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A S VA N G U A R DA S E U R O P E I A S

O ALVORECER DA MODERNIDADE
Século vinte. Um estouro
nos aprendimentos.

Oswald de Andrade
1. O ADVENTO
DA S
VA N G U A R DA S
• O termo vanguarda é de origem militar, vem da língua francesa e refere-
se a avant-garde, que significa “marchar na frente”. Refere-se, deste
modo, à parte de um exército situado à frente do corpo principal, à frente
das tropas.

• Acepção artística do termo = usado para qualificar um grupo de artistas


cujas obras e intervenções se distinguem pelo seu aspecto experimental,
inovador e transgressor.

Os vanguardistas estavam dispostos a lutar agressivamente em prol da


renovação e da transformação.
1.1 ERA DOS EXTREMOS: O SÉCULO XX
• Apesar de algumas tendências consideradas vanguardistas aflorarem já no
fim do século XIX, é com o século XX e com o contexto considerado
moderno que essas manifestações tornam-se sistemáticas e sistêmicas;
• Momento crítico = o mundo ocidental imerso em uma grave crise –
período que abarca os eventos geradores da primeira (1914-1918) e
segunda (1939-1945) guerras mundiais.

• Os movimentos vanguardistas são a resposta-produto artístico-cultural de


um tempo de grande contestação e inquietação.
• A maioria das tendências tem em comum o ímpeto de questionar o
legado cultural herdado = nega-se o padrão de “beleza” estabelecido;
“arte envelhecida e cristalizada”.

• “Mais do que simples tendência, a vanguarda representa a mudança de


crenças experimentadas no pensamento e na arte do mundo ocidental,
desde o início deste século (XX). Toda vanguarda sempre se caracteriza
pela sua agressividade, manifestada no antilogismo, no culto a valores
estranhos (...) os poderes mágicos, a beleza da anarquia, o
instantaneísmo, o dinamismo, a imaginação sem fio.” (TELES, Gilberto M.
)
“Entende-se, com este termo – vanguarda -, um
movimento que investe um interesse ideológico na arte,
preparando e anunciando deliberadamente uma
subversão radical da cultura e até dos costumes sociais,
negando em bloco todo o passado e substituindo a
pesquisa metódica por uma ousada experimentação na
ordem estilística e técnica”
(Giuliuo Carlo Argan)
2. AS CORRENTES DE
VANGUARDA

• Dentro das vanguardas européias estão os diversos “-


ismos”: Futurismo, Expressionismo, Cubismo, Dadaísmo
e Surrealismo.
• As vanguardas caracterizavam-se pela publicação
inicialmente de manifestos que foram publicados no
período de 1909 à 1924.
A. FUTURISMO
(1909)

Giro dentro das hélices de todos os


navios.
Eia! eia-hô eia!
Eia! sou o calor mecânico e a
eletricidade!

Álvaro de Campos
• Primeiro movimento de vanguarda depois do impressionismo. Inicia-se no
século XX com a publicação de um manifesto em 20 de fevereiro de 1909
por Filippo Tomaso Marinetti.

⮚ Proposta:
• Olhar para o futuro e desprezar o passado. Nada feito antes é levado em
consideração.
• Valorização da vida moderna, da máquina, da eletricidade e da velocidade.
• Linguagem excessiva, agressiva e violenta, com intuito provocatório.
Publicação do
manifesto
«Fundação e
Manifesto do
Futurismo», na
primeira página
do jornal Le
Figaro, a 20 de
fevereiro de
1909, da autoria
de Marinetti.
1. Nós queremos cantar o amor ao perigo, o hábito da energia e da
P RO P O S TA S temeridade.
2. A coragem, a audácia e a rebelião serão elementos essenciais da nossa
poesia.
3. Até hoje a literatura tem exaltado a imobilidade pensativa, o êxtase e o
sono. Queremos exaltar o movimento agressivo, a insónia febril, a
velocidade, o salto mortal, a bofetada e o murro.
4. Afirmamos que a magnificência do mundo se enriqueceu de uma beleza
nova: a beleza da velocidade. Um carro de corrida adornado de grossos
tubos semelhantes a serpentes de hálito explosivo... um automóvel rugidor,
que parece correr sobre a metralha, é mais belo que a Vitória de Samotrácia.
5. Queremos celebrar o homem que segura o volante, cuja haste ideal
atravessa a Terra, lançada a toda velocidade no circuito de sua própria órbita.
6. O poeta deve prodigalizar-se com ardor, fausto e munificência, a fim de
aumentar o entusiástico fervor dos elementos primordiais.
7. Já não há beleza senão na luta. Nenhuma obra que não tenha um carácter agressivo pode ser uma obra-
prima. A poesia deve ser concebida como um violento assalto contra as forças ignotas para obrigá-las a
prostrar-se ante o homem.

