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#17 | 22 a 26/04 | 2019

TRANSCRIÇÃO DAS LIVES @italomarsili

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ÍNDICE

ESQUEÇA O “MUNDO MELHOR”;


FAÇA A VIDA DO OUTRO MELHOR! - 6

AS 7 BOSTAS INTERIORES - 13

LIVRE-SE DO DILEMA EGOÍSMO X ALTRUÍSMO - 23

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A SEMANA NUMA TACADA SÓ

LIVE #52 | 22/04/2019


PACIÊNCIA, MEDIOCRIDADE, RECAÍDAS E ALGO MAIS
Acreditar no “paraíso terrestre” é a desculpa perfeita para que você se
dispense de aliviar o sofrimento do próximo.

LIVE #53 | 23/04/2019


RELAXA, NINGUÉM SE IMPORTA COM A SUA VIDA
A prática do exame diário de consciência — direto, simples e breve — é
uma poderosa ferramenta de transformação pessoal.

LIVE #54 | 24/04/2019


VOCÊ NUNCA SERÁ A BEYONCÉ
Não permita que esse falso problema paralise sua ação no mundo. To-
das as ações humanas são ego-altruístas.

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RESUMO DA SEMANA
LIVE #52 | 22/04/2019 - Instagram
ESQUEÇA O “MUNDO MELHOR”; FAÇA A VIDA DO OUTRO MELHOR!

Existe uma idéia que impregnou o imaginário do homem contemporâneo


e, como uma semente maligna, destrói nos corações onde se instala toda a
capacidade de amar. Essa idéia, que na técnica filosófica recebe o nome de
“fé metastática”, pode ser enunciada assim: um dia, a realidade se transfi-
gurará neste mundo, e tudo será mais perfeito e belo; não haverá mais dor,
todos serão iguais, e jorrarão rios de leite e mel.

Mesmo as pessoas mais hostis à vida intelectual podem ter-se contaminado


com essa idéia. Um de seus desdobramentos, no nível do indivíduo, é a es-
perança de que, um dia, todos os nossos esforços serão recompensados — é
como se o destino nos esperasse com flores na mão e devesse nos estender
um tapete vermelho em reconhecimento às nossas labutas e sofrimentos.

Na verdade, não há absolutamente nenhuma garantia de que o serviço, a


fidelidade ao dever e o amor à virtude resultarão em ganhos materiais nes-
ta vida. A promessa de um mundo melhor foi plantada em nós, mas a única
coisa sobre a qual temos efetivo controle é a nossa ação. É por ela que cons-
truímos a nossa personalidade — nosso centro de força — e podemos tornar
o mundo do outro melhor, sendo o chão do nosso amigo, o porto seguro do
nosso amor, o amparo daqueles que precisam de nós. Não é o serviço “não
recompensado” que te afunda; o que te afunda é a esperança nesse paraíso
prometido, nessa quimera que plantaram na sua cabeça.

LIVE #53 | 23/04/2019 - Instagram


AS 7 BOSTAS INTERIORES

O homem que não consegue contar a própria história não pode se orientar
no mundo. E, para contar a própria história direito, é preciso um olhar since-
ro para si mesmo, identificando nossas dificuldades e más inclinações. Em
suma, é necessário matar a pose e enxergar-se como verdadeiramente se é.
Um recurso que ajuda muito a conquistar uma visão mais clara sobre si
mesmo é o exame diário de consciência diante do observador onisciente.
Esse exercício não deve levar mais do que 3 ou 5 minutos, e consiste em
responder a três perguntas: no dia de hoje, o que eu fiz bem? O que eu fiz
mal? O que eu poderia ter feito melhor?

As respostas — que devem levar em conta o observador onisciente, que já

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as conhece — ajudarão você a tomar posse do fio condutor da sua história,
a visualizar com mais clareza quem você é, e por que certas coisas não dão
certo em sua vida. Geralmente, erramos no mesmo lugar, e por influências
das sete más inclinações que acompanham a Humanidade desde a noite
dos tempos — são as sete bostas interiores, que você precisa saber iden-
tificar em si mesmo e mapear-lhes a figura, como em um raio-x, para que
deixem de ser uma força cega sobre você. Quando você se enxerga melhor,
você começa a se livrar do vitimismo e do sentimento de ser injustiçado
pelo mundo.

LIVE #54 | 24/04/2019 - Instagram


LIVRE-SE DO DILEMA EGOÍSMO X ALTRUÍSMO

Longe de ser uma questão banal, a dúvida sobre a natureza das nossas
ações — se egoístas ou altruístas — é causa de muita confusão para muitas
pessoas, que acabam paralisadas por não saber a melhor forma de agir.

A verdade, entretanto, é que esse só é um problema para quem busca a ple-


nitude da perfeição nos seus atos — uma pretensão incabível na realidade
deste mundo. E, sem conseguir atingir a perfeição absoluta, a pessoa recua
pelo escrúpulo, deixando de fazer o bem que está ao seu alcance.

A saída para esse problema está na compreensão de que, neste mundo im-
perfeito, as ações humanas são sempre ego-altruístas. O fato de extrairmos
uma satisfação pessoal das boas ações que praticamos não perverte o bem
que fazemos. Por isso, na circunstância concreta, a pergunta deve ser: “O
que é o certo a se fazer?”, e não: “Estou sendo egoísta ou altruísta?” A per-
gunta sobre egoísmo ou altruísmo está errada em sua formulação mesma
e paralisa a ação.

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Live #52 | 22/04/2019 - Instagram

ESQUEÇA O “MUNDO MELHOR”;


FAÇA A VIDA DO OUTRO MELHOR!

Vocês sabem que essas postagens do feed nada mais são do que frases ou
conteúdos de lives e stories que pegamos, reescrevemos de algum modo e
colocamos no ar. Então, falamos sobre o assunto de se anular — que você
só se encontra quando serve aos demais. Aí, apareceram muitas pessoas
confirmando e agradecendo. Outras, que não concordaram, falaram “Não
é isso! Se eu servir aos outros, vou me anular! Nós aprendemos na vida
assim: primeiro, eu; segundo, eu; terceiro, eu! Se eu não me amar, quem
vai me amar?”. Ouvimos isso desde a infância e tomamos como verdade. O
pior que é assim que as pessoas pensam mesmo.

Se não fizermos uma anamnese, visualizando nosso interior, a realidade, o


convívio com os outros, do tipo “Será que a realidade é feita disso mesmo?
Será que essa é a trama do convívio humano? Italo, eu estou meio tris-
te... de onde vem essa tristeza?”, pode ser que todos caiam nessa mesmo.
Aí, algumas pessoas falaram “Acho esse coach muito superficial!”. Franca-
mente, a pessoa pode pensar o que quiser – quem faz os cursos presen-
ciais sabe que não somos superficiais. Estamos longe de ser shallow!

