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Iara Beleli

Gênero: e Amor

Experiências, encontros e desencontros 1970-


1990

Mestrado em História Social

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

1999
Iara Beleli

Gênero e amor

Experiências, encontros e desencontros 1970-1990

Dissertação apresentada a Banca


Examinadora da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção
do titulo de mestre em História, sob
orientação da professora doutora
Maria Izilda Santos de Matos.
Resumo

A pesquisa que resultou nesta dissertação esteve centrada na reflexão sobre as


concepções de feminilidade e de masculinidade apresentadas pela documentação,
enfatizando as possíveis mudanças e/ou permanências ocorridas nas relações
amorosas nos últimos 20 anos. A experiência de homens e de mulheres - entre 40 e
50 anos, pertencentes a uma parcela das camadas médias urbanas, que de alguma
forma estiveram influenciados, direta ou indiretamente, pelas discussões levantadas
pelo movimento feminista em meados dos anos 70 no Brasil - abriu um caminho que
tornava possível historicizar, a partir da experiência dos sujeitos, o gênero e a
memória,
Aqueles que continuam vivos em
minha memória
Júlia e Lia
Vavá e Amilcar
Para Marce e Rafa,
iniciantes nos caminhos
do amor
Agradecimentos

Estou "cheia de motivos", como diria Ana Fonseca, para agradecer as pessoas
e instituições que participaram, direta ou indiretamente, neste projeto. UNICAMP,
de onde vim, PUC-SP, para onde fui e CNPq, pelo fundamental auxílio na execução
desta pesquisa.

Algumas das questões problematizadas nesta dissertação tiveram o seu


despertar há muito tempo... "desde que me conheço por gente", mas a primeira
organização das idéias teve lugar no Coletivo Feminista de Campinas, onde comecei
a pensar como o cotidiano das pessoas podia ser político, devo confessar que só
agora me dou conta disso. Agradeço as mulheres que aí encontrei, particularmente
a Ana Fonseca que segue, às vezes persegue, meus passos nos últimos vinte anos.

De lá pra cá [meu pai sempre usava essa expressão quando queria encurtar
uma história], fui encontrando muitas pessoas de diferentes áreas disciplinares,
matizes políticos e formas de pensar... não sei bem como juntá-las, mas está vivo
em minha memória o incentivo de todas/os elas/es.

Eliezer me trouxe de volta a academia e insistia muito que eu tivesse um


projeto próprio... te agradeço a insistência, foram fundamentais a compreensão e o
carinho com que você recebeu, e viabilizou, o projeto que escolhi, ainda que ele
nos tivesse afastado profissionalmente...

Manduca contribuiu com muitas histórias, em. longos e inesquecíveis almoços,


sobre as diferentes masculinidades, te agradeço por isso e pela doce convivência
destes 10 anos.
7

Héctor me instigava com suas percepções filosóficas, e políticas, sobre o


tempo; Suze, foi o primeiro elo da cadeia que me levou a conhecer minha
orientadora. Edu fez um pouco o papel de "advogado do diabo", mas seus
questionamentos sobre a precariedade de tratar, academicamente o "não racional"
me fornecia mais elementos para sedimentar os caminhos da pesquisa. Agradeço
aos amigos que fiz no Núcleo de Estudos Estratégicos da Unicamp que, de alguma
forma, participaram desta incursão - Cavagnari, Jádison e Samuel.

Caetano, meu irmão querido, apoiou-me em momentos de angústia, o que


permitiu-me uma certa tranquilidade, financeira e pessoal, ao longo desses dois
anos e meio. Cae, você foi, e continua sendo, o meu porto seguro.

Cris, minha irmã postiça, aparece de muitas maneiras neste processo. Além da
casa, onde ficava dois dias por semana, e dos comentários sobre as primeiras
incursões na escrita, me inseriu em seu mundo, onde tive a chance de conhecer, e
vivenciar, a movimentada noite paulistana, o que muitas vezes nos levava a ficar
noite adentro em conversas que não se afastavam muito do tema aqui proposto.
Foram instigantes as conversas informais dos almoços das "quintas-feiras", onde
conheci, através de Cris, algumas pessoas que alimentavam questões por mim
propostas, o que permitiu-me entrar numa forma de linguagem que só conhecia
através do "divã" - Rodolfo e Renaté contribuíram com algumas histórias.
8

Maria Tereza, mesmo distante do país, acompanhou via e-mail algumas das
discussões.

Das picantes histórias de Miracema às fabulas de La Fontaine, devo a Marcelo


Ganzarolli uma força, na maioria das vezes, não verbalizada. Kia e Rose também
foram amigas muito presentes. Agradeço a elas e a Lu, uma jovem e promissora
amizade, pelas horas dedicadas a ouvir um monólogo monotemático.

Durante muitos anos tive resistência a continuar os estudos de maneira


formal. A maioria das pessoas com quem me relacionei, nos últimos vinte anos,
sofriam muito ao entrar no processo de elaboração de suas dissertações de
mestrado ou teses de doutorado. Devo confessar que a elaboração desta
dissertação não me causou nenhum sofrimento, ao contrário, tive muito prazer em
realizar este trabalho.

Foi determinante minha aproximação ao Núcleo de Estudos de Gênero - Pago,


da Unicamp. São especiais as pessoas que encontrei nesta instituição, tanto pelo
que escrevem, o que é público, como pela forma com que receberam alguém que
iniciava uma caminhada. Poucos foram os lugares por onde passei, e foram muitos,
onde as pessoas são respeitadas pelas idéias, mesmo que estas não venham
acompanhadas de títulos acadêmicos.

"Títulos" são de extrema importância, tanto que cá estou eu em busca de


um..., mas "o mundo muda por idéias", me ensinaram Amilcar e Lia. Tento passar
isso aos meus filhos - Marcelo e Rafael - e os agradeço o
9

incentivo, mesmo que soubessem que isso significava estar ausente em alguns
momentos muito especiais da vida deles.

Deixei para o final, talvez porque não consiga, de fato, expressar os


sentimentos em relação a algumas pessoas que participaram diretamente da
elaboração, do acompanhamento e da finalização deste projeto.

Agradeço imensamente as pessoas que se dispuseram a narrar suas histórias


de amor, pois sei que, para algumas delas, as lembranças fizeram com que
novamente vivenciassem momentos de sofrimento e dor, mesmo que todas/os
elas/es confessassem o imenso prazer que tiveram ao "reviver" essas histórias. Sem
essas mulheres e esses homens está pesquisa não poderia ter sido realizada.
Gostaria de mencionar seus nomes, mas, por um compromisso já assumido com
elas/es, não o farei:

À Izilda - a principio, minha orientadora, ao final, orientadora e amiga - teria


muitas coisas para agradecer, entre elas, por ter recebido e "bancado" um projeto
temporal e metodologicamente pouco tradicional na história; pelo carinho e a
forma cuidadosa de criticar algumas incursões, mas sempre respeitando minhas
idéias.

Difícil agradecer Adriana que, não só incentivou as primeiras incursões deste


projeto, como o tornou possível, lendo, relendo e discutindo, incansavelmente, as
questões por mim colocadas.
Sumário

Conteúdo

Resumo ............................................................................................................... 4
Agradecimentos .................................................................................................. 6
Apresentação .................................................................................................... 11
Capítulo I - História, memória, narrativas... ....................................................... 15
1.1. Episódios e histórias ................................................................................ 17
1.2. O contexto da narração ........................................................................... 27
1.3 - Intercruzando história, memória e narrativas ......................................... 41
Capitulo II – Gênero e experiência: uma interlocuçao? ..................................... 54
2.1. Os caminhos da experiência .................................................................... 56
2.2. Discutindo gênero ................................................................................... 58
2.3 - "Engendrando" a experiência na história ................................................ 79
Capitulo III – "Concordo em genero, numero e grau..." .................................... 88
3.1 - O que dizem as mulheres...' .................................................................... 90
3.2. O que dizem os homens... ..................................................................... 102
3.3. Homens e mulheres: novas buscas? ...................................................... 111
Considerações finais... ..................................................................................... 121
Bibliografia ...................................................................................................... 126
Apresentação

Voltar à vida acadêmica depois de uma certa idade é uma coisa, ao mesmo
tempo, instigante e preocupante. Instigante porque as experiências vividas, e as
pessoas com quem se compartilha essas experiências, ajudam a ter uma certa
maturidade que só o tempo te possibilita alcançar, muitas vezes nem o tempo
ajuda, na medida em ele próprio e um "se fazer"... Preocupante? Sim, porque não
sou jovem o suficiente para que meus deslizes sejam justificáveis e nem tão velha a
ponto de ser respeitada pela idade... estou a meio caminho, sou uma jovem
senhora...

"Coincidentemente", está pesquisa privilegiou um recorte onde jovens


senhoras e jovens senhores falaram dos encontros e desencontros nas relações de
amor por elas (eles vividas entre anos 70 e 90. Suas experiências individuais,
pautadas pelo desejo, pela busca, pelo afeto, pelo amor, mostraram-se, ao mesmo
tempo, coletivas, na medida em que deixaram ver o quão relacional somos.

Foram instigantes as discussões realizadas nos cursos - oferecidos pelo


Programa de Pós-Graduação em História da PUC-SP - e gratificantes interlocuções
proporcionadas pelas atividades extra-curso - muitas delas realizadas no Núcleo de
Estudos de Gênero/Pagu/Unicamp, entretanto, duas pessoas proporcionaram a
junção destes dois termos, tornando a interlocução instigante e gratificante - Maria
Izilda, amiga e orientadora, que, durante todo o percurso, organizava minhas
palavras, pensamentos e idéias; e Adriana Piscitelli - uma antropóloga que,
pacientemente, tentava fazer com que eu entendesse
12

os significados do gênero e as diferentes formas de (a)bordá-lo. Eu tive a sorte de


conhecê-las!

Essas interlocuções, aliada a outras, fizeram com que eu repensasse,


cotidianamente, os caminhos da pesquisa. As certezas abaladas me apontaram um
caminho de ampliação das dúvidas, mas, diferente de outros tempos e histórias,
esse já não era um problema.

O trabalho com os narradores, interlocução pouco tradicional na história,


possibilitou uma abertura para outras alianças, onde o "particular", apesar de
mostrar-se em constante movimento, fornecia as peças que conformariam o
mosaico, semelhante a um "quebra-cabeça".

Repensar as noções de espaço, vinculado – ao tempo, e de experiência, como


algo que ultrapassa os limites do racional, trouxe, na relação dialógica de sujeito e
objeto, o "se fazer" do sujeito, formando um corpo de questões, que podem
apontar uma tendência, tendo em mente que a apreensão das mudanças e/ou
permanências estão pautadas pelas diferenças.

Esse caminho levou-me a pensar na história em movimento, no passado


dinâmico, onde o real se apresenta, e assim deve ser (re)apresentado, como sinais
de que algo aconteceu, dando margem a sucessivos questionamentos e, portanto,
reelaborações.

Diferente de uma história pautada pelo progresso gradativo de


aperfeiçoamento da natureza humana, a impermanência dos valores possibilitaram
outras definições do sentido, e do lugar, da política,
13

abrindo aos sujeitos a participação na recriação da cultura e na (re)construção do


conhecimento - um conhecimento intersubjetivo e critico.

Sai de cena o a priori e entra o sujeito constituinte do, e constituído pelo,


conhecimento. Saí de cena o paradigma estrutural e entra uma análise situada num
campo de forças, onde os sujeitos e suas experiências são fundamentais para
buscar as dimensões políticas do cotidiano. Saí de cena o único, previsível,
ordenador... entra em cena o múltiplo, imprevisível, incontrolável e imponderável...
diferente!

Estas discussões marcaram o trajeto desta pesquisa. O primeiro capítulo foi


construído de forma a dar ao leitor uma idéia do contexto onde são construídos os
narradores e a narração para, ao final, fazer um intercruzamento das narrativas
inseridas no “se fazer" da história, tendo na memória algo que traz a reconstrução
do passado no presente e, por que não dizer, permeado pelos projetos do futuro.

A interseção de gênero e experiência permitiu problematizar algumas


discussões, bastante contemporâneas, no sentido de pensar as masculinidades e
feminilidades representadas na documentação, numa tentativa de "engendrar" a
experiência na história.

Interpretar o que dizem homens e mulheres nesta perspectiva não é tarefa das
mais fáceis, no entanto, o terceiro capítulo traz algumas destas falas e persegue os
caminhos trilhados nas buscas amorosas e não e por acaso que "novas buscas" vêm
seguidas de um ponto de interrogação.
14

A opção de chamar de considerações finais o que seria uma conclusão, não


sinaliza apenas uma substituição de palavras, e talvez uma forma de reiterar, e ser
coerente com, a história em movimento.
Capítulo I - História, memória, narrativas...

Se é verdade que cada ato perceptual é um ato


presente, uma relação atual do organismo com o
ambiente, é também verdade que cada ato de
percepção é um novo ato. Ora "novo" supõe que
antes dele aconteceram outras experiências, outros
movimentos, outros estados do psiquismo.

Ecléea Bosi

Nós surgimos, de certo modo, a meio de uma


conversa que já começou e na qual tentamos
orientar-nos para fornecer-lhe o nosso contributo.

Paul Ricoeur
16

"quem conta um conto, aumenta um ponto". Este e um dito popular que,


traduzido para uma fala mais erudita, poderia significar aquilo que se conhece
como interpretação. A história vivida, relembrada, narrada... e, antes de tudo, uma
percepção que os narradores têm de suas experiências e das experiências de
outrem.

Essa percepção pode ser diferente quando tempos e espaços mudam. Se a


narração está no presente, necessariamente, ela está (re)criando o passado, dando-
lhe um status de mobilidade e trazendo um "novo" que não e único, mas, de
alguma forma, aponta tendências.

Da mesma forma, o[a pesquisador(a), ao utilizar-se das representações dos


sujeitos para (re)contar histórias, não está imune a colocar na, agora sua,
representação as próprias experiências vividas.

Este capítulo procura trazer um contexto do recorte da pesquisa e um


contexto da narração, numa tentativa de pensar como história, memória e
narrativas são termos inseparáveis, que se entrecruzam na representação dos
sujeitos.
17

1.1. Episódios e histórias

No início do século XX o ideal feminino era apresentado pela trilogia "mãe-


esposa-dona de casa", identificado como parte de sua natureza, através de um
discurso religioso, médico e legal avalizado pelo Estado. Ainda que as leis tivessem
sofrido alguma alteração, passando a manutenção da família como única
responsabilidade do homem até 1890, para responsabilidade dos cônjuges em
1916, permanecia, juridicamente, a subordinação “... o direito da mulher casada ao
trabalho iria depender da autorização dele [marido], ou em certos casos do arbítrio
do juiz". 1

Essas representações, de homens e de mulheres, buscavam conformar um


ideal de "felicidade conjugal". A volta no tempo, numa pesquisa centrada nas
histórias vividas entre os anos 70 e 90, deve-se ao mote da "felicidade conjugal",
latência presente como permanência nos depoimentos aqui recolhidos ao narrar
suas histórias de amor.

Esse ideal de "felicidade conjugal" também esteve presente nos anos 50 e 60,
momento em que os sujeitos, interlocutores desta pesquisa, estão sendo
constituídos, ainda que com nuances de modernização ou modernidade. Algumas
revistas dedicadas ao público feminino, provavelmente lidas pelas mães dos
narradores, apresentam um discurso homogeneizante para as mulheres:

1
MALUF Marina e MOTT", Maria Lucia. Recônditos do mundo feminino. In: SEVCENKO, Nicolau
(org.). História da Vida Privada no Brasil 3. República: do Belle Epoque a Era do Rádio. São
Paulo, Cia das Letras, 1998, pp.375-376.
18

Nos anos 60, em Claudia, as habilidades continuam muito valorizadas. Do mesmo


modo que o Jornal das Mocas, Claudia aconselha as esposas a não se descuidarem
destes dotes, a prepararem os pratos favoritos do marido (mesmo que os detestem),
a esperarem o esposo sempre com boas refeições etc...2

Após o golpe de 64, o Brasil entrou num período de concentração e


centralização do capital, acarretando uma perda do poder aquisitivo, perda está
que colocou a possibilidade/necessidade da entrada das mulheres de camadas
médias no mercado de trabalho, embora sexualizada - dividindo as profissões entre
masculinas e femininas3. As profissões ditas "femininas" estão relacionadas às
"características próprias" do feminino, o que redefinia o trabalho e os salários
sobre a base do sexo. Essa divisão sexual do trabalho baseada na "natureza
feminina" não só se distinguia da "natureza masculina", como lhe era
complementar ou subsidiária4.

A década seguinte, marcada pela industrialização, modernização e urbanização


crescentes, estreitou os limites, claramente marcados em momentos anteriores,
entre o público e o privado, permitindo e impulsionando a participação das
mulheres num mundo diferente daquele onde a dona-de-casa reinava. A abertura à
profissionalização, às atividades

2
BASSANEZI, Carla. Revistas Femininas e o ideal de felicidade conjugal (1945-1964). Cadernos Pagu (1),
1993, pp.121-122.
3
BRUSCHINI, Cristina. Sexualização das ocupações: o caso brasileiro. Cadernos de Pesquisa, São Paulo,
março de 1979.
4
SAFIOTTI, Heleith I.B. A Mulher na Sociedade de Classes. Mito e Realidade. Petrópolis, Vozes, 1979.
19

educacionais e à cultura não afastavam a mulher de suas tarefas domésticas, o clue


as levava a desempenhar uma dupla jornada5.

Aliada à entrada das mulheres no mercado de trabalho já estava configurada


sua inserção no ensino médio, o que a tornava apta a entrar na universidade. No
final dos anos 80, um mesmo número de homens e mulheres participavam do
ensino formal, com uma ligeira desvantagem para os homens no ensino médio e
superior, todavia, as mulheres eram orientadas a escolher carreiras que fossem
mais adequadas as suas especialidades referentes aquilo que "naturalmente",
poderiam desenvolver melhor conforme sua natureza. As carreiras eleitas -
preferencialmente pedagogia e enfermagem6 - sugerem um cuidar" com a extensão
do trabalho doméstico7.

A saída das mulheres do espaço doméstico, ainda que orientadas para eleger
profissões ou cursos que fossem compatíveis com sua natureza, abre um debate
nas associações entre masculinidade e trabalho e feminilidade e funções
domésticas, introduzindo algumas tensões nas relações afetivas.

5
A questão da dupla jornada de trabalho para as mulheres foi amplamente discutida pelo
Movimento Feminista, o clue também gerou algumas discussões acadêmicas. Ver especialmente
o trabalho de SARTI, Cynthia e MORAES, Maria Lygia Quartim de. Ai a porca torce o rabo. In:
BRUSCHINI, Maria Cristina A. e ROSEMBERG, Fulvia. Vivencia. História, Sexualidade e Imagens
Femininas. São Paulo, FGV/Brasiliense, 1980, p.52.
6
VALDEZ, Tereza e GOMARIZ, Enrique. (coord.) Mulheres Latinoamericanas em Dados. Espanha,
Instituto de la Mujer (Ministerio de Asuntos Sociales de Espana) e FLACSO, 1993.
7
SALÉM, Tania. O velho e o novo: um estudo de papéis e conflitos familiares. Petrópolis, Vozes,
1980.
20

Nas questões afetivas, o ritual de namoro, noivado e casamento com véu,


grinalda - pressupondo a virgindade das mulheres, festa e viagem de núpcias é uma
das marcas dos anos 608. De forma distinta, o exercício da sexualidade para os
homens era uma prova da sua masculinidade, ocorrendo entre 13 e 14 anos,
geralmente com empregadas domésticas e prostitutas, o que afirma a construção
de uma imagem onde os homens separam sexualidade e afeto, imagem que se
mantém recorrente9. As mulheres iniciavam sua sexualidade entre 17 e 19 anos,
procurando resguardar a virgindade até o casamento10.

Uma das marcas dos anos 70 está nos questionamentos sobre a virgindade da
mulher e no ritual do casamento civil e religioso. Se o ritual do casamento era
preservado, muitas vezes para não descontentar a família, já estavam colocadas
algumas relações que subvertiam as normas estabelecidas. No entanto, deixar de
ser virgem não era um tema exatamente fácil, pois vinha acompanhado de medos
pautados pela normatização, mesmo que houvesse uma união, como de fato havia
para as mulheres, entre sexo e afeto. Além disso, as "namoráveis" não eram

8
AZEVEDO, Tháles de. Namoro à antiga: tradição e mudança. Salvador, s/ed., 1975.
9
Algumas pesquisas de comportamento, publicadas no jornal Folha de S.Paulo, nas revistas Elle,
Marie Claire e Yip Exame, apontam para a necessidade atávica dos homens a copula, sem que
isso signifique estar entrando numa relação, enquanto que as mulheres necessitariam algum
sinal de continuidade - "os homens falam de experiência sexual, as mulheres em re*ao sexual".
BOZON, Michael. Amor, Sexualidade e relações sociais de sexo na Franca contemporânea.
Revista Estudos Feministas, n° 1, 1995.
10
VAITSMAN, Jeni. Flexíveis e Plurais. Identidade, casamento e família em circunstâncias pós-
modernas. Rio de Janeiro, Rocco, 1994, p.ll4.
21

mulheres com quem os homens se casavam, estigmatizando-as como "fáceis".

Se a virgindade não tinha um valor absoluto como acontecia em décadas


anteriores, os códigos morais permaneciam11, a quantidade de parceiras ainda
enaltecia os homem, enquanto que ter muitos parceiros denegria as mulheres12.

Crescem, assim, estes atores. De um lado, colocando homens e mulheres em


lugares normatizados para a preservação e idealização da família, de outro, alguns
homens e mulheres, ao romper o cerco, sugerem a flexibilização das normas - novo
e velho bailam num mesmo salão.

Paralelamente, o país vivia um clima de movimentação política que impedia


homens e mulheres de exercerem plenamente sua cidadania, o que os levava a
buscar novas formas de organização, numa tentativa de burlar as medidas
repressivas instituídas pelos governos militares entre 1964 e 1974, quando o
regime inicia sua transição "lenta, gradual e segura", nas

11
Sobre os códigos morais que pautavam o período ver PISCITELLI, Adriana. Trabajádoras,
avictimas" y "amantes": Mujeres en Brasil. Relatório de Consultoria do Ibero American Heritage
Curriculum Project: Latinos in the making of the United States of America. Yesterday, today and
tomorrow, The University of the State of New York, Albany, 1990.
12
As mulheres, ainda hoje, necessitam de um álibi para estar em alguns lugares públicos - bares,
restaurantes, bailes -, ou estão acompanhadas por seus parceiros, ou por amigas, enquanto que
é comum encontrar homens sozinhos nestes mesmos lugares sem causar qualquer
"estranhamento". Essa questão não foi colocada claramente aos depoentes, mas as entrelinhas
dos depoimentos traz a permanência de alguns códigos de normatização do comportamento de
homens e de mulheres.
22

palavras do general Geisel, culminando na instauração da Nova República em


198513.

O ano de 1975, instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU) como o
Ano Internacional da Mulher, propiciou o aparecimento de vários grupos de
mulheres em torno das questões ditas femininas, abrindo um espaço político que
rompia o cerco fechado montado pela ditadura militar. Até então, "mulher" era um
tema restrito as teses acadêmicas e, mesmo assim, pouco valorizado14. Assim
crescem os movimentos de mulheres, incluindo, na sua multiplicidade, o
movimento feminista.

