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DIREITO

 CONSTITUCIONAL  –  JOÃO  PAULO  LORDELO  

CONSTITUCIONALISMO  
Sumário:  
1.  Noções  Gerais  
1.1.  Alocação  do  Direito  Constitucional  
1.2.  Conceito  de  Constitucionalismo    
2.  Fases  históricas  do  Constitucionalismo    
2.1.  CONSTITUCIONALISMO  ANTIGO    
2.2  CONSTITUCIONALISMO  MEDIEVAL  
2.3  CONSTITUCIONALISMO  MODERNO  
2.3.1  CONSTITUCIONALISMO  CLÁSSICO  OU  LIBERAL    
2.3.1.1  As  principais  idéias  que  aproveitamos  dos  Constitucionalismos    
2.3.1.2.  Estado  de  Direito  ou  Estado  Liberal  
2.3.1.3.  Experiências  do  Estado  de  Direito  ou  Estado  Liberal  
2.3.2  CONSTITUCIONALISMO  MODERNO  SOCIAL  
2.3.2.  Estado  Social  
2.4.  CONSTITUCIONALISMO  CONTEMPORÂNEO/NEOCONSTITUCIONALISMO  
2.4.1.  Características  do  Neoconstitucionalismo  
2.4.2.  Marcos  fundamentais  para  se  chegar  ao  neoconstitucionalismo    
2.4.3.  Pós-­‐positivismo  
2.4.4.  Dimensões  dos  Direitos  Fundamentais  
2.4.5.  Estado  Democrático  de  Direito  
2.5.  CONSTITUCIONALISMO  DO  FUTURO  
1.  Noções  Gerais  
1.1.  Alocação  do  Direito  Constitucional  
  O  Direito  é  uno  e  indivisível,  devendo  ser  estudado  como  um  grande  sistema.    
A   divisão   que   conhecemos   entre   ramos   de   direito   público   e   privado   foi   uma   opção  
didática,  desenvolvida  por  Jean  Domat.  O  Direito  Constitucional  seria  de  direito  público.  
  A  idéia  de  codificação  civil  como  reguladora  das  relações  privadas  foi  fortalecida  com  o  
liberalismo   clássico,   do   Estado   Liberal   ou   de   Direito,   a   partir   da   criação   dos   direitos   de   primeira  
dimensão   (fundados   no   valor   liberdade).   O   Estado   de   Direito   foi   seguido   pelo   Estado   Social  
(fundado   em   direitos   de   segunda   dimensão,   com   base   no   valor   igualdade,   em   sua   acepção  
material),   e   pelo   Estado   Democrático   de   Direito   (fundado   em   direitos   de   terceira   dimensão,  
fundados  nos  valores  solidariedade  e  fraternidade).  
Hoje,  apesar  da  suposta  utilidade  didática  da  dicotomia  entre  direito  público  e  privado,  
não   é   mais   adequado   falar   em   ramos   do   direito,   mas   em   um   verdadeiro   escalonamento  
verticalizado  e  hierárquico  de  normas,  apresentando-­‐se  a  Constituição  como  norma  de  validade  
de   todo   o   sistema   (inclusive   do   direito   civil,   para   passa   por   um   processo   de   descodificação   –  
com  a  criação  de  microssistemas  –  e  despatrimonialização,  em  razão  da  eficácia  horizontal  dos  
direitos   fundamentais   nas   relações   privadas),   situação   essa   decorrente   do   princípio   da   unidade  
do   ordenamento   e   da   supremacia   da   Constituição   (força   normativa   da   Constituição,   de   Konrad  
Hesse).  
 
1.2.  Conceito  de  Constitucionalismo      
Constitucionalismo  é  a  evolução  histórica  do  Direito  Constitucional.  Ele  gravita  em  torno  
das  seguintes  idéias  básicas:  
i. Separação  de  poderes  
ii. Garantia  de  direitos  
iii. Princípio  do  governo  limitado  
 

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DIREITO  CONSTITUCIONAL  –  JOÃO  PAULO  LORDELO  

Karl   Loewenstein,   um   dos   maiores   constitucionalistas,   afirma:   “a   história   do  


constitucionalismo  não  é,  senão,  a  luta  do  homem  político  pela  limitação  do  poder  absoluto”.  
O  constitucionalismo  surgiu,  assim,  como  uma  reação  ao  absolutismo,  contendo  regras  
de  limitação  do  poder  autoritário  e  de  prevalência  dos  direitos  fundamentais1.  
Canotilho,   por   sua   vez,   conceitua   o   constitucionalismo   moderno   como   uma   “técnica  
específica   de   limitação   do   poder   com   fins   garantísticos”,   como   uma   teoria   normativa   da  
política.  
A   economia   funcionou   como   um   fator   decisivo   para   a   evolução   do   Direito  
Constitucional.  
Pergunta-­‐se:  qual  é  o  conceito  de  constitucionalismo?  
Segundo  NOVELINO,  o  constitucionalismo  nada  mais  é  senão  uma  história  da  evolução  do  
Direito   Constitucional.   Em   um   sentido   amplo,   o   constitucionalismo   surge   desde   o   primeiro  
Estado  (todo  Estado  teria  uma  Constituição  -­‐  em  sentido  bem  amplo).  Acontece  que  o  termo  
“constitucionalismo”,  tecnicamente,  também  é  utilizado  de  maneira  estrita.  
Segundo  UADI  LAMMÊGO  BULOS:    
• Em   sentido   amplo   !   “Constitucionalismo   é   o   fenômeno   relacionado   ao  
fato   de   todo   Estado   possuir   uma   Constituição   em   qualquer   época   da  
humanidade,  independentemente  do  regime  jurídico  adotado”.    
• Já   em   sentido   restrito   !   “É   a   técnica   jurídica   de   tutela   das   liberdades,  
surgida  nos  fins  do  Séc.  XVIII,  que  possibilitou  aos  cidadãos  exercerem,  com  
base  em  constituições  escritas,  os  seus  direitos  e  garantias  fundamentais”.  
Ensina   ALEXANDRE   DE   MORAES:   “A   origem   formal   do   constitucionalismo   está   ligada   às  
Constituições  escritas  e  rígidas  dos  Estados  Unidos  da  América,  em  1787,  após  a  Independência  
das   13   Colônias,   e   da   França,   em   1791,   a   partir   da   Revolução   Francesa,   apresentando   dois  
traços   marcantes:   organização   do   Estado   e   limitação   do   poder   estatal,   por   meio   da   previsão   de  
direitos  e  garantias  fundamentais”.  
Explica   PEDRO   LENZA:   “Canotilho   identifica   vários   constitucionalismos,   como   o   inglês,   o  
americano  e  o  francês,  preferindo  falar  em  ‘movimentos  constitucionais’.  Em  seguida,  define  o  
constitucionalismo  como  uma  ‘teoria  ou  ideologia  que  ergue  o  princípio  do  governo  limitado  
indispensável  à  garantia  dos  direitos  em  dimensão  estruturante  da  organização  político-­‐social  
de  uma  comunidade’”.  
KILDARE   GONÇALVES   CARVALHO,   por   seu   turno,   vislumbra   tanto   uma   perspectiva   jurídica  
como  uma  sociológica:  
" Em   termos   jurídicos,   reporta-­‐se   a   um   sistema   normativo,   enfeixado   na  
Constituição,  e  que  se  encontra  acima  dos  detentores  do  poder;  
" Sociologicamente,  representa  um  movimento  social  que  dá  sustentação  à  
limitação   do   poder,   inviabilizando   que   os   governantes   possam   fazer  
prevalecer  seus  interesses  e  regras  na  condução  do  Estado’.  
ANDRÉ  RAMOS  TAVARES  identifica  quatro  sentidos  para  o  constitucionalismo:  