8. Nós estamos no promontório extremo dos séculos!... Por que haveríamos de olhar para trás, se queremos
arrombar as misteriosas portas do Impossível? O Tempo e o Espaço morreram ontem. Nós já estamos
vivendo no absoluto, pois já criamos a eterna velocidade onipresente.

9. Nós queremos glorificar a guerra - única higiene do mundo - o militarismo, o patriotismo, o gesto
destruidor dos libertários, as belas idéias pelas quais se morre e o desprezo pela mulher.

10. Nós queremos destruir os museus, as bibliotecas, as academia de toda natureza, e combater o
moralismo, o feminismo e toda vileza oportunista e utilitária.

11. Nós cantaremos as grandes multidões agitadas pelo trabalho, pelo prazer ou pela sublevação;
cantaremos as marés multicores e polifônicas das revoluções nas capitais modernas;
Umberto Boccioni, A cidade se levanta, 1910.
B.
O CUBISMO
(1912)
• Surge em Paris, nasce das experiências artísticas de Pablo Picasso e de Georges
Braque.
• Inicialmente, detém-se às pinturas através da valorização de formas
geométricas. A colagem será outra técnica introduzida pelos cubistas. Além
disso, a pintura cubista propõe o rompimento com real (foto) e a linearidade
da arte renascentista.
• Proposta: Olha-se para um cubo e compreende-se a totalidade do objeto. “O
trabalho do artista não é cópia nem ilustração do mundo real, mas um
acréscimo novo e autônomo”(Picasso).
• Historicamente, o cubismo originou-se na obra de Cézanne, pois para
ele a pintura deveria tratar as formas da natureza como se fossem
cones, esferas e cilindros. Entretanto, os cubistas foram mais longe do
que Cézanne. Passaram a representar os objetos com todas as suas
partes num mesmo plano.

• Literariamente, o cubismo tem sua primeira experiência literária através do


manifesto de Apollinaire em 1912. A literatura cubista manifesta uma
preocupação em se aproximara das outras artes plásticas. Ainda valoriza a
construção do texto e os espaços em branco e preto da folha de papel.
Defendia-se as “palavras em liberdade”, “a invenção de palavras” e a
“destruição das sintaxes condenadas pelo uso”.
Paul Cézanne:

"Natureza-morta
com maçãs e
laranjas",
1895-1900.
Museu d'Orsay
Les Demoiselles d’Avigno (1907) –
de Pablo Picasso
Mulher Chorando (1937) - Picasso
Pablo Picasso (1881-1973).Guernica, 1937. Óleo sobre

tela, 349,3 x 776,6 cm. Museu Nacional Centro de Arte Rainha Sofia, Madri, Espanha.
Georges
Braque, 1909
(September), Vi
olin and
Palette (Violon
et palette, Dans
l'atelier), oil on
canvas, 91.7 x
42.8
cm, Solomon R.
Guggenheim
Museu

2. 1909, Port en
Normandie (Litt
le Harbor in
Normandy),
81.1 x 80.5 cm,
The Art
Institute of
Chicago
Poema “A pomba apunhalada e jato d’água” – de
Apollinaire
C. O DADAÍSMO (1916)
• Surge durante a Primeira Guerra Mundial quando ainda acreditava-se na
vitória Alemã. Surge durante o movimento de instabilidade do período da
Guerra. O manifesto é idealizado por Tristan Tzara : Manifesto Dadá.

• Proposta: é um movimento de retorno à infância – dadá. Eles querem a


inocência primitiva. Propõe a valorização do nada. É o mais radical dos
movimentos de vanguarda.

• Na literatura, a arte é caracterizada pela agressividade, improvisação,


desordem e rejeicão de qualquer tipo de racionalização. Valorizou-se
também a livre associação de palavra e a construção de palavras explorando
apenas o significante – a poesia puramente fonética.
Receita de poema dadaísta

Pegue um jornal.
Pegue a tesoura.
Escolha no jornal um artigo do tamanho que você deseja dar a seu poema.
Recorte o artigo.
Recorte em seguida com atenção algumas palavras que formam esse artigo e meta-
as num saco.
Agite suavemente.
Tire em seguida cada pedaço um após o outro.
Copie conscienciosamente na ordem em que elas são tiradas do saco.
O poema se parecerá com você.
E ei-lo um escritor infinitamente original e de uma sensibilidade graciosa, ainda que
incompreendido do público.

