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Bacabal
2016
CLARA CATARINA VIEIRA CIRILO
Bacabal
2016
RESUMO
Este artigo pretende mostrar as principais ideias de Freud acerca do fenômeno religioso,
que segundo ele, seria próprio de todos os humanos, já que a crença seria ilusória e todos os homens
possuem ilusões. A sociedade seria a responsável por assassinar o próprio pai – Deus – para livrar-
se dos temores e das possíveis penalidades resultantes da transgressão da vontade paterna. Vale
ressaltar que não buscamos exaurir esta temática, haja vista que nem mesmo Freud se propôs a tal
feito. Procuramos compreender ainda, os conceitos ressignificados por Freud como ilusão e impulso,
que mostraram-se fundamentais para a compreensão do pensamento freudiano sobre a religião.
Bacabal
2016
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO..........................………………...................................................…..05
2. SIGMUND SCHLOMO FREUD..........................................................................…..05
3. CULTURA……………….....................................................................................…..06
4. IMPULSO/PULSÃO……………………………..................................................….07
5. ILUSÃO...............................…………………………………………...................….09
6. CONCLUSÃO.................……………………........................................................…11
7. REFERÊNCIAS.........................................………………….....................................11
FREUD: A RELIGIÃO COMO ILUSÃO E COMO NEUROSE COLETIVA
Clara Catarina Vieira Cirilo1
Raphael Leandro Lopes Diniz2
1. INTRODUÇÃO
Sigismund Schlomo Freud, mais conhecido como Sigmund Freud foi um médico
neurologista e pai da psicanálise, de família judia, nascido na região da atual República Tcheca e
antigo império austríaco. Suas obras são lidas em todo o mundo, aproximando-se filosoficamente
do pensamento spinoziano, procurou libertar os homens para que estes pudessem compreender e
transformar seus afetos e para a alforria de suas opressões internas e externas, reais e imaginárias.
O conjunto de toda as obras produzidas por Sigmund Freud está, sem dúvidas, entre os
mais influentes textos já produzidos durante o século XX. O pai da ciência psicanalítica debruçou-
se sobre problemas humanos de forma como nenhum outro havia ousado antes dele. Desenvolveu
métodos que são utilizados ainda hoje.
Entre os vários títulos produzidos por Freud, destacamos neste artigo um texto em
específico: O futuro de uma ilusão, que foi publicado pela primeira vez em 1927. Esta obra se
coloca entre os textos em que Freud se propõe a discutir a origem psicológica da cultura, da religião
e seus dogmas. Junto com Totem e Tabu (1913), O futuro de uma ilusão compõem o conjunto de
produções mais elucidativas sobre o fenômeno psicológico/psiquiátrico da religião.
Freud procura explorar de maneira simples, porém profunda e elucidativa os termos que
julgou importantes para explicar os fenômenos que já citamos.
3. CULTURA
Freud aponta que o fenômeno religioso é uma manifestação cultural. A partir disso veremos
então o que significa cultura para Freud no livro “O futuro de uma ilusão”.
O propósito da cultura seria possibilitar a vida em comum, mas repousando sobre uma ótica
de coerção de uma minoria repressiva sobre uma maioria que também deverá negar seus impulsos
em favor da produção de bens divididos. Freud coloca então o fato de que mesmo que um ser
humano não possa viver em estado de isolamento, este indivíduo pode achar opressivo o modo de
se sacrificar para poder produzir o bem comum.
Freud vai então traçar algumas críticas a este modelo de cultura, apontando que a humanidade
fez e ainda fará progressos contínuos em favor da dominação da natureza e não tem progredido no
que diz respeito em evoluir na regulação das relações humanas. Para Freud seria bom acreditar em
uma possível cultura que não estivesse baseada na coerção e na repressão dos impulsos, onde o
indivíduo trabalharia em favor de si e não para o bem comum, no entanto, ele mesmo acredita que
ficaria apenas a pergunta se isto seria possível ou não.
Freud vai tocar então em um ponto consideravelmente importante, o fato de que não é seguro
que a maioria dos indivíduos estará preparado para assumir o que a cultura necessita, o autor coloca
que há em todos os homens tendências destrutivas e antissociais.
É necessário que as massas vejam em seus líderes exemplos a serem movidos ao trabalho a
renúncia aos impulsos e que isso deveria ser trabalhado desde a sua infância.
4. IMPULSO/PULSÃO
Freud inicia O Futuro de uma Ilusão com um debate sobre a cultura como instrumento de
dominação – devemos, então lembrarmo-nos que Freud compreende a cultura como “[…] tudo
aquilo em que a vida humana se elevou acima de suas condições animais e se distingue da vida dos
bichos”, neste sentido a cultura seria indivisível e inerente à própria civilização. (FREUD, 2010, p.
36). Para ele, a cultura seria ainda uma categoria comparativa entre as “realizações” de outras
culturas.