1
  Nas   palavras   de   Kildare   Gonçalves   Carvalho,   citado   por   Pedro   Lenza,   o   constitucionalismo   “em   termos   jurídicos,   reporta-­‐se   a   um   sistema  
normativo,  enfeixado  pela  Constituição,  e  que  se  encontra  acima  dos  detentores  do  poder;  sociologicamente,  representa  um  movimento  social  
que  dá  sustentação  à  limitação  do  poder,  inviabilizando  que  os  governantes  possam  fazer  prevalecer  seus  interesses  e  regras  na  condução  do  
Estado”.  

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" Movimento   político-­‐social   com   origens   históricas   bastante   remotas   que  


pretende,  em  especial,  limitar  o  poder  arbitrário;  
" Imposição  de  que  haja  cartas  constitucionais  escritas;  
" Propósitos  mais  latentes  e  atuais  da  função  e  posição  das  constituições  nas  
diversas  sociedades;  
" Evolução  histórico-­‐constitucional  de  um  determinado  Estado.  
Arremata   LENZA:   “os   textos   constitucionais   contêm   regras   de   limitação   ao   poder  
autoritário   e   de   prevalência   dos   direitos   fundamentais,   afastando-­‐se   da   visão   autoritária   do  
antigo  regime”.  
 
2.  Fases  históricas  do  Constitucionalismo  
2.1.  CONSTITUCIONALISMO  ANTIGO  
Essa  fase  começa  na  Antiguidade,  passando  pela  Idade  Média,  e  termina  no  final  do  séc.  
XVIII.  Não  aprofundaremos  nessa  fase,  pois  somente  envolve  vestígios  do  constitucionalismo.    
Constitucionalismo  hebreu   Grécia   Roma  
A   primeira   experiência   de   Durante   breves   e   brilhantes   Também   havia   limites   ao  
Constitucionalismo   ocorreu   centúrias,   existiu   um   regime   poder   do   Estado,   sobretudo  
no   Estado   hebreu   (era   um   político   absolutamente   na  fase  da  República  (antes  do  
estado   teocrático   e   os   constitucional:   a   democracia   império).  
poderes   do   soberano   eram   direta   das   Cidades-­‐Estados   Destaca-­‐se   aqui   o   valor  
limitados  pela  Igreja   gregas,   no   século   V.   Aqui,   o   liberdade   (limitada   aos  
poder   era   dividido   entre   patrícios,  logicamente).  
todos  os  cidadãos.  
 

Segundo   alguns   autores,   a   única   experiência   realmente   importante   para   o  


constitucionalismo   clássico   estudo   foi   a   inglesa:   a   experiência   constitucional   do   Rule   of   Law.  
Contudo,  a  doutrina  majoritária  coloca  essa  experiência  constitucionalismo  na  era  medieval.  
Entre  os  antigos,  o  constitucionalismo  já  se  apresentava,  de  modo  geral,  como  técnica  
de  limitação  do  poder.  São  características  do  constitucionalismo  antigo:  
• Inexistência  de  constituições  escritas,  prevalecendo  acordos  de  vontade;  
• As  leis  poderiam  ser  mudadas  sem  maiores  formalidades;  
• Vigorava   a   irresponsabilidade   governamental.   Os   imperadores   não   estavam  
obrigados  a  seguir  as  normas  jurídicas.  
 
2.4  CONSTITUCIONALISMO  MEDIEVAL  (SÉC  V  ATÉ  O  FIM  DO  IMPÉRIO  ROMANO  DO  ORIENTE)  
  É  engano  pensar  que,  na  Idade  Média,  o  constitucionalismo  teria  sido  sufocado.  Muito  
pelo  contrário!  Encontram-­‐se  neste  momento  as  mais  claras  apologias  ao  poder  limitado  dos  
governantes.  Vejamos:  
i. a  MAGNA  CARTA  DE  1215,  outorgada  na  Inglaterra,  pelo  rei  João  Sem  Terra,  filho  
de   Henrique   II,   representa   o   grande   marco   do   constitucionalismo   medieval,  
protegendo  diversos  direitos  individuais.  

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ii. Estatuto  ou  Nova  Constituição  de  Merton  (1236);  


iii. Petition  of  Rights  (1628);  
iv. Habeas  Corpus  Act  (1679);  
v. Bill  of  Rights  (1689)  e  o;  
vi. Act  of  Settlement  (1701).    
 