Mas, isso não importa! Deixa esse pessoal achar! Só quero saber de uma
coisa: essas pessoas já ouviram falar em “fé metastática”? Elas sabem o
que é isso? “Ah, Italo, não sou religioso!”. Isso sequer está num texto reli-
gioso – não está em nenhum teólogo católico, protestante, budista ou de
religiões afro-brasileiras. Isso aparece no livro Ordem e História, do Eric
Voegelin. Mais do que um termo, a fé metastática é uma crença que ma-
tou a possibilidade de convivência neste mundo. Nessa obra gigantesca
do Voegelin – li somente o que interessava para resolver problemas nos
quais eu já me debruçava havia anos – aparece a fé metastática, ou seja,
uma crença que já passou pela nossa cabeça em algum momento: “Tudo
vai dar certo! Se ainda não deu certo, foi porque não chegou no final.” –
como aquelas frases “de caminhão”, do Chaves, de filmes de Hollywood,

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da nossa mãe, da nossa tia etc.

Isso que se fala, como se fosse a grande verdade da vida, que a gente diz
para consolar os outros (lembrando que a gente, muitas vezes, consola
os demais com mentiras), não vai funcionar por muito tempo. Assim que
a pessoa se der conta que isso é uma mentira, ela ficará triste e “pau da
vida” contigo. Afinal, você a enganou, sem consolá-la. Mas, o que é a fé
metastática? É uma crença fantástica de que a realidade da Terra pode se
substanciar, de repente, numa ordem perfeita, onde reinará a felicidade
(com rios de leite e mel, sorrisos largos, ausência de dor). Independente-
mente de qualquer coisa, isso é a crença na fé metastática. Para o sujeito
que nos chamou de shallow, isso já aparece no livro Cadernos do Cárcere,
do Antonio Gramsci, no qual “tudo será mais belo um dia, tudo seria mais
belo num certo momento, quando o regime hegemônico for feito, as lutas
de classe acabarem”, ou seja, ali a fé metastática aparece entrando no nos-
so imaginário – sem pararmos sequer para pensar nesse assunto.

Então, deixa eu falar aqui de como a realidade é – e você pode chorar o


que for, ficar pau da vida, falando “Dr. Italo, você é um pessimista!”. Minha
filha, tudo que eu não sou é uma pessimista! Você sabe disso porque já
me acompanha há meses – alguns me acompanham há anos, outros são
meus pacientes há décadas... vocês sabem que eu sou um otimista, alguém
que olha para a realidade com tesão e vontade de viver. Tenho vontade
de chacoalhar a sua cabecinha oca, pegar seus cabelinhos – com todo o
carinho que eu tenho no meu coração – e falar “Olha para a realidade, esta
porra é boa! Vamos viver! Vamos acordar com tesão!”.

Outra coisa que o pessoal falou foi: “Ah, ele se contradiz com muita frequ-
ência...”. Vocês não sabem do outro princípio mencionado sempre aqui: o
ser humano vive numa tensão. Qualquer um que queira fugir dela deixou
de ser humano. Vivemos numa tensão (esquerda x direita, Céu x Terra),
estamos no centro desta cruz de quatro polos. É aqui que estamos, então
é claro que a vida tem algo de contraditório e de confusão. Isso é óbvio.
Aquele sujeito que não quer arcar com a contradição da vida – desejando

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fugir para um dos polos ou para seu recanto de ilusões e sonho – fugiu da
trama da existência. Então, é claro que as coisas são contraditórias – isso
é evidente. Não vamos fugir disso se estivermos verdadeiramente com-
prometidos com o “estar vivo”, o viver.

Então, ao mesmo tempo em que olhamos para o mundo com tesão e von-
tade de acordar, viver e servir, há um outro elemento deste planeta, que
é o elemento de sofrimento, tristeza e miséria. Como diria Santa Teresa
d’Ávila, uma autora que eu amo, essa nossa vida é “uma noite ruim, numa
ruim pousada”. Isso aqui é uma bosta: temos dor na coluna, hemorroida e
unha encravada; somos abandonados por quem amamos; uns dizem que
nos amam e, no outro dia, já estão pensando no próprio umbigo; perde-
mos familiares; perdemos todo mundo. Isso aqui é uma tristeza, um vale
de lágrimas sem fim. É isso mesmo, caramba!

Quando o sujeito, amedrontado por não ter capacidades intelectuais e


físicas, foge e deixa de encarar essa como sendo a trama/realidade do
mundo – lembrando que a paz e a felicidade universais jamais aparece-
rão para nós, pois este mundo não é feito disso –, ele migra para aquele
lugar que o Dr. Voegelin chama de fé metastática, no qual, de repente,
como num passe de feitiçaria, tudo será transfigurado, ficando mais belo.
Quando caímos nisso, deixando essa mentalidade se instalar em nosso
coração, imediatamente – e é aqui que está o passo sutil, que explica todo
o conteúdo do post – isso mata a nossa caridade.

Por que? Atenção! Esse é o pulo do gato, o ponto central da nossa explica-
ção: se a fé metastática nos invadiu e aguardamos o tempo em que tudo
será mais belo, a paz reinará e uma ordem política colocará tudo em or-
dem – como um rapaz acabou de postar, dizendo que descobriu o melhor
antídoto para a desigualdade social: obrigar o pobre a casar com um rico,
misturando tudo.

Meu filho, você, ao instaurar o reino da tirania e baixar a porra de um


decreto para acabar com a desigualdade social, lesou a liberdade do su-

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jeito de casar com quem desejar; foda-se a desigualdade social, que está
abaixo da liberdade humana (que é imperativa e mais importante do que
tudo); olha a maluquice do sujeito: para que isso aconteça – a tal igualda-
de –, ele subirá a um grau tão alto de poder, tornando-o desigual quanto
aos outros, pois cagou uma regra que todos deverão obedecer.

Voltando ao pulo do gato, ele não reparou em algo que não haverá na
Terra: a igualdade (seja social, intelectual ou moral) e a extinção do sofri-
mento. Este mundo é feito disso! É hierárquico! As coisas acontecem as-
sim. Se você foge para o reino da fantasia – esse é o pulo do gato –, acaba
matando a caridade no seu coração. Você não entende que a sua ação de
serviço é a única coisa que possibilita às pessoas do seu convívio (seu ir-
mão, seu amor, seus alunos etc.) uma passagem atenuada por este mundo,
sendo um pouco aliviadas da ignorância, do sofrimento e das penúrias da
vida. Se você não age, no sentido de aliviar o sofrimento daquele filho da
puta, ele vai continuar sofrendo! Você é a única possibilidade! Diariamen-
te, a sua ação amorosa, abnegada e serviçal é a única possibilidade de
atenuar essa tal desigualdade social que você quer combater. Ao apostar
no serviço diário de amor – anulando a si mesmo, para que o outro apare-
ça –, você aparece! É disso que é feita a natureza humana!

