Você está na página 1de 9

........ , .

, "'- -
noção e a relação com pensamento, sentimento, sensação e intuição. Numa coníJSSão
encantadora, descreve o desenYOlrunento do Teste de Associação de P21avru. "No c0-
meço .. _ ell estava completamente desorienWlo ~m os pacientes.. ~ao sabia onde c0-
meçar, ou o que dizer, e o experimento da asaociaçio deu-me acesso ao seu inCO!l3CÍen-
te". Concluindo a nossa discussão, o Dr. Jung responde às minhas paguntas sobre doen-
ças psicossomáticas e os efeitos das drogas tranqüilizantes em terapia.

EVANS: Dr. Jung, entrando no desenvolvimento da teoria de Freud,


c~ G. Jung que o senhor reconhece como um fator significativo no desenvolvimento de
muitas de suas primeiras idéias próprias, o Dr. Freud falou muito a respeito
(1875-1961)
do inconsciente.
ru~beu seu diplomo de médico
C. G. Jung JUNG: Tio logo a pesquisa entra na questão do inconsciente, a coisa CIr
na Universidade da Basiléia , em 1900. Estu:
dou com Pie"~ Janet , em Paris e trabalhou meça necessariamente a embaraçar-se porque o inconsciente é uma coisa que
durante um per(odo com Eugene Bleuler. é realmente inconsciente! Assim, você não tem um objeto - nada. Você só
que desen volveu o conceito de esquizofre- pode fazer inferências, porque não pode vê-lo; e assim, você tem de criar um
nia. Em J 9J3. abandonou seu posto na Uni-
l'trsidade de Zurique, para poder dediau modelo da possível estrutura do inconsciente. Agora, Freud chegou ao con-
umpo à cUnica ptzrticuÚlT, li pe$l[uis4 e a ceito do inconsciente principalmente ba.seando-se na mesma experiência que
seus escritos. Colega de Freud, romptJ.I com eu havia tido com o experimento de associação ; a saber, que as pessoas rea-
~ste quanto a vária: questt5es importante:,
incluindo a teoria psicorsexual do desenvolvimento , que Jung acJuzva muito rertrira. giam - elas diziam coisas, elas faziam coisas - sem saber o que haviam fei-
Conhecido como um dor grandes pensador~s do siculo, e fundador da pril:ologilz anaJ(- to ou dito. Há uma certa despotencialização da consciência; tais coisas des-
tica, as conrribuiçt5es de Jung à psicologia incluem conceitos básicbs como Il inlTO~r­
são e a extrovtrslio, o tesre de asJOCiaçóO de palavras, o iIu:onscientt colelil'O e a nIIlÚ
cem abaixo do nível da consciência e, deste modo, tomam-se inconscientes.
controvertida, a noção dos arqueripoL Muito da sua obra reflete também o JeU inrenlO Esta, também, é a opini!o de Freud, mas ele diz que elas descem porque são
interesse pelos problema:; amplos da religião, no desenvolvimenro e na individu.aljz~ impedi~; a consciência é reprimida de cima. Este foi o meu primeiro pon-
dapeuoa.
to de divergência com Freud. Acho que houve casos, nas. minhas obseIVa-
ções, em que não houve repressão de cima; aqueles conteúdos que se toma-
Jung e Freud: Intenção e Reação/O Primeiro Ponto de Di~ência/O Inconscien- ram inconscientes tinham se afastado por si mesmos e não porque tivesse~
te E Realmente Inconsciente/A Constante Construção do Ego/As Verdades Eternas sido reprimidos. Ao contrário, eles têm uma certa autonODÚa.. Eles descobri-
no Homeml/Iung: Definições. Explicações e Exemplos/Arquétipos/O Inconsciente Co- ram o conceito da autonDnÚa: esses conteúdos que desaparecem têm o po-
letivolMitologiafReligião IA lquimia/A nimalA nimus/Persona /SeI!/ 0 Quadrado DO . Cír-
culo I Mandalall lntroversão IExtroversãol Pensamento I Sentimentol Sensa~o/ lntui~oll der de mover-se independentemente da minha vontade. Ou eles aparecem
Terapia : Onde Começar/O Teste de Associação de Palavras/Doenças Psicossomáticasl quando quero dizer alguma coisa deftnida; eles interferem e falam por si
A Terapia das Drogasll mesmos, ao invés de me ajudarem a dizer o que quero dizer; eles me obrigam
a fazer uma coisa que não queria; ou eles se afastam no momento que eu
O Dr. Jung e eu começamos nossa di.scUSÃo com suas respostas à teoria de Freud,e ele quero usá-los. Eles desaparecem com certeza!
descreve o primeiro ponto de divergência que o levou a romper eventualmente com EVANS : O Dr. Freud sugeriu que o indivíduo nasce sob a influência do
Fteud. Ele abona seus conceitos de inconsciente, id, ego, e supereso, e 01 pontos em
que o seu penwnento difere da teoria tradicional freudiana- Ele depois dá uma explica-
que ele chama o id, que é inconsciente e subdesenvolvido, um conjunto de
ção f~nte dos arquétipos e do inconsciente coletivo, com JeUS padrões subjacentes impulsos animais. Não é muito fácil entender de onde todos esses impulsos
de nutologia, religião e alquimia. Ele derme os termos anima, animus e penana, etda- primitivos, todos esses instintos, vêm.
rece o uso que faz do termo self e esboça a mandala, a imagem do cúculo no qua-
dndo, tão marcante no seu trabalho, ltrav~ do seu silnificado simbólico e hiltórico.
JUNG : Ninguém sabe de onde vêm os instintOs. Eles estão ai e você os
Como o criador do conceito de introvmão e extroversão, explica a evolução desta lUa encontra. I: uma história que aconteceu há milhões de anos atrás. I: absolu-
tamente ·dículo, como você sabe, especular sobre uma tal impossibilidade.
. Esta discussão é um excerto do Livro Jung on e/emenrary psychology: a discu~-
f~~lerwe~n C. G. Jung and !l-ichard l Evans. Nova York : E. P. Duttoll. Copyright ® Assim, a questão é somente esta - de onde vêm estes casos em que o instin-
. de RIchard I. Evans.. ReJm~resso com permissão de E. P. Dutton. Originalmente to nlo funciona? Isto é alguma coisa que está ao nosso alcance, porque nós
~u~cahardo como Conversatlons wlth Carl Jung and Rtllctions from Emeft Jonel (1964)
e c d I. Evans, Nova York : D. Van Nostrand Company. podemos estudar os casos em que o instinto não funciona.

