Entre os inúmeros movimentos inovadores, surgidos nas primeiras décadas do século
XX, e que contribuíram decisivamente para a constituição da chamada modernidade artística, devemos destacar:
FUTURISMO
A história do Futurismo é também a de seu líder, o italiano Marinetti (1867-1944).
Desde o primeiro manifesto futurista, publicado em Paris, 1909, passando pelo grande número de manifestos da década de 10, até a adesão de Marinetti ao Fascismo no início dos anos 20, percebe-se o movimento centrado numa figura, ao mesmo tempo líder teórico e prático, divulgador e defensor da nova estética. Marinetti assume os aspectos positivos e negativos de suas proposições e leva-as até o fim. O fim natural é o Fascismo. Glorificando a audácia, o amor ao perigo, a energia, a guerra, a tecnologia, as luzes feéricas das cidades, o cinematógrafo, a velocidade dos automóveis, das locomotivas e dos aeroplanos, o Futurismo exalta a imagem de um novo mundo, dominado por homens superiores. Homens-máquinas que desprezam o passado com seus acervos inúteis: Nós queremos demolir os museus, as bibliotecas, combater o moralismo, o feminismo e todas as covardias oportunistas e utilitárias. Que exigem da literatura o imprevisto e a revolta: Nós queremos cantar o amor ao perigo, o hábito à energia e à temeridade. Tendo a literatura até aqui enaltecido a imobilidade pensativa, o êxtase e o sono, nós queremos exaltar o movimento agressivo, a insónia febril, o passo ginástico, o salto mortal, a bofetada e o soco. Nós declaramos que o esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova: a beleza da velocidade. Um automóvel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de fôlego explosivo... um automóvel rugidor, que parece correr sobre a metralha, é mais belo que a Vitória de Samotrácia. Homens que celebram o carácter "higiénico" das guerras até porque o primeiro manifesto futurista é anterior à catástrofe de 1914: Nós queremos glorificar a guerra – única higiene do mundo – o militarismo, o patriotismo, o gesto destruidor dos anarquistas e as belas ideias que matam. Esta proposta anárquica de destruição do passado e de construção de uma nova ordem, centrada nos avanços tecnológicos, tem sua correspondência na ideia de uma grande revolução na linguagem. Especialmente na linguagem literária. E é enquanto projecto estético renovador - e não enquanto ideologia - que o Futurismo torna-se importante. Seu criador e os futuros seguidores arrasarão com a velha retórica, com o discurso literário tradicional, fascinados pela aventura de uma linguagem jovem e contestadora das convenções.
Em 1912, Marinetti lança o Manifesto técnico da literatura futurista:
É preciso destruir a sintaxe, dispondo os substantivos ao acaso, como nascem. Deve-se usar o verbo no infinito (...) Deve-se abolir o adjetivo para que o substantivo desnudo conserve a sua cor essencial. O adjetivo é incompatível com nossa visão dinâmica uma vez que supõe uma parada, uma meditação. Deve-se abolir o advérbio (...) Cada substantivo deve ter o seu duplo. Exemplo: homem-torpedeiro, mulher-golfo, multidão-ressaca, praça-funil
Abolir também a pontuação (...)
A poesia deve ser uma sequência ininterrupta de imagens novas (...) Destruir na literatura o "eu" Façamos corajosamente o "feio" em literatura e matemos de qualquer maneira a solenidade. Além disso, o criador do Futurismo vai defender o emprego de símbolos matemáticos no texto e também o uso da impressão tipográfica, até então neutra, para obter efeitos especiais: páginas impressas em linhas verticais, circulares e oblíquas, multiplicidade de tipos, cores, etc. Pode-se afirmar que o movimento futurista impulsiona decisivamente toda a arte de vanguarda, tanto a europeia como a não-europeia. No Brasil, ele é o principal estímulo artístico e intelectual para os jovens renovadores de São Paulo, a tal ponto que os mesmos são conhecidos -durante os primeiros anos da década de 20 - como "futuristas" mais do que como "modernistas". Um exemplo de texto formalmente vinculado ao Futurismo, é este poema de Maiakovski, Balalaica, na espectacular tradução (recriação) de Augusto de Campos. Além das inovações formais, ressalte-se o carácter revolucionário da balalaica – instrumento popular russo - que impugna o baile de gala, símbolo da decrépita aristocracia do país: (como um balido abala a balada do baile de gala) com um balido abala abala (com balido) (a gala do baile) louca a bala laica* * laica: leiga, no sentido de popular.