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Departamento de Línguas

9º Ano | Português
Ficha informativa | maio | Ano Letivo 2019/2020

Despedidas em Belém – Canto IV


Síntese
Depois de relembrar a História de Portugal, Vasco da Gama narra ao rei de Melinde a partida da armada
para a viagem de descoberta do caminho marítimo para a Índia, em analepse.
Começa por contar que os navegadores foram remunerados por D. Manuel I e incentivados com palavras
de ânimo.
No porto de Lisboa, prepararam-se as naus para a viagem, encontrando-se os marinheiros e os soldados
muito entusiasmados e sem medos. Depois destes preparativos, aprontaram-se também espiritualmente, pedindo a
Deus orientação e apoio para a viagem.
Vasco da Gama refere que quando recorda o momento da partida, cheio de dúvida e receio, tem dificuldade
em conter as lágrimas.
Naquele dia, o povo da cidade de Lisboa aglomerou-se na praia de Belém para assistir à partida das naus e
para se despedir dos amigos e parentes que iriam embarcar.
Acreditava-se que a viagem seria longa e perigosa de forma que o povo considerava a possibilidade dos
navegadores jamais voltarem. Os homens não conseguiam esconder a emoção (“com suspiros”) e as mulheres
choravam com desespero de não os voltar a ver.
Estrutura do episódio
1. Os que partem
- Referência ao estímulo dado pelo rei aos marinheiros (83)
- Vasco da Gama refere o entusiasmo de marinheiros e soldados em o acompanhar (84-85)
- Orações de despedida (86-87)

2. Os que ficam
- A gente da cidade deixa transparecer saudade e tristeza (88)
- Os mais chegados revelam a sua tristeza: os homens com “suspiros”; as mulheres, as mães, as esposas e
as irmãs “cum choro piadoso”(89)

Análise do episódio

Este episódio de Os Lusíadas corresponde ao momento da partida dos marinheiros da praia do Restelo e
da despedida dos seus familiares e amigos - início da viagem de Vasco da Gama à Índia.
O episódio está incluído apenas no canto IV. Seguindo o modelo das epopeias greco-latinas, a narração
não começa no princípio da acção (a partida das naus de Lisboa e início da viagem), mas já a meio da acção ( in
media res): “Já no largo Oceano navegavam (Canto I, est. 19).

O episódio pode ser dividido em 3 partes:


Introdução – est. 83-86
Feita a referência a D. Manuel I, que pagou aos marinheiros e encorajou-os com palavras de louvor, e
localizada a acção no espaço e no tempo, observamos o alvoroço geral dos últimos preparativos para o embarque
da “gente marítima e a de Marte” (marinheiros e soldados). Prontas as naus, os nautas reúnem-se em oração na
ermida de Nossa Senhora de Belém.

Desenvolvimento – est. 87-92

1
Descreve-se a “procissão solene” do Gama e seus companheiros desde o “santo templo” (ermida) até aos
batéis, pelo meio da “gente da cidade”, homens e mulheres, velhos e meninos, com relevo especial para as mães e
esposas.
Tanto os que partiam como os que ficavam se entristeciam e a despedida assume grande emotividade.
“Porque me deixas, mísera e mesquinha?
“Porque de mi te vas, ó filho caro”

Conclusão – est. 93
Refere-se ao embarque que, por vontade de Vasco da Gama, se fez sem as despedidas habituais para
diminuir o sofrimento, tanto dos que partiam como dos que ficavam.