327
EVANS: Continuando, outra parte da teoria do Dr. Freud, que tomou. peito das coisas que eles MO devem fazer, como o Decálogo, "Não deverás",
se muito importante, à qual aliás nós já aludimos, foi a idéia do consciente' e isto é sempre apoiado por narrativas mitológicas. Isso, é claro, me deu um
un:
isto é, de dentro desse inconsciente, "estrutura" instintual, o id, emerge motivo para estudar os arquétipos, porque comecei a ver que a estrutura do
ego. Freud sugeriu que este ego resultava do conta to do organismo com a que eu depois chamei de inconsciente coletivo era realmente um tipo de
realidade, talvez um produto da frustração, uma vez que a realidade é impos- aglomerado de tais imagens típicas, cada uma das quais tinha uma qualidade
ta ao indivíduo. O senhor aceita este conceito do ego? singular. Os arquétipos são, ao mesmo tempo, dinâmicos. Eles slo imagens
JUNG : Se o homem, de fato tem um ego, esta é a sua pergunta. Ah, eis instintivas, MO intelectualmente inventadas. Estão sempre aí, e produzem
novamente um caso como o de antes; não estava lá quando ele foi inventado. certos processos no inconsciente, que poderiam ser comparados aos mitos.
Contudo, aqui, você pode observá· lo, em certa medida, com uma criança. A Essa é a origem da mitologia. Assim, as afIrmações, as regras de toda religião,
criança começa realmente num estado em que não há ego, e por volta dos de muitos poetas, etc., sfo afirmações a respeito do processo mitológico in·
quatro anos, ou antes, desenvolve um senso de ego - "eu, eu mesmo". A temo, que é uma necessidade, porque o hômern não está completo se não
identidade com o corpo é uma das primeiras coisas que formam um ego; é tem consciência deste aspecto das coisas.
a separação espacial que induz, aparentemente, o conc:ito de ego. Mais taro E a pergunta seguinte que eu mesmo me fIZ foi "Agora, onde houve alo
de, há diferenças mentais e outras diferenças pessoais de todo tipo. Veja, o guém neste mundo ocupado com este problema?" Descobri que não tinha
ego está continuamente se formando; jamais é um produto acabado - ele havido ninguém, exceto um movimento espiritual peculiar que surgiu junto
vive em formação. com o início do cristianismo - os gnósticos. Eles estavam preocupados com
EVANS: Na sua última publicação, em adição ao ego, Freud introduziu o problema dos arquétipos e elaboraram uma fllosofia peculiar. Todo mun-
um termo para descrever uma função particular do ego. Esse termo foi o do elabora uma ffiosofia peculiar quando se depara ingenuamente com eles,
superego. Falando de modo geral, o superego era responsável pela função e não sabe que se trata de elementos estruturais da psique inconsciente. Os
"restritiva moral" do ego. gnósticos viveram nos séculos um, dois e três; eu queria saber o que houve
JUNG: Sim, trata·se do superego, a saber, aquele código do que você entre aquele tempo e o de hoje, quando repentinamente somos confron·
pode e do que você n10 pode fazer. tados com problemas de inconsciente coletivo, que foram os mesmos há dois
EvA.l'olS: Proibições inerentes, que Freud pensou que podiam ser, em pa. milênios atrás, embora não estejamos preparados para admiti·los. Descobri-
te adquiridas e em parte "inerentes". para meu assombro -, que o que houve foi a alquimia, aquela que é entendida
JUNG: Sim. No entanto, Freud não vê a diferença entre o inerente e o como história da química. Foi um movimento espiritual particular, um m"
adquirido. Como você vê, é preciso tê-lo quase que inteiramente dentro de vimento fIlosófico. Eles se chamavam fllósofos, como o gnosticismo. t claro
si; caso contrário, nIo poderia haver estabilidade no indivíduo. E quem teria que não posso lhe contar detalhes a respeito da alquimia. Ela é a base do
inventado o Decálogo - os Dez Mandamentos? N10 foi inventado por Moi. nosso modo moderno de conceber as coisas e, por isso mesmo, é como se
sés, mas é a verdade eterna no próprio homem, porque ele examina a si estivesse exatamente sob o limiar da consciência.
próprio. Assim, você vê, em nossos dias temos tal e tal visão do mundo, uma m"
EVANS: Nesta altura, o senhor poderia comentar o conceito de arqué. sofia particular, mas, no inconsciente, temos outra diferente. O que pode·
ti·po.? mos ver através do exemplo da fllosofia alquimista é que ela se comporta em
JUNG: Bem, você conhece o qu~ é um padrão de comportamento, o relação à consciência medieval, exatamente como o inconsciente se compor-
modo como o pássaro constrói o seu ninho. Esta é uma forma herdada. t ta em relaç10 a nós mesmos. E podemos construir, ou mesmo predizer, o
absolutamente certo que o homem nasce com um funcionamento determi. inconsciente dos nossos dias quando sabemos o que ele foi ontem.
nado, um certo tipo de funcionamento, um certo padrão de comportamento EVANS: Esta ação do arquétipo poderia ser descrita como espontânea?
que se expressa na forma de imagens arquetípicas, ou foanas arquetípicas. JUNG: Absolutamente espontânea. Uma certa magia apodera·se de V"
Por exemplo, o modo.· como um homem deve se comportar é expresso por cê, e você faz algo inesperado. O arquétipo é uma força. Ele tem autonomia
um arquétipo. Por essa raza'o, os primitivos contam tais estórias. Grande par. e pode, de repente, apoderar·se de você. Assim, por exemplo, apaixonar·se
te .da educaçIo é passada através da narraçã'o de estórias. Por exemplo, eles à primeira vista é um caso desses. Você tem uma certa imagem, em si mes-
reunem os jovens e dois homens mais velhos representam na sua frente to- mo, sem saber, da mulher - de qualquer mulher. Você vê aquela moça, ou
das as coisas que eles não devem fazer. Outro modo é lhes contar tudo ares- pelo menos uma boa imitação do seu tipo e instantaneamente é apanhado.

