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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2022.0000365834

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº


3000552-45.2022.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é agravante
ESTADO DE SÃO PAULO, é agravada CHRISTIANE TORTURELLO.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 6ª Câmara de Direito


Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão:
Negaram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator,
que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores SIDNEY


ROMANO DOS REIS (Presidente sem voto), SILVIA MEIRELLES E EVARISTO
DOS SANTOS.

São Paulo, 16 de maio de 2022.

ALVES BRAGA JUNIOR


Relator
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Voto 16976
Agravo de Instrumento 3000552-45.2022.8.26.0000 DC (digital)
Origem 4ª Vara de Fazenda Pública do Foro Central - Capital
Agravante Estado de São Paulo
Agravada Christiane Torturello
Juiz de Primeiro Grau Antonio Augusto Galvão de França
Processo de Origem 1022227-46.2016.8.26.0053/85
Decisão 27/1/2022

AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE


SENTENÇA. RPV. RENÚNCIA AO CRÉDITO EXCEDENTE.
CONTA DE LIQUIDAÇÃO DE 2012. Requisição de pagamento
que se fazem com o valor apurado no cálculo e respectiva data
base, o que permite atualização a qualquer tempo, e que deverá ser
feita por ocasião do pagamento. Com base na Lei Estadual
11.377/2011, o exequente deve levar em consideração o teto na
data da conta de liquidação. Crédito de R$ 19.514,13. Cálculo
elaborado em 31/5/2012, data para a qual o teto era de R$
20.934,71 (2012). O crédito, constituído e liquidado antes da lei, é
inferior ao antigo teto. Não há excedente a renunciar.
RECURSO DESPROVIDO.

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto


por ESTADO DE SÃO PAULO PREVIDÊNCIA contra a r. decisão de fls. 212/3
do processo de origem que, nos autos do incidente de requisição de pequeno
valor proposto por CHRISTIANE TORTURELLO, determinou que o teto do RPV a
ser observado seja aquele em vigor ao tempo do trânsito em julgado do título
executivo judicial, “nesses termos, digam os exequentes em termos de
prosseguimento, expressamente esclarecendo se há observância do teto
existente ao tempo do transito em julgado do título executivo judicial”.

O agravante alega que a RPV não está em termos de prosseguimento.

Afirma que a Lei Estadual 17.205/19 reduziu para R$ 11.678,90 o limite para
requisição direta de pagamento de condenação judicial de pequeno valor (OPV),
e que, em se tratando de norma de natureza processual, sua aplicabilidade é
imediata e alcança todos os processos em curso.

Aduz que o valor não atende o limite para RPV, “devendo a parte escolher entre
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receber pelo precatório ou renunciar, respeitado o novo limite”.

Entende necessária a expedição de precatório ou retificação da RPV para ajustar


o valor ao teto.

Requer a concessão de efeito suspensivo e, a final, a reforma da r. decisão, para


que “seja determinada a aplicação do novo teto da RPV ou expedição de
precatório”.

Efeito suspensivo indeferido a fls. 13/22.

Contraminuta a fls. 26/9.

FUNDAMENTAÇÃO

O recurso não comporta provimento.

A situação dos autos parece bastante confusa, misturando-se, por vezes,


informações dos três processos: ação coletiva, cumprimento de sentença e
expediente de requisição de pagamento.1

Em mandado de segurança coletivo, impetrado em 2002, o ESTADO foi


condenado a pagar, aos impetrantes, professores estaduais inativos, bônus anual
de mérito, por v. acórdão desta c. câmara, de 26/3/2007, que acolheu embargos
1 Relação cronológica dos atos processuais relevantes para a análise deste agravo de
instrumento.
1022227-46.2016.8.26.0053 Cumprimento de sentença
Fls. 178/379: planilha de cálculo
Fls. 541: Decisão em 27/1/2017. Fixa honorários advocatícios em 10% do valor do débito e
determina intimação da Fazenda para impugnação.
Fls. 547/552: impugnação da Fazenda ao cumprimento
Fls. 603/697: nova planilha de cálculo, excluídos casos de litispendência
- Data da conta: 31/5/2012
- Crédito de honorários advocatícios: R$ 19.514,13
Fls. 698/699: Decisão que determinou a suspensão até julgamento, no STJ, sobre o Tema
Repetitivo 973 (Análise acerca da aplicabilidade da Súmula 345 do STJ diante da
superveniência do art.85, § 7º, do CPC/2015)
Fls. 756: Decisão em 22/10/2020. Retomada do processamento em razão do julgamento definitivo
do Tema 973 (O art. 85, § 7º, do CPC/2015 não afasta a aplicação do entendimento
consolidado na Súmula 345 do STJ, de modo que são devidos honorários advocatícios nos
procedimentos individuais de cumprimento de sentença decorrente de ação coletiva, ainda
que não impugnados e promovidos em litisconsórcio.)
Fls. 762: Decisão em 12/2/2021. Determinada a solicitação da expedição das RPV por
peticionamento eletrônico intermediário, no portal e-SAJ, com dados da conta homologada.
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para conceder a ordem, fls. 319/24 dos autos de origem.

