ulteriormente. Os comportamentos a serem
construídos antecipadamente são tanto uma questão de
pensamento produtivo e de criatividade quanto de simples fatos
e habilidades.
No ambiente educacional e de ensino, é comum associar o condutismo ou
behaviorismo com o ensino tradicional, tão criticado por acadêmicos, professores,
gestores educacionais e até leigos no assunto, no entanto, é importante citar que a
pedagogia tradicional possui suas bases em práticas educativas que se fundamentam na
tradição (NÚÑEZ e FARIA, 2004) e por isso não faz sentido falar em uma única forma
para essa pedagogia (POZO e CRESPO, 1998).
Em relação ao nosso objeto de estudo, o trabalho experimental, o ensino
tradicional trata como uma forma de motivar os alunos para o conhecimento que será
transmitido pelo professor ou comprovar esses conhecimentos (NÚÑEZ e FARIA,
2004), ou seja, mostrar como os conhecimentos teóricos acontece na prática, com uma
forte tendência à práticas empiristas (LABURÚ, 1998).
Há pouco espaço para o desenvolvimento e formação de habilidades gerais já
que o conhecimento científico pode ser aprendido pela memorização e repetição de
exercícios. Valoriza-se mais o conhecimento conceitual, específico da disciplina, que é
transmitido verbalmente, reforçado em exercícios repetitivos e testados ao final em um
controle avaliativo que geralmente é chamado de “prova”.
O desenvolvimento de uma sociedade onde mais pessoas tem acesso à escola e a
informação circula com uma grande velocidade traz novos desafios para o ensino e a
aprendizagem na escola básica, os quais já foram discutidos como parte do
desenvolvimento do nosso problema. Via de regra, a escola tradicional não tem atendido
a essas provocações movidas pela sociedade do conhecimento o que nos conduz a
investigar teorias da aprendizagem que possam fazer frente a essas demandas.
Em paralelo ao behaviorismo, se desenvolveu na antiga União Soviética, a partir
dos anos de 1920, uma escola de psicologia que desenvolveu o conceito de atividade
como elemento que media a relação do homem com o mundo que o cerca. Esta escola
fundada por L. S. Vygotsky assume que a aprendizagem humana é a transformação do
conhecimento de conceitos e habilidades que inicialmente é externo e, portanto, social
em uma estrutura mental do indivíduo, por meio da atividade, na qual a fala e sua
unidade genética, a palavra, são decisivas nesse processo.
Um representante notável desta escola foi A. N. Leontiev. Em obras como
Atividade, Consciência e Personalidade (LEONTIEV, 1978) e O Desenvolvimento do
Psiquismo (LEONTIEV, 2004), apresentou a aprendizagem como um tipo de atividade
que apesar de existir, até em certa medida, também nos animais, na raça humana tem
uma característica peculiar. Segundo este autor (LEONTIEV, 2004):
A principal característica do processo de apropriação ou de
“aquisição” que descrevemos é, portanto, criar no homem
aptidões novas, funções psíquicas novas, é nisto que se
diferencia do processo aprendizagem dos animais. Enquanto
este último é resultado de uma adaptação individual do
comportamento genérico a condições de existência complexas e
mutantes, a assimilação no homem é um processo de
reprodução, nas propriedades do indivíduo, das propriedades e
aptidões historicamente formadas na espécie humana.
O domínio da natureza e sua assimilação pelo ser humano são processos que
derivam das aptidões humanas superiores. No ponto de vista da teoria da atividade, esta
assimilação é o processo de aquisição humana, das experiências históricas de sua
espécie, mas não só a experiência evolutiva de seus ancestrais, mas principalmente a
experiência sociocultural das gerações precedentes, dos produtos da atividade social
objetivado na cultura. Este processo acontece em um meio social em ativa interação
mútua entre os indivíduos, mediante formas de cooperação e comunicação.
Para uma melhor compreensão deste fenômeno é preciso entender a atividade
humana como o processo que media a relação entre o sujeito (homem) e a realidade a
ser transformada por ele (objeto) (LEONTIEV, 1983), ou seja, a atividade é o modo
especificamente humano, pelo qual o homem se relaciona com o mundo (NÚÑEZ,
2009). Leontiev (1989) define atividade como:
Uma unidade molar não aditiva da vida do sujeito corporal e
material. Num sentido mais estreito, ou seja, ao nível
psicológico, esta unidade da vida é mediada pelo reflexo
psíquico, cuja função real consiste em que este orienta o sujeito
no mundo dos objetos. Em outras palavras, a atividade não é
uma reação, e sim um sistema que possui uma estrutura, passos
internos, um desenvolvimento.
Conforme aponta Núñez (2009), a aprendizagem como processo de assimilação
da experiência historicamente acumulada pelo ser humano e sintetizada pelos conteúdos
escolares estabelece, a formação das capacidades especificamente humanas, cujas
características são:
 É um processo ativo por parte do sujeito. Para assimilar o conteúdo escolar
como o produto da atividade humana, é necessário realizar uma atividade
adequada àquilo que corresponde ao produto dado.
 É um processo que cria novas premissas para o posterior desenvolvimento da
atividade e cria uma nova capacidade ou função em condições mediadas pelas
relações com os outros e os objetos culturais.
Apesar de promover a atividade como processo que internaliza o conhecimento
social em mental, Leontiev não desenvolveu uma explicação de como a atividade
externa se transforma em interna de uma forma não espontânea. Neste aspecto, o
próprio Leontiev reconhece o trabalho de P. Ya. Galperin no estudo das etapas
sucessivas e as condições de transformação orientada com a finalidade de internalização
das ações materiais ou materializadas em internas (mentais) (LEONTIEV, 1978). Neste
contexto, Galperin (2001, p.85) define que:
Aprendizagem é toda atividade cujo resultado é a formação de
novos conhecimentos, habilidades, hábitos naquele que a
executa, ou a aquisição de novas qualidades nos conhecimentos,
habilidades, hábitos que já possuam. O vínculo interno que
existe entre a atividade e os novos conhecimentos e habilidades
residem no fato de que, durante o processo de atividade, as
ações com os objetos e fenômenos formam as representações e
conceitos desses objetos e fenômenos.
O trabalho realizado por Galperin estava voltado para a formação de habilidades
em seu aspecto executivo, com ênfase na atividade intelectual, portanto, não apresentou
resultados acerca das relações afetivas presentes no processo de comunicação durante a
aprendizagem bem como sobre seus aspectos indutores.

4.2 ATIVIDADE E COMUNICAÇÃO NA APRENDIZAGEM


Extrapolando a categoria atividade, donde o indivíduo está submetido a uma
relação sujeito-objeto, a categoria comunicação consiste na interação de dois ou mais
indivíduos conduzida para a adesão e união de esforços com a finalidade de estabelecer
relações compartilhadas para se atingir um resultado comum. Neste caso, a ação
individual de cada participante não é a unidade psicológica da comunicação, uma vez
que, a existência do outro requer considerar a interação entre os sujeitos de forma que
cada um participa como portador de sua atividade.
As características mais importantes da comunicação são a possibilidade de
orientação compartilhada e o estado ativo de cada participante que intervém no processo
como personalidade e não como objeto ou corpo físico (LISINA, 2013). Esta
característica é apresentada por LOMOV (1989, p. XX) da seguinte maneira:
A comunicação é a interação dos participantes que são
incluídos neste processo como sujeitos [...] Para a
comunicação são necessárias, pelo menos, duas pessoas, cada
uma das quais participa, precisamente, como sujeito.
Através dos processos interativos, os alunos partilham, em vários momentos em
que ocorre a comunicação com o professor e os demais colegas, as ações realizadas,
desde a motivação para o objeto de estudo até a assimilação deste de forma mental.
Neste contexto, a interação tem a finalidade de produzir intercâmbio e negociação dos
sentidos envolvidos na atividade, entre os participantes do processo educativo. Esta
interação está diretamente relacionada ao contexto das relações sociais que une os
integrantes, de forma que as que ocorrem na escola são diferentes das existentes em
outros ambientes sociais como a família, igreja, entre outros.
É neste processo que ocorre a aglomeração de ideias subjetivas (individuais) em
relação ao objeto de estudo, com a finalidade de captar uma ideia geral comum a todos,
ou seja, o ponto de vista global de um grupo onde a discussão ocorre, com uma
incessante reciprocidade da utilização e construção de códigos e regras. Desta maneira a
atividade individual é uma componente da atividade social, sendo necessária uma
análise do sistema de interações entre os indivíduos no contexto social em que ocorre a
atividade.
A ideia de que as interações sociais cumprem uma função decisiva, na formação
da personalidade humana, não significa que o indivíduo, como sujeito da atividade, tem
uma relação passiva nos processos de aprendizagem e desenvolvimento. As relações
sociais são formadas a partir das ações dos indivíduos particulares em interação
dialética com a sua realidade. Na escola, um modelo de comunicação democrática deve
permitir a participação dialógica nas interações entre professor e aluno e entre os
próprios alunos.
Apesar da importância que tem a interação no processo de comunicação,
destacamos, em sua estrutura, também os aspectos comunicativos e perceptivos, de
forma que as interações comunicativas possam desempenhar um papel mais sistêmico
na comunicação em sala de aula. Separar a interação da percepção e da própria
comunicação em si reduz esta última a um aspecto interacionista, conduzindo a uma
concepção exagerada da comunicação como simples troca de informações (LISINA,
2013). É preciso salientar que as pessoas se comunicam também para compreenderem
os fenômenos e obter respostas para problemas dos mais variados tipos.

4.3 AS INTERAÇÕES COMUNICATIVAS NO PROCESSO DE


APRENDIZAGEM FOMENTADO PELA ATIVIDADE E PELA
COMUNICAÇÃO

A existência de pelo menos dois participantes no processo de comunicação exige


ações compartilhadas, ou seja, interações. A interação, na atividade comunicativa, como
assinala Lisina (2010), é caracterizada pelas ações de iniciativa e de resposta
desenvolvidas por cada componente. A interação comunicativa é o elemento que
coordena o processo de transformação da ação individual em ação coletiva. Cada
indivíduo, neste processo, transforma a ação objetal em ação de comunicação. O
desenvolvimento deste procedimento estrutura a comunicação como um sistema de atos
conjugados (LOMOV, 1989).
É nesta transformação que se avalia a importância das categorias atividade e
comunicação no processo de assimilação mental de conceitos e ações. É na atividade
que o indivíduo interioriza os objetos e as ações relacionadas a essa interiorização, no
entanto, é no processo de comunicação em que essas ações são compartilhadas e, por
esse motivo, a interação, como ato conjugado, deve ser diferenciada do conceito de
ação.
Em cada interação comunicativa estão implícitos dois sujeitos, que, ao se
comunicarem, compartilham enunciados que influenciam na interação produzida pelo
outro. Esta influencia no que o outro fala e consequentemente pensa, transforma não
apenas o processo de comunicação, mais também a qualidade da interação do outro
sujeito e, por que não, a forma como este lida com sua atividade. Vale salientar que,
neste caso, cada sujeito realiza interações próprias no momento em que ele avalia a
forma que vai se comunicar de acordo com os interlocutores.
O aspecto interativo da comunicação está relacionado à disposição contígua da
atividade grupal. Deve-se levar em consideração, nos processos interativos, elementos
que evidenciam o “como” e o “quando” estes ocorrem e de que forma são produzidos os
intercâmbios de conceitos, habilidades e atitudes, bem como de sentimentos e estilos de
enunciados.
O processo de influência mútua entre os participantes do diálogo interativo
produz novos enunciados, ações e formas de se realizar determinada atividade,
produzidas conjuntamente e representativas da coletividade. Além disso, este
planejamento comum pode regular as ações de um indivíduo a partir de ações que
surgiram na cabeça do outro (LOMOV, 1989).
Neste aspecto, não é possível separar interação de comunicação, uma ocorre em
paralelo à outra, no entanto, é importante caracterizar que a interação e a percepção são
as partes respectivamente coletiva e individual da comunicação. Desta forma, a
comunicação também não se completa se um indivíduo não tomar consciência do
conhecimento dos outros participantes.
Considerando a possibilidade de se constituir um processo de aprendizagem a
partir de uma atividade comunicativa, ou seja, aprendizagem como atividade e
comunicação, estabelecemos as seguintes características:
 Os objetos da aprendizagem são compostos pelos conceitos e as ações
(atividade) assim como por outras pessoas, outros sujeitos
(comunicação).
 A necessidade de aprender está associada não apenas à motivação
intrínseca revelada pelos problemas objetais do conteúdo mas também
pela aspirações que as pessoas têm em ser conhecidas e valorizadas por
outras pessoas.
 Os motivos da aprendizagem devem estar focados na busca pelos objetos
nas qualidades que o indivíduo e as pessoas que o cercam possuem com a
finalidade de valorizar o indivíduo a partir de suas interações.
 As ações da aprendizagem são compostas pelas que são associadas ao
próprio objeto de estudo (atividade), mas também pelas interações entre
os indivíduos caracterizadas por ações de iniciativa e de resposta.
 Os meios que permitem a aprendizagem são as operações cujas ajudas se
realizam no processo de interações comunicativas.
 Os produtos da aprendizagem são compostos pela formação de ações
mentais materializadas pela assimilação consciente dos conceitos e das
ações (atividade), assim como, pelas formações de caráter material e
espiritual, produzidas pela comunicação e formadoras da personalidade.

4.3.1 Funções da comunicação

Podemos classificar a comunicação como detentora de três funções principais


estabelecidas por Lomov (1989): informativa, afetiva e reguladora. Essas funções não
devem ser pensadas como absolutas ou independentes uma das outras, mas como
articuladas e formando parte de um mesmo fenômeno.

4.3.1.1 Função informativa

A função informativa abrange todo o processo de transmissão e recepção da


informação, ao mesmo tempo em que representa uma das formas mais importantes no
processo de apropriação pelos indivíduos da experiência histórico-cultural da
humanidade. É através do caráter informativo da comunicação que ocorre a formação de
hábitos, habilidades e convicções de forma que o emissor de uma mensagem influencia
na formação ou atualização das ações mentais do receptor.
Do ponto de vista pedagógico atribui-se uma grande importância à transmissão
não apenas de ideias ou conceitos científicos, mas também atitudes, interesses e
sentimentos em um processo complexo, de duplo sentido, de forma que, cada
participante do processo comunicativo se manifesta como sujeito ativo.
Receber uma informação é uma das vias para adquirir conhecimento sobre o
mundo a sua volta, seja esta informação social ou material. Tem uma grande influência,
neste processo, a personalidade, já que apesar da habilidade de descrever possuir uma
invariante que caracteriza sua essência, a forma que ela vai ser ensinada varia muito
desde a forma como ela é exposta, as palavras escolhidas por cada professor para
desenvolver a formação, as respostas dadas pelos alunos que participam, entre outras, as
quais não podem ser representadas simplesmente pela relação entre sujeito e objeto.
A função informativa na comunicação pode se manifestar de duas maneiras. A
primeira delas é de forma direta, situação esta em que o emissor das informações está
presente e pode interagir com os participantes que recebem a informação. De outra
forma, quando o emissor não está presente, a interação dos receptores com o primeiro
não é possível. Este é o caso em que a comunicação ocorre com o apoio de livros,
revistas, televisão, entre outros, na qual o interlocutor tem acesso às manifestações
culturais indiretamente.
Mesmo no segundo caso, existe um direcionamento para a interação
comunicativa que se deseja quando os autores de livros, sítios, revistas ou programas de
televisão direcionam o conteúdo da mensagem para públicos específicos, por exemplo,
os livros didáticos para o ensino médio, em geral, são direcionados para estudantes na
faixa de 15 a 17 anos que estão finalizando o ciclo básico de educação e pretendem ter
acesso ao mercado de trabalho ou na universidade.
O fato de existirem vários indivíduos com características distintas no processo
comunicativo em sala de aula contribui para concluirmos que a comunicação não se
reduz à troca de informações. Deve-se pensar na função informativa como parte
integrante de um processo comunicativo que possui outras nuances que inclua emoções,
motivos, necessidades e a resposta do outro a todo esse processo.

4.3.1.2 Função emotiva

Nesta categoria está incluída toda gama de emoções, sentimentos, experiências,


que se desenvolveram individualmente durante a formação do indivíduo e que reaparece
no processo comunicativo. Possui um forte apelo às características interativas e
perceptivas da comunicação e se expressam na necessidade que os indivíduos possuem
de compartilhar suas impressões e de sentirem-se compreendidos.
A característica interativa da função emotiva se estabelece principalmente no
processo de intercâmbio das atividades que ocorrem na vivência de cada indivíduo, nas
suas relações interpessoais. De certa forma, interações que promoveram vivências
agradáveis, ou seja, que permitiram a satisfação dos participantes provocam a
cooperação, o apoio e ajuda mútuos em um grupo e, ao contrário, interações negativas
podem contribuir para o surgimento de um sentimento de repulsão de alguns
participantes do processo comunicativo.
A percepção também influencia o caráter afetivo da comunicação, já que esta
categoria psicológica pode ser caracterizada pela constância, como a disposição que o
sujeito tem de ajustar desacertos provocados pela interminável diversidade de condições
de existência das coisas, dos eventos e de outros indivíduos. Esta característica não é
inata, sua origem está nas ações ativas realizadas pelo indivíduo na interação com
outros, que ao passar do tempo vão encontrando pontos de comum acordo,
convergência de interesses, ou não, contribuindo decisivamente para se produzir
empatia.
Em um experimento formativo deve-se levar em consideração esse aspecto. É
um erro para o educador considerar que será suficiente para uma boa aprendizagem
investir apenas no aspecto cognitivo da comunicação e não considerar que as relações
afetivas podem promover um maior nível de satisfação entre os alunos, permitindo que
o docente possa ter uma maior possibilidade de convencimento e maior influência sobre
os estudantes.

4.3.1.3 Função reguladora

Esta função está diretamente relacionada com o controle da atividade


comunicativa e das ações realizadas pelos participantes desta, constituindo-se como a
maneira como os participantes da comunicação produzem uma influência mútua entre
si. Podemos perceber componentes interativos, perceptivos e comunicativos nesta
função, principalmente porque ela se apresenta necessária na orientação, execução e
controle do processo de assimilação se fazendo presente em todos os momentos da
atividade.
O aspecto comunicativo está presente na possibilidade de modificar a atividade
de alguém que recebe uma informação a partir de uma ordem, uma solicitação ou
pedido. Destacamos que não apenas o conteúdo da informação, mas também a forma
como ela é proferida interfere neste aspecto, por exemplo, a entonação da voz, a
imposição ou não para a realização de uma ou outra tarefa, entre outros.
A característica interativa desta função se manifesta nas atividades conjuntas em
que as tarefas são distribuídas entre os participantes como regulação da atividade dos
membros de um grupo. Já o componente perceptivo pode ser identificado nas situações
em que o conhecimento do outro pode contribuir para uma valorização crítica da própria
atividade conduzindo à mudança de comportamento.

4.3.2 Níveis de comunicação

Consideramos a existência de diversos níveis de comunicação, no entanto,


estamos dispostos a tratar teoricamente, a partir dos objetivos traçados para esse
trabalho, aqueles que estabelecem patamares que remetem à qualidade das interações,
conforme a participação dos estudantes no processo formativo.

4.3.2.1 Nível 1: transmissão e recepção

O primeiro nível em que ocorrem interações comunicativas é o de transmissão e


recepção. Este nível do processo comunicativo está relacionado às formas mais
tradicionais de explicação deste processo. Neste aspecto, leva-se em consideração como
ocorre a transmissão de informação entre os participantes, sem incluir os aspectos
interativos e perceptivos, fixando-se no estilo mais formal do processo.
É neste patamar que se discute principalmente quais são os componentes
objetivos da comunicação, especificando os sujeitos e objetos que estão inseridos nesta
forma de atividade. Neste nível define-se comunicação como um processo de
transmissão de informação de um emissor para um receptor através de um meio. É uma
estrutura que supõe a existência de um código específico que deve ser codificado pelo
emissor e decodificado pelo receptor.
O emissor é o sujeito que dá início ao processo de comunicação ao emitir a
mensagem que contém a informação. Fazendo uma transferência para uma sala de aula
tradicional, ou mesmo da maioria das salas de aula atuais, na grande maioria dos casos,
o emissor é o professor, o qual planeja, executa e avalia os procedimentos de ensino e
aprendizagem, inicialmente por exposição verbal, seguida de uma sequência de
retroalimentação como resposta à emissão.
O receptor, como o próprio nome já informa, é aquele que recebe esta
informação. Seguindo nosso exemplo de escola, a tradicional, este papel é
desempenhado pelos alunos, que assim como o emissor devem ter domínio do meio, do
canal de codificação e decodificação da mensagem.
O meio utilizado para se realizar o processo é a linguagem, desenvolvida e
sofisticada social e historicamente e que utiliza um sistema de signos para representar o
que Vygotsky (2000) chama de categoria da unidade genética do pensamento e da fala,
a saber, a palavra. As condições com que esse meio transmite a mensagem caracterizam
os canais de comunicação que podem se representados na comunicação escolar pela
própria voz do professor, o quadro, um experimento didático-científico, entre outros.
A tabela 1 apresenta de forma geral os elementos que compõe a atividade de
comunicação em sua relação dialética transmissão-recepção.
Tabela 3 - Elementos da comunicação

Lugar de origem da informação no qual nasce a


FONTE
mensagem.

Indivíduo ou grupo que seleciona os signos adequados,


EMISSOR OU codificando-os para transmitir a mensagem de forma
CODIFICADOR inteligível ao receptor. É nele que se inicia o processo
comunicativo.

Indivíduo ou grupo ao qual se destina a mensagem. É ele


que decifra e interpreta o seu conteúdo. Pode ser passivo,
RECEPTOR OU
quando apenas recebe a mensagem e ativo quando recebe,
DECODIFICADOR
armazena e dá reposta a o emissor em um processo de
retroalimentação.

Conjunto de regras próprias de cada sistema de signos e


CÓDIGO símbolos utilizado pelo emissor para transmitir a
mensagem.

É o conteúdo da informação composto por ideias,


MENSAGEM sentimentos e acontecimentos que o emissor deseja que
seja decodificado pelo receptor.

Meio pelo qual se transmite a mensagem ou informação


CANAL
estabelecendo uma conexão entre emissor e receptor.

Realidade percebida pelo receptor devido à transmissão


REFERENTE
da mensagem.

Formada pelas condições de tempo e espaço em que se


SITUAÇÃO
realizam as interações comunicativas.

INTERFERÊNCIA OU Qualquer perturbação sofrida durante a comunicação em


RUÍDO qualquer dos seus elementos.

Também chamada de mensagem de retorno é a condição


necessária para que haja interatividade no processo
comunicativo, caracterizada pelo recebimento de uma
RETROALIMENTAÇÃO resposta pelo emissor, desejada ou não por ele, a partir da
conduta ou atitudes do receptor. Pode ser positiva,
OU REALIMENTAÇÃO quando o receptor fomenta a comunicação, ou negativa,
quando ele quer mudar o tema ou finalizar a
comunicação. Sem retroalimentação a comunicação não
se completa.
O modelo clássico da comunicação, apresentado na figura 1, explica algumas
dificuldades que podem existir durante o próprio processo. Neste caso, o receptor pode
não estar habilitado para decodificar a mensagem, seja por não ter conhecimento
suficiente ou por não saber realizar as ações necessárias para manejar a linguagem
utilizada para compreender a mensagem. O próprio emissor pode também utilizar o
canal de forma inadequada, sendo assim haverá dificuldades de decodificação devido à
forma como o meio é utilizado.

Figura 1 - Modelo clássico de comunicação

Considerando o modelo clássico da comunicação como a simples transmissão e


recepção das informações contidas nas mensagens, mesmo que se considere o processo
de retroalimentação, ainda estamos discutindo um modelo em que o receptor é passivo,
visto que, o emissor não leva em consideração os motivos do receptor para obter a
informação, ao mesmo tempo em que a simples recepção não completa todo o processo,
porque além desta, é necessário que o receptor compreenda a informação que está sendo
recebida para que se estabeleça um intercâmbio de conhecimento. Esta crítica inclui a
ideia de que a comunicação não é o simples movimento de informação, mas a busca das
pessoas pela elaboração de um sentido comum (LEONTIEV, 1979), ou seja, quem se
comunica compartilha significados e realizam uma atividade de interação e negociação
na busca de um significado comum.
A transmissão da informação ocorre por intermédio de um sistema de signos que
deve ser codificado. Do ponto de vista da comunicação verbal, o emissor precisa
organizar suas ideias em forma de palavras e enunciados que deverão ser decodificados
pelo receptor para que haja a compreensão do significado da mensagem e esta possa
fazer parte das imagens representativas deste último, no entanto, a diferença entre
sentido e significado nos remete a outra dificuldade da teoria clássica, já que, as
palavras e enunciados podem ter significados diferentes para cada participante do
processo comunicativo.
Respostas diferentes de receptores distintos podem estar associadas às diferentes
idades, posições sociais e características psicológicas dos participantes. Neste caso,
mais eficiente do que a simples comunicação em seu modelo mais tradicional, deve-se
pensar em como introduzir os participantes em uma atividade compartilhada, que possa
ser comum a todos.