328 329
E, depois, pode descobrir que foi um tremendo engano. Ele vê que ela, afio carrega dentro de si uma fêmea. Foram eles que disseram; nIo é invenção
nal, n!o é boa, que é um péssimo negócio e, então, ele me conta. Ele diz moderna. Com o animus dá-se a mesma coisa. t uma imagem masculina nu-
"Pelo amor de Deus, doutor, ajude-me a livrar-me daquela mulhe(. Apesar ma mente de mulher, que está, às vezes, bastante consciente, outras vezes
disto, ele n[o consegue, ele é como barro nos dedos dela. Eis o arquétipo. nlo tanto; mas é chamada à vida, no momento em que a mulher encontra o
Tudo aconteceu por causa do arquétipo da anima, embora de pense que tu- homem que diz as coisas certas. Depois, pelo que ele diz, que é totalmente
do venha da sua própria pessoa., como você sabe. ~ como a moça - qual- verdadeiro, toma-se o companheiro, nlo importa o que ele seja. Estes dois
quer moça. Quando um homem canta soberbamente, ela pensa que ele slo arquétipos particularmente bem fundados. E você pode pôr a mão nas
deve ter um maravilhoso caráter espiritual e fica muito desapontada quando suas bases.
vê que se casou apenas com aquela "música" especial. Bem, este é o arquéti- Ev ANS: Dr. Jung, para levar nossa discussão do inconsciente adiante,
po do animus. tomemos a situaçfo particular de um sonho e a sua interpretação. Entendo
EVANS : Para recapitular, então, o arquétipo é apenas uma ordem mais que sua visfo do inconsciente, o que se acha no sonho, nlo é necessariamen-
elevada de um padrão instintivo, tal como o seu primeiro exemplo de um te urna imagem ou um símbolo do que aconteceu no passado do indivíduo.
pássaro construindo um ninho. ~ assim que o senhor tencionava descrevê-lo? JUNG : Oh, não! t a manifestação da situação do inconsciente, vista do
JUNG: t uma ordem biológica do nosso funcionamento mental como ponto de vista do inconsciente.
por exemplo, nossa função biológico-flSiológica segue um modelo. Êstamo~ EVANS: Agora, se o inconsciente age sobre uma situação presente,
apenas profundamente inconscientes destes fatos, porque vivemos por todos observando isto em termos motivacionais amplos, este efeito não é um re-
os nossos sentidos e fora de nós mesmos. Se um homem pudesse olhar para sultado da repressllo do jeito que o psicanalista ortodoxo o vê.
dentro de si ele descobriria isto. Quando um homem descobre isto em n05- JUNG : Pode ser, você sabe, que aquilo que o inconsciente tem a dizer
sos dias, ele pensa que está louco - realmente louco. ' seja tio desagradável que se prefere não prestar atenção, e na maioria dos
EVANS : Agora, o senhor diria que o número de tais arquétipos é limi- casos as pessoas seriam provavelmente menos neuróticas se admitissem as
tado ou predeterminado, ou pode ser aumentado? coisas. Mas, ~o sempre coisas um pouco difíceis ou desagradáveis, incon-
JUNG : Bem, na-o sei o que posso dizer a respeito; é muito confuso. C~ venientes ou algo do tipo; assim, há sempre uma certa quantidade de repres-
mo você vê, n[o temos termos de comparação. Sabemos e vemos que há um s:o. Mas isto não é o mais importante.
comportamento, digamos, como o incesto; ou há um comportamento de EvA."ls: Haveria bastante equivalência entre o inconsciente de um de-
violência, uma certa espécie de violência; ou há um comportamento de pâ- terminado indivíduo que foi criado numa cultura, e outro indivíduo criado
nico, de poder, etc. Estas são áreas por assim dizer, nas quais há muitas va- em cultura totalmente diferente?
riaç~s_ Isto pode ser expresso deste modo ou daquele, você sabe. E eles se JUNG: Bem, esta questão também é complicada. Por que quando nós
justapõem e, freqüentemente, você não pode dizer onde uma forma começa falamos de inconsciente, Jung diria "Qual inconsciente?" Dizemos "h o
ou termina. NlIo é nada conciso, pois o arquétipo em si é completamente in- inconsciente pessoal que caracteriza uma certa pessoa, um certo indivíduo?"
consciente e você só pode ver os seus efeitos. Você pode reconhecer quando EVANS: O senhor tem falado em suas publicações a respeito de um in·
uma pessoa está possuída por um arquétipo; então, você pode adivinhar ou consciente pessoal como sendo uma espécie de inconsciente.
mesmo prognosticar possíveis desenvolvimentos. JUNG : Sim, no tratamento das neuroses, por exemplo, você tem que li-
Ev ANS : Para ser mais específico Dr. Jung, o senhor tem usado os con- dar com o inconsciente pessoal uma porção de tempo, e depois, s6 quando
ceitos anima e animus que está agora identificando em tennos de sexo ma5- surgem sonhos revelando o inconsciente coletivo, é que ele pode ser tocado.
cutino ou feminino. Gostaria que o senhor nos esclarecesse, de forro: mais EVANS : Portanto, a distinção entre inconsciente pessoal e o inconscien-
específica estes termos. Tomemos o termo "anima", primeiro. Ele faz parte te coletivo é então que o pessoal estaria mais envolvido com a vida imediata
da natureza herdada do indivíduo? do indivíduo e o coletivo seria universal - o reino inconsciente composto de
JUNG : Bem, isto é um pouco compUcado, você sabe. A anima é uma elementos que s:o os mesmos em todos os homens?
forma arquetípica que expressa o fato de o homem ter um mínimo de gens JUNG: Sim, coletivo. Por exemplo, a psique tem problemas coletivos
femininos. Isto é algo que não aparece ou desaparece nele, está constante- convicções coletivas, etc. Somos muito influenciados por elas, e há exemplos
mente presente, e funciona corno uma fêmea no homem. Lá pelo século XVI, provando isto. Você pertence a um certo partido político ou a uma certa
os humanistas descobriram que o homem tem uma anima e cada homem religillo; isto pode ser um determinante sério no seu comportamento. Agora,

331
se se origina uma questão de conflito pessoal, o inconsciente coletivo não é completa que o ego, porque o ego consiste naquilo de que se é conscien-
atingido. Mas no momento em que você transcende a sua esfl~ra pessoal e te, aqw10 que você sabe ser você mesmo. Agora veja, enquanto estou falan-
chega ao seu detemúnante impessoal - digamos, você responde a uma ques- do, estou consciente do que digo; estou consciente de mim mesmo, embora
tIo política ou a qualquer outra questão social que realmente o importa -, só numa certa medida. Muitas coisas acontecem. Quando faço gestos, 113:0 es-
ent3:o você está se confrontando com um problema coletivo; enUo, você tou consciente deles. Posso dizer ou usar palavras, e nlo consigo lembrar de
tem sonhos cole tivos. ter usado estas palavras, ou mesmo no momento não estou consciente delas.
