Você está na página 1de 1

Lendo pela primeira vez, sim, o ‘Primeiras estórias’ de Guimarães Rosa, esse conto que me fez 

pensar nos processos de luto e melancolia e já aqui, nesse conflito temporal, na fala linda da 
mãe: “Cê vai, ocê fique, você nunca volte!” e do filho e a não aceitação da separação: “Pai, o 
senhor me leva junto nessa canoa?".  ⁣

⁣ 

Outra passagem me remete a um texto de Freud, Luto e Melancolia, de 1917, onde ele trata dos 
movimentos psíquicos inerentes à perdas, e na melancolia, diz sobre a essa incapacidade e da 
'sombra do objeto que recai sobre o Eu', impedindo uma separação adequada. "E a canoa saiu-se 
indo - a sombra dela por igual (...)comprida longa" contida em um espaço indefinido, difuso “Ele 
não tinha ido a nenhuma parte." estando em “ outra sina de existir, perto e longe da família dele." 
Em um processo de identificação com o outro, sob o olhar dos outros, o protagonista ainda se 
regozija de carregar essas lembranças e aprendizados, remetendo-os sempre ao pai, “ele que 
me ensinou”, mesmo que fosse “mentira por verdade”, na criação de uma ilusão de si, de sua 
própria realidade. E no “devagar depressa dos tempos”, tenta dar razão à morte nessa vida que é 
só demoramento.⁣ 

⁣ 

E então a assunção paulatina da realidade, dolorosa: “A gente teve de se acostumar com aquilo. 
Às penas, com o que a gente mesmo nunca se acostumou, em si, na verdade.”, e uma fixação 
ainda em um tempo passado, que não passa “só com nosso pai me achava: assunto que jogava 
pra trás meus pensamentos.”⁣ 

⁣ 

O não-dito sobre a perda e sua legitimação na citação da imagem do post. Em um movimento de 
não querer esquecer, e querer lembrar. Só se pode lembrar, com saudade, daquilo que pode ser 
esquecido. Diferente dos outros, que se foram e tocaram suas vidas, ele insiste em se manter 
fiel ao pai, ali. Não conseguindo se desapegar dessa imagem, de elaborar o luto e se 
desvencilhar dessa imagem, se vê envelhecido e tendo de confrontar a própria morte. A sua, 
interna. E na terceira margem do rio a imagem desse tempo suspenso, lugar eterno onde 
situamos o mundo. Nem aqui, nem lá, mas local de travessia, passagem, em um estar eterno, 
dentro do curso dos pensamentos, dentro do curso de um rio chamado vida. 

Você também pode gostar