4.3.2.2 2º nível: compartilhamento de significados

A possibilidade de retroalimentação do processo comunicativo, presente no


modelo clássico da comunicação, vista na seção anterior, estabelece uma relação
hierárquica e sequencial deste processo, caracterizada pela existência de uma tríade de
atividades representada por emissão - recepção - retroalimentação.
Esta hierarquização, considerando-se a estrutura da escola tradicional, favorece o
modelo de sala de aula em que o professor é o emissor e o aluno o receptor, neste caso,
o controle total da atividade de comunicação pelo professor limita a própria
retroalimentação, promovendo passividade nas ações dos alunos e dificultando os
processos interativos necessários ao que Lomov (1989) chama de regulação das ações
de um sujeito por ideias originadas na cabeça do outro.
Ao contrário do primeiro nível, neste, a separação entre interação e comunicação
não faz sentido, uma vez que ambas se organizam no processo de atividade conjunta, ou
seja, os participantes que, na comunicação em sala de aula são os alunos e o professor,
socializam informações, ao mesmo tempo em que compartilham a própria atividade,
elaborando então as regras de ação coletiva. Neste caso, é necessário que a comunicação
permita ao aluno:
 Conhecer as condições em que se realizam suas ações e como estas se
relacionam com as ações dos outros.
 Tomar consciência da importância de suas ações e das ações do outros e
como ocorre a interação entre elas.
A aprendizagem e o desenvolvimento integral dos indivíduos estão
intrinsecamente associados ao contexto social, histórico e cultural em que ocorrem as
interações comunicativas. Neste aspecto, como estabelecido por Vygotsky (2000), as
funções psicológicas superiores, assimiladas pela mente humana, são originadas nas
relações interativas entre os indivíduos. O compartilhamento de significados dá ao
indivíduo a possibilidade de, em contato com os outros, estabelecer a interação como
unidade básica da comunicação. Conforme apresenta Leontiev (1979, p. 78), no
processo da produção material os homens produzem também a linguagem que serve
como meio de comunicação e é portadora dos significados socialmente elaborados.
Leontiev (1979, p. 112) complementa afirmando que os conceitos e as ações
mentais não se formam em absoluto na mente humana segundo o tipo de formação das
imagens sensoriais genéricas, no entanto, constituem um resultado do processo de
apropriação de significados preparados, ou seja, historicamente elaborados e, que este
processo transcorre na atividade individual, subsidiada pela comunicação com os
outros. Esta relação entre atividade e comunicação pode ser representada na figura 2.

Figura 2 - articulação entre as categorias atividade e comunicação

A psicologia desenvolvida pela escola soviética, derivada de pressupostos


ontológicos e filosóficos do marxismo, erigiu uma abordagem que se orienta pela
afirmação de que o estudo objetivo da mente humana demanda uma análise da atividade
histórica e social concreta da humanidade. Daí a necessidade de se compartilhar
significados desde as palavras até as estruturas essenciais que formam as habilidades.
Considerando que a atividade objetal não esclarece os processos de relações
sociais a partir dos polos sujeito-sujeito, esta psicologia de orientação marxista, uma das
principais abordagens que define a comunicação, articula esta categoria diretamente
com o processo de interação social. Neste contexto, toda coletividade humana foi
construída a partir de mecanismos interativos que têm como alicerce a comunicação,
sendo assim, tais mecanismos produziram a essência do que denominamos sociedade.
Em sala de aula esse compartilhamento dá força ao conceito de grupo, de
coletividade, ao mesmo tempo em que diminui os esforços individuais para buscar os
aspectos essenciais da formação de habilidades gerais como descrever em atividades
práticas experimentais. A ideia de que as interações sociais cumprem uma função
decisiva, na formação da personalidade humana, não significa que o indivíduo, como
sujeito da atividade, tem uma relação passiva nos processos de aprendizagem e
desenvolvimento integral, as relações sociais são formadas a partir das ações dos
indivíduos particulares em interação com a sua realidade. Na escola, um modelo de
comunicação democrática deve permitir a participação dialógica nas interações entre
professor e aluno e entre os próprios alunos, na busca da alteridade.
Neste sentido, compartilhamos o conceito de aprendizagem definido por
Galperin (2001, p 85), de forma que a assimilação é um processo pelo qual o indivíduo
se apropria da experiência social, a partir da atividade objetal entre sujeito e objeto e a
atividade de comunicação (LISINA, 2010) ou simplesmente comunicação (LOMOV,
1989), estabelecida na relação entre sujeitos. No caso da habilidade de descrever os
significados que devem ser compartilhados são relativos ao conceito, às ações
necessárias para realizar este procedimento e as operações que compõem estas ações
para que a descrição de um objeto ou fenômeno seja capaz de produzir no interlocutor
uma reprodução exata do que está sendo descrito.
Em suma, podemos admitir que conceitos e habilidades são assimilados pelos
indivíduos em um processo contínuo entre atividade e comunicação, respectivamente,
com a mediatização dos objetos e a mediação das pessoas. A continuidade desta
assimilação explica a internalização da linguagem externa ou social em interna ou
individual (VYGOTSKY, 2000) que se inicia no nascimento e se prolonga por toda a
vida.

4.3.2.3 3º nível: Formação de significados conjuntos

Este nível exige um maior comprometimento do indivíduo na formação das


interações comunicativas. Enquanto, no nível anterior, o conteúdo das mensagens era
compartilhado com a finalidade de estabelecer um processo de socialização e
negociação dos significados, neste, faz-se dessa discussão uma busca de um significado
comum, resultado do processo comunicativo, que fará parte de uma estrutura construída
nas interações comunicativas e, consequentemente, serão a base para o processo de
formação das ações mentais, tão necessários à formação de habilidades.
Os diversos níveis de comunicação e, em particular, os três que estamos
discutindo, são atingidos conforme a intensidade de participação do indivíduo é maior
ou menor, de que maneira compromete afetivamente e emocionalmente a partir de suas
motivações e necessidades. A ideia central associada ao processo interativo da
comunicação está embasada no fato de que uma atividade negociada, compartilhada
entre os participantes, tem um grande potencial no processo de motivação e orientação
da aprendizagem, da mesma forma que é um objeto de controle nas etapas de formação
em que há a necessidade de se utilizar a linguagem como atividade de formação de
habilidades.
As interações comunicativas se estabelecem não apenas como algo que deve ser
estruturado pelos seus mecanismos e regularidades, mas também e, principalmente,
como uma categoria imprescindível para o desenvolvimento psicológico dos indivíduos.
A necessidade de interagir e se comunicar, bem como, de estabelecer orientações
comuns, são tipicamente humanas e estão presentes desde os primeiros anos de vida.
A origem da comunicação se dá a partir da atividade prática humana, seja ela
escolar ou não, em sua trajetória histórica, social e cultural, traço característico de seu
desenvolvimento, o qual ocorre a partir de duas categorias: as interações comunicativas
práticas e espirituais.
A primeira categoria, ou seja, a comunicação prática, material, está direcionada
para a realização de tarefas concretas, realizadas coletivamente, nas quais o professor
tem a função de coordenar as ações para se atingir o conhecimento escolar, científico
em sua faceta transposta da ciência, como parte do mundo dos objetos, cuja
representação foi criada pelo homem, que criou também os instrumentos que permitem
mediar essa atividade.
Por outro lado, existe também a comunicação espiritual, orientada à busca da
valorização do outro indivíduo, ou seja, ela parte do reconhecimento que o professor e
os demais colegas, participantes da comunicação educativa, são portadores de uma
experiência social que, ao ser compartilhada, permite condições para uma melhor
coordenação das ações com o outro, da interação com os que rodeiam e a
autorregulação deste processo. Neste processo não se compartilha e, consequentemente,
se assimila, apenas o conteúdo objetivo da atividade, mas também as ideias, sentimentos
e impressões do outro.
Este nível de comunicação, em que as interações comunicativas promovem o
desenvolvimento da consciência e a formação da personalidade, pode ser materializado
em três construtos em forma de produto da comunicação. Chamaremos esses construtos
de produto da negociação coletiva, controle externo regulador da comunicação e por fim
a autorregulação e autocognição individuais.
O produto da negociação coletiva é o resultado do processo de negociação de
significados com o grupo de alunos que formam uma turma, juntamente com o
professor e o objeto da comunicação construído social e historicamente por uma área do
conhecimento. Considerando o aspecto essencial dos objetos e ações, é possível extrair
de cada participante, o nível de desenvolvimento em que este se encontra frente a essa
estrutura e confrontar com o que foi desenvolvido até o momento como cultura e com o
nível de desenvolvimento apresentado por outros colegas.
Este produto contém a estrutura essencial de uma habilidade, como, por
exemplo, descrever, mais é resultado de uma incessante comunicação entre cientistas,
professores, pessoas leigas em ciências, estudantes e tantos outros que participaram de
processos de negociação como forma de permitir o processo interativo. O ambiente
educacional pode transferir para o seu contexto esta atividade essencialmente humana e
que pode desempenhar uma função de produção coletiva que, uma vez produzida serve
de parâmetro para ações individuais de seus participantes.
Um processo de ensino e aprendizagem embasado na assimilação de habilidades
gerais possui uma grande vantagem para a utilização de um produto de negociação
coletiva, já que todas as tarefas que compõem a formação de uma habilidade estão
alicerçadas no caráter essencial estabelecido na estrutura do conceito, das ações, das
operações e do controle necessário para realizar uma atividade que dependa desta
habilidade.
Lomov (2006) apresenta como um grande potencial para a categoria
comunicação um investimento na motivação e orientação dos processos de
aprendizagem, uma vez que a forma e o conteúdo das interações comunicativas são
determinados pela função social que os indivíduos têm nas diversas esferas coletivas, ou
seja, sua posição no sistema de relações sociais.
Considerando esse aspecto, um sistema de aprendizagem em que o aluno tem
uma função passiva, escutando a lição e seguindo fielmente as orientações construídas e
apresentadas pelo professor, o nível de transmissão e recepção é o único que é ativado
consegue explicar o processo comunicativo. Não há necessidade, neste caso, de haver o
processo de negociação tampouco de se produzir um produto desta negociação, já que o
processo comunicativo se completa na retroalimentação materializada nos sem números
de chamadas orais, trabalhos de pesquisa e provas escritas que existem nesse modelo de
educação.
Um processo de ensino e aprendizagem que permite a negociação de
significados e que, consequentemente, produza sua formação e valorização individual
requer do aluno uma participação ativa, uma busca dos significados compartilhados de
maneira estruturada para servir de modelo para sua posterior generalização. Este
processo não apenas contribui para a aprendizagem humana, mas também para o
desenvolvimento integral do indivíduo, como alerta Núñez (2013):
O estudante se desenvolve e, ao internalizar os sistemas de
relações sociais, modifica seu lugar nesses sistemas de relações.
O desenvolvimento intelectual se expressa em novas motivações
da atividade de estudo e em novas atividades que, como uma
espiral, pautam ciclos de desenvolvimento interligados.
Vygotsky (2000) estabelece que a palavra seja a unidade genética que une
pensamento e linguagem, de forma que o pensamento e a palavra estão ligados entre si
por um vínculo primário. Segundo este autor, generalização e significado das palavras
são sinônimos. Toda generalização, toda formação de conceitos é o ato mais específico,
mais autêntico e mais indiscutível de pensamento.
Neste aspecto, Vygotsky apresenta como função comunicativa da linguagem a
diferenciação entre os significados das palavras e a tomada de consciência desses casos.
O Estudo da comunicação humana deve ser realizado a partir de uma atitude
generalizadora, a qual constitui um estágio adiantado da origem do significado das
palavras. A interação comunicativa humana ocorre imersa na complexidade que permite
o pensamento humano refletir a realidade em forma de conceitos, ou seja, todo
pensamento humano é conceitual.
A importância dada à comunicação pela psicologia histórico-cultural está
embasada nos pressupostos filosóficos do materialismo histórico dialético. Conforme a
apresenta Engels (XXXX):
Por outro lado, o desenvolvimento do trabalho, ao multiplicar os
casos de ajuda mútua e de atividade conjunta, e ao mostrar
assim as vantagens dessa atividade conjunta para cada
indivíduo, tinha que contribuir forçosamente para agrupar ainda
mais os membros da sociedade. Em resumo, os homens em
formação chegaram a um ponto em que tiveram necessidade de
dizer algo uns aos outros.
Uma especial importância à comunicação está inserida no trabalho de Mikhail
Bakhtin, principalmente na utilização do enunciado como unidade real da comunicação
verbal (1997). A experiência verbal individual humana evolui e toma forma sob o efeito
das interações comunicativas contínuas e permanentes com os enunciados individuais
dos outros, de forma que a assimilação da experiência social humana ocorre a partir dos
pares e não da estrutura da língua. Para Bakhtin (1997):
Nossa fala, isto é, nossos enunciados (que incluem as obras
literárias), estão repletos de palavras dos outros, caracterizadas,
em graus variáveis, pela alteridade ou pela assimilação,
caracterizadas, também em graus variáveis, por um emprego
consciente e decalcado. As palavras dos outros introduzem sua
própria expressividade, seu tom valorativo, que assimilamos,
reestruturamos, modificamos.
O trabalho de Bakhtin revela o quanto assimilamos os processos estabelecidos
na relação sujeito-sujeito de forma que não apenas a atividade objetal é a fonte do
conhecimento humano. A criatividade e a afetividade, tipicamente humanas não podem
ser encontradas no mundo dos objetos, tampouco em apenas uma personalidade, de
certa forma, estas qualidades são transmitidas entre os componentes da comunicação
que, as transformam em sua individualidade.
As análises sobre os conceitos de comunicação nos leva a concluir que as
interações comunicativas são processos de negociação de sentidos entre um grupo sobre
determinado objeto, de forma que há interferência entre os sujeitos participantes com a
finalidade de se atingir um sentido comum. Uma vez sendo atingido esse sentido
comum, ou seja, exista o produto da negociação coletiva, é preciso que o resultado da
negociação seja parte das funções psicológicas superiores (VYGOSTSKY, 2000) ou
como estabelecido por Galperin (2011), se tornem ações mentais.
Esse caminho é longo, complexo e depende de uma atividade organizada,
centrada nos aspectos essenciais da habilidade. É mais longo ainda se não for um
processo planejado já que a habilidade de descrever pode ser desenvolvida pelo
indivíduo como resultado de suas experiências pessoais, mesmo independente da escola,
no entanto, sem a motivação e orientação adequadas, perde-se muito tempo em aspectos
não essenciais que não fazem parte do que deve ser internalizado.
É aqui que entra em cena um dos conceitos introduzidos na psicologia por
Vygotsky (2000) que possui um grande poder de transferência para a didática, a zona de
desenvolvimento próximo. Segundo Vygotsky (2000) o processo de aprendizagem deve
estar focado nas atividades ainda em desenvolvimento no aluno, ou seja, aquelas tarefas
em que ele precisa de ajuda para realizar. As interações comunicativas, neste caso, são
de fundamental importância para o processo de regulação da atividade, ou seja, o
controle das ações que os alunos realizam durante a realização das tarefas.
É necessária a realização de uma atividade coletiva com base na comunicação e
no diálogo de forma que, enquanto parte do grupo realiza as tarefas de aprendizagem,
outra parte consulta o resultado da negociação anterior para interferir no processo, se
comunicando com o colega. Posteriormente os papéis se invertem e os alunos que
realizaram as tarefas com o controle dos outros passam a realizar o controle das tarefas
realizadas por estes últimos.
Conforme os alunos, com o apoio do objeto de negociação, avançam neste
processo, duas situações de aprendizagem são satisfeitas. Em primeiro lugar, quando ele
está resolvendo a tarefa com apoio do colega, será cada vez menos necessária a
interferência deste, ou seja, ele desenvolve a capacidade de realizar a tarefa sem a ajuda
do outro, com independência e autonomia, situação esta que é indicadora de
desenvolvimento. Como regulador da atividade do outro, ele também se organiza para
regular a própria atividade, ou seja, ao mesmo tempo em que ele toma consciência da
atividade do outro, desenvolve a própria autoconsciência. De acordo com Lisina (2011,
p. 91):
Os atos de comunicação, que se realizam muitas vezes e em
diferentes variantes, se convertem na base para a formação de
inter-relações que se constituem entre os participantes. Estas
inter-relações, por sua vez, produzem a base para a compreensão
de si mesmo.
A autocognição e a autorregulação são resultados desse processo, assim como a
atividade objetal permite ao indivíduo assimilar os objetos do conhecimento, a
comunicação favorece a formação individual da prática social e dos processos
interativos que ocorrem na coletividade humana. É importante reconhecer algumas
categorias psicológicas desenvolvidas no processo de comunicação, das quais
destacamos a empatia, a assertividade e a escuta ativa, categorias estas que entram no
processo como resultado da afetividade promovida pela comunicação.
A empatia consiste em um estado emocional que permite ao indivíduo sentir o
que o outro sente e pensar como o outro pensa, com a finalidade de transformar essas
emoções em uma experiência afetiva indireta dos sentimentos de outra pessoa, segundo
Eisenberg e Millar (1992), é um estado afetivo que tem origem na apreensão do estado
emocional do outro e que é congruente com o seu. As principais características que
estão relacionadas à empatia é a tomada de consciência da perspectiva alheia, o
sentimento de preocupação com outro e o compartilhamento de situações tensas que
envolvem outras pessoas.
Desenvolver a empatia não significa sempre concordar com os outros em
detrimento do abandono de suas convicções e sim de uma resposta mais positiva aos
sentimentos e ideias de outros indivíduos, respeitando suas posições e aceitando suas
motivações a partir das quais se produz um estado afetivo. É possível diferenciar-se de
outros indivíduos reconhecendo as relações que existem entre suas experiências e as
alheias assimilando principalmente aquelas em que há convergência.
A assertividade também é uma característica psicológica estabelecida pelo
processo de comunicação e se caracteriza pela capacidade de expressar as próprias
ideias ou sentimentos de maneira eficaz sem a preocupação com seu conteúdo e como
as outras pessoas se comportarão frente a esta informação. Ser assertivo é vencer as
barreiras e interferências da comunicação sem agredir ao outro, sem impor seu ponto de
vista e sim, expressá-lo de forma adequada.
Em uma comunicação assertiva, os indivíduos tem uma participação ativa, sem
medo de ser julgados ou manipulados por outros. Considerando o outro extremo temos
uma comunicação entre sujeitos agressivos e não assertivos, em que os primeiros
impõem suas ideias e sentimentos enquanto o outro grupo aceita (pelo menos
superficialmente) de forma passiva. Neste caso, a comunicação fica ainda presa ao
primeiro nível e interações comunicativas não ocorrem em essência porque parte dos
participantes não reconhece o outro.
Por último e não menos importante, uma comunicação completa que dê conta
dos três níveis que aqui teorizamos deve ser capaz de desenvolver a escuta ativa, ou
seja, a escuta com atenção para que o que a outra pessoa diz possa ser compreendido
integralmente. Escutar ativamente é ter concentração para focar com atenção as ideias e
sentimentos contidos na mensagem para compreendê-la e mostrar ao interlocutor que
ela foi entendida. É entender não apenas o que diz o interlocutor, mas também o que ele
sente.
Escutar ativamente é um processo de atenção voluntária e pode ser utilizada
como uma atividade de controle psicológico. Conforme especifica Galperin (2011x, p.
XX), a atenção voluntária é um controle da ação realizado sobre as bases de um plano
previamente elaborado. A existência de um produto da negociação permite direcionar a
atenção para uma atividade socializada, e não para elementos isolados da percepção,
portanto, esta forma de escutar também é um indicador de desenvolvimento já que
poderá ser transferida para outros contextos de aprendizagem.

4.4 A TEORIA DA ASSIMILAÇÃO POR ETAPAS E SUA IMPORTÂNCIA NO


PROCESSO DE APRENDIZAGEM POR MEIO DA ATIVIDADE E DA
COMUNICAÇÃO

Como já dissemos anteriormente, a Teoria da assimilação por etapas das ações e


dos conceitos de P. Ya. Galperin estabelece condições de análise para todo o processo
intelectual e cognitivo ocorrido na atividade de aprendizagem, instituindo de maneira
considerável parâmetros academicamente reconhecidos no aspecto executivo do
desenvolvimento das habilidades como formadora da consciência e da personalidade.
Grandes contribuições didáticas a essa teoria foram incorporadas nas últimas
décadas. As principais contribuições estão relacionadas ao aspecto indutivo da formação
da personalidade desde trabalhos que utilizam a motivação como elemento a ser
mantido durante todo processo de assimilação (TALÍZINA, 1988, 2010) até os mais
recentes como o que estabelece a vivência e o estilo de vida como elementos chave no
processo de formação e do desenvolvimento do pensamento complexo humano a partir
da interdisciplinaridade e da transdisciplinaridade (FARIÑAS, 2010).
A Teoria da assimilação por etapas das ações e dos conceitos de P. Ya. Galperin
é uma excelente alternativa teórico-metodológica para planejar, executar e avaliar de
forma didática o processo de assimilação de uma habilidade como linguagem interna,
ou seja, como uma ação mental. Conforme explicam Núñez e Farias (2013), a ideia
principal desta teoria admite que a assimilação dos novos conhecimento e habilidades,
ou seja, a passagem da experiência social para a experiência individual ou, como
explica Vygotsky (2000), do plano interpsicológico ao plano intrapsicológico, como
expressão do principio de internalização da atividade ocorre em etapas que permitem a
materialização dos objetos e interações entre os participantes do processo de
aprendizagem.
A relação entre o afetivo e o cognitivo, ou mesmo a importância do primeiro na
formação das habilidades não estiveram no rol principal dos trabalhos de Galperin, no
entanto, Vygotsky (2000) que considera o pensamento não apenas como racional, mas
como uma relação complexa entre os processos afetivos e cognitivos, prestou atenção
aos processos comunicativos como representação desta relação dialética. Núñez e
Ramalho (2013) apresentam esta relação articuladas com as tarefas de aprendizagem:
O afetivo abre a porta do cognitivo. Sem interesse, necessidade
e motivo não se produz a aprendizagem. As tarefas devem levar
em conta, sempre, esses fatores. A satisfação, o desejo, a
espontaneidade, a criatividade, os sentidos pessoais dos
estudantes são fatores que não podem ser desconsiderados
quando se organiza o sistema de tarefas de aprendizagem.
As etapas propostas por Galperin são ricas em diálogo, o qual permite a
assimilação de significados mais ricos e complexos cuja aplicação é cada vez mais
ampla dentro de um determinado limite de aplicação. Este processo é potencializado
pelas interações comunicativas presentes no trabalho colaborativo entre os próprios
alunos, com um valor formativo muito grande para o desenvolvimento de atitudes como
conteúdo da personalidade. Os alunos como protagonistas, ou seja, como sujeitos ativos
e que, possuem liberdade para verbalizar e expressar suas ideias reconhecem que estão
evoluindo, devido o apoio do outro colega e do professor estabelecidos nas relações de
simetria, colaboração e complementaridade.