EVANS: Um outro conceito ou idéia muito interessante no seu traba- Ou, quando estou escrevendo um artigo, continuo a escrever na minha men-
lho é a "persona". Esta pare~ ser altamente relevante para a vida diária do te sem o saber. Você pode descobrir estas coisas nos sonhos' ou se você é in-
indivíduo. Gostaria que elaborasse um pouco mais sobre corno o senhor teligente, na observaç1'o imediata do indivíduo. Enua voei vê ~os gestos ou
construiu este termo "persona". na expresslo do rosto que há o que se chama "une arriére pensée",alguma coi-
JUNG : Ele é um conceito prático,de que nós necessitamos na elucidação sa por trás da consciência. Há, é claro, grandes. diferenças individuais. Há pes-
das relaçOes das pessoas. Notei com meus pacientes, especialmente com pes- soas que têm um surpreendente conhecimento de si mesmas, das coisas que
soas que estavam na vida pública, que elas tinham uma certa maneira de acontecem com elas. Mas mesmo essas pessQ3S 010 sã'o capazes de saber o que
apresentar·se. A persona é parcialmente o resul tado das exigênciu sociais. se passa no seu inconsciente. Por exemplo, elas não têm consciência do fato
De outro lado, é um compromisso com o que se gosta de ser, ou como se de que enquanto vivem uma vida consciente, durante todo o tempo um mito
gosta de aparecer. Assim, a persona é um certo sistema complicado de com- está atuando no inconsciente, um mito que vem se estendendo há séculos, a
portamento que é parcialmente ditado pela sociedade e parcialmente ditado saber, idéias arquetípicas. Realmente, é como wn fluxo contínuo, que vem à
pelas expectativas ou desejos que alguém nutre sobre si mesmo. Mas isto 113:0 luz nos grandes movimentos, digamos nos movimentos políticos ou espirituais.
é a personalidade real. A despeito do fato de que essas pessoas lhe assegura- Se alguém é suficientemente inteligente para ver o que está acontecendo
rIa que isto é absolutamente real e honesto, ainda assim. não ~L Um tal de- na mente das pessoas, nu suas mentes inconscientes, ele será capaz de fazer
sempenho da persona é absolutamente correto, desde que você saiba que prediçOes. Por exemplo, eu poderia ter predito a ascensão nazísta na Alema-
você n3:o é idêntico à forma na qual aparece; mas, se está incon~ente deste nha através da observaç3:o dos meus pacientes alemães. Eles tinham sonhos
e
fato, você entra às vezes em conflitos muito desagradiveis. 'uma quesUo nos quais a coisa toda já estava antecipada, e com detalhes consideráveis. Es.-
de Jekyll e Hyde. Eventualmente há uma tal diferença que nós quase pode- tava absolutamente certo - nos anos que antecederam Hitler no inicio an-
ríamos falar de uma dupla personalidade, e quanto mais isto é pronunciado, tes de Hitler chegar -, estava convicto de que alguma coisa e~tava ame~an­
mais a pessoa fica neurótica. Ela toma-se neurótica porque tem dois modos do a Alemanha, alguma coisa muito grande, muito catastrófica. Eu apenas
diferentes; ela se contradiz todo o tempo, e visto que está inconsciente de si soube disto através da observação do inconsciente.
própria, nlo sabe disto. Ela pensa que é uma SÓ, mas todo mundo vê que 550 Há alguma coisa muito particular nas diferentes nações. ~ um fato pecu-
duas. liar que o arquétipo da anima represente um grande papel na literatura oci-
EVANS: Na verdade o senhor diria que o indivíduo pode ter até mais do dental francesa e anglo-saxônica Mas na literatura alem! há pouquíssimos
que duas "personae'''! exemplos em que a anima desempenha um papel . .. ela precisa ter um títu-
JUNG : Não temos recursos para representar satisfatoriamente mais do lo; caso contrário nlo existiria. E assim, isto ê apenas como se na Alemanha
que dois papéis, mas há casos em que as pessoas conseguem ter mais que - agora, imagine você, isto é muito drástico, mas ilustra meu argum,ento -
cinco personalidades diferentes. Em casos comuns, ~ apenas uma dissociação 010 houvesse realmente mulheres. Há a Frau doutor, Frau professor, Frau
vulgar da personalidade. Chama·se a isto de dissociação sistemática, em avó, a sogra.. a filha, a irmI. Isto é um fato tremendamente importante que
contraposição à dissociação assistemática ou caótica que você encontra na mostra que na mente alemã há um mito particular, alguma coisa muito
esquizofrenia especial.
EVANS: O senhor também usa o termo "self". A palavra "!;elf' nlo tem EVANS: Isto, claro, é um conjunto de afmnações muito interessantes
um significado diferente de "ego" ou "persona"'! e notáveis. Como o senhor observaria Hitler sob esta luz? O senhor o veria
JUNG : Sim. Quando digo "selC" então você não deve pc:nsar "eu, eu como a personificaça'o, como um símbolo do "pai'''!
mesmo", porque esse é só seu self empírico, já defmido pelo 'termo "ego"; JUNG : Na'o, n3:o totalmente. Nlo poderia explicar, possivelmente, esse
mas quando se trata de "self", entã'o é uma questão de personaljdade, é mais fato tio complicado que Hitler representa. t complicado demais. Ele foi um

332 333
·.. ~--,;; ......--.. --- - - - - - - - - -
se se origina uma questão de conflito pessoal, o inconsciente coletivo não é
atingido. Mas no momento em que você transcende a sua esfera pessoal e
chega ao seu determinan te impessoal - digamos, você responde a uma ques-
completa que o ego, porque o ego consiste naquilo de que se é conscien-
te, aquilo que você sabe ser você mesmo. Agora veja, enquanto estou falan-
do, estou consciente do que digo; estou consciente de mim mesmo, embora
t!o política ou a qualquer outra quest!o social que realmente o importa-, s6 muna certa medida. Muitas coisas acontecem. Quando faço gestos, não es-
ent!o você está se confrontando com um problema coletivo; ent!o, você tou consciente deles. Posso dizer ou usar palavras, e n!o consigo lembrar de
tem sonhos coletivos. ter usado estas palavras, ou mesmo no momento não estou consciente delas.