Não adianta acreditar que a natureza humana é feita de outra coisa, que
você é mais você “quando se amar primeiro”. Quando você se ama primei-
ro, sabe o que acontece? Nada. Você instaura o caos! Você não sustenta
isso. O único modo de aparecer, do jeito que você foi projetado para ser
(um ser amoroso), é servindo aos demais, sem pensar em si. É claro que
isso choca a todos. Afinal, nós não fomos treinados para pensar assim.
Pensamos “farinha pouca, meu pirão primeiro”.

O ser humano é egoísta. Nós encontramos nossa infelicidade no egoísmo,


que é irmão siamês da infelicidade, por um único motivo: não é assim
que funciona a vida humana! Quando você é egoísta, tem apenas gozo e
alegria momentâneos, de poucos dias. Depois, a sua vida segue ladeira
abaixo. Sua vida só aparece quando você se compromete firmemente com

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a caridade, através do serviço abnegado, diário e oculto. “Mas, Italo, eu me
dei muito mal! Servi a vida toda e só cagaram na minha cabeça. Agora,
estou abandonada e infeliz”. Se a vida acabou, é porque você não se de-
dicou, não se comprometeu verdadeiramente a servir até o último minuto
nesta vida.

Por causa da fé metastática, que é uma descrição filosófica trazida pelo


Eric Voegelin, e não uma religião – uma crença que tomou conta da ca-
beça de 99,9% das pessoas –, você pensa “cadê esse mundo que não se
transfigura pra mim? Servi a todos, limpei a bosta do meu avô que ficou
doente e a do meu filho recém-nascido, trabalhei junto com meu mari-
do... cadê esse mundo?”. É que você esqueceu que esse mundo não vai
se transfigurar para você. Só que a perda da cosmovisão da vida eterna,
ou seja, da ciência da vida eterna, em que você morrerá e irá para outro
lugar, não importando sua religião, se você vai reencarnar depois ou se
vai para o céu, inferno ou purgatório – e lá está o reino da felicidade, e
não aqui – te leva, uma hora, ao cansaço. A incompreensão da notícia que
está postada no meu feed do Instagram, é, no final, uma não crença na
vida eterna. Você não acreditou, nem entendeu do que é feita a estrutura
da realidade: você tem um arco de vida, entra no tempo, depois sai dele
e entra na vida eterna – isso aqui é a vida de todo mundo. “Mas, Italo, eu
não tenho fé, não acredito nisso”. Não importa! Isso não é matéria de fé,
não estou falando de Deus. Estou falando de estrutura antropológica, ou
seja, do que forma o homem. Aí, você precisa fazer meu curso presencial
para entender 100% – aqui não é possível explicar tudo.

Mas, a questão é essa: ao perder a noção da vida eterna, de que o paraí-


so é celeste, ou seja, ele está em outro lugar (independentemente da sua
crença), você, obviamente, será contaminado por esse elemento da fé me-
tastática, que te leva a esperar e crer na chegada de uma ordem responsá-
vel por te instalar num paraíso terrestre — seja por causa dos seus atos ou
por um passe de mágica. Como essa ordem nunca chega, você fica puto
e pensa “ah, não vou servir a mais ninguém”. Sabe o que acontece? A vida
de todo mundo vira um inferno. Isso aqui é “suportai-vos uns aos outros!”.

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Isso não significa aguentar chatice de primo! Na verdade, você deve ser
um suporte através da sua vida, da sua carcaça, do seu esqueleto e do seu
coração, que pulsa todo dia para tentar atenuar um pouco esse vale de
lágrimas que é a vida. É só assim que se encontra a felicidade. “Ah, Italo,
mas aí um espaço será aberto para os abusadores”. Meu filho, vai surgir
abusador em todos os lugares! Não é o fato de você servir ou não que te
coloca numa posição de presa fácil. Quanto mais você serve, menos fra-
co você fica! Você fica muito mais forte quando entende que é uma ação
neste mundo.

Ao se recolher para o mundo do egoísmo, você vira um objeto, podendo


ser reposicionado no tabuleiro da vida pela ação dos demais – tem sempre
alguém agindo, porra! Não se deixe invadir pela fé metastática. Esta mer-
da é uma falácia, uma sombra gnóstica que entrou na cabeça de todos. É
uma sombra que paira no espírito revolucionário do homem contemporâ-
neo. Como nos livramos dessa bosta de fé metastática? Não é lendo o livro
do Voegelin, pois ele não dá a solução. Deve-se entender que a realidade
tem esse elemento de desordem, caos, sofrimento e penúria, mas você é
o chão do seu amigo, do seu amor e do seu filho. Se você não está servin-
do de maneira sólida, ele não pisa bem, acaba tropeçando e afundando
numa areia movediça dessa realidade caótica. Aí, as duas pessoas ficam
tristes, não encontram o amor e entram num mundo de desespero e de-
sorientação. Sempre que o ser humano entra nesse mundo desesperador,
acaba fugindo para o seu mundo mental e vivendo no “mundo da lua”.

“Italo, como eu saio do mundo das ideias e vou para o da ação? Estou meio
triste e com uma sombra de desesperança, como faço?”. Servindo! É assim
que se encontra a felicidade. Não se sinta idiota, pois idiota você já é! Seja
uma idiota que serve! Com o tempo (um, dois, três anos), a gente até fica
menos idiota. Nós até começamos a tocar naquilo que é nossa humanida-
de verdadeira, naquilo que é a estrutura humana neste mundo. Estamos
neste mundo para suportar as outras pessoas através do serviço abne-
gado. Não tenha medo! “Ah, Italo, mas aí abro portas para o abusador”.
Presta atenção! O abusador aparece na vida do egoísta e do não egoísta.

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Isso aqui não tem nada a ver, não é superficialidade. É estudo profundo
de psicologia humana.

O problema do Brasil e de grande parte do Ocidente é que só se fala so-


bre psicanálise. Só se fala disso. E é claro: para o conceito teórico desse
sujeito, isso aqui escapa monstruosamente. No máximo, a psicologia adle-
riana vai dar conta disso de alguma maneira – já falei isso mais de uma
vez aqui, só que ninguém estudou o Alfred Adler, ninguém sabe o que é
isso. Nem é esse psicólogo que dá a resposta para isso. Você vai precisar
escalar, ou seja, subir no amadurecimento humano.