4.5 A FORMAÇÃO DA HABILIDADE DE DESCREVER COMO EXPRESSÃO


DO PENSAMENTO TEÓRICO

O aluno do nível médio ou da formação inicial de professores de Física utiliza-se


de habilidades como a descrição dos fenômenos naturais mesmo que não dominem o
conceito, as estruturas das ações e o sistema de operações que determinam a utilização
consciente destas habilidades como procedimentos científicos. Esta situação revela que
o ensino de habilidades foram aprendidas por meio da reprodução na escola básica e
isso deve ser evitado nas licenciaturas, já que o professor deve aprender a descrever
segundo a cultura científica e não apenas como um processo de tentativa e erro..
O laboratório de Física, ou mesmo a sala de aula convencional, utilizada para
desenvolver práticas experimentais, podem ser utilizados como ambiente de
aprendizagem de conceitos e formação de habilidades. Aprender Física ou aprender a
ensinar Física, neste contexto, consiste em dar sentido e significado aos elementos que
integram a linguagem científica, melhorando a capacidade linguística dos alunos do
Ensino Médio ou mesmo da formação inicial de professores.
Conforme explicam Núñez e González (1997), durante os procedimentos de
aprendizagem, a linguagem e a comunicação têm o potencial de conscientizar os alunos
sobre o objeto e o processo que permite a assimilação do conteúdo científico, situação
que estabelece a escola como instituição responsável em planejar o conhecimento
teórico e experimental, as atividades dos estudantes e a linguagem como componentes
de um sistema de aprendizagem.
É importante que, durante o processo de planejamento de uma atividade de
ensino, o professor leve em consideração que existem diversas maneiras de comunicar o
objeto do conhecimento científico, para evitar, por exemplo, que peçamos aos alunos
para, ao realizar uma experiência de laboratório, explicar o procedimento que
realizaram, quando realmente o que queremos é que descrevam tal procedimento. Neste
aspecto, é imprescindível a compreensão de que se comunicar cientificamente supõe,
dentre outros os procedimentos, descrever, explicar, justificar, argumentar, traduzir,
construir tabelas, gráficos, diagramas.
Para Marquez (2005) os alunos aprendem ciências, quando, por exemplo,
aprendem a descrever observações ou a escrever relatórios experimentais, a partir dos
sentidos e significados da própria ciência. Separar o conteúdo do Ensino de Ciências
das tipologias textuais impede a aprendizagem de ambas. Situando nossa discussão nas
atividades práticas experimentais, a habilidade de descrever é essencial no processo de
produção do conhecimento científico, a partir da observação de um experimento.
Esta habilidade, cuja principal característica é situar a forma como o objeto ou
fenômeno experimental será observado, ou seja, deve-se identificar neste processo o que
é relevante para a observação. Nestes termos, a descrição aparece como um passo inicial
significativo da construção do conhecimento, já que o objeto ou fenômeno é descrito tal
como ele é.
Apesar da descrição científica estar centrada nos fatos, de forma que toda uma
comunidade, independentemente de suas próprias ideias, possam estar de acordo
(MARQUEZ, 2005) sobre a observação de determinado fenômeno, esta habilidade deve
ser bem trabalhada na escola já que uma descrição cotidiana pode ser bem diferente.
Como exemplo, ao observar a diminuição do nível de um reservatório do qual não foi
acrescentada nem retirada água, podemos ter descrições diferentes, como por exemplo,
“a água desapareceu” ou “a água evaporou”. Nos dois casos são feitas pequenas
descrições do fato, no entanto, a segunda possui uma carga teórica mais profunda,
qualificando a comunicação do ponto de vista científico.
Para Veslin (1988), descrever é citar acontecimentos sem estabelecer relações
entre eles, pelo menos de forma explícita. Esclarecemos que essa definição não
apresenta a habilidade de descrever como uma ação realizada de qualquer maneira, à
pura sorte, mas que acompanha alguma ideia de organização que o indivíduo que
descreve tem em mente.
As situações que envolvem atividades práticas experimentais possuem uma série
de padrões teóricos pré-estabelecidos que o aluno possa ter domínio em maior ou menor
grau. Em primeiro lugar, o estudante pode ter um conhecimento do conteúdo conceitual
associado ao experimento, por exemplo, numa atividade que envolve o pêndulo simples,
os conceitos associados à força resultante, movimento periódico, movimento harmônico
simples, entre outros, são decisivos para que o observador compreenda a necessidade de
avaliar ou medir o período de oscilação ou o comprimento do pêndulo para descrever o
movimento. Outros aspectos conceituais que podem influenciar na decisão do que pode
ser descrito é o conhecimento de grandezas físicas, erros experimentais, relação entre
grandezas, entre outros.
Além do conteúdo conceitual, a descrição demanda outras habilidades,
chamadas cognitivas que estão relacionadas à observação como identificar, comparar e
classificar o que realmente precisa ser descrito em um processo experimental. Tomamos
como exemplo, a seguinte situação: uma barra de ferro aquecida pode mudar de cor,
portanto, em que medida a descrição sobre essa mudança é importante para observar o
fenômeno da dilatação térmica, considerando que este seja o objeto de estudo atual?
Descrever pode também ser definido como “representar objetos ou fatos com
palavras, desenhos ou outros sistemas de signos” (LÓPEZ, 1990), de forma que permita
ao receptor fazer uma representação exata do que é descrito (JORBA, 2000). É
importante frisar que são mais complexas e estabelecem um maior grau de
desenvolvimento, descrições que abarcam o julgamento de características não materiais
do objeto a ser descrito, qualificando a prática experimental como atividade que pode
“materializar” diversas qualidades associadas ao objeto de estudo, como a análise de
semelhanças e diferenças (comparação) e determinação de categorias (classificação).
Jorba (2000) propõe uma definição mais completa da habilidade de descrever
como produzir proposições ou enunciados que enumerem qualidades, propriedades,
características de um objeto ou fenômeno. Além disso, este autor apresenta critérios de
validez, complexidade e associações com outras habilidades, necessários a elaboração
de uma boa descrição, como vemos na figura. Jorba et al (2000) definem uma série de
habilidades cognitivo-linguísticas que são ativadas como elementos transversais entre a
base de operações cognitivas e o processo de ensino e aprendizagem. Com vistas a não
haver confusão entre os conceitos de descrever e explicar, é realizado nesse trabalho um
amplo esforço para diferenciar estas duas habilidades de forma que descrever é definida
como “produzir proposições ou enunciados que enumerem qualidades, características ou
propriedades do objeto ou fenômeno observado” (p. 34) e explicar é “produzir razões ou
argumentos de forma ordenada e estabelecer relações entre eles para modificar um
estado de conhecimento” (p. 38).

A figura 5 apresenta uma relação adaptada deste trabalho no qual a habilidade


cognitiva de observar está relacionada à habilidade de descrever, que por sua vez
associa-se a produção textual.
Além da definição já apresentada, Jorba (1998) especifica indicadores essenciais
para desenvolver uma descrição. Para este autor, a descrição é válida se o receptor tem
uma ideia exata do que é descrito e varia sua complexidade se o objeto de estudo é
concreto ou abstrato, simples ou complexo, presencial ou não, vivenciado ou não,
observável ou não. Isto implica em:
 Observar.
 Comparar e encontrar as semelhanças e diferenças.
 Identificar o essencial.
 Construir terminologia adequada.
Figura 5 – habilidades cognitivo-linguísticas como elementos associativos entre observar e produzir
textos (adapatada de Jorba, 2000)

Na opinião de Núñez (2012):


Na área da linguagem, na aprendizagem das ciências naturais, a
descrição situa-se como um procedimento para representar e
comunicar os objetos do conhecimento. É uma forma de expressar o
observado, o conhecido, o imaginado. Esse procedimento é adequado
para a proposição das teorias científicas e, na aprendizagem das
ciências, auxilia o entendimento e a construção dos conceitos
científicos envolvidos. A descrição deve permitir a reprodução mental
do objeto, do fenômeno ou do processo científicos. Mas é importante
considerar que, na atividade criativa, a descrição traz consigo a
novidade como forma de produzir transformações no objeto do
conhecimento.
Para Sanmartí (2007) incluir a habilidade de descrever em aulas de Ciências
Naturais provoca uma melhor consolidação da “forma de olhar” um determinado
fenômeno. Neste processo, a observação é condicionada a partir do modelo teórico que
se pretende construir e junto com a descrição permitirá o desenvolvimento de outros
textos ou discursos como a explicação, por exemplo.
A descrição está fortemente associada às habilidades cognitivas, como observar,
comparar, classificar e identificar. Observar e descrever em atividades práticas
experimentais pode desencadear uma série de procedimentos que associados aos
conteúdos científicos, permitem que os alunos construam entidades, estabeleçam
semelhanças e diferenças, situem o cenário de observação a partir de uma teoria
(SANMATÍ, 2007) e desenvolva formas mais elaboradas de se comunicar.
Descrever é apresentar as características dos objetos, ou seja, atribuir qualidades
a um processo ou fenômeno físico observado. Constitui uma forma superior da
percepção visual e requer o uso de palavras adequadas que possibilitem criar a
representação desejada como objeto da comunicação (NÚÑEZ, 2012). Uma das
finalidades da educação científica é permitir aos alunos a assimilação das diversas
maneiras de utilizar a linguagem científica, ou seja, aprender a raciocinar a natureza,
observá-la e falar sobre ela, o que constitui uma parte importante do fazer científico.
Nesse contexto, descrever é uma habilidade fundamental.
Descrever é uma habilidade essencial para desenvolver a linguagem da ciência e
poder representar os fatos e os processos científicos. Ensinar a descrever com as
palavras mais apropriadas, fazendo uso dos termos e expressões mais ajustados à
linguagem cientifica, corrobora com o desenvolvimento dos alicerces para a
aprendizagem das ciências naturais e dos conceitos científicos.
A descrição é um elemento da comunicação. Ela expressa com exatidão o que
foi observado em um fenômeno natural ou processo científico (DUVAL, 1997) ou
relaciona um fato observado num determinado nível de organização com outro inferior,
levando à mudança de escala (VESLIM, 1988).
A importância da formação de habilidades, como por exemplo, descrever em
uma atividade prática experimental, está intrinsecamente articulada à conversão das
ações que, segundo Galperin (2011c, p. 81) inicialmente são externas ou materiais e,
posteriormente se transformam em mentais ou internas. Esta conversão pode ser
explicada, como feito por Vygotsky (2001) por meio da internalização da linguagem
externa em outra que o indivíduo realiza “para si”, cuja função e estrutura são
transformadas pelas etapas que compõem este processo.
Reconhecemos que o conceito de habilidade possui um grande grau de
polissemia (NÚÑEZ e RAMALHO, 2012) e, por esse motivo, estabelecemos nossa
opção a partir dos pressupostos orientadores deste trabalho que conferem uma leitura
materialista histórica e dialética ao desenvolvimento deste tema. Neste caso,
considerando a Teoria da atividade, desenvolvida por A. N. Leontiev (1979), acolhemos
a ideia de que as ações a partir das quais se realiza a atividade são seus componentes
fundamentais e, consequentemente, a habilidade de descrever deve estar relacionada a
esse fundamento. Uma definição de habilidade que está de acordo com esses
pressupostos e que, por esse motivo, passaremos a utilizar como categoria teórica desta
pesquisa foi estabelecida por Petrowski (1979). Segundo este autor:
Habilidade é o domínio de um complexo sistema de ações
psíquicas e práticas necessárias para uma regulação racional da
atividade com o apoio dos conhecimentos e hábitos que a pessoa
possui.
Este conceito de habilidade, representado na figura 1, ao mesmo tempo em que
admite a composição por um sistema de ações, compõe os elementos que formam a
aprendizagem, juntamente com os conhecimentos e os hábitos. Conforme declara
Galperin (2011, p. XX) aprendizagem é toda atividade cujo resultado é a formação de
novos conhecimentos e habilidades em quem a executa ou a incorporação de novas
qualidades aos conhecimentos e habilidades que já se possuem.

O processo de assimilação de uma habilidade, proposto pela teoria de P. Ya.


Galperin encerra em sua estrutura o estabelecimento de etapas específicas em que
ocorre a aprendizagem, as quais tem como resultado uma complexa cadeia de
desenvolvimento, dialeticamente relacionada à aprendizagem, caracterizada pela
qualidade da ação assimilada e que, nada mais são do que indicadores qualitativos que
representam as transformações psicológicas ocorridas durante a assimilação. Estas
características, denominadas por Galperin (2001x, p. XX) de parâmetros da ação
incluem a forma da ação e os graus de generalização, abreviação e assimilação.
Esses indicadores qualitativos revelam os níveis de desenvolvimento intelectual,
resultantes do processo de assimilação (NÚÑEZ, 2014), apesar de se desenvolverem em
conjunto, durante o processo de aprendizagem, consistem separadamente, em um
valioso arsenal de análise pedagógica individualizado em unidades de inferência
psicológica da atividade de assimilação da habilidade de descrever.
Conforme o processo de aprendizagem evolui em etapas, nas quais esses
indicadores se desenvolvem, as ações essenciais intrínsecas a atividade de descrever,
inicialmente materiais ou materializadas e essencialmente externas aos estudantes, se
interiorizam em forma de habilidade intelectual, conferindo ao aluno a possibilidade de
interiorizar a habilidade de descrever a partir de suas características essenciais,
encerradas em sua invariante materializada nos conceitos e ações.
Os indicadores qualitativos, estudados por Talízina (1988, 2002) como
características da ação, podem ser classificados como primários ou secundários, de
forma que estes últimos são consequências, ou seja, derivadas de uma ou mais
propriedades primárias, as quais, por sua vez, são consideradas fundamentais, de
formação independente, apesar de estarem relacionadas e se influenciarem mutuamente.
De acordo com Talízina (2002, p. 120):
Estas são independentes no sentido em que a formação de
uma delas não conduz à formação de outra. Isto significa
que durante a organização do processo de assimilação, é
necessário preocupar-se com cada uma destas características
separadamente.
A tabela 1 apresenta de forma resumida cada característica qualitativa primária,
conforme estudada e teorizada nos trabalhos de Talízina (1988, 2002). Apesar do foco
do nosso trabalho ser a generalização da ação ou da habilidade, é necessário ter atenção
nas relações e influências que esta pode ter ou sofrer em articulação com as demais
características. Da mesma forma, a tabela 2 apresenta as características secundárias
relacionadas à habilidade de descrever.
Tabela 4 - características primária da assimilação da habilidade (ação) de descrever
CARACTERÍSTICAS PRIMÁRIAS DA AÇÃO DE DESCREVER
A forma da ação, como indicador qualitativo, caracteriza o nível de
apropriação da ação ou habilidade de descrever pelo estudante.
FORMA DA AÇÃO Neste contexto, destacam-se as mudanças que esta ação sofre no
caminho de sua internalização, ou seja, na transformação de uma
atividade externa material ou materializada em interna, mental.
GRAU DE Caracteriza a medida de separação das propriedades essenciais que
GENERALIZAÇÃO permeiam a habilidade de descrever das não essenciais.
Infere se todas as operações que formam a ação de descrever são
GRAU DE
cumpridas pelo estudante. Vale salientar que, conforme esta
DETALHAMENTO
característica se desenvolve a ação vai se reduzindo.
Identifica se a ação de descrever se realiza de forma fácil,
GRAU DE automatizada e com rapidez. É desenvolvida inicialmente de forma
ASSIMILAÇÃO lenta e, conforme se toma consciência da ação, o ritmo de
realização aumenta.
Refere-se à possibilidade do estudante realizar uma descrição com
GRAU DE ou sem ajuda. Conforme a assimilação ocorre, os níveis de ajuda
INDEPENDÊNCIA diminuem até que o aluno consiga realizar a ação de descrever sem
ajuda do outro.

Tabela 5 - características secundárias da habilidade (ação) de descrever


CARACTERÍSTICAS SECUNDÁRIAS DA AÇÃO DE DESCREVER
Relaciona a ação de descrever com as condições necessárias à
CARÁTER
sua assimilação, ou seja, as condições pela quais se orienta o
RACIONAL
estudante para assimilar a habilidade de descrever.
Consiste na possibilidade de cumprir corretamente a ação de
GRAU DE descrever ao mesmo tempo em que a fundamenta
CONSCIÊNCIA corretamente sua estrutura de forma verbal, ou seja, saber o
que está fazendo e por que.
CARÁTER Consiste na possibilidade de realizar a ação de descrever de
ABSTRATO forma generalizada sem o apoio emocional dos objetos.
É a possibilidade de realizar a ação de descrever algum tempo
GRAU DE
depois que a formação é realizada. É o resultado do grau de
SOLIDEZ
generalização em longo prazo.
O grau de generalização como indicador qualitativo da habilidade de descrever
A generalização como qualidade da atividade humana foi estudada pela
psicologia soviética em todo o percurso do século XX e começo deste. Vygotsky (2001)
atribuía ao significado da palavra, como ato de pensamento, a definição de
generalização ou de conceito, que por sua vez, para este notável psicólogo, eram
sinônimos. Davidov (1972) considerando a generalização como um processo, assinala
que este deve conduzir o indivíduo a uma transformação da descrição de um objeto
individual para a sua conclusão em separado de toda uma classe de objetos, ou seja, o
caráter generalizado de uma ação caracteriza a medida de separação das propriedades
essenciais de um objeto para a realização de uma ação dentre as propriedades não
essenciais (TALÍZINA, 1988, p. 62).
O grau de generalização da habilidade de descrever demanda uma distinção mais
acabada desta habilidade, a partir de seu conceito e as ações e operações necessárias e
suficientes para a sua realização. Significa destacar seu conteúdo constante e
estereotipado (GALPERIN, 2011). Este destaque confere um enorme valor à posterior
abreviação da ação como habilidade ou hábito. Conforme estabelece Galperin (2011), o
formato constante e estereotipado da ação revela uma condução muito rápida entre as
informações iniciais e determinado resultado sem que haja a necessidade de reproduzi-
la sempre em sua totalidade para conhecer o resultado final.
A obra criativa de Vygotsky (2001, p. XX) estabelece que no processo de
formação do pensamento e da fala, a palavra, como unidade genética de generalização,
ao mesmo tempo em que é usada para identificar os objetos individualmente, representa
principalmente um grupo ou classe de objetos que possuem as mesmas características.
Esta unidade de generalização é uma ação verbal de pensamento e reflete a realidade de
uma forma totalmente diferente da sensação e da percepção.
No processo de generalização revela-se o que é comum entre objetos ou
fenômenos da realidade, designando-os com a palavra, ou seja, vinculam-se tais objetos
ou fenômenos aos mesmos indícios semânticos, atribuindo-lhe um significado
compartilhado. De acordo com Vygotsky (2001, p. XX), o significado das palavras não
é apenas a unidade do pensamento e da linguagem, mas também a unidade de
generalização, de comunicação e de pensamento.
O extenso trabalho experimental na área de psicologia, desenvolvido por
Vygotsky e seus colaboradores, tinha como principal problema o reconhecimento da
exigência de um método genético para estudar os diversos formatos do significado
verbal e das generalizações nelas reagrupadas. Segundo destaca Davidov (1992):
Nos trabalhos de Vygotsky e dos seus colaboradores foram
estudados com um procedimento experimental os processos de
formação dos denominados conceitos artificiais em crianças de
diferentes idades e se efetivou, também, um estudo comparativo
da formação dos conceitos científicos e dos cotidianos.
Métodos e dados experimentais alcançados com estas pesquisas
são pontualmente expostos nos trabalhos de Vygotsky e
colaboradores.
Apesar de um extenso trabalho experimental sobre a formação dos conceitos
cotidianos, as contribuições de Vygotsky sobre a generalização a partir da formação dos
conceitos científicos, assim como outras categorias, como a formação de habilidades,
figuraram no que se chama de “sinfonia inacabada”, situação esta que especifica a sua
obra como genial, ao mesmo tempo em que se abriu para novas contribuições.
Os pressupostos teórico-metodológicos que orientam este trabalho estabelecem a
generalização como procedimento essencial do pensamento humano, no entanto, não se
limita apenas a esse campo. Para formar a habilidade de descrever de forma
generalizada é importante conhecer o mecanismo psicológico da generalização que a
une à estrutura funcional desta ação.
A verificação de que um indivíduo assimilou uma habilidade de forma
generalizada deve ser aferida a partir da análise da utilização das propriedades
essenciais para resolver todos os tipos de tarefas em determinado limite de
generalização. Talízina (1988) alerta para o fato de que a generalização se realiza
sempre segundo as propriedades dos objetos que presentes na composição da B.O.A.
tipo III, direcionada à análise destes objetos.
Esta constatação significa que a existência das propriedades essenciais não
garante a assimilação por parte dos indivíduos se não houver a estruturação da
atividade, por meio do controle do conteúdo da B.O.A. tipo III, que se dá no processo
de interação comunicativa entre iguais, principalmente na etapa materializada e na etapa
verbal. Conforme explica Talízina (1988, p. 80), a generalização se realiza sempre
segundo as propriedades dos objetos que entraram na composição na base orientadora
das ações direcionadas a análise destes objetos.
Isto significa que a orientação da generalização das ações cognitivas que formam
a habilidade descrever deve fazer parte da estruturação da atividade realizada pelos
alunos, incluindo o controle do conteúdo da base orientadora destas ações e não apenas
apresentar ao grupo de estudantes o conceito e suas respectivas ações e operações. Sem
a orientação necessária para distinguir características essenciais de gerais, toda a
atividade que envolva a habilidade de descrever pode ser assimilada de forma errônea
ou incompleta.
Tomando como exemplo o estudo do movimento retilíneo uniforme de uma
partícula podemos estabelecer que as propriedades essenciais que formam este conceito
podem ser resumidas em um enunciado: “a partir do estabelecimento de um referencial
inercial, o vetor velocidade de uma partícula é invariante com o tempo”. Este
enunciado, por se tratar de propriedades essenciais do objeto que está sendo estudado,
orienta qualquer tarefa cujo objetivo seja estudar o movimento supracitado, no entanto,
podemos identificar outras características pertencentes a esse objeto que são gerais, ou
seja, fazem parte do objeto, mas não representam uma propriedade essencial.
Dentre os enunciados possíveis, podemos citar: “a partícula percorre distâncias
proporcionais aos intervalos de tempo”, ou “a aceleração é nula”. Apesar destes
enunciados serem verdadeiros para o movimento que estamos estudando, eles são
consequências do conceito, portanto, não são capazes de promover o processo de
generalização que ora estamos explicitando.
Estes exemplos práticos permitem visualizar a regularidade promovida por uma
orientação que visa a generalização teórica, ao invés de uma generalização que se dá a
partir de uma generalização das características gerais e não essenciais. A escola
tradicional deixa ao critério dos alunos definirem as propriedades que utilizarão em uma
ação que envolva descrever, a partir do momento em que esta habilidade não é ensinada
na escola de maneira sistematizada e estruturada a partir de suas características
essenciais.
Conforme a atividade é planejada de forma que a orientação seja composta das
características necessárias e suficientes e se garanta a orientação sistemática a todos os
participantes, da mesma forma que todas as tarefas que compreendem o processo de
assimilação em suas etapas, se forma no aluno uma generalização completa
(GALPERIN, 2011x; TALÍZINA, 1988) ou generalização teórica (DAVIDOV, 1972).
Neste processo em que a assimilação é orientada pelas características essenciais da
habilidade de descrever, direcionadas pela B.O.A. tipo III, as características não
essenciais não influenciarão no processo, promovendo uma aprendizagem rápida e sem
erros.
Segundo Galperin (2001x, p XX) a B. O. A. tipo III é caracterizada pela
habilidade que possui o sujeito em formar individualmente a imagem orientadora
completa da ação. Neste caso, é evidente que o estudante precisa aprender a formar esta
orientação, processo este que demanda algum tempo, no entanto, uma vez formada a
orientação de caráter geral e completa da habilidade, sua generalização ocorre de forma
rápida e sem erros.
É importante esclarecer que esta orientação não ocorre na direção de tarefas
particulares, de forma que, para cada tarefa seja necessário ativar uma orientação
diferente. O grande diferencial da B. O. A. tipo III, como orientação adequada para o
processo de generalização é o direcionamento para as propriedades e relações essenciais
para qualquer objeto que possua as características essenciais definidas inicialmente.
Neste caso, dá-se um processo de evolução da aprendizagem do geral para o particular,
de forma que o caráter essencial da habilidade é utilizado para resolver tarefas isoladas,
estabelecendo combinações das propriedades essenciais e suas relações. Para que a
generalização seja possível nesse processo é necessário que a aprendizagem seja
organizada segundo o que é proposto por Galperin (2011x, p XX):
 Formação da análise geral;
 Sua aplicação a uma tarefa particular;
 A formação da ação especial através da execução dessa tarefa particular.
A B. O. A tipo III, definida por Galperin como uma orientação de caráter geral e
que, por esse motivo, permite a generalização da habilidade possui algumas vantagens,
apresentadas a seguir (GALPERIN, 2011x, p XX):
Uma vantagem fundamental da aprendizagem com uma
orientação do terceiro tipo consiste na mudança essencial do
processo e do produto da aprendizagem. Ao diferenciar
individualmente a base orientadora da ação, o sujeito a segue
ativamente e a organização externa da ação se faz desnecessária.
Aí a ação se executa corretamente desde o primeiro momento e
sua assimilação posterior transcorre também sem erros. A ação
que se forma sobre a análise das relações da área dada
proporciona dados muito precisos acerca das mudanças das
condições (da situação, do material e dos estados do próprio
sujeito). A orientação do terceiro tipo se manifesta em uma
completa transferência da ação dentro dos limites da área dada.
Aí participa claramente a diretriz geral de investigar antes de
atuar, de abordar as novas tarefas a partir de seu estudo prévio.
O terceiro tipo de orientação tem maiores perspectivas. Lógico
que este tipo de orientação apresenta algumas dificuldades,
devido a que pressupõe uma reconstrução essencial não somente
dos métodos de aprendizagem, mas também das próprias
disciplinas.
Na generalização da habilidade de descrever e suas respectivas ações deve ser
assegurada a aplicação de todos os tipos de tarefas previstas, de forma que as diferenças
entre os tipos de material sejam contempladas e não simplesmente sua variabilidade.
Distinguimos três tipos de material, conforme o que é proposto por Galperin (2011x, p.
XX):
 O material lógico de caráter geral, que tem uma composição completa,
excessiva e incompleta de condições e a combinação do excesso de umas
condições com a insuficiência de outras.
 O material psicológico com divergência e coincidência de traços evidentes e
características conceituais (em diferentes combinações).
 O material objetivo-especial, no que o conceito que se estuda tenha sido
expresso mediante diversos fenômenos e meios de um material dado.
As tarefas de aprendizagem são imprescindíveis como recursos pedagógicos
utilizados com a finalidade de se alcançar um objetivo. Elas são as próprias ações
desenvolvidas sob os limites impostos pelos motivos da atividade e as condições de
execução. Segundo Núñez e Ramalho (2013), para dominar uma habilidade, o estudante
deve realizar tarefas que contenham o sistema de ações que a forma bem como, as que
variam as condições, a complexidade e o sistema de conhecimentos.
Em princípio, evita-se um grande número de tarefas, visto que, uma escolha
inadequada de tarefas semelhantes em maior quantidade pode conduzir a uma
automatização destas em detrimento de outras que foram menos frequentes. Deve-se
neste caso, utilizar o princípio do contraste, incialmente com tarefas diferentes, de todos
os tipos no interior do limite de aplicação, para apenas depois dessa fase, investir em
tarefas semelhantes (TALÍZINA, 1988).
A formação da imagem generalizada da habilidade de descrever se estrutura a
partir da rigorosa constância dos critérios utilizados para a delimitação das
características essenciais desse procedimento, cujos atributos vão paulatinamente sendo
incorporados pelo estudante e, pela variedade de tarefas materiais que compõe as ações
necessárias e suficientes à sua formação. Conforme explica Galperin (2011x, p. XX):
Esta generalização implica a diferenciação da formação
constante da ação, e com o passo da ação de forma materializada
a mental se produz inevitavelmente sua abreviação. Esta
abreviação progride rapidamente e termina quando o próprio
processo da ação desaparece da consciência. Assim dos
excitadores passamos diretamente dos resultados desta ação a
seu esclarecimento, através do conjunto de características do
objeto dado.
A generalização como qualidade primária da ação interfere de forma decisiva,
como é representado nas figuras 2 e 3, em outros indicadores como o grau de
consciência, o caráter racional e o grau de solidez das ações que formam a habilidade de
descrever.
O caráter racional associa-se à generalização tanto como um indicador pré-
formação como pós-formação, visto que, as condições para formação da habilidade
tanto estão associadas aos conhecimentos e hábitos que o aluno possui quanto aos que
venham a aprender durante o processo. Além disso, leva-se se em consideração as
condições de aprendizagem desta habilidade, como por exemplo, em que nível de
aprofundamento as atividades experimentais são exploradas, definindo assim um limite
de exploração e de formação.
Quanto ao grau de consciência, não é suficiente que as características da
generalização sejam apenas identificadas pelo aluno sem que ele possa explicar e
compreender sua formação. É necessário que o estudante possa realizar as tarefas de
generalização cujos limites são estipulados na B. O. A. tipo III, consciente de como ela
foi construída e como as características essenciais da habilidade podem ser aplicadas em
todas as tarefas. O grau de consciência também inclui a possibilidade de identificar
tarefas em que as características essenciais não são suficientes parasse realizar a
descrição por estarem fora dos limites de aplicação estabelecidos pela B. O. A. tipo III.
Figura 3 - Relação entre generalização e características secundárias
Enfim, para que a habilidade formada e sua respectiva generalização sejam
sólidas é necessário que esta atividade não perca as características conforme o tempo
passa, ou seja, o processo de formação deve ser dirigido para que a orientação seja
utilizada com uma frequência que, mesmo depois de algum tempo após a aplicação do
experimento formativo, permita que a habilidade continue formada e ativa como ação
mental do estudante.
5. A TEORIA DA ASSIMILAÇÃO POR ETAPAS DE P. YA. GALPERIN
NA FORMAÇÃO DA HABILIDADE DE DESCREVER
Neste capítulo organizamos as principais ideias teóricas associadas à Teoria da
assimilação por etapas das ações e dos conceitos articuladas com as interações
comunicativas durante as etapas. Como Já fizemos uma exposição da formação da
habilidade de descrever a partir do grau de generalização, no capítulo anterior, faremos
neste uma exposição de como é possível realizar a formação ou atualização desta
habilidade a partir destas etapas, considerando as interações comunicativas no processo
de aprendizagem.
5.1 TIPOS DE INTERAÇÕES COMUNICATIVAS
Durante o processo de compartilhamento dos conhecimentos e das ações por
parte de cada indivíduo, pode haver discordâncias ou concordâncias entre eles, o que
fomenta um diálogo no sentido de estabelecer uma posição comum do grupo. Neste
caso, entram em cena, as categorias de características opostas das interações
comunicativas que podem ser organizadas da seguinte maneira:
 Cooperação e competição.
 Acordo e conflito.
 Adaptação e oposição.
 Associação e dissociação.
Apesar de vivermos numa sociedade capitalista, em que categorias como a
competição e o conflito são extremamente utilizados e valorizados nas relações de
produção e de trabalho, a escola deve ser um espaço que estimula a cooperação, o
acordo, a adaptação e a associação, principalmente nas alternativas que promovem o
trabalho em grupo entre adolescentes ou mesmo entre estudantes adultos.
Neste aspecto, destacamos a ajuda do outro na atividade ou na resolução de
tarefas de aprendizagem. Esta ajuda pode ocorrer em grupos maiores, como toda a
turma, em grupos pequenos ou mesmo em duplas, para a negociação de sentidos durante
a orientação, execução ou controle do processo. A ajuda do outro reflete a importância
do grupo de estudantes para a aprendizagem de cada indivíduo participante do grupo.
É nas interações comunicativas e na ajuda do outro que se difunde a cultura e se
organiza a experiência humana adquirida durante a atividade. Esta interpretação implica
em considerar a comunicação como um conjunto de elementos onde todas as
transformações sofridas por um indivíduo alteram ou afetam os outros (GARCÍA,
2007).
Neste caso, é necessário estabelecer possibilidades para que as relações
competitivas e conflituosas possam evoluir para as interações cooperativas, de
convergência, como forma de contribuir para a substituição de uma participação
individual, onde cada indivíduo realiza sua atividade independente dos outros, ou
sucessiva, na qual a atividade é realizada com dependência de outra realizada
previamente por outros participantes, para uma participação recíproca simultânea de
cada participante com os demais indivíduos (figura 3).