.:
.
EVANS: Um outro conceito ou idéia muito interessante no seu traba- Ou, quando estou escrevendo um artigo, continuo a escrever na minha men-
lho é a "persona". Esta pare~ ser altamente relevante para a vida diária do te sem o saber. Você pode descobrir estas coisas nos sonhos; ou, se você é in-
indivíduo. Gostaria que elaborasse um pouco mais sobre como o senhor teligente, na observaçlro imediata do indivíduo. Ent!o você vê nos gestos ou
construiu este termo upersona". na express[o do rosto que há o que se chama ''tme arriére pensée" ,alguma coi-
J\,;NG : Ele é wn conceito prático,de que nós necessitamos na elucida~o sa por trás da consciência. Há, é claro, grandes. diferenças individuais. Há pes-
das relaçOes das pessoas. Notei com meus pacientes, especialmente com pes- soas que têm um surpreendente conhecimento de si mesmas, das coisas que
soas que estavam na vida pública, que elas tinham uma certa maneira de acontecem com elas. Mas mesmo essas pessQas nlo slro capazes de saber o que
apresentar·se. A persona é parcialmente o resultado das exigências sociais. se passa no seu inconsciente. Por exemplo, elas não têm consciência do fato
De outro lado, é um compromisso com o que se gosta de ser, ou como se de que enquanto vivem wna vida consciente, durante todo o tempo um mito
gosta de aparecer. Assim, a persona é um certo sistema complicado de com- está atuando no inconsciente, um mito que vem se estendendo há séculos, a
portamento que é parcialmente ditado pela sociedade e parcialmente ditado saber, idéias arquetípicas . Realmente, é como um fluxo contínuo, que vem à
pelas expectativas ou desejos que alguém nutre sobre si mesmo. Mas isto JÚO luz nos grandes movimentos, digamos nos movimentos políticos ou espirituais.
é a personalidade real. A despeito do fato de que essas pessoas lhe assegura- Se alguém é suficientemente inteligente para ver o que está acontecendo
r[o que isto é absolutamente real e honesto, ainda assim não é. Um tal de· na mente das pessoas, nas suas mentes inconscientes, ele será capaz de fazer
sempenho da persona é absolu tamente correto, desde que você saiba que prediçOes. Por exemplo, eu poderia ter predito a ascensão nazista na Alema-
você nlfo é idêntico à fonna na qual aparece; mas, se em inconsciente deste nha através da observaç[o dos meus pacientes alemães. Eles tinham sonhos
fato, você entra às vezes em conflitos muito d~is. uma questãoe nos quais a coisa toda já estava antecipada, e com detalhes consideráveis. Es-
tava absolutamente certo - nos anos que antecederam Hitler, no início, an-
de Jekyn e Hyde. Eventualmente há uma tal diferença que nós quase pode-
ríamos falar de uma dupla personalidade, e quanto mais isto é pronunciado, tes de Hitler chegar -, estava convicto de que alguma coUa estava ameaçan·
mais a pessoa fica neurótica. Ela torna-se neurótica porque tem dois modos do a Alemanh.a, alguma coisa muito grande, muito catastrófica. Eu apenas
diferentes; ela se contradiz todo o tempo, e visto que está inconsciente de si soube disto através da observação do inconsciente.
própria, n[o sabe disto. Ela pensa que é uma SÓ, mas todo mundo vê que são Há alguma coisa muito particular nas diferentes nações. ~ um fato pecu-
duas. liar que o arquétipo da anima represente um grande papel na literatura oci·
EVANS : Na verdade o senhor diria que o indivíduo pode ter até mais do dental francesa e anglc>saxõnica. Mas na literatura alemã há pouquíssimos
que duas "personae'''? exemplos em que a anima desempenha um papel ... ela precisa ter um títu·
JUNG: Não temos recursos para representar satisfatoriamente mais do lo; caso contrário não existiria. E assim, isto é apenas como se na Alemanha
que dois papéis, mas há casos em que as pessoas conseguem ter mais que - agora, imagine você, isto é muito drástico, mas ilustra meu argu~nto -
cinco personalidades diferentes. Em casos comuns, é apenas uma dissociação não houvesse realmente mulheres. Há a Frau doutor, Frau professor, Frau
vulgar da personalidade. Charna-se a isto de dissociação sistemática, em avó, a sogra, a filha, a irrnlr.. Isto é um fato tremendamente importante que
contraposição à dissociação assistemãtica ou caótica que você encontra na mostra que na mente alemã há um mito particular, alguma coisa muito
esquizofrenia. especial.
Ev ANS : O senhor também usa o termo "seif'. A palavra "self' n[o tem EVANS: Isto, claro, é um conjunto de afirmações muito interessantes
um significado diferente de "ego" ou "persona"'? e notáveis. Como o senhor observaria Hitler sob esta luz? O senhor o veria
JUNG : Sim. Quando digo "self' então você não deve pensar "eu, eu como a personificaçã"o. como um símbolo do "pai'''?