Vejamos  as  principais  características  do  constitucionalismo  nesse  período:  
• Predomínio  da  concepção  jusnaturalista  de  constituição;  
• Existência  de  autênticas  constituições  não  escritas;  
• Idéia   de   que   a   autoridade   dos   governantes   era   fundada   num   contrato   com   os  
súditos.  Deus  seria  o  árbitro  do  seu  fiel  cumprimento;  
• Os  cidadãos,  ao  menos  teoricamente,  não  poderiam  ser  submetidos  ao  poder  
arbitrário.  Aqui,  iniciou-­‐se  o  RULE  OF  LAW.  
  Na   Inglaterra   surgiu   uma   expressão   (recentemente   cobrada   em   certame   do   MP/MG)  
chamada  rule  of  law.  Tal  expressão  possui  origem  na  Magna  Carta  inglesa  (1215),  documento  
precursor   de   todas   as   futuras   Declarações   de   Direitos,   já   que   representa,   breve   síntese,   a  
necessidade  de  submissão  do  governo  às  leis.  
Tal   expressão   é   traduzida   como   “governo   das   leis”,   em   substituição   ao   governo   dos   homens.  
Trata-­‐se  de  um  pressuposto  básico  da  Democracia,  marco  do  constitucionalismo,  donde  se  extraem  as  
seguintes  contribuições:    
a) Limitação   ao   poder   arbitrário   (apesar   de   não   ter   uma   constituição   escrita,  
muitos  pactos  foram  celebrados  entre  cidadãos  e  governantes,  com  o  escopo  de  
limitar  o  poder  arbitrário:  sujeição  à  lei  e  ao  parlamento  etc.).  
b) Igualdade  dos  cidadãos  ingleses  perante  a  lei  
Artigo:  Você  sabe  o  que  significa  o  princípio  "rule  of  law"?  -­‐  Lilia  Loffredo  20/08/2008  
Autor:  Lília  de  Castro  Monteiro  Loffredo;    
A   resposta   à   indagação   remonta   à   primeira   manifestação   concreta   do  
constitucionalismo:  a  Magna  Carta  Libertatum.  Na  Inglaterra,  ano  de  1215,  o  Rei  João  
Sem   Terra   foi   coagido   pelos   barões   ingleses   a   prometer   obediência   à   Magna   Carta  
Libertatum,   por   eles   idealizada.   Esse   precioso   documento   pode   ser   considerado   o  
principal   precursor   de   todas   as   futuras   Declarações   de   Direitos,   eis   que   representa   a  
autoridade  do  governo  exercida  em  concordância  com  as  leis  existentes.  
José   Joaquim   Gomes   Canotilho   entende   que   mesmo   com   as   variações   do   princípio  
"rule  of  law"  no  tempo,  o  instituto  contém  quatro  dimensões  bem  nítidas:  The  rule  of  
law   significa,   em   primeiro   lugar,   na   seqüência   da   Magna   Charta   de   1215,   a  
obrigatoriedade  da  observância  de  um  processo  justo  E  legalmente  regulado,  quando  
se  tiver  de  julgar  e  punir  os  cidadãos,  privando-­‐os  de  sua  liberdade  e  propriedade.  
Em  segundo  lugar,  IMPORTA  NA  proeminência  das  leis  e  costumes  do  país  perante  a  
discricionariedade  do  poder  real.  Por  conseguinte,  aponta  para  a  sujeição  de  todos  os  
actos  do  executivo  à  soberania  do  parlamento.  
E,   Por   fim,   Rule   of   Law   terá   o   sentido   de   igualdade   de   acesso   aos   tribunais   por   parte  
dos   cidadãos   a   fim   destes   aí   defenderem   os   seus   direitos   segundo   os   princípios   de  
direito  comum  dos  ingleses  (Common  Law)  e  perante  qualquer  entidade  (indivíduos  
ou   poderes   públicos).   Analisando   a   questão   mais   a   fundo,   verifica-­‐se   que   o   "rule   of  
law"   tem   como   verdadeiro   substrato   o   princípio   da   legalidade.   Nessa   esteira   de  
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DIREITO  CONSTITUCIONAL  –  JOÃO  PAULO  LORDELO  

pensamento,   tem-­‐se   que   um   Estado   que   não   respeita   os   direitos   humanos   ou,   até  
mesmo,  não  se  pauta  na  democracia  pode  muito  bem  existir  sem  o  princípio  "rule  of  
law".  Todavia,  trata-­‐se  de  preceito  considerado  pressuposto  lógico  da  Democracia,  que  
se   revela   como   verdadeira   garantia   contra   o   despotismo   ao   se   firmar   como   suporte  
legal  ao  Estado  Democrático  de  Direito.  

 
2.3.  CONSTITUCIONALISMO  MODERNO  
  Inaugura-­‐se  a  partir  do  surgimento  da  Constituições  escritas.  
 
2.3.1  CLÁSSICO  OU  LIBERAL  
Começa  no  final  do  séc.  XVIII,  com  as  revoluções  liberais  (francesa  e  norte-­‐americana),  e  
vai  até  a  Primeira  Guerra  Mundial  (1914).    
  Até   então,   não   existia   Constituição   escrita,   mas   simplesmente   baseada   nos   costumes.   A  
primeira   Constituição   escrita   que   existiu   foi   dos   EUA,   em   1787,   seguida   da   Constituição  
francesa  de  17912.      
  Com   a   Constituição   escrita   surge   a   rigidez   constitucional   (processo   mais   solene,   com  
dificuldade  de  alteração  de  suas  normas).   A   Constituição   rígida,   por   sua   vez,   é   caracterizada  
pela  supremacia,  surgindo  a  idéia  de  supremacia  da  Constituição.  
 Escrita  !  Rigidez  !  Supremacia      
  Muitos   autores   entendem   que   o   Constitucionalismo   só   surgiu   nessa   fase,   com   a  
Constituição  rígida  e  suprema.  
Nessa   fase   do   Constitucionalismo   surgiram   os   direitos   de   primeira   dimensão3:   direitos  
fundamentais  relacionados  com  o  valor  liberdade4,  elegendo-­‐se  o  povo  como  o  titular  legítimo  
do  poder  (pela  Revolução  Francesa).  
A  primeira  dimensão  de  direitos  é  formada  por  direitos  civis  ou  políticos5.    
 
2.3.1.1.  As  principais  idéias  que  aproveitamos  dos  Constitucionalismos    
 

A)  Norte-­‐americano  
i. Supremacia   da   Constituição   #   o   jogo   político   é   protagonizado   pelos   Poderes  
Legislativo,   Judiciário   e   Executivo   e   organizado   pela   Constituição.   Os   norte-­‐
americanos  perceberam  que,  para  a  Constituição  efetivamente  determinar  as  regras  
do   jogo   entre   os   Poderes,   teria   que   estar   acima   deles.   Daí   surgiu   a   idéia   de   Poder  
Constituinte,   que   se   refere   à   Constituição,   e   Poderes   Constituídos,   que   são   os  
Poderes  Legislativo,  Executivo  e  Judiciário;  

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 A  Constituição  francesa  não  foi  a  primeira  constituição  escrita  na  Europa,  mas  a  Constituição  polonesa,  que  surgiu  um  pouquinho  antes.  
3
 Não  se  utiliza  mais  a  expressão  “geração”,  para  manter  a  idéia  de  que  as  dimensões  coexistem.  
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  Pois   esse   era   o   interesse   da   luta   da   burguesia,   que   buscava   proteger   os   direitos   à   liberdade   e   propriedade,   contra   a   arbitrariedade   do  
monarca.  
5
  Para   ilustrar,   a   Constituição   americana,   que   data   de   1787,   época   do   Constitucionalismo   clássico   ou   liberal,   quando   surgiu,   somente  
consagrava  direitos  civis,  razão  porque  chamam  os  direitos  constitucionais  de  civil  rights  lá.  