Essas novas formas de organização retomam, nas discussões pelo


reestabelecimento do Estado de Direito, as diferenças de gênero nas relações
profissionais, familiares e conjugais, colocando a questão da mulher como
sistemática e particularizada, opondo-se a qualquer perspectiva essencialista. A
especificidade na área profissional se colocava nas suas dificuldades em conseguir
emprego, de ter salários menores que os homens e de estarem exercendo cargos
subalternos, ainda que tivessem qualificações para chefia; no âmbito familiar eram
colocadas as questões da dupla jornada, chamando os homens à divisão do
trabalho doméstico; e nas questões conjugais eram questionadas a virgindade até o
casamento e o direito ao corpo e ao prazer, desvinculando o sexo da reprodução.

13
OLIVEIRA, Eliezer Rizzo de. De Geisel a Collor. Forças Armadas, transição e democracia.
Campinas-SP, Papirus, 1994.
14
MORAES, Maria Lygia Quartim de. A experiência feminista nos anos 70. Textos (5),
Araraquara, UNESP, Faculdade de Ciências e Letras, 1990.
23

Permeadas por essa discussão, as feministas dividiram-se em três tipos de


agrupamentos: mulheres no exílio; mulheres intelectuais; e militantes, ou
simpatizantes, de organizações de esquerda15.

Apesar de não ser objetivo desta pesquisa fazer uma análise do movimento
feminista no Brasil, abrir um parênteses para apresentar um dos grupos que se
formam neste contexto pode ampliar a discussão.16

O Coletivo Feminista, criado no início de 1979, nasceu no interior do Centro da


Mulher Brasileira (CMB), por ocasião da organização de um painel sobre Mulher e
Reprodução no Brasil". Crítico a existência de temas-tabus nas discussões do CMB -
corpo, sexualidade - e da forma hierárquica de gestão17, o Coletivo Feminista coloca
a necessidade de uma luta específica das mulheres, enfatizando a "opressão" da
mulher dentro da opressão social, numa proposta de aliança "deshierarquizada" à
luta de classes "mais geral".

Já que não é pertinente aos homens nem aos outros grupos organizados lutar pelo
15
SOUZA-LOBO, Elisabeth. O gênero da Militância: movimento de mulheres e representação
política no Brasil (1980-1990). Revista Brasileira de Ciências Sociais, n°17, Ano 6, outubro de
1991, p.9.
16
Ver o trabalho de Goldberg que faz um percurso do Movimento Feminista no Brasil, dividindo-
o entre "Emancipação feminina ao Movimento de Mulheres Feminista (19631978) e "Das
Mulheres em Movimento ao Feminismo de Estado" (1979-1988), além de indicar uma excelente
bibliografia. GOLDBERG, Anette. Feminismo no Brasil Contemporâneo: o percurso intelectual de
um ideário político. BIB, Rio de Janeiro, n° 28, 2° semestre de 1989.
17
Sobre as questões dos mecanismos de poder e de como a questão do poder perpassava os
próprios grupos feministas ver os trabalhos de PONTES, Heloisa. Dos palcos aos bastidores. O
SOS Mulher e as práticas feministas contemporâneas. Dissertação de Mestrado, Departamento
de Antropologia - IFCH, Unicamp, 1986; PONTES, Heloisa E GREGORI, Maria Filomena. A família,
a violência e o feminismo. VII Encontro Anual da ANPOCS, Águas de São Pedro, 1983.
24

específico da mulher, já que a opressão como sexo atinge a todas as


mulheres, pensamos que cabe a elas procurar suas aspirações e
reivindicações específicas na vida pessoal, social, política e econômica,
fortalecidas por um movimento autônomo, sem subordinação a outros
grupos que também travam debates e lutas pela transformação da
sociedade (...) podemos nos filiar a esses grupos individualmente ou
desde que aceitem nosso movimento como força legítima que vem para
somar esforços e não para dividir como muitos acreditam (...) devemos
estar presentes nas lutas gerais... sem deixar que nossos espaços e nossa
especificidade sejam suprimidos pela importância das "lutas mais
gerais"18.

O documento aponta para a construção de uma identidade sediada na


especificidade dos problemas vividos pelas mulheres, universalizando-as. Ainda
assim, revoga a tese de que os problemas específicos seriam solucionados com a
vitória na luta "mais geral".

A exemplo do Coletivo Feminista, outros grupos caminhavam na direção de


uma "identificação de mulheres". Mesmo que os caminhos trilhados nesta pesquisa
apontem a multiplicidade como uma forma para pensar a problemática das
relações de gênero, afastando-se da identidade de homens ou identidade de
mulheres, reconhece que essas discussões foram fundamentais para que novas
categorias de análise fossem inseridas

18
COLETIVO FEMINISTA. O Movimento de Mulheres no Brasil. Cadernos da Associação de Mulheres (3),
agosto de 1979, p.52. Neste número são apresentadas as propostas e o histórico de alguns grupos
pertencentes ao movimento de mulheres - Associação de Mulheres, Centro da Mulher Brasileira-RJ,
Centro da Mulher Brasileira-SP, Coletivo de Mulheres, Grupo Nas Mulheres, Grupo Feminista 8 de
Março, Movimento pela Participação da Mulher e Sociedade Brasil Mulher. A associação de Mulheres foi
criada em 1976 e, até 1978, era responsável pela publicação do jornal Nas Mulheres, importante veículo
de divulgação do movimento feminista no Brasil.
25

nos estudos acadêmicos, categorias estas que questionaram alguns binarismos


reguladores das relações entre homens e mulheres.

... as representações sobre a condição da mulher, elaboradas pelo feminismo e


reinterpretadas de formas distintas, forneciam o modelo cultural legitimador e
organizador da conduta de uma parcela das mulheres que experimentaram situações
de vivência. (...) a indústria cultural, "psicologismo" e feminismo (...) produzem
modelos para os integrantes de fami1ias de certos estratos das camadas médias, (...)
questionaram os valores hegemônicos que organizaram a moralidade sexual e a vida
familiar19.

Igualdade de classes e igualdade de sexos eram motes de uma mesma


campanha, ainda que a última fosse vista como reacionária por algumas
organizações de esquerda, na medida em que dividia os olhares para aquilo que
deveria ser central e que, uma vez conquistada - igualdade de classes -, abarcaria
as desigualdades de gênero. Tais reivindicações eram também mal vistas pelas
organizações de direita, estas também preocupadas com a desestruturação da
família, talvez pelas discussões, iniciadas em meados dos anos 60, sobre o prazer
sexual da mulher, que começa a ter espaço em algumas revistas dedicadas ao
público feminino:

... a ênfase no prazer sexual sentimental feminino ameaça às bases da dupla moral
para os sexos e a dominação masculina na hierarquia de gênero. São abalados vários
dos tradicionais pilares que sustentam o controle da sexualidade feminina, as
distinções "naturais" entre o feminino e o masculino e as exigências, atribuições e
expectativas que compõem o relacionamento homem-mulher 20.

19
ROMANELLI, Geraldo. Famílias de camadas médias: a trajetória da modernidade. São Paulo, USP, Tese
de Doutorado, 1986, p.103.
20
BASSANEZI, Carla. Revistas Femininas... Op.cit., p.143.
26

Se, no período da ditadura, o Movimento Feminista colocava suas questões,


mesmo que especificando-as enquanto de "mulheres", numa direção socialista,
revolucionaria, de esquerda..., com a abertura política, algumas feministas
defendiam a participação na estrutura estatal como maneira de intervir na
sociedade - o Estado passa a ser um interlocutor - no sentido de melhorar a
condição das mulheres.

No contexto dessas discussões21, surge, em 1983, o primeiro Conselho


Estadual da Condição Feminina em São Paulo, seguido por Minas Gerais e Paraná e
gerando, anos depois, o órgão ao nível federal. A instauração dos Conselhos,
defendida por um grupo de mulheres filiadas ao MDB, não era consenso entre as
feministas, vozes contrarias, minoritárias no Movimento, não acreditavam que essa
era uma forma de reconhecer e legitimar o Movimento.

Esse curto e descritivo parênteses sobre tendências do Movimento Feminista


no Brasil, evidenciando suas discussões/divisões, e uma tentativa de dar uma das
pegas do mosaico que forma o quadro de tensões germinal dos depoimentos aqui
contemplados.

Ainda que as/os narradoras/es não estivessem, necessariamente, ligadas/os a


organizações políticas ou feministas, elas/es crescem em meio a reivindicações pela
liberdade e, dentro destas, reivindicações de direito ao

21
Sobre o teor das discussões em torno da participação do Movimento Feminista em órgãos
estatais ver BARROSO, Carmem. Mulher, Sociedade e Estado no Brasil São Paulo,
Brasiliense/UNICEF, 1982.
27

corpo, participação política das mulheres e a impulsão da mulher ao mercado de


trabalho.

Sem querer fazer uma apologia às mulheres, pois não é o caso, como ressalta
Matos22, de passá-la de papel de vitima a heroína, a1gumas - pertencentes a uma
parcela da classe media - tiveram a possibilidade de viabilizar um novo caminho,
diferente do antigo, iniciando, nos anos 70, uma discussão sobre sua inserção num
mudo que, até então, somente homens tinham acesso.

Essa inserção mudou a vida de muitas mulheres e, conseqüentemente ou não,


de muitos homens. Essas mudanças e/ou permanências serão objetos de análise
deste trabalho. O próximo passo é apresentar ao leitor as/os narradoras/ES que
aqui contaram suas histórias e um pouco dos caminhos que me levaram até
elas/ES.

1.2. O contexto da narração

Antes de falar dos caminhos percorridos na realização da pesquisa e


apresentar as/os narradoras/ES, é necessário explicitar que a utilização da primeira
pessoa em algumas partes deste texto faz parte de uma opção metodológica. Não
há uma separação entre o observador e o observado, como apontou Gilliam,
"...uma das boas coisas que trouxe a pós-

22
MATOS, Maria Izilda S. de. Gênero: trajetórias, desafios e perspectivas na historiografia
contemporânea. Boletim Cehila n° 50, setembro de 1991+-maio de 1995, p.24.
28

modernidade e o fato de participarmos daquilo que estamos observando..."23.

Trabalhar com fontes orais implica um processo dialógico, ainda que, a


princípio, determinado pelo pesquisador, processo este que estabelece a
importância do nível de confiança entre os interlocutores, onde a troca é
fundamental24. Na interlocução com os personagens que compõem está
dissertação essa "troca" foi sentida, muitas vezes fui inquirida, passando de
entrevistadora a entrevistada, ainda que as entrevistas se pautassem, na maior
parte do tempo, por ouvir os relatos.

Se, no princípio, está pesquisa se colocava algumas questões suscitadas pelo


levantamento bibliográfico e ampliadas por um debate que uma parcela da mídia
brasileira insiste em colocar, a inserção das narrativas abriu um leque de novas
questões e possibilidades para perceber as relações afetivas, refinando alguns
conceitos que se pretendem, ou são colocados como, globalizantes, universa
lidando expressões já consolidadas: mulher frágil, privada, passiva e homem forte,
público, ativo.

Apesar de fazer alguma referência às pesquisas de comportamento, elas não


foram aqui privilegiadas na análise, pois apontavam para uma

23
Seminário de Angela Gillian sabre o movimento de mulheres negras, realizado no Núcleo de
Estudos de Gênero/Pagu/Unicamp, em novembro de 1998.
24
Alessandro Portelli em Seminário "História e Memória", realizado na PUC-SP em outubro de
1995. Para entender melhor essa questão ver. CRAPANZANO, Vincent. Life-Histories. American
Anthropologist, vol.86, n° 4, december 1984, p.953-959; SEVCENKO, Nicolau. Fim da História.
Atrator Estranho, n°19, janeiro de 1996, p. 26; PORTELLI, Alessandro. Tentando aprender um
pouquinho. Algumas reflexões sobre ética e história oral. Projeto História (15), São Paulo,
Educ/Centro Cultural Banco do Brasil, 1997.
29

fragilidade quando inseriam mulheres e homens em modelos fechados, dando um


caráter superficial à análise. Entretanto, as várias pesquisas de opinião, publicadas
semanalmente no Caderno Cotidiano da Folha de S.Paulo, suscitaram questões que,
aliadas a observação participante, vieram a engrossar o ponto de partida da
pesquisa.

No início, uma questão que se colocava era dificuldade de encontrar as fontes,


ao final, uma das dificuldades que se apresentou foi eleger os depoentes. Indicados
por amigos, ou amigos de amigos, as pessoas se colocaram não só dispostas a falar
de sua vida amorosa, mas insistiam na pertinência da pesquisa, e se mostraram
ansiosas pelos resultados. Apesar de vivenciarem experiências distintas, as/os
depoentes se unem em busca de uma relação “afetivo-prazeirosa-permanente”25.

Privilegiar as narrativas enquanto documento implica uma preparação do


pesquisador para uma negociação de subjetividades26 na relação
pesquisador/narrador.

Ao trabalhar um documento escrito, já produzido, certamente o olhar para


está produção poderá evidenciar ou problematizar questões nunca mencionadas,
por mais trabalhado que tenha sido o documento. Qualquer história narrada e um
documento em potencial, mas somente se torna um documento de fato quando o
pesquisador se senta com o depoente e grava

25
Ver QUINTEIRO, Maria Conceição. União conjugal: a grande busca. São Paulo, Tese de
Doutorado, USP, 1993.
26
BERTAUX, D. Capproche Biographique. Cohiers Intemationoux de Sociologie, Paris, vol.60,
1982.
30

uma entrevista. Neste momento se dá o "se fazer" do documento e aí entra a


negociação, pois dependendo da resposta do interlocutor e da reação do
pesquisador ante essa resposta o se fazer pode ser mudado, tomar outro rumo. Da
mesma forma, no olhar do pesquisador para um documento escrito está contida
sua própria história de vida.

Construir o documento a partir de depoimentos orais tem uma certa


especificidade. Se um pesquisador chora ao ler um documento onde é descrita a
violência sofrida por uma mulher na sua relação conjugal, tal reação não
modificará aquilo que está escrito, poderá modificar o olhar do pesquisador sobre
o documento, mas não o documento. Entretanto, se o pesquisador mimetiza a
emoção de um depoente, ou o inverso, se o pesquisador se mantém impassível
ante um ato de forte emoção, o depoente pode sentir-se, no primeiro caso,
acolhido e, portanto recuperar ou não mais evidências de sua história individual e
coletiva, no segundo caso, pode irritar-se ou não com a frieza do pesquisador e
acelerar o depoimento, finalizando-o intempestivamente.

Essas questões apontam a inexistência de uma preparação a priori, alguns


sujeitos desta pesquisa colocaram questões que se afastavam dos propósitos
iniciais deste trabalho. A narração de suas experiências esteve permeada pela vida
afetiva do seu país, amigos ou parentes próximos. A ênfase colocada na vida afetiva
daqueles que estavam a sua volta se tornou fundamental não só para a
compreensão da vida afetiva delas/es, mas também para pensar como era
apresentado o mundo em que viviam,
31

permitindo uma percepção das possíveis mudanças e /ou permanências nas


relações amorosas ao longo de sua vida e de seu grupo social.

O que é importante para o depoente, ainda que, aparentemente, se afaste dos


objetivos da pesquisa em si, deve ser importante para o pesquisador, não somente
como forma de apreender o sujeito, mas também de dar-lhe uma certa autonomia
para que ele possa expor a forma como vivenciou. Essa discussão é passível de uma
crítica comum em torno das subjetividades, mas aponta uma tendência que pode
ser fundamental para perceber como o sujeito vive, e constrói, a estrutura. "O
documento fala", não importa se está na forma escrita ou é produzido através de
relatos, o particular no segundo caso é tratar-se de um ser humano, passível de
emoções e que externaliza essas emoções - "Seres vivos não são papéis”27.

Nos dois casos o real não pode ser totalmente captado. O historiador não
busca a verdade total, e nem poderia, a não ser que parta de perguntas pré-
construídas e procure respondê-las, fechando-se aos sucessivos questionamentos
proporcionados pelo documento, onde é necessário fazer (re)elaborações
constantes, (re)elaborações estas que emergem do diálogo

27
AMADO, Janaína. A culpa nossa de cada dia: ética e história oral. Projeto História, n° 15, Revista do
Programa de Estudos de Pós-Graduados em História e do Departamento de História, PUC-SP, abril de
1997, p.16.
32

com o documento oral e/ou escrito, sem, no entanto, hierarquizar ou colocar em


oposição a diversidade da documentação28.

A provisoriedade do conhecimento histórico é dada pela sua estreita ligação às


questões que são postas, "...mais do que respostas é preciso descobrir as
perguntas"29. A relação de quem observa e de quem é observado é dialógica,
ligando a documentação, no caso as narrativas, com o estudo dos processos sociais
concretos no tempo e no espaço. Entretanto, a negociação dos processos
permeados pela memória suscitaram críticas que indicam a construção do passado
pelo sujeito, buscando redimir o presente. A negociação temporal e inerente ao
narrador e a ressignificação do passado através do presente e também uma mostra
do jogo que se estabelece entre mudanças e permanências no processo social.

Se o fato pode ser pensado não enquanto verdade, mas enquanto uma
representação - um olhar a partir da experiência vivida, incorporada - pode-se
chegar ao indivíduo singular universal30.

No caminho percorrido para chegar às/aos narradoras/es, algumas


observações iniciais podem ser contributivas a compreensão do grupo em que
estão inseridas(os. As mulheres contatadas foram mais receptivas e se mostraram
mais dispostas a falar que os homens contatados. Antes de

28
Le Goff coloca que muitas vezes foi dado ao documento oral uma certa imobilidade e
fidedignidade e ao documento escrito uma perfeição e maleabilidade. Le GOFF, Jácques.
Historio e Memória. Campinas, Editora da Unicamp, 1996 (4a ed.), p.53.
29
PORTELLI, Alessandro. Conferencia realizada na PUC-SP no segundo semestre de 1997.
30
DENZIN, Norman. Interpretando as vidas de pessoas comuns: Sartre, Heigegger
Faulkner. Dados, Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, vol.27, n° 1, 1984.
33

iniciar os depoimentos foram colocados, de maneira suscinta, os objetivos da


pesquisa - o interesse em problematizar os (des)encontros amorosos no final do
milênio - onde foi solicitado que eles falassem sobre suas histórias afetivas. Minha
interferência se deu em momentos de forte emoção, mais comum entre as
mulheres entrevistadas, ou quando era solicitada a fazer perguntas, mais comum
entre os homens entrevistados. Os depoentes escolheram o lugar onde seriam
realizados os depoimentos.

Não posso me furtar a mencionar um contato que, infelizmente, não pode ser
utilizado nesta análise. Um engenheiro recusou-se a dar seu depoimento,
justificando: "... iria mentir ou omitir fatos de minha vida, e prejudicaria sua
pesquisa", insisti, pois em algumas ocasiões pude observar a movimentada vida
afetiva pós-separação e suas elucubrações a respeito dos seus relacionamentos
conjugais, colocando-se quase como um personagem cinematográfico - "romântico,
apaixonado e... incompreendido". Este rápido contato suscitou-me a importância
das omissões ou invenções que, antes de serem omitidas ou inventadas, poderiam
ser tratadas enquanto um documento onde estaria presente uma memória coletiva
do grupo ao qual pertence, assimiladas por ele, ainda que imaginariamente.

As "invenções" não aparecem do nada, elas formam parte de uma memória


individual que, mesmo inventada ou romanceada, auxiliam a
34

constituição do processo histórico, talvez não lógica, mas simbolicamente31.


Infelizmente, ante a recusa irrefutável, não foi possível fazer esse exercício. Outro
homem se colocou a disposição para conversar comigo, deixando claro que ele
faria o contato, mas não recebi nenhum retorno.

Está pesquisa contou com seis depoimentos - 3 homens e três mulheres. Os


nomes são fictícios, à exceção de um homem, os depoentes solicitaram que fossem
preservados seus nomes verdadeiros.

Apresento as pessoas que tornaram possível está dissertação. A situação


conjugal, idade, tempo de separação, entre outros, referem-se ao período em que
as entrevistas foram realizadas - entre setembro de 1996 e agosto de 1997.

Conheci Helena, através de uma amiga, no momento de sua separação,


quando ainda elaborava o projeto de pesquisa que resulta nesta dissertação. Desde
então ela se mostrou bastante interessada em relatar sua experiência.

Helena nasceu em 1954 e é psicanalista. Vive com dois filhos adolescentes


num bairro de classe média em São Paulo. Seu depoimento, realizado no segundo
semestre de 1996, durou 2 horas e 45 minutos sem intervalos programados, houve
somente uma interrupção de 5 minutos ocorrida num momento de forte emoção.
Helena, na ocasião do depoimento, tinha 42 anos e estava separada há 2 anos de
um casamento

31
Sobre as narrativas inventadas ou romanceadas ver o instigante artigo de AMADO, Janaina. O grande
mentiroso: tradição, veracidade e imaginação em história oral. História, Revista da Universidade
Estadual Paulista, São Paulo, vol.14, 1995.
35

que durou 20 anos. Como profissional liberal, divide suas atividades entre um
consultório particular e uma instituição privada e é economicamente
independente. O depoimento de Helena foi ouvido na sala de estar de sua casa.

Alberto nasceu em 1955, nunca se casou legalmente, mas já vivenciou um


relacionamento, que considera o mais importante, pois mesmo separado há quatro
anos, sua parceira ainda é lembrada como modelo que mais se aproximou da
mulher ideal. Alberto vive num bairro de classe média-alta em São Paulo e divide
suas atividades profissionais entre a universidade, onde é professor, e uma
pequena empresa. Até aquele momento, com 41 anos, não pensava em ter filhos.
Seu depoimento foi coletado em três etapas, entre o segundo semestre de 1996 e
o primeiro de 1997, totalizando 3h e 10min de gravação.

O primeiro contato, indireto, com Alberto foi feito através de uma entrevista
na Folha de S.Paulo - seção "Cotidiano" - sobre pessoas que moram sozinhas. Fui
procurá-lo na universidade, ele foi muito receptivo, mas, a princípio, reticente. Ele
não entendia bem porque uma pesquisadora se interessaria por uma "pessoa tão
comum". Talvez como parte de um imaginário onde "pessoas comuns" não tenham
uma história a ser contada.

O primeiro depoimento durou 40 minutos, mas aos 15 minutos ele pergunta:


"o que mais você quer saber?" Alberto determinava o final do depoimento, mas se
colocava receptivo para repetir quantas vezes fosse necessário. Foram realizados
três encontros, em lugares públicos escolhidos
36

por ele, somando um total de 2 horas e 50 minutos de depoimento gravado.

Maria, nascida em 1957, é doutoranda em Ciências Sociais e trabalha num


órgão do governo de São Paulo. Vive com dois filhos adolescentes num bairro de
classe média em São Paulo. No primeiro semestre de 1997, seu depoimento foi
realizado em duas partes, sendo 1h e 30min no primeiro dia e 1h duas semanas
depois. Maria estava separada há cinco anos e, nesse período, não constituiu
nenhuma relação mais duradoura, apenas "casos" como ela própria diz.