JUNG: Nã"o, nlfo totalmente. Na'o poderia explicar, possivelmente, esse
mesmo", porque esse é só seu self empírico, já defuúdo pelo termo "ego";
mas quando se trata de "self', ent[o é uma questão de personalidade, é mais fato t!o complicado que Hitler representa. t complicado demais. Ele foi um

333
332
r. e e e c . . . . . . .-. •••• wrw .. .. ·-,:::'P'4 ·--
herói no mito germânico, imagine você, um herói religioso. Ele foi um salva- uma forma de energia, a despeito de não podermos medi-la. E assim, aco~t;~)~M
dor; significava um salvador. cimentos psíquicos são fatos, são realidades. E quando você observa o flux~ '~~;
EVANS: Voltando especificamente à idéia de self .. . das imagens internas, observa um aspecto do mundo, do mundo interior, -. . . i~-­
JUNG : O self é meramente um termo que designa a personalidade glo- porque a psique, se você a entende como um fenômeno que tem lugar nos
bal. A personalidade do homem co!Qo um todo é indescritível. Seu conscien- chamados corpos vivos, é uma qualidade da matéria, como nosso corpo con-
te pode ser descrito ; seu inconsciente não, porque o inconsciente, e eu me siste de matéria.
repito, é sempre inconsciente. EvA.~s : J! claro que um dos mal-entendidos mais comuns, pelo menos
Ev A."lS : O que parece ser uma parte muito fundamental das suas obras em minha opinião, a respeito do seu trabalho, entre alguns escritores na
e uma das suas idéias principais reflete·se no tenno "mandala". Como o se. América, é que eles têm caracterizado a sua discussão de introversão e extro-
nhor o encaixa no contexto da nossa discussão do self? vers[o como sugerindo que o mundo é formado só de duas espécies de pes-
JUNG : MandaJa . .. , bem, é apenas uma fonna de arquétipo típica. ~ o soas, os introvertidos e os extrovertidos; estou certo de que o senhor está
que é chamado de ultimo exquadra circu!ae. o quadrado no círculo, ou cír. consciente disto. Gostaria de comentá-lo para nós?
culo no quadrado. J: um símbolo antigo que remete à pré-hist6ria do ho- JUNG: Bismarck urna vez disse "Que Deus me proteja dos meus amigos;
mem. Ele é encontrado em toda a face da terra; expressa ou a divindade ou com meus inimigos lido eu mesmo." Você sabe como as pessoas são. Elas
.'
o self; estes dois termos são, psicologicamente, muito relacionados, o que têm uma palavra-chave depois tudo é esquematizado ao 10l1go dessa palavra.
não quer dizer que acredite que Deus é o self, ou que o self é Deus. Fiz a ._- Nã"o há isso de extrovertido puro ou introvertido puro. Um homem assim
afmnaçã"o de que há uma relação psicológica, e há um colosso de evidência '! estaria num asilo de loucos.
para isso. e um arquétipo muito importante. E o arquétipo de ordem inter- EVANS : E claro que unido à sua tipologia de introversão, extroversão,
na: e é usado sempre nesse sentido, seja para fazer arranjos dos muitos e sabemos das suas quatro funções, de pensamento, sentimento, sensação e
muitos aspectos do universo. um esquema do mundo, ou para organizar as- intuição. Seria muito interessante ouvir alguma explicação do significado
pectos complicados da nossa psique dentro de um esquema. Ela expressa o destes tennos particulares, enquanto relacionados às orientações de introver·
e
fato de que há um centro e uma periferia, e tenta abarcar o todo. o sím· são-extroversão.
bolo da totalidade. Urna mandala aparece, espontaneamente, como um ar- Jt..'NG : Bem, há uma explicação bastante simples destes termos e ela
quétipo compensador durante épocas de distúrbio. Aparece trazendo or- mostra, ao mesmo tempo, como cheguei a tal tipologia. A sensação nos con-
dem, mostrando a possibilidade de ordem e de centralidade. E, poderíamos ta que há alguma coisa. O pensamento, falando grosseiramente, nos diz
dizer, o arquétipo principal. o que é. O sentimento conta se é agradável ou não, ·se deve ser aceito ou não,
EVANS: Dr. Jung, outro conjunto de idéias originais e muito bem co- aceito ou rejeitado. E a intuição - há uma dificuldade, porque você não sa-
nhecidas do mundo centra·se em tomo dos termos "introversão" e "extro- be, comumente, como a intuição funciona. Quando 9 homem tem uma in-
vers[o". Eles se tomaram, provavelmente, os conceitos psicológicos usados tuiçâ"o, você !lIa pode dizer, exatamente, como ele chega a ela, ou de onde
com mais freqüência pelo leigo de hoje. ela veio. Há alguma coisa engraçada a respeito da intuição.Minha defmição, en-
JUNG : Há certas pessoas que decididamente são mais influenciadas por t[O, é que a intuição é uma percepção sem formas ou meios, do inconscien-
seus ambientes do que por suas intenções internas, enquanto outras pessoas te. t quase assim que eu a entendo. Esta é uma função muito importante
~o mais influenciadas pelo fator subjetivo. A psique tem duas condições porque quando se vive em condições primitivas, é provável que aconteçam
important~. Uma é a influência ambiental e a outra é o fato dado da psique muitas coisas imprevisíveis. Por exemplo, você está andando numa floresta
quando ela nasce. A psique não é de modo algum, aqui, uma "1ábula rasa", virgem. Voei só pode ver alguns passos adiante, e. talvez, você ~ oriente
mas uma mistura e urna combinaçã"o defmitiva de gens que estão ali desde por bússola. Você não sabe o que há na frente; é um terreno desconhecido.
o primeiro momento de nossa vida ; e eles dão caráter defmido , mesmo à Se você usa a sua intuição, então você tem palpites; e quando você vive sob
criança pequena. Este é um fato r subjetivo, observado de fora. Mas, quando tais condições primitivas, você se toma instantaneamente consciente destes
você se observa de dentro, vê imagens se movendo, um mundo de imagens palpites.
geralmente conhecidas como fantasias. Contudo, essas fantasias são fatos. Ev ~S : Nós, os psicólogos americanos, fazemos uma grande quantida-
Tudo que você faz aqui, tudo isto, todas as coisas, foram fantasias para co- de de medições utilizando "testes projetivos". O senhor certamente teve um
meçar e a fantasia tem urna realidade própria. A fantasia, como você vê, é papel importante no desenvolvimento de testes projetivos com o seu método

334 335
de associaçcto de palavras. O que o levou a desenvolver o Teste de Associa -o Acredita-se que este é um caso em que fatores emocionais criaram realmente-
deP~avr.u? ~ urna patologia. Estas idéias têm-se estendido a muitas outras áreas. E pensa-
JUNG: Bem, no início quando era jovem, eu ficava completamente de- se por exemplo, que onde já houver patologia, estes fatos emocionais podem
sorientado com meus pacientes. Não sabia por onde começar ou o que dizer' intensificá·la. Falando de tais distúrbios psicossomáticos. como por exem-
e o experimento da associação foi me dando acesso ao seu inconsciente. Fi~ plo, as suas experiências e estudos sobre tuberculose, o senhor tem algumas
quei sabendo de coisas que eles ~ão me d~arn, e cheguei ii uma percepção idéias quanto ao porquê do paciente escolher este tipo de sintoma?