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ii. Garantia  Jurisdicional  #  define  que  o  Poder  Judiciário  será  responsável  por  garantir  
a   supremacia   da   Constituição.   Os   norte-­‐americanos   escolheram   o   Poder   Judiciário  
para   defesa   da   Constituição   porque   era   o   Poder   mais   neutro,   do   ponto   de   vista  
político,   em   comparação   com   os   Poderes   Executivo   e   Legislativo.   O   controle   de  
constitucionalidade  surgiu  aqui,  em  função  da  garantia  jurisdicional  (controle  difuso  
feito  pelo  juiz  Jonh  Marshall,  em  1803).  
iii. Federalismo,  República  como  forma  de  governo,  Etc.  
 

B)  Francês  
i. Garantia  de  Direitos    
ii. Separação  de  Poderes  
 

Essas   ideias   estão   muito   claras   no   art.   16   da   Declaração   Universal   dos   Direitos   do  
Homem  e  do  Cidadão  (a  declaração  da  revolução  francesa,  de  1789):  
Art.  16.º  A  sociedade  em  que  não  esteja  assegurada  a  garantia  dos  direitos  nem  estabelecida  a  
separação  dos  poderes  não  tem  Constituição.  

 
2.3.1.2.  Estado  de  Direito  ou  Estado  Liberal  
O  Estado  de  Direito  surge  até  um  pouco  antes  do  constitucionalismo  clássico,  no  Rule  of  
Law  inglês,  mas  é  nessa  época  que  ela  fica  institucionalizado.    
A   partir   do   constitucionalismo   clássico,   começa   a   haver   predomínio   do   positivismo  
jurídico  sobre  o  jusnaturalismo,  surgindo  a  idéia  de  Estado  de  Direito.  
O   Estado   de   Direito   substituiu   o   modelo   de   Estado   anterior,   absolutista,   chamado   de  
Estado   de   Polícia.   O   Estado   de   Direito   está   ligado   à   idéia   de   “império   da   lei”,   opondo-­‐se   ao  
império  dos  homens.  
 

CARACTERÍSTICAS  PRINCIPAIS  DO  ESTADO  LIBERAL:  


i. Os  direitos  fundamentais  correspondem  aos  direitos  da  burguesia  –  seriam  os  direitos  à  
liberdade  e  propriedade.  
O   Estado   liberal   é   essencialmente   abstencionista,   não   intervindo   nas   relações   sociais,  
laborais,   econômicas,   mas   somente   se   preocupando   com   a   proteção   da   liberdade   e   da  
propriedade.  
Nessa  época,  liberdade  e  propriedade  só  apresentavam  caráter  formal,  e  não  a  dimensão  
material,  adotada  na  atualidade.  
Desde   essa   época,   a   intervenção   (restrição)   dos   direitos   fundamentais   só   era   possível   por  
meio  de  lei.  Daí  vemos  que  o  princípio  da  legalidade  já  estava  presente.  
 

ii. A   limitação   do   poder   do   Estado   pelo   Direito   se   estende   ao   soberano   –   no   Estado   de  


Direito  não  havia  ninguém  acima  da  lei:  todos  estavam  sujeitos  à  lei  e  à  Constituição.  
iii. Princípio  da  legalidade  da  Administração  Pública  –  Ela  só  podia  atuar  com  base  em  lei.  

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iv. O  Estado  se  limita  à  defesa  da  ordem  e  segurança  públicas   –  isso  porque  o  Estado  liberal  
é  abstencionista.  No  campo  econômico,  o  Estado  de  Direito  é  mínimo6.    
 
2.3.1.3.  Experiências  do  Estado  de  Direito  ou  Estado  Liberal  
O  Estado  de  Direito  teve  três  concretizações/experiências  importantes:    
A. Experiência  da  Rule  of  Law  –  foi  um  Estado  de  Direito  que  aconteceu  na  Inglaterra,  na  
Idade   Média.   Foi   “o   Governo   das   Leis”,   em   substituição   ao   “Governo   dos   Homens”.  
Característica   principal:   desenvolvimento   do   devido   processo   legal   em   sua   dimensão  
substantiva  (noção  de  que  o  processo  tem  que  ser  justo  e  adequado).  
B. Experiência  do  Rechtsstaat  –  ocorreu  na  Prússia,  no  séc.  XVIII.  (trad.  literal  é  Estado  de  
Direito).   Característica   principal:   impessoalidade   do   poder   (ou   seja,   dentro   do   Estado,  
todos  estão  limitados  pelo  que  a  lei  determina).  
C. Experiência   do   État   Légal   –   ocorreu   na   França,   depois   da   Revolução   Burguesa.  
Característica   principal:   estabelecimento   de   normas   por   legisladores   eleitos  
democraticamente.   Apenas   na   França   o   direito   tinha   que   ser   criado   por   legisladores  
eleitos,   na   Alemanha   não   havia   essa   previsão.   O   État   Légal   corresponde   ao   Estado   de  
Direito.  
Nessa   época   vigia   o   positivismo   jurídico   da   Escola   da   Exegese.   Os   revolucionários  
franceses  não  confiavam  nos  juízes,  razão  porque  a  hermenêutica  seria  de  subsunção.  A  função  
do  juiz  era  meramente  revelar  aquilo  que  a  lei  dizia.  O  juiz  só  podia  interpretar  literalmente,  e  
não  aplicando  uma  interpretação  conforme  a  Constituição.  
 

OBS:   Experiência   do   État   du   Droit   –   ocorreu   na   França,   após   o   État   Legal.   Ele  
corresponde  ao  que  chamam  na  Alemanha  de  Verfassungsstaat  (Estado  Constitucional)  
e  não  ao  Estado  de  Direito,  como  pode  parecer.  
 

QUESTÃO:  Trate  do  devido  processo  legal  no  Rule  of  Law,  no  État  Legal  e  Rechtsstaat.  