Então, estamos oferecendo o caminho inicial, o caminho das pedras. Tome


cuidado com essa bosta chamada fé metastática, que invadiu o coração
de todo homem contemporâneo. Isso é uma sombra com várias caras,
como se fosse uma Medusa com várias serpentes que tendem a surgir.
Nós vamos até à raiz dela! Vamos matar essa bosta! Neste mundo sempre
haverá sofrimento conosco. Isso aqui faz parte do mundo, não tem nada
de errado. É o mundo onde fomos colocados para tentar aliviar um pouco
a vida do nosso irmão. Fazemos isso com amor, coração, ouvidos, olhar
atento, trabalho diário... e, muitas vezes, o que temos é isso. Quando você
pensar que foi feito de idiota, pense que a vida ainda não acabou. Conti-
nue! Continue! Continue! O que aconteceu quando você parou e pensou
dessa forma? Você foi invadido pela sombra da fé metastática – o que vai
te afundar. Você não encontrará a felicidade no fundo desse poço porque
ela não está embaixo. Ele está em cima, na direção do céu!

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Live #53 | 23/04/2019 - Instagram
AS 7 BOSTAS INTERIORES

O assunto de hoje é o de não perder o fio da meada da própria vida e de


como isso pode ferrar com nossa história. É um assunto recorrente aqui
e importante para a maturidade. Sem esse assunto, não conseguiremos
chegar a lugar nenhum.

Se não conseguimos contar a nossa própria história com o mínimo de


coerência lógica – não me refiro à coerência mental, mas, sim, ao que de
fato podemos ou não fazer na vida –, ou seja, quando falseamos a nossa
história, nós não sabemos o que podemos fazer ou não, não conhecemos
nosso lugar no mundo, não temos a nossa própria voz, não dominamos os
momentos do nosso coração, não sabemos de fato o que nos pesa, acaba-
mos fazendo pose, temos medo, ficamos envergonhados e não sabemos
para o que servimos. Aí, alguém fala alguma coisa sobre nós, achamos
bacana, acreditamos naquilo e vamos vivendo uma vida que não é real-
mente nossa.

O que acontece quando fazemos isso? Aqui está o ponto central da his-
tória: quando contamos a nossa vida longe do que de fato somos, nossas
ações não causam o efeito pretendido. Se você não sabe dar conselhos ou
escutar alguém – não está nem aí para os outros, quer saber apenas da
sua vida –, mas, por algum motivo, alguém falou “A Marcinha sabe ouvir
tão bem as pessoas”; aí, você acreditou nessa bosta, só que nunca reco-
lheu nenhuma capacidade para isso e nem quer ser essa pessoa. Só que
você gosta disso por ser um distintivo de qualidade dado por alguém. Dar
conselho é bom, então você começa a achar que sabe dar conselhos e
passa a dar palpites para as pessoas, colocando-se nessa posição. O que
acontece?

O efeito pretendido a partir da sua ação vai ser absolutamente descon-


trolado, pois você, por não ter o domínio dessa técnica, não controla esse
efeito. É só pose, esse negócio! Assim, você tem uma desconexão entre

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causa e efeito na vida – e não há nada que nos torne mais inseguros e
com exasperação afetiva, com os nervos à flor da pele, do que essa desco-
nexão. Por quê? Porque você é uma ação, meu filho... um sujeito agindo no
mundo, lembra? Só que se você não tem o mínimo controle da sua ação,
de modo que as consequências dos seus atos são loucas – lógico, pois
você não se dedicou àquilo, e vou falar hoje sobre como fazer isso –, então
é óbvio que você terá um efeito completamente diferente do pretendido.
Assim, torna-se desorientado, uma pessoa com exasperação afetiva, o que
leva ao surgimento de um elemento de vitimismo na sua vida.

Esse é o grande mal da história toda: você acha que é uma vítima e que a
outra pessoa não te ouve, nem acolhe o conselho dado por você... pensa
que a outra pessoa não seguiu a carreira aconselhada por você. Desse
modo, começa uma desconexão absurda entre causa e efeito, que te leva
a ver o mundo ruir na sua frente – pois você vira um coitadinho que, assim
como uma criança, não tem ação no mundo, não faz nada e nem controla
as coisas. Ora, um adulto tem que ter certas competências e capacidades.
Mas o que acontece contigo? Você se vitimiza, se sente incompreendido
e acha que as pessoas te devem algo (atenção, ouvir o que você manda
etc.). Esse é um grande problema: a incapacidade do indivíduo de se ins-
talar na vida pelo fato de não se conhecer intimamente.

Então, como é possível fazer isso? Aqui está o centro da nossa conver-
sa. Não é só dar um diagnóstico – que é algo fácil, as pessoas vivem,
acordam, dormem, estão no “mundo da lua” e não querem saber de nada.
Temos que fazer um balanço diário. Esse é o exercício que precisa ser
compreendido e, de algum modo, ser colocado na vida, o que não é fácil e
demanda disciplina e rotina. Estou falando sem a pretensão de que você
já consiga encaixar isso na sua vida, pois não é algo que acontece do dia
para a noite. Diante do Observador Onisciente – afinal, é Aquele que te
conhece e sabe quais são as suas inclinações – deve-se gastar de dois a
três minutos à noite para fazer um balanço real, genuíno e verdadeiro do
dia – isso é uma técnica milenar, não é invenção de coach. Você está frito
se você não fizer isso diante do Observador Onisciente.

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Agora, o problema: quem faz isso habitualmente (sem se descuidar ou es-
quecer, numa base regular diária)? Não é difícil viver, dá apenas um certo
trabalho! A questão é a seguinte: você pega um papel ou caderno – eu
gosto de fazer no caderno, e não no Iphone, por causa do risco de descon-
centração –, põe a data e reflete, escrevendo “Onde é que eu não estive
presente hoje? Quais foram as bostas que fiz hoje? O que eu fiz mal? O que
eu fiz bem?”. Em três minutos, você faz isso! Isso é técnica milenar! Funcio-
na! Fazendo isso ao longo de dois ou três anos, você muda radicalmente.

Aqui está o ponto: não é para fazer isso diante de vizinho, patrão, esposa
ou marido. Isso é apenas você fazendo pose para todos eles. A questão
é a seguinte: fazer diante de Observador Onisciente. Só é olhar para seu
caderninho e pensar “O que eu fiz bem? E mal? O que eu poderia ter feito
melhor?”. Só você poderá dar as respostas. Eu sei que não sairá porra ne-
nhuma no primeiro dia (só falsidade ou nada mesmo). É um compromisso
que você precisa ter consigo. Não é possível que eu faça por você. No
máximo, poderíamos criar uma comunidade, um 10 P.M. Club, sei lá, às 22h,
todos entrariam aqui comprometidos a escrever sobre o que foi feito de
bom ou ruim.