TZARA, Tristan. In: TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda europeia e modernismo


brasileiro. 9. ed. Petrópolis: Vozes, 1986. p. 132. (Fragmento).
Marcel Duchamp (1887-1968). A fonte,
1964 (réplica executada sob a direção
de Duchamp depois que o original de
1917 foi perdido), ready made. Museu
Nacional de Arte Moderna, Centro
Georges Pompidou, Paris, França.
O elefante Celebes (1921) –
Max Ernst
D. O EXPRESSIONISMO (1918)
• Surge, na Alemanha, concomitante ao Futurismo, mas só tem o seu manifesto
publicado em 1918. O expressionismo não foi um movimento homogêneo,
coexistindo vários pólos artísticos com uma grande diversidade estilística, como a
corrente modernista, cubista, futurista, surrealista ou a abstrata.
• Proposta: Constitui o movimento de DENTRO para fora. O que importa é a
associação que o pintor faz em seu interior, o objeto não precisa estar presente.
A única realidade é a expressão, ou seja, as imagens nascidas em nosso mundo
interior, o belo e o feio não importam.

• Idéias trazidas pelo manifesto: Ironiza o Real/Naturalismo – o indivíduo estrutura


os fatos, não os descreve; Defende o fim das adiposidades da linguagem – poesia
sem adjetivo, substantivada; Globalização do movimento – nem Alemão ou
Francês; e defende a ideia de que a salvação da humanidade estaria no mundo
"Assim o universo total do artista expressionista torna-se visão. Ele não
vê, mas percebe. Ele não descreve, acumula vivências. Ele não reproduz,
ele estrutura. Ele não colhe, ele procura. Agora não existe mais a cadeia
de fatos: fábricas, casas, doenças, prostitutas, gritaria e fome. Agora
existe a visão disso. Os fatos tem significado somente até o ponto em
que a mão do artista o atravessa para agarrar o que se encontra além
deles. Esse tipo de expressão não é alemão nem francês. Ele é supre
nacional. Ele não é somente assunto da arte. É exigência do espírito. Não
é um programa de estilo. É uma exigência da alma. Uma coisa da
humanidade."

(EDSCHMID, Kasimir. In: TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda europeia e


modernismo brasileiro. 9. ed. Petrópolis: Vozes, 1986. p.111.).
O grito. 1893.
Nasjonalgalleriet, Oslo
Os grandes cavalos azuis (1911), de Franz Marc (1911), de Franz Marc, Walker Art
Center, Minneapolis.
METRÓPOLIS (1927) – Fritz Lang

Primeiro grande filme de ficção científica do cinema e


marco do expressionismo alemão, ainda impressiona
pelo clima sombrio e pelo visual futurista criado pelo
grande mestre da cinematografia da época Karl
Freund e Gunther Rittan.

Visualmente, o filme é um dos marcos da história da


sétima arte, não só pelos seus efeitos revolucionários
para a época, mas principalmente pela sua visão do
futuro, onde é possível identificar um design
moderno e altamente tecnológico, destacando-se o
trabalho da escola Bauhaus.

(https://assimerahollywood.wordpress.com/2012/05
/22/ciclo-o-expressionismo-alemao-metropolis-parte-
1/)
E. SURREALISMO (1924)
• Lançado por André Breton – que rompe com o Dadaísmo- em Paris no ano de
1924. Surge no período entre guerras. Suas origens estão ligadas mais ao
Expressionismo e à sondagem do mundo interior.
• Proposta: Consiste basicamente numa combinação do representativo, do abstrato,
do irreal e do inconsciente.
“Acredito na resolução futura destes condições
aparentemente contraditórias de sonho e realidade
numa espécie de realidade absoluta, se assim se pode dizer: surrealidade.
Após a conquista aspiro a certeza de não alcançá-los, também despreocupado com
minha morte, no entanto, para não pesar pelo menos as alegrias de tal posse.”

– ANDRÉ BRETON : Primeiro Manifesto do Surrealismo (1924)


• De acordo com o manifesto as obras seriam executadas à margem da razão, sem
preocupações estéticas racionalizadas:

• A associação de ideias eram feitas sem a procura de sentido e desencadeada


livremente segundo três técnicas: 1. Escrever ou desenhar em estado semi-hipnotico,
sob a influencia de álcool, da fome, ou da droga que provocariam alucinações;
2. Discursos ditos ou ditados durante o sono ou relatos de sonos; 3. • Junção de
escritas simultâneas de varias pessoas

• O Surrealismo orientou a criatividade de alguns artistas, tornando nítida a visão do


interior do ser humano, especialmente com a estranheza produzida pelos sonhos, tanto
por seu conteúdo quanto pelas relações ilógicas que se estabelecem entre os espaços e
a imprecisão do significado das coisas.

• Seja pela invenção de mundos estranhos, seja por deslocamentos das relações do
mundo real, o Surrealismo põe em xeque a noção de realidade.
A Persistência da
Memória –
Salvador Dalí
(1931)
Golconde by Ren
é Magritte, 1953.
René Magritte,
Madame Récamier
de David, 1950

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