 
2.3.2  CONSTITUCIONALISMO  MODERNO  OU  SOCIAL7  
Teve  uma  duração  curta,  existindo  no  período  entre-­‐guerras  (1918-­‐1945).  
Esse   novo   Constitucionalismo   surgiu   em   razão   da   crise   econômica   e   financeira   pela   qual  
o   mundo   passava,   em   decorrência   do   esgotamento   fático   do   Constitucionalismo   Liberal,  
incapaz   de   atender   as   demandas   por   direitos   sociais.   O   Estado   abstencionista   é,   assim,  
substituído  pelo  Estado  intervencionista.  
  Nessa  fase  do  Constitucionalismo,  o  rol  de  direitos  fundamentais  é  aumentado,  surgindo  
a   segunda   dimensão   de   direitos   fundamentais,   ligados   ao   valor   “igualdade”.   Essa   é   a   igualdade  
material,  pois  a  igualdade  formal  já  existia  na  época  do  Constitucionalismo  Clássico.  

6
  Teoria   da   mão   invisível,   de   Adam   Smith,   principal   teórico   do   campo   econômico   do   Estado   Liberal.   Na   visão   de   Adam   Smith,   o   Estado   deve   ter  
apenas  três  deveres:  (i)  proteger  a  sociedade  contra  a  violência  e  a  invasão  externa;  (ii)  estabelecer  uma  adequada  administração  da  Justiça;  
(iii)  erigir  e  manter  obras  e  instituições  que  não  sejam  objeto  de  interesse  privado.  
7
  O   Constitucionalismo   Moderno   (denominação   de   Marcelo   Novelino)   também   é   chamado   por   Pedro   Lenza   e   Uadi   Lammêgo   de  
Constitucionalismo  Moderno.  Esses  autores  não  distinguem  a  fase  do  Constitucionalismo  Moderno  entre  os  Estados  de  Direito/Liberal  e  Social,  
como   faz   Marcelo   Novelino,   que   trata   desses   Estados   como   fazendo   parte,   respectivamente,   das   fases   do   Constitucionalismo   Clássico   e  
Moderno.  Para  Pedro  Lenza  e  Uadi  Lammêgo,  tanto  o  Estado  de  Direito  quanto  o  Estado  Social  estão  insertos  na  fase  do  Constitucionalismo  
Moderno.  

7  
DIREITO  CONSTITUCIONAL  –  JOÃO  PAULO  LORDELO  

Os   direitos   de   segunda   dimensão   são   conhecidos   como   direitos   sociais,   econômicos   e  


culturais.  
Os  direitos  ligados  ao  valor  liberdade  eram  direitos  individuais.  Já  os  direitos  de  segunda  
geração  são  coletivos.  
Os   direitos   de   segunda   dimensão   e   o   Constitucionalismo   moderno   tiveram   como  
documentos   marcantes   a   Constituição   do   México,   de   1917,   e   a   de   Weimar,   de   1919.   Essas  
Constituições  influenciaram  a  criação  da  Constituição  brasileira  de  1934.  
No   Constitucionalismo   Moderno,   surge   um   novo   modelo   de   Estado   para   substituir   o  
Estado  de  Direito/Liberal:  o  Estado  Social.  
 
2.3.2.1.  Estado  Social  
O   Estado   Social   tenta   superar   a   dicotomia   paradoxal   entre   a   igualdade   política   (todos  
tinhas  direitos)  e  a  desigualdade  social  (as  pessoas  viviam  de  formas  diferentes).  
O   Estado   Social   mantém   sua   adesão   ao   capitalismo,   e   isso   o   diferencia   do   Estado  
Socialista/Proletário,  que  adota  o  comunismo  ou  o  socialismo.  
 

CARACTERÍSTICAS  DO  ESTADO  SOCIAL:  


i. Intervenção   no   domínio   social,   econômico   e   laboral   –   ao   contrário   do   Estado  
Liberal,  que  deixava  que  a  liberdade  de  concorrência  cuidasse  dessa  parte.  
ii. O  Estado  assume  um  papel  decisivo  na  produção  e  distribuição  de  idéias  
iii. Garantia   de   um   mínimo   de   bem   estar   social   –   por   isso   muitos   o   chamam   de   Estado  
do  Bem  Estar  Social  ou  Welfare  State.  
O   Estado   de   Bem   Estar   Social   costuma   criar   um   salário   social.   No   Brasil   temos   isso:   o  
benefício   assistencial   (não   previdenciário)   pago   para   incapazes   ou   maiores   de   65   anos   que  
tiverem  renda  familiar  per  capita  menor  de  ¼  do  salário  mínimo.  
 

iv. Estabelecimento   de   um   grande   convênio   global   de   estabilidade   econômica   –  


Keynes   foi   o   principal   teórico   econômico   do   Estado   Social.   Por   isso,   esse   pacto  
(acordo  global  de  estabilidade  econômica)  é  chamado  de  keynesiano.    
v. Aumento   do   grau   de   complexidade   da   interpretação   do   Direito   –   A   partir   de  
meados  do  séc.  XIX,  Savigny  estabelece  cânones  hermenêuticos  que  passaram  a  ser  
aplicados,   em   adição   à   interpretação   literal,   propagada   pelos   exegetas.   A  
interpretação  seria  realizado  por  meio  dos  seguintes  métodos  interpretativos:    
a. literal  ou  gramatical;    
b. histórica;    
c. lógico  e  sistemático.    
O   elemento   teleológico   (busca   a   finalidade   da   norma)   não   foi   desenvolvido   por   Savigny,  
pois   não   há   necessidade   de   fixação   dele   como   elemento   autônomo,   uma   vez   que   quando   se  
utiliza  os  demais  métodos  interpretativos,  já  se  está  buscando  a  finalidade  da  norma.  
 
2.4.  CONSTITUCIONALISMO  CONTEMPORÂNEO  OU  NEOCONSTITUCIONALISMO  

8  
DIREITO  CONSTITUCIONAL  –  JOÃO  PAULO  LORDELO  

Alguns   autores,   brasileiros,   espanhóis   e   latino-­‐americanos   têm   chamado   essa   fase   de  


neoconstitucionalismo.    
Essa  fase  do  constitucionalismo  é  fundada  do  paradigma  jurídico  do  pós-­‐positivismo,  em  
se   busca   não   mais   apenas   atrelar   o   constitucionalismo   à   idéia   de   limitação   de   poder   político,  
mas,  acima  de  tudo,  buscar  a  eficiência  da  Constituição.  Seu  modelo  normativo  é  AXIOLÓGICO8,  
porque   enquanto   o   caráter   ideológico   do   constitucionalismo   moderno   era   apenas   limitar   o  
poder,   o   caráter   ideológico   do   neoconstitucionalismo   é   o   de   concretizar   direitos  
fundamentais.  
 