Figura 3 - associação entre a forma de interação e as relações que se estabelecem


As interações comunicativas verbais se caracterizam pelo uso da palavra no
processo de comunicação, tanto de forma escrita como oral. Está centralizada naquilo
que é dito ou escrito e constitui-se como uma das formas mais básicas de comunicação
para a formação de conceitos e habilidades. É preciso compreender quais fatores
influenciam neste processo para que a comunicação planejada e estruturada como
categoria de apoio à formação de habilidades possam desenvolver relações de ajuda
mútua entre os alunos.
A comunicação determina a forma original e individual que tem o indivíduo
quando interage com outros. É, portanto, um objeto da personalidade e já que esta se
orienta para direcionar e participar da comunicação por meio das interações
comunicativas, a personalidade de cada indivíduo define o estilo da comunicação. Cada
pessoa possui um estilo pessoal como forma pela qual o sujeito, em geral, se comunica.
Os principais estilos de comunicação podem ser caracterizados pelas categorias
de extroversão-introversão, centrado nas tarefas e centrado nas relações. No primeiro
deles, existe uma variação na maneira como o indivíduo se expressa desde as formas
mais introvertidas, nas quais as interações são de difícil ativação, acompanhadas das
dificuldades que os participantes têm de se expressar, até formas bem naturais em que
os indivíduos conseguem externalizar seus pontos de vista e suas experiências.
O estilo de comunicação centrado nas tarefas possui a característica de
realização da comunicação em função dos objetivos e finalidades traçados pelo grupo
em que se está realizando as interações comunicativas e o centrado nas relações quando
a comunicação é orientada para dar resposta ao elemento humano, ou seja, voltada para
a preocupação com os outros e para a manutenção do relacionamento entre os
participantes.
5.2 A IMPORTÂNCIA DAS INTERAÇÕES COMUNICATIVAS VERBAIS
NA APRENDIZAGEM
Uma das classificações possíveis para a comunicação está orientada a partir das
interações verbais ou não verbais. As interações comunicativas não verbais, ou seja,
aquelas em que não se usa a linguagem e sim um sistema especial de signos e sinais,
apesar de grande interesse da psicologia e da didática não faz parte da estrutura deste
trabalho.
Nossos esforços estão direcionados para a comunicação verbal, na qual a
linguagem desempenha o papel simbólico de representação de conceitos e ações
concretos, cujas representações estão assimiladas pela mente humana. Ela pode ser oral
ou escrita, a primeira materializada pela fala e a segunda por símbolos que compõem o
que a cultura humana chama de alfabeto.
Em sala de aula, a linguagem oral ou escrita é o instrumento de comunicação
utilizada pelo estudante que tem implicação direta na solução de tarefas de
aprendizagem. Uma vez estabelecida a comunicação é preciso caracterizar o seu
conteúdo e as condições em que ela acontece. É importante identificar e caracterizar o
que é verbalizado pelo estudante, seja de forma oral ou escrita, de que maneira ele se
expressa, para quem ele usa este o aquele objeto da comunicação e em qual situação se
estabelece a comunicação.
Aprendizagem e desenvolvimento são categorias presentes nas discussões da
psicologia histórico-cultural desde a sua gênese. Os trabalhos dos primeiros
representantes desta escola como Vygotsky, Leontiev e Luria apresentavam estas
categorias como elementos chaves de estudo para a psicologia e a educação, a partir da
teoria da atividade. Para Vygotsky (XXXX), no entanto, toda atividade de
aprendizagem desenvolve, mas, a atividade é mais eficiente quando avança o
desenvolvimento.
Uma resposta a esta provocação está explícita no trabalho desenvolvido por P.
Ya. Galperin e seus colaboradores, dentre os quais, os principais são N. F. Talízina e V.
V. Davidov. Para Galperin (XXXX), a atividade de aprendizagem que avança o
desenvolvimento não é qualquer atividade, senão a atividade de orientação. A ideia de
que a aprendizagem avança o desenvolvimento está associado a quatro consequências
que utilizaremos em nosso trabalho:
 A aprendizagem é um processo ativo, portanto o aprendiz deve participar
da elaboração, execução e controle da atividade que conduz à formação
da linguagem interna.
 A função real da atividade é orientar o sujeito no mundo dos objetos
(LEONTIEV, 2001), portanto a atividade de aprendizagem deve ser uma
atividade de orientação investigativa (GALPERIN, 1976).
 A aprendizagem escolar deve ser orientada como uma atividade que
inclua desde o início o sistema dado de conhecimentos e garanta sua
aplicação dentro de limites determinados, articulando dialeticamente
conceito e habilidade como um processo único (TALÍZINA, 1988).
 As interações comunicativas como componentes da atividade de
aprendizagem e da comunicação estabelecem vínculos e relações entre
aprendiz e parceiro mais capaz (professor – aluno), entre iguais (aluno -
aluno) e entre aluno e objeto de aprendizagem que interferem
decisivamente na formação da linguagem interna.
De acordo com Núñez (2014), no contexto escolar, essas características da
aprendizagem são expressas da seguinte maneira:
Na perspectiva adotada por nós, o termo aprendizagem
corresponde à atividade do estudante sob a mediação do
professor e em interatividade com outros colegas no contexto
escolar. A aprendizagem, no contexto escolar, é um processo
ativo, reflexivo e regulado, de apropriação e recriação da
experiência humana (cultura) elaborada pelas gerações
precedentes e atual, sob condições de orientação e interação
social, na qual se integram os fatores afetivos e cognitivos.
Para entender a importância da comunicação no processo de internalização da
linguagem externa em interna, faremos uma breve explicação da Teoria da Assimilação
por Etapas das Ações e dos Conceitos desenvolvida por P. Ya. Galperin e seus
seguidores, focalizando as interações comunicativas. Esta teoria utiliza, como
sustentação teórica, duas principais teses, expostas a seguir:
 A internalização da atividade humana do plano externo ao plano mental
ocorre em etapas.
 Existe uma atividade de orientação investigativa capaz de atingir o plano
mental da linguagem com alto grau de generalização (BOA tipo III).
A formação da ação mental ou da linguagem interna é formada a partir de cinco
etapas, segundo esta teoria. É importante salientar que essas etapas não são
perfeitamente lineares tampouco demonstram uma forma mecânica de explicar a
aprendizagem. O processo de formação de conceitos e habilidades é complexo,
dinâmico e requer um grande esforço de professores e alunos para a elaboração e
execução de uma orientação interativa, na qual todos participam e interagem.
A Teoria da Assimilação por Etapas das Ações e dos Conceitos estabelece um
modelo pedagógico que permite a formação da linguagem interna a partir da linguagem
externa mediante o intercâmbio de suas funções e estrutura. Ao comunicar-se com
outras pessoas, a linguagem se converte em um meio de pensamento para si
(GALPERIN, 2000).
Galperin (2000) estabelece cinco etapas para o processo de assimilação e,
consequentemente, de aprendizagem. De acordo com este autor:
A formação da ação mental passa por cinco etapas. A primeira
pode ser chamada como a criação de um projeto de ação, sua
base de orientação, a qual o aluno se orientará para realizar a
ação. Na segunda etapa se realiza a forma material (ou
materializada) desta ação, sua primeira forma real para o aluno.
Na terceira etapa, a ação se separa dos objetos (ou de suas
imagens materiais) e passa ao plano de linguagem em voz alta.
Na quarta etapa, a ação se realiza mediante a conversação para
si, no entanto imprecisa em seus componentes verbais e
conceituais. Esta ação no plano da linguagem para si na seguinte
etapa se transforma em um processo automático e, em
consequência disto, precisamente na sua parte verbal se separa
da consciência; assim, o processo verbal se converte em um
processo oculto e, em seu sentido mais complexo, em um
processo interno.
Em uma reconstrução destas etapas em outro trabalho (GALPERIN, 2000-b),
este pesquisador funde as duas últimas etapas em apenas uma e reestabelece as etapas
como quatro:
 A formação da base orientadora da nova ação.
 A formação do aspecto material desta ação.
 A formação de seu aspecto linguístico.
 A formação da ação como um ato mental.
Consideramos que a comunicação tem uma forte influência em todo o processo
que caracteriza a formação da ação, em cada uma de maneira diferente, situação esta
que exploraremos a seguir. Galperin considerava que a motivação é uma categoria que
deveria ser mantida em todo processo de assimilação, motivo pelo qual não a
acrescentou como etapa do processo, devido a seu caráter sistêmico. Coube a N. F.
Talízina realizar essa tarefa e incluir a motivação como primeira etapa do processo
formativo que garante a assimilação de uma ação ou conceito. Para Talízina (2000):
Sem dúvida, cada aluno tem suas particularidades, entre outras
coisas, em sua esfera motivacional. Idealmente, as vias para a
formação dos motivos para o estudo, se devem formar
considerando o nível de partida da motivação escolar de cada
estudante e suas características individuais.
É importante comentar aqui que Talízina (2000, 1988) não nega o caráter
sistêmico da motivação, ou seja, que ela deva ser mantida durante todo o processo de
assimilação, porém, ela deve ser componente do diagnóstico da turma frente a o
processo formativo, de maneira a subsidiar a orientação de estudo.
Reconstruímos então as etapas propostas por Galperin (2000-b) e Talízina
(1988), da seguinte forma:
 A formação da motivação.
 A formação da base orientadora da nova ação.
 A formação do aspecto material desta ação.
 A formação de seu aspecto linguístico.
 A formação da ação como um ato mental.
A seguir, discutiremos a importância da comunicação em todo processo de
formação por etapas propostas pela teoria de P. Ya. Galperin, de forma a subsidiar
teoricamente nosso trabalho.

5.2.1 As interações comunicativas verbais no processo de motivação


A formação integral do ser humano requer um processo educativo motivado de
forma que o aluno seja um sujeito ativo de sua aprendizagem e de seu desenvolvimento,
de maneira consciente. Neste aspecto, a Teoria da Assimilação por Etapas, não apenas
deve garantir o processo que relaciona o aluno com seu objeto de estudo, ou seja, os
conceitos e as ações, mas também estimular a maneira pela qual cada estudante
concretiza suas necessidades e compartilham com os colegas. Segundo Lomov (2006), o
estudo da comunicação é muito importante, em particular, para a compreensão dos
mecanismos da formação dos objetivos e da motivação.
A motivação tem sua importância no processo de desenvolvimento integral do
estudante. Conforme alerta Núñez (2013):
O estudante se desenvolve e, ao internalizar os sistemas de
relações sociais, modifica seu lugar nesses sistemas de relações.
O desenvolvimento intelectual se expressa em novas motivações
da atividade de estudo e em novas atividades que, como uma
espiral, pautam ciclos de desenvolvimento interligados.
O importante não é apenas responder a uma atividade, é buscar a implicação
entre as necessidades dos alunos e o produto final que deve ser alcançado como objetivo
desta. Neste sentido é necessário proporcionar a interação entre os indivíduos, para que
a motivação ocorra também na relação sujeito-sujeito. Para Talízina (1986):
A atividade do sujeito sempre responde a alguma necessidade
sua, está dirigida ao objeto capaz de satisfazer esta necessidade.
Este objeto impulsiona e dirige a atividade do sujeito. O estudo
representa uma atividade propriamente dita só quando satisfaz a
necessidade cognitiva.
A necessidade de uma satisfação é de fundamental importância para o
desenvolvimento eficiente da atividade. O termo motivação procede do vocábulo latino
motus e tem a ver com aquilo que mobiliza o sujeito para executar uma atividade,
popularmente, uma pessoa está motivada quando empreende algo com ilusão,
superando o esforço que deva realizar para obter uma recompensa. É um processo
psicológico pelo qual alguém se coloca frente a um objetivo, utiliza os meios adequados
e mantém a conduta com o fim de conseguir uma meta. No entanto essa meta pode ser
compartilhada de forma que o que mobilize um indivíduo possa mobilizar também um
grupo.
O papel do professor no processo de motivação reside em transformar a
necessidade social em motivo de aprendizagem para o estudante. Essas necessidades
podem não fazer parte da consciência dos estudantes, neste caso, o processo de
motivação permite uma maior satisfação na assimilação de habilidades e conceitos e,
podem ser concretizadas no processo comunicativo de negociação entre professor e
aluno e entre os alunos.
É necessário que o estudante saiba que o domínio de uma habilidade ou conceito
é fundamental para resolver problemas que envolvam o conhecimento científico. O
acesso a essa informação se dá por meio da comunicação verbal em que professores e
alunos discutem as possibilidades de resolução dos problemas. Para que a necessidade
se transforme em ação, cada indivíduo experimenta um processo psicológico complexo
que envolve o contato com o objeto e com os outros indivíduos participantes e as
categorias motivação, atividade e comunicação. De acordo com Majmutov (1983),
durante esse processo o homem interioriza e compara os aspectos subjetivo e objetivo
da necessidade e da ação destinada à sua satisfação.
Conforme discute Talízina (1988) a motivação é a “etapa zero” da atividade de
assimilação, nela ainda não são introduzidos os conceitos e as ações, contudo, é o
momento em que se prepara o estudante para a assimilação destes. O problema da
motivação é muito importante e não se pode avançar para novas etapas se esta condição
não estiver assegurada. Neste momento é imprescindível vincular o conteúdo
apresentado com o mundo que o cerca, as atividades desenvolvidas diariamente e em
alguns casos, como é o caso de um estudante de licenciatura em Física, por exemplo, a
sua futura atividade profissional.
A utilização de vários meios como vídeos, equipamentos experimentais, internet,
entre outros, podem contribuir significativamente nesta fase, a qual influencia as
demais, ao mesmo tempo em que pode ser influenciada pelas imagens que o individuo
tem de suas capacidades e potencialidades. Há uma relação dialética entre motivação e
consciência, de forma que, do mesmo jeito que a motivação é uma etapa necessária para
a formação e o desenvolvimento da consciência sobre o caráter objetal da atividade de
aprendizagem, a consciência da clareza dos objetivos é fundamental para atingir, de
forma motivada, o resultado da aprendizagem.
Compartilhamos a ideia de que a motivação é eficiente quando se baseia em
situações problemas. Majmutov (1983) explica que a orientação do processo de
aprendizagem tem uma estrutura psicológica não apenas em relação ao conteúdo, mas
também em relação à motivação pessoal. Para este autor, as situações problêmicas
tendem a cumprir as seguintes finalidades didáticas:
 Atrair a atenção do aluno para a pergunta, a tarefa ou a questão docente;
despertar o interesse cognitivo e outros motivos da atividade.

 Cobrar dos alunos um nível de dificuldade cognitiva acessível, cuja


superação intensifique sua atividade mental.

 Propiciar que os alunos descubram a contradição existente entre a


necessidade cognitiva desenvolvida por ele e a impossibilidade de
satisfazê-la mediante os conhecimentos, as habilidades e os hábitos que
ele tem assimilado.

 Ajudar o aluno a determinar a tarefa cognitiva no questionamento e no


exercício do problema fundamental e traçar o plano para buscar as vias
de solução da dificuldade, na conduzindo-o a uma atividade de pesquisa.

 Ajudar o aluno a determinar os limites dos conhecimentos assimilados


anteriormente que se atualizam e assinalar a direção da pesquisa por uma
via mais racional para superar as dificuldades.

A motivação inclui as situações problêmicas que uma matéria ou área do


conhecimento podem auxiliar na resolução e explicação, associando o conteúdo
específico com questões da cultura geral que envolve a ciência, a tecnologia, a
sociedade e o trabalho. A familiarização com as situações problêmicas pode ampliar a
capacidade de distinguir diversas ocasiões, nas quais uma resposta demonstrou, em
outros momentos, ser a que proporciona uma maior expectativa de sucesso.
As situações problêmicas para resolver determinada tarefa são as mesmas
independentes da consciência ou a personalidade de cada licenciando, no entanto,
consideramos que cada um terá uma interpretação diferente destas situações conforme
seu histórico pessoal de interações sociais. Neste aspecto, o processo de motivação deve
ser compartilhado entre os sujeitos da aprendizagem de forma que dois pressupostos
possam ser contemplados:
 Cada participante do processo de aprendizagem deve ter consciência do
que já assimilou sobre o objeto de estudo.
 As interações comunicativas devem permitir uma orientação coletiva
para que se realize a formação ou a atualização do conceito ou
habilidade.
O trabalho de Wertsch (1984) apresenta um conceito para representar esta
conjuntura. Este autor propõe o termo “definição de situação” como representação de
um conjunto de ideias em determinado contexto social que são externalizadas no
processo de interação comunicativa. Neste aspecto, cada indivíduo desenvolve uma
representação dos objetos a serem assimilados, de forma ativa, a partir do seu nível de
desenvolvimento e do contato com os sentidos atribuídos por outros indivíduos.
Em nossa concepção a simples apresentação de uma situação problêmica
estabelecerá várias representações individuais diferentes para cada indivíduo,
mobilizadas por sua história tanto cognitiva como afetiva em relação ao problema
apresentado. Isso significa que cada licenciando no processo de formação ou atualização
da habilidade de descrever estabelecerá uma definição da situação problêmica que será
distinta dos outros colegas e do professor.
A justificativa que apresentamos para este acontecimento está embasada na ideia
de que as situações problêmicas aparecem quando, durante a assimilação de um objeto
de estudo, como por exemplo, a habilidade de descrever, os alunos se deparam com
informações já conhecidas e outras que ainda não foram apropriadas. Sendo assim, a
definição da situação problêmica, capaz de motivar o aluno em direção à sua resolução
segue três possibilidades:
1. Os conhecimentos assimilados anteriormente não são suficientes para
resolver problemas em novas condições práticas.

2. Contradição entre o resultado prático alcançado na realização de uma


tarefa e a falta de conhecimento teórico para sua explicação.

3. Contradição entre o modelo teórico para solucionar uma tarefa e uma


situação prática estabelecida.

