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MATERIAL DE APOIO

Disciplina: Direito Civil


Professor: Nelson Rosenvald
Aulas: 01 e 02 | Data: 06/08/2015

ANOTAÇÃO DE AULA

SUMÁRIO

DIREITO DAS OBRIGAÇÕES


1. Relação obrigacional
2. Vínculo jurídico
2.1 Débito sem responsabilidade
2.2 Responsabilidade sem débito

1. Relação Obrigacional
Relação obrigacional é a relação jurídica transitória, estabelecendo vínculos jurídicos entre credor e devedor, cujo
objeto é uma prestação, positiva ou negativa, garantindo o cumprimento, sob pena de coerção judicial.

A relação obrigacional é composta de três elementos:


 sujeitos: credor e devedor;

 objeto: é a prestação (conduta humana devida: dar, fazer ou não-fazer);

 vínculo jurídico: é o vínculo que une o credor ao devedor.

2. Vínculo jurídico
Segundo a teoria dualista, toda relação obrigacional é composta de dois elementos: débito (schuld) e
responsabilidade (haftung).

O que é o débito (schuld)? Débito é a relação de direito material entre credor e devedor.

Podem ser fontes de débito:


a) negócio jurídico;

b) dever legal: imposição do legislador;

c) dano: nasce uma obrigação de indenizar (obrigação de dar quantia certa);

d) enriquecimento sem causa.

Veja o tema a seguir no informativo 562 do STJ de 28 de maio de 2015:

DIREITO CIVIL. COBRANÇA DE TAXA DE MANUTENÇÃO EM CONDOMÍNIO DE FATO. RECURSO REPETITIVO (ART.
543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). TEMA 882.
As taxas de manutenção criadas por associações de moradores não obrigam os não associados ou os que a elas
não anuíram. As obrigações de ordem civil, sejam de natureza real sejam de natureza contratual, pressupõem,
como fato gerador ou pressuposto, a existência de uma lei que as exija ou de um acordo firmado com a
manifestação expressa de vontade das partes pactuantes, pois, em nosso ordenamento jurídico positivado, há
somente duas fontes de obrigações: a lei ou o contrato. Nesse contexto, não há espaço para entender que o
morador, ao gozar dos serviços organizados em condomínio de fato por associação de moradores, aceitou

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tacitamente participar de sua estrutura orgânica. Com efeito, na ausência de uma legislação que regule
especificamente a matéria em análise, deve preponderar o exercício da autonomia da vontade - a ser manifestado
pelo proprietário ou, inclusive, pelo comprador de boa-fé -, emanada da própria garantia constitucional da
liberdade de associação e da legalidade, uma vez que ninguém pode ser compelido a fazer algo senão em virtude
de lei. De igual modo, incabível o entendimento de que a vedação ao enriquecimento ilícito autorizaria a cobrança
pelos serviços usufruídos ou postos à disposição do dono do imóvel inserto em loteamento, independentemente de
ser ou não associado. Isso porque adotar esse posicionamento significaria esvaziar o sentido e a finalidade da
garantia fundamental e constitucional da liberdade de associação, como bem delimitou o STF no julgamento do
RE 432.106-RJ (DJe 4/11/2011), encontrando a matéria, inclusive, afetada ao rito da repercussão geral (RG no AI
745.831-SP, DJe 29/11/2011). De fato, a jurisprudência não pode esvaziar o comando normativo de um preceito
fundamental e constitucional em detrimento de um corolário de ordem hierárquica inferior, pois, ainda que se
aceite a ideia de colisão ou choque de princípios - liberdade associativa (art. 5º, XX, da CF) versus vedação ao
enriquecimento sem causa (art. 884 do CC) -, o relacionamento vertical entre as normas - normas constitucionais e
normas infraconstitucionais, por exemplo - deve ser apresentado, conforme a doutrina, de tal forma que o
conteúdo de sentido da norma inferior deve ser aquele que mais intensamente corresponder ao conteúdo de
sentido da norma superior. Ademais, cabe ressaltar que a associação de moradores é mera associação civil e,
consequentemente, deve respeitar os direitos e garantias individuais, aplicando-se, na espécie, a teoria da eficácia
horizontal dos direitos fundamentais. Concluindo, a aquisição de imóvel situado em loteamento fechado em data
anterior à constituição da associação não pode impor a cobrança de encargos ao adquirente que não se associou
nem a ela aderiu. Igualmente, se a compra se opera em data posterior à constituição da associação, na ausência
de fonte criadora da obrigação - lei ou contrato -, é defeso ao poder jurisdicional, apenas calcado no princípio do
enriquecimento sem causa, em detrimento dos princípios constitucionais da legalidade e da liberdade associativa,
instituir um dever tácito a terceiros, pois, ainda que se admita a colisão de princípios norteadores, prevalece,
dentre eles, dada a verticalidade de preponderância, os preceitos constitucionais, cabendo tão-somente ao STF, no
âmbito da repercussão geral, afastá-los se assim o desejar ou entender. Precedentes citados: EREsp 444.931-SP,
Segunda Seção, DJ 1º/2/2006; AgRg nos EDcl no Ag 715.800-RJ, Terceira Turma, DJe 12/12/2014; e EDcl no REsp
1.322.723-SP, Quarta Turma, DJe 29/8/2013. REsp 1.280.871-SP e REsp 1.439.163-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas
Cueva, Rel. para acórdão Min. Marco Buzzi, Segunda Seção, julgados em 11/3/2015, DJe 22/5/2015.