CONSTITUCIONALISMO  MODERNO   NEOCONSTITUCIONALISMO  


Hierarquia  formal  entre  normas  constitucionais  e  infra     Hierarquia  entre  normas  baseada  em  valor  (axiológica)  
Finalidade:  Limitação  de  poder   Finalidade:  Concretização  dos  direitos  fundamentais  

 
2.4.1.  Características  do  Neoconstitucionalismo  
Segundo   Walber   de   Moura   Agra,   dentre   as   principais   características   do  
neoconstitucionalismo  podem  ser  mencionadas:  
a) Positivação  e  concretização  de  um  catálogo  de  direitos  fundamentais  
b) Onipresença  dos  princípios  e  das  regras  
c) Inovações  hermenêuticas  
d) Densificação  da  força  normativa  do  Estado  
e) Desenvolvimento  da  justiça  distributiva  (eficácia  de  direitos  sociais)  
 
i. Normatividade   da   Constituição   (Konrad   Hesse)   –   Define   que   a   norma   constitucional  
tem  status  de  norma  jurídica,  sendo  dotada  de  imperatividade.  os  EUA  já  aceitavam  a  
normatividade   da   Constituição   desde   sua   Constituição   de   1978,   mas   na   Europa   não  
havia   essa   preocupação,   pois   para   os   europeus   os   direitos   fundamentais   eram   apenas  
diretrizes,   às   quais   o   Parlamento   não   estaria   vinculado9.   Hoje,   a   normatividade   é  
indiscutível.    
ii. Supremacia   Constitucional   –   essa   característica   também   já   existia   desde   as   primeiras  
constituições  escritas.  Para  ter  supremacia  formal,  a  Constituição  tem  que  ser  rígida  e,  
para  ser  rígida,  tem  que  ser  escrita.  
iii. Centralidade   da   Constituição   –   essa   característica   também   é   denominada   de  
Unipresença,   Imperatividade,   Superioridade,   Ubiqüidade   Constitucional.   A   Constituição  
passa   a   ser   o   centro   do   sistema   jurídico,   marcada   por   intensa   carga   valorativa.   A  
centralidade   da   Constituição   se   reflete   no   fenômeno   da   Constitucionalização   dos   ramos  
específicos  do  Direito  (ex:  constitucionalização  do  direito  civil).    
Expressões  da  centralidade  da  Constituição:  
a. Eficácia  Horizontal  dos  Direitos  Fundamentais:  quando  os  direitos  fundamentais  
de   primeira   dimensão   surgiram,   tinham   apenas   eficácia   vertical   (somente   o  
Estado  era  sujeito  passivo).  Os  juristas  começaram  a  perceber,  no  entanto,  que  a  
violação  dos  direitos  fundamentais  não  ocorria  somente  na  relação  subordinada  
entre   Estado   e   cidadãos,   mas   também   na   relação   de   coordenação,   entre  

8
 No  constitucionalismo  moderno  a  diferença  entre  normas  constitucionais  e  infraconstitucionais  era  apenas  de  grau,  no  neoconstitucionalismo  
a  diferença  é  também  axiológica.  
9
 Pois  os  europeus  confiavam  em  seus  parlamentares  para  defesa  de  seus  direitos.  

9  
DIREITO  CONSTITUCIONAL  –  JOÃO  PAULO  LORDELO  

particulares.   Por   isso   desenvolveram   a   tese   da   eficácia   horizontal   dos   direitos  


fundamentais,  que  impõe  sua  observância  nas  relações  entre  particulares.  
b. Filtragem   Constitucional:   Define   que   tudo   deve   ser   interpretado   a   partir   da  
Constituição,   que   servirá   de   norma   de   validade   de   todo   o   sistema,   que   deverá  
estar   em   consonância   com   seu   espírito.   Significa   que   as   leis   devem   ser  
interpretadas  à  luz  dos  valores  consagrados  pela  Constituição.  Esse  é  o  chamado  
princípio  da  interpretação  conforme  à  Constituição.  
c. Rematerialização  da  Constituição:  é  uma  característica  comum  às  Constituições  
do  pós-­‐guerra.  Significa  que  o  conteúdo  da  Constituição  foi  revisto  e  ampliado.  
Novos  direitos  fundamentais  foram  incorporados  às  Constituições,  que  passaram  
a   adotar,   também,   por   exemplo,   diretrizes   políticas.   Por   isso,   as   Constituições  
passaram   a   ser   prolixas10.   É   o   chamado   totalitarismo   constitucional,   segundo  
qual   a   Constituição   passa   a   tratar   de   todos   os   assuntos   minimamente  
importantes,   assumindo,   ainda,   conteúdo   programático11,   característica   da  
constituição   dirigente   de   Canotilho12,   que   visa   a   encontrar   mecanismos   para   a  
efetiva  concretização  dos  valores  consagrados  na  Constituição.  
d. Maior   Abertura   da   Interpretação   Constitucional:   a   interpretação   constitucional  
evoluiu   e   hoje   temos   vários   métodos   específicos   para   a   interpretação   da  
Constituição.    
Os   princípios   são   aplicados   por   meio   de   um   método   de   sopesamento,   da   ponderação,   e  
não  pelo  método  da  subsunção  (aplicado  sobre  as  normas-­‐regras).  O  juiz  tem  que  analisar,  no  
caso  concreto,  o  princípio  que  tem  relevância  maior.  Não  havendo  um  consenso  do  que  venha  
a  ser  a  decisão  mais  correta,  a  decisão  torna-­‐se  mais  subjetiva,  com  mais  poder  para  o  juiz.  O  
juiz  utiliza  a  fundamentação  para  decidir.  
e. Fortalecimento   do   Poder   Judiciário:   antes   da   Constituição   de   1988,   somente  
existia   uma   ação   de   controle   de   constitucionalidade   abstrato,   hoje   temos   4.  
Nenhum   outro   país   do   mundo   tem   tantas   formas   de   controle   de  
constitucionalidade  como  o  Brasil.  Isso  dá  grande  poder  ao  STF,  que  atua  como  
legislador  negativo.  A  ampliação  dos  legitimados  para  a  propositura  das  ações  de  
controle   de   constitucionalidade   também   auxiliou   o   fortalecimento   do   Poder  
Judiciário   (Antes   da   CF/88,   só   o   Procurado   Geral   da   República   podia   ajuizar   a  
representação  de  inconstitucionalidade).  
 