Mas, isso não funcionaria! Afinal, você é que deve se comprometer com
isso! Por quê? Ao começar a escrever, você pega um fio da meada que é
o seguinte: “o que permanece no centro dos meus interesses ao longo de
três meses?”. “Ah, o meu empreendimento, uma lojinha de brownie...”. Meu
filho, você pode montar uma loja de brownie, de biquíni, o que for... Não
é isso que é o fio condutor da sua vida! Presta atenção! O fio condutor da
sua vida é o que você é, e não o que faz. Isso é fundamental – mas, é claro
que, pelo que você faz, conseguimos ver também o que você é. Aí, você
consegue visualizar: “Porra, de novo eu falei aquela frase escrota para
uma pessoa num momento errado. De novo, fiz uma piadinha que não era
para ter sido feita. De novo, não desejei bom dia para aquela pessoa. De
novo, fui preguiçoso e não acordei na hora certa”. Aí, começamos a notar
que o importante é essa coisa chamada de “competências sociocaralha-
das” pelas pessoas. Sei lá! É a coisa da virtude mesmo! É o que te falta ou

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não! Isso é que deixa sua vida consistente. Você é uma pessoa laboriosa?
Constante? Que tem fortaleza? Que sabe sorrir? É agradável? Você vê o
que te falta e quais são as suas inclinações realmente negativas. Isso é o
princípio do autoconhecimento.
Essas inclinações são sete. Eu já te conto... você tem tudo isso dentro de
você. A sensualidade, por exemplo, te faz perder o foco porque é mais
gostoso dormir, ficar deitado na rede, deixar de estudar para se coçar. É
o que te joga pra baixo. Todo mundo tem isso! Você precisa ver o quanto
cede a esse ponto, ou seja, o quanto deixou de cumprir para: comer fora
de hora uma banana, iogurte ou biscoito; ficar deitado(a) na cadeira mais
tempo; conversar com um amigo mais do que deveria etc. É aquela porra:
o quanto você deixou de dar esmola, ser bom e fazer a caridade por ser
apegado aos bens materiais e estar com medo de dar o que é seu – isso
porque você não entendeu como funciona a vida ainda. Ela é isso: receber
com alegria e dar as coisas com generosidade. Se a vida te dá, você aceita;
se te toma, entrega. Não tem mistério!

Mas, é claro que temos uma inclinação para baixo – que vem do medo, do
apego medroso – chamada avareza. Ou, então, você tem outra inclinação
negativa, que é a preguiça – todos nós temos. Não tem um sujeito na Terra
que não seja preguiçoso! “Italo, mas meu pai e eu não somos preguiçosos,
acordamos cedo e ligadões”. É, meu filho, isso se chama preguiça ativa,
ou seja, o sujeito que se mexe muito nunca está parado, só que nunca faz
o que precisa realmente fazer (não arruma gavetas, não entrega um rela-
tório etc.). Tem também o “preguiçoso Garfield’, sempre sentado no sofá e
comendo lasanha. São os dois tipos de preguiça existentes.

Tem o nervosinho também, que está sempre nervoso e não consegue


orientar a força dele para o bem. A ira, em geral, aparece assim: você fica
“pau da vida” com alguém que está na sua frente, mas é um cordeirinho
com medo de se levantar contra a falsidade e o que existe de ruim (não
consegue falar nada por causa do julgamento alheio). É sempre algo de
covardia. Veja bem a distinção: com sua esposa, seu marido, seu irmão,
seus alunos, ou seja, alguém que está na sua frente, seja fofo(a), genero-

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so(a), risonho(a), acolhedor(a). Não adianta ficar nervoso e bravo. Isso é
ridículo e não serve para nada! Agora, contra os princípios ruins, as co-
vardias e injustiças, levante-se sempre com toda a energia do mundo. Isso
não é a ira (inclinação negativa)! É a fortaleza! Parece a mesma coisa, mas
não é.

À noite, você vai olhar e falar assim: “Contra quais pessoas eu me irritei?’.
Você não tem motivo para se irritar com ninguém: ou você ama a pessoa
ou entende que aquela porra é um sintoma. Você vai se irritar com seu fi-
lho, uma criança que cagou o tapete pela 5ª vez? Vai se irritar com o gato,
que mijou? Vai se irritar com sua mulher, que não colocou a correspon-
dência no lugar certo? Fosse você botar! Deixa de ser preguiçoso! A gente
não tem motivo para se irritar com ninguém nesta vida, chamando os
outros de babacas... pare com isso! Não adianta se irritar com ninguém...

Ontem, um rapaz me escreveu algo desaforado no início, por causa do


que falei a respeito do Bolsonaro. Aí eu pensei “Ah, eu vou ficar esquentan-
do?!”. Fui lá e falei com o cara. No final, ficou tudo bem. Acabou! Para que
ficar irado e nervoso com alguém? É claro que não! Isso é coisa de idiota,
de alguém que não entende a vida. Com um homem ou mulher concretos,
deve-se sempre ter carinho, acolhimento, tentativa de entendimento... foi
o que falamos na Live anterior: não vamos dirigir ao contrário. É isso aí,
Camila! Você se irrita fácil. Um monte de gente se irrita fácil.

O que estou querendo dizer é o seguinte: ninguém te deve nada! A pessoa


não te deve nada (atenção, dinheiro, elogio etc.). Você é um zero à esquer-
da. Eu sou também! Nós é que devemos tudo aos outros: honrar nossos
pais, louvar ao nosso Deus, agradecer àquele sujeito que acorda antes da
hora para a cidade funcionar, agradecer ao guarda, ao pessoal do hospital
(médicos, enfermeiros, entre outros) etc. A gente deve tudo a todo mundo
o tempo todo! Agora... ninguém nos deve nada – assim resolvemos muitos
problemas. “Ai, mas a minha irmã falou...”. Você é que precisa ir lá e aju-
dá-la.
As pessoas mais irritadas são aquelas que acham que todos devem algo

17
a elas. Aí, a pessoa se irrita. Primeiramente, você acha que a pessoa deve
ser rápida, não deve atrasar seu dia. Depois, você acha que ela te deve
atenção. Meu filho, você não fala nada com nada! Por que ela vai prestar
atenção em você, porra?

Oh, isso aqui é muito bom! Pavio longo e pavio curto. Pavio longo é algo
que se conquista, tem gente que nasce com ele ou não. Existem pessoas
que o conquistam. Há pessoas que nascem com pavio curto; outras, sem
pavio. Quanto a estas, saiba de uma coisa: isso não tem a ver com tempe-
ramento, mas, sim, com esse pensamento de que alguém deve tudo a elas.
Quando você entende que ninguém te deve nada, entra esse elemento de
acabar com a irritação na sua cabeça. Aí, você passa entender que está na
vida da pessoa para fazê-la melhorar. Quando isso acontecer, ela melho-
rará. Assim, uma relação do caralho será estabelecida. Então, essa ira aí é
uma bobeira. Aquela coisinha que eu coloquei para você escrever à noi-
te é um roteiro que estou dando. Se você não quiser anotar, nem prestar
atenção... paciência! O problema é seu! É o roteiro para fazer esse diário
noturno à luz do Observador Onisciente.