Conheci Maria num evento promovido pela Pontifícia Universidade Católica de


São Paulo, ela tomou conhecimento do meu trabalho e, ao mostrar bastante
interesse na pesquisa, se dispôs a dar seu depoimento32.

Solange é doutora na área de políticas públicas, nasceu em 1957. Seu


depoimento foi realizado no segundo semestre de 1997, um ano após a separação.
Ela vive hoje numa cidade do interior de São Paulo com um casal de filhos - 10 e 5
anos - e trabalha como pesquisadora numa universidade paulista. A exemplo de
Maria, Solange também teve muito interesse em relatar sua história no momento
em que soube desta pesquisa.

32
Maria não chegou a ser militante do movimento feminista brasileiro, mas, diferente das
pessoas aqui ouvidas, seu depoimento traz algumas conex6es explicitas com alguns grupos de
mulheres, particularmente os que se dedicaram a reflexão.
37

Pedro, jornalista e sociólogo, trabalha em um órgão do governo do Estado de


São Paulo e foi candidato a um cargo eletivo municipal. Sua trajetória é marcada
por uma atuante militância em um partido de esquerda. Pedro esteve casado por
cinco anos e, no momento de seu depoimento, vivia uma situação de volta ao
casamento, após uma separação de um ano, ainda assim, ele confirmava sua
relação mais de amizade com sua "ex-atual mulher", como ele próprio denomina.
Pedro não tem filhos, mas apresenta forte necessidade de ser pai, realizando assim
"um de meus sonhos", como ele mesmo coloca. Pedro nasceu em 1956 e vive num
sítio próximo a São Paulo.

Marcos, nascido em 1954, é engenheiro e trabalha numa empresa de capital


misto. Viveu alguns anos no exterior enquanto fazia seu doutorado. Hoje, vive
numa cidade do interior paulista, num bairro de classe média alta, próximo a São
Paulo. Marcos nunca conviveu na mesma casa com uma mulher e mesmo que isso
venha a acontecer, ele não tem planos de ter filhos. Marcos me foi apresentado por
Solange.

Mesmo nesta curta descrição dos depoentes e da forma como foram


contatados pode-se observar que as mulheres estavam mais disponíveis que os
homens para falar de suas histórias. A exceção de Pedro, que ficou muito
interessado ao saber da pesquisa e teve uma fala fluente, Marcos e Alberto se
colocaram um tanto reticentes. No início, suas falas foram permeadas por "o que
mais você quer saber"? ou "você não tem um roteiro?... eu preciso de um roteiro",
essas questões foram contornadas, no caso de Alberto, a partir do segundo
depoimento por sua própria iniciativa, ele se
38

sentia mais à vontade e verbalizou isso; no caso de Marcos, foram inseridas


algumas perguntas, mas a partir da segunda metade da entrevista a fala se tornou
mais fluente.

O critério usado na seleção das pessoas a serem entrevistadas foi pautado


pelo interesse e disponibilidade destas em relatar suas histórias de amor, além
disso, elas/es deveriam situar-se no recorte desta pesquisa - homens e mulheres,
entre 40 e 50 anos, pertencentes a uma parcela das camadas médias urbanas,
inseridos/as no mercado de trabalho, economicamente independentes, e que
tivessem interesse em refletir, falar, lembrar e contar suas relações amorosas.

As mudanças ocorridas ou não nas vivências afetivas entre homens e mulheres


que estão iniciando, ou a procura de, um relacionamento, num momento diferente
daquele em que a idéia do "príncipe" e da "cinderela" era mais nítida e claramente
delineada, permitiu explorar algumas "novas" formas de socialização de homens e
mulheres comuns – aquelas/es que não estão em evidência por sua beleza, virtude,
atitudes irônicas, no imaginário para as mulheres, ou poder, prestígio, dinheiro, no
imaginário para os homens -, historicizando as relações afetivas através das
experiências lembradas e contadas por estes homens e mulheres.

Alguns contatos foram descartados na medida em que a disponibilidade inicial


transformava-se em impossibilidade de um encontro com a pesquisadora e o
"gravador"..., algumas mulheres e alguns homens, muitas vezes, relatavam histórias
extremamente instigantes para a pesquisa em reuniões informais ou no bate-papo
pós-entrevista, quando o
39

gravador já havia sido desligado. Está postura fazia com que eu passasse algumas
horas anotando tudo que me haviam dito e não havia sido gravado.

O diálogo com as fontes e a análise bibliográfica indicaram caminhos até então


pouco trilhados pela historiografia - reconhecer vozes, histórias, não institucionais,
individuais ou desorganizadas. O (re)aparecimento da História oral permitiu "ouvir"
aqueles que até então estavam silenciados – “os excluídos da história" -, ou porque
não estavam presentes nos documentos escritos, ou porque não tinham cometido
atos que instigassem o/a historiador/a, trazendo a memória como possibilidade de
explicação do social.

Os narradores aqui contemplados têm, de certa forma, algo que os une.


Inseridos em uma parcela da classe média paulista, passaram pela experiência de
convívio universitário e, uns mais que outros, iniciavam um questionamento, em
suas experiências junto ao seu grupo, sobre as relações entre homens e mulheres
num momento que ia da luta pela volta ao Estado de Direito às “jovens tardes de
domingo"33.

De formas distintas, todas/os estiveram envolvidas/os, na sua experiência de


vida, em situações que as/os colocavam em posição de refletir sobre as questões
levantadas pelo movimento feminista.

33
Sobre a Jovem Guarda, movimento cultural ocorrido nos anos 60, ver PEDERIVA, Ana
Barbara Aparecida. Jovens tardes de guitarras, sonhos e emoções. Fragmentos do
movimento cultural-musical Jovem Guarda. PUC-SP, Dissertação de Mestrado, 1998.
40

Todos experimentaram relacionamentos fora dos padrões tradicionais,


buscando outras formas de socialização, diferente daquelas vividas, e a elas/es
passadas, por seus pais.

Entretanto, o que homogeniza estes narradores é uma certa "insatisfação"


com seus relacionamentos amorosos, o que as/os - levava a imaginar, e verbalizar
esse imaginário, um ideal de relação amorosa, ainda que as falas estivessem
permeadas por um certo desencanto.

O desencantamento é acompanhado por uma aura de derrota quando pensam


na possibilidade de constituir um "relacionamento ideal", criando um descompasso
entre aquilo que vivenciam e aquilo que está no seu imaginário. Este é um
problema que o historiador enfrenta ao analisar essas falas: "O limite entre o
imaginário e o real, do mesmo modo que entre o consciente e o inconsciente...”34

Entretanto, a realidade do desencanto é atenuada pela universalização dos


desencontros. Os narradores aqui contemplados falam de si - individualmente -, ao
mesmo tempo que colocam seus problemas como do “mundo" - universalizando-
os.

Por fim, uma questão que, em pane, homogeneizou tanto os narradores como
as pessoas contatadas, mas que, por um motivo ou por outro, não deram seus
depoimentos, ou ainda aquelas/es que, formal ou informalmente, tomaram
conhecimento do tema desta pesquisa, foi o

34
PASSERINI, Luisa. Mitobiografia e História Oral. Projeto História, n° 10, Revista do
Programa de Estudos de Pós-Graduados em História e do Departamento de História,
PUCSP, dezembro de 1993, p.35.
41

interesse nos resultados, como se este pudesse ser um receituário que viesse a
adequar o imaginário da relação amorosa ideal e a experiência vivida.

Está ansiedade coloca a questão dos modelos. De certa forma, os depoentes e


as pessoas interessadas nos resultados deste trabalho se sentirão frustradas, pois
não encontrarão as "receitas" para o bom relacionamento, mas sim um outro olhar,
problematizando as relações afetivas vivenciadas num momento onde a exaltação
35
da "nova mulher" e suposta "crise de identidade masculina" aparecem como
discursos recorrentes na vida das pessoas comuns36.

1.3 - Intercruzando história, memória e narrativas

A preocupação desta pesquisa em detectar os novos, e/ou a permanência dos


velhos, caminhos percorridos por mulheres e homens nos seus (des)encontros foi
apreendida através das narrativas dos sujeitos aqui contemplados, buscando não
um interesse de uma história em particular, mas tentando captar o mundo
apresentado pelo narrador.

No entanto, é preciso enfatizar que partir das histórias amorosas de mulheres


e homens, através das narrativas, traz um olhar para uma

35
Talvez mais um binarismo criado no mundo contemporâneo, a ser tratado no capitulo
II.
36
Sobre a questão de pensar a história a partir da experiência ver: VIEIRA, Maria do Pilar
de Araujo; PEIXOTO, Maria do Rosario da Cunha e KHOURY, Yara Maria Aun. A pesquisa
em História. São Paulo, Ática, 1995, 31 ed., pp.37-38.
42

história que não está nem fora, nem acima dos grupos, não há intenção de
confirmar ou refutar hipóteses já determinadas, mas sim explorar, de forma pouco
tradicional, uma outra história, ou uma outra consciência.

Ao lembrar histórias de uma geração anterior a sua, são apresentadas as


diferenças de comportamento nas relações amorosas e nas construções de
masculinidade e de feminilidade, afastando a idéia de que o progresso, o futuro e a
história estão dados. A inserção da subjetividade, e da ação, implode, ou no
mínimo questiona, as idéias do raciocínio 1ógico, progressista e iluminista37.

Os narradores aqui contemplados passaram pelo "sofrimento" em suas


relações afetivas e encontraram uma "escuta" para relatá-los. Não é o caso aqui de
quantificar a dor, tampouco utilizá-la como rima para o amor, ainda que, muitas
vezes, as narrativas sejam pautadas por ela.

Ao deparar-se com alguém que os instigava a narrar suas histórias de amor, os


depoentes buscaram na memória os "fatos" que apontavam suas vivencias
amorosas. Vários foram os tipos de relatos, entre eles os do silencio, apontando
para o significado do "não dito"38, transcrito aqui como reticências.

O fio condutor estava dado - as relações amorosas -, no entanto, são


recorrentes as menções a família de origem, nuclear ou ampliada - pai, mãe,
irmãs/ãos, primas/os - ou a constituição de sua própria família.

37
SEVCENkO, Nicolau. O fim da história. Atrator Estronho, n° 19, janeiro de 1996.
38
POLACK, Michael. Memória, esquecimento, silêncio. Estudos Históricos, Rio de Janeiro,
V01. 2, n° 3, 1989.
43

História, memória e narrativas, termos intercambiáveis, são perpassados pelo


tempo, um "tempo individual" que é absorvido pelo "tempo social"39.

Partindo das narrativas foi possível utilizar a experiência dos atores, através da
memória, no sentido de buscar o vetor norteador para compreender o processo
histórico.

No caso desta pesquisa as narrativas se constituíram no suporte da


investigação como fonte documental, buscando desvendar as redes das relações
afetivas, não como técnica mas como construção histórica, juntando observação e
reflexão sobre essa imagem reproduzida na lembrança, como aponta Piscitelli: "Los
discursos de los adores, con sus individualidades e especificidades, son
desmenbrados, reagrupados e interpretados y pueden diluirse en la trama social
integrada por el conjunto de actores"40.

O olhar41 aqui apresentado foi pautado, num primeiro momento, por aquilo
que se apresenta na narração, portanto, "o que" é mostrado; para, em seguida,
buscar "como é mostrado", intercruzando individual e social. De um lado, houve
um exercício em perceber aquilo que os narradores apresentavam como sendo
suas relações amorosas hoje é o ideal de relacionamento amoroso, o que
certamente afetou a narração dos amores

39
BOSI, Eclea. Memória e Sociedade. Lembrança de Velhos. São Paulo, Cia das Letras,
1995, p.418.
40
PISCITELLI, Adriana. História de vida, história oral y memória. Revisto de Ciencias
Socialies, n° 1, Universidad Nacional del Centro, Argentina, dezembro de 1995.
41
Enfatizo "o olhar", pois estou segura que outros olhares são possíveis, ainda que se
parta das mesmas fontes, tanto empíricas, quanto teóricas.
44

vividos há 20 anos; de outro, era instigante perceber que no processo da


lembrança apareciam algumas identificações ajustavam a suas identidades e
aspirações atuais42.

Aproximar os resultados desta pesquisa a uma "realidade vivida" por estes


interlocutores, até então silenciosos, e vincular uma teoria ao tempo e ao sujeito -
de outra forma ela seria vazia. Isso significa, de um lado, ler os autores e atores de
forma a perceber de onde eles falam numa articulação entre o espaço e o tempo,
de outro, abrir um mundo menos definido, menos consensual e pautado pela
racionalidade.

Bosi coloca que os fatos (marcos) são as pontas do iceberg, tendo algo que se
articula por baixo. "Contar" e "narrar" podem ter o mesmo significado se
articulados com o tempo - pensando-o como elemento disciplinador da história43.

Usar narrativas ("contar") como meio de chegar as percepções do passado leva


a ativação da memória ("lembrar"), estas percepções, realizadas e refletidas no
presente, libertam os fatos de sua temporalidade linear, abrindo um campo para
outras temporalidades - agora vivenciadas, retendo na memória "o que ainda está
vivo".

42
Sobre o questionamento de identidades no processo de rememoração ver THOMSON,
Alistair. Recompondo a mem6ria. Questões sobre a relação entre história oral e as
mem6rias. Projeto História, n° 15, Revista do Programa de Estudos de P6s-Graduados em
História e do Departamento de História, PUC-SP, abril de 1997, p.57.
43
BOSI, Alfredo. O tempo e os tempos. In: Tempo e História, São Paulo, Cia das Letras,
1996, pp.19-32.
45

A memória coletiva (...) é uma corrente de pensamento contínuo, de uma


continuidade que nada tem de artificial, já que retém do passado somente
aquilo que ainda está viva ou capaz de viver na consciência do grupo que a
mantém44.

Ao questionar a linearidade da história, centrada nos grandes heróis e


vinculada a um discurso universal masculino, possibilitou, de um lado, o
surgimento de uma outra história - História de um sujeito sem história. De outro, a
emergência de discursos múltiplos formam um mosaico 45 constituído de pequenos
pedaços, onde as peças sozinhas podem não fazer muito sentido, mas da sua
junção pode emergir uma outra conformação do social. A montagem desse
"quebra-cabeça" não é uma tarefa fácil, na medida em que está pautada por um
"principio desordenador... portanto, incontrolável"46.

Isso não significa que o processo histórico se faça na somatória dos vários
olhares para um mesmo fato, mas, antes, naquilo que se entrecruza nas
lembranças, afastando-se da idéia de totalidade.

Nada do que um dia aconteceu pode ser perdido para a história. Somente a
humanidade redimida poderá apropriar-se totalmente do seu passado, como
não há humanidade redimida, não existe apropriação total do passado 47.

44
HÁLBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo, Revista dos Tribunais Ltda, 1990, pp.
81-82.
45
A idéia de um "mosaico" foi emprestada de Portelli ao afirmar que as narrativas não podem
ser consideradas como "quadrados" exatamente iguais, mas sim uma "colcha de retalhos que,
na sua diferença, poderão conformar um "todo coerente". PORTELLI, A. Tentando aprender um
pouquinho... Op.cit., p.16
46
BENJAMIN, Walter. Magia e Técnica, Arte e Política. São Paulo, Brasiliense, 1996, tese 13.
47
Id., ib., p.223.
46

Sem a prisão da totalidade ou da verdade a história se abre e, suscetível ao


encontro de uma experiência presente e passada, inaugura a memória ativa,
colocando em evidência um tempo saturado de "agoras" a partir de experiências
presentes. A narrativa histórica é uma construção feita a partir de sinais de algo
que aconteceu.

Solange traz um episódio ocorrido dias antes do seu depoimento. Ela


encontrou-se, 26 anos depois, com Gustavo - o homem por quem se apaixonara,
platonicamente, na adolescência, aos 12 anos, e de quem se afastara quando ele
"roubou-lhe" o primeiro beijo. Gustavo havia gravado uma música, cuja letra foi
retirada de um caderno de poesias que ela lhe dera há 26 anos, quando ele se
mudava para o Rio de Janeiro:

eu fiquei tão emocionada que eu fiz uma poesia contando essa história
inteira... isso foi à semana passada [agosto de 1997], um dia depois de ver o
show que ele apresentou em São Paulo. Foi tão engraçado porque saiu uma
poesia com uma rima e uma métrica completamente infantil, eu escrevi como
se tivesse 12 anos, com aquela emoção...

Solange relata em seguida que permanece esse sentimento platônico,


permitindo-se apenas uma relação de parceria musical, impedindo, como ocorreu
há 26 anos, um contato "mais carnal", talvez para preservar o sinal que a traria de
volta a adolescência, aos momentos, segundo ela ainda coloca, onde o "despertar
do desejo... é lindo... é mágico... não trazer isso para o mundo real", fazendo uma
distinta separação entre real e imaginário.
47

Se as marcas do caminho - os sinais - estão presentes nas narrativas, estas são


constantemente refeitas, ainda que atue com permanências importantes.

...toda história é bem contemporânea, na medida em que o passado é


apreendido no presente e responde, portanto, aos seus interesses, o que não
só é inevitável, como legítimo... o passado é ao mesmo tempo passado e
presente48.

Quando Marcos aponta as melhores condições que o "mundo de hoje" oferece


as mulheres, ele está, de certa forma, ressignificando algumas marcas que, se no
passado poderiam ser vistas de forma natural, o presente as enxerga de forma
opressiva:

...minha mãe hoje tem uma vida muito mais tranquila do que quando era
casada, hoje ela faz coisas que ela não podia fazer ou... com muito mais
naturalidade, ela não estudou... ela se sente muito mais sem repressão hoje do
que tinha... e eu acho que isso aí seria talvez o reflexo do que aconteceu de
maneira geral.

A mudança é caracterizada pela aceitação da separação do país como algo


normal, o que, em outros tempos, estigmatizava as mulheres como ele ainda
coloca:

...eu me lembro de coisas horrorosas que se falavam de uma. mulher quando


eu era adolescente ou criança... o preconceito era muito grande... a mulher
que vivia assim... uma vida... se fosse, por exemplo, descasada e saísse pra
tomar uma cerveja com um amigo ou com alguns amigos... era... as pessoas
começavam a falar mal dela e elas também tinham receio disso...

48
Le GOFFJ, Op.cit., p.51.
48

Ainda que Marcos alie a mudança à separação, muitas vezes de modo circular -
uma centrada na outra -, ele enfatiza a importância da família, talvez esteja aí o
tom "desviante" quando se apresenta como alguém que não pensa em constituir
família, como aponta Barros:

A importância do grupo familiar como referência fundamental para a


reconstrução do passado advém do fato de a família ser, ao, mesmo tempo,
objeto das recordações dos indivíduos e o espaço em que essas recordações
podem ser avivadas49.

Resgatar a experiência não é um ato apenas individual. Quando Helena


expressa seus sentimentos em relação ao ex-marido, ela assim se coloca:

eu não o quero mais enquanto homem... mas eu sinto tanta saudade daquela
situação de família... eu me organizo melhor... pessoalmente, na profissão e na
vida social...

Esse fragmento da narração de Helena expressa, de um lado, a importância


social da família, de outro, a marginalidade a que está sujeita vivendo fora das
"normas sociais", extrapolando o interesse individual e colocando uma outra
conformação de um período da história, onde a interpretação está pautada pela
interação entre o sujeito e seu mundo.

Entretanto, a conformação da vida familiar ou a importância que ela impinge a


família não deve ser considerada como "típica" de homens ou mulheres, buscando
categorias coloquem padrões de comportamento. É importante salientar que a
experiência narrada não oferece uma

49
BARROS, Myriam Moraes Lins de. Memória e fami1ia. Estudos Históricos, Rio de
Janeiro, vol.2, n° 3, 1989, p.34.
49

especificidade à memória masculina ou feminina provenientes da biologia ou


determinada nos papéis sexuais, mas afirma que a consistência dos relatos revela
uma tendência, uma orientação, uma disposição, no caso, de viver em família e os
obstáculos que sofre ao viver fora dela.

...el propósito de la investigación de histórias de vida es revelar co6mo las


personas comunes ortogan sentido a sus vidas dentro de los limites y de la
libertad que les son concedidos. Se acepta que el trabajo centrado en la vida
de un individuo es legitimo50.

O narrador também se apropria de mem6rias de pessoas do seu grupo. Helena


recorda o fascínio pela prima mais velha:

... de família - pai, mãe, essa coisa - tinha muito pouco de experiências e
histórias das histórias amorosas, se falava muito pouco desse tipo de coisa, o
que sim era uma referencia forte pra mim era uma prima que dos 10 aos 14
anos [1964-1968]... essa prima era meu ídolo, porque ela estava sempre em
muitas festinhas, tinha muitos amigos e muitos namorados. Então a coisa do
que se poderia viver em termos de histórias amorosas tinha a ver com essa
coisa dos- muitos, ou dos vários, ou dos... era uma coisa muito superficial
mesmo... um encantamento pela beleza, ou pela brincadeira, pela diversão,
muito mais do algo que tocasse, que comovesse...

A ênfase nos “muitos", colocada na fala, e determinante das relações


"superficiais", a idealização da prima não se dava por relações estáveis, indicando
uma mudança no seu comportamento e de algumas mulheres a sua volta, que
antes limitava o número de namoros até o casamento para as mulheres, anos
depois, Helena enfatiza o viver em família, uma

50
PISCITELLI, Adriana. Op.cit.
50

representação que se adequaria ao "mundo masculino", que viveria varias


experiências antes de "assentar-se" numa família.

Apropriados de outrem ou não, as memórias, ao serem narradas, contem uma


interpretação da experiência vivida, reinterpretadas pelas/os pesquisadoras/es,
que constroem um enredo a partir de outro. Entretanto, o/a historiador/a, nessa
construção, não deve ter uma preocupação em homogenizar diferenças ou
encontrar uma palavra mestra que designe os caminhos do
passado/presente(futuro, mas sim retomar categorias históricas.

A reinvenção/representação do passado através da memória, muitas vezes,


sofre uma adequação a experiência vivida pelos narradores, ainda assim essa
"memória adequada" permite trilhar um caminho que pode apontar a resistência
as permanências, ou as mudanças, do mundo contemporâneo, na medida em que
pode estar vinculada aquilo que o narrador vivencia como norma - não querer
casar-se, não querer ter filhos são situações que exigem explicações demasiado
longas.

Nenhum dos depoentes aqui contemplados detiveram-se especialmente nos


motivos que os/as levaram a casar-se ou coabitar com seus/suas parceiros/as,
entretanto, as explicações se alongavam quando "tinham"51 que explicar, talvez
para si próprios, os motivos que as/os levavam a não querer casar-se ou não querer
ter filhos.

51
A escolha do verbo e proposital, pois e quase um dever.
51

Solange, antes de constituir família, teve um relacionamento de dois anos com


um homem que lhe propunha casamento. A explicação da sua recusa somaram
duas paginas transcritas de depoimento, permeadas por um sentimento
angustiante, pois, segundo ela, havia amor de ambas as partes. Quando fala de sua
decisão por casar-se, a justificativa se reduz a uma frase:

...eu me apaixonei...

Não se trata aqui de quantificar a paixão, o amor, ou analisar os motivos que


levam uma pessoa a eleger um/a determinado/a parceiro/a , mas sim pensar na
representação que os narradores têm daquilo que e normatizado pelo social e por
elas/es próprias/os enquanto parte deste social, corroborando, incorporando e
transmitindo, ou modificando, tal normatização52.