2.4.2.  Marcos  fundamentais  para  se  chegar  ao  neoconstitucionalismo  
 

10
 Nossa  Constituição,  por  exemplo,  é  tão  prolixa  porque  posterior  à  ditadura.  
11
 Normas  programáticas  são  metas  a  serem  atingidas  pelo  Estado,  programas  de  governo.  
12
 Essa  concepção  de  dirigismo  estatal  (de  o  texto  fixar  regras  para  dirigir  as  ações  governamentais)  tende  a  evoluir  para  o  que  André  Ramos  
Tavares   chama   de   dirigismo   comunitário   do   constitucionalismo   globalizado,   que   busca   difundir   a   idéia   da   proteçãoaos   direitos   humanos   e  
propagação  para  todas  as  nações.  

10  
DIREITO  CONSTITUCIONAL  –  JOÃO  PAULO  LORDELO  

 1)  Estado  Cons„tucional  de  Direito    


HISTÓRICO    2)  Cons„tuições  a  par„r  da  2ª  Guerra  Mundial    
 3)  Redemocra„zação  

 1)  Pós-­‐posi„vismo  (direito-­‐é„ca)  


MARCOS   FILOSÓFICO  
FUNDAMENTAIS    2)  Direitos  Fundamentais  

 1)  Força  norma„va  da  Cons„tuição  (Konrad  Hesse)  


 2)  Supremacia  da  Cons„tuição  (cons„tucionalização  
TEÓRICO   dos  direitos  fundamentais)    
 3)  Nova  dogmá„ca  da  interpretação  cons„tucional  
 
2.4.3.  Pós-­‐positivismo  
O  pós-­‐positivismo  é  o  paradigma  jurídico  do  constitucionalismo  contemporâneo,  como  
uma  filosofia  do  Direito  que  surge  após  a  Segunda  Guerra  Mundial,  quando  perceberam  que  a  
legalidade   estrita   poderia   dar   fundamento   a   muitas   atrocidades   (como   ocorreu   na   Alemanha  
nazista,  que  era  um  Estado  de  Direito).  
O  pós-­‐positivismo  passou  a  buscar  a  reaproximação  entre  o  direito  e  a  moral,  ou  seja,  
com  a  noção  de  justiça.  Não  representa  um  retorno  ao  jusnaturalismo,  mas  algo  novo.  Ela  tenta  
ser  um  ponto  intermediário  entre  o  jusnaturalismo  (direito  natural,  posto)  e  juspositivismo.    
Robert  Alexy13  foi  quem  melhor  definiu  o  pós-­‐positivismo,  a  partir  da  identificação  dos  
elementos  dos  dois  paradigmas  jurídicos  que  o  antecederam:  jusnaturalismo  e  positivismo.    
Um   elemento   que   sempre   estará   presente   em   toda   definição   de   Direito   criada   pelos  
jurnaturalistas:  correção  substancial,  ou  seja,  que  para  ser  direito,  é  necessário  que  tenha  um  
conteúdo  justo.  A  preocupação  dos  jusnaturalistas  era  com  a  justiça.  
“O   direito   extremamente   injusto   não   é   direito”,   por   falta   de   correção   substancial   (Robert   Alexy).  
Contudo,  não  é  qualquer  injustiça  que  descaracteriza  o  direito.  

No   positivismo   jurídico,   por   sua   vez,   dois   elementos   estão   sempre   presentes   nos  
conceitos   de   Direito   desenvolvidos   por   seus   teóricos:   validade   formal   e   eficácia   social.   A  
preocupação  dos  positivistas  era  com  a  segurança  jurídica.    
Para   composição   de   seu   conceito   de   Direito,   os   pós-­‐positivistas   conjugam   os   três  
elementos  mencionados  pelo  jusnaturalismo  e  juspositivismo:  correção  substancial  (justiça  em  
seu  conteúdo);  validade  formal  e  eficácia  social.    
 

CARACTERÍSTICAS  DO  PÓS-­‐POSITIVISMO:  


a. Adequação  entre  positivismo  e  jusnaturalismo  
b. Reconhecimento  do  caráter  normativo  dos  princípios  –  por  contribuição  de  Ronald  
Dworkin  e  Robert  Alexy,  principais  autores  do  pós-­‐positivismo.  
Para   a   teoria   do   jusnaturalismo,   princípio   e   norma   eram   diferentes:   princípio   seria  
diretriz,  conselho,  sem  caráter  vinculante,  enquanto  norma  seria  regra  obrigatória  e  vinculante.  
Os   positivistas   continuaram   a   diferenciar   princípio   de   norma.   Os   pós-­‐positivistas   passam   a  
adotar  a  seguinte  distinção:  
A  norma  jurídica  é  o  gênero  de  que  são  espécies  os  princípios  e  as  regras.  

13
 Robert  Alexy  é  muito  citado  na  jurisprudência  do  STF,  a  partir  de  2003,  por  sua  obra:  Teoria  dos  Direitos  Fundamentais.  Ler!  

11  
DIREITO  CONSTITUCIONAL  –  JOÃO  PAULO  LORDELO  

Por  isso  diz-­‐se  que,  enquanto  no  positivismo  o  principal  protagonista  era  o  legislador,  no  
pós-­‐positivismo   o   principal   protagonista   é   o   juiz,   que   aplicará   os   princípios   com   base   em  
métodos  hermenêuticos  de  ponderação  de  valores,  extremamente  subjetivos.  
 
2.4.2.  Dimensões  dos  Direitos  Fundamentais  
No  Constitucionalismo  Contemporâneo  surgem  os  direitos  de  terceira  dimensão,  ligados  
à   fraternidade   ou   solidariedade.   Hoje   já   se   fala   em   direitos   que   quarta   e   quinta   geração,   mas   a  
partir  da  terceira  dimensão,  há  divergência  da  doutrina  na  classificação  dos  direitos.  
Classificação  de  Paulo  Bonavides  (rol  exemplificativo  dos  direitos):  
o Primeira   dimensão:   direitos   civis   ou   políticos,   individuais,   ligados   aos   valores  
burgueses  da  propriedade  e,  principalmente,  da  liberdade.  
o Segunda   dimensão:   direitos   coletivos   sociais,   econômicos   ou   culturais,   fundados  
no  valor  da  igualdade  material.  
o Terceira  dimensão:  direitos  ligados  ao  valor  fraternidade,  solidariedade.  Ex:  direito  
ao   meio   ambiente;   autodeterminação   dos   povos,   direito   ao   progresso   ou  
desenvolvimento;  direito  de  comunicação,  etc.  São  direitos  transindividuais.  
DICA:   Notar   que   as   dimensões   dos   direitos   constitucionais   seguem   a   ordem   da   luta   burguesa:  
“liberdade,  igualdade  e  fraternidade”.  
 

o Quarta   dimensão:   são   os   direitos   ligados   ao   valor   “pluralidade”.   Ex:   democracia,  


informação  e  pluralismo.    
o Quinta   dimensão:   recentemente,   Paulo   Bonavides   classificou   a   paz   como   direito  
fundamental   de   quinta   dimensão.   Pedro   Lenza   e   André   Ramos   Tavares   classificam  
a  paz  como  direito  de  terceira  dimensão.  
 