Outra coisa é a inveja. Ela pode acontecer mesmo. A inveja sempre movi-
menta o negativo: olhar a vida do outro e desejar o que ele possui, sem
esforço para conquistar algo por mérito próprio. Há a inveja extrínseca:
ao desejar os bens materiais do outro, você sente algo ruim no peito. Isso
é inveja! Existe também a intrínseca (dos bens intrínsecos): você inveja
a inteligência de um sujeito; a rapidez, generosidade e bondade de uma
menina. Você pode ter inveja dessas coisas.

“Italo, eu não tenho inveja de ninguém!”. Então, você tem a sétima coisa:
a soberba. Você acha que é melhor do que todos, só não tem inveja dos
outros porque está ocupado achando que é melhor... “ninguém chega aos
meus pés”. Todo mundo está nessa bosta, todos têm essas sete coisas. Um
dos segredos da vida é mapear essa bosta – na verdade, já estou dando
o mapa – e ver o quanto você tem de cada coisa e onde aparece com fre-
quência. Não é tão difícil assim! Em geral, aparece no mesmo lugar e do

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mesmo jeito.

O que não te faz progredir está sempre no mesmo lugar. Ou a preguiça


predomina em você ou a inveja ou a soberba... essas porras aí! Então, faça
o seu roteirinho mesmo. Examine-se! Mas, faça todo dia, durante nove me-
ses, dois anos... é rotina! Você tem que querer isso. Aí, você deixa de se
vitimizar. Você começará a notar que não é vítima. Você é ruim mesmo!
“Ai, por que não estão me considerando na minha dignidade ontológi-
ca?! Por que não estão vendo como sou bom(a)?!”. É porque você não é
bom(a)! Você nem reparou que tem uma das sete bostas que aparecem
sempre na sua vida. Não dá para esconder! Você está no trabalho e todos
estão vendo que você é invejoso. Você acha que não é, mas, na verdade, é!
Ou, então, você, no trabalho, não consegue emprestar suas coisas porque
está apegado. Você não progride, é uma bosta... então, não há vitimização.
Você não vale nada mesmo, então a pessoa vai te tratar como se você
nada fosse. “Italo, que absurdo! Você não acredita na dignidade humana,
desde a sua concepção até a morte? Meu filho, o que o cu tem a ver com as
calças? O que uma coisa tem a ver com as outras? A dignidade ontológica
todo mundo tem. Outra coisa é a seguinte: a dignidade moral, que você
tem pelo que faz, pelo que é. Você e eu – bostinhas – não vamos ser va-
lorizados como se fossemos heróis ou santos. Nós não somos isso! Como
as pessoas vão dar essa moral toda para nós? Não temos porra nenhuma
mesmo, somos bostas ainda.

Se você ainda tem esse olhar cego sobre a vida, sem saber de onde vem
ou para onde vai a coisa... dessa desorientação fenomenal – que eu falei
no início – vem aquela desconexão entre causa e efeito, ou seja, você acha
que é uma pessoa linda e maravilhosa, mas, na verdade, é uma invejosa
e gulosa – um monte de bosta que aparece em você e atrapalha sua vida.
Ninguém vai te considerar mesmo! Não se vitimize! Melhore! Não busque
compensações na vida! Examine-se! Aqui é a tecnologia de exame. Não
há outra. Mude! Você vai começar a notar que faz uma expressão facial de
bosta quando alguém conta, por exemplo, que começou a namorar. Isso
porque você é uma solteirona com uma puta inveja de quem consegue

19
namorar – por mais que você diga que está bem resolvida.

Você verá se está realmente bem resolvida quando alguém der a notícia:
“noivei, vou casar”. “Ah, Italo, eu estou muito bem resolvida com meu Uno
Mille, não ligo para carro”. Aí, seu colega de trabalho arranja um jipe – um
de que todo mundo gosta –, e você fala: “Também... ele ganhou a herança
do pai”. Você começa a justificar na sua cabeça... deixa de se enganar!
Isso é inveja! Quando se dá nome aos bois, você começa a melhorar, a
mapear a si mesmo. Aqui está o ponto: “Italo, mas eu dei nome aos bois.
Como eu melhoro?”. Primeiro, entenda-se! Mapeie essa bosta! Vai ser um
enorme avanço! Você vai começar a notar que não tem motivos para se
vitimizar, querer a atenção de todo mundo para se achar linda e maravi-
lhosa. Vai entender o fato de ninguém te querer na roda de conversa, não
ser promovida, não ser querida pela mãe etc. “Como eu não reparei antes?
É por causa dessa bosta que eu sou”.

O que vai acontecer? Você começará a se acalmar e entender que é uma


bostinha. Você passará a se orientar no mundo e a entender o porquê de
as coisas não funcionarem. É porque antes disso você se irritava com o
mundo, voltada para a exasperação afetiva. Você se vitimizava porque
não entendia o fato de não conseguir os efeitos pretendidos. Quando
você entende que é uma bostinha, a coisa acalma. Aí, você assenta onde
está e, a partir deste chão fixo, começa a progredir, conquistar as virtudes
ausentes e as capacidades intelectuais, técnicas e morais.

“Ih, ele melhorou, porra!”. Recebo um monte de gente aqui que já sacou
esse negócio. Hoje, falaram: “Italo, alguém próximo morreu... eu estou com
38 anos e me falaram que estou muito madura e mudada”. Meus para-
béns! Antes tarde do que nunca! Mas, qual foi o passo que a pessoa deu?
Nenhum. Só deu nome aos bois, declarando que não pára de falar, enche
o saco de todos, quer a atenção de todo mundo etc. Se você declara isso,
já melhorou! Você se põe no seu lugar! Uma parte de nós será bosta para
o resto da vida – eu também –, mas, ao dar nome aos bois, você entende
o que precisa conquistar de avanço/melhora. Eu já estou trazendo aqui o

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que é necessário para melhorar: trabalhar, servir aos demais, não encher
o saco etc. Assim, você já melhorou num nível que, porra, você nunca fez
isso na vida! Nunca passou sete dias sem reclamar de nada – eu sei, eu
te conheço! Faça isso ao longo de uma semana e passe para outro nível
de gente, vire outra pessoa! Nós temos mania de reclamar de tudo. Não é
para fazer isso porque é chato!