O trânsito em julgado se deu em 14/9/2012, fls. 225 dos autos de origem.

A Fazenda pretende que se aplique o valor da RPV para a data da expedição do


ofício requisitório, com a aplicação da lei nova, que reduziu o teto de 1.135,2885
para 440,214851 UFESPs. A r. decisão agravada, de fls. 212/3, determinou a
adoção da data do trânsito em julgado do título executivo.

A Lei Estadual 17.205, de 7 de novembro de 2019, alterou o limite para


obrigações de pequeno valor, nos seguintes termos:

Artigo 1º - Nos termos e para os fins de requisição direta à Fazenda do


Estado de São Paulo, Autarquias, Fundações e Universidades
estaduais, como disposto no § 3º do artigo 100 da Constituição
Federal, serão consideradas, como obrigações de pequeno valor, as
condenações judiciais em relação às quais não penda recurso nem
qualquer outra medida de defesa, cujo valor individual do credor, na
data da sua conta de liquidação, independentemente da natureza do
crédito, seja igual ou inferior a 440,214851 Unidades Fiscais do Estado
de São Paulo - UFESPs, da mesma data, vedado o fracionamento ou
quebra do valor da execução para fins de enquadramento de parcela
nessa modalidade de requisição.

Parágrafo único - Mediante renúncia, irrevogável e irretratável, ao valor


que exceder o limite definido no 'caput' deste artigo, fica facultada aos
credores a opção pela requisição direta de seus créditos, na forma
desta lei.

Artigo 2º - Esta lei entrará em vigor na data da sua publicação,


produzindo efeitos imediatos e revogando as disposições em
contrário

O título executivo é a sentença ou acórdão que estabeleceu a condenação. O


crédito, entretanto, só será conhecido a posteriori, com a elaboração dos cálculos

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e homologação.

São, comumente, enormes os interregnos entre cada etapa processual, desde a


formação do título até o pagamento. O valor da dívida, quando da requisição,
estará defasado, no melhor cenário, em alguns meses e, não raro, em anos ou
décadas. A atualização, como se sabe, reabre o debate entre credor e devedor.
Não por outra razão, o que se faz é informar, no ofício requisitório, o valor e a
respectiva data base.

O valor é certo, porque decorre de cálculo homologado, após esgotadas as


postulações das partes, correções ou ratificações, e exaurimento dos recursos. A
data base deve corresponder à data do cálculo, ou seja, a data para a qual os
valores foram computados, atualizados e acrescidos dos consectários previstos
no título.

Normalmente, a data do cálculo coincidirá com a data em que é apresentado nos


autos, embora não seja impossível, nem irregular, que o cálculo informe data de
referência anterior; atualizado até o último dia do mês anterior, por exemplo. O
que importa é a data para a qual os cálculos foram realizados, mais do que a data
de apresentação.

Não importa a data em que se deu a homologação, que pode ter ocorrido meses
ou anos depois. A data do trânsito em julgado do título também não se mostra a
mais adequada para servir como data base porque podem ter se passado meses
ou anos, com idas e vindas, e longas discussões entre credor e devedor sobre
métodos e valores. Assim, a requisição se faz com o valor expresso no
cálculo e respectiva data base, o que permitirá atualização a qualquer
tempo, e que deverá ser feita por ocasião do pagamento.

Sendo assim, não há outro valor de corte, para fins de expedição de requisição
de pequeno valor, senão o valor vigente para a data base, ou data do cálculo.

Nada melhor do que buscar a regra no texto da própria lei.

Estabelece o art. 1º, da Lei Estadual 17.205, de 7 de novembro de 2019, que

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“serão consideradas, como obrigações de pequeno valor, as condenações


judiciais em relação às quais não penda recurso nem qualquer outra medida
de defesa, cujo valor individual do credor, na data da sua conta de
liquidação, independentemente da natureza do crédito, seja igual ou inferior a
440,214851 Unidades Fiscais do Estado de São Paulo - UFESPs, da mesma
data, (...).”

Como se vê, para se estabelecer que dado montante é obrigação de pequeno


valor, utiliza-se o montante da data do cálculo. Tal valor será confrontado com o
valor em UFESP da mesma data! E nem poderia ser diferente. Basta ver que se
não forem usados valor de crédito e valor de teto em UFESPs contemporâneos, o
passar do tempo gerará enormes discrepâncias e tratamento não isonômico entre
credores.

Não haveria problema se os índices de atualização do débito fossem exatamente


coincidentes com a evolução do valor da UFESP, o que, naturalmente, não
ocorre.

Sobre a renúncia, também não há de pairar dúvida.

O parágrafo único do art. 1º estabelece:

“Parágrafo único - Mediante renúncia, irrevogável e irretratável, ao


valor que exceder o limite definido no “caput” deste artigo, fica
facultada aos credores a opção pela requisição direta de seus créditos,
na forma desta lei.”

E qual é o valor definido no caput? Valor correspondente às tantas UFESPs da


data do cálculo. A renúncia, assim, será sempre retroativa. Não importa a data
em que ocorreu. O novo valor do teto, reduzido pela Lei 17.205, só será aplicável
aos créditos constituídos (trânsito em julgado da condenação) após sua entrada
em vigor.