Análise estrofe a estrofe


Estrofes 83 a 87: os que partem
Estrofe 83
A estrofe começa com a referência a D. Manuel I, «Emanuel», o qual elogia e anima os argonautas
(soldados e marinheiros) por fazerem parte da armada e por se aventurarem nesta expedição marítima.
Estrofe 84
O primeiro verso situa no espaço a ação, «ínclita Ulissea», ou seja, Lisboa, em Belém. O ambiente é de
alvoroço e as naus estão prontas para partir. A «gente marítima e a de Marte», marinheiros e soldados, estão
entusiasmados e determinados. O narrador, Vasco da Gama, não duvida que os seus homens o seguirão para toda
a parte.
Estrofe 85
A agitação dos homens na praia contrasta com a calma da natureza. Os soldados de várias cores e os
homens de várias artes movimentam-se pela praia, ansiosos com a partida em busca de “novos mundos”; no mar,
os «ventos sossegados» ondeiam os estandartes das «fortes naus».
Estrofes 86 e 87
Preparadas as naus, é tempo de preparar as almas para a partida. A morte não deixa de preocupar os
homens e, por esse motivo, convém pedir/implorar proteção e ajuda do «sumo Poder», ou seja, de Deus. Para isso,
os que partem ouvem missa e comungam, «aparelhámos a alma pera a morte». Depois seguem em procissão
desde a Ermida de Nossa Senhora de Belém até à praia. O momento é solene, as dúvidas e os receios invadem os
corações daqueles que partem, as lágrimas tornam-se difíceis de conter.

Estrofes 88 a 92: os que ficam


 Estrofe 88
A população mobiliza-se para ver partir a armada: há aqueles que ali estão por causa dos amigos e/ou
parentes; outros, para «ver somente», isto é, por curiosidade. Todos evidenciam saudade dos que ainda não
partiram ou tristeza. Na procissão seguem não só os soldados e marinheiros, como também os religiosos. Todos
rezam.
 Estrofe 89

2
No primeiro verso, há a indicação de um «tão longo caminho». Na verdade, remete-nos não para a
distância, mas para o sofrimento de todos nesta difícil despedida e partida. As mulheres choram compulsivamente,
os homens desesperam entre suspiros. O desespero apodera-se das mães, esposas e irmãs que, por Amor, temem
não voltar a ver os homens.

 Estrofe 90
O desespero é tanto que uma mãe interpela (discurso direto) o seu filho, «Ó filho», tentando dissuadi-lo de
partir. Pergunta-lhe como a pode deixar tão chorosa e em sofrimento, ele que era o seu amparo na sua velhice.
Pergunta-lhe ainda como pode partir para a morte, «onde sejas de pexes mantimento». A mãe não acredita no
sucesso da viagem e crê que o seu filho, ainda vivo, já está condenado à morte.
Estrofe 91
O desespero também leva uma mulher a dirigir-se (discurso direto) ao seu «doce e amado esposo». De
acordo com o que ela sente, contraditoriamente ao suposto, é precisamente o Amor (esse cruel sentimento) que os
impede de estarem juntos. Pergunta ao seu esposo o que o leva a aventurar-se no mar perigoso, por um caminho
incerto, deixando-a na tristeza.
 Estrofe 92
Outros intervêm e apelam para que os soldados e marinheiros não partam, seguindo-os até ao mar. O
ambiente é de profunda emoção e claro desespero e isso reflete-se na Natureza: os montes quase respondiam,
comovidos pelo sofrimento humano. Na praia, a «branca área» é banhada pelas lágrimas da multidão. Esta
hipérbole pretende transmitir a dimensão do sofrimento que parece incomensurável.

Estrofe 93: a partida


Os homens que partem procuram manter os olhos no chão, para assim suportar melhor o sofrimento e não
encarar o desespero das mulheres (mãe, esposa). Para evitar maior sofrimento e poupar os homens de maior
desespero e angústia, Vasco da Gama determina que todos embarquem sem as habituais despedidas.

Conclusão
Neste episódio predomina o tom lírico e não o épico.
É a linguagem emotiva que domina o registo da narração, ou seja, os sentimentos familiares e humanos,
em todos os seus sonhos e temores. Não temos a narração de grandes feitos, como a superação de obstáculos ou
descobertas.
Este episódio permite conferir aos portugueses a sua verdadeira dimensão humana, valorizando todos os
feitos alcançados ao longo da história: por um lado, são capazes de grandes aventuras, coragem e determinação;
por outro lado, são suscetíveis ao sofrimento e dor humanos.
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