As possibilidades apresentadas estabelecem uma relação entre o pensamento


teórico desenvolvido já desenvolvido pelo licenciando e uma situação prática
estabelecida na tarefa de motivação. Consideremos, por exemplo, um experimento que
envolva um pêndulo simples, neste caso, sabe-se que o período de oscilação deste
objeto é proporcional á raiz quadrada do comprimento do pêndulo e não depende de sua
massa.
Considerando que massa, período e comprimento são grandezas físicas que
podem ser quantificadas por intermédio de uma unidade de medida por simples
comparação com padrões pré-estabelecidos, alunos que não assimilaram essas
informações e até mesmo como medir essas grandezas estão inseridos na categoria 1 de
definição de situação problêmica. Ele não conseguirá descrever as relações citadas
anteriormente porque desconhece as próprias grandezas que fazem parte destas relações
ou mesmo a forma de medir essas grandezas.
O licenciando que não houver assimilado os conceitos de relações de
dependência entre variáveis e particularmente o grau de proporcionalidade destas
relações estará no segundo nível (2) de definição de situação problêmica. Mesmo que
ele saiba qual o objetivo da atividade que, neste caso, é descrever as relações entre o
período do pêndulo, massa e comprimento, ainda não terá assimilado as ações
necessárias para a realização da mesma.
Por fim, outra forma de produzir uma situação problêmica é o aluno ter
assimilado um modelo teórico que não é suficiente para resolver a tarefa. Neste caso,
pode ser que ele pense, inicialmente, que o período do pêndulo depende da massa e é
diretamente proporcional ao comprimento (e não à sua raiz quadrada). Além disso,
exemplo que estamos utilizando é possível que as informações obtidas
experimentalmente não sejam exatamente iguais às apresentadas na equação do pêndulo
simples, desenvolvida por uma demonstração matemática a partir da utilização de um
modelo newtoniano. Situações como estas caracterizam a terceira (3) possibilidade
dentre as que apresentamos.
As três possibilidades de definição de situações problêmicas que elencamos não
são excludentes entre si, tampouco remete a uma hierarquização quantitativa. Estamos
estabelecendo, a partir destas possibilidades, características que podem orientar a
motivação dos alunos, quanto ao aspecto cognitivo.
A motivação está associada a dois pares dialéticos muito importantes no
processo de interações comunicativas. Trata-se dos pares dialéticos do individual-social
e do intrínseco-extrínseco. Claramente podemos diferencial o individual do social a
partir de outra relação dialética que ocorre entre a subjetividade e a objetividade do
processo de assimilação humana. Ao mesmo tempo em que um indivíduo assimila uma
atividade a partir de seu caráter objetivo ele a recria de maneira singular, situação esta
que permite a evolução não apenas do sujeito, mas também da sociedade, já que o
produto de sua criatividade em algum momento será externalizado.
A motivação individual parte das necessidades humanas que o sujeito assimilou
e tem consciência. Vale salientar que, seguindo uma orientação epistemológica
materialista, esta motivação já foi social e, a partir do processo de atividade e
comunicação, as ações do tipo sujeito-objeto e as interações sujeito-sujeito subsidiaram
a internalização desta motivação. Segundo Núñez (2013):
É bom esclarecer que o desenvolvimento não está pautado só
pela dimensão social. O enfoque do materialismo dialético
sobre o desenvolvimento humano reconhece a dialética entre os
condicionantes sociais e a educação com os motivos, as
necessidades, os desejos do indivíduo. Assim, deve-se
considerar a dialética do social com o individual.
Em relação ao par dialético intrínseco-extrínseco, os licenciandos podem estar
motivados a partir da satisfação gerada pela própria atividade de estudo e na aquisição
de conhecimentos e habilidades que o preparem para uma melhor compreensão do
conteúdo da física enquanto ciência natural bem como para sua atuação atual ou futura
como docente desta disciplina. Esta forma de motivação, interna à atividade, é
classificada como motivação intrínseca. Da mesma forma, o motivo pode ser orientado a
partir de fora da atividade de estudo a partir de uma via externa à assimilação de conhecimentos
e habilidades. Neste caso, classificaremos as formas de motivação como uma
combinação dos quatro polos formados por estes dois pares dialéticos conforme a figura
1.

Figura 1 - Tipos de motivação a partir da relação dialética entre o geral e o individual e entre o
intrínseco e o extrínseco.
A motivação intrínseca favorece a manifestação de interesses cognitivos, de
forma espontânea nos licenciandos, induzindo-os para a aprendizagem de habilidades
cognitivo-linguísticas, suas categorias, conceitos e formas de ação necessárias à
assimilação autônoma destas habilidades. Uma atividade de aprendizagem que
estabeleça como processo motivacional as situações problema está embasada nesta
categoria de motivação como a mais eficiente para manter a atividade motivada durante
todo processo de assimilação de habilidades e conceitos.
A forma como a escola se organiza, nos dias atuais como um reflexo de nossa
sociedade, não privilegia a motivação intrínseca, uma vez que, não considera que os
critérios para aprovação de um estudante seja a aprendizagem de conhecimentos e
habilidades. A formação é movida por motivações extrínsecas como atingir uma nota
mínima, obter o título desejado para cumprir as regras sociais ou melhorar a sua
possibilidade de obter um bom emprego que, para a nossa sociedade, se resume em uma
boa remuneração.
Os processos de formação devem ser orientados para considerar que a motivação
intrínseca é mais eficiente, no entanto, quando a extrínseca está presente e nao pode ser
descartada, é essencial que esta seja direcionada para a formação de interesses
cognitivos e sociais nos licenciandos, ou seja, o anseio de adquirir conhecimentos e
habilidades úteis para sua atividade profissional em forma de uma motivação autônoma
para a aprendizagem de habilidades cognitivo-linguísticas.
As interações comunicativas tem um papel importante no processo de
motivação, precisamente na possibilidade de ativar a motivação intrínseca, a partir da
elaboração de situações problemas adequadas ao nível de desenvolvimento dos alunos
da formação inicial do professor de Física. Neste contexto, assimilar todas as situações
problemas por meio do processo de atividade objetal, na relação sujeito-objeto, seria
equivalente a assimilar todo o processo histórico-social de construção destes problemas
que, em nossa opinião, levaria um tempo muito grande.
Uma forma de diminuir o tempo para estabelecer essas situações problêmicas é
utilizando o processo comunicativo como referência para apresentar e compartilhar
entre os participantes do processo formativo tais situações, sob a orientação do
professor e com a participação dos colegas de turma.
Outra função das interações comunicativas no processo de motivação é
estabelecer relações entre a motivação extrínseca e a intrínseca, de forma que, as
recompensas externas ao conteúdo da assimilação possam ser associadas ao aspecto
cognitivo desta. Considerando, por exemplo, que o aluno tenha que ser avaliado por um
conceito, seja ele quantitativo ou qualitativo, é importante que haja um esforço para que
ele entenda que esta o processo de aprendizagem é o que realmente gera esse conceito,
ou seja, na impossibilidade de materializar a qualidade da aprendizagem, utiliza-se de
uma representação desta.
As interações comunicativas no processo de motivação podem ser
desencadeadas a partir de três elementos fundamentais do processo educativo. São eles
os aspectos acadêmicos, laborais e investigativos que, a partir da relação dialética entre
teoria e prática complementam-se no questionamento sobre que sentido científico,
prático e humano tem o conhecimento a ser adquirido e as possíveis soluções.
Estes elementos podem ser subdivididos em:

 Acadêmicos: são os que favorecem a formação e o desenvolvimento de


conhecimentos, hábitos, habilidades, habilidades e atitudes para o seu
desempenho presente e futuro.

 Profissionais: Estão relacionados à atuação profissional na realidade


material da sala de aula, comportando a ligação entre a teoria, a prática e
o desenvolvimento de interesses cognitivos.

 Investigativos: motivação que causa a produção do conhecimento de


maneira criativa quanto às soluções teóricas e metodológicas, articulando
a explicação da realidade à solução de problemas.

No tratamento específico de atividades práticas experimentais no ensino de


Física, Laburú (2006) lista uma série de orientações para subsidiar a elaboração e a utilização
destas atividades em sala de aula, com a finalidade de prender a atenção do aluno e manter a
motivação. As orientações são as seguintes:
 Explorar a novidade ou o lúdico: explorar o viés do curioso ou
inesperado e o último pela provocação de sensações de prazer ou pelo
desafio. Na sequência é preciso evitar que tudo acabe em simples
entretenimento.

 Interesse pelo apelo social: são os contextos cotidianos que têm sentido
para o aluno, que despertam seu interesse e favorecem uma disposição
positiva para a aprendizagem. Considera-se que o aluno tenha
necessidade de satisfação emocional de se perceber como parte de um
grupo, de manter contato com outras pessoas. Isso deve ser aproveitado
como elemento motivacional. A atividade experimental deve ser
planejada para manter a atenção do aluno o maior tempo possível e não
ficar apenas naquele momento inicial.

 Domínio das ações empreendidas: a motivação pode decair rapidamente


e se perder se o aluno ficar sem domínio do entendimento das suas ações
empreendidas em seguida ou durante as diversas partes de uma atividade
experimental. Se isso acontecer, mesmo havendo uma motivação inicial,
há uma perda de conexão entre as partes ou procedimentos da atividade.
Com isso as ações passam a ser simples operacionalizações mecânicas,
desmotivadas, de baixa significação e sem sentido.

 Para manter o aluno interessado, a situação precisa apresentar significado


para ele, precisa ter sentido, um valor, um desejo. Uma pessoa se
mobiliza para alcançar um objetivo que a motiva e se sente motivada por
algo que a mobiliza.

 Precisa existir uma aproximação e sentido para evitar o decaimento


rápido da motivação.

 Forma operacional para constatar se uma atividade experimental


planejada se mostra bem sucedida: Algumas condutas que se esperam
observar quando alguém se encontra em um estado motivado ou não:
condutas de engajamento, esforço ou persistência empenhada na
atividade, qualidade de desempenho na realização da tarefa.

Em geral, tudo que é feito pela primeira vez desperta mais atenção pelo simples
fato de ser novidade. Nesse aspecto, pode ser explorado o curioso, o inesperado,
despertando sensações de prazer e satisfação. Por outro lado, alguns experimentos têm a
característica de promover desafios, explorando a competitividade entre os alunos, tão
comum nos adolescentes. É importante desenvolver estratégias para que essa motivação
inicial se mantenha durante a execução da atividade e não fique apenas no campo do
mágico, diferente, engraçado ou esquisito, por isso, a exploração da novidade e do
lúdico, caracterizada por uma satisfação de baixo nível e superficial, vai sendo aos
poucos substituída por uma satisfação intelectual internalizada pela aprendizagem dos
conteúdos. A motivação é um processo permanente do processo docente-educativo, está
constituída por um grande número de impulsos psicológicos e educativos que devem
estar presentes a través de toda a aula e todo o curso, não meramente ao principio de
uma ou outro.
A segunda orientação está relacionada à interação dos alunos com seus pares e
com a sociedade a qual ele pertence. Em nossa experiência, percebemos a dificuldade
de aprender alguns conteúdos, por parte dos alunos, devido à impossibilidade de discutir
ou conversar com outros colegas de classe, familiares ou seus contatos em geral. Isso
acontece porque os currículos escolares, em geral, são diferentes das necessidades
sociais relacionadas a esses conteúdos, afastam o aluno, que não se sente parte
integrante do grupo que o domina esses currículos. É necessário aproximar o aluno do
contexto social ao qual ele pertence e também do contexto social da própria ciência e
suas aplicações mais cotidianas como a indústria, a medicina, entre outros. Para os
alunos se sentirem motivados, o material de estudo de cada unidade do programa deve
estar contextualizado.
Dominar as ações empreendidas é a terceira orientação para cativar os alunos.
Os elementos devem se apresentar nas situações e as formas em que realmente se usam,
o que se apresenta em uma unidade deve se referir a um tema ou uma situação que
realmente motive os alunos. O professor deve utilizar sabiamente esta motivação,
cuidando para valorizar com justiça o estudante e incentivá-lo a realizar os esforços
necessários, participar nos encontros, cumprir com os deveres, consultar a bibliografia e
outras ações que compõem a atividade.
Enfim, deve haver um esforço para se realizar o controle desta motivação. Não
se atinge os resultados de sucesso se não registrarmos os resultados sejam eles positivos
ou negativos. O professor deve observar como o aluno se empenha durante a atividade e
como esse empenho se converteu em aprendizado por meio de tarefas de controle que
privilegiam a assimilação de conhecimentos, habilidades e hábitos.
A assimilação de conhecimentos e habilidades no ponto de vista de Galperin e
seus seguidores, na qual as interações comunicativas são tratadas como a continuidade
do trabalho de Vygotsky, os recursos cognitivos e afetivos que dispõe os licenciandos,
sua história de vida, seus interesses, desejos, necessidades e motivos precisam ser
analisados a fim de estabelecer situações adequadas para que ocorra uma aprendizagem
eficiente que tribute para o avanço do desenvolvimento do sujeito, no seu grupo, sem
que este perca sua individualidade.
5.2.2 As interações comunicativas no processo de elaboração da base
orientadora da ação
A segunda etapa de assimilação é caracterizada pela construção do que Galperin
chamava de um projeto de ação, ou seja, algo que possa servir de apoio para guiar o
aluno na realização de uma ação (GALPERIN, 2001). Esse plano de ação que foi
denominado de base orientadora da ação (BOA) pode ter numerosas formas de ser
implementado, no entanto, principalmente na atividade de aprendizagem pode ser
resumido em três formas básicas para se internalizar a cultura desenvolvida pela
humanidade em linguagem interna.
Investigando as diversas formas como a base orientadora da ação era
desenvolvida, reduziu suas concepções em três tipos fundamentais que representam
modelos de ensino distintos quando se leva em consideração o papel do professor e do
aluno durante o desenvolvimento da orientação. Os três tipos generalizados de
orientação estão exemplificados abaixo de maneira reduzida, conforme explicita
Galperin (2001a, p. 41):
Se o sujeito não pode formar uma imagem orientadora completa
da nova ação e o experimentador não pode ajudar, esse quadro
está incompleto e se obtém primeiro tipo de orientação. Se o
mesmo experimentador mostra ao sujeito a base orientadora
completa da ação e exige uma investigação intensa sobre ela,
obtemos o segundo tipo. Finalmente, se o sujeito constrói uma
imagem orientadora completa de maneira individual, temos
então o terceiro tipo de orientação para a tarefa.
O primeiro tipo de orientação, proposto por Galperin, apresenta algumas
deficiências e incoerências, as quais transformam o modelo em uma categoria de
orientação insuficiente, quando comparada a outras. A orientação, neste caso, transcorre
a partir de indicadores particulares, se aproximando muito da simples execução de
operações se baseia praticamente em situações de tentativa e erro, limitando a
transferência do conhecimento.
Em um processo de ensino e aprendizagem que utiliza uma orientação desse
tipo, o aluno é um mero reprodutor do objeto de aprendizagem, realizando
superficialmente a tarefa, onde o principal objetivo está na execução e no resultado. O
processo de formação ocorre lentamente, em um processo de “diferenciação
desordenada, de repetições das bases orientadoras e movimentos forçados” (Galperin,
2001a, p. 42).
O segundo tipo de orientação, que representa o formato de ensino e
aprendizagem realizados no ensino tradicional, é apresentada de forma elaborada e
completa aos estudantes, entretanto de forma muito particular, o que permite aplicação
para apenas um exemplo. Infelizmente a exigência de uma orientação completa não
segue em todo processo da ação, que desconectada, não controla as demais etapas de
assimilação e retorna-se a tentativa e erro. Geralmente, não existe o retorno às
orientações, a explicação de suas conexões e relações objetivas que são muito
importantes no processo de execução de uma atividade.
Para o segundo tipo de orientação é necessário o apoio de uma organização
externa rigorosa, para que o estudante tenha todas as condições de executar a ação que
posteriormente acaba por ser fracionada em relações particulares. De acordo com
Galperin (2001a, p. 43):
A mudança sistemática do material conduz à generalização
sistemática da ação, porque, como a ação é executada em uma
ordem invariável, em seguida, rapidamente molda o estereótipo
dinâmico. A Análise da situação é abreviada para o
reconhecimento e execução das operações que ocorrem sem
uma comparação antecipada, então a ação é desenvolvida para
automatizar todo o processo.
A formação nesta forma de orientação avança rapidamente, como boa precisão e
poucos erros, no entanto, a transferência de conhecimento é muito limitada e sempre
que precisar elaborar uma nova ação, os conceitos e as imagens formadas (de formas
limitadas e generalizadas) apenas permitem que a aproximação seja realizada com
indicadores de orientação precisos. O processo é pouco dialético, já que o resultado da
orientação anterior contribui pouco para as imagens sensoriais que o aluno forma para
uma nova ação demandando sempre muito tempo e esforço todas as vezes que uma
nova orientação for necessária.
O terceiro tipo de orientação é distinto dos anteriores devido ao caráter completo
e generalizado que permitem aos estudantes construí-lo individualmente a partir de
procedimentos gerais fornecidos pelo docente.
Resumindo então as formas de orientação, temos:

 BOA tipo 1: o aluno constrói uma imagem incompleta da nova ação sem
a ajuda do professor ou dos colegas.
 BOA tipo 2: o aluno recebe uma orientação completa, no entanto, esta
exige uma grande investigação do primeiro.
 BOA tipo III: o aluno constrói uma imagem orientadora completa
individualmente.
Atualmente, a escola tem que lidar com uma grande quantidade de
conhecimento devido ao próprio fluxo de produção de informação que se intensificou
muito nas últimas décadas e particularmente nos últimos anos. O terceiro tipo de
orientação, a BOA tipo III, tem por característica formar no indivíduo habilidades
gerais, em detrimento de tarefas particulares, com um grande potencial de transferência
à diversos contextos. Ao contrário da BOA tipo 2, a qual não iremos aprofundar neste
trabalho, a BOA tipo III permite uma orientação completa individual do aluno, não para
tarefas particulares e sim para as propriedades e relações essenciais que permeiam o
objeto em determinada área do conhecimento. Conforme explica Galperin (2001), sobre
a BOA tipo III:
Estudando a formação das ações mentais e posteriormente, a
formação de conceitos, nos convencemos de que esse processo
de formação se determina pelo caráter orientador da ação. Isto
nos conduziu a mudar o enfoque da investigação e
questionarmos não como se forma a nova ação (na solução de
problemas de um mesmo gênero), e sim que condições são
necessárias para que a nova ação possa ser executada rápida e
corretamente.
Para elucidar essa ideia, tomamos como modelo um elemento da comunicação
científica, a descrição em um experimento físico. A orientação que defendemos nesse
trabalho, como mais eficiente para que a aprendizagem da habilidade de descrever
aconteça de forma rápida e correta, consiste em capturar juntamente com os alunos a
essência do que seja descrever em um limite determinado (ciências naturais para o
nosso caso), ou seja, quais são as condições necessárias e suficientes para realizar uma
descrição em ciências naturais (invariante). Esta proposta atribui à etapa de orientação
uma grande importância em todo o processo de aprendizagem, visto que é nessa fase em
que o aluno planeja todo o percurso da formação, evidente com a ajuda do professor e
dos colegas.
Neste contexto, o conceito de invariante é fundamental para o desenvolvimento
desta forma de orientação. Não se trata de uma orientação de ações particulares de uma
atividade, mas da busca das habilidades essenciais, ou seja, do domínio das ações
necessárias para desenvolver e diferenciar qualquer tarefa no interior de uma mesma
área.
Ainda nesta construção são estabelecidos três invariantes para esta habilidade: o
modelo conceitual, o modelo de habilidade e o modelo do controle. Estas instâncias
formam a invariante pela qual o aluno irá se orientar durante todo o processo de
aprendizagem, de forma individual, mas sempre com o apoio de outros, em constante
interação. O modelo da invariante conceitual revela a essência do objeto, enquanto que
o modelo de habilidade apresenta as ações necessárias para utilizar o conceito e por fim,
o modelo do controle está relacionado ao domínio necessário para estabelecer se o
conceito e habilidade estão sendo formados.
É nesta etapa, ou seja, da construção da Base Orientadora da Ação (B.O.A.) que
os licenciandos têm acesso à estrutura da nova atividade, os conceitos que a formam, as
ações necessárias e as condições para a sua realização. Esta orientação deve ser uma
atividade nova para o estudante, de forma que se realize uma formação completa de
uma nova habilidade ou conceito ou a sua atualização em determinado limite
estabelecido por áreas específicas do conhecimento. É a novidade da nova habilidade ou
as características de sua atualização que estimula os motivos e as necessidades para a
solução dos problemas apresentados.
Este artifício permite que os estudantes elaborem em conjunto com o professor o
modelo das atividades, é neste estágio que o aluno deve ter pleno conhecimento do que
vai ser exigido no objeto da ação, as condições em que a atividade será executada e o
controle dos seus limites de aplicação.
A orientação representa a pedra angular da teoria psicológica de Galperin, que
posteriormente, através dos trabalhos de N. F. Talízina, incluindo o tratamento de
formação de habilidades de nível superior, se transforma em teoria pedagógica. Talízina
estende a estrutura das etapas de assimilação e enfatiza o papel preponderante do
professor nas etapas de motivação e de elaboração da base orientadora da ação (B.O.A.)
como conselheiro que possibilita aos alunos a obtenção dos elementos e condições
necessárias para adequar a nova ação à sua psique.
A etapa de orientação consiste no planejamento de como o indivíduo vai realizar
a atividade. O aluno, com a ajuda do professor, deve pensar criticamente sobre a
atividade que será realizada, como ela se estrutura, quais são as condições necessárias,
os recursos disponíveis e as qualidades da ação. É essa consciência acerca da atividade
que permite o autocontrole, a regulação e o aprender a aprender.
A execução de uma tarefa pelo indivíduo implica a existência de um objetivo
que está relacionado com uma razão, ou seja, um motivo, o que caracteriza a ação como
direcionada para um objeto material ou ideal. A execução de uma ação pressupõe a
existência de uma representação específica, mesmo que parcial, que direciona o agente
executor para avaliar se há conformidade com as condições impostas pela orientação.
Outra característica de uma ação é sua relação com um conjunto específico de
operações que devem ser conhecidas pelo indivíduo para que a atividade de
aprendizagem seja eficiente.
Talízina (1988) esclarece que a B.O.A. tipo III tem uma composição completa e
generalizada e, além disso, pode ser aplicada como meio de orientação para a
aprendizagem de um conjunto de fenômenos e tarefas de uma mesma classe. Esta
característica confere a este tipo de orientação uma vantagem em relação às outras, já
que o licenciando pode construí-la de forma independente, com o apoio de métodos
gerais. A atividade, segundo esse tipo, forma-se rapidamente com poucos erros e se
caracteriza por sua estabilidade, seu alto nível de generalização e, portanto, por uma
maior transferência a situações novas, com potencial para o desenvolvimento da
criatividade.
A B.O.A. tipo III, além de completa e generalizada, se forma fácil e rapidamente
e pode ser dividida, segundo Galperin, em três etapas citadas a seguir:
 A formação da análise geral.
 A aplicação a uma determinada tarefa (com disposição da imagem e
material).
 A formação da ação específica através da execução de uma tarefa
particular.
A organização da orientação não deve ser pensada apenas nos momentos iniciais
da atividade de estudo, os momentos de execução, regulação e ajuste dependem e são
previstos na B.O.A. III, durante a execução da tarefa, o aluno deve regular suas ações
pelo sistema de padrões e indicadores desta orientação.
A importância da comunicação e das interações comunicativas na etapa de
orientação, seguindo a B.O.A. tipo III, reside no fato de que esta orientação pode ser
construída com o apoio da materialização da própria atividade como objeto de
aprendizagem, já que esta é construída pelo aluno por meio de um processo da busca da
invariante, no entanto, é uma atividade compartilhada entre os participantes do processo
formativo.
O professor pode ter acesso ao nível de formação da habilidade de todos os
alunos individualmente, por meio de um diagnóstico inicial, e da invariante da
habilidade por meio do desenvolvimento da sociedade, como um elemento histórico e
social, construída cientificamente a partir de uma estrutura invariante. Esta situação
garante ao profissional formador realizar uma aproximação da estrutura construída
socialmente da zona de desenvolvimento proximal do aluno, planejando uma tarefa que
promova a negociação dos sentidos atribuídos à habilidade de descrever por cada
licenciando, ao mesmo tempo em que participa como representante da invariante já
construída socialmente pela comunidade científica.
Este processo de negociação de sentidos para a habilidade descrever requer dois
tipos de interação comunicativa. Em primeiro lugar ocorre a interação entre iguais, os
licenciandos em dupla interagem entre si para determinar uma posição deste par de
indivíduos em relação ao conceito e as ações necessárias para por em prática a atividade
de descrever na atividade científica. Em seguida, as estruturas conceituais e
procedimentais desenvolvidas pelos alunos são compartilhadas com todo o grupo com a
finalidade de realizar uma comparação com a invariante desenvolvida cientificamente.
Sobre todo esse processo de negociação de sentidos e significados, Núñez (2013)
estabelece as seguintes diretrizes:
Os estudantes, com a orientação do professor, desenvolvem um
processo de ressignificação dos sentidos dos conteúdos
levantados no diagnóstico inicial. Os alunos devem estruturar o
esquema de orientação geral, como suposições ou hipóteses que
encaminham os processos de solução do sistema de tarefas do
mesmo tipo propostas assim como o conceito em relação a sua
definição, processando, paulatinamente, a informação de que
dispõem para organizá-la em função dos problemas e tarefas
propostos. Ao se estabelecer a BOA, definem-se seus três
modelos a serem utilizados para a resolução de todas as tarefas
dentro dos limites de generalização. Além disso, ela é
materializada (modelizada) nos chamados cartões de estudo
como apoio externo para a etapa materializada. Esse processo
não é uma descoberta da B.O.A. realizada unicamente pelos
estudantes e tampouco a disponibilização do modelo pronto pelo
professor, mas sim uma construção negociada de sentidos e
significados entre alunos e professor.
É importante frisar que nesta etapa, o estudante participa ativamente, se reunindo
em duplas e discutindo todas as operações necessárias ao desenvolvimento da ação de
forma estendida e minuciosa enquanto o professor assume o domínio destas operações e
fornece as orientações necessárias. O motivo principal desta fase não inclui o
desenvolvimento de ação material, mental ou verbal por parte do aluno, entretanto, é
necessário manter a discussão a respeito da mudança de um estado objetal, das tarefas
necessárias para permitir a generalização do conteúdo da ação em vários sentidos.
5.2.3 As interações comunicativas na etapa de formação da ação no plano
material ou materializado