No presente caso, os cálculos foram apresentados com o requerimento do


cumprimento de sentença relativo a honorários advocatícios de sucumbência, a

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fls. 2/96, dos autos de origem. Como se vê no topo do documento (fls. 2), a data
da conta é 31 de maio de 2012. No final da página seguinte, consta o crédito da
agravada - honorários advocatícios - de R$ 19.514,13.2

Ao apresentar o termo de declaração, em que presta todas as informações que


serão utilizadas para o ofício requisitório, após conferência do juízo, a credora
informou, a fls. 199, que a data base era 31/5/2012, exatamente a data que
consta no cálculo já mencionado.

Há petição da credora, em conformidade com os documentos, a fls. 210/1, em


que rebate a postulação da Fazenda Pública e afirma o acerto da requisição com
base nas informações: crédito de R$ 19.514,13, elaboração do cálculo em
31/5/2012, data para a qual o teto era de R$ 20.934,71.

O teto aplicável, portanto, é o da lei anterior, de R$ 20.934,71, correspondente a


1.135,2885 UFESPs, cujo valor unitário, para 2012, era de R$ 18,44.

Pretende a Fazenda que se reconheça a incidência da Lei 17.205/2019, por ser


norma de natureza processual e que, portanto, alcança processos em curso.
Pretende que o novo teto (reduzido) incida sobre as renúncias de valores
realizadas a partir de 8/9/2019 vez que, até a renúncia, haveria situação jurídica
que sujeitava aos precatórios.

A sequência lógica apresentada pela Fazenda não se mostra sustentável. O

2Relação cronológica dos atos processuais relevantes para a análise deste agravo de instrumento.
1022227-46.2016.8.26.0053/00085 Requerimento de RPV
Fls. 202/5: RPV em 6/7/2021. Informa:
- Data do ajuizamento do processo de conhecimento: 17/5/2016
- Data do trânsito em julgado: 12/2/2021
Fls. 207: Certidão de recebimento do ofício requisitório
Fls. 208/9: petição da Fazenda apontando incorreção na RPV, em 23/7/2021
Fls. 210/1: petição da credora, de 22/9/2021, em que defende a regularidade da requisição, com
adoção do limite para a data do cálculo, ou seja, 31 de maio de 2012, e que inaplicável a Lei
17.205/2019.
Fls. 212/3: decisão agravada, em que o magistrado estabelece a data do trânsito em julgado
do título judicial para aplicação do limite da RPV. Em 27/1/2022.
Fls. 218/24: petição da credora em que informa o trânsito em julgado do v. acórdão que julgou a
ação coletiva 0026620-22.2002.8.26.0053 em 14/9/2021.
Fls. 225 e 355: certidão de trânsito em julgado do acórdão em 14/9/2012, expedida pelo STJ.
Fls. 318/324: acórdão da 6ª Câm que deu provimento ao recurso, em embargos de
declaração, para julgar procedente o pedido, de 26/3/2007.
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crédito, constituído e liquidado antes da lei, é inferior ao antigo teto. Se assim é,


não há excedente a renunciar. Portanto, não pode a constituição do crédito ser
considerada dependente de renúncia a ser manifestada com a nova lei em vigor.

Trata-se de raciocínio circular. E mesmo que o crédito fosse superior ao teto


anterior, a renúncia, naturalmente, haveria se ser considerada para a respectiva
data de referência, isto é, a data do cálculo, conforme critério adotado na própria
lei, e demonstrado acima.

O crédito não se constitui com a renúncia. A constituição é anterior. A renúncia


extirpa parte do crédito constituído; portanto, impróprio dizer que é ela que
constitui o crédito.

Na decisão agravada, o magistrado estabeleceu o trânsito em julgado do título


como a referência para determinação do teto aplicável às RPV. Tanto o trânsito
em julgado do v. acórdão, no processo de conhecimento, quando o cálculo de
liquidação, que lhe é posterior, são muito anteriores à data em que o teto
reduzido passou a vigorar.

Portanto, qualquer que seja a data, o crédito será inferior ao teto.

Em caso análogo:

Agravo de Instrumento nº 2257075-52.2018.8.26.0000


Relator(a): Alves Braga Junior
Comarca: São Paulo
Órgão julgador: 2ª Câmara de Direito Público
Data do julgamento: 29/01/2019
Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE
SENTENÇA. REQUISIÇÃO DE PEQUENO VALOR. A data de
apresentação dos cálculos pelos exequentes é o momento
oportuno para observar se o montante requisitado está dentro do
limite legal para RPV. Precedente. RECURSO NÃO PROVIDO.

Não se vê plausibilidade jurídica na tese da Fazenda.

Correta a r. decisão de primeiro grau.

DISPOSITIVO

Agravo de Instrumento nº 3000552-45.2022.8.26.0000 8


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Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso.

Alves Braga Junior


Relator

ASSINADO COM CERTIFICADO DIGITAL

Agravo de Instrumento nº 3000552-45.2022.8.26.0000 9

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