Entretanto, há espaços para mudanças de direção, ainda que permeadas,


como aponta um fragmento do depoimento de Alberto, por longas explicações:

Quando se e novinho, você tem certa... assim... motivo... você acha que vai
casar, vai ter filhos... depois passa o tempo e você começa a olhar aquilo... não
tem nem pé, nem cabeça... você começa a juntar as coisas... nesse rol de
motivos para você não casar. E tem o aspecto legal, que e... extremamente
esquisito... você já pegou aqueles códigos? a menos de algumas poucas
diferenças isso está valendo até hoje... 50 anos depois...

52
Essas digressões sabre adequação da memória me foram suscitadas pela leitura de ROUSSO,
Henry. Usos do passado na Franca de hoje. In: van SIMON, Olga Rodrigues de Moraes. Os
Desafios Contemporâneos da História Oral. Campinas, Associação Brasileira de Historia Oral e
Centro de Memória - Unicamp, 1997, pp.11-27. (Trad. Yara Aun Khoury.)
52

Essa legislação tem um enfoque... tratando a mulher como um ser inferior... e


um ser que não tem capacidade de sobreviver sozinho e que ela depende do
marido, o marido e um provedor de sustento, dinheiro, casa... a meu ver, hoje
em dia, não tem mais nada a ver, se e que alguma vez teve, talvez no tempo do
vovô e da vovó... hoje em dia acho que isso não tem a ver... estou falando isso
no meio que a gente frequenta... porque se você vai pensar nos meios mais
pobres pode ser diferente...

A narração de Alberto coloca uma incorporação - "Quando você e novinho...


você acha que vai casar..." - onde o casamento e apresentado como uma
experiência do vir-a-ser, que terá que ser, necessariamente, vivida enquanto pane
de uma norma social. Romper com a norma requer algumas explicações causadas
desde o "passar do tempo" - que leva o indivíduo a pensar - até o requinte da
estagnação dos códigos legais.

Se para Alberto as causas do rompimento da norma estão colocadas fora dele,


Marcos as coloca como um problema seu, auto-denominando-se "diferente":

...talvez eu seja um sujeito meio diferente... não digo que não quero casar de
jeito nenhum... se aparecer "aquela mulher" (risos) pode ser..., mas eu tive
muitas experiências e nenhuma delas me deu vontade de casar... a Marcela eu
gostaria de ter casado, mas eu penso isso hoje... na época eu não pensava...
tanto que não casei, mas não me arrependo de estar só... eu gosto de estar
só... eu gosto de crianças, mas dos outros (risos)... não sei se poderia conviver
todos os dias com mulher e filhos na casa... fico pensando na liberdade... acho
muito difícil, monótono... (grifo meu)

As narrativas aqui contempladas apontam um exercício de percepção dos


narradores não só de suas histórias de vida, mas também seus projetos de vida,
(re)construindo o passado ativado pelas experiências vividas no momento,
considerando, entretanto, os projetos de vida futuros. A
53

concatenação destes tempos tem na memória um lugar de busca e aconchego,


criando vínculos entre membros de um grupo social.

Não e na história apreendida, e na história vivida que se apóia nossa memória.


Por história e preciso entender então não uma sucessão cronológica de
acontecimentos e datas, mas tudo aquilo que faz com que um período se
distinga dos outros, e cujos livros e narrativas não nos apresentem em geral
senão um quadro bem esquemático e incompleto53.

A experiência vivida, recordada e contada, pelos narradores, onde as normas


aparecem flexibilizadas e passiveis de modificação, ainda que, muitas vezes,
ancoradas em tradições, pode oferecer um mosaico diferente de um quadro final. A
apreensão dos lugares e tempos, onde as pegas são colocadas, e determinante
naquilo que conforma o social, ao mesmo tempo, individual.

53
HÁLBWACHS, Maurice. Op.cit.
Capitulo II – Gênero e experiência: uma interlocuçao?

Un infinito número de lenguajes describe el Universo,


pero solo háy un codigo que to descifra. La busqueda
de ese codigo es el infinito número de lenguajes que
describe el Universo.

Lia Herrera
55

Nas últimas décadas, diversas perspectivas tem convergido para o


questionamento de modelos, do alcance dos conceitos abstratos e da
universalização de categorias analíticas na historiografia. Contestando a separação
sujeito/objeto, essas perspectivas procuraram transformar os sujeitos - seres
dotados de historicidade, vivenciando tempos não lineares. Assim, inseridas as
temporalidades, as categorias e os conceitos transcendem esse abstrato.

Numa tentativa de abrir um caminho para compreender as representações de


gênero da documentação, este capitulo centra-se nas particularidades, isto e,
aquelas que e possível tragar com os sujeitos desta pesquisa.

Além das narrativas, foram utilizadas algumas representações de


masculinidade e de feminilidade presentes em revistas destinadas a um publico
análogo - em termos de faixa etária, classes sociais e nível de instrução - ao recorte
desta pesquisa e que colocam para os leitores questões abordadas também pelos
depoentes.

Essas representações trazem uma construção da experiência vivida, na qual se


percebe a procura de uma lógica sediada no movimento do passado. O quadro
final, composto de pequenos pedaços, apresenta um "todo" flexível, provisório e
múltiplo, abandonando concepções de histórias finitas.
56

2.1. Os caminhos da experiência

Pensar a história como uma disciplina é um exercício de fazer uma história que
se abre para a história, sem a preocupação de captar a verdade - o real - mas
buscar o movimento dessa 1ógica histórica presente no "se fazer" do sujeito. Essa
dinâmica do passado pode, muitas vezes, dar uma sensação de incompletude,
entretanto, ela preserva a relação sintônica entre sujeito e objeto, numa tentativa
de eliminar, ou no mínimo abrandar, essa separação.

A documentação apresenta uma mescla de residual e emergente, de racional e


não racional, o que impossibilita o pesquisador fazer a análise do primeiro em
separado, ou deixar de analisar aquilo que lhe parece não racional, como se não
estivesse presente no discurso, aparentemente racionalizado. Thompson, ao
criticar o racionalismo economicista alerta para a

estreita propaganda da necessidade material, que e cega a áreas inteiras de


necessidades (sexuais, culturais), que despreza os próprios recursos culturais
do povo, e que decide, sem permitir que as pessoas escolham, o que elas
realmente "querem".

O mais velho erro do racionalismo foi supor que definindo o não racional como
não fazendo pane de seu vocabulário havia, de alguma forma, conseguido
eliminá-lo da vida’54.

Deixar o discurso não racional fora da análise e, muitas vezes, uma forma de
fugir a crítica do relativismo, entretanto, tal postura oculta parte

54
THOMPSON, E.P. Miséria de Teoria ou um planetário de erros. Rio de Janeiro, Zahar
Editores, 1981, p.196. (Tradução: Waltensir Dutra.) Creio que tradução espanhola foi
mais feliz ao colocar "universo Del discurso" em lugar de "vocabulário".
57

das experiências vividas pelos sujeitos. Não é demais enfatizar, e reiterar, que o
"desocultamento" não significa apreensão do real, do todo, e sim abre a história às
ações coletivas, permeadas pelos significados que as pessoas impingem as suas
próprias ações e as de seu grupo.

A inserção da experiência na análise, o "termo ausente" de Thompson,


permite uma articulação com a estrutura - sistema aprisionado ao capital, onde a
classe social é definida pela função que ocupa e desempenha, onde as explicações
são pautadas pela necessidade.

Se a constituição da estrutura é um dado, não é preciso, necessariamente,


partir dela, pode-se fazer o caminho inverso, procurando, a partir do "se fazer" dos
sujeitos, perceber como as pessoas a mantém ou a modificam.

Como articular os significados de dois termos, aparentemente, dicotômicos?


De um lado, a estrutura - una, inflexível, permanente -, de outro, a experiência -
um processo que movimenta a determinação histórica -, apresentando um "se
fazer" do sujeito, onde a necessidade contém a consciência moral e afetiva,
podendo ser modificada pelos normas e valores.

Como são determinadas as normas? Como são constituídos, e mantidos, os


valores? Voltar-se para a experiência social – multifacetada, associada ao conflito,
inerente ao sujeito - requer um aprendizado sobre como os modos de viver
(cultura) se expressam na emergência do sujeito. Assim, "não se trata apenas de
um ponto de junção entre `estrutura' e
58

‘processo’, mas um ponto de disjunção entre tradições alternativas e


incompatíveis"55.

Apreender os modos de vida permite compreender essas relações entre


estrutura e processo, ao mesmo tempo que pode evidenciar alguns pontos de
ruptura nas tradições, fazendo emergir possíveis mudanças sociais, ainda que
ancoradas, a principio, em modelos tradicionais. A inclusão, na análise, do não
racional, apresenta a estrutura como campo de forças, expressado através dos
conflitos entre necessidades, sentimentos, valores e normas.

...as pessoas não experimentam sua própria experiência apenas como idéias,
no âmbito do pensamento e de seus procedimentos, ou (como supõem alguns
praticantes teóricos) como instinto proletário. Elas também experimentam sua
experiência com o sentimento e lidam com esses sentimentos na cultura, como
normas, obrigações familiares e de parentesco, e reciprocidades, como
valores...56

Pensar a estrutura como um campo de forças, onde as experiências vividas, ao


serem narradas, estão articuladas com o tempo - heterogêneo, fragmentado e
descontínuo - implode, ou no mínimo possibilita olhar criticamente, os estudos
onde o cotidiano aparece como imutável, contínuo e repetitivo. Perceber esses
novos, e múltiplos, tempos permite desvendar algumas tramas do passado,
bombardeando não só os "grandes fatos" cronológicos, mas concepções estanques
de classe, raça, etnia e gênero.

55
Id., ib., p.183.
56
Id.,ib., p.189.
59

As histórias de vida de mulheres e de homens, aqui denominadas "pessoas


comuns"57, pode levar à percepção do mundo em que vivem58, de como essas
pessoas percebem esse mundo e como as experiências põem em evidência esse
campo de forças no qual estão inseridas.

Falar em experiência, muitas vezes, leva à aproximações, equivocadas, da


realidade enquanto "verdade". No inicio, esta pesquisa se propunha a fazer a
história dos (des)encontros amorosos num determinado período (anos 70-90), a
inclusão de um simples artigo definido 59 modificou o significado de todo um
trabalho - uma história dos (des)encontros amorosos, caracterizando um olhar -,
incluindo o "se fazer" do sujeito na proposta metodológica.

Se a teoria da história é um corpo de questões, e não verdades prontas, a


instabilidade das categorias produz não só teorias inacabadas, como subentende a
abertura para interlocuções interdisciplinares, a exemplo do próprio Thompson que
dialogou muito com a antropologia.

57
Aquelas que não estão em evidência por sua beleza, virtude, atitudes heróicas - no
caso das mulheres -, ou poder, prestígio, dinheiro - no caso dos homens -, conforme
padrões tradicionais de feminilidade e masculinidade.
58
Piscitelli aponta: "Nas linhas interpretativas, o valor fundamental do trabalho com as
histórias de vida é o resgate da experiência, concebido como interação entre o eu o
mundo, reveladora de um no outro e de um para o outro. O que suscita interesse não e
um determinado eu particular, senão o mundo desse eu". (grifo meu) PISCITELLI,
Adriana. História de Vida, história oral e memória. Revisto de Ciencias Sociales, n° 1,
Universidad Nacional del Centro, Argentina, dezembro de 1995.
59
Seria conveniente salientar que a inclusão do amigo definido esteve perpassada por
longas discussões corn a bibliografia, que atravessou o campo disciplinar da história,
utilizando as penitentes interlocuções com a antropologia e a sociologia.
60

Realidades vividas, concretas, em contraposição a normas estáticas e fixas


transformam seres humanos abstratos, eternos, imóveis em sujeitos concretos, que
se movimentam e se desenvolvem numa época determinada60. Captar o modus
vivendi significa relacionar o quotidiano de seres humanos concretos aos sistemas
abstratos e aos processos históricos aos quais estavam inseridos.

A emergência do "relativismo" permite ainda questionar uma divisão clássica


– central/periférico, onde "periférico" entraria na análise mais como complemento
do que como determinante na política. Enfatizar aspectos periféricos, dando-lhe
status de outros definidores de política, permite a abertura do "fato histórico", que
deixa de ser considerado como único, verdadeiro e objetivo61.

A constante (re)criação dos fatos alimentou a inserção de novos sujeitos que,


ao introduzirem novos olhares, questionaram marcos explicativos centrados nos
grandes heróis, burlando/implodindo a história neo-positivista e, em alguns casos,
os paradigmas marxistas.

Perceber como são produzidas as dicotomias - mundo real/mundo ideal,


filos6ficoinão-filos6fico, superior/inferior, espiritual/material,
teórico/prático, culto/inculto, residual /emergente, arcaico/moderno, masculino/
feminino, - é uma forma de analisar o político a partir do cotidiano, invertendo a
construção histórica.

60
' FEBVRE, Lucien. Combats pour Phistoire. Paris, Plon, 1952, p.46.
61
MATOS, Maria Izilda Santos de. Outras histórias: as mulheres e os estudos dos gêneros
percursos e possibilidades. In: SAMARA, E.; SOIHET, R. e MATOS, M.I.S. Gênero em
debate. Trajetórias e perspectivas na história contemporânea. São Paulo, Educ, 1997,
pp.89-90.
61

Entretanto, é preciso cuidar para não transformar essa inversão num outro
modelo fechado e pautado por verdades absolutas. Partir da experiência para
compreender as mudanças/permanências sociais não significa produzir conceitos,
teorias e histórias estagnadas, ao contrário, existe aí uma possibilidade de
apreender os conflitos, as necessidades, as normas e os valores que emergem do
sujeito.

Este caminho pode levar a apreensão das mudanças, mas estas não são,
necessariamente, realizadas, pois, muitas vezes, o inventário do cotidiano e
acompanhado de sua negação pelo sonho, negação esta que supõe também a
ironia frente aos símbolos e ao imaginário 62.

O termo ausente de Thompson, pensado a partir da categoria classe, abriu um


caminho que da margem à percepção de outras dimensões da consciência social,
onde a construção da "classe" se daria nas relações sociais, afastando, portanto, a
idéia de separação entre indivíduo e estrutura - o sujeito produz, e é produzido,
pelas relações sociais.

Entretanto, ao trabalhar o "termo ausente", Thompson ignora a importância


da diferença sexual. Essa ausência, bastante criticada pelas feministas, apontaria
para descontinuidades intra-classe.63 Se Thompson tivesse colocado em sua análise
a questão da diferença sexual, talvez não

62
LEFEBVRE, Henry. La vida cotidiano en el mundo moderno. Madrid, Alianza Editorial,
1972, p.9.
63
''SCOTT, loan. Gender and the politics of history. New York, Columbia University Press,
1990, pp.68-90.
62

fosse possível pensar na criação de uma "identidade comum da classe"64. Não foi, e
não é, proposta desta pesquisa trabalhar o conceito de identidade, mas é instigante
o alerta de Gagnebin:

...tendemos demais a assimilar semelhnça, similitude (Ahnlichkeit) com


reprodução (Abbildung), a pensar que a imagem de uma coisa e a sua copia.
Ou ainda, a definir a semelhança em termos de identidade, dizendo que dois
objetos são semelhantes quando apresentam um certo número dos mesmos
traços65.

Pensar os sujeitos a partir de suas experiências significa trazer umaanálise de


como se deu o "se fazer", de como estão, irremediavelmente, imbricadas a
linguagem e a história.

Não são indivíduos que tem experiência, mas sim os sujeitos que são
constituídos pela experiência. Experiência nesta definição torna-se, então, não
a origem de nossa explanação, não a evidência legitimadora (porque vista ou
sentida) que fundamenta o que é conhecido, mas sim o que procuramos
explicar, sobre o que o conhecimento e apresenttmo. Pensar sobre a
experiência desse modo e historicizá-la, bem como historicizar as identidades
que ela produz66.”

Utilizar o arcabouço teórico de Thompson, substituindo classe por gênero,


como central da análise, permitiria perceber o "se fazer" do gênero. Esta poderia
ser uma porta de entrada para se pensar, numa perspectiva de gênero, como os
sujeitos pensam, vivem, constróem e

64
"Id. A invisibilidade da experiência. Projeto História (16), PUC-SP, fevereiro de 1998,
p.310.
65
GAGNEBIN, Jeanne Marie. Sete aulas sobre linguagem, mem6ria e história. Rio de
Janeiro, Imago, 1997,
66
135COTT, Joan W. A invisibilidade da experiência. Op.cit, p.304.
63

modificam o mundo. Isso não significa abandonar a classe, pois seria ignorar a
importância da interseção de categorias numa análise.

No entanto, essa centralidade do gênero poderia levar à novas identificações,


não mais de classe, mas de gênero, colando homens a masculino e mulheres a
feminino. Talvez uma saída para essa questão seja pensar gênero atravessando a
experiência, abrindo a documentação de forma a pensar como, na experiência dos
sujeitos, gênero é vivido e (re)apresentado.

2.2. Discutindo gênero

A participação da historiografia no campo das discussões interdisciplinares de


gênero possibilitou uma abertura para "outras histórias", provocando outras
inserções metodológicas, inserções estas que, aliadas à análises até então alheias à
história, permitiram perceber interseções dentro da política e do cotidiano, visto
também como espaço de poder, onde o enfoque político não estaria centrado
unicamente no Estado.

A ampla produção sobre questões de gênero, nos últimos 20 anos, converte a


escolha entre as diferentes abordagens numa tarefa bastante árdua. A proposta
desta pesquisa não é fazer uma revisão ou reunião desta produção, mas, através de
algumas leituras bibliográficas, buscar uma interlocução com os documentos.

A discussão de gênero surge de uma inquietação das feministas acadêmicas,


destacando a característica relacional, os perfis, o
64

comportamento e os padrões de feminilidade e masculinidade - definidos um em


função do outro.

Ao afirmar o aspecto relacional, essa percepção de gênero deu margem a


muitas interpretações e utilizações, talvez uma das mais profícuas esteja centrada
em deixar de ser sinônimo de "mulheres", instigando a1gumas[uns
pesquisadora/es a buscar também a partir dos homens essa política impressa no
cotidiano.

A determinação de comportamentos vista numa perspectiva de gênero -


pensado como construção histórica, social e cultural - afasta-se de naturalizações,
procurando na cultura os significados das diferenças corporais.

Nessa perspectiva, esta pesquisa esteve centrada em perceber como a


documentação apresenta ideários de feminilidades e de masculinidades e, nessa
pluralidade, apreender as significações e (re)significações das diferenças. Prestar
atenção às diferenças que se expressam nos ideários de masculinidades e
feminilidades permite contrapor-se a idéia de identidade de gênero.

Essa formulação de gênero sintetiza as perspectivas desenvolvidas no seio das


discussões feministas contemporâneas. Apesar das diferenças introduzidas no
debate67", essas discussões mantém uma certa continuidade com as questões
introduzidas a partir da década de 70. Isto é, compreender a situação desigual na
qual se encontram as mulheres.

67
"Sobre as diversas perspectivas de abordagem de gênero ver o debate publicado no
Cadernos Pagu (11), Campinas, ÚNICAMP/PAGU, 1998.
66

Mulher - Pessoa adulta do sexo feminino. 2. Esposa. 3. Mulher da plebe ou das


classes inferiores. 4. Homem efeminado.

Homem - Ser humano em geral. 2. Individuo da espécie humana. 3. Ser humano do


sexo masculino. 4. A humanidade. 5. Pop. Marido ou amante. 6. Aquele que
procede com prudência, que tem experiência do mundo. 7. Pessoa de quem se
trata.

Mulher significa, em primeiro lugar, ser o sexo feminino. O homem, antes de


ser do sexo masculino, é um "ser humano em geral", o que, simbolicamente,
engloba a mulher e não e somente uma questão semântica, na medida em que é
sabido o quanto o significado das palavras influencia o cotidiano dos indivíduos.

Outra definição que merece comentário é "esposa" para a mulher e "marido


ou amante" para o homem. Seguindo o dicionário, e quase que fazendo a trajetória
de um hipertexto, o termo "esposa" é definido como "casado, algemado", "marido"
e um sinônimo de "esposo". No entanto, a definição de homem abre uma brecha
para libertá-lo "das algemas", podendo ser "marido" ou "amante".

As definições apresentadas, de homem e de mulher, apontam para as marcas


do corpo - o sexo a que se pertence:

Feminino - Próprio de mulher ou de fêmea. 2. Relativo ao sexo caracterizado pelo ovário,


nos animais e nas plantas. 3. Gram. Qualificativo do gênero que indica os seres fêmeos
ou considerados como tais.

Masculino - Que pertence ou se refere ao sexo dos animais machos. 2. Próprio de


homem, varonil. 3. Gram. Qualificativo do gênero dos nomes que designam entes
masculinos ou objetos considerados como tais. 4. Gram. Diz-se das palavras ou nomes
que, pela terminação e concordância, designam seres masculinos ou que como tais se
consideram. S. m. O gênero masculino.
67

É evidente a ligação direta entre mulher e feminino e homem e masculino, no


entanto, não é difícil perceber normas e valores aí embutidos. Mesmo que
masculino e feminino se encontrem na definição como "próprio de homem" e
"próprio de mulher", ao masculino associa-se também a virilidade - "qualidade de
viril, idade que vai da adolescência a velhice68".

Essas perspectivas do senso comum, expressas através do dicionário,


perpassam a teoria dos papéis sexuais, estereotipados ou não, designados a
mulheres e homens. A proposta desta pesquisa segue caminhos diferentes. Pensar
em sujeitos múltiplos com identidades flexíveis e plurais é uma forma de afastar-se
da "identidade coletiva de mulheres"69 baseada na subordinação das mulheres aos
homens, ou de "identidade coletiva de homens" permeada pela dominação.

A questão da "dominação masculina" tem sido, nos últimos anos,


intensamente debatida. No entanto, os debates centrados na universalização da
dominação empobrece e "fecha" as possibilidades de interpretação histórica, na
medida em que homogeniza os sujeitos, deixando de levar em conta as classes
sociais a que pertencem, a raça, a cultura em que vivem.

68
"Dicionário Eletrônico Michaelis.
69 19
Ver a critica de BESSA, Karla A. 0 Crime da Sedução. Cadernos Pagu (2), 1994, p.193.
68

Se há uma hegemonia do masculino - ainda que perspassada por subdivisões,


gerando "masculinidades subalternas70' -, o feminino estaria submetido a essa
hegemonia, mesmo ao "masculino subalterno". Se feminino e igual a mulher,
dentro da concepção de hegemonia da dominação, restaria as mulheres aceitar sua
condição de subordinação, tornando-se oprimidas, ou rebelar-se.

As experiências vividas por algumas mulheres nos últimos 20 anos indicariam


uma "rebelião" contra aquilo que lhe estava determinado pelos papeis associados
ao seu sexo, o que levou muitos autores e pane da mídia a pensar na "estagnação"
masculina como consequencia da "evolução" feminina. Ora, essa idéia estaria
questionando a própria idéia de dominação masculina, numa perspectiva que
associa homem a masculino, quase que apontando uma inversão nas relações de
poder. As coisas não aconteceram exatamente assim.