profunda de fatos sobre os quais eles nao estavam conscientes. Descobri JUNG: Ele não escolhe ; acontece a ele.
muitas coisas. EVANS : Talvez uma das sugestões mais radicais, na área da medicina
Ev ~~S : Em outras p~avras, de tais respostas de associação, o senhor psicossomática tenha sido a sugestão de que algumas fO[lllas de câncer pe>-
descobnu complexos ou áreas de bloqueio emocional no paciente. ~ claro dem ter componentes psicossomáticos como fatores causais. Isto o sur·
que a p~.avra "complexo", que teve origem com o senhor, é empregada preenderia?
agora maIS amplamente. O senhor está familiarizado Com os testes de JUNG: NIo, absolutamente. Já sabemos disto há muito tempo. Há cin-
Rorschach, aquele que usa os borrões? qüenta anos atrás ja tlnhamos estes casos : úlcera de estômago, tuberculose,
.JUN?: Sim, mas nunca ? a~liquei, porque mais tarde nem mesmo apü- artrite crócúca. moléstias de pele. Todos são psicogênicos, sob certas condi-
q~el mais o Teste de Assoclaçao de Palavras. Ele não era mais necessário. çt'ks. Você pode ter uma doença infeccioSa num certo momento - isto é,
FI~av~ sabendo o que tinha de saber através do exame estrito das reações uma indisposição ou desarranjo físico -, porque está particularmente pre-
pSlqUlcas. o que acho um me io excelf'!nte. . disposto a uma infecção; talvez, às vezes, devido a uma atitude psicológica.
, . EVA~S.: Mas. o senhor recomendaria que outros psiquiatras, psicólogos Quando a doença se estabelece e há wna febre alta e um abscesso, você não
C!lrucoS, pSicanalistas_ usassem estes testes projetivos. como o Teste de Asso- pode curá-la pela psicologia. Contudo, é bastante possível que você possa
claçã"o de Palavras ou o Rorschach? evitá-la com urna atitude psicológica adequada.
Jt.J~G: Bem, talvez. Para a educação dos psicólogos, que tencionam fa- EVANS; Outro evento que cai direto nesta linha que concorda com te>-
zer um trabalh~ re~ c~ pess.oas, acho que é um excelente modo de apren- da essa discussão de medicina psicossomática. tem sido o uso de drogas pa-
d:r. como funClona o mconsctente. Acho que não superestimei o valor di- ra tratar problemas psicológicos. ~ claro que, historicamente, as drogas
datlco dos testes projetivos. Penso que eles têm um valor muitíssimo alto têm sido usadas em grande quantidade pelas pessoas para tentar esquecer
na. f?rrnaçã"O de jovens psicólogos. E, ãsvezes. é claro, sa"c úteis para qualquer os seus problemas, aliviar a dor, etc. Contudo, um~ evolução particular tem
psiCO logo. Se te~o um caso de um paciente que não quer falar, posso ela- sido as chamadas drogas tranqüilizan tes nãe>-viciógenas. Elas estão agora sen-
bor~ um expenmento e descobrir uma porção de coisas através dele. Des- do administradas mais livremente aos pacientes por práticos ou internos
cobn, por exemplo, um assassinato. em geral.
EVANS : ~ verdade? O senhor poderia nos contar como isto aconteceu? JUNG: Esta prática é muito perigosa.
_ . JUNG: Vocês têm, nos Estados Unidos, um detector de mentiras, e ele EVANS : Por que o senhor acha perigosa? Acredita-se que estas drogas
e _I~al ao test~ de associação que desenvolvi com o fenômeno no psicogal- não viciam.
varuco. Tambem t~~os feito muitos trabalhos sobre a pneumografia, que JUNG : ~ exatamente como a compulsão causada pela morfma ou he-
mostraram o decrescuno do volume da respiração sob a influência de um roína. Toma-se um hábito. Você não sabe o que faz, veja bem, quando usa
complexo. Você sabe, uma das causas da tuberculose é a manifelitação de tais drogas. ~ como o abuso dos narcóticos.
um complexo. As pessoas têm uma respiração muito superficial não venti. EVANS: O senhor tem visto pacientes ou tem tido algum contato com
Iam mais os ápices dos seus pulmões e contraem a tuberculose. Metade dos indivíduos que tenham tomado essas drogas específicas, esses t~qüilizant~s?
casos de tuberculose são psíquicos. JUNG : Não posso dizer. Como você vê, há muito pouco dIsto entre n~s.
EV.ANS : Uma área interessante que está sendo muito discutida nos Esta- Na América há de tudo, pós e comprinúdos. Felizmente, não chegamos am-
dos Umdos, atualrnente, e eu estou certo que é também do seu interesse é a da tã"o longe. A vida americana é, num sentido sutü, tão unilateral e tão sem
:a medicina psicos~om~tica, uma área que lida com o modo pelo qu~ os raízes que você precisa ter alguma coisa com que compensar a natureza real
~mponentes emOClOn31S da personalidade podem afetar as funções corpo- do homem. Você precisa pacificar o seu inconsciente, o tempo todo , porque
falS. ~ claro que o exemplo clássico na literatura é o da úlcera gástrica. ele está em absoluto reboliço ; assim, à mais leve provocação, você se depara

336 337
de associaça'o de palavras. O que o levou a desenvolver o Teste de Associação
...