A primeira forma da ação que o indivíduo tem acesso é a forma material ou


materializada, que é o conhecimento que pode ser assimilado desde o início de forma
sensorial. Mesmo que os objetos da ação sejam pouco acessíveis, em sua origem, é
necessário investigar as representações existentes acerca destes como forma de conceber
essa materialização inicial condicionada às relações essenciais dos objetos.
Nesta etapa realiza-se a manipulação dos objetos quando é possível ter acesso a
estes em sua forma material ou, de suas representações, situação esta que caracteriza
uma materialização do objeto de aprendizagem. No caso da habilidade de descrever, as
operações realizadas nesta etapa dizem respeito a uma materialização por meio das
invariantes conceituais e procedimentais desta habilidade cognitivo-linguística e de sua
orientação.
É nesta fase que os alunos realizam interações comunicativas em duplas, em um
processo de ajuda mútua. O conteúdo da orientação, construído na etapa anterior é
materializado em cartões de estudo ou mapas de atividades que compõe a estrutura
invariante da habilidade a ser formada a partir de três modelos: conceito, ações e
controle. Estes cartões ou mapas servirão de esquemas referenciais de ajuda para a
realização de tarefas que envolvam a habilidade de descrever e, é por isso que, o seu
conteúdo é composto da Base Orientadora da Ação (B.O.A. tipo III), desenvolvida
individualmente por cada aluno no processo de negociação que ocorreu na turma.
Neste caso, os cartões de estudo são um resultado da interação entre os
participantes da turma, no entanto, cada licenciando elabora o seu individualmente
como decorrência das interações que ocorreram durante o processo de orientação. Por
meio de interações verbais, um dos licenciandos resolve determinada tarefa e outro de
posse do cartão de estudo acompanha a ação, com a função de realizar o controle sobre
o processo de assimilação que ocorre com o colega. Conforme as tarefas vão sendo
resolvidas, os indivíduos mudam de função, ora resolvendo a tarefa, ora realizando o
processo de controle.
A finalidade desta etapa é que os estudantes possam depender cada vez menos
da representação materializada da habilidade de descrever e possam realizar as tarefas
cada vez mais com um menor grau mediação objetal dos cartões de estudo e da
comunicação do colega que controla a realização da ação, no entanto, existe a
possibilidade desta interação em dupla ocorrer sem o uso dos cartões, ou seja, apenas
pelo processo de interação oral, neste caso, a etapa materializada dá lugar à etapa
verbal, a qual será discutida na próxima secção.
Esta etapa tem uma via dupla no processo de assimilação de uma habilidade já
que, por um lado, um dos componentes está resolvendo a tarefa, fazendo uso do
conceito e das ações necessárias para sua realização enquanto o outro, cujo papel é de
controlador do processo, assimila os indicadores de controle, o que será útil para a
formação de um autocontrole. O desempenho daquele que tem o papel de controlador é
uma via para a apropriação não somente dos indicadores de controle e da formação da
própria habilidade como também para a formação do autocontrole. Ao não destacar o
controle na tarefa especial, incluímos na atividade fundamental como forma de
realização (GALPERIN, 1988) e, com isso, ao controlarem uns aos outros, aprendem a
regular suas ações e se tornam mais atentos (TALÍZINA, 2001).
Uma das hipóteses levantadas por Galperin sobre a etapa materializada é que a
organização do controle como ação externa definida pelo processo de orientação
produzirá atos de atenção (GALPERIN, 1988). Isso quer dizer que a atenção é assim
considerada como uma das atividades de controle da assimilação de habilidades e
conceitos, ao mesmo tempo em que seu desenvolvimento depende da organização de
uma atividade que garanta o reflexo dos objetos conforme a tarefa é organizada
(SMIRNOV et al, 1978, p. 184).
A realização de uma atividade autônoma pelo licenciando é um sinal de avanço
em sua zona de desenvolvimento próximo. No caso da etapa materializada, não apenas
há um avanço do indivíduo, mas também da ajuda mútua entre os pares, constituindo-se
como um elemento da comunicação. Conforme explica Núñez (2009), os cartões de
estudo são recursos materializados nos quais os estudantes se apoiam para a resolução
de tarefas e, portanto, são ferramentas culturais importantes para o desenvolvimento
intelectual no processo de assimilação. Este mesmo autor (NÚÑEZ, 2013), referindo-se
ainda aos cartões de estudo, afirma que:
Neles, explicitam-se os modelos da atividade geral para resolver
quaisquer tipos de problemas do mesmo tipo, assim como os
conceitos necessários dentro dos limites de generalização.
No transcorrer desta etapa, exige-se dos alunos, a utilização de outras
habilidades cognitivo-linguísticas, tais como a explicação, a justificação e a
interpretação, além daquela é que o foco do trabalho, a descrição. O importante é que a
interação verbal, principalmente de forma oral, é utilizada na solução de tarefas de
aprendizagem que apresentam problemas do mesmo tipo e que utilizam o sistema de
operações que compõe a habilidade, conceito e controle envolvidos na atividade de
descrever em atividades práticas experimentais.
As tarefas da etapa de materialização podem conduzir ao desenvolvimento de
vários indicadores qualitativos. Um desses indicadores, característicos da qualidade da
ação, é a generalização, cujo desenvolvimento requer a aplicação dos conhecimentos em
todos os casos típicos possíveis dentro da invariante desenvolvida na etapa de
orientação. Conforme explica Vygotsky (2000):
A generalização é um ato verbal de pensamento e reflete a
realidade duma forma totalmente diferente da sensação e da
percepção. Esta diferença qualitativa se encontra implicada na
proposição segundo a qual há um salto qualitativo não só entre a
total ausência de consciência (na matéria inanimada) e a
sensação, mas também entre a sensação e o pensamento.
Na etapa materializada, os alunos resolvem em duplas tarefas de todos os tipos
que estão presentes em um determinado limite de aplicação. Em nosso trabalho, por
exemplo, estamos limitando as atividades que compõe a habilidade de descrever em
atividades práticas experimentais em ciências naturais. A generalização consiste em
assimilar o conceito da habilidade de descrever e as ações necessárias a realizações das
tarefas em todas as tarefas particulares que são estabelecidas neste limite do
conhecimento científico.
O processo que permite a formação de habilidades como ação mental, a qual
será discutida neste capítulo, sofre uma forte influência da materialização dos objetos e
dos fenômenos, materialização esta diretamente associada à observação como fenômeno
do pensamento, à descrição como fenômeno da linguagem e à generalização como
fenômeno da comunicação.
Esta conclusão está embasada na ideia de que um conceito ou uma habilidade
são um reflexo da realidade e consequentemente podem ser representados por uma
invariante estabelecida na atividade objetal entre sujeito e objeto ou na comunicação
entre sujeitos. Neste aspecto, o controle realizado por outro indivíduo, materializado no
processo de comunicação nesta etapa, avança o processo de reconhecimento e de
identificação das ações necessárias para realizar uma atividade e, consequentemente a
assimilação deste processo e própria habilidade.
Durante o processo de materialização da habilidade de descrever ocorre um
procedimento semelhante à compreensão de uma máquina complexa cujo mecanismo
deve ser dominado por um estudante de um curso técnico para a indústria. Antes de
tudo procura-se entender os elementos constituintes separadamente, para em seguida,
estudar as interações entre as peças, para ao final dominar a peça com todos seus
elementos constituintes e suas interações internas cuja finalidade é atingir um objetivo
final específico como, por exemplo, produzir um parafuso.
A analogia com a etapa materializada existe porque, é nesta que, os licenciandos
resolverão tarefas de todos os tipos, as quais estão no limite de aplicação, como estas
tarefas estão articuladas e de que forma elas podem interagir para a atividade associada
à habilidade geral de descrever. Assim como na máquina que citamos anteriormente,
sem a comunicação com alguém que possa controlar as ações de análise e síntese desses
processos, a assimilação ocorre lentamente e com muitos erros, situações estas que não
estão de acordo com a teoria da assimilação desenvolvida por Galperin.

5.2.4 As interações comunicativas e a etapa verbal da assimilação por etapas

Nesta fase, a formação da habilidade (ação) se encontra no estágio verbal e os


alunos as pronunciam em voz alta. Inicialmente esta ação se estrutura como um reflexo
verbal exato da ação realizada com o objeto, a qual o estudante se refere o tempo todo e
esforça-se para representá-lo cada vez mais por palavras para expressar a ação,
diminuindo o caráter objetal.
A resolução das tarefas continua da mesma maneira que na fase anterior, no
entanto, elas vão se organizando cada vez mais sem a necessidade da utilização dos
cartões de estudo. A ação verbal produz três mudanças fundamentais, segundo
Galperin.
 Ela se estrutura não apenas como um reflexo real da ação realizada com o
objeto, mas também como uma comunicação da mesma subordinada as
exigências da compreensão e o sentido específico que deve ter para as
outras pessoas e, por conseguinte, como um fenômeno da consciência
social.

 O conceito se constitui na base da ação, eliminando a maior limitação


imposta pelos objetos os quais não diferenciam conceitos primários de
conceitos mais complexos.
 Depois que a forma verbal da ação é bem compreendida, ela é novamente
(e pelas mesmas razões) apresentada a uma redução consecutiva e torna-
se uma ação por fórmula e, finalmente, se esta ação é adequadamente
ensinada, seu conteúdo relacionado ao objeto torna-se consciente, mesmo
sem ser executada.

A forma verbal constitui a maneira como o indivíduo se relaciona com o signo


no qual se dá importância a característica psicológica unitária da palavra. É nesta fase
que as imagens sensoriais e o objeto em si se transformam em fenômenos com
significado linguístico. Podemos perceber no processo verbal de assimilação as
interações comunicativas de três tipos, a saber: informativas, reguladoras e afetivas. As
características de cada um estão mais bem apresentadas a seguir:
 Informativas: abrange todos os recursos de comunicação que podem ser
descritos como a transmissão e recepção de informações.

 Reguladoras: inclui a regulação da atividade, no sentido amplo da


palavra, ou seja, a regulação realizada entre os pares.

 Afetivas: pertencem à determinação da esfera emocional humana.

Nas interações comunicativas que ocorrem na etapa verbal podemos perceber


todas as funções comunicativas estabelecidas anteriormente, de forma que, para cada
participante do processo elas podem ser ora de um tipo, ora de outro, ou mesmo
ocorrerem paralelamente e mudarem de indivíduo para indivíduo. Nestes casos, por
exemplo, para uma pessoa, a interação comunicativa pode ser um ato de transmissão de
informações e, para outra, uma interação que libera uma grande carga emocional.
Conforme explica Lomov (2006), outra forma de classificar funções da
comunicação, que compreendemos que valem para a etapa verbal de assimilação está
expressa nas funções como a organização da atividade coletiva, o conhecimento mútuo
dos participantes da comunicação e o desenvolvimento de relações interpessoais. Para
este autor:
Precisamente o processo de comunicação se forma no plano da
atividade coletiva e se distribuem todos os seus elementos entre
os participantes. No curso da atividade coletiva se realizam o
intercâmbio de informações, a estimulação mútua, o controle e a
correção das ações. Em essência, a comunicação desempenha a
função de organização da atividade individual. Por isso, a
investigação da regulação psicológica da atividade individual
exige analisar os processos da comunicação com outras pessoas.
Outra função, não menos importante, da comunicação se
relaciona com os processos de conhecimento mútuo. [...] Por
último, a formação e o desenvolvimento das relações
interpessoais é, talvez, a mais importante e complexa, e também
a menos estudada entre as funções de comunicação. Sua análise
supõe o estudo de um grande conjunto de questões não apenas
psicológicas, mas também, sociológicas, éticas e, inclusive,
econômicas.
Nesta etapa é muito importante a função do diálogo que, por sua vez, permite a
apropriação de significados cada vez enriquecedores e aplicáveis a uma pluralidade de
tarefas diversas dentre os limites da generalização (Núñez, 2013). Este diálogo,
materializado nas interações comunicativas dialógicas, desencadeia os fenômenos
comunicativos propostos por Lomov (2006), uma vez que os participantes das
interações em duplas estabelecem uma ajuda mútua como aceleradora do processo de
assimilação da habilidade.
A comunicação, neste caso, ocorre sem a participação direta do professor,
propiciando a atividade colaborativa entre os próprios licenciandos (entre iguais),
estimulando a formação não apenas de conteúdo conceitual e procedimental como
elementos, mas também, de atitudes frente ao desafio de se tornar professor de Ciências
Naturais.
Os licenciandos podem trabalhar livremente e, esta situação os faz sentirem-se à
vontade para verbalizar e expressar suas ideias, necessidades e emoções, na
identificação do que está ou não sendo aprendido e, além disso, influenciando de forma
motivacional no processo de assimilação do outro, em um intercâmbio constante
estabelecido por relações de simetria, colaboração e complementaridade. Conforme
explica Núñez (2013), isso faz aumentar o protagonismo dos estudantes na gestão de
sua própria aprendizagem e, no caso de licenciandos, defendemos que, além de se
desenvolver como alunos, estes estão também se desenvolvendo como profissionais da
educação, já que, ao aprender desta maneira, disseminarão esta metodologia entre seus
futuros alunos.
As tarefas utilizadas nesta etapa são do mesmo tipo que na etapa materializada,
no entanto, deve-se levar em consideração as possibilidades proporcionadas pela
linguagem escrita e oral. Apesar da aprendizagem, neste caso está direcionada para a
descrição, como habilidade cognitivo-linguística, exige-se do aluno outras habilidades
de maior complexidade, na solução de tarefas, de forma que a ação se manifeste a partir
da objetividade dos conceitos, dando origem aos primeiros passos no processo de
generalização.
Conforme as etapas vão evoluindo para o processo de comunicação verbal,
ficando mais explícita a utilização da linguagem oral ou escrita, fica evidente a
importância da dialética entre a internalização e a externalização e o papel essencial que
assume as categorias atividade e comunicação. Conforme explica Núñez (2013):
A assimilação dos conceitos como processo de internalização da
atividade externa supõe respeitar o princípio da internalização-
externalização. Segundo esse princípio, que tem seu fundamento
na unidade da atividade material e da psíquica, a internalização
se refere à conversão dos processos e objetos materiais externos
para processos executados no plano mental. Já a externalização
é o processo inverso da internalização, em que os processos
mentais se manifestam através de atos externos, como a fala, a
escrita, de tal forma que eles podem ser verificados e corrigidos
quando necessário.

5.2.5 As interações comunicativas e a etapa mental

A etapa mental, proposta por Galperin, principalmente no que diz respeito ao


processo de comunicação, é semelhante ao conceito de linguagem interna, desenvolvida
por L. S. Vygotsky (GALPERIN, 2001; VYGOTSKY, 2000). A tese de Vygotsky
reside no fato de que a linguagem interna é formada a partir da linguagem externa,
conforme mudam suas funções, se estruturando a partir de um meio para comunicar
ideias para outras pessoas é convertida em um meio de pensamento para si.
A linguagem interna é a forma mais elevada de execução da ação, quando o
indivíduo supera as limitações de apenas verbalizar e se utilizam dela mentalmente, só
para si, ou seja, é uma etapa de trabalho em que o aluno realiza a ação de forma
independente sem nenhum grau de apoio do parceiro mais capaz, portanto, a ação se dá
no plano intrapsicológico. É o momento em que o conceito se transforma em estrutura
operacional da habilidade, constituindo um episódio de pensamento. Inicia-se uma
automatização de uma habilidade que aos poucos se transforma em hábito que formará
o corpus conceitual de um indivíduo e que começa a se reduzir em maior ritmo se
transformando em uma atividade por fórmula.
A linguagem interna é ativada na maioria das vezes em uma ação para si, sem a
necessidade da comunicação, no entanto, pode também ser realizada em voz alta,
principalmente quando ela precisa ser externalizada. É nesta externalização que ficam
caracterizados a subjetividade e a criatividade humana, apesar da objetividade típica da
relação objetal que ocorre no processo de atividade. Segundo GALPERIN (2001):
[...] a linguagem interna pressupõe, por um lado, uma
linguagem-comunicação e, por outro, tudo aquilo que se entende
e sobre o qual se pensa sem o apoio da linguagem, ou seja,
ideias e pensamentos livres da linguagem. [...] esta, todavia é
linguagem, mas em comparação com a comunicação verbal é
uma linguagem especial, uma forma de pensamento.
A linguagem interna não deve ser interpretada simplesmente como linguagem
desprovida de som, mas como um ato de pensamento resultante das interações verbais
promovidas na comunicação e que, têm como meio a linguagem externa, com a qual, a
primeira mantém uma indissolúvel unidade dinâmica de transições de um plano a outro
(VYGOTSKY, 2001). As linguagens externa e interna interagem dialeticamente, de
forma que, as conexões entre elas podem ser estudadas na articulação entre os processos
de internalização e externalização da atividade de comunicação.
A assimilação da habilidade de descrever, como uma internalização da
orientação desta habilidade composta de suas invariantes conceituais e procedimentais,
ou simplesmente conceitos e ações, ocorre por um longo processo em que a
comunicação permite o controle da atividade por parte do outro e, conforme são
retirados o apoio material (cartões de estudo) e o apoio interativo (ajuda do outro), as
funções de controle realizadas por estes elementos são também assimiladas pelo
indivíduo.
Em princípio, segundo Galperin (2001), a comunicação que ocorria com o
colega que formava a dupla, continua ocorrendo com um sujeito oculto, no entanto de
forma abreviada e, posteriormente esse processo de abreviação da atividade se
transforma em hábito, de forma que não é mais necessária a interação consigo mesmo
para a realização da tarefa. A orientação da atividade passa a ocorrer no plano
intrapsicológico e a comunicação é substituída pela reflexão para a transformação do
objeto em produto, segundo os objetivos e as tarefas. De acordo com Núñez (2013):
Hipoteticamente, nesse momento, o aluno se apropriou, no nível
mental, do conceito e da orientação geral ou da estrutura da ação
e do conceito que permitem a solução do conjunto de tarefas
baseadas nesse conteúdo. No final dessa etapa, que os alunos
desenvolvem um nível satisfatório da assimilação e é possível
falar da transformação da ação em habilidade, considerando que
é o momento no qual o estudante passa a ter domínio da ação.
A internalização de uma atividade em forma de linguagem interna possibilita a
formação de ações mentais que, nada mais são habilidades para realizar uma ação
objetiva dada em relação aos conceitos e articuladas com estes como representações
mentais (GALPERIN 2001). Essas ações mentais sempre estão em íntima união com o
conceito e com a habilidade, enquanto imagem ou representação.
6 METODOLOGIA

Esta pesquisa foi embasada no enfoque dialético, estabelecido pelo materialismo


histórico, como referência para um estudo relativo à formação de futuros professores de
Física na totalidade de sua realidade concreta, ou seja, a sala de aula no curso de
licenciatura. Neste domínio, o processo de formação deste profissional foi tomado como
um movimento contínuo em constante transformação.
A abrangência dos objetivos estabelece condições para classificar a pesquisa
como aplicada e exploratória, já que o problema surge da prática social associada à
atividade profissional a ser desenvolvida pelos participantes em formação, ao mesmo
tempo em que proporciona maior familiaridade com o problema.
Foi utilizada uma abordagem que admite a utilização de instrumentos
quantitativos e qualitativos, conforme a relação dialética existente entre essas duas
dimensões, estabelecendo uma complementaridade necessária para dar confiabilidade
ao processo que culminou na resposta ao problema de pesquisa. Considerou-se a
importância da complementaridade entre as duas abordagens a partir da ideia de que
ambas são necessárias, mas (sozinhas) nem sempre suficientes para abarcar toda
realidade observada (MINAYO e SANCHES, 1993), além de revelar uma relação
indissolúvel entre subjetividade e as condições objetivas onde ela tem lugar e se
expressa como produção de conhecimento (NÚÑEZ, 2012).
A partir da revisão teórica, problematização, objetivos e tese, foram elaborados a
estruturação do conteúdo, o diagnóstico inicial, o sistema didático e, posteriormente, um
processo formativo, cuja finalidade é a formação da habilidade de descrever no conjunto
das atividades práticas experimentais, como parte do conhecimento profissional,
realizado como proposta de uma disciplina da formação inicial de professores de Física,
embasada na Teoria da assimilação por etapas das ações e dos conceitos de P. Ya.
Galperin. Em consonância com a teoria e os momentos do experimento foi analisado o
potencial desta ferramenta como metodologia de aprendizagem eficiente na apropriação
da orientação do sistema de operações desta habilidade, com contribuições ao
desenvolvimento do grau de generalização.
O percurso metodológico está embasado na tese de que o desenvolvimento
humano acontece por intermédio da assimilação da experiência social, vivida pelo
indivíduo em suas interações diárias. A assimilação permanece por toda a existência, se
constituindo como meio no processo de aprendizagem e desenvolvimento humanos.
6.1 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS E FILOSÓFICOS GERAIS

A pesquisa foi amparada em pressupostos teóricos e filosóficos gerais que


devem ser levados em consideração nas pesquisas em Ciências Sociais. Conforme
apresenta Creswell (2013), um bom entendimento por parte do pesquisador desses
pressupostos influencia a pesquisa de duas maneiras:
 Molda como formulamos o nosso problema e as perguntas da pesquisa e como
buscamos as informações para responder as perguntas.
 Essas suposições estão profundamente enraizadas em nossa formação e são
reforçadas pela comunidade acadêmica em que trabalhamos.
Apresenta-se a seguir, no quadro 1, um compêndio desses pressupostos como
forma de filiar o trabalho a uma estrutura metodológica sólida. São apresentados, neste
quadro, os pressupostos axiológicos, ontológicos, filosóficos e teóricos.

PRESSUPOSTOS
TEÓRICOS E BREVE DESCRIÇÃO
FILOSÓFICOS

Considera-se o caráter material da natureza, de forma que a


ONTOLÓGICOS matéria é tudo que existe independente de nossa consciência
e o homem a assimila em forma de representação como
reflexo da realidade.

A pesquisa considera a apreensão do fenômeno da forma


como ele se manifesta, ou seja, pela sua aparência, para em
EPISTEMOLÓGICOS seguida compreendê-lo em sua forma generalizada, ou seja,
sua essência. Considera-se, no entanto, a impossibilidade de
se atingir a essência, sem que se manifeste o fenômeno e
este seja analisado.

TEÓRICOS Utiliza-se a Teoria da assimilação por etapas das ações e dos


conceitos como elemento teórico principal da pesquisa.

Consideram-se as crenças e valores assimilados pelo


pesquisador durante sua formação e internalização da
AXIOLÓGICOS atividade social, no entanto, utiliza-se de elementos de
validade e fidedignidade das informações, bem como de
triangulações dos dados.