Farge alertou para essa questão, propondo uma saída de "apreensão dialética"
do "binômio dominação/subordinação", contestando a tradicional separação entre
público e privado.71

As concepções tradicionais de feminilidade, sintetizando atributos como


fragilidade, passividade..., e de masculinidade, como força, ação...72, remete a

70
Sobre as diferentes masculinidades ver os trabalhos de CONNEL, R.W. La organización
social de la masculinidad. ISIS Internacional, Ediciones de las mujeres (24), 1997; e
ALMEIDA, Miguel Vale de. Senhores de Si... Op.cit.
71
21FARGE, Arlette. La historic de las mujeres. Cultura y poder de las mujeres: ensayo de
historiografia. Historic Social (9), organizado por LUNA, Lola. Barcelona, Promociones y
publicaciones Universitarias SA., 1994.
72
22 Outras características podem ser acrescentadas: Mulher - espontânea, alegre,
feminina, risonha, sedutora, bonita, simples, seria elegante (objeto passivo de contempla
ao do desejo) - objeto simbólico; Homem - inteligente, trabalhador, corajoso (afetuoso,
69

identidades quase fixas.

Se a documentação apresenta lugares onde mulheres e homens vivenciam


múltiplas identidades, as concepções tradicionais apontam para uma identidade
primeira, que gere as "outras", de forma a facilitar a normatização de
comportamentos. No entanto, as diferenças colocadas, pela documentação aqui
analisada - entre mulheres e homens, entre homens e homens e entre mulheres e
mulheres -, mostram um "se fazer" constante, onde a estabilidade ou fixação para
identidades femininas ou masculinas não tem lugar.

Pensar gênero como o "...o saber que estabelece significados para as


diferenças corporais...73” explicita um conflito, antes pensado como consenso, onde
se articulam as relações de poder. "Desnaturalizar" significa pensar masculinidades
e feminilidades como construções sociais de sujeitos históricos que, como tais,
estão em constante movimento, dando historicidade ao próprio conceito.

Gênero assim proposto induz a uma reflexão sobre como as distintas


percepções dos relacionamentos amorosos ou as ações de homens e de mulheres,
em suas trajetórias, consideradas como introdutórias as mudanças ou
permanências, expressam concepções, consagradas, de

seguro) - sujeito social. Ainda que estes atributos estejam pensados por Bozon para a
Franca contemporânea, penso que eles se encaixam também na representação de
homens e mulheres na documentação aqui contemplada, permeadas por adições e
subtrações. BOZON, Michel. Amor, sexualidade e relações sociais de sexo na Franga
contemporânea. Revisto de Estudos Feministas (1), 1995.
73
"SCOTT, -Joan Wallach. Prefacio a Gender and Politics of History. Cadernos Pagu (3),
1994, pp.12-13.
70

masculinidade e de feminilidade. Em muitos momentos as concepções de gênero


se entrecruzam nas falas destes homens e destas mulheres e, na sua multiplicidade,
formam uma trama onde feminilidades e masculinidades se pluralizam e dão
margem a perceber como participam nas varias identidades aí criadas.

Partindo das identidades múltiplas dos sujeitos inseridos na história, a


documentação abre um leque de possibilidades para problematizar as construções
de feminilidade e de masculinidade, enquanto normatização.

A noção de identidades múltiplas abriu caminhos para pensar que a rigidez


daquilo que e visto, pensado e vivido como norma, ou como transgressão, também
aparece nuançado, o que supera, de alguma forma, o binômio emergente residual,
arcaico/moderno.

Neste sentido, uma das "normas" contestadas pelo movimento feminista,


ainda que afirmasse a existência da subordinação universal feminina, foi
desvincular feminino de posição inferior, colocando em cena um questionamento
sobre o caráter natural dessa subordinação: "Um `natural' que se deriva,
basicamente do biológico: a biologia determinaria as funções e espaços destinados
a mulher e seria a causa de sua `posição social inferior.74

Ora, se e questionável que o dimorfismo sexual seja determinante. nas


"funções" sociais de mulheres e homens, também e questionável que as

74 21
PISCITELLI, Adriana. Relatório Final do Projeto Integrado de Pesquisa
CNPq(PAGU(ÚNICAMP: História e memórias femininas, 1996, p.2.
71

relações entre os sexos estejam definidas segundo padrões estabelecidos pelo fato
de pertencerem a um ou outro sexo.

Vários grupos feministas percorreram este caminho, particularmente os


grupos de auto-reflexão. Ainda que, a princípio, a tônica fosse a "mulher", o
aspecto relacional perpassava as discussões. No entanto, até pouco tempo, os
homens não tinham uma organização, no sentido institucional e pessoal, capaz de
refletir algumas questões por eles vividas. Simultaneamente a essas organizações,
há todo um desenvolvimento dos estudos de masculinidade, alguns deles,
influenciados pelas perspectivas feministas, que, pelo fato de serem recentes,
justificam uma abordagem mais detalhada.

Os estudos sobre masculinidade trouxeram "novos" ares aos estudos de


gênero, antes identificados com estudos de mulheres. Através de algumas
questões, colocadas por estes estudos, está pesquisa propôs-se a analisar os
significados da representação de homem e de masculinidade e de mulher e de
feminilidade, que os narradores, algumas revistas, destinadas a um público
semelhante ao recorte dos depoentes, e alguns textos escritos por profissionais
liberais que, embora sejam textos acadêmicos, apresentavam uma auto-reflexão.

Em outubro de 1985 um grupo de homens organizou, para homens, o


"Simpósio do homem", que resultou no livro Macho-masculino-homem, a
sexualidade, o machismo e a crise de identidade do homem brasileiro75.

75
GANDINO, A. Macho, masculino, homem: a sexualidade, o machismo e a crise de
identidade do homem brasileiro. Porto Alegre, LUM, 1986. Este livro foi o resultado das
discussões ocorridas neste encontro. Alguns textos apontam uma reflexão mais geral,
72

Uma conclusão óbvia, expressa no titulo do livro, era que os homens brasileiros
estavam em crise, de um lado, pelas mudanças ocorridas no comportamento das
mulheres e na moral sexual, de outro, pelo "fardo" de sua posição dominadora.

Alguns analistas enxergaram este tipo de organização como uma resposta, ou


um enfrentamento, ao movimento feminista. Outros, entretanto, enfatizavam a
"especial idade" destas discussões como próprias de alguns homens que estariam
em busca de uma qualidade de vida melhor. Não e o caso aqui de tomar uma
posição por uma ou outra análise, mas trazê-las como representações que estes
homens fazem do gênero.

De que falavam esses homens?

O homem acreditou no mito que se fez dele. O homem acreditou que deve ser
autoritário, imbatível e único capaz de sustentar a fami1ia.
Em relação ao sexo, nem se fala; nada mais resta saber. A sua vasta
experiência sexual" o coloca como responsável pelo orgasmo feminino. Mas
será que alguém que evita tanto o contato, que dificilmente exprime afeto ou
que tem tanta vergonha de seu próprio corpo, pode ter uma boa vida
sexual?(...)
O homem precisa refletir mais sobre si mesmo. Ele precisa reaver a sua
capacidade de ver e sentir a relação com o próximo, procurando associar
a ação com a emoção.76

Logo na introdução, Moacir Costa, um dos organizadores do evento, coloca


algumas questões que indicam uma postura auto-reflexiva em relação ao fardo de
ser homem. Moacir indica a construção dos modos de ser e viver para o homem ao
colocá-lo como mito, ao mesmo tempo, ao

ligadas a área de atuação do autor, outros são perpassados por um tom de depoimento,
quase um ‘desabafo".
76
"COSTA, Moacir. Introdução. In: GANDINO, A. Op.cit., pp.7-8.
73

propor a associação entre ação e emoção, evoca um sentimento, que as diferentes


correntes atribuem ao feminino.

"Macho-masculino-homem" é uma expressão que, além de criar uma


identidade de gênero, cria uma identidade especifica para o homem brasileiro,
quase que apontando uma essência dentro daquilo que essencializa pessoas do
sexo masculino.

Falar em "crise de identidade o homem brasileiro" pressupõe, de um lado,


uma homogeneidade bastante difícil, senão impossível, de ser caracterizada, se não
e levado em conta raça, classe, inserção social. De outro, afirma a necessidade das
definições, afastando o "perigo do indefinido77".

A importância dessas discussões e inegável, na medida em que trouxeram


outros olhares que impulsionaram a inserção de novas categorias de análise nos
estudos acadêmicos, categorias estas que permitiram questionar alguns binarismos
reguladores das concepções de masculino e feminino, ainda que criassem outros a
exemplo do aparecimento da "nova" mulher x "crise de identidade masculina".

Alguns estudos, que tratam a "crise de identidade masculina" como


consciência do aparecimento da "nova mulher", indicam que os homens
necessitam "repensar sua identidade a partir das mudanças ocorridas no
comportamento feminino”78.

77
CORRÊA, Mariza. A natureza imaginaria do gênero. Cadernos Pagu (5), Campinas,
I.WICAMP/PAGL~ 1995, p.125
78
Depoimento de um psiquiatra que trabalha com homens de baixa renda no Hospital
das Clinicas em São Paulo. Isto e, n° 1322, 01/02/95. Esse trabalho de reflexão de homens
74

Partilhadas por outros, quase depoimentos, havia aí uma alusão que um "novo
homem" deveria ser criado para poder/conseguir relacionar-se com essa "nova
mulher":

E minha opinião que os movimentos feministas tem muito têm contribuído para a
reflexão sobre a necessidade deste novo homem. A nova mulher tem influenciado de
forma sutil - feminina! - o reposicionamento do homem, que busca uma posição nova e
mais interativa na cultura atual.79

Aparentemente, estes estudos homogenizam homens e mulheres, apontando


novos estereótipos para o masculino e para o feminino, criando uma armadilha
onde a multiplicidade dos sujeitos e novamente escamoteada.

Outros trabalhos apontam para uma crise de identidade frente ao masculino,


sem que essa apareça como herdeira do feminismo, o que "reduziria a
complexidade da cena contemporânea a problemática de gênero"80.

Na concepção euro-ocidental moderna, um homem, para não ter sua


masculinidade questionada, teria que enquadrar-se no padrão de desempenho de
algumas funções: provedor, forte, ativo, viril, agressivo e determinado. Nolasco
propõe que aquilo que está sendo chamado de "crise

foi criado nos EUA e Canadá para ajudar os homens a redefinir suas relações com mulheres
emancipadas. No Brasil, esse trabalho e desenvolvido pelo psiquiatra Luis Cuschinir, professor
do Departamento de Psicologia da USP e coordenador do Gender Group.
79
BOECHÁT, Walter. Os arquétipos masculinos. In: NOLASCO, Sócrates. A desconstrução...
Op.cit, 1995, p.33.
80
NOLASCO, Sócrates. A desconstrução do masculino: uma contribuição critica a análise de
gênero. In: NOLASCO, S. (org.) A desconstrução do masculino. Rio de Janeiro, Rocco, 1995, p.23.
75

de masculinidade" tenha estatuto próprio, não seja tratada de forma funcional,


advinda do feminismo - os homens estão em crise porque a mulher mudou:

...essa nova masculinidade solicita que um homem seja sensível, mas sem que isso
comprometa sua virilidade, do mesmo modo, ele devera ter iniciativa na vida, sem que,
com isso, seja agressivo, violento ou competitivo.81

Entre parênteses, no inicio do século XX as mulheres, representadas na


literatura e nos folhetins, já demandavam "homens mais delicados, que revelassem
seus sentimentos".82

As propostas de trabalhos como o de Nolasco apontam algumas modificações


para o comportamento dos homens, onde, nas "novas" construções do masculino,
seriam questionados comportamentos violentos e agressivos, buscando a
"sensibilidade", sentimento tido como "naturalmente" feminino, paradoxalmente,
a ênfase na manutenção da virilidade reforça o binômio masculino/feminino, na
medida em que sugere uma "essência viril", mesmo que o resgate, ou apreensão,
da sensibilidade, aponte para a multiplicidade dos sujeitos inseridos na história.

Quando gênero atravessa as discussões, e necessário perceber como os


interlocutores desta pesquisa pensam suas masculinidades e feminilidades e como
pensam suas relações amorosas, sua sexualidade, enquanto mulheres

81
Id. Um Homem de Verdade. In: CALDAS, Dario. (org.) Homens. Comportamento,
sexualidade, mudança 7a. Identidade, crise, vaidade. São Paulo, Editora SENAC, 1997,
p.21.
82
"SCHPUN, Monica Raísa. O amor na literatura. Um exercício de compreensão histórica.
Cadernos Pagu (8(9), Campinas, PAGU/ÚNICAMP, 1997, p.190.
76

e homens, não esquecendo que as condições culturais especificas - cruzamentos


entre raça, classe, etnia... - são indispensáveis.

A maioria dos trabalhos acadêmicos que relacionam a "crise de identidade


masculina" com o aparecimento da "nova mulher" tratam de masculinidade como
sedimentada em "papeis" masculinos desempenhados pelos diversos personagens.

A associação de masculinidades e feminilidades com o que fazem,


respectivamente, homens e mulheres, permite pensar que a suposta inversão dos
papeis geraria uma crise de identidade dos homens, como se estes estivessem
contra aquilo que lhes foi determinado, como se estivessem "fora de lugar".

Perceber que essa "crise" não se deve a inversão de papeis exige uma
abordagem diferente. Quando homens e mulheres escolhem o que fazer de suas
vidas - sua opção sexual, profissional ou de lazer - implodem aquilo que,
supostamente, lhes e (pré)determinado pelo sexo e abrem outros caminhos para
compreender as representações de masculinidades e feminilidades, através dos
quais é possível questionar binarismos que hierarquizam as relações - "um dos
modos de privar a hegemonia masculina e sua heterossexualidade compulsória de
suas premissas primárias mais valiosas"83.

Neste sentido, a "crise de identidade masculina" poderia ser vista como outra
forma de viver a masculinidade, da mesma forma, a "nova mulher"

83
33 BUTLER, Judith. Variações sobre sexo e gênero. Beauvoir, Witting e Foucault.
In: BENHÁBIB, Seyla & CORNELL, Drucilla. Feminismo como critica da modernidade. Rio
de Janeiro, Rosa dos Tempos, 1987, p.151.
77

estaria vivenciando outras feminilidades, abrindo-se a novas, no sentido de


diferentes daquilo que lhe foi determinado pelo sexo, identidades.

É certo que outras formas de vivenciar masculinidades e feminilidades podem,


muitas vezes, inferiorizar ou desvalorizar homens e mulheres, ante as definições
correntes

Tenho tantas duvidas! Mas quando a gente se junta [referindo-se as reuniões


sociais entre os homens] só da pra falar de futebol, de mulheres alheias, da
conjuntura política, da divida externa e da cotação do dólar.
Falar (...) sobre os nossos sentimentos masculinos, não dá mesmo. Como será
que você se sente quando está sem vontade de fazer amor e só faz por
obrigação, para não decepcionar a companheira?
Você percebe o seu corpo? Se acha bonito ou feio? Você já achou outro
homem bonito? Como e que você se sente com seu pênis? Se for pequeno ele
o envergonha? Você o esconde? E suas nádegas? Como você as sente? Eu fico
até sem jeito de saber essas coisas...84

Essas questões abrem brechas para pensar as diferentes maneiras de viver as


masculinidades, no entanto, ficar "sem jeito de saber [perguntar] essas coisas"
implica num questionamento de se um homem "pode" se formular essas questões
e continuar sendo homem.

Em suas "reflexões sobre a identidade masculina", DaMatta coloca que uma


brincadeira comum entre homens, na sua adolescência - de apalpar a bunda dos
meninos com a pergunta "tem pente aí?" -, era um "gesto ritual" que moldava a
masculinidade, qualquer reação de maior sensibilidade ao toque nesta região
poderia ser interpretada como pouco masculina.

"ser homem" não era apenas ter um corpo de homem, mas mostrar-se

84
COSTA, Reinaldo Pamplona da. Pênis, pra que te quero? In: GANDINO, A. Op.cit., p.10.
78

"masculino" e "macho" em todos os momentos. Como a brincadeira do "Tem


pente aí?" indicava, ninguém devia (ou podia) esquecer essa condição, nem
mesmo quando conversava despreocupadamente com os amigos numa área
publica da cidade. Um dos pregos da masculinidade, portanto, era uma eterna
vigilância das emoções, dos gestos e do próprio corpo.85
Estar atento - "vigilante" - às emoções, aos comportamentos, pode significar
uma certa "fragilidade na própria definição de masculinidade86", fragilidade está
que compromete o centro da definição - a heterossexualidade compulsória”87.

A difusão dos estudos de masculinidades traz alguns retornos e cria algumas


armadilhas. Mesmo que alguns estudos os sobre masculinidade e as narrativas
apontem para uma flexibilização, o masculino se apresenta vinculado ao homem e,
aparentemente, não abre mão de algumas características determinadas pelo sexo a
exemplo da virilidade. Como aponta Costa, "um dos principais ganhos que o
conceito de gênero trouxe, quando aliados as correntes estruturalista e pós-
estruturalista, foi a negação epistemológica de qualquer tipo de essência a
mulher88'.

Um segundo retorno está no aspecto relacional da definição de gênero, na


medida em que reforçar um dos termos, e aqui empresto a reflexão de Piscitelli, e
"limitar os aportes":

85
DAMATTA, Roberto. Tem pente aí. Reflexões sobre a identidade masculina. In: CALDAS,
Dario (org.). Homens. Comportamento, sexualidade, mudança. Identidade crise, vaidade.
São Paulo, Editora Senac, 1997, p. 37.
86
ALMEIDA, Miguel Vale de. Gênero, masculinidade e poder. Anuário Antropológico/95,
Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1996, p.163.
87
BUTLER, .Judith. Variações sobre sexo e gênero. Op.cit.
88
COSTA, Claudia de Lima. O trágico do gênero. Cadernos Pagu (11), Campinas,
PAGU/UNICAMP, 1998, p.134.
79

Após densas discussões em torno do gênero terem aberto penosamente os


caminhos para pensar na interação entre multiplicidade de categorias e diversas
conceitualizações de masculinidade e feminilidade, inclusive em espaços que
tendiam a ser considerados, até pouco tempo atras, como homogeneos, que
sentido faz a "nova enfase num dos lados das categorias (de genero)...89

Essas questoes indicam o cuidado que o pesquisador deve ter com aquilo que
se apresenta como novo. "Novo homem", "nova mulher", "novas enfases" podem
mascarar permanencias que definem as relações de poder.

2.3 - "Engendrando" a experiência na história


Voltando ao termo ausente de Thompson, a experiencia foi proposta como um
caminho que articularia a consciencia social, partindo de "uma" classe construida
nas relações sociais. Ao pensar genero como uma diferenciação que atravessa a
experiencia, percebe-se como as constr-uções de masculinidade e feminilidade
atravessam, de forma descontinua e plural, a relação entre homens e mulheres,
entre homens e homens e entre mulheres e mulheres.
Quando "grupos de homens", ou alguns trabalhos academicos, apontam para
a "crise da masculinidade" sugerem que o masculino e inerente ao homem e nao
uma construção de genero que pode ser descolada de homem. Sugere tambem
uma ideia de homem homogeneo, mesmo que o localize em alguns paises ou
continentes, criando identidades,

89
PISCITELLI, Adriana. Gênero em perspectiva. Cadernos Pagu (11), Campinas,
UNICAMP/PAGU, 1998, p. 155.
80

a exemplo do "caliente homem latino". Como aponta Oliveira: "...os homens


brancos de classe media quando se olham no espelho se veem como um ser
humano generalizavel. Eles nao estao capacitados a enxergar como o genero, a raça
e a classe afetam suas experiencias"90.
Colocar a "questão do poder", como sugere Perrot91, no centro das relações
entre homens e mulheres, permitiu sair do aprisionamento economicista,
enquanto principal, as vezes unico, definidor das relações entre individuos.
Partindo das experiencias de vida aqui relatadas as representações sobre as
formas de amar estiveram perpassadas pela diferenciação entre masculinidade e
feminilidade e, nao consequentemente, entre hornens e mulheres.
Se nas formas de amar as representações tradicionais, tal como definida pela
cultura do Ocidente, associam homem a razao e mulher a emoção, dando-lhe um
sentido de complementariedade na relação, cabe perguntar se, nesta suposta
transição de um modelo tradicional para um modelo onde as descontinuidades
afloram, as categorias masculino e feminino continuam norteadoras para a leitura
dos comportamentos individuais de homens e mulheres.

90
OLIVEIRA, Pedro Paulo de. Discursos sobre a masculinidade. Revisto de Estudos
Feministas (1), primeiro semestre de 1998, p.91.
91
PERROT, Michelle. Os Excluidos da Historia. Operarios, Mulheres e Prisioneiros. Rio de
,Janeiro, Paz e Terra, 1988, p.184. (Tradução: Denise Bottmann.)
81

Para a larguissima maioria das pessoas, para o nivel a que nas Ciencias Sociais
chamamos senso comum, ser homem e fundamentalmente duas coisas: nao
ser mulher, e ter um corpo que apresenta orgãos genitais masculinos92.

Se Almeida esta certo, ao falar de Pardais e essa representação e extensiva a


documentação aqui analisada, a definição de homem para o “senso comum” se da
pela negativa - "nao ser mulher". As definições tradicionais e o "senso comum"
apontam/normatizam que aos homens cabe a proteção da familia, dos filhos e das
mulheres, e as mulheres cabe cuidar dos homens da família e dos filhos e, em anos
mais recentes para uma consideravel parcela da população, tambem da profissão.
Se essa representação de mulheres coloca o domestico como um espaço de
afirmação identitaria, cabe a questao se essas "novas mulheres" nao criaram outros
espaços de afirmação, possibilitando outras identidades agora vivenciadas fora do
"mundo das mulheres".
Tanto as mulheres que aqui relataram suas experiencias, quanto as mulheres
lembradas nos relatos dos homens criaram "outras" identidades, mas ainda
aparecem identidades fundantes, globalizadas, a exemplo da maternidade. Mesmo
no caso dos depoimentos de Alberto e Marcos, que nao tem filhos e nao se
propoem a tê-los, as representações que fazem de suas parceiras, ainda que essas
tambem nao tenham filhos, e acompanhada do "atavico" desejo de ser mae.

92
ALMEIDA, Miguel Vale de. Senhores de Si. Uma interpretação antropologica do
mosculinidade. Lisboa, Fim de Seculo Edi~bes, LDA, 1995, p. 127.
82

Algumas imagens parecem sugerir "novas" definições positivas de


masculinidade e feminilidade. Ao mesmo tempo, elas recorrem a construçoes que
poderiam ser pensadas como "tradicionais" para provocar o efeito de "novas",
utilizando uma linguagem de papeis sexuais, na qual a permanencia da virilidade e
permeada por uma certa sensibilidade.
Entretanto, paradoxalmente, suscita a abertura para pensar o genero como
"um modo de vivenciar as estruturas, onde existem multiplas feminilidades e
masculinidades”93. Como, e onde, e formada a imagem de que o homem tem que
ser viril, de onde saem expressoes correntes como "mundo dos homens" ou
"mundo das mulheres"? De que mundo se esta falando?
Helena questiona se o fato da independencia e auto-suficiencia de mulheres
como ela nao "feminiliza os homens", referindo-se tanto aos seus parceiros, quanto
a educação de seus filhos94.
Sera que meus filhos, ao verem uma mae tao forte, independence,
autosuficiente nao acaba fazendo com que eles se tornem mais femininos?
Sim... porque isso e um problema prá quando eles forem se relacionar com as
mulheres... eu nao quero um homem feminino... acho que as mulheres nao
querem homens femininos... podem querer homens mais sensiveis...