Por outro lado, a responsabilidade (haftung) é a sujeição patrimonial do devedor ao credor, ou seja, quando o
devedor não cumpre espontaneamente o débito, o ordenamento jurídico, diante da pretensão do credor, pode
atingir os seus do inadimplente pela via processual e, coercitivamente, obter dele tudo o que deixou de cumprir.

CC, art. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do


direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se
a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente
pela reparação.

Portanto, o credor pode buscar bens no patrimônio do executado. Pergunta-se: quais são esses bens?

NCPC, art. 789. O devedor (executado) responde com todos os seus


bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações,
salvo as restrições estabelecidas em lei.

ATENÇÃO: em que pese o artigo acima faça menção apenas a bens presentes e futuros, podemos incluir os bens
PASSADOS, a fim de evitar, por exemplo, fraude contra credores.

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Quais bens do executado são atingidos?

CC, art. 391 CC. Pelo inadimplemento das obrigações respondem


todos os bens do devedor.

CUIDADO: embora o dispositivo faça previsão de todos os bens do devedor, isso está ERRADO, pois existe uma
parte do patrimônio do devedor que se chama PATRIMÔNIO MÍNIMO (teoria do patrimônio mínimo). Ex.:
impenhorabilidade do imóvel residencial, bem de família voluntário, bens impenhoráveis previstos no CPC.

Nesse sentido, o patrimônio mínimo está em constante expansão e a nossa jurisprudência vem corroborando tal
tendência. Vejamos a súmula 486, STJ:

É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja


locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja
revertida para a subsistência ou a moradia da sua família (S. 486,
STJ).

Pergunta: o imóvel de pessoa solteira é considerado bem de família? O conceito correto não é “bem de família”,
mas BEM MÍNIMO EXISTENCIAL, porque o patrimônio mínimo é protegido pela dignidade da pessoa humana,
conforme súmula 364, STJ:

O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também


o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas (S. 364,
STJ).

Atenção: perceba que o NCPC prestigia a proteção do credor, in verbis:

NCPC, art. 833, §2º O disposto nos incisos IV e X do caput não se


aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação
alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às
importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais,
devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8o, e no art.
529, § 3o.

Sabemos que a responsabilidade no Brasil é patrimonial. Isso porque, antigamente, a responsabilidade pelo
inadimplemento de débitos tinha cunho pessoal. Com o passar do tempo, a responsabilidade passou a adotar
pena de prisão.

CF, art. 5º, LXVII CF. Não haverá prisão civil por dívida, salvo a do
responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de
obrigação alimentícia e a do depositário infiel;

Desde 2008, o STF extinguiu com a prisão civil do depositário infiel.

Vejamos o teor do seguinte RE: nenhuma relação obrigacional pode ofender direitos da pessoa humana.