Você mapeia o que te puxa para baixo e faz essas coisinhas: trabalha,
serve e não enche o saco. Acabou! Quer mais o quê da vida? Depois, co-
meça a parecer possível aquele assunto da vocação, do sentido da vida
referente a trabalho, missão e propósito neste mundo... meu amigo, não
tem como você saber isso se ainda é uma bola de síntese confusa – termo
técnico da Filosofia –, sem saber separar as coisas. Você não sabe por que
está agindo. Como você conseguirá ter propósito?! No outro dia, você já
mudou o propósito – que nem o Find Your Why, do autor Simon Sinek, que
tem um vídeo muito bom no Youtube e escreve livros, blá blá blá... aí, as
empresas contratam esses caras para falar do seu propósito. Meu filho,
tem uma porra de uma síntese confusa... você vai tocar um dia no seu pro-
pósito, vai ter uma comichão no peito e depois some essa porra... a síntese
confusa volta a tomar da sua vida porque você não fez o dever de casa,
não depurou o básico, back to basics (voltar ao início). Você vai escrever
todo dia e mapear as bostas que faz. Ao mesmo tempo, você trabalha, fica
forte e não enche o saco.

Eu não estou simplificando assim: “Ai, Italo, você é uma camisa de força,
isso não serve para todo mundo”. Meu filho, isso não é nada de específico
para sua vida. Estou falando algo que é para todo mundo. O ser humano
tem que fazer o que estou dizendo. É o básico, o chão no qual pisamos.
Depois, cada um desenvolve sua história, sua vida particular. Então, meus
amados, vocês devem se comprometer. É uma coisa que não posso fazer
por vocês.

Olha, de 99,9% das pessoas que estão aqui – 7.000 pessoas hoje –, se isso
entrar no ouvido de vinte pessoas, já está bom – assistir a Live de novo,

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pegar a porra do caderno e se mapear. Você mata isso de find your why,
de propósito – algo que não é possível saber – e isso frustra. O cara vai lá,
vende uma porra de uma palestra, um monte de livros, você faz workshop,
sai de lá animado, dois meses passam e você já esqueceu. É claro! Quem
descobriu o propósito? Essa coisa é a síntese confusa, uma confusão do
cacete no seu peito. Ninguém descobriu o propósito. Aquilo é só uma exci-
tação... vai passar... assim como a excitação sexual e a fome, por exemplo.
Depois, vai embora. Aquilo não fica. Isso até o dia em que você for alguém
consistente, quando essa síntese confusa virar pequenas sínteses espe-
cíficas (preguiça, avareza, inveja, soberba) – você passa a saber em qual
lugar elas batem. Você passa a se conhecer e entender onde aparecem
essas bostas todas. Você tem um chão firme no qual começa a caminhar.
Eu poderia falar sobre essas coisas bonitas – propósito, find your why, gol-
den circle –, mas realmente não funcionam. O que falamos é que funciona!

Você deve fazer o exame toda noite, durante três minutos – ninguém
aguenta por vinte minutos. “Mas, Italo, isso não dá conta de ver”... eu sei!
Se você começar a puxar demais, vai ver que não é para se aguentar mes-
mo. Você é uma bosta mil vezes maior do que acha que é. Então, durante
três minutos está bom. Deixa para o dia seguinte o resto... e vai empur-
rando essa porra... ao longo de dois anos, você varreu tudo. Temos que,
de fato, sentar nesse lugar aqui, senão seremos essa síntese confusa para
sempre.

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Live #54 | 24/04/2019 - Instagram

LIVRE-SE DO DILEMA
EGOÍSMO X ALTRUÍSMO

Nestes anos de prática clínica no consultório, eu pude perceber em algu-


mas pessoas um pensamento (bem comum, na verdade) mais escrupulo-
so, uma certa dúvida que paralisa muita gente, sobre se estar agindo de
modo egoísta ou altruísta.

Peguemos o bom e velho exemplo do mendigo. Às vezes acontece de a


pessoa vir me falar “Eu não sei se darei esmola para mendigo, pois até
acho que os estou beneficiando, mas, no final das contas, eu é que estou
melhorando. Portanto, dar esmola seria uma atitude egoísta, logo, eu não
deveria fazê-la, pois estaria alimentando meu egoísmo”.

Ou então a pessoa fala: “Não sei se darei um presente para o fulano, por-
que gosto tanto de dar presentes que fico mais feliz que o presenteado.
Acabo achando o ato meio egoísta, meio vazio, desprovido de sentido,
sem muita razão de ser, porque eu é quem me beneficio”.

Todos esses exemplos demonstram um daqueles falsos problemas da fi-


losofia: “O que nos rege é o egoísmo ou o altruísmo”?. A pessoa quer me-
lhorar e progredir, até ouve as coisas que falamos aqui, mas pensa “Tenho
que deixar de ser egoísta. Serei altruísta!” e, na primeira vez em que nota
que agiu de modo egoísta, ela paralisa diante da vida (justamente por não
querer se tornar egoísta e odiosa).

Este é um assunto vastamente discutido na psicologia, não é trivial, então


tomemos cuidado. Há uma grande cadeia de pensadores falando sobre
esses “egoísmo ético” ou “altruísmo ético”. A discussão é longa, e alguns
representantes que levam a dianteira propõem coisas que às vezes até
fazem sentido em um certo contexto.

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A Ayn Rand, por exemplo, em seu livro “A Virtude do Egoísmo”, fala algo
do gênero: ela acredita que tudo seria melhor se todos fossem egoístas,
pois você se beneficiaria e acabaria melhorando o todo das relações. A
verdade é que às vezes vai funcionar assim, às vezes não vai. Quem me
parece que matou a charada foi um sujeito que disse o seguinte: “Todas
as ações humanas são ego-altruístas”. Isso dá uma calma fenomenal para
todos nós, porque é verdade, mesmo. Se você for investigar a natureza dos
seus movimentos e ações, notará que todos eles, quase sem exceção, têm
um componente de altruísmo e um de egoísmo. É quase sempre assim.
(Claro que não estou falando do sujeito muito perverso, que faz tudo por
egoísmo. Não estou conversando com ele, ele não me interessa e não es-
tará aqui assistindo a nossa live a não ser que seja para bagunçar, encher
o saco e fazer comentários idiotas.)

Como nós, o sujeito normal quer ser bom. Como nós, às vezes ele é mal,
tenta fazer o bem, mas erra; está comprometido com a vida, mas dá uma
escorregada… Esse sujeito, o homem comum, nós, temos quase todas as
ações ego-altruístas. Elas têm um componente de egoísmo e um de altru-
ísmo, é quase sempre assim e não há problema nenhum nisso, é a simples
realidade da vida.

Voltemos ao exemplo de antes. Você deu esmola para o mendigo. Você


tirou algo do seu bolso e deu para ele, doeu, mas, ao mesmo tempo, você
se sentiu bem porque fez algo bom, ficou feliz porque o sujeito ganhou o
dinheiro. Qual é o problema nisso?

“Italo, por que motivo você gasta suas horas em lives diárias? Não é pos-
sível que seja só por altruísmo, não acredito nisso. Você também ganha
dinheiro e fica famoso”. Meu filho, mas é claro! Toda ação no mundo é
assim, caramba! Toda ação sempre é ego-altruísta.