O questionamento de Helena sugere que feminilidade e masculinidade sao


inerentes, respectivamente, a mulheres e homens. Ao colocar-se como forte,
independente, auto-suficiente, caracteristicas pensadas tradicionalmente como
masculinas, acaba por perguntar-se se os homens

93
ALMEIDA, Miguel Valle de. Senhores cle Si... Op.cit.
94
Helena tem dois filhos homens.
83

nao se feminilizariam, uma forma de enfatizar a relação de complementariedade


entre os sexos. No entanto, de forma paradoxal, ela clama pelo homem mais
sensível.
Alberto enfatiza a importancia de ter como parceiras mulheres que tenham
uma profissao "desde que ela nao se torne um homem... se ela perde o seu modo
feminino de ser, ela deixa de me seduzir enquanto mulher". E evidence a
essencialização no imaginario de Alberto, mesmo aplaudindo a inserção
profissional das mulheres com quem se relaciona, implodindo a oposição "mundo
dos homens x mundo das mulheres", a essencia feminina deve ser preservada.
Se as marcas do corpo aparecem como definidoras nas historias de vida aqui
relatadas, o estreitamento dos limites dos "mundos" - de homens e de mulheres - e
as supostas mudanps na organização da família95 indicariam algumas mudangas nas
relações entre homens e mulheres, o que nao significa, necessariamente, uma
mudança nas relações de poder, pois "a direção da mudança nao segue um unico
sentido”96.
Assim é questionavel a identificação, quase unica, do homem com o trabalho -
poder fundador de sua identidade - ou de alguns tipos mapeados pela publicidade
para retratar a mulher: escrava-empregada,

95
Sobre as mudanças na organizaçao familiar ver GOLDANI, Ana Maria. As fam1ias no
Brasil contemporaneo. Cadernos Pagu (1), Campinas, UNICAMP/PAGU, 1993; e
ROMANELLI, Geraldo. Familias de camadas medias: a trajet6ria da modernidade. Sao
]Paulo, USP, Tese de Doutorado, 1986.
96
SCOTT, Joan W. Genero como categoria tirfil de analise historica. Op.cit. p.14.
84

objeto-sexual, boneca deslumbrada, burra e ingenua encantada”97, ou mais


recentemente, a mulher executiva, a workaholic numa tentativa de sintetizar
identidades de homens e mulheres, esta certo Hamawi ao ressaltar a importancia
de refletir sabre o equivoco de alguns autores que tentam encontrar uma nova
identidade masculina [e feminina], cometendo o erro (muito masculino e
muito moderno) de supor a possibilidade de uma nova sintese (...) trata-se,
portanto, de encontrar simplesmente novas names, novas apreciacoes e novas
possibilidades para o “ser homem” 98.

A explicitação das diferenças numa maneira essencialista aludem para o modo


de ser de homens e de mulheres, impingindo comportarrentos diferentes pautados
pelo dimorfismo sexual.

(...) Para nos, homens, parece nonsense o bailado feminino depois da copula.
Nao compreendemos coma elas conseguem permanecer passarinhando ao
nosso redor, esfregando seus pezinhos frios na nossa canela e beijando nossa
orelha, se nao ha nenhum motivo gritante para isso. Já nao cumprimos nossa
missao, passo a passo - caprichamos nas preliminares, olhamos por dentro
delas, usamos devidamente a camisinha contra gravidez e doencas? Elas ja nao
estao coradas e felizes? Que mais esperam de nos, depois de tamanha
explosao de energia? Nao entendo. (...)

(...) Pago por todos os opressores da historia da humanidade - e quem sou eu?
Um oprimido, um homem que nao pode viver seu fastio pós-coito sem sustos,
porque sabe que um quarto de hora mais tarde estara de novo no alto da
montanha-russa da testosterona, prestes a implorar de joelhos que [elal o
encha de beijos e ouca as perversoes que guardou para ela. Quem e o usado
aqui? (...)
(...) Sexo e prisao. Doce prisao. Se ha alguem escravo numa relacao de sexo,
somos nos, os homens. O desejo nos acorrenta as mulheres; o momento pos-
97
SIQUEIRA, Frailda Brito Garboggini. A mulher margarina: uma representacao
dominante em comerciais de TV nos anos 70 e 80. Dissertacao de Mestrado, Multi-meios,
Unicamp, 1995, p.112.
98
HAMAWI, Rodolfo. Que querem as homens? In: NOLASCO, Socrates. (or,,.) A
desconstru;ao... Op.cit., p.12.
85

coito nos liberta. Nos sentimos livres, por alguns momentos, daquela angústia
permanente que e nosso desejo ancestral de copular com todas as mulheres
do mundo, liberar nossos espermatozoides e proliferar nossas sementes sobre
a terra99.

Mesmo que. a representação dos comportamentos de hornens e mulheres


seja aqui colocada de forma um tanto esteriotipada ela e perfeitamente adequada
ao nome da coluna - "O homem sincero". Talvez esteja aqui expressado o que
muitos homens pensam, mas nao tern coragem de dizer.
Se as "algemas" que prendiam o homem, na definição do dicionario, esta dada
pela sua condição de "esposo", uma condição instituida pelo casamento, a
representação que Hernandez faz da prisaofliberdade esta diretamente atrelada ao
fato de ser possuidor do sexo masculino, colocando, de um lado, a testosterona,
como uma essencia que impele - "o desejo ancestral de copular com Codas as
mulheres do mundo". De outro, esse desejo essencializado se afirma como
produtor da felicidade das mulheres.
A introdução dessa documentação bastante recente se deu pela proximidade
de algumas questoes colocadas, de forma nuançada, em alguns depoimentos.
Marcos aponta algemas de suas expectativas em relação as mulheres com quem se
relaciona:

A Telma era uma grande companheira de cama, porque parece que ela me
entendia na cama, nao no lance do sexo... mas ela era boa de cama (risos)...
deitava e dormia no cantinho dela... tem umas que vem pra cima, tentam

99
Hernandez, Fabio. O fastio pas-coito. Vip Exame, outubro de 1997. (Seçao "Atitude",
coluna "O homem sincero".)
86

dormir abraçadas, de maos dadas... nao aguento isso... acho que passado
aquele momento [referindo-se ao ato sexual] a gente quer um pouco de paz...

"Paz" e ao "fastio-pós-coito" adquirem aqui significados semelhantes,


sugerindo que, após o "cumprimento da missao", os direitos devam ser
reivindicados e exercidos. Esses "direitos" sao motivos de insatisfação para Maria,
que nao entende porque os homens nao gostam de carinho logo após o ato sexual:

...e lógico que estou falando daquilo que eu experimentei... mas os homens
com quem estive sempre se colocam enfastiados com alguma aproximação
depois que terminam de fazer amor... deitam e dormem (risos)... a1guns ate
justificam que isso e porque o orgasmo pra eles e tao intenso que ficam muito
cansados... mas eu nao sei nao! sempre tenho duvidas e acho que dormem
porque nao gostaram, mas quando vejo que nao foi coisa de uma única noite e
que esta sendo muito bom quando estamos juntos... penso que pode ser
diferente mesmo para os homens e para as mulheres...

Ainda que Maria tambem busque uma explicação biológica para


comportamentos construidos social e culturalmente e para as diferenças, no seu
desentendimento, nao ha uma reivindicação de direitos, mas sim um certo
desencantamento.
Alberto, ao descrever um amigo, reforçap uma ideia de homem definida pelo
comportamento:

Celso e um cara assim que nao consegue viver sem mulher, nao no aspecto
sexual, ele e assim... como um parasita, ele gruda e vai atras, se a mulher falar.
"vamos a direita..." ele vai, nao e ele quem decide, ele precisa estar colado
numa mulher pra sobreviver, se a mulher der um pé-na-bunda dele e um
negócio gravissimo... e um "bundao" mesmo!
87

A fala de Alberto traz algumas questoes. Adjetivar um homem como "bundao"


e algo que denigre sua imagem, afinal a bunda e algo "intocavel" nos homens,
mesmo simbolicamente. Alberto aponta que "ficar sem mulher" nao significa deixar
de "fazer sexo", coisa que Celso, aparentemente, nao conseguia, pois necessitava
de uma relação, o que pode significar que este homem nao faz a separação entre
sexo e afeto. Isso, aliado a vivencia de situações onde se apresenta como parasita,
onde a mulher e quem toma a decisao, o torna "bundao".
Se deslocar masculinidade e feminilidade de homens e mulheres permite o
afloramento pleno da simbologia de genero, ancorado na realidade das relações
sociais, os documentos, aqui analisados, "impoem o limite”100 entre masculino e
feminino, na maioria das vezes, essencializando homens e mulheres, ao mesmo
tempo em que pluraliza suas identidades. Talvez aqui esteja a porta de entrada
para uma dessencialização que nao seja apenas discursiva, mas onde o conceito de
simetria esteja presente nessa pluralização.
Fazer uma analise que pane da experiencia dos sujeitos, atravessada pelo
genero, pode levar a outras conformações sociais, onde mulheres e homens "nao
sao", "se fazem" e, neste "se fazer", alocam, (re)alocam ou deslocam atributos
antes determinados segundo o sexo a que se pertence.

100
O limite imposto pelo material empirico foi colocado como questao por Adriana
Pisictelli ao entrevistar Miguel Vale de Almeida. Cadernos Pagu (11), Campinas,
UNICAMP/PAGU, 1998, p.213.
Capitulo III – "Concordo em genero, numero e grau..."

Se as identidades mudam ao longo do tempo


e em relação a diferentes contextos, nao podemos utilizar
modelos simples de socialização que veem gênero
como um produto mais ou menos estavel da educação
na primeira infancia, na famí1ia e na escola.
Joan Scott
89

"Concordo em gênero, número e grau" é uma fala popularmente utilizada


quando alguém, em conversas informais, quer enfatizar sua concordância com
outras falas. Frases de infância que permaneceram e que, hoje, talvez possam ter
algum significado. Por que retomá-la? Número lembra quantidade e grau evoca
evolução e essas duas categorias não estão contempladas nesta dissertação, mas
gênero – “uma maneira de se referir à organização social da relação entre os
sexos”1 - é aqui utilizado para pensar o "se fazer" dos sujeitos, perpassado por
identidades múltiplas, criando masculinidades e feminilidades.
Este capitulo busca apreender, num dialogo mais intenso com a
documentação, as diferentes formas de amar de homens e de mulheres2 e ate que
ponto essas representações estao permeadas pela normatização daquilo que o
senso comum considera como masculino e feminino.

...muitas vezes nao esta claro a que o "papel masculino" ou o "papel


feminino" se referem. Em alguns casos sao usados para referir-se a um
ideal normativo de comportamento; em outros casos, referem-se a
estereotipos de papeis do homem ou da mulher3.

1
SCOTT, Joan. Genero: uma categoria util de analise historica. Educação e Realidade,
Porto Alegre, 16(2), jan/dez de 1990, p.5.
2
Por uma questao de recorte, e apenas par isso, esta pesquisa limitou-se a tratar de
relações heterossexuais.
3
COSTA, Claudia de Lima. O Leito de Procusto: genera, linguagem e as teorias feministas.
Cademos Pagu (2), 1994, p.148.
90

3.1 - O que dizem as mulheres...'4


O primeiro olhar de Helena para os homens e lembrado como um
encantamento. Platonico e o termo usado para definir essa primeira relação, o
beijar, o falar com um homem era um misterio que aguçava a curiosidade. Sua
narrativa e datada, o encantamento que se inicia aos 10 anos,

...isso foi se estendendo dessa mesma forma, de viver o encantamento, de nao


buscar exatamente uma aproximação... ate os 14 anos, que o momento que eu
começo a ter o meu primeiro namorado, a primeira situação que me coloca
como estando mesmo, ou assumindo uma relação ai com um rapazinho...

Do encantamento Helena passa a querer descobrir esse misterio, e começa a


desvendar o que nascia da curiosidade. Os primeiros contatos mais físicos sao
lembrados como mecanicos, ao mesmo tempo que saciava a curiosidade, Helena
experimentava sua valorização atraves do outro.

...aquela histdria meio que comum mesmo, de it descobrindo como e que


beija, era uma coisa muito mais... ah!... como e que fala?... muito mais
mecanica... ele era muito bonito, eu lembro dele ser loiro, de ser meio que o
menininho que chamava muito atenção das meninas, entao tinha uma coisa
tambem por ai, de ter a curiosidade de como e estar com um rapazinho la, mas
tambem um pouco de desfilar...

O encantamento de Maria inicia-se com a curiosidade e passa para a sedução -


seduzir e ser seduzida. Isso ocorre no final dos anos 60,

4
As fala das "mulheres" refere-se aquelas que se dispuseram a dar seus depoimentos
para esta pesquisa. A idade, situação conjugal, profissional e inserção de classe social das
personagens - Helena, Maria e Solange - foram descritas no primeiro capitulo desta
dissertação.
91

momento em que ja se iniciam os questionamentos sobre o confinamento das


mulheres ao "ser seduzida" ou a ter um namorado "firme"5:
...ah! eu nao sei bem o que me acontecia... eu começava a namorar, gostava
muito de namorar e achava que estava apaixonada, mas logo aparecia outro e
eu me apaixonava de novo... acho que eu gostava mesmo era de me apaixonar
(risos)... mesmo quando tava apaixonada nao deixava de olhar para outros
meninos e eu era sempre correspondida... e... eu era muito popular... (risos)

Maria aponta, a exemplo de Helena, para "o desfilar", entretanto, de formas


diferentes. Helena procurava, ao "desfilar com o outro", uma forma de auto
valorização, e estende isso tambem ao rapaz com quem desfila:

eu lembro dele ser loiro, de ser meio que o menininho que chamava muito
atenção das meninas, entao tinha uma coisa meio de querer... de sentir-se
valorizada pelas mulheres (...) acho que da parte dele talvez tinha uma coisa
muito parecida...

O depoimento de Helena indica que a valorização, tanto dela como de seu


parceiro, estaria vinculada ao fato de "ficar" com alguem e poder exibir o/a
parceiro/a como se fosse um trofeu.
Maria "desfila para o outro", aparentemente, sem que o outro seja,
necessariamente, um homem. Essa diferença marcará a trajetoria de ambas no
momento em que elas entram numa relação conjugal.
As diferentes nas percepções, de uma mesma situação, entre as mulheres
entrevistadas, questiona e ultrapassa o discurso hegemonico a

5
Ver PEDERIVA, Ana Barbara Aparecida. ,Jovens tardes e guitaras, sonhos e emoções:
fragmentos do movimento musial-cultural .Jovem Guarda. Sao Paulo, Ponti-ficia
Universidade Catolica, Dissertaçã de Mestrado, 1998.
92

partir dos enfrentamentos aos quaifs as "mulheres" estariam sujeitas. Se para


Helena havia um fascinio "meio comum mesmo" pela descoberta de "como beijar"
e "desfilar", Solange coloca seu primeiro beijo, ocorrido em uma viagem com o
pessoal da escola, como uma transgressao6:

...o Marquinho sentou comigo e na volta da viagem ele me deu um beijinho no


rosto e ai... [risos] eu nunca mais falei com ele, ate hoje. Foi uma loucura, me
semi tao puta, tao suja, tao envergonhada por um beijo no rosto... eu tinha 12
anos, mas foi uma coisa, uma violencia... [risos]7

Os "risos" ao final desta fala foram sentidos, e explicitados pela depoente, ao


mesmo tempo como uma ironia e uma surpresa com sua propria fala - "tao puta,
tao suja" -, na medida em que ela se ve como muito carnal e sensual, tentando
uma explicação para essa "unica" experiencia pensada como rejeição/transgressao:

...hoje eu fico pensando que eu queria que continuasse desse jeito, porque e
tao magico, tao lindo que eu acho que a gente teria que continuar fazendo
poesia e música junto... mas nao trazer isso nunca para o nivel do real. Acho
tambem que tem a ver com o despertar do desejo, porque aos 12 anos, na
verdade... e... foi a primeira sensação de desejo, foi o primeiro homem que eu
desejei depois do meu pai.

Solange passa do sentimento de transgressao para a experimentação de um


romance onde apreende o amor, a sensualidade. Em nenhum

6
A utilização da palavra transgressao implica a existencia de uma norma, em nenhum
momento explicitada ou questionada claramente pelas depoentes. O beijo em publico,
mesmo que no "escurinho do cinema" ainda corria o risco de olhares reprovadores. Ver
PEDERIVA, Ana Barbara Aparecida. Op.cit.
7
Solange coloca "ate hoje", porque na noite anterior, apos 20 anos, ela havia se
encontrado com Marcos, seu amor da infancia, como ela mesma o denominou.
93

momento coloca sua primeira relação sexual como uma perda, no caso, da
virgindade. O momento e marcante, colocado como ganho, apesar da reação
violenta manifestada a princípio.

...eu lembro que a gente estava numa turminha no clube e ele... ele me
segurou, ele me prendeu... não sei o que ele fez, que eu meti um tapa na cara
dele [risos] e a gente começou a namorar, meio cinematográfico... foram tres
anos de descobertas, de sensualidade... ele era muito livre, foi me ensinando o
amor de uma forma muito linda, com muito carinho, com muita paixao, e uma
fase que eu guardo saudade, porque acho que e a forma mais bonita que uma
mulher pode ter de conhecer o amor... um primeiro amor vale um romance...

Percebe-se aqui uma dupla transgressao - às normas estabelecidas e aos seus


ideais de relacionamento, obviamente, permeados por estas mesmas normas. De
um lado, sua fala "tao puta" poderia ser ambígua nao fosse seguida de "tao suja",
deixando claro uma alusao a prostituição vista enquanto suja e pautada pela
violencia 8. De outro, havia um "ideal" de relacionamento que nao passava pelo
toque, mas pela "comunhao de almas". A fala de Solange expressa uma separação
entre "real" e "ideal".
A partir do primeiro contato mais fisico com um rapaz, Helena lembra um
período de muitas festas, muita gente - a turma -, muitas viagens e muitos
namorados, e tinha como modelo uma prima com quem conviveu dos 10 ao 14
anos,

8
"No imaginario social, o homem que procura as prostitutas o faz por interesse sexual.
Ou entao como explorador, cafetao, ou alguem no papel de autoridade moral ou legal..."
ANDRADE, Leandro Feitosa. Uma relação diferente entre homens e mulheres na
prostituição feminina. In: ARILHA, Margareth, RIDENTI, Sandra G. Unbehaum e
MEDRADO, Benedito. Homens e Masculinidades. Outras Palavros. Sao Paulo, Editora
34/ECOS, 1998, p.271.
94

...eu idolatrava minha prima, e ela tinha muitos namorados... em termos de


historias amorosas tinha a ver com essa coisa dos muitos, ou dos varios... era
uma coisa superficial mesmo, um encantamento pela beleza, ou pela
brincadeira, pela diversão, muito mais do que algo que tocasse, que
comovesse, que era muito o que essa prima me fazia sentir da vivência dela.
...ate entao eu permanecia virgem. Os meus namoros eram muito rapidos, uma
diversidade muito grande, mas que permaneciam muito mais na coisa de
beijos e abraços...

De outra forma, Helena esta em busca de diversao... esta em busca de


vivenciar a curiosidade pelos homens, mas a virgindade e preservada. Essa questao
so e colocada com um homem que vira a ser o "homem de sua vida", como ela
mesma coloca. Ela lembra que esse era um tema dificil, a “perda" da virgindade
teria que ser vivida como um momento muito especial, como se ela tivesse que
"ser seduzida" para isso, nao era somente sua vontade, ou curiosidade, indicando
as concepções consagradas de masculino e feminino, onde o homem e o detentor
da ação e a mulher, passivamente, "se deixa seduzir":
...vem o lance das caricias, onde eu resisto bastante a gente poder ter uma
relação sexual mesmo... ele me propunha e eu acho que ele me propunha de
um jeito muito pouco sedutor... era uma coisa meio exigida... eu justificava pra
ele que era uma coisa que eu temia bastante, que eu tinha a impressao... que
eu nao me reconheceria mais, como se isso me fizesse sentir outra pessoa, que
eu nao saberia bem qual era e que eu tinha medo disso...

Maria tambem tinha muita curiosidade com relação aos homens, mas queria
guardar sua virgindade:

...não queria que um momento tão especial fosse vivido dentro de um carro,
como aconteceu com algumas de minhas amigas (...) nós faziamos tudo, a
gente se tocava sem limite, mas quando ele propunha de transar... ah! eu
tinha medo, medo de que ele nao me quisesse mais, isso era uma coisa que
95

minha mae e minhas tias me diziam sempre; "minha filha, os homens quando
conseguem o que querem [a virgindade] eles vao embora e nao dao nem
tchauzinho... desaparecem..." eu achava isso exagerado, mas conseguia me
segurar... por medo, eu acho9.

Estas tres mulheres abordam a questao da virgindade de formas diferentes.


Solange não enfatiza essa questao, Helena tinha medo de tornar-se outra mulher e
"nao mais se reconhecer" e Maria tinha medo de ser abandonada, incorporando,
ainda que nao racionalmente, o discurso da mae e tias, ao entregar o seu "bem"
maior.
A narrativa de Maria e difusa quando, ao mesmo tempo, critica a fala da mae,
pensada por ela como um "exagero", e aponta para o seu proprio medo. Um medo,
como aparece claramente no discurso da mae e das tias, pautado pelas "regras do
namoro a antiga"10.
Ainda que nos anos 70 a questao do namoro nao se colocasse exatamente
dessa maneira, a virgindade era um "bem" valioso que somente deveria ser trocado
por um casamento tradicional ou por uma relação estavel com grandes
possibilidades de casamento.
Isso acontece em meados dos anos 70 onde a virgindade e amplamente
discutida como "nao-valor”11 e questionada pelo movimento feminista12,

9
Maria deixa de ser virgem quando se casa, aos 22 anos.
10
"...a maioria dos rapazes... exigia rigorosamente das namoradas e noivas que nao
tivessem sido tocadas por outros, de preferencia nao tendo estado noiva nem namorado
seriamente". AZEVEDO, Thales de. As regros do namoro a antiga. Sao Paulo, Atica, 1986,
p.118.
11
VAITSMAN, June. Op.cit.
12
MORAES, Maria Lygia Quartim de. Op.cit.
96

discurso este incorporado par Maria e Helena, a primeira apontando o "exagero"


da fala da mãe, e a segunda, declarando, de um lado, que "nao tinha a virgindade
como valor", de outro, que, ao deixar de ser virgem, nao mais se reconheceria. Ou
ainda Maria que se dizia envergonhada "por ter ficado virgem durante tanto
tempo", provocando o espanto de suas amigas.
A ambiguidade desses depoimentos remetem a intrinseca relação entre
arcaico e moderno, onde aquilo que aparece como novo encontra-se numa relação
de dependencia cam o, tradicionalmente, estabelecido, sem, no entanto, deixar de
apontar outros rumos para pensar as relações afetivas das depoentes. O que,
aparentemente, e contraditorio aponta um constante "se fazer".
Ha um corte no depoimento de Helena quando ela começa a narrar o inicio e
o desenrolar de seu relacionamento com Máximo - "o homem mais importante de
sua vida". Desaparecem as festas, as viagens, a "turma". A relação e construida a
dois, somente os amigos dele sao incorporados ao casal, suas lembranças relatam
que a entrada na vida dele coincidem com o abandono de sua vida anterior.
Helena faz algumas tentativas de incorporação de seus amigos, mas nao
obtem sucesso, e afasta-se deles. Helena cobrava que acontecimentos importantes
- primeira relação sexual, casamento, gravidez – fossem tratados de forma especial.