2.4.5.  Estado  Democrático  de  Direito  
Esse   é   o   Estado   que   surge   com   o   neoconstitucionalismo.   Ela   tenta   fazer   uma   conexão  
entre  democracia  e  Estado  de  Direito,  por  meio  do  principio  da  soberania  popular.  
O  ordenamento  introduz  dispositivos  que  passam  ao  povo  o  poder.    
Art.   1º,   Parágrafo   único   da   CF.   Todo   o   poder   emana   do   povo,   que   o   exerce   por   meio   de  
 
representantes  eleitos  ou  diretamente,  nos  termos  desta  Constituição.  

O  Estado  Democrático  de  Direito  procura  sintetizar  as  conquistas  dos  Estados  Liberal  e  
Social.  
Marcelo   Novelino   prefere   utilizar   a   expressão   “Estado   Constitucional   Democrático”   no  
lugar  de  “Estado  Democrático  de  Direito”  em  razão  da  análise  da  idéia  em  torno  da  qual  gira  o  
Estado  na  Fase  do  Neoconstitucionalismo,  já  que  o  paradigma  do  império  da  lei  (do  Estado  de  
Direito)  mudou  para  força  normativa  da  Constituição.  
 

CARACTERÍSTICAS  DO  ESTADO  DEMOCRÁTICO  DE  DIREITO:  


i. Preocupação  com  a  efetividade  e  com  a  dimensão  material  dos  direitos  fundamentais:  
enquanto   a   preocupação   antes   era   com   a   consagração   dos   direitos   na   Constituição,  
agora  busca-­‐se  que  os  direitos  já  consagrados  sejam  efetivados.  

12  
DIREITO  CONSTITUCIONAL  –  JOÃO  PAULO  LORDELO  

No   Estado   Liberal,   os   direitos   fundamentais   tinham   caráter   meramente   formal.   No  


Estado   Democrático   de   Direito,   os   direitos   fundamentais   passam   a   ter   consagrados   sua  
dimensão  material:  ex.  direito  à  igualdade  (como  diminuição  de  desigualdades).  
 

ii. O   direito   deve   ser   exercido   e   organizado   em   termos   democráticos:   No   Brasil,   temos  
mecanismos  de  democracia  direta  e  indireta  (participação  popular).  
iii. O  legislador  passa  a  ter,  além  das  limitações  formais,  limitações  materiais:  o  legislador  
não  está  limitado  apenas  em  relação  ao  processo  como  elabora  a  lei,  mas  também  ao  
conteúdo,  a  substância,  das  normas  que  cria.  
iv. A   democracia   não   é   apenas   a   democracia   formal   (vontade   da   maioria   e   eleições  
periódicas).  Hoje,  a  democracia  é  vista  em  um  sentido  substancial.  Além  das  acepções  
tradicionais   da   democracia,   entra   um   componente   novo:   a   garantia   de   direitos  
fundamentais  para  todos,  inclusive  para  as  minorias.  
 
2.5.  CONSTITUCIONALISMO  DO  FUTURO  
Os  autores  já  estão  falando  no  Constitucionalismo  do  futuro,  que  ainda  não  chegou,  mas  
pode  vir  a  ser.  
A  idéia  do  constitucionalismo  do  futuro  surgir  há  algumas  décadas,  quando  foi  realizado  
um   congresso   na   América   Latina   em   que   foram   discutidas   as   metas   para   o  
constitucionalismo   no   futuro.   Alguns   participantes   escreveram   artigos   com   base   nessas  
discussões.  O  autor  argentino  José  Roberto  Dromi  tem  sido  citado  em  concurso.  

O   Constitucionalismo   do   futuro   deve   buscar   um   equilíbrio   entre   as   conquistas   do  


constitucionalismo  moderno  e  os  excessos  do  constitucionalismo  contemporâneo.  
EXCESSOS  DO  NEOCONSTITUCIONALISMO:  mais  ponderação  que  subsunção;  mais  princípios  do  que  
regras;  protagonismo  do  judiciário  etc.    
 

Na   realidade,   o   ideal   é   que   haja   um   equilíbrio   entre   os   Poderes,   e   entre   normas   e  


princípios.   Com   base   em   princípios,   o   juiz   pode   decidir   da   forma   como   bem   entender,   daí   a  
importância  das  regras  para  conferirem  segurança  jurídica  ao  sistema.  
 

VALORES  FUNDAMENTAIS  QUE  DEVEM  NORTEAR  O  CONSTITUCIONALISMO  DO  FUTURO:  


i. Verdade  –  As  Constituições  não  podem  gerar  falsas  expectativas,  somente  devendo  
consagrar  o  que  puder  ser  cumprido.  
ii. Solidariedade  –  É  uma  nova  perspectiva  da  igualdade:  solidariedade  entre  os  povos,  
dignidade  da  pessoa  humana  e  justiça  social.  
iii. Consenso  –  A  Constituição  deverá  ser  fruto  de  consenso  democrático.  
iv. Continuidade  –  As  Constituições  não  devem  ficar  sofrendo  reformas  continuamente,  
como   acontece   hoje.   Ao   se   reformar   a   Constituição,   a   ruptura   não   pode   deixar   de  
levar  em  conta  os  avanços  já  conquistados.  
v. Participação  –  Consagração  da  democracia  participativa.  
vi. Integração  –  Criação  de  órgãos  supranacionais  que  integrem  os  povos.  
vii. Universalização   –   Consagração   de   direitos   fundamentais   internacionais,   fazendo  
prevalecer   a   dignidade   da   pessoa   humana   universalmente,   afastando   a  
desumanização.    
13  

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