A pesquisa consiste em um experimento pedagógico a partir


METODOLÓGICOS da sistematização e planejamento de um sistema didático
elaborado sob a égide de informações teóricas (estruturação
do conteúdo) e empíricas (diagnóstico inicial).
6.2 ESTRATÉGIA DE PESQUISA
Considerando o método como ferramenta fundamental para a aquisição do
conhecimento científico, optou-se por utilizar um experimento pedagógico como
estratégia de formação da habilidade de descrever. Neste caso, o pesquisador interage
com o objeto de estudo, formado pelos alunos e o próprio processo de formação que
eles participam (TALÍZINA, 2000).
Realizou-se um experimento pedagógico de laboratório, de forma que o controle
das variáveis permitiu fixar a coleta de dados de maneira mais objetiva, com mais
exatidão, com equipamentos e materiais didáticos específicos e com os participantes
conscientes de estarem participando de uma pesquisa. Apesar dessas vantagens, houve a
preocupação com a influência que o participante pode ter no transcurso de sua atividade,
apontado por Talízina (2000) como uma desvantagem dessa modalidade quando
comparada ao experimento natural.
Além disso, o experimento pedagógico seguiu dois momentos importantes
conforme o que foi estabelecido pelos objetivos. Inicialmente realiza-se um
experimento de constatação, ou seja, por meio de um diagnóstico inicial, constata-se o
nível de desenvolvimento da habilidade de descrever entre os licenciandos participantes
da pesquisa. A seguir, o experimento passa a ser formativo, já que, a partir da análise do
diagnóstico inicial, realiza-se a formação ou atualização da habilidade de descrever.
O experimento pedagógico utilizado como método de pesquisa seguiu as etapas
básicas apresentadas a seguir:
 Estabelecimento de um objetivo a partir da formação de uma habilidade
determinada.
 Planejamento das etapas do experimento.
 A realização do experimento, com a respectiva coleta de dados.
 Organização e análise dos dados.
 Elaboração das conclusões que permitem estabelecer as contribuições
experimentais da pesquisa.
Considerou-se a assimilação da habilidade de descrever, do conceito e do
sistema de ações, como um processo que permite a regularidade da aprendizagem, a
partir da estrutura objetiva da atividade, determinada a partir da cultura. Neste caso,
optou-se por realizar uma aproximação do experimento pedagógico à Teoria da
atividade, de forma que a atividade unitária (habilidade de descrever) participa na
qualidade de objeto de estudo (TALÍZINA, 2000, p. 27).
O experimento pedagógico se fundamenta na ideia de que a formação de uma
habilidade ocorre com êxito e com um relativo grau de generalização quando o aluno
tem uma participação efetiva no processo de orientação, execução e controle do
processo educativo tomando consciência das etapas que permeiam o processo de
assimilação e os erros que podem ser cometidos.
Considerando o enfoque dialético da pesquisa, foram relacionados diferentes
métodos de pesquisa, com ênfase aos métodos teóricos e empíricos. A importância do
método teórico utilizado consiste na elaboração do conteúdo inerente à habilidade de
descrever em atividades experimentais como um elemento que faz parte do
desenvolvimento histórico das ciências naturais e sua respectiva influência nas aulas de
Física para o ensino médio.
A estruturação da habilidade de descrever em atividades experimentais requereu
a utilização de um modelo teórico, ou seja, a invariante estrutural-funcional que
permitirá a compreensão de sua estrutura como um sistema dialético-conceitual, ou seja,
uma B.O.A tipo III desenvolvida pelo pesquisador como um sistema de significados que
servirá de parâmetro para o diagnóstico inicial e a etapa de orientação do processo de
formação.
O método empírico consistiu no desenvolvimento na formação habilidade, desde
o processo de diagnóstico inicial até a estratégia de formação utilizando as etapas
determinadas pela Teoria da assimilação por etapas das ações e dos conceitos.
Foram utilizados como instrumentos de pesquisa a observação, o sistema de
tarefas, o questionário e entrevista. Assim como nos métodos que utilizamos, a
variedade de instrumentos atende ao enfoque dialético, como forma de estabelecer uma
melhor representação da unidade material do objeto de estudo com o mundo a sua volta.
Os dados foram registrados em instrumentos como diários de anotações,
gravações em áudio e protocolos de questionários e sistema de tarefas, organizados em
banco de dados, utilizando planilhas eletrônicas e chaves de correção e tratados por
análises qualitativas de conteúdo e discurso.
A seguir apresentamos os elementos da metodologia aplicados aos objetivos
específicos estabelecidos na pesquisa.
6.3 PRIMEIRO OBJETIVO ESPECÍFICO: ESTRUTURAÇÃO DO
CONTEÚDO INVARIANTE DA HABILIDADE DE DESCREVER
Considerando que o pesquisador deve conhecer a estrutura objetiva da atividade
que vai formar (TALÍZINA, 2000, p. 27), neste caso, a habilidade de descrever e que, o
sucesso da formação de uma habilidade depende da qualidade da sua base orientadora,
estabelecemos o método teórico estrutural-funcional (TALÍZINA, 2000; RESHETOVA,
1988) como estratégia para obter o modelo do conceito e do sistema de ações
componentes da habilidade de descrever, construído historicamente pelas ciências
naturais.
O estabelecimento da estrutura invariante foi desenvolvido da seguinte maneira:
 Levantamento na literatura acadêmica do modelo do objeto e das ações que
compõe a atividade de descrever como variantes do conhecimento.
 Identificação, nessa diversidade, de enunciados que caracterizam o modelo do
conceito e das ações para cada variante levantada.
 Análise de enunciados semelhantes para obter um significado comum
representado por apenas um enunciado invariante.
 Estabelecer o modelo do conceito e o modelo das ações a partir do conjunto dos
enunciados invariantes, produzindo a invariante geral.
 Estabelecimento de limites de aplicação e generalização dos modelos invariantes
estabelecidos.
A partir do exame detalhado do conteúdo das diversas variantes apresentadas
pelos trabalhos analisados, fez-se a seleção das estruturas comuns que compõem o
modelo do conceito e do sistema de ações, por sua vez, formará a estrutura invariante da
habilidade de descrever. A obtenção da invariante da habilidade de descrever permite o
desenvolvimento e a estruturação do conteúdo como sistema e formação do pensamento
e da generalização teóricos, revelando a essência da atividade de estudo.
O quadro 2 apresenta o modelo utilizado para representar o levantamento dos
modelos (variantes conceituais e variantes das ações) desenvolvidos pelos autores
pesquisados.
VARIANTES DA HABILIDADE (PROCEDIMENTO) DE DESCREVER

AUTOR VARIANTES CONCEITUAIS VARIANTES DAS AÇÕES


Da mesma forma, elaboramos o quadro 3 para estabelecer os enunciados que
foram denominadas “unidades componentes dos diversos conceitos” relacionados a
análise qualitativa para se obter a invariante por cada grupo de unidades semelhantes
chamada de “unidade proposta para compor o modelo conceitual”.

UNIDADE PROPOSTA
UNIDADES COMPONENTES DOS DIVERSOS PARA COMPOR O
CONCEITOS MODELO CONCEITUAL

O quadro 4, semelhante ao quadro 3, estabelece uma associação entre o grupo de


ações com significados semelhantes, estabelecido pelos enunciados que as representa
para cada autor pesquisado, com a ação sintetizada desenvolvida a partir da análise
teórica feita neste trabalho. É nos quadros 3 e 4 que se estabelece o significado comum
representado respectivamente pelas invariantes conceitual e das ações.

GRUPOS DE AÇÕES COM


AÇÃO SINTETIZADA
SIGNIFICADOS SEMELHANTES

O quadro 5 apresenta tanto o modelo do conceito como o modelo das ações


desenvolvidos como parte da estrutura invariante, que estabelece a estruturação do
conteúdo, associada à habilidade de descrever. Está composto também das operações,
como ações que já devem ser dominadas pelo licenciando para que se assimile o modelo
das ações proposto.

MODELO DO
MODELO DAS AÇÕES OPERAÇÕES
CONCEITO
6.4 SEGUNDO OBJETIVO ESPECÍFICO: O DIAGNÓSTICO INICIAL

O diagnóstico inicial da habilidade de descrever em atividades práticas


experimentais, utilizadas no ensino de Física, encerrou como finalidade o
estabelecimento do nível de desenvolvimento, em relação aos sentidos que os
licenciandos atribuíam ao conceito e as ações componentes da atividade de descrever.
Conforme aponta Talízina (2000), este diagnóstico deve se realizar para determinar o
nível dos conhecimentos gerais que se incluem no conteúdo da atividade que está sendo
assimilada. Segundo Núñez e Ramalho (2011):
Não se trata de um diagnóstico de pré-requisitos ou somente de
ideias prévias, mas da caracterização do grau de
desenvolvimento inicial da habilidade a ser formada na Zona de
Desenvolvimento Proximal (ZDP), ou seja, nesse sentido se
diagnostica o desenvolvimento inicial, em relação ao grau de
desenvolvimento da habilidade desejada.
Foram considerados os seguintes momentos para a realização do diagnóstico
inicial:
 Definição dos objetivos do diagnóstico inicial.
 Elaboração do plano do diagnóstico.
 Elaboração do sistema de tarefas que conterá este instrumento e o respectivo
instrumento de análise.
 Validação do instrumento.
 Aplicação do instrumento.
 Observação, durante a aplicação.
 Organização e análise dos dados.
Considerou-se que o processo formativo da habilidade de descrever em
atividades práticas experimentais, assim como acontece com a assimilação de qualquer
outro conceito ou habilidade, pressupõe um nível determinado de desenvolvimento da
atividade cognitiva dos alunos. A presença destes conceitos ou habilidades subsidia a
construção ou a atualização de novos, por esse motivo, os resultados desse diagnóstico
serão relevantes para as próximas etapas da formação da habilidade de descrever.
Foram estabelecidas duas categorias de tarefas para a realização do diagnóstico
inicial. A primeira categoria é composta por uma situação problema realizada por meio
de uma atividade escrita na qual os licenciandos devem explicitar, passo a passo, o
procedimento de descrever, bem como qual é o seu conceito. A segunda tarefa consiste
em uma atividade que envolve um experimento didático que demanda a necessidade de
realizar uma descrição. Para estabelecer uma melhor relação entre os objetivos das
tarefas e as questões utilizadas, foi realizado o plano do questionário apresentado no
quadro 6. Não se apresenta ainda as questões por serem parte dos resultados,
apresentados a partir do capítulo 7.

OBJETIVOS QUESTÕES

Verificar se o licenciando domina os


enunciados associados ao conceito e se
reconhece as ações necessarías para
realizar o procedimento de descrever.

Observar se o domínio do conceito e das


ações é utilizado em um experimento
didático.

Os questionários foram validados por um Grupo Reflexão composto por


pesquisadores participantes do Projeto de pesquisa “Aprender a ensinar habilidades
cognitivo-linguísticas como ferramentas na educação em ciências. uma abordagem
baseada na teoria de formação das ações mentais e dos conceitos de P. Ya. Galperin”
(Núñez, 2012) constituído como espaço de construção e desenvolvimento de pesquisas
desta natureza na Universidade federal do Rio Grande do Norte.
Os dados foram obtidos utilizando as questões em forma de tarefas relacionadas
à atividade profissional do professor de física do ensino médio, por meio de duas
situações problemas. Utilizou-se como critérios para estabelecer uma referência sobre a
habilidade de descrever, a invariante produzida anteriormente tanto quanto ao modelo
do conceito como o modelo das ações os quais foram desenvolvidos na análise
sistêmica estrutural-funcional. Além da estrutura relativa aos conceitos e ações, foi
utilizado também o critério de validade de uma descrição, o qual estabelece como
princípio para uma boa descrição o receptor fazer uma ideia exata do que se descreve.
Durante a aplicação do questionário do diagnóstico inicial foi utilizada também
como instrumento de coleta de dados a observação da assimilação da atividade de
descrever como relação entre sujeito e objeto de aprendizagem, organizadas no diário de
anotações.
Além disso, foi necessário estabelecer uma chave de correção como
organizadora das ações e conceitos já formados parcialmente pelos licenciandos como
forma de avaliar o estado atual de desenvolvimento de cada um, individualmente, como
elemento de orientação para se realizar o processo de aprendizagem. Estabelecemos os
níveis de desenvolvimento da habilidade postos no quadro 7, como forma de apresentar
uma gradação da habilidade parcialmente formada, ou não, em cada licenciando
participante da pesquisa.

Tabela 6 - Modelo de análise do grau de desenvolvimento da habilidade de descrever


NÍVEL DE
SITUAÇÃO
DESENVOLVIMENTO
A1 Reconhece e aplica corretamente o conceito e as
ações necessárias para se descrever um objeto ou
fenômeno.
A2 Reconhece corretamente o conceito e aplica
parcialmente as ações para se descrever um objeto
ou fenômeno.
A3 Reconhece corretamente o conceito, mas não sabe
aplicar as ações necessárias para se descrever um
objeto ou fenômeno.
B1 Reconhece parcialmente o conceito, mas aplica
corretamente as ações necessárias para se descrever
um objeto ou fenômeno.
B2 Reconhece e aplica parcialmente o conceito e as
ações necessárias para se descrever um objeto ou
fenômeno.
B3 Reconhece parcialmente, mas sabe aplicar as ações
necessárias para se descrever um objeto ou
fenômeno.
C1 Não reconhece o conceito, mas aplica corretamente
as ações necessárias para se descrever um objeto ou
fenômeno.
C2 Não reconhece o conceito e aplica parcialmente o as
ações necessárias para se descrever um objeto ou
fenômeno.
D Não reconhece o conceito e não sabe aplicar as
ações necessárias para se descrever um objeto ou
fenômeno.

Os dados colhidos e organizados a partir do questionário foram tratados por


meio da técnica de análise de conteúdo (Bardin, 1977) para o estabelecimento de
categorias representativas da assimilação da habilidade de descrever parcialmente
apropriada pelos licenciandos.
6.5 TERCEIRO OBJETIVO ESPECÍFICO: O DESENVOLVIMENTO DO
SISTEMA DIDÁTICO

A finalidade do sistema didático é o planejamento do processo formativo, de


forma a privilegiar a orientação como elemento chave no processo de aprendizagem. É
um instrumento que direciona o processo de formação ou atualização da habilidade de
descrever em atividades experimentais. Apresenta-se a seguir os critérios utilizados para
desenvolver este sistema.

6.5.1 Critérios para a definição dos pressupostos teóricos e metodológicos

Definiram-se como integrantes do sistema didático os pressupostos teóricos e


metodológicos da Teoria da Assimilação por etapas das ações e dos conceitos de P. Ya.
Galperin.

6.5.2 Critérios para a definição do objetivo

Considerando o processo de aprendizagem como uma atividade, foram


estabelecidos os objetivos a partir da análise teórica propiciada pela estruturação dos
conteúdos e a análise empírica realizada no diagnóstico inicial. Conforme estabelece
Núñez (2013):
Partindo do pressuposto de que a aprendizagem é um tipo de
atividade, os objetivos se formulam na linguagem das ações que
o estudante realiza com o objeto de estudo, para sua assimilação,
ou seja, como um tipo de atividade que engloba as ações e os
conceitos objetos de assimilação, uma vez que o conhecer não se
separa do saber fazer (os conceitos e as ações formam uma
unidade), assim orientada para o desenvolvimento intelectual e
da personalidade integral dos estudantes.
Grosso modo, a formulação destes objetivos considera que:
 A habilidade de descrever possui uma estrutura conceitual e
procedimental.
 A formação desta habilidade tem como finalidade a assimilação desta
estrutura, em forma de ação mental.
 A partir da análise do diagnóstico inicial, as ações ainda não assimiladas
pelos estudantes seguem etapas de aprendizagem, desde a motivação, a
elaboração da base orientadora da ação, etapa material, etapa linguística
e etapa mental.
Com a finalidade de materializar esses objetivos, compartilhamos do modelo
desenvolvido por Núñez e González (1996), adaptados à habilidade de descrever em
atividades experimentais:
 Definir o objetivo em termos da habilidade de descrever em atividades
práticas experimentais;
 Definir o vínculo da habilidade de descrever em atividades práticas
experimentais com a atividade profissional de professor de Física do
ensino médio;
 Considerar o nível inicial do grau de desenvolvimento da habilidade de
descrever em atividades práticas experimentais apresentadas pelos
alunos;
 Considerar os limites de aplicação da atividade;
 Definir os indicadores qualitativos da habilidade de descrever em
atividades práticas experimentais que serão analisadas em nossa
pesquisa.

6.5.3 Critérios para estruturação do sistema de tarefas de aprendizagem

A Teoria da assimilação por etapas das ações e dos conceitos privilegia a


utilização de tarefas de aprendizagem no processo formativo. Para o caso da formação
da habilidade de descrever, utilizaram-se os momentos definidos por Núñez (2009),
citados a seguir.

 Diagnóstico inicial do grau de desenvolvimento da habilidade.

 Execução do processo de formação da habilidade.

 Controle final do processo de formação.

Considerando que o diagnóstico inicial foi realizado como uma etapa anterior ao
planejamento do sistema didático, foi estabelecido que os resultados apresentados por
essa análise subsidiassem os dois outros momentos da formação e, portanto, o
desenvolvimento de tarefas de aprendizagem levou em consideração este resultado.
O sistema de tarefas elaborado também está associado ao grau de generalização
estabelecido pelas ciências naturais, delimitado pelas situações em que os limites de
aplicação desta área do conhecimento podem ser aplicados nas tarefas em questão.
Nestes termos, o grau de generalização é o indicador qualitativo que pode estabelecer o
quanto uma habilidade é aplicável a uma quantidade dada de situações (Galperin 2011-
x).
É importante elucidar que o número de tarefas que serão utilizadas no
experimento formativo depende do grau de desenvolvimento inicial dos licenciandos
quanto ao grau de generalização. Além disso, a passagem de uma etapa para outra
ocorre a partir dos licenciandos atingirem as lacunas de formação que serão
apresentadas no diagnóstico inicial.
Além do grau de generalização as tarefas são pautadas também segundo as
etapas de assimilação. Para cada etapa, foram utilizadas interações entre os licenciandos
e o objeto de assimilação de acordo com as características de cada uma ou sua função
no processo de apropriação da habilidade de descrever. Apresenta-se a seguir os
critérios utilizados de acordo com cada etapa:

 Etapa motivacional – Interação do grupo, tarefas individuais.

 Etapa de estabelecimento da B. O. A. tipo III – Interação do grupo,


tarefas individuais e tarefas em dupla.

 Etapa materializada – tarefas em duplas, utilização do cartão de estudo.

 Etapa verbal – tarefas em duplas.

 Etapa mental – tarefas individuais.

6.5.4 Critérios para a estruturação das tarefas de controle


O controle de aprendizagem teve como critério a análise do grau de
generalização como indicador qualitativo da ação de descrever em atividades
experimentais cujo limite de aplicação está no interior das Ciências Naturais. Neste
caso, o controle ocorre para verificar se o licenciando aplica a estrutura invariante a
todas as situações novas dentro do limite de aplicação e se a transfere para outros
contextos.
Os testes de controle realizados seguiram uma adequação a cada etapa de
assimilação da habilidade conforme é estabelecida por Núñez (2009) e apresentadas a
seguir:
 Etapa motivacional: testes preliminares (diagnóstico inicial) com a finalidade de
estabelecer o grau de desenvolvimento da habilidade.
 Etapa de orientação: testes para inferir a compreensão da orientação construída.
 Etapa materializada: testes realizados a partir das operações, segundo a estrutura
das ações.
 Etapa de linguagem interna: testes inicialmente realizados a partir das operações
e posteriormente pelos resultados apresentados.
 Etapa mental: testes realizados a partir dos resultados apresentados.
Foram utilizados como critérios para organizar as tarefas de controle um teste
em articulação direta com as ações e conceitos. Seguiu-se um protocolo de atividade
como padrão de observação que, inclusive, pode ser disponibilizado para as duplas na
etapa materializada. Os critérios de verificação deste protocolo são os seguintes:
 Verificar se a descrição tem as características assinaladas.
 Assinalar o resultado da verificação como + = presente, - = ausente ou
? = não sabe.
 Avaliar o resultado de forma que se forem satisfeitas todas as
caraterísticas a resposta será positiva.

6.6 QUARTO OBJETIVO ESPECÍFICO: REALIZAÇÃO DO


EXPERIMENTO FORMATIVO

A obtenção de dados nesta pesquisa está influenciada por sua faceta empírica
orientada pela busca da aproximação da verdade que envolve o objeto de investigação a
partir do reflexo da realidade. Busca-se uma maior aproximação entre o professor-
pesquisador e o objeto de estudo para permitir a coleta das informações necessárias para
atender os objetivos específicos.
Do ponto de vista metodológico o experimento formativo será apresentado a
partir dos instrumentos de pesquisa, quanto à coleta, a organização e o tratamento dos
dados.
Os métodos empíricos utilizados, em correspondência com os métodos teóricos,
são embasados nos seguintes pressupostos:
 Integração dos métodos caracterizada por sua unidade dialética.
 Escolha e interpretação dos dados orientados pela formação do
pensamento teórico e da assimilação por etapas.
 Relação direta com a natureza do objeto de estudo.
 Materialização dos instrumentos em um sistema de tarefas.
6.6.1 Instrumentos de coleta de dados
A etapa empírica da pesquisa foi organizada para coletar os dados indispensáveis
para se responder aos objetivos propostos. Os instrumentos utilizados comportaram o
avanço do processo de firmação da habilidade de descrever e permitiram produzir
inferências acerca dos fatores que favorecem e dificultam o desenvolvimento desta
habilidade quando formada a partir de uma estratégia baseada na Teoria da assimilação
por etapas das ações e dos conceitos.
Foram utilizados como principais procedimentos, nesta pesquisa, instrumentos
como questionários, a entrevista, a observação, questionários e o caderno de anotações.

6.6.1.1 O questionário

O processo de formação da habilidade de descrever contou com a aplicação de


duas modalidades de questionários. A primeira modalidade trata de caracterizar os
licenciandos pesquisados quanto às informações individuais de situação social,
econômica e de formação para estabelecer relação entre esses parâmetros como
identificador de um grupo.
A segunda modalidade está relacionada ao levantamento de argumentos entre os
licenciandos acerca dos fatores que favorecem e que dificultam a formação da
habilidade de descrever em atividades experimentais por meio dos pressupostos teóricos
e metodológicos estabelecidos pela Teoria da Assimilação por Etapas de P. Ya.
Galperin.
A primeira modalidade foi aplicada apenas como um instrumento no início do
processo de formação, enquanto que a segunda modalidade foi aplicada enquanto
instrumentos duas vezes. A primeira vez logo em seguida a aplicação do diagnóstico
inicial e a segunda vez ao final do processo formativo.
O questionário foi escolhido como um dos instrumentos para coletar as
informações da realidade e como sugere Gil (1999, p. 128):
[...] é a técnica de investigação composta por um número mais
ou menos elevado de questões apresentadas por escrito às
pessoas, tendo por objetivo o conhecimento de opiniões,
crenças, sentimentos, interesses, expectativas, situações
vivenciadas etc.
Apesar desta técnica apresentar muitas vantagens e desvantagens, foi
considerada a mais adequada para ser aplicada no contexto que estamos apresentando
por se tratar de instrumento que permite uma maior padronização e uniformidade das
questões (RIBEIRO, 2008, p. 13) apesar de impedir o auxílio ao informante quando este
não entende corretamente as instruções ou perguntas; envolver, geralmente, número
relativamente pequeno de perguntas, porque é sabido que questionários muito extensos
apresentam alta probabilidade de não serem respondidos e proporcionar resultados
bastante críticos em relação à objetividade, pois os itens podem ter significados
diferentes para cada sujeito pesquisado (GIL, 1999, p. 129).
As desvantagens apresentadas acima serviram de estímulo a remediá-las, com
um melhor direcionamento para a condução da aplicação deste instrumento, tanto na
escolha de questões, como de universo dos pesquisados. Em primeiro lugar, as
instruções para responder ao questionário foram feitas de forma escrita, no corpo do
próprio instrumento e verbal, pelo próprio pesquisador antes da aplicação. Da mesma
forma, o número de indivíduos participantes foi relativamente pequeno, algumas
dezenas de pessoas, no entanto, o maior nível de objetividade esteve presente nas
questões fechadas, do tipo sim ou não, ou de identificação de gênero, idade, entre outras
de mesmas características. Quanto às questões abertas, a objetividade pôde ser mais
bem alcançada a partir da elaboração de um plano do questionário validado pelo Grupo
Reflexão, dando uma maior fidedignidade ao instrumento. O pré-teste foi realizado com
uma turma diferente da participante da pesquisa com 8 licenciandos.
Foram utilizadas perguntas fechadas para identificar e caracterizar o grupo
pesquisado no questionário de situação social, econômica e de formação e perguntas
abertas para os demais questionários cujas finalidades foram explorar os fatores que
favorecem e que dificultam a formação da habilidade. Neste caso, as perguntas abertas
possuem um importante papel em estudos exploratórios como o que foi realizado
quanto a este objetivo da pesquisa.
Os planos dos questionários são apresentados a seguir, nos quadros 7, 8 e 9.
QUESTIONÁRIO 1
Objetivo Protocolo de perguntas
Caracterizar os licenciandos pesquisados Identificação de gênero, idade, estado civil,
quanto às informações individuais de ocupação entre outros.
situação social, econômica e de formação Identificação de indicadores sociais e

para estabelecer relação entre esses econômicos dos licenciandos.