Eu tinha uma coisa muito tradicional, mas nao acho que seja so a coisa do
tradicional, e como se eu quisesse viver os momentos com uma certa coisa do
especial, e isso nunca aconteceu, e principalmente quando tivesse alguma
97

coisa mais especial, aí e que parece que tinha que ser vivido como algo
comum.

O "tradicional" aí presence pode ser remetido a acomodação de uma relação


constituída na familia. O afastamento da "turma" tem como compensação a
"especialidade de momentos", especialidade relacionada a entrada na “vida" do
outro, quase que abrindo mao da sua propria. Tanto Helena pensa desta maneira
que poucos sao os momentos em que ela fala de sua profissionalização.
No sentido contrario esta o depoimento de Solange, que faz uma separação
dos momentos em que cabia ou nao um casamento. Primeiro, seu medo de
acomodar-se no casamento; segundo, sua satisfação na busca pela
profissionalização, assim expressado num momento em que ela rompe uma relação
de 6 anos, ja corn casamento marcado, apartamento comprado, decorado, em vias
de "estabilizar-se":

...esse ciclo marcou um periodo... aquele período que a gente tem sonhos de
ter uma famíia... de ter um amor pra toda vida, eu sentia que tinha alguma
coisa que me impedia, que eu nao queria uma estrutura familiar... normal,
tinha medo de ficar velha e gorda, matrona, cheia de filhos, encostada... sabia
que ele me supriria financeiramente, de certa forma eu queria isso, mas por
outro lado... ia me impedir de crescer... tinha medo de me acomodar na
relação...

Solange aponta o casamento como gerador de um perfil de mulher - gorda,


velha, matrona, encostada... -, apontando, de um lado, que os cuidados com o
corpo passavam pela sedução inesperada, nao mais possível numa relação estavel,
onde o "seu" homem estaria conquistado, de outro, a
98

possibilidade de construir uma estrutura familiar fora dos padroes “normais", que
impedia o crescimento profissional das cônjuges.
Helena conta que seu fascínio por Maximo faz com que ele se sobreponha a
algo que "deveria" ser mais importante - ser mãe13. Se, no final dos anos 70, a
sexualidade ja nao se pautava somente pela procriação, o direito ao corpo e ao
prazer sexual eram motes que nao questionavam a maternidade como um dever
para a mulher, ainda que algumas mulheres, na pratica, questionassem esse "dever
ser"14. Helena relembra um episodio de uma viagem que Maximo lhe propoe,
quando o segundo filho era recém nascido:

...e eu deixo meu bebe... isso me da uma dimensao de como o espaço desse
cara na minha vida e bem maior do que o meu de mae, um fascinio que eu sou
capaz de largar minha cria15 para ir atras dele. Eu morria de medo de nao fazer
isso, nao conseguia nao fazer, minha impressao era de que se eu nao fizesse
era uma escolha: ou ele ou os bebes.

Helena se coloca dividida entre o medo e a culpa16. Medo de perder o marido,


se nao o acompanhar, culpa por deixar os filhos pequenos aos

13
"...durance seculos as maneiras de encarar o casamento e a posioo de mulher
condensaram-se no principio de que o matrimonio era, menos para o gozo sexual e a
luxuria, para a procriação.. ". AZEVEDO, Thales de. As regras do namoro a antiga. Sao
Paulo, Atica, 1986, p.99.
14
"Dar a luz e um compromisso, um dever moral...". ARDAILLON, Danielle e CALDEIRA,
Teresa. Mulher. individuo ou fam~1ia. Novos Estudos CEBRAP 2(4), abril de 1984, p.5
15
Grifos meus.
16
"A mulher, mater dolorosa, sofre calada e se sente responsavel e culpada pela dor
alheia, em particular pelo fracasso da relação amorosa". MATOS, Maria Izilda Santos de.
Dolores Duran. Experidncias Bodmias em Copacabana dos anos .50. Rio de _Janeiro,
Bertrand Brasil, 1997, p.104.
99

cuidados de outras pessoas da familia. Aqui, culpa e medo fazem parte de uma
construção social, como parte das normas estabelecidas para o feminino, onde a
maternidade "deveria" ser predominante nos seus desejos, suplantando seus
impulsos. Onde esta Helena? onde esta sua individualidade, sua independencia do
outro? Ela mesma responde:

Eu nunca tive desejos, o meu desejo era entrar no desejo dele. Eu tinha
absolutamente pavor de contrariar, de frustrar... a minha sensação era essa
que ou era assim ou era nada, por outro lado, acho que estava fascinada
mesmo, fa atras, eu largava qualquer coisa, nada no mundo era mais
importance do que estar com ele... era isso... talvez me custasse muito pouco
renunciar a amigos, a trabalho, a filhos, o que me importava era estar ao lado
dele e acabou17.

Dedicação e renuncia aparecem como condição as possíveis, mas no caso


improvaveis, gratificações "reais ou simbolicas"18, retomando a ideia do
"casamento feliz" dos anos 40/ 50 onde "o homem e o ponto de referencia; se ele
esta bem, o casamento vai bem"19.
Renuncia e uma palavra que aparece com uma certa frequencia nos
depoimentos de Solange e Helena, ainda que os significados sejam distintos. Se
Helena podia renunciar a tudo para estar ao lado do "homem de sua vida", Solange
resistiu muito ao casamento com medo das renuncias que teria que fazer e Maria
"usa" o casamento como uma fuga da situacao de

17
Grifos meus.
18
TRIGO, Maria Helena Bueno. Amor e casamento no seculo XY. In; D'INCAO, Maria
Angela. Amor e Famfia no Brasil. Sao Paulo, Contexto, 1989, p. 90.
19
BASSANEZI, Carla. Revistas Femininas.... Op.cit., p.129.
100

vigilancia familiar, em busca de uma nova vida. E evidente seu incomodo ao se auto
relatar como transgressora:

...nao é que eu não gostasse dele... Marco Antonio era muito interessante, me
apresentava um mundo em que... as coisas mais simples que eu queria fazer,
eram vistas pela minha família como transgressão e eu me tornei uma
transgressora... com Marco Antonio era diferente, as minhas transgressões
eram a mais pura normalidade... eu me "encontrei" com ele e as pessoas que
conviviam com ele...

Tanto Maria quanto Helena se separam das suas "turmas" para incorporar, no
caso da primeira, e ser incorporada, no caso da segunda, pelas relações dos seus
maridos, tal separação se apresenta de forma diferente no desenrolar da vida de
ambas. Helena, ao ser incorporada, passa, quase todo o tempo, tentando provar
que merece essa incorporação, colocando-se numa posição inferior.
Maria apresenta a incorporação como uma decisao própria e vive certo
"deslumbramento". Marco Antonio e apresentado como "salvador", de certa forma
o "principe moderno" que a salva da "mediocridade" familiar, mas nao se sente
devedora, ao contrario, ela “se faz" dentro da nova "turma".
Incorporar-se ou ser incorporada20 faz toda a diferença no desenrolar de suas
vidas. Ainda que ambas tenham se casado dentro dos padrões

20
A distinção entre incorporar-se e ser incorporada pode ser analoga a distinção entre
identificação e mimese onde "na primeira, estende-se um processo de invasao que um
determinado ser social (pai, mae, professor, [maridol, personagem literario, histórico,
cinematografico etc.) produz sobre o sujeito... na segunda - a mimese -, o sujeito escolhe
alguns pedagos caracteristicos de outs pessoa reinterpretando-os criativamente para
produzir uma assimilação bem seletiva, parcial e inovadora". CANEVACCI, Massimo.
Apresentação. In: GOLDENBEG, Miriam. Toda Mulher e meio Leila Diniz. Rio de
janeiro/Sao Paulo, Record, 1995, p.11.
101

tradicionais - igreja, veu, grinalda, festa e viagem de nupcias - com um verniz de


modernidade, justificado pela exigencia das familias, e claro o encantamento de
ambas no ritual. Helena descreve a cena:
No casamento eu estava absolutamente deslumbrada, eu lembro de sorrir de
um jeito, que o padre, quando dava o sermao, nao entendia muito... eu sorria
muito pra ele... eu sorria mais para o padre que para o noivo... era como se o
noivo nao tivesse sentido esse momento tao especial...

A primeira viagem que Helena se permite fazer sem a companhia da família e


sugerida pelo marido. Ela descreve um "descobrir-se" fora da dualidade
mae/amante, mas sempre com a perspectiva de que essa dualidade era a que mais
importava21.
...eu fico muito interessada em poder me perceber... eu to achando muito
legal essa historia de como e estar nas coisas, eu fico muito, muito feliz, acho
muito legal ter algumas sensações por mim mesma, meio que me retomando...
quando chego em minha casa... fico absolutamente decepcionada... ninguem
me espera.

O que Helena conta das sensações sobre a viagem esta aí transcrito, as duas
paginas seguintes do seu depoimento sao dedicadas a decepção, o que levou a uma
importance crise no seu casamento. A emoção marcou esta parte do depoimento,
deixando ver que Helena, apesar de ter gostado muito da experiencia de estar só,
tinha muito presente a familia, tanto que sua emoção se da no momento da volta:
"ninguem me espera", é como se

21
SALEM, Tania. O velho e o novo: um estudo de papeis e conflitos familiares. Petropolis,
Vozes, 1980, p.65.
102

ela quisesse provar, para si mesma, sua importancia para o marido e filhos, queria a
sensação da ausencia sentida por eles, queria a ansiedade presente naqueles
olhares, isto nao acontece.

Maria tambem vive uma certa angustia de fazer-se necessaria na família, mas
sua narrativa incorpora uma necessidade de profissionalização, a princípio, para
adequar-se, ou ser mais respeitada pelas pessoas com as quais convivia para, no
momento seguinte, incorpora-la como uma necessidade para si propria.

3.2. O que dizem os homens...22

Alberto busca na memoria quando aparece seu interesse pelas meninas,


apontando que o namoro tinha algo de concreto. Mais que curiosidade, sua fala
aponta uma especie de competição que, ao final, traria um trofeu - o beijo,
exercendo “o que e esperado de um menino: virilidade, agressividade e
determinação”23.

...eu tinha 3 ou 4 anos quando corria atras dal menininhas da rua(risos), eu


queria namorar com as menininhas das rua. Namorar, naquele tempo, era... se
conseguir dar um beijo na menina era ...(risos) era um negocio..., e eu sempre
andava correndo atras disso.

22
Da mesma forma que a fala das mulheres, a fala dos homens refere-se aos depoentes
aqui contemplados - Alberto, Pedro e Marcos -, tambem apresentados no primeiro
capítulo delta dissertação.
23
NOLASCO, Socrates. A descontrução do masculino: uma contribuição critica a analise
do genero. In: A descontrução do masculino. Rio dejaneiro, Rocco, 1995, p18.
103

Alberto afirma nao acreditar em relacionamentos de longo prazo como propoe


a instituição do casamento, enfatizando a legislação que o rege como algo que
colocaria a mulher num patamar inferior ao homem.

Essa legislaoo tem um enfoque, a meu ver, assim, tratando a mulher como
sendo um ser inferior, e um ser que nao tem capacidade de sobreviver sozinho
e que ela depende do marido, o marido e um provedor de... sustento,
dinheiro, casa... entao, o nosso casamento e feito... baseado nesse
pressuposto, que a meu ver, hoje em dia, nao tem mais nada a ver, se e que
alguma vez teve...

A instituição do casamento e apresentada como geradora da desigualdade


entre homens e mulheres, onde o homem, enquanto marido, aparece como
provedor. A "inferioridade da mulher" e apontada por ele como uma construção
social, referindo-se a legislação que estabelece os contratos matrimoniais, no
entanto, a "essencia feminina" sera enfatizada na busca da mulher ideal.

Alberto teve a primeira namorada "de fato" em 1974, aos 19 anos, um


relacionamento que durou 7 anos, mas ele nao fala muito, passa rapidamente para
Ruth, sua parceira mais importante, a unica mulher que morou com ele:

Ruth e uma pessoa extremamente madura, assim, uma pessoa... todo mundo
gosta dela, ela e super... simpatica... e uma pessoa ponderada, um pessoa que
tem muito bom-sendo, muito inteligente, nao e linda de morrer, mas ela cativa
por isso: uma pessoa extremamente viva, inteligente, esperta... e uma pessoa
que tem assim... qualidades... ela consegue perceber as coisas, ela é... sabe
aquele sexto sentido feminino?...24
24
Os grifos na transcrição dos depoimentos são devido à ênfase que os depoentes
colocam.
104

Entre o primeiro e o terceiro depoimento, Alberto apresenta duas versoes para


justificar o fim da relação com Ruth, no primeiro, aponta a cohabitação, no
terceiro, a infidelidade:

...com a Ruth eu fiquei... acho que... olha... mais de 5 anos, a gente chegou a
morar junco e tal... aí foi o começo do fim (risos)...
... a mais importante e a Ruth, sem duvida, of tem um negocio, quando... como
começou o quiprocó com a Ruth? É... eu sai com a Noemi uma vez, e a gente
ta... e eu sai com ela, foi isso que detonou toda a crise...

Alberto e Ruth formavam um casal onde havia uma forte amizade. An-Les de
decidirem morar juncos, eles ja dividiam um projeto profissional, que continuou
apos a separação. Essa questao aponta para a dificuldade de, nas palavras de
Heilborn, "estabelecer o equili'brio entre a unidade, que encapsula os sujeitos, e a
preservação do senso de individualidade nos casais igualitarios"25.

Um dos poucos momentos de emoção no depoimento de Alberto foi quando


falou da separação de Ruth, ainda assim, a emoção estava mais voltada para a
melancolia do que para a dor da separação:

...terminar relacionamentos nao e facil... entao voce tem... aquele... sei la...
aquele vasinho que voces foram comprar... aquilo passa a ter um significado
que... nao e o valor do vasinho, entendeu?

25
HEILBORN, Maria Luiza. Dois e par. Conjugalidade, genero e identidade sexual em
contexto igualitario. Tese de Doutorado em Antropologia Social, Rio de Janeiro, Museu
National-UFRJ, 1992, capitulo 3.
105

Alberto ve o sexto-sentido feminino como uma caracteristica natural das


mulheres, isso fica mais claro quando ele aponta o jeito feminino de manipular as
situações, ao referir-se a sua mae e mais adiante a Ruth:

...consegue manipular uma famlia inteira... sem... praticamente nao fazer


nada, voce mexe os pauzinhos, e um polrtico, essa e que e a pessoa certa, esse
e que e o inteligente... porque tem os homens da fami1ia tambem, como e que
leva todo mundo no bico? com a aquele jeito feminino, leva no bico... a Ruth
mexe os pauzinhos dela o tempo todo, mesmo que ela nao consiga, mas voce
ve que e uma coisa etica...26

Alberto enfatiza que a inteligencia nao esta relacionada com a educaoo


formal, e da natureza das mulheres, que ele idealiza, usar esse "dom" feminino
para vencer as dificuldades e manipular as situa~bes, tragando os caminhos para
que seus desejos se realizem "sempre com sutileza e feminilidade". A
"feminilidade" se sobrepbe e, de certa forma, se apodera da "natural" esperteza
masculina, "porque tem os homens da familia tambem, como e que leva todo
mundo no bico?".

Pedro coloca o casamento, paradoxalmente, como causador de, e solução


para, problemas. Uma das solugbes que seu casamento com Flavia trazia era o fato
dele poder centrar-se, conseguiu terminar uma faculdade sempre interrompida
pela sua intensa militancia polftica, iniciada precocemente nos primeiros anos da
decada de 70, mas no fragmento do depoimento que segue, observa-se que os
impedimentos a realização de

26
Ao enfatizar que a inteligencia nao esta necessariamente ligada a educação formal,
Alberto fala de sua mae: "uma mulher extremamente inteligente, que nao tem mais que
o curso primario, e dedicou sua vida basicamente a educaoo dos 3 filhos".
106

projetos tambem estavam centrados no “jogo de sedução permanente”, já nao


necessarios quando os dois resolvem morar juntos:

...o casamento centra as pessoas, de cal maneira que elas possam se dedicar a
outros projetos que nao o jogo da sedução permanence quando se esta
solteiro... ao mesmo tempo isso traz embutido uma contradição... quando
voce toca sua vida no seu proprio progresso material... torna o casamento o
liquidificador do romantismo... essa e uma contradição que eu nunca consegui
entender muito bem.

Se o romancismo se "liquidificava" no casamento, este trazia uma


solidariedade somente possfvel numa relação afetiva por ele pautada. Pedro fala
de uma maior aproximação com Flavia atraves da "solidariedade na dificuldade",
tanto nas financeiras quanto nas enfermidades.
A relação de Pedro e Flavia comportava conversas sobre relações com outros
parceiros fora do casamento. Flavia propunha que tudo fosse falado, mas Pedro,
como ele mesmo diz, "impos" que somente seria dito aquilo que fosse considerado
importance,

...porque se ela tivesse, ou eu tivesse, uma historia sem importancia... eu nao


quero que voce me diga porque eu you ficar encanado por algo que nao tem
importancia e se for tao importance pr-6 voce me falar, nao precisa falar, so
diga que nao me quer mais e fica com a outra pessoa... nao tinha que falar.

As falas de Alberto e Pedro se encontram na "etica" para o primeiro e na


“lealdade" para o segundo. Alberto fala da manipulação como uma caracterfstica
tambem "natural" das mulheres. Pedro percebe a manipulação como uma grande
mudanga na condição das mulheres, quase como se elas tivessem aprendido a
trabalhar uma característica natural:
107

... as ilusoes que a gente tem quando e adolescence ou quando esta na


maturidade e que voce controla as relações. Isso pra mim e completamente
errado... as relações sao controladas pelas mulheres, essa mudança e muito
clara... a capacidade de sedução e, de alguma maneira, de trabalhar mais com
a questão afetiva e muito feminina.

O controle das relações estaria pautado por uma maior compreensão da


afetividade, "inerente" as mulheres, fazendo com que elas passassem ao domínio
da relação. Tal mudança e percebida atraves da "pulverização" de sua família, onde
ele descreve o pai, a mae, o irmao e, particularmente, a irma: "uma mulher
submissa, que herdava as tradições das mulheres submissas".
No seu relacionamento conjugal, Pedro se diz "reprodutor", ainda que de
forma diferente, de um comportamento muito semelhante aos dos homens da
geração de seu pai e avo, ainda que façã uma auto-critica em relação a "bigamia",
termo utilizado por ele, que pautou suas relações desde a adolescencia,

... no fundo, eu acabei reproduzindo superficialmente a historia da... a historia


que pai gostava de fazer, era a coisa mais horrivel... na verdade, aquilo que as
pais dos pais faziam, que era ter uma mulher e ter uma amante, coisa mais...
(ah?) indigesta pra alguem que se julgava progressista, que se julgava liberado
desse tipo de coisa...

A diferença encontra-se na sua atitude quando Flavia se encanta com outro


homem. Atitute de "hombridade", como ele mesmo coloca, afastando-se da
relação para dar-lhe um tempo de decidir entre ele e o
108

outro, talvez uma diferença que caracterize a mudança, onde ele se permite "ser
homem" sem ter a mulher como responsavel pela sua honra27.
Entretanto, Pedro faz uma critica as mulheres e as revistas dedicadas ao
publico feminino, quanto a explicitação de suas relações com os homens:

As mulheres sao mais bocudas com isso... dizem: "que maravilha ter um cara
que nao se cansa... nao dorme depois da primeira... esta la a disposicao,
absolutamente disposto", as mulheres estao descobrindo uma coisa que elas
foram podadas durante muito tempo, sua propria realizacao sexual, isso as
futiliza... mas elas tem o direito de se futilizar... eu nao gostaria que isso
acontecesse com alguem que eu gostasse... nao gosto dessa leviandade... e
uma certa falta de gentileza e as vezes isso pode servir muito de humilhacao
prá gente...

Se a honra de Pedro ja nao pode ser maculada pelas relacoes extra conjugais
de sua parceira, sua masculinidade - aqui vista como "desempenho" - e
questionada atraves da comparação, apontando uma "certa ambiguidade e/ou
coexistencia entre o que se considera correto-moderno e os valores e papeis
tradicionais do homem heterossexual que tem que afirmar sua masculinidade"28. E
apresenta os homens como mais comedidos e menos “perversos”:

... as mulheres adoram dimensões, voce nao ve um homem medindo um


peito... os homens nao entram muito nessa historia, voce pode ouvir "essa
mulher e muito boa de cama", mas nao entra na posicao, no jeito... e muito
raro isso... muito raro... o grau de intimidade que voce precisa prá chegar
27
Sobre a honra dos homens definida pelo comportamento das mulheres, ver MALUF,
Marina e MOTT, Maria Lucia. Reconditos do mundo feminino. In: SEVCENKO, Nicolau.
(org.) História do Vida Privado no Brasil 3. Republica: do Belle Epoque a Era do Radio. Sao
Paulo, Cia das Letras, 1998, p.382.
28
KALCKMANN, Suzana. Incursoes ao desconhecido. Percepcoes do homens sobre a
saude reprodutiva e sexual. In: ARILHA, Margareth, RIDENTI, Sandra G. Unbehaum e
MEDRADO, Benedito. Homens e Mosculinidades... Op.cit, p.94
109

a isso e grande... e quando se fala disso nao se fala com um grau... uma forma
meio sordida, ja esta entrando numa discussao mais seria... evidentemente
que existe ai um grau de degeneração geral entre as homens... que tem
relação um pouco a ter atitudes de... que e [falarl dos termos da piranha,
galinha, perua...

Ainda que veja como degeneração, Pedro aponta que alguns homens dividem
as mulheres entre "serias", e estas ameagam sua masculinidade quando falam de
"dimensoes", e as "piranhas, galinhas, peruas", cujos comentarios "nao sao levados
em conta".

O adjetivo "galinha", que pode ser empregado tanto para um homem quanto
para uma mulher, produz reações diferentes, dependendo do sexo. Para um
homem e enaltecedor ser chamado de galinha, quase como dizer "e isso ai,
cumprindo seu papel"! Mas nao e somente uma questao de papeis, esta aí
embutido uma construção onde o desejo sexual para os homens e atavico,
incontrolavel, enquanto que para as mulheres seria permeado por uma relação de
amor. Assim, quando o adjetivo e empregado para definir uma mulher, ele a
desqualifica.

Pedro ressalta que ha uma diferença entre adjetivar uma mulher como
"galinha" numa "roda de mulheres" - "isso nao e ofensivo" - e numa "roda de
homens" - "aí ela fica puta mesmo"29.