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RE n.466.343, 03.12.2008, Informativo n. 531 STF, Rel. Min.Peluso: “Já não é possível conceber o corpo humano
como passível de experimentos normativos no sentido de que se torne objeto de técnicas de coerção para
cumprimento de obrigações estritamente de caráter patrimonial”.

O STF adotou a tese da SUPRALEGALIDADE dos tratados internacionais que versam sobre direitos humanos.

ATENÇÃO: cabe ressaltar que a norma supralegal, de acordo com o STF, é dotada de EFICÁCIA PARALISANTE
(porque o tratado internacional paralisou a vigência das normas infralegais).

Portanto, qualquer juiz, em sede de controle de constitucionalidade deverá fazer dois controles: (i) controle de
constitucionalidade e (ii) controle de convencionalidade.

SÚMULA VINCULANTE Nº 25, STF - É ILÍCITA A PRISÃO CIVIL DE


DEPOSITÁRIO INFIEL, QUALQUER QUE SEJA A MODALIDADE DO
DEPÓSITO.

Mas e a prisão do devedor de alimentos? A prisão civil NÃO é pena, mas TÉCNICA PROCESSUAL COERCITIVA.

O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que


compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da
execução e as que se vencerem no curso do processo (S. 309, STJ).

NCPC, art. 517. A decisão judicial transitada em julgado poderá ser


levada a protesto, nos termos da lei, depois de transcorrido o prazo
para pagamento voluntário previsto no art. 523.

Obs:. no NCPC, os alimentos serão aqueles compreendidos em sentido amplo (e não somente os decorrentes do
direito de família). Ex.: alimentos decorrentes de atos ilícitos (lucros cessantes), honorários advocatícios etc.

NCPC, art. 531. O disposto neste Capítulo aplica-se aos alimentos


definitivos ou provisórios.

2.1 Débito sem responsabilidade


Pergunta: pode haver débito SEM responsabilidade (obrigações imperfeitas ou naturais)? Sim.

Ex1.: prescrição – é um fato jurídico que neutraliza a pretensão do credor.

CC, art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual
se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e
206.

Pergunta: qual é o único efeito jurídico de uma obrigação natural? É a IRREPETIBILIDADE.

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CC, art. 882. Não se pode repetir o que se pagou para solver dívida
prescrita, ou cumprir obrigação judicialmente inexigível.

Ex2.: “jogos e apostas tolerados” são obrigações naturais.

CC, art. 814. As dívidas de jogo ou de aposta não obrigam a


pagamento; mas não se pode recobrar a quantia, que
voluntariamente se pagou, salvo se foi ganha por dolo, ou se o
perdente é menor ou interdito.

Pergunta: como fica o regramento em relação ao jogo proibido? O objeto é ilícito ou nulo.

CC, art. 883 CC e parágrafo único. Não terá direito à repetição aquele
que deu alguma coisa para obter fim ilícito, imoral, ou proibido por
lei. Parágrafo único. No caso deste artigo, o que se deu reverterá em
favor de estabelecimento local de beneficência, a critério do juiz.

2.2 Responsabilidade sem débito


Ademais, havendo o inadimplemento da obrigação, o credor tem a chamada GARANTIA GERAL, ou seja, o credor
pode atingir o patrimônio do devedor utilizando do (i) arresto, (ii) sequestro e (iii) penhora.

Outro modo de reforço ao credor é a GARANTIA ESPECIAL, que se divide em duas:

 garantia real: é a garantia de afetação a bem específico do devedor (ex.: hipoteca [imóveis], penhor
[móveis] e anticrese) – concede direito de sequela e preferência.

CC, art. 1419. Nas dívidas garantidas por penhor, anticrese ou


hipoteca, o bem dado em garantia fica sujeito, por vínculo real, ao
cumprimento da obrigação.

 garantia pessoal (obrigacional): é a fiança e o aval. A garantia do fiador ou do avalista passa a recair sobre
o patrimônio de terceiro (há responsabilidade sem débito). Portanto, fiador e avalista são responsáveis
por dívidas alheias.

CC, art. 818. Pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer
ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a
cumpra.

Pergunta: qual a diferença entre FIANÇA e AVAL?