Identificação do percurso formativo a partir
parâmetros como identificador de um
dos cursos e atividades que o licenciando
grupo.
participou durante a vida.
QUESTIONÁRIO 2
Objetivo Perguntas
Identificar e caracterizar as dificuldades Identificar as dificuldades que os
apresentadas pelos licenciandos para licenciandos tiveram para resolver as tarefas.
responder ao diagnóstico inicial da habilidade Identificar os fatores atribuídos pelos
de descrever. estudantes para explicar as dificuldades
apresentadas na resolução das tarefas.

QUESTIONÁRIO 3
Diagnóstico inicial e
motivação?
Que fatores favoreceram
Materializada?
o processo de formação
Linguagem Externa?
Identificar e caracterizar o que favoreceu nas etapas
Plano mental?
e o que dificultou o processo de
Controle final?
formação da habilidade de descrever
Diagnóstico inicial e
utilizando a Teoria da assimilação por
motivação?
etapas Que fatores dificultaram o
Materializada?
processo de formação nas
Linguagem Externa?
etapas
Plano mental?
Controle final?
Identificar quais as vantagens da Quais as vantagens de se aprender através da
utilização da Teoria da assimilação teoria da Assimilação por etapas?
por etapas no processo de
aprendizagem.
Identificar as desvantagens da Quais as desvantagens de se aprender através
utilização da Teoria da assimilação da Teoria da Assimilação por etapas?
por etapas no processo de
aprendizagem
6.6.1.2 A entrevista
Foram utilizadas entrevistas neste trabalho com a finalidade de extrair
conhecimentos sistematizados dos indivíduos pesquisados, com a finalidade de se
buscar as concepções, opiniões, percepções e saberes que compõem a consciência dos
indivíduos enquanto agentes ativos dos fenômenos sociais. Conforme Kaufmann
(1996), o emprego da entrevista está amparado na convicção de que os atores não são
simples agentes portadores de determinadas estruturas, mas sim produtores ativos do
social, depositários de um saber importante que compõe o seu sistema de valores.
Esta técnica possui algumas vantagens, principalmente quando comparada ao
questionário, permitindo, antes de tudo, a aquisição de uma maior abundância de
informações por ser mais fácil de responder. Esta situação garante uma melhor
flexibilidade, seja porque o entrevistador pode se adaptar mais facilmente, durante o
processo de obtenção dos dados conforme o comportamento do entrevistado, seja
porque ela pode ser utilizada como adaptação às respostas do próprio questionário
quando as respostas não forem essencialmente claras.
Considerando que a função do pesquisador é explicar e interpretar a fala dos
atores sociais por intermédio das informações colhidas, a entrevista, assumida desde a
acepção mais ampla do processo comunicativo até o sentido mais constrito de uma área
específica da ciência, promove a construção de informações pertinentes para um objeto
de pesquisa e a abordagem pelo observador de temas igualmente pertinentes tendo em
vista este objetivo (MINAYO, 2013).
Apesar de haver múltiplas modalidades de entrevistas, optamos por realizar
entrevistas estruturadas em nossa pesquisa. As perguntas foram elaboradas para
esclarecer respostas não compreendidas no processo de observação e nos dados contidos
nos questionários, bem como, nas tarefas realizadas pelos estudantes. O registro das
entrevistas seguiu um processo de gravação, transcrição e codificação com autorização
dos entrevistados. Seguimos dois pressupostos principais como orientação das
entrevistas como técnica de pesquisa, os quais são apresentados a seguir:
 As entrevistas realizadas buscaram a apreensão dos sentidos e
significados das categorias empíricas resultantes das respostas,
ampliando sua validez como construtos primários.
 As entrevistas serviram de apoio à construção de inferências obtidas com
outras técnicas atribuindo uma maior confiabilidade.
6.6.1.3 A observação
Utilizamos a observação como uma maneira distinta, única, de se entrar em
contato com o mundo real e seus diversos fenômenos. A observação teve como
finalidade obter a maior quantidade de informações possíveis acerca do objeto de estudo
focado no processo de formação da habilidade de descrever em atividades
experimentais. A intencionalidade de nossa observação esteve voltada para a busca de
fatores influenciados pelas categorias atividade e comunicação que envolvem a
formação dessa habilidade, no contexto da formação inicial do professor de física.
Optamos por utilizar uma observação em que o professor-pesquisador participa
de todo processo empírico da pesquisa, caracterizado pela experiência formativa. Para
evitar mudanças no comportamento dos alunos frente à pesquisa, a introdução do
pesquisador como professor foi feita gradualmente e apesar de que os alunos tenham
consciência da pesquisa, a disciplina deve transcorrer de maneira mais natural possível,
evitando possíveis deturpações nos dados. Neste caso, o professor-pesquisador se
tornou um participante usual do grupo pesquisado.
Não utilizamos a observação em seu aspecto behaviorista, tratando o objeto
como imediato e compartimentado. Fazemos uma aproximação à teoria da atividade
(LEONTIEV, 1989), principalmente à tese defendida por Talízina (2000), na qual a
observação é dirigida para os componentes importantes da atividade de estudo, que
permitem julgar de maneira mediatizada sobre a parte que interessa. Esta observação
está dirigida para a assimilação da orientação que transcorre de forma psíquica mais é
revelada nas ações desenvolvidas pelo indivíduo.
O andamento da formação da habilidade de descrever em atividades
experimentais foi observado em nossa pesquisa a partir da identificação dos indicadores
de assimilação promovidos pelo processo de comunicação, durante a aprendizagem.
Observamos as dificuldades apresentadas pelos estudantes, o comportamento individual
de cada um no grupo no decorrer da realização das tarefas que compunham o sistema
didático.
Caracterizamos nossas observações como não-estruturadas, materializadas em
uma técnica conhecida como observação participante. Nesta abordagem o professor-
pesquisador está inserido no convívio social, juntamente com os indivíduos e o objeto
observados, participando com eles em seu ambiente natural de vida, ao mesmo tempo
em que realiza a coleta de dados.
O professor-pesquisador fez parte do conjunto a ser observado e, sua presença
no ambiente de pesquisa transformou o contexto ao mesmo tempo em que foi
transformado por ele. Em nossa pesquisa, o professor-pesquisador tem um papel formal
frente ao objeto de estudo já que ele assume o papel de professor do grupo observado
numa perspectiva de médio prazo como parte integrante da estrutura social promovida
por uma sala de aula.
As observações foram realizadas em sala de aula, durante todo o experimento
formativo, ou seja, nos diagnósticos inicial e final, na construção da B. O. A. tipo III e o
processo de formação que contempla as etapas propostas pela Teoria da assimilação por
etapas das ações e dos conceitos. Os registros foram realizados por meio de notas
rápidas, descrição em caderno de anotações e gravação em áudio, propiciando uma
grande quantidade de informações que subsidiaram a análise feita posteriormente pelo
pesquisador.

6.7 ORGANIZAÇÃO DOS DADOS


Esta foi uma importante fase da pesquisa, principalmente em relação ao
processo de seleção, transcrição e codificação das informações obtidas pelos diversos
métodos de obtenção dos dados que permitirá uma análise rigorosa e válida
cientificamente, criando diversas possibilidades e perspectivas para o próximo passo do
nosso percurso metodológico.
Os dados foram organizados de acordo com cada técnica de obtenção das
informações. As respostas obtidas nas e tarefas e as informações constantes nas
observações foram categorizadas com base em inferências quanto ao seu significado,
segundo os critérios propostos por Núñez (2012):
 Exaustividade, abrangendo todo tipo de resposta obtida;
 Exclusividade, agrupando em cada categoria um conjunto de respostas
que nitidamente se diferencia dos outros;
 Manutenção de um mesmo nível de inferência e/ou interpretação dos
comportamentos, cuidando para que não ocorram grandes oscilações no
contínuo de objetividade-subjetividade.
Organizamos os dados obtidos nos instrumentos em planilhas eletrônicas para
facilitar a identificação das unidades de análise constantes nas respostas. Essas planilhas
foram subdividas por instrumento aplicado e por objetivo a ser respondido. O mesmo
foi feito para a organização dos dados obtidos nas observações, selecionando os
enunciados produzidos pelos alunos.

6.8 ANÁLISE DOS DADOS

Os procedimentos de análise dos dados seguiram uma estratégia que articula


dialeticamente aspectos quantitativos e qualitativos, a partir da premissa de que esses
dois aspectos são indissociáveis. Estabelecemos uma evolução entre sistemas de análise
quantitativo-descritivo, quantitativo-interpretativo e qualitativo.
Em princípio orientamos a análise para uma exploração objetiva estabelecendo
correlações entre variáveis relacionadas aos objetivos da pesquisa para, em um
momento posterior, realizar inferências, para explicar o processo sem perder de vista o
caráter objetivo expresso na própria natureza dos dados. Entra em cena aqui a
importância de se vincular os dados empíricos ao referencial teórico e,
consequentemente as primeiras contribuições da pesquisa como inovação acadêmica e
pedagógica.
Utilizamos como técnica de análise de dados uma análise qualitativa de
conteúdo, com a finalidade de que os enunciados produzidos pelos estudantes não
desapareçam no processo de categorização e relativização destes durante a atividade de
análise das frequências, traço quantitativo comum na análise de conteúdo tradicional.
De acordo com Núñez (2012):
A análise qualitativa dos dados busca a apreensão de
significados nas falas [...] interligados ao contexto e às situações
em que são produzidos e delimitados pelas referências teóricas
adotadas como marco referencial. É um processo indutivo de
análise de dados descritivos.
Uma das características que utilizamos a partir deste método foi o
emparelhamento dos dados empíricos com o modelo teórico que consideramos no
trabalho. Buscamos verificar a correspondência entre a construção teórica que compõe o
trabalho e os dados empíricos recolhidos durante a pesquisa. Em particular a atividade
de descrever em atividades experimentais foi analisada como elemento da comunicação,
ou seja, uma habilidade cognitivo-linguística que é assimilada por etapas com auto grau
de generalização, modelo este que esteve presente como orientador das análises
realizadas para a interpretação do conteúdo obtido.
A análise destes resultados também pode ser classificada como histórica já que
se baseia no referencial teórico escolhido para relatar a evolução do processo de
formação da habilidade, com a finalidade de por a prova a Teoria da assimilação por
etapas das ações e dos conceitos de P. Ya. Galperin.
7 REFERÊNCIAS
ACADEMIA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS (ABC). O Ensino de ciências e a educação
básica: propostas para superar a crise. Academia Brasileira de Ciências. Rio de Janeiro
2008, 56 p.

BRASIL, LDB. Lei 9394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.


Disponível em < www.planalto.gov.br >. Acesso em: 09 de outubro de 2013..

CAMPANARIO, J.M.; MOYA, A. Cómo enseñar Ciencias. Principales tendencias y


propuestas. Enseñanza de las Ciencias, 17(2), 179-192, 1999.

DELORS, J .Educação: um tesouro a descobrir: relatório para a UNESCO da Comissão


Internacional sobre Educação para o século XXI. Brasília, DF.: MEC: UNESCO, 1998.

GADOTTI, MOACIR. Perspectivas atuais da educação. São Paulo em Perspectiva.


São Paulo, v. 14, n. 2, junho de 2000. Acesso em 03 de novembro de 2014.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-88392000000200002.

GARCÍA, Carlos Marcelo. Formalidade e informalidade no processo de aprender a


ensinar. In PUENTES, Roberto Valdés; LONGAREZI, Andréa Maturano, AQUINO,
Orlando Fernández. Ensino Médio: estado atual, políticas e formação de professores.
EDUFU, Uberlândia, 2012.

MARCHESI, A. Estrategias para el cambio educativo. Pensamiento Iberoamericano, n.


7, 2010.

MARTINS, Isabel; OGBORN, Jon; FRESS, Gunther. Explicando uma explicação.


Ensaio,v. 1, n. 1, p. 29 - 46, 1999.

MONEREO, Carles; POZO, Juan Ignacio. ¿En que siglo vive la escuela? El reto de la
nueva cultura educativa. Cuadernos de Pedagogía nº 298, janeiro 2001.

OCDE. Informe PISA 2006: Competencias científicas para el mundo del mañana.
Madrid. Santillana, 2008.

OEI. Metas 2021: La educación que queremos para la generación de los bicentenários.
Organización de Estados Iberoamericanos para la Educación, la Ciencia y la Cultura.
Madrid, 2010.

OEI. miradas sobre la educación em Iberoamérica. Organización de Estados


Iberoamericanos para la Educación, la Ciencia y la Cultura. Madrid, 2012.
OGBORN, Jon et al. Explaning science in the classroom. Londres: Open University,
1996.

REID, D.V.; HODSON, D. Ciencia para todos en secundaria. Madrid: Narcea, 1993.

UNESCO. ¿Qué educación secundaria para el siglo XXI?. Ediciones UNESCO.


Organizações das Nações Unidas, 2002.

UNESCO. Hacia las sociedades del conocimiento. Ediciones UNESCO. Organizações


das Nações Unidas, 2005.

UNESCO. Como promover el interés por la cultura científca?: una propuesta didáctica
fundamentada para la educación científica de jóvenes de 15 a 18 años. Santiago de
Chile: Cátedra UNESCO América Latina, 2006.

VILCHES, Amparo; GIL-PEREZ, Daniel. La necesaria renovación de la formación del


profesorado para una educación científica de calidad. Tecné, Episteme y Didaxis n.º 22,
2007.

ARRUDA, S. M.; LABURÚ, C. E. Considerações sobre a função do experimento no


ensino de ciências. Questões Atuais no Ensino de Ciências. Série: Educação para a
Ciência, Editora Escrituras, SP, 2, 53-69, 1998.

BORGES, A. Tarcísio. novos rumos para o laboratório escolar de ciências. In Caderno


Brasileiro de Ensino de Física, v. 19, n. 3, dez. 2002. P. 9-31.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Média e


Tecnológica. PCN+ Ensino Médio: orientações educacionais complementares aos
Parâmetros Curriculares Nacionais – Ciências da Natureza, Matemática e suas
Tecnologias. Brasília: MEC/Semtec, 2002.

BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas


Educacionais Anísio Teixeira. Exame Nacional do Ensino Médio (Enem):
fundamentação teórico-metodológica. Brasília: MEC/INEP, 2005.

CARRASCOSA, J.; GIL PÉREZ, D.; VILCHES, VALDÉS, P. Papel de la actividad


experimental en la educación científica. In Caderno Brasileiro de Ensino de Física,
v. 23, n. 2, p.157-181, 2006.

GALPERIN, P. Ya. Sobre la formación de las imágenes sensoriales y de conceptos. In


Rojas, L. Q. (Comp). La formación de las funciones psicológica durante El
desarrollo del niño. Tlaxcala: Editora Universidad Autónoma de Tlaxcala, p. 27-40,
2001a.

GALPERIN, P. Ya. Tipos de orientación y tipos de formación de acciones y de los


conceptos In ROJAS, L. Q. (Comp). La formación de las funciones psicológica
durante el desarollo del niño. Tlaxcala: Editora Universidad Autónoma de Tlaxcala. p.
41-56, 2001b.

GASPAR, Alberto. MONTEIRO, Isabel Cristina de Castro. Atividades experimentais


de demonstrações em sala de aula: uma análise segundo o referencial da teoria de
Vygotsky. In Investigações em Ensino de Ciências, V. 10 (2), pp. 227-254, 2005.

GOMES, Alessandro D. T. BORGES, A. Tarcísio. JUSTI, Rosária. Processos e


conhecimentos envolvidos na realização de atividades práticas: revisão da literatura e
implicações para a pesquisa. In Investigações em Ensino de Ciências, v. 13 (2),
pp.187-207, 2008.

GRANDINI, Carlos Roberto. GRANDINI, Nádia Alves. Os objetivos do laboratório


didático na visão dos alunos do curso de Licenciatura em Física da UNESP-Bauru.
Revista Brasileira de Ensino de Física, v. 26, n. 3, p. 251 - 256, 2004.

LEONTIEV, A. N. Actividad, consciencia y personalidad. Ediciones Ciencias del


Hombre. Havana. Cuba. 1978.

LEONTIEV, A. N. Acerca de la importancia do concepto de actividad-objetal para la


psicologia. In Rojas, L. Q. (Comp). La formación de las funciones psicológica
durante El desarrollo del niño. Tlaxcala: Editora Universidad Autónoma de Tlaxcala,
p. 27-40, 2001a.

MARX, KARL. Teses sobre Feuerbach. Versão para e-book. Rocket Edition. 1999.
Disponível em http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/feuerbach.pdf. Acesso em 26
de maio de 2012.

MARSULO, Marly Aparecida Giraldelli. SILVA, Rejane Maria Ghisolfi. Os métodos


científicos como possibilidade de construção de conhecimentos no ensino de ciências.
In Revista Electrónica de Enseñanza de las Ciencias, v. 4, no 3, 2005.
MILLAR, R. Towards a role for experiment in the science teaching laboratory. In
Studies in Science Education. v. 14, p. 109-118, 1987

MONEREO, Carles; POZO Juan Ignacio. ¿En que siglo vive la escuela? El reto de la
nueva cultura educativa. In Cuadernos de Pedagogía, nº 298, enero 2001.

MOREIRA, M. A.; GONÇALVES, E. S. Laboratório estruturado versus não


estruturado: um estudo comparativo em um curso individualizado. In Revista
Brasileira de Física, v. 10, n.2, p. 367 - 381, 1980.

NUÑEZ, I. B. RAMALHO, B. L.. Desarrollo de una unidad didáctica para el estudio de


los procesos de oxidación reducción en el pre universitario: contribuciones de la teoría
de P. Ya. Galperin In: Marcia Gorette Lima da Silva. (Org.). Temas de ensino e
formação de professores de ciências. 1ed.Natal: EDUFRN, 2013, v. 1, p. 35-52.

NUÑEZ, I. B.; RAMALHO, B. L.. O contexto da atividade profissional e as condições


de trabalho: dimensões do profissionalismo docente. In: PUENTES, Roberto Valdés
Puentes; LONGAREZI, Andréa Maturano; AQUINO, Orlando Fernández. (Org.).
Ensino Médio: Estado atual, políticas e formação de professores. 1ed. Uberlândia, MG.
EDUFU, 2012, p. 229-252.

NUÑEZ, I. B. Ensinar a ensinar habilidades comunicativas como ferramenta na


construção do conhecimento em Ciências Naturais. Uma abordagem baseada na Teoria
de Assimilação por Etapas de P. Ya. Galperin. Projeto de Pesquisa Financiado pelo
CNPQ. UFRN. Natal, 2012.

NUÑEZ, I. B. RAMALHO, B. L. A formação de habilidades no contexto escolar:


contribuições da teoria de p. ya. Galperin. 34ª Reunião anual da ANPED – Educação e
Justiça Social. Natal/RN. 2011.

NUÑEZ, I. B.; Vygotsky, Leontiev e Galperin Formação de Conceitos e princípios


didáticos. Brasília. Liber Livros, 2009.

NUÑEZ, I. B. ; RAMALHO, B. L. A profissionalização da docência: um olhar a partir


das representação de professoras do ensino fundamental.. Revista Iberoamericana de
Educación (Online), v. -, p. 1-15, 2008.
NUÑEZ, I. B. ; RAMALHO, B. L. A pesquisa como recurso da formação e da
construção de uma nova identidade docente: notas para uma discussão inicial. Eccos.
Revista Científica, v. 7, p. 87-111, 2005.

NUÑEZ, I. B.; FARIA T. C. L. O enfoque sócio-histórico-cultural as aprendizagem: os


aportes de L. S. Vygotsky, A. N. Leontiev e P. Ya. Galperin. Fundamentos do Ensino
-aprendizagem das Ciências Naturais e da Matemática: O Novo Ensino Médio,
Editora Sulina, Porto Alegre, 51-68, 2004.

NUÑEZ, I. B. ; PACHECO, O. G. . Los Objetivos de La Quimica General. Definicion


A Partir Del Metodo Teorico. Didáctica de las Ciencias Experimentales y Sociales,
Universidade Valencia/Espanha, v. 10, n.0, p. 65-74, 1996.

NUÑEZ, I. B.. La formación de habilidades en Química General en la perspectiva de la


teoria de P. Ya Galperin como actividade de construción de conocimientos.. Química
Nova, São Paulo, v. 22, p. 429-434, 1999.

NUÑEZ, I. B.; PACHECO, O. G.. Formação de conceitos segundo a teoria de


assimilação de Galperin.. Cadernos de Pesquisa (Fundação Carlos Chagas), v. 105, p.
92-109, 1998.

NUÑEZ, I. B. Sistema didactico para la ensenanza de la quimica general. Havana,


1992. Tese (Doutoramento em Ciências Pedagógicas) – Universidade de Havana.

PEDUZZI, Sônia S.; PEDUZZI Luiz O. Q. Editorial. Caderno Brasileiro de Ensino de


Física – Edição Especial, Florianópolis, v. 24 p. 7 e 8, 2004.

PINHO-ALVES, José. Atividades Experimentais: do método à prática


construtivista. Florianópolis, 2000. Tese (Doutoramento em Educação: Ensino de
Ciências Naturais) – Universidade Federal de Santa Catarina.

______________(b). Regras da transposição didática aplicadas ao laboratório didático.


In Caderno Catarinense de Ensino de Física, v. 17, n. 2, ago. 2000.

POINCARE, H. Science and hypothesis. The walter scott publishing company ltd. New
York. 1905.
PORTUGAL. Ministério da Educação. Departamento de Ensino Secundário. Ensino
Experimental das Ciências: (Re)Pensar o Ensino das Ciências. PRODEP, 2001, 163 p.

PRAIA, João Felix. CACHAPUZ, António Francisco Carrelhas. GIL-PÉREZ, Daniel.


Problema, teoria e observação em ciência: para uma reorientação epistemológica da
educação em ciência. In Ciência & Educação, v.8, nº1, p.127 – 145, 2002.

QUINTANA, José Alba. JIMÉNEZ, Juan Carlos Elola. GARCÍA, Máximo Luffego.
Las Competencias Básicas en las Áreas de Ciencias. In Cuadernos de Educación de
Cantabria Volume 4. Consejería de Educación de Cantabria. Santander. Espanha.

RAMALHO, B. L. ; NUÑEZ, I. B. ; GAUTHIER, C. . Formar o Professor


Profissionalizar o Ensino: perspectivas e desafios. 2. ed. Porto Alegre: Editora Sulina,
2004. v. 2. 208p .

RAMALHO, B. L. ; NUÑEZ, I. B. Diagnóstico das necessidades formativas de


professores do ensino médio no contexto das reformas curriculares. Revista Educação
em Questão, v. 40, N. 26. Janeiro de 2011. Natal, RN: EDUFRN.

SARAIVA-NEVES, Margarida. CABALLERO, Concesa. MOREIRA, Marco Antonio.


Repensando o papel do trabalho experimental, na aprendizagem da física, em sala de
aula – um estudo exploratório. In Investigações em Ensino de Ciências – v. 11 (3),
pp.383-401, 2006.

SBF 2008. Física para o Brasil: pensando o futuro / editores: Alaor Chaves e Ronald
Cintra Shellard – São Paulo: Sociedade Brasileira de Física, 2005. 248p.

TENREIRO-VEIRA, Celina. VIEIRA, Rui Marques. Diseño y validación de


actividades de laboratorio para promover el pensamiento crítico de los alunos. In
Revista Eureka de Enseñanza e Divulgação Científica, 3 (3), pp. 452-466. 2006.

UNESCO. ¿Qué educación secundaria para el siglo XXI? UNESCO/OREALC


Santiago, Chile, 2002

UNESCO. Hacia las sociedades del conocimiento. Ediciones UNESCO. Paris, 2005.

VILELA-RIBEIRO, Eveline Borges. BENITE, Anna Maria Canavarro. Concepções


sobre natureza da ciência e ensino de ciências: um estudo das interações discursivas em
um Núcleo de Pesquisa em Ensino de Ciências. In Revista Brasileira de Pesquisa em
Educação em Ciências, vol. 9, no 1, 2009.

VIGOTSKY, L. S. Pensamento e da Linguagem. Edição eletrônica: Ed Ridendo


Castigat Mores. 2001.

_______________. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos


psicológicos superiores. 7o ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

_______________. Historia del desarrollo de las funciones psíquicas superiores. La


Habana, Editorial Científico Técnica. 1987.

_______________. A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo. Editora


Martins Fontes. 2000.

WERTSCH, J. V. The zone of proximal development: Some conceptual Issues. In:


Rogoff, B. e Wertsch, J. V. (eds): In Childrens learning in the Zone of Proximal
Development- New Directions to Child development, n 23 – S Francisco, Jossey –
Bass, março, p 84. 1984.

Você também pode gostar