29
O "Folhateen" fez uma rapida enquete: "Coma e a garota galinha, segundo as homens".
As respostas, dos adolescentes entre 15 e 20 anos, nao difere muito daquilo que Pedro
narrou em seu depoimento: "e a mulher que transa com qualquer um", "a galena fala
muito delas, dizem que e so chegar e sair, nao precisa nem chavecar muito"; "eu
conhei;o muitas assim, elas acabam ficando faladas. O camarada sai com ela, e na
primeira vez ja transam.. ". Agradeço a Rafael Salazar par ter me alertado sabre
110

Diferente de Pedro e Alberto, Marcos nunca teve experiencia de conviver na


mesma casa com nenhuma de suas parceiras. As histórias de seus relacionamentos
sao pautadas pela impossibilidade, ora pelas condições geograficas, ora pelas
condições matrimoniais de suas parceiras. Ele nao se declara um solteiro convicto,
mas tambem nao procura "desesperadamence" uma relação conjugal:

...eu tenho uma vida muito boa, saude, eu tenho conforto, um bom emprego...
tenho meus amigos... sou um privilegiado... nao sou um solteirao convicto,
mas tambem nao e porque nao tenho uma companheira ou coisa que seja...
uma mulher, uma namorada... que eu you ficar... correndo atras... se pintar...
se encontrar alguem que eu sinta necessidade de viver junto... pode ser...

A fala de Marcos e dissonante de sua geração que acreditou na ideia


modernista de unidade, de complementariedade", e talvez continue acreditando,
mas sofre um paradoxo com a "expansao da individualidade”30.
Quando Marcos fala da mulher ideal, ele descreve uma amiga - Alessandra -
com quem teve um relacionamento mais íntimo no final dos anos 80, e que agora
sao muito amigos. Ele assim a descreve:

...essa pessoa me atrai muito, ela e muito inteligente... e tem uma coisa que eu
gosto: ela tem muita iniciativa, a mulher pra mim tem que ser inteligente, tem
que ser atualizada politicamente... acho que eu gostaria que ela fosse mais
atualizada e inteligente que eu... muitas mulheres nao me satisfaziam do lado
intelectual, a última namorada que eu tive acrescentava pouco e a relação
estava ficando desequilibrada...

pertinencias das discussoes deste Folhateen comemorativo do Dia International da


Mulher. Folha de S.Paulo, "Folhateen", dia 08 de março de 1998.
30
VAITSMAN, Jeni. Flexiveis e Plurais... Op.cit, p.179.
111

O equilibrio da relação e aqui subordinado as caracteristicas da parceira,


destacando a inteligencia. Marcos nao fala, em nenhum momento de
"feminilidade" ou de “jeito feminino", para ele, o sucesso de um relacionamento
estaria condicionado a igualdade.
Essa individualidade tão necessaria a Marcos encontra eco no depoimento de
Alberto, que coloca o relacionamento ideal como aquele onde nao existe
cohabitação. No entanto, Marcos, ao colocar-se como um homem "fora dos
padroes", faz uma referencia a padroes sociais que "impoem" o casamento, os
filhos e a formação de fam1ia, diferente de Alberto que, ao sugerir a falencia dos
contratos matrimoniais, busca sair de um modelo de felicidade conjugal pautado
relações tradicionais.

3.3. Homens e mulheres: novas buscas?


A separação de Helena, Maria e Solange foi acompanhada de muita dor,
angustia e incerteza da capacidade de viverem sos. Quando elas se colocam
abertas a outras relações percebem, de maneiras distintas, que podiam acordar
muitas coisas que estavam adormecidas e recuperar a sedução, ou o "ser
seduzida", perdida nos relacionamentos por elas experimentados. Helena assim se
coloca:

...acho que sou... ah..., na verdade, acho que sempre tive algo muito
disfarr,ado, mas presente, de achar muito importante a sedução e que ela
ficou muito reprimida, nao e uma sedução do adolescente, e a sedução da
mulher... que tem que persistir pela vida toda, nao e uma coisa especifica
daquele periodo. ...acho que e recuperar algo do... do viva, nao
necessariamente adolescente. Contando um pouco de como isso vai
acontecendo, tem as amizades com as mulheres extremamente confortante
112

neste momento, a analise, com certeza, e ai os outros homens que vao


aparecendo.

Os "homens que vao aparecendo" mostram novas possibilidades na


experiencia de Helena. Viver sensações adormecidas e a volta do sonho, da
fantasia, mas a ideia de famí1ia esta fortemente presente, como se este fosse um
período de experimentação e ao final chegasse novamente a viver em família.

Vou experimentando outros jeitos de ser mulher, em que lugares que isso me
faz bem? em que lugares que isso nao da muito certo?, em alguns momentos
eu me confundo de precisar estar bem em qualquer lugar, nesses lugares eu...
em alguns momentos eu posso nao me exigir isso, que homens eu you
experimentando? que homens que me fazem bem? foi muito legal, uma coisa
de ter me aproximado dessa coisa de conhecer homens em lugares de dançã e
tal... que voce nao sente que to satisfazem, nao sei... vai situando um pouco o
que eu quero, ate onde eu concedo, ate onde nao, e uma coisa que nao e
estabelecido... mas que e gostoso, e triste tambem porque fica um vazio...
querer muito aquela situaoo de fami1ia, companheiro, que e muito forte,
muito presente... dai vai tendo outras experiencias, e ter uma experiencia de
alguem que era so pra um dia mesmo, e ter um relacionamento sexual... como
e que e transar com alguem que e so aquele dia mesmo...

Helena estava vivendo, na epoca do depoimento, uma relação estável corn um


homem tambem separado, mas estava insatisfeita, apesar de ser um
relacionamento que se propunha a formação de uma familia.

...acho que nao da pra saber muito bem o que mais me incomoda, talvez
porque... e um cara muito diferente do Maximo, muito carinhoso, muito
preocupado, muito ligado e muito disponivel... e... nao sei, ate com os meus
filhos..., mas de uma certa forma me sufoca, me coloca numa situação de que
eu acabo tendo espaço demais nessa relação, eu acabo nao podendo muito...
muito tendo tempo pra mim.
113

A exemplo de Helena, Maria tambem desperta para sua sexualidade e


compara este periodo pós-separação ao frisson que acompanhava sua
adolescencia, onde, segundo ela, o ato de preparar-se para as festas era de muita
emoção, vestir-se corn as amigas tambem separadas, pensar quem iria encontrar,
as possibilidades de novos relacionamentos:

A gente se arruma e fica muito excitada em pensar se o “fulano" ira pra festa...
cria as possibilidades de encontros para as amigas. Isso me lembra quando eu
tenha 16 anos e me preparava para as festas... trocando roupas e aderegos
corn minhas amigas... palpitando o que ficava melhor, era um periodo muito
bom...

Apesar dessas falas serem, num primeiro momento, pautadas par uma
esperança e um sonho de vivenciar novos relacionamentos de forma diferente aos
que viveram no passado, ha uma certa desesperanga e descrenga quando falam das
suas buscas atuais. Solange diz:

...agora eu nao quero mais um homem fraco, quero um homem que eu tenha
uma relaçã de igual pra igual, de troca... e impressionante, eu nao sei se so
sobraram homens fracos ou se sou eu que atraio isso, mas a maioria dos
homens que se aproximam de mim... 99%... sao caras que estao
desempregados, que querem uma mae, que querem uma pessoa forte que
resolva tudo... sera que e sinal dos tempos?

O "homem fraco" e uma referencia ao seu ex-marido que, segundo ela, "nao
algava v6os profissionais, nao tinha iniciativa de comprar um imovel", deixando as
decisoes a seu cargo, inclusive aquelas que estavam relacionadas a sua propria
carreira profissional. A busca de Solange esta no homem bem-sucedido, forte e
resoluto, nao necessariamente provedor, onde permanece um padrao de
masculinidade tradicional. Nessa busca há
114

um questionamento sobre as mudancas ocorridas: "o fato da mulher, hoje, ter a


possibilidade de um projeto profissional', nao teria, de algum modo, colocado os
homens em uma posicao menos agressiva ante as situacoes ".
Maria nao tem um homem idealizado, mas procura homens masculinos que
exercam uma certa "feminilidade"31. Acalenta a ideia de um novo casamento, ainda
que de forma menos romanceada. Seu depoimento, realizado 5 anos apos a
separacao - 1993 - aponta seus vários envolvimentos amorosos como pouco
duradouros, colocando um certo "desencantamento" com os homens.

...quero alguem culto... um par mesmo... alguem que possa se interessar pelo
meu trabalho, que se encante comigo integralmente, nao pela minha beleza
ftsica somente, ou pela forca que tenho pra levar a vida... mas que se encante
com o que me encanta... quero cumplicidade!... mas nao tenho encontrado
isso... os homens ou sao muito criancas ou sao velhos demais..., ou seja,
querem ser cuidados... (risos)

Na fala de Maria, o "ser crianca ou velho demais" nao esta necessariamente


relacionado a idade de seus parceiros, mas sim a atitude ante a possibilidade de
um relacionamento. Ao mesmo tempo que pede cumplicidade, Maria nao abre
mao das "pequenas gentilezas", sugerindo as atitudes que parceiro devera ter:

ah! tem mais uma coisa: eu fico encantada com um homem que abre a porta
do carro, que manda flores... essas cobrancas eu fazia muito ao Marco Antonio
e ele fazia essas coisas, mas so quando eu cobrava... quero alguém

31
Como foi discutido no segundo capitulo, Nolasco aponta para uma "nova
masculinidade" que solicita um homem mais sensivel, sem que para isso deixe de ter
iniciativa. NOLASCO, Socrates. Um "Homem de Verdade". In: CALDAS, Dario. (org.)
Homens. Comportomento, sexualidode, mudanca. Identidade, crise, vaidade. Sao Paulo,
Editora SENAC, 1997, p.21.
115

que faça isso espontaneamente, porque eu acho que e muito dificil as pessoas
mudarem... fica artificial quando a gente cobra... na hora de uma briga
qualquer isso sempre aparece... "eu fiz isso por voce e voce nao e capaz de
fazer aquilo por mim"... sabe essa coisa? ele fazia algumas coisas porque eu
pedia e depois me dava o troco... como se estivesse me fazendo um favor...

Pedro coloca em questao as possibilidades das relações conjugais, das paixoes,


da irracionalidade dos sentimentos, mas nao descarta uma vida em famfia,
apresenta a mulher ideal como aquela que faz o papel do amigo, que nao faz
cobrangas, destacando a lealdade, identidade intelectual sem deixar de ser "muito
bela e muito boa de cama (risos)". Ressalta ainda que a mulher ideal para ele deve
compreender as "pequenas fragilidades", quase que reproduzindo o discurso da
"natureza" masculina: "...a fragilidade e, por exemplo, nao resistir a uma sedução
incontestavel, isso e uma fragilidade, e uma fraqueza humana...".

E importante assinalar que Pedro coloca essas "pequenas fragilidades" como


inerente ao ser humano, indicando que Canto os homens quanto as mulheres
podem viver uma "sedução incontestavel". No encanto, quando ele propoe a sua
parceira que os relacionamentos extra-conjugais nao deveriam ser mencionados, "a
nao ser se tivessem muita importancia e, neste caso, ela ficaria com o outro",
aponta a infidelidade feminina como mais grave, nao no sentido moral, mas onde
sexo e afeiçã nao se separam32.

32
GOLDENBERG, Mirian. A outra: uma reflexao antropologica sobre a infidelidade
masculina. In: NOLASCO, Socrares. (org.) A desconstru~7ao do masculino.Rio de Janeiro,
Rocco, 1995, p.138.
116

Marcos nao pensa em constituir fami1ia, fala das mulheres que passararn pela
sua vida como muito inteligentes, agradaveis, bonitas e, em media, 10 anos mais
jovens que ele, destacando uma que o divertia muito, que nao ficava somente
"naquele papo intelectual, tinha espaço pra falar abobrinhas".

Ao enfatizar os problemas dos relacionamentos, ele se interroga se alguma vez


esteve realmente apaixonado, "nao tem uma busca... vou encontrando, trombando
com as pessoas...", referindo-se aos rompimentos mais pela falta de "interesses
amorosos do que propriamente por briga ou rompimento mais serio, discussões".

Tanto Marcos quanto Alberto se sentiram sufocados por mulheres que


colocavam, implicita ou explicitamente, o casamento como condiçã de
continuidade do relacionamento.

Alberto, Pedro e Marcos apontam a "inteligencia da mulher" como a principal


caracteristica, acrescida, para Alberto a ponderação e o bomsenso, para Pedro, a
lealdade e a estetica e, para Marcos, alguem que seja intelectual, mas nem por isso
deixe se seduzi-lo com pequenas hist6rias do cotidiano, que o divirta.

Pautados ou nao por ideais normativos de comportamento ou por esteri6tipos


de papeis de homem ou de mulher, os depoimentos mostram uma "impregnação"
de papeis definida pelo dimorfismo sexual, ainda que esta se apresente de forma
nuançada.
117

As nuances trazem a multiplicidade de masculinos e femininos, abrindo


algumas brechas que tem um potencial modificador das relações entre homens e
mulheres. E preciso estar atento ao que diz Almeida:

Masculinidade e feminilidade nao sao sobreponíveis, respectivamente a


homens e mulheres, sao metaforas de poder e de capacidade de ação, como
tal acessíveis a homens e mulheres. Se assim nao o fosse, nao se poderia
pensar nem em varias masculinidades [eu acrescentaria femilidades] nem nas
transformações nas relações de gênero33.

Recato, pureza, virgindade sao valores que definiram mulheres por muitos
anos, enquanto que para os homens esses valores eram invertidos. A virgindade de
um homem, dependendo de sua idade, ainda e um problema. Sera que as
transições, os questionamentos que perpassam a discussao de genero, o
movimento feminista e suas discussoes, fizeram com que as regras do jogo
mudassem? Aparentemente nao. A virgindade para Helena nao e colocada como
um valor strictu sensu, entretanto a questao e considerada "um momento muito
especial". Para Alberto parece ser muito "natural" o exercício da sexualidade,
pensado enquanto "ganho", ao contrario de Helena que a ve, como muitas
mulheres, enquanto "perda"34. Talvez essa questao, ainda que possa ser vista de
forma diferente do que foi no passado, traga uma impregnação dos valores,

33
ALMEIDA, M.V.de. Genero, masculinidade e poder: revendo um caso do sul de
Portugal. Anu6rio Antropol6gico/95, Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1996, p.162.
34
GUIDDENS, Anthony. A tronsformaçã do intimidade. Sao Paulo, Eitora da UNESP, 1992,
p.61.
118

...el honor de un hombre y de una mujer entranan modos de conduta


diferentes... una mujer queda deshonrada, pierde la verguenza, al mancharse
corn la macula de su pureza sexual, pero un hombre no35.

As caracteristicas da jo parceirato apontam para uma mescla de atributos


associados a feminilidade e masculinidade. Os depoentes descrevern suas parceiras
enfatizando o corpo, a beleza, mas enfase semelhante ou maior e dada a
inteligencia, que, no caso de Alberto, nao esta relacionada ao conhecimento ou a
capacidade profissional, apesar da maioria de suas parceiras terem sido mulheres
profissionalizadas, mas sim a ante de lidar corn as situações, inscrita na "natureza
feminina".
Da mesma forma, as depoentes pensam no possivel parceiro como aquele que
possua força, capacidade de proteção e uma certa "feminilidade", sem, no entanto,
afastar-se demasiadamente da "natureza masculina".
Os motivos que levam a insatisfação de Helena na relação corn Maximo -
ainda muito presente e, portanto, colocada como parametro -- sao opostos aqueles
que levam a mesma insatisfaçã quando ela pole voltar a ter uma fam1ia.
Se antes seus desejos nao eram considerados, agora ela se encontra em uma
relação onde se sente sufocada por alguem que satisfaz todos os desejos. Mesmo
querendo "muito aquela situação de famí1ia", quando se coloca essa situação ela
nao quer. "Aquela" situação de famia parece ser

35
PITT-RIVERS,, Julian. Antropologia del honor. Barcelona, Editorial Critica, 1979, p.44.
119

uma referencia a famí1ia nuclear, o que pode ser formado fora dela nao e
comparavel nem satisfaz.
Pedro se denomina um outsider, tentando fugir de uma certa falsidade nas
relações, principalmente quando se refere ao irmao, ou de submissao, quando se
refere a irma.
Alberto valoriza o desempenho profissional e a iniciativa das mulheres que
"passaram por sua vida", mas coloca em destaque "o jeito feminino de manipular
as situações", como se isso significasse uma forma de burlar o "dominio natural" do
homem. Para ele, a manipulação e um dado, e inerente a mulher, por isso Alberto
fala da "etica da manipulação" como a inteligencia feminina, etica significa para ele
"nao querer enganar, mentir".
Helena quer um homem que respeite seu desejo, mas que nao perca as
caracteristicas de homem - virilidade, proteçã, forga e, paradoxalmente, questiona:
"sera que `nova' mulher nao estaria abrindo um espago para a feminilização dos
homens"?

Maria nao precisa de um "provedor", tampouco de um "protetor", ao longo de


seu depoimento ela se mostra bastante auto-suficiente na divisao entre a profissao
e os filhos, mas permanece o modelo masculino que faz as "pequenas delicadezas".
Alberto aceita e aplaude a inserção das mulheres em cameos ate entao
ocupados por homens, mas sem perder o ` jeito feminino", sem precisar "tornar-se
um homem".
120

Trazer a experiencia dos sujeitos, atravessados pelo genero, coloca alguns


limites impostos pela documentação. No entanto, mesmo a enfase na essencia, na
natureza, no sexo estatico3 de mulheres e de homens, nao impede a percepção do
jogo arcaicolmoderno, indicando que um modelo de masculinidade e de
feminilidade nao abarcam as multiplas identidades que afloram dos sujeitos.
Considerações finais...

... se o sujeito e constituido pelo poder, esse poder não


cessa no momento em clue o sujeito e con.stituido,
pois esse sujeito nunca esta plenamente constituido,
mas e sujeitado e produzido continuamente. Esse
sujeito nao e base nem produto, mas a possibilidade
permanence de um certo processo de re-significação...
Judith Butler
122

Considerações finais...

Chegar ao final..., e aqui as reticencias sao fundamentais, indicando sempre


um recomego, e uma tarefa bastante dificil para as/os pesquisadoras[es, pois, de
um lado, significa o terrnino de uma etapa, de outro, o questionamento daquilo
que poderia ter sido feito e nao foi. Como diria Mariza Correa, "os piores leitores
dos seus trabalhos sao seus proprios autores"1.
Algumas perguntas nortearam esta pesquisa desde o inicio, outras foram
suscitadas pela interlocuçã com os sujeitos que dela participaram, interrogando as,
ou introduzindo modificações nas, questoes que lhes eram apresentadas.
As relações amorosas, vivenciadas nos anos 70-90, abriram alguns caminhos
para compreender os significados associados ao genero, atraves das
representapoes de masculinidades e de feminilidades dos sujeitos aqui
contemplados, presentes no jogo arcaico(moderno. Neste sentido, uma das
perguntas que se colocava era em que medida essas representações estavam
associados, ou em contraposição, ao discurso do "novo homem", do "homem em
crise" e do aparecimento da "nova mulher".
Essas questoes foram analisadas a luz da experiencia dos sujeitos, com o
cuidado de nao torna-la, por ser experiencia, uma evidencia legitimadora, mas
pensa-la como uma expressao de mudangas ejou permanencias nas relagaes entre
homens e mulheres, buscando uma historia ancorada na

1
CORREA, M. e PISCITELLI, A. "Flores do colonialismo". Entrevista com Miguel Vale de
Almeida. Cadernos PAgu (11), Campinas, UNICAMP/PAGU, 1998.
123

memoria e passada atraves da narração, uma narrarrao permeada pelos tempos


multiplos, flexiveis e heterogeneos, trazendo ao presente o "sinal de que algo
aconteceu" e "que ainda esta vivo na memoria" - marcas que, apesar de estarem
situadas no individual, mostram-se coletivas quando os narradores falavam de si
atraves de seu mundo.
Este caminho permitiu olhar para a historia em movimento, onde a narraçã,
partindo da "realidade" das experiencias vividas, apontavam, nao a verdade", mas
o vetor que norteia o processo historico.
Na interseção de genero e experiencia foi possivel perceber alguns sinais que
indicavam a convivencia de mudangas e permanencias, de arcaico e moderno, de
emergente e residual nas masculinidades e feminilidades, constituindo um mosaico
onde a multiplicidade acaba por implodir concepções que colocam alguns termos
com significados unicos e em oposição.
Certamente, uma das dividas que as discussoes academicas tem com os
estudos feministas, a partir dos anos 80, esta na inserção das questoes de genero
em suas discussoes, nas quaffs identidade da lugar a subjetividades multiplas e nao
unificadas.
Os depoimentos mostram situações onde os comportamentos sao associados
a construções de masculinidade ou de feminilidade, independentemente do sexo
do agente. Nesse sentido, foi instigante analisar alguns trabalhos que buscam
explicações para os comportamentos receosos frente aos (des)encontros entre
homens e mulheres fora da fam1ia convencional, entre elas, as que colocavam a
"crise de identidade
124

masculina" como consequencia do aparecimento da "nova mulher", apresentado


questionamentos, ate entao velados ou inexistentes, aos seus parceiros.
As construções apontadas, “nova mulher" - que saiu para trabalhar, viaja
sozinha, tem uma profissao, e independente economicamente - ou "crise de
identidade masculina" - permeada pela "emancipação da mulher", ou pelo "fardo"
de ser homem, partem do mesmo paradigma das perspectivas que derivam e
limitam masculinidades a homens e feminilidades a mulheres.
As mulheres que aparecem nesta dissertaçã estao inseridas em novos lugares,
tem novas roupagens, novas preocupapoes, mas ainda apreciam homens
portadores de atributos tradicionais -protetor, para Helena, forte, para Solange e
gentil, para Maria. Os homens que aqui falaram de suas historias de amor
aplaudem essas inserções de mulheres como Helena, Maria e Solange, desde que
as novas roupagens nao apaguem a "natureza feminina", para Alberto, que nao os
humilhe ao falar das "dimensoes", para Pedro, e que nao o tenha como referencia
de vida, para Marcos.
E aqui cabe outra pergunta: Sao "novas" essas mulheres? os depoimentos aqui
apresentados indicam a existencia de mudangas claras em suas trajetorias, pois jd
nao se encaixam exatamente na concepção de feminilidade tradicional - mae-
esposa-dona de casa - permeadas pelo recato e pela pureza. No entanto, as
depoentes apresentam identidades multiplas, que nao pode, e nao deve, ser
simplificada, pois seria cair na mesma
125

armadilha que aprisiona homens e mulheres a uma única identidade definida pelo
sexo.
Tratar a identidade masculina como homogenea significa ignorar a
multiplicidade de significados de genero englobados nesse termo. Trata-la como
consequencia do aparecimento da "nova mulher", significa, novamente,
homogeneizar, reduzindo masculinidades a estereotipos, uma impossibilidade
quando tratamos de sujeitos com miultiplas identidades.
As varias feminilidades e masculinidades, apresentadas nas narrativas, abrem
algumas brechas para (re)pensar/re-significar as relações entre homens e mulheres
nos ultimos 20 anos. Mais do que respostas, este trabalho traz algumas indagações
que remetem a importancia, a potencialidade e a contemporaneidade dessas
questoes, deixando em aberto um desafiante caminho para a historiografia.
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