FIANÇA AVAL
Obrigação civil Obrigação cambiária
Obrigação acessória Obrigação autônoma
Dívida subsidiária Dívida solidária

Veja o tema a seguir no Informativo 560 do STJ de 03 de maio de 2015:

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ILEGITIMIDADE ATIVA DO FIADOR PARA PLEITEAR EM JUÍZO A REVISÃO DO
CONTRATO PRINCIPAL.
O fiador de mútuo bancário não tem legitimidade para, exclusivamente e em nome próprio, pleitear em juízo a
revisão e o afastamento de cláusulas e encargos abusivos constantes do contrato principal. Com efeito, a fiança é
obrigação acessória, assumida por terceiro, que garante ao credor o cumprimento total ou parcial da obrigação
principal de outrem (o devedor) caso este não a cumpra ou não possa cumpri-la conforme o avençado. Esse
conceito é facilmente extraído do art. 1.481 do CC/1916 bem como do art. 818 do CC/2002, que dispõe: "Pelo
contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não
a cumpra". A despeito disso, a relação jurídica que se estabelece entre o credor e o devedor do negócio jurídico
principal não se confunde com a relação estabelecida no contrato secundário (de fiança), firmado entre aquele
mesmo credor e o fiador, que se apresenta como mero garantidor do adimplemento da obrigação principal. Cuida-
se, portanto, de contratos que, apesar de vinculados pela acessoriedade da fiança, dizem respeito a relações
jurídico-materiais distintas. Essa distinção existente entre as relações de direito material é que torna evidente a
ilegitimidade do fiador para, exclusivamente e em nome próprio, postular em juízo a revisão e o afastamento de
cláusulas e encargos abusivos constantes do contrato principal (mútuo bancário), materializador, como de outro
modo não poderia ser, da comunhão de vontades, exclusivamente, dos contratantes (credor e devedor). É que não
se pode confundir legitimidade para agir - que diz respeito à qualidade reconhecida ao titular do direito material
que se pretenda tutelar em juízo, relacionada ao fato de ser o autor da pretensão o verdadeiro titular do direito
que se pretende tutelar bem como ser o réu o titular do direito de àquele pleito se contrapor - com interesse de
agir, nem, menos ainda, conceber a ideia de que o exercício da ação estaria sujeito apenas à existência do
segundo. Desse modo, apesar de ser inconteste a existência de interesse econômico do fiador na eventual
minoração da dívida que se comprometeu garantir perante o credor, não é sua a legitimidade para demandar a
revisão das cláusulas apostas no contrato principal, sendo irrelevante, nesse aspecto, o fato de responder de modo
subsidiário ou mesmo solidariamente pelo adimplemento da obrigação. Isso porque, para tanto, a titular do
direito material correlato é pessoa jurídica distinta e o fiador, como consabido, não está autorizado por lei a atuar
como seu substituto processual. REsp 926.792-SC, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 14/4/2015, DJe
17/4/2015.

Pergunta: é possível uma pessoa ser responsável por um débito mesmo que ela não se tenha obrigado a tanto?
Sim. São as chamadas hipóteses de responsabilidade patrimonial secundárias. São exemplos:

a) cônjuge

NCPC, art. 790. São sujeitos à execução os bens:

IV - do cônjuge ou companheiro, nos casos em que seus bens


próprios ou de sua meação respondem pela dívida;

ATENÇÃO: segundo o art. 3º, III da Lei 8009/90, a impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de
execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: pelo credor da pensão
alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união
estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida.

b) sócio.

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NCPC, art. 790. São sujeitos à execução os bens:

II - do sócio, nos termos da lei;

O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera,


por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente (S. 430, STJ).

c) responsável: mediante incidente de desconsideração da personalidade jurídica.

NCP, art. 790. São sujeitos à execução os bens:

VII - do responsável, nos casos de desconsideração da personalidade


jurídica.

Obs.: cabe ressaltar que a disposição legal acima contemplada abarca a possibilidade da desconsideração inversa
(busca de bens com a pessoa jurídica).

QUESTÃO
Ano: 2014 / Banca: CESPE / Órgão: Câmara dos Deputados / Prova: Analista Legislativo

São fontes mediatas das obrigações em geral os contratos, as declarações unilaterais de vontade e os atos ilícitos.
( ) Certo ( ) Errado

Resposta: certo.

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