, ~~~
Acredita-se que este é um caso em que fatores emocionais criaram realmente":"'J~;::.:.J!i,
de Palavras? uma patologia. Estas idéias têm-se estendido a muitas outras áreas. E pensa- . ~ii: \i
. Jt.JNG : Bem, no inicio quando era jovem, eu ficava completamente de. se por exemplo, que onde já houver patologia, estes fatos emocionais podem -'--:','1
sonentado com meus pacientes. Não sabia por onde começar ou o que dizer' intensificá-la. Falando de tais distúrbios psicossomáticos. como por exem- - ,.
e o .experimento da associação foi me dando acesso ao seu inconsciente. Fi~ pio, as suas experiências e estudos sobre tuberculose, o senhor tem algumas
quel sabendo de coisas que eles não me diziam, e cheguei a uma percepção idéias quanto ao porquê do paciente escolher este tipo de sintoma?
profunda de fatos sobre os quais eles não estavam conscientes. Descobri JUNG : Ele não escolhe ; acontece a ele.
muitas coisas. EVANS : Talvez uma das sugestões mais radicais, na área da medicina
Ev ~'JS: Em outras palavras, de tais respostas de associação, o senhor psicossomática tenha sido a sugestão de que algumas formas de câncer po-
descobnu complexos ou áreas de bloqueio emocional no paciente. ~ claro dem ter componentes psicossomáticos com0 fatores causais. Isto o sur-
que a pal.avra "complexo", que teve origem com o senhor, é empregada preenderia?
agora maJS amplamente. O senhor está familiarizado com os testes de JUNG : N[o, absolutamente . Já sabemos disto há muito tempo. Há cin-
Rorschach, aquele que usa os borrões? qüenta anos atrás ja tlnhamos estes casos: úlcera de estômago, tuberculose,
. JUN~ : Sim, mas nunca? apliquei, porque mais tarde nem mesmo apli. artrite crõnica, moléstias de pele. Todos são psicogênicos, sob certas condi-
q~el maiS o Teste de AsSOCiação de Palavras. Ele não era mais necessário. ções. Você pode ter uma doença infeccioSa num certo momento - isto é,
Fl:av~ sabendo o que tinha de saber através do exame estrito das reações uma indisposição ou desarranjo físico - , porque está particularmente pre-
pSlqUlcas. o que acho um meio exce"~nte. . disposto a uma infecção; talvez, às vezes, devido a uma atitude psicológica.
. .EVASS.: Mas. o senhor recomendaria que ou tros psiquiatras, psicólogos Quando a doença se estabelece e há wna febre alta e um abscesso, você não
C~lruCOS, pSicanalistas. usassem estes testes projetivos, como o Teste de Asso- pode curá-Ia pela psicologia. Contudo, é bastante possivel que você possa
claçã'o de Palavras ou o Rorschach? evitá-la com uma atitude psicológica adequada.
JUNG : Bem, talvez. Para a educação dos psicólogos, que tencionam fa- EVANS: Outro evento que cai direto nesta linha que concorda com to-
zer um trabalh~ real c~m pe~as, acho que é um excelente modo de apren- da essa discussão de medicina psicossomática, tem sido o uso de drogas pa-
d~r. como funCiona o mCOtlSC1ente. Acho que não superestimei o valor di- ra tratar problemas psicológicos. ~ claro que, historicamente, as drogas
datlco dos testes projetivos. Penso que eles têm um valor muitíssimo alto tem sido usadas em grande quantidade pelas pessoas para tentar esquecer
na. f?rmação de jovens psicólogos. E, às vezes, é claro, slc úteis para qualquer os seus problemas, aliviar a dor, etc. Contudo, um~ evolução particular tem
}nlcologo. Se tenho um caso de um paciente que não quer falar, posso ela- sido as chamadas drogas tranqüilizantes não-viciógenas. Elas estão agora sen-
bor~ um experimento e descobrir uma porção de coisas através dele. Des- do administradas mais livremente aos pacientes por práticos ou internos
cobn, por exemplo, um assassinato. em geral.
EVA~S : ~ verdade? O senhor poderia nos contar como isto aconteceu? JUNG: Esta prática é muito perigosa.
" JUNG : Vocês têm, nos Estados Unidos, um detector de mentiras. e ele EVANS : Por que o senhor acha perigosa? Acredita-se que estas drogas
e _I~al ao teste de associação que desenvolvi com o fenõmeno no psicogal. não viciam.
varuco. Também temos feito muitos trabalhos sobre a pneumografia, que JUNG : ~ exatamente como a compulsão causada pela morfIna ou he-
mostraram o decréscimo do volume da respiração sob a influência de um roína. Toma-se um hábito. Você não sabe o que faz, veja bem, quando usa
complexo. Você sabe, uma das causas da tubt:rculose é a manife~tação de tais drogas. ~ como o abuso dos narcóticos.
um co~plex~. As pessoas têm uma respiração muito superficial, não venti- Ev ANS: O senhor tem visto pacientes ou tem tido algum contato com
lam maIS os apices dos seus pulmões e contraem a tuberculose. Metade dos indivíduos que tenham tomado essas drogas específicas, esses t~qüílizant~s?
casos de tuberculose são psíquicos. JUNG: Não posso dizer. Como você vê, há muito pouco disto entre n~s.
EVANS: Uma área interessante que está sendo muito discutida nos Esta- Na América há de tudo, pós e comprimidos. Felizmente, não chegamos am-
dos Unidos, atualmente, e eu estou certo que é também do seu interesse é a da tão longe. A vida americana é, num sentido sutil, tão unilateral e tão sem
da m di . . ,
raízes que você precisa ter alguma coisa com que co~pensar a natureza real
e clna PSicossomática, uma área que lida com o modo pelo qual os
c~mponentes emocionais da personalidade podem afetar as funções corpo- do homem. Voce precisa pacificar o seu inconsciente, o tempo todo , porque
r31s. e claro que o exemplo clássico na literatura é o da úlcera gástrica. ele está em absoluto reboliço; assim, à mais leve provocação, você se depara
336 337
com uma grande rebeJi!o moral na América. Olhe a rebelião da juventude
moderna americana, a rebelião sexual e tudo o mais. Estas rebeliões ocorrem
porque o homem real, natural, está exatamente, em luta aberta contI:! a for
ma totalmente desumana do estilo de vida americano.

REFERENCIAS
Evans, R. L 1976a. Jung 011 dementary prychology. !'Iova Yorle : Dutton.
Jung, C. G. 19~6. Symba/r of tranrforTTll1tioll, voL S. Nova Yorl:: Pantheon Press.
--.1963. Memorie!. dreamr. nflections. Reorg. e ed. p/ Aniela Jaffé; tradllZido
por R. C. Winston. Nova Yorle: Pantheon Books.

338

Você também pode gostar