Para compreendermos melhor o que Freud propõe sobre a cultura e a religião, devemos
entender o que ele chama de “impulso” ou trieb4 no alemão. Impulsos – ou pulsões – seriam os
nossos desejos, as nossas vontades, mas não os desejos puramente incontroláveis, já que estes
últimos podem ser confundidos com instintos inconscientes, representam a parcela do querer que
aponta ao prazer.
A religião seria, neste sentido, o mecanismo cultural de controle das pulsões humanas, haja
vista que é ela quem delimitaria os caminhos do prazer humano, de seus desejos e suas pulsões. Ele
destaca ainda que frustração seria o sentimento de um indivíduo que não tem seus impulsos
satisfeitos e que a proibição seria a categoria ou a ferramenta de obstrução das pulsões. A coerção
também é tomada como um dos elementos de proibição eficiente para a frustração dos indivíduos.
É como quando se tem uma vontade, um anseio sexual por alguém, seu corpo e sua mente
lhe impulsionam a tentar satisfazer este desejo, entretanto a coerção religiosa lhe impede, lhe diz
que tal ato é impróprio pois “Deus não quer”. Deus, neste sentido seria o “tirano” que ditaria todas
as regras morais para os crentes.
Freud compara ainda a relação entre os homens e a divindade com a relação entre pai e
filho. O pai seria visto pelo filho com olhos de admiração, o protetor, aquele indivíduo mais forte
com capacidade de livrar o filho dos males no mundo, mas ao mesmo tempo é visto com olhos de
medo, temor; a mesma força que é usada para proteger o filho, também pode ser usada para puni-lo
caso alguma atitude da criança desagrade ao pai. Deus seria este ser admirado por sua onipotência
(no caso da religião cristã), sua mão protetora sobre seus filhos humanos, e sua benevolência, mas
4 É interessante que compreendamos que existem diversas traduções para o que seria o termo trieb, no Brasil
chegaram primeiro as traduções das traduções, ou seja, traduções para o português brasileiro a partir de outras
traduções, no caso o Inglês e o Francês. Sendo que estas duas traduções davam outros significados para o que seria
trieb, sendo traduzidos como instinto e pulsão, respectivamente. Posteriormente algumas edições traduziram o texto
original em Alemão direto para o português, compreendendo trieb como algo que impulsiona, empurra para frente.
também é temido por seus filhos, que evitam a ira de seu poderoso pai que os poderia castigar por
seus atos transgressores da vontade divina/paterna.
A sociedade seria a responsável por assassinar o próprio pai para livrar-se dos temores e
das possíveis penalidades resultantes da transgressão da vontade paterna. Mas como meio de
amenizar o remorso pelo patricídio a sociedade decide manter os ensinamentos deixados pelo pai.
“Não matarás, não roubarás”, disse ele.
Sigmund Freud usa todo seu típico sarcasmo para tratar sobre a coerção religiosa e idealiza
como seria uma sociedade sem as proibições religiosas/culturais. E segundo ele, poderíamos
imaginar que sem as proibições
“[…] alguém pode, então, escolher para objeto sexual qualquer mulher
que lhe agrade; pode matar seu rival na disputa por mulheres, ou quem mais estiver
em seu caminho, sem o menor escrúpulo; pode, também, tomar qualquer bem do
outro sem lhe pedir permissão [...]”. (FREUD, 2010. p. 55).
Quão caótica seria a vida, então sem as proibições culturais e religiosas! Mas é bem
verdade que a natureza não nos limita quanto aos nossos impulsos. A natureza, de maneira diferente
à cultura e à religião que nos proporcionam a frustração das pulsões por meio das proibições, a
natureza é conivente com elas, mas ao mesmo tempo é implacável quando nos quer, de alguma
maneira nos restringir, “ela nos mata de modo frio, cruel e sem consideração, segundo nos parece, e,
talvez, justamente nas ocasiões de nossa satisfação”. (IDEM, 2010. p. 56). Assim, a religião e a
cultura, o controle de nossas pulsões seriam meios de nos proteger da frieza da natureza.
Mas seria de um todo ilusório pensar que a natureza estivesse completamente controlada,
haja vista que não podemos controlar as marés, parar uma tempestade ou um tremor de terra que é
capaz de soterrar milhares de pessoas.
5. ILUSÃO.
“Não há instância alguma acima da razão”. Freud afirma isso ao refutar o argumento
religioso de um padre católico que dizia: “Creio porque é absurdo”. Tal afirmação nos levaria a
imaginar que o credo está acima de qualquer argumento racional, mas nos leva também a imaginar
“devo eu crer em qualquer absurdo” e se não, “por que justamente nesse?” (FREUD, 2010. p. 81).
Assim percebemos que a religião se baseia em ilusões, em imperativos de experiências individuais
que tentam ser aplicadas a todos os homens. “Se alguém obteve a convicção inabalável na verdade
real das doutrinas religiosas graças a um estado extático que o impressionou profundamente, que
importa isso ao outro?” (IDEM, 2010. p. 82).