“Ah, eu acordei de madrugada para limpar a bunda do meu filho que es-
tava chorando. Fiz isso por egoísmo ou altruísmo?’ Meu filho, foi por ego-
-altruísmo. Se você colocar as coisas nesses termos, não paralisará mais

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diante da vida. A porcaria da retidão de intenção, que é um dos grandes
fetiches do homem religioso e moral, não existe. A retidão de intenção cris-
talina não existe neste mundo. Você sempre terá dúvida sobre o motivo
pelo qual você está fazendo algo.

Você vai limpar a bunda do seu filho em parte porque está se doando por
ele, e em parte porque é bom ver seu filho limpo, você fica feliz, ele não
fica assado, não te dará trabalho no dia seguinte. Aí você fica na dúvida
“Ai, meu Deus, mas por que estou limpando a bunda do meu filho à noite?
É porque sou egoísta ou altruísta?” Meu filho, você é ser humano e está
neste mundo. Cocô de criança é sempre confuso, caramba, não fique cho-
cado com isso!

Preste atenção: nunca, neste mundo, você alcançará a retidão de intenção.


Ponto. E não há problema algum, esta é a vida humana, caramba, é sempre
assim! Você não é santo, não é um anjo, não é Deus, então é tudo sempre
misturado. Espiritozinhos escrupulosos, saibam disso, ok?

O que você fará é: deslocar o problema para o mundo objetivo e limpar a


bunda do seu filho, porque ela tem de ser limpa, sem ficar se perguntando:
“Eu fiz isso por egoísmo ou altruísmo?”. Você fez porque tinha de fazer! Há
uma bunda suja na sua frente. De quem é o filho, meu ou seu? É seu, então
você limpa! E se o filho for meu, eu limpo!

Do mesmo modo, há um mendigo na sua frente morto de fome, você dará


dinheiro a ele “por egoísmo”, ou “por altruísmo”? Não interessa! Você dará
dinheiro a ele porque ele está com fome! Não por egoísmo, nem por altru-
ísmo, meu santinho, mas porque o sujeito é mendigo! Não adianta querer
“ensinar a pescar”, seu filho da mãe, ele não aprende, ele é mendigo, é ou-
tra coisa, e está com fome! Se você não der comida a ele, ele fica sem ter
o que comer, caramba. Alguma alma terá de ajudar aquele mendigo, pois
isso é o que ele é!

“Sou egoísta ou altruísta?” Pare de se perguntar essa porcaria, você já sabe

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a resposta. Você é egoísta e altruísta, é sempre assim em qualquer ser hu-
mano normal. Você fará o que quer que seja porque tem de ser feito. Vol-
tamos ao princípio, ao que sempre falamos: “Por quê? Porque você tem de
cumprir seu dever”. É sempre isso. Pare de ficar se perguntando bobeira.

O sujeito que está sempre olhando para o próprio umbigo é maximamen-


te desinteressante. É um saco conviver com esse tipo de cara, e não só
para os outros, mas para ele, também. Veja que coisa estúpida: se você
começa a se colocar no centro de tudo, você agirá (ou deixará de agir) ba-
seado em uma percepção terrivelmente confusa do motivo pelo qual você
age — dado que o motivo não deve ser essa percepção louca de altruísmo
ou egoísmo.

Você deve agir porque o mundo está te chamando à ação, porque você
precisa agir, porque não há outra pessoa para agir, porque, ora bolas, o su-
jeito precisa. Você simplesmente age e não se pergunta esse tipo de coisa.

“Ah, mas estou agindo por egoísmo ou altruísmo?” Eu já disse a respos-


ta: pelos dois motivos. Simples assim! Não há outro movimento possível.
Qualquer pessoa que tenha de fato estudado as linhas sobre egoísmo vs.
altruísmo na ação humana, sobre éticas egoístas vs. altruístas, ou seja,
qualquer sujeito minimamente centrado na realidade, sabe que a respos-
ta é essa.

Acontece que os “acadêmicos” das universidades, de Stanford, da USP, fi-


cam “estudando” em uma masturbação mental sem fim, e nunca se sen-
tam em uma porcaria de um consultório para olhar um paciente, ou para
olhar um amigo no bar, ou para olhar para a própria vida, então eles ficam
sem entender que ela é a articulação entre as duas coisas.

É o mesmo problema da pergunta: Cristo no alto da cruz fez aquilo tudo


por egoísmo ou altruísmo? Uns dirão “Por egoísmo”, pois fazendo isso
tudo, Ele ganhou o império do mundo e menções honrosas pelo resto
da eternidade histórica. Outros dirão “Foi totalmente por altruísmo, pois

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Ele estava se doando para o gênero humano.” É tão idiota essa pergunta!
Foi pela articulação entre as duas coisas, caramba. Ele fez porque tinha
um bando de pecadores condenados ao inferno e fez também para nos
salvar. Fez porque tinha que fazer. Não foi egoísmo nem altruísmo, Ele fez
porque só Ele podia fazer, então foi lá e fez. Com a gente é a mesma coisa.

Esse suposto dilema é peido mental, é a cortina de fumaça que o ninja


joga para camuflar suas ações, para você não conseguir agir. É pegadinha
de Filosofia. Pare com isso. Eu vejo um monte de gente paralisando na sua
auto análise quando percebe o primeiro ato egoísta. Minha filha, você não
é perfeita, você nunca é perfeita, então ficará nessa até o fim da vida, até o
último segundo! Nunca paralise a sua ação. Quando você faz isso porque
está pensando em termos de “egoísmo vs. altruísmo”, você recuou para o
domínio da falácia, para o domínio de uma investigação absolutamente
conceitual que não te orientará em nada na vida.

Escrupulosos do meu coração, e também vocês que se acham perfeitinhos


e bradam “Eu sou muito altruísta!”: parem de bobeira! Você não é altruísta
nem egoísta, mas uma articulação entre os dois. Pare de pensar sobre isso,
é atraso de vida, não te deixa agir. Olhemos para o mundo concreto, para a
necessidade do outro, para aquilo que está na nossa frente, e cumpramos
o nosso dever sorrindo, sem reclamar, pois é o que temos que fazer. Essa
pergunta nunca levou ninguém a lugar nenhum e, pelo contrário, só gera
neurose e paralisia na cabeça dos outros.

Há uma série de autores que poderíamos citar para embasar isso tudo,
alguns mais difíceis, outros mais acessíveis. Parece-me que o Robert Spen-
cer é quem matou a charada quando falou que tudo ego-altruísta, que é a
mesma coisa, vem tudo junto. Pare, analise-se e veja se não é assim na sua
vida. Desde fritar um bife até se sacrificar por alguém; você sempre terá
essa dúvida, e tanto faz a resposta. Aja diante do seu dever de estado (que
é um outro conceito-chave). O tema de hoje é mesmo fundamental, pois
limpa a confusão na cabeça de um monte de gente.

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