Neste sentido, as pretensões irracionais dos dogmas religiosos são de natureza ilusória, ou
seja, são vontades de satisfazer o desejo de proteção por um pai, e o “desamparo” sentido por toda a
vida humana forçou aos homens de sentimento infantil a buscarem um pai mais poderoso, que os
guardassem como um “único filho amado, o povo eleito”.
A ideia, ou ilusão, como diz Freud, de um pai poderoso e benevolente afasta ou diminui o
medo dos perigos da vida, atenua os sofrimentos causados na terra por conta de uma esperança da
vida que se prolonga além da morte.
Ilusão seria o erro (não necessariamente um erro) provocado pelo impulso, pelo desejo. É
um delírio permeado pelos desejos. Basta lembrarmos do exemplo usado por Sigmund Freud:
Colombo ao chegar nas terras do novo mundo errou ao achar que chegava em solo indiano, mas este
erro estava permeado por seus desejos de dar uma volta ao mundo e encontrar novas rotas para a
chegada à Asia, neste sentido, Colombo estava preso à uma ilusão. A ilusão não necessariamente se
refere a algo irrealizável,
“uma mocinha plebeia, por exemplo, pode ter a ilusão de que um príncipe
virá buscá-la. É algo possível; já aconteceram alguns casos deste tipo. Que o
Messias venha e funde a Idade do Ouro é muito menos provável; conforme a
posição pessoal daquele que a julga, ele classificará essa crença como ilusão ou
como análoga a uma ideia delirante”. (FREUD, 2010. p. 87).
Uma sociedade religiosa, assim, estaria acometida de uma neurose universal, ou seja, a
ilusão generalizada no sentido de não possuir nenhuma pretensão racional sobre a vida ou mesmo a
morte, e tal patologia social protegeria os indivíduos de uma neurose pessoal, das dores, da
realidade a ser vivida por uma vida regrada pela racionalidade. As doutrinas religiosas seriam todas
ilusórias, nenhuma poderia ser demonstrada de maneira racional, algumas são tão inverossímeis que
Freud as compara com o delírio. E na mesma medida em que são indemonstráveis são também
irrefutáveis. (FREUD, 2010).
Também é necessário lembrar que Freud não procura forjar uma sociedade sem religiões,
haja vista que um mundo sem ilusões é um ilusão. Para ficar ainda mais claro, Freud afirma
categoricamente que já que as doutrinas religiosas possuem tanto ao seu favor, que suas ilusões não
podem ser refutadas, e que tem a tradição ao seu favor não seria ele quem impediria qualquer um de
crer, pois “da mesma forma que ninguém pode ser forçado a crer, ninguém pode ser forçado a não
crer” (FREUD, 2010. p. 90).
Nossa ilusão ocidental cabe ainda na ideia religiosa de que há uma regência moral
universal, que há uma vida depois desta, que existe um pai protetor e provedor de nossas
necessidades. Freud diz ainda que
“[…] é muito estranho que tudo isso seja da maneira como temos de
desejar que seja. E seria ainda mais esquisito se nossos antepassados, pobres,
ignorantes e sem liberdade, tivessem encontrado a solução de todos esses difíceis
enigmas do mundo.” (FREUD, 2010. p. 92).
5. CONCLUSÃO
Em O futuro de uma ilusão, Freud explora de maneira racional as origens das ilusões
religiosas na psique humana. Busca compreender, também, como se dá a relação humana com o
divino, comparando esta relação com a de um pai com seu filho. Aborda ainda a origem cultural da
religião, na tentativa de criar uma linha histórica do desenvolvimento religioso ocidental.
Este texto de Freud é, sem dúvidas, essencial para qualquer estudioso que se pretende
compreender a formação psicológica/psiquiátrica e até mesmo social da religião no mundo
ocidental.
Interessante notarmos que Freud, diferente de outros intelectuais ateus de seu tempo – e
mesmo antes disso – não ensejou propor uma sociedade sem religiões ou sem ilusões, buscava
somente compreender a origem destas categorias tão pertinentes e inerentes à própria humanidade.
Ilusório seria imaginarmos a humanidade completamente livre das ilusões, livre de sua própria
esperança e, por que não, de sua fé. Fé no amanhã, ou mesmo a esperança em um certo avanço
científico que pudesse servir de maneira positiva à sociedade. Tais pretensões podem ser tomadas
como ilusórias, mas não deixam de ter seu fundo em possibilidades reais.
6. REFERÊNCIAS
FREUD, Sigmund. O futuro de uma ilusão. ed. L&PM POCKET, vol. 849, 2010. Porto Alegre, RS.
SIGMUND FREUD. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2016.
Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Sigmund_Freud&oldid=47352958>.
Acesso em: 